FÉ E EVOLUÇÃO: A INFLUÊNCIA DE CRENÇAS RELIGIOSAS SOBRE A CRIAÇÃO DO … · 2017-02-22 ·...

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ANDRÉA PORTO LUIZ MADEIRA FÉ E EVOLUÇÃO: A INFLUÊNCIA DE CRENÇAS RELIGIOSAS SOBRE A CRIAÇÃO DO HOMEM NA APRENDIZAGEM DA TEORIA DA EVOLUÇÃO COM ALUNOS DO 3º ANO DO ENSINO MÉDIO Programa de Estudos Pós-Graduados em Ciências da Religião Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PEPG-CRE-PUC/SP São Paulo 2007

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  • ANDRA PORTO LUIZ MADEIRA

    F E EVOLUO: A INFLUNCIA DE CRENAS RELIGIOSAS

    SOBRE A CRIAO DO HOMEM NA APRENDIZAGEM DA

    TEORIA DA EVOLUO COM ALUNOS DO 3 ANO DO

    ENSINO MDIO

    Programa de Estudos Ps-Graduados em Cincias da Religio

    Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo

    PEPG-CRE-PUC/SP

    So Paulo

    2007

  • 2

    ANDRA PORTO LUIZ MADEIRA

    F E EVOLUO: A INFLUNCIA DE CRENAS RELIGIOSAS

    SOBRE A CRIAO DO HOMEM NA APRENDIZAGEM DA

    TEORIA DA EVOLUO COM ALUNOS DO 3 ANO DO

    ENSINO MDIO

    Dissertao apresentada ao Programa de Estudos

    Ps-Graduados em Cincia da Religio Pontifcia

    Universidade Catlica de So Paulo

    PUC/SP,

    como exigncia parcial para a obteno do ttulo de

    Mestre, sob a orientao do Prof. Dr. Eduardo

    Rodrigues da Cruz.

    PUC - SP

    2007

  • 3

    ____________________________________________________

    ____________________________________________________

    ____________________________________________________

  • 4

    AGRADECIMENTOS

    Primeiramente a Deus e a Jesus Cristo por terem permitido a concluso

    desta pesquisa, e por terem me dado tudo de bom que possuo!

    Em especial ao meu esposo, Fredy Madeira Jnior, pela pacincia,

    tolerncia e incentivo, sem ele no seria possvel a realizao deste

    trabalho.

    Secretaria da Educao do Estado de So Paulo, pela Bolsa de Estudos

    oportunidade a mim ofertada.

    Ao meu orientador, Prof. Dr. Eduardo Rodrigues da Cruz, por todo apoio,

    compreenso, sabedoria e amizade.

    Profa. Dra. Llian Al-Chueyr Martins pelos ensinamentos e por toda

    ateno e carinho.

    Ao Prof. Dr. Afonso Maria Ligrio Soares pelas valiosas discusses e

    sugestes significativas.

    Secretria do Programa de Cincias da Religio, Andria por sua ateno

    e cordialidade.

    Em especialmente Leide Bela de Brito Anlia da Costa, obrigada pela

    amizade e pelo companheirismo nesta jornada.

    Ao Diretor da escola E. E. Bom Pastor, Jos Maurcio Serafim Alves, seus

    professores e alunos que motivaram e serviram de inspirao para esta

    pesquisa.

    A toda minha famlia, minhas irms Graa, Bete, Gilmara, minha sogra, D.

    Jlia, minha cunhada Regina, e meus sobrinhos por todo amor, carinho e

    incentivo para a realizao deste trabalho.

    Aos meus amigos que compartilharam o percurso desta minha jornada, em

    especial, Ivanilde, Marli e Sandra.

  • 5

    Dedico este trabalho aos meus pais (in

    memoriam), os primeiros a me segurarem pelas

    mos para que pudesse dar os primeiros passos

    e por acreditarem que um dia seria capaz de

    construir o meu prprio caminho.

  • 6

    Cincia e Religio: Modelo(s) Educativo(s) para a tradio

    ou ps-modernidade.

    Um educador consciente no esperar, nem pretender,

    formar um adulto culto, que no possua nenhum princpio,

    valores, ou opinies, os quais no consiga defender

    racionalmente perante todas as pessoas e, que seja incapaz

    de manifestar idias determinadas, virtudes bem enraizadas,

    ou profunda lealdade e dedicao. Por outro lado, no

    tratar tambm os seus alunos, de modo, a deix-los de

    esprito fechado e compreenso limitada. O processo de

    formao de aluno semelhante ao de aprender a construir

    uma casa, em que se constri realmente a casa, e depois

    tem de se viver na casa que se construiu. um processo

    em que a pessoa necessita inevitavelmente de ajuda. O

    autoritrio exagerado ajuda a construir a casa, segundo o

    projeto que julgar ser melhor, obrigando o principiante a

    viver nela. Este educador projeta a casa de madeira a

    dificultar ao mximo a possibilidade de o principiante a

    alterar. O liberal exagero deixa o principiante procurar seus

    prprios materiais, criar o seu prprio projeto, com receio de

    exercer uma influncia abusiva. No mximo fornecer

    informaes exclusivamente tcnicas, se lhes pedirem. O

    educador consciente ajuda o principiante a construir a

    melhor casa que puder ( luz da experincia acumulada).

    Ele faz o balano entre a necessidade de produzir uma boa

    casa e a vantagem de deixar o principiante fazer suas

    prprias opes; mas toma precaues para que o projeto

    da casa seja criado, de modo a poder ser posteriormente

    alterado e melhorado, quando o proprietrio, que deixou de

    ser principiante, julgar conveniente .1

    1 Este texto foi adaptado do Professor Basil Mitchell The Durham Report. In: POOLE, Michael. Coleo Epistemologia e Sociedade, sob a direo de Antonio Oliveira Cruz. Traduo de Ana Andr. Capa Dorindo Carvalho. Instituto Piaget. Av.Joo Paulo II, Lote 544.2-1900 Lisboa-Portugal.

  • 7

    RESUMO

    O reconhecimento das transformaes do campo religioso nas ltimas

    dcadas, e mais recentemente, o aumento e visibilidade do protestantismo

    pentecostal, mais conhecido como grupo de evanglicos, e a insero

    destes em diversos mbitos da sociedade brasileira e mais especificamente

    em instituies e espaos pblicos, nos motivou a estudar e tentar

    compreender como a dinmica interna das religies e do cristianismo em

    geral, configura posturas individuais e coletivas que refletem no mbito das

    relaes e interaes humanas, conflitos e tenses subjacentes a um

    contexto bem maior e complexo: o eixo cincia-religio. Devido relevncia

    histrica e a atualidade das questes e controvrsias quanto s explicaes

    da origem do universo, da vida e do homem, a temtica deste trabalho vem

    discutir o grau de conhecimento e adeso s teorias conhecidas como

    evolucionismo e criacionismo e a forma como so entendidas, interpretadas

    e, mediadas, por agentes sociais formadores de opinio como, por exemplo,

    professores e lderes religiosos. Nosso trabalho , portanto, o resultado

    dessa pesquisa que investiga a concepo, convico e a interpretao de

    jovens secundaristas da classe popular da Grande So Paulo, mais

    especificamente do municpio de Guarulhos, quanto origem da vida e do

    homem. Tomamos como ponto de partida, a realidade educacional pblica,

    mais particularmente, o ensino de biologia. A pesquisa aponta para a

    necessidade da conjugao e a convivncia de opinies distintas e

    conflitantes no mbito da sala de aula, bem como, para o reconhecimento de

    um mapa indicativo que reflete elementos constitutivos de adeso e afiliao

    em ambas esferas e, apontam para uma adeso hbrida que se configura

    talvez, numa nova forma de ressignificao de identidade fundamentalista

    em ambos os campos: cientfico e religioso. Nesse sentido, entendemos que

    esse confronto ideolgico entre evoluo e criao, cada vez mais, se

    consolida, como um elemento de fundamental importncia na anlise e

    compreenso de aspectos da sociedade brasileira que muito tem chamado a

    ateno de educadores e pesquisadores no mbito das cincias sociais.

  • 8

    ABSTRACT

    The Recognition of the religious field changing in the last few decades, and

    more recently, the increase and visibility of the Pentecostal Protestantism,

    well known as evangelic group, and the insertion of these in several scopes

    of the Brazilian society and more specifically in public institutions and spaces,

    it motivated us to study and try to understand how the internal religions

    dynamics and the Christianity in general configure individual and collective

    positions that reflect the relations and interactions underlying human beings

    scope, conflicts and tensions to a well bigger and complex context: the axle

    science-religion. Due to historical relevance and the present time questions

    and controversies as well as the origin of the universe, of the life and the

    human being explanations, this work thematic comes to argue the degree of

    knowledge and adhesion to the known theories such as evolutionism and

    creationism and the way how they are understood, interpreted and mediated

    by opinion influents social agents, for example: teachers and religious

    leaders. Therefore our work is this research outcome that investigates the

    conception, certainty and the interpretation of the young secondary students

    come from popular economic classes in the Great So Paulo, more

    specifically of the city of Guarulhos, about the origin of the life and the human

    being. As a starting point we take the public education reality, more

    particularly, the biology education. The research points to the conjugation

    and the coexistence needing of distinct and conflicting opinions in the

    classroom scope, as well as, to the recognition of an indicative map that

    reflects constituent elements of adhesion and affiliation in both spheres and,

    points with respect to a hybrid adhesion that configures itself maybe in a new

    way of fundamentalist identity re-meaning in both fields: scientific and

    religious. In this direction, we understand this ideological confrontation

    between evolution and creation consolidates itself as an important basic

    element in the analysis and understanding of the Brazilian society aspects

    that has been calling the educators and researchers attention in the social

    sciences scope.

  • 9

    SUMRIO

    INTRODUO ...

    15

    CAPTULO I DARWIN, DARWINISMOS E A EVOLUO..............

    20

    1.1. Pensadores Pr-Darwinistas e Suas Contribuies................

    23

    1.2. Pensadores Ps-Darwinistas e suas Contribuies................

    26

    1.3. Pensadores Neodarwinistas e Suas Contribuies.................

    27

    1.4. O Darwinismo..........................................................................

    28

    1.5. Evoluo e Conceitos..............................................................

    29

    1.6 Quanto Velocidade em que Ocorre a Evoluo....................

    31

    1.7. Seleo Natural.......................................................................

    32

    1.8. A Trajetria dos Antepassados Humanos...............................

    35

    1.9. O Homem Veio do Macaco ou No?.......................................

    41

    1.10. A Biologia como Cincias......................................................

    42

    1.11. A Cincia no Brasil................................................................

    43

    1.12. O Currculo de Biologia e os PCN s...................................... 44

    1.13. A Biologia numa Perspectiva da Educao Transformadora

    47

    1.14. O Papel do Professor de Biologia......................................... 48

    CAPTULO II RELIGIO, EVOLUCIONISMO E CRIACIONISMO...

    50

    2.1. Religio e Cincia....................................................................

    52

    2.2. A Criao a partir da Cosmoviso Catlica.............................

    55

    2.3. O Humano na Criao.............................................................

    57

    2.4. Mitos e Mitologia......................................................................

    58

    2.5. Criao, Criacionistas e Criacionismo.....................................

    62

    2.6. Estruturas Conceituais do Evolucionimso e Criacionismo a

    partir de um Ponto-de-Vista Teolgico Adventista...............................

    67

    2.6.1. Evolucionismo Naturalista..............................................

    67

    2.6.2. Evolucionismo Agnstico................................................

    70

    2.6.3. Evolucionismo Pantesta................................................

    70

  • 10

    2.6.4. Evolucionismo Desta.....................................................

    71

    2.6.5. Evolucionismo Testa..................................................... 72

    2.6.6. Criacionismo Progressivo...............................................

    73

    2.6.7. Criacionismo Bblico.......................................................

    74

    2.7. Informaes da Rede Internet.................................................

    75

    2.8. Vises de Religies Monotestas............................................ 78

    2.8.1. Criacionismo da Terra Jovem.........................................

    79

    2.8.2. Criacionismo da Terra Antiga.........................................

    80

    2.8.3. Criacionismo Religioso...................................................

    80

    2.9. Criacionismo Cientfico............................................................

    84

    2.10. Desgnio Inteligente...............................................................

    85

    2.11. Criacionismo no Brasil...........................................................

    86

    2.12. Breve Panorama do Campo Religioso Brasileiro..................

    89

    2.13. Fundamentalismo, Dogmas e Doutrinas...............................

    93

    CAPTULO III

    EVOLUCIONISMO E CRIACIONISMO NO

    AMBIENTE ESCOLAR DA GRANDE SO PAULO...........................

    95

    3.1. A Pesquisa Proposta...............................................................

    95

    3.2. A Pesquisa de Campo.............................................................

    97

    3.3. Os Sujeitos Pesquisados.........................................................

    97

    3.4. Instrumental.............................................................................

    98

    3.5. Procedimentos.........................................................................

    98

    3.6. Representao das Figuras.................................................... 99

    3.7. As Perguntas Respectivas s Figuras.....................................

    100

    3.8. Tratamento dos Dados............................................................

    101

    3.9. Resultados Obtidos nas Escolas Pesquisadas.......................

    102

    3.10. Dados da Pesquisa de Campo..............................................

    106

    3.11. Comentrios Gerais sobre os Dados Apresentados.............

    139

    CONSIDERAES FINAIS.................................................................

    146

  • 11

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS....................................................

    152

    ANEXOS.............................................................................................. 158

    Anexo 1: Questionrio Aplicado.....................................................

    158

    Anexo 2: Instituies de Ensino e Igrejas.......................................

    162

  • 12

    LISTA DE TABELAS

    Tabela 1: Classificao dos primatas atuais........................................

    36

    Tabela 2: Taxonomia homdea: o lugar dos humanos e dos

    homindeos no mundo biolgico (baseado em Le Gros Clark, 1949;

    Szalay e Delson,1979).........................................................................

    37

    Tabela 3 Populao total e grupos religiosos no Brasil...................... 90

    Tabela 4 Populao total do Estado de So Paulo (2000)................. 90

    Tabela 5 Populao total do Municpio de Guarulhos/SP.................. 90

    Tabela 6 Identificao dos alunos quanto idade das duas escolas

    analisadas............................................................................................

    102

    Tabela 7 Identificao dos alunos quanto ao gnero......................... 102

    Tabela 8 Adeso religiosa................................................................... 103

    Tabela 9 Credo religioso quanto ao gnero........................................ 103

    Tabela 10: Credo religioso dos alunos.................................................

    103

    Tabela 11: Igrejas freqentadas pelos alunos.....................................

    104

    Tabela 12: Credo religioso dos alunos resumido.................................

    105

    Tabela 13: Mapeamento dos dados de caracterizao dos alunos

    pesquisados.........................................................................................

    106

    Tabela 14: Representao das respostas sobre a linha evolutiva do

    homem, partindo de um mesmo ancestral comum..............................

    109

    Tabela 14a: Representao da opinio dos alunos quanto ao credo

    religioso a respeito da linha evolutiva do homem, partindo de um

    mesmo ancestral comum.....................................................................

    110

    Tabela 14b: Opinio dos alunos cristos quanto sua concordncia

    ou no sobre a evoluo humana ter partido de um mesmo

    ancestral comum..................................................................................

    111

    Tabela 15. Representao da ancestralidade comum: prossmios

    (roedores/pr macacos).......................................................................

    112

    Tabela 15a: Aceitao da ancestralidade comum/prossmios entre

    catlicos/evanglicos e sem religio....................................................

    114

    Tabela 16: Aceitao ou no da evoluo com mudanas

  • 13

    adaptativas...........................................................................................

    116

    Tabela 16a: Aceitao ou no da evoluo com mudanas

    adaptativas, com base no credo religioso dos alunos.........................

    117

    Tabela 17: Corresponde opinio sobre a contraposio entre a

    linha evolutiva humana com relao aos relatos bblicos do Gnesis 118

    Tabela 17a: Corresponde opinio sobre a contraposio entre a

    linha evolutiva humana com relao aos relatos bblicos do Gnesis,

    considerando o credo religioso............................................................

    119

    Tabela 18: Reconhecem a ancestralidade homindea como oriunda

    dos smios diretamente ou no............................................................

    124

    Tabela 18a: Reconhecem a ancestralidade homindea como oriunda

    dos smios diretamente ou no, com base no credo religioso.............

    125

    Tabela 19: Representa idias da ancestralidade do homem como

    sendo do macaco com vis cientfico ou criacionista..........................

    127

    Tabela 19a: Representa idias da ancestralidade do homem como

    sendo do macaco com vis cientfico ou criacionista, levando em

    conta o credo religioso.........................................................................

    127

    Tabela 20: A opinio dos alunos quanto contribuio de Darwin no

    sculo XIX............................................................................................

    130

    Tabela 20a: Opinio dos alunos quanto contribuio de Darwin no

    sculo XIX, levando em considerao seus credos religiosos............

    131

    Tabela 21: Origem da Humanidade: a criao ..................................

    133

    Tabela 21a: Origem da Humanidade: a criao , levando em conta

    o credo dos alunos...............................................................................

    133

    Tabela 22: Surgimento da vida no universo h milhares de anos.......

    136

    Tabela 22a: Surgimento da vida no universo h milhares de anos,

    levando em conta o credo dos alunos.................................................

    136

    Tabela 23: Surgimento da vida no universo com interveno de um

    poder sobrenatural...............................................................................

    138

    Tabela 23a: Surgimento da vida no universo com interveno de um

    poder sobrenatural, levando em considerao o credo dos alunos....

    138

  • 14

    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1: Os humanos antes da humanidade......................................

    40

    Figura 2: Evoluo do bicho-homem...................................................

    108

    Figura 3: Representao esquemtica da possvel linha evolutiva

    entre os Australopitecus e o Homo sapiens sapiens...........................

    116

    Figura 4: Linha evolutiva humana como descendente dos smios

    (macacos)............................................................................................

    122

    Figura 5: Ainda sobre a linha evolutiva humana como descendente

    dos smios (macacos)..........................................................................

    123

    Figura 6: Charge de Darwin.................................................................

    129

    Figura 7: Ado e Eva no paraso, o mito de criao do Gnesis.........

    132

    Figura 8: Galxia no universo..............................................................

    135

  • 15

    INTRODUO

    Apresentamos aqui uma temtica que no recente no mundo,

    mas que vem ganhando cada vez mais fora no Brasil, principalmente a

    partir das duas ltimas dcadas: a controvrsia entre Evolucionismo e

    Criacionismo. Tal controvrsia est sendo debatida no meio acadmico e

    religioso. No ir demorar muito para que em breve estas ganhem espao

    em frum pblico, no s no plano Estadual como foi o caso do Rio de

    Janeiro, mas em todo territrio Nacional. Nos Estados Unidos da Amrica j

    existe esse impasse desde os anos 20. De alguma forma essa controvrsia

    passou a ganhar fora ao passo que o campo religioso brasileiro foi se

    configurando na mudana de um pas Cristo Catlico para um pas Cristo

    Protestante (Pentecostal, Neopentecostal e Neocristo2).

    Tal mudana no perfil religioso pode ser comprovada no ltimo

    censo de 2000, e tambm identificada no contingente das escolas pblicas

    onde foi realizada a pesquisa deste trabalho. A mudana social do perfil

    religioso traz em seu bojo variaes epistemolgicas na cosmoviso dos

    jovens, alunos do Ensino Mdio. Ao descrever a referida pesquisa

    esperamos contribuir em alguns aspectos na compreenso da temtica e

    sobretudo, dar visibilidade da questo em mbito escolar, isto , que a

    discusso do evolucionismo e do criacionismo nos traga mais luz sobre

    como anda a opinio de jovens alunos de ensino pblico e como est a

    posio de professores (formadores de opinio) quanto questo ou

    controvrsias entre cincias e religio, ou como queiram outros, entre f e

    evoluo.

    A motivao que nos moveu nesta direo de tentar clarificar o

    motivo de tantas controvrsias entre ambos paradigmas foi a prtica

    2 Segundo JACOB et al (2003), o grupo dos neocristos composto pelas religies Testemunha de Jeov, Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos ltimos Dias (Mrmos), e pela Legio da Boa Vontade/Religio de Deus.

  • 16

    docente. Considerando a experincia docente na disciplina de biologia junto

    aos alunos do Ensino Mdio (3 ano) em escolas pblicas e, no trato de

    assuntos como a origem do homem e do universo, observava entre os

    alunos basicamente duas reaes: uma primeira, os alunos reagiam

    normalmente s discusses da temtica, refletindo a respeito de suas

    experincias e aprimorando seus conhecimentos; uma segunda, os alunos

    reagiam de forma extremamente actica, tensa e conflituosa abordagem

    cientfica e/ou evolucionista da origem do homem.

    Como professora, pensava o que levaria esses alunos a reagirem

    de forma to diversa e antagnica. Seria a forma de abordar o assunto em

    sala de aula? Seriam suas pr-conceituaes a respeito do tema que

    poderiam estar em conflito com a abordagem apresentada? Seria a forma de

    encarar essa outra possibilidade de concepo que estaria causando

    tamanho desconforto nestes? No tinha as respostas. Durante alguns anos

    convivi com essas dvidas sem conseguir respostas satisfatrias. Estas

    interrogaes me perseguiram e impulsionaram-me a estud-las

    empiricamente.

    Por certo, sabia que no eram questes muito simples, pois,

    envolviam no mbito pedaggico, tenses e intenes entre as abordagens

    cientfica, por um lado, e religiosa, por outro, no estudo da origem do

    homem, da vida e do universo. Entendi que, para elucidar melhor a questo

    teria que enfrentar desafios quanto compreenso do prprio contexto

    macro-social e religioso que envolvia os alunos e as caractersticas

    peculiares da escola e da comunidade a que estavam inseridos; bem como,

    as inter-relaes destes elementos com outros .ampos do saber.

    Basicamente, o que nos interessa investigar como a escola

    pblica age e reage diante de questes e interrogaes de alunos com

    determinada orientao religiosa que privilegia a abordagem bblica da

    origem do homem e do universo e que se sentem agredidos no mbito da

  • 17

    sala de aula, com respeito a seu direito de crer e pensar sobre a criao do

    homem como uma questo de ordem religiosa.

    Em outras palavras, o que nos interessa saber, como alunos

    concluintes do Ensino Mdio, lidam com a abordagem cientfica da origem

    do homem, (que se contrape orientao religiosa sobre o mesmo

    assunto: o mito da criao) e secundariamente, como a escola no papel de

    mediadora desse conhecimento formal, bem como a figura do professor de

    biologia como mediador do conhecimento por parte destes alunos, vem

    administrando conflitos (que no so poucos) e tenses emergentes quando

    da abordagem dessa temtica em sala de aula.

    Dessa forma, entendemos que preciso saber lidar com questo

    to relevante quanto complexa para melhor desempenho do corpo docente

    em vista de garantir uma educao de melhor qualidade na escola pblica,

    bem como, otimizar melhorias na compreenso e apreenso da construo

    social da realidade e do conhecimento por parte dos alunos, contribuindo

    simultaneamente para a formao, desenvolvimento e consolidao de uma

    atitude de respeito mtuo entre alunos de orientao religiosa crist catlica

    e protestante (orientaes que enfatizam a interpretao bblica da criao)

    e a escola pblica (orientao laica que enfatiza uma imagem cientfica da

    origem da vida).

    Para lidar com esse aspecto, optamos, discorrer em nosso

    trabalho por um vis interdisciplinar para nos ajudar na compreenso,

    elucidao e clarificao dessas questes.

    Neste sentido, entendemos que, dentro do universo escolar, pois

    no espao de educao formal o lugar que o fenmeno da interao social

    e intelectual acontece, onde h necessidade de proporcionar varias

    possibilidades (idias) para a construo do intelecto do aluno e do ser que

    est por detrs do mesmo.

  • 18

    Primeiramente, a biologia fornece um vis para entendermos a

    relao do aluno como sujeito ativo biolgico-corpo que interage com a

    biologia na dimenso da macro-viso da evoluo das espcies do tempo e

    espao correspondente nos acontecimentos temporais da evoluo do

    homem. Em segundo lugar, no campo filosfico o vis para a compreenso

    do aluno como sujeito ativo do universo pensante-mente humana-e sua

    interao-pensamento-religio e religiosidade. Em terceiro, a pedagogia o

    hmus como mediador na discusso ou para dialogar essas questes na

    construo do ser humano-corpo biolgico-mente filosfico. Por ltimo, a

    religio vem neste mesmo contexto ser uma possibilidade de interao do

    ser humano (aluno) como meio de interlocuo e alteridade entre o homem

    (aluno) com o prprio homem (professor/outro) e perceber a sua evoluo

    histrica (biolgica) e social (idias) enquanto um todo - a condio humana.

    A religio nunca estar longe do homem, mas sempre interagindo

    com ele na sua construo do social. Nesse sentido, entendemos que a

    religio crist, a qual a esteira de nosso objeto de estudo, fornece uma

    gama de fatores primordiais na construo social e do carter do indivduo

    (aluno), como a moral, os valores e as virtudes, fazendo parte deste ser

    humano (aluno) que compe as salas de aulas das escolas pblicas de todo

    pas.

    Neste momento atual, as tenses entre as idias (pensamentos)

    sobre evolucionismo e criacionismo esto se processando. Na verdade a

    pergunta : O que esta por detrs destas idias? Para ns, o que realmente

    est em jogo so as perguntas: De onde viemos? Para onde vamos? Quem

    somos? A religio e as cincias esto h mais de dois sculos tentando

    responder essas perguntas, mascaradas entre a criao divina e a evoluo

    dos seres. Para sabermos realmente o que est por detrs de tais idias

    faremos uma retrospectiva do homem em seus aspectos evolutivo

    (biolgico) e histrico-filosfico formando uma ponte na construo do que

    hoje conhecemos como Homo sapiens.

  • 19

    No primeiro captulo apresentamos a contribuio cientfica que

    Darwin deu com suas pesquisas, em especial a Teoria das Origens das

    Espcies publicada em 1859, e as controvrsias que sugiram aps sua

    publicao e a partir desta publicao dando incio uma srie de

    controvrsias que se alargaram nestes ltimos 150 anos ao que se refere

    origem do homem. O conceito de evoluo em seu sentido amplo e a

    proposta curricular de biologia (PCNs). No segundo captulo abordamos a

    cosmo-viso criacionista dos cristos Catlicos e Evanglicos (protestantes

    histricos, pentecostais e neocristos) que se destacam na pesquisa. E bem

    como, o processo histrico de construo desse pensamento. No terceiro

    captulo apresentamos o percurso metodolgico da pesquisa, os dados

    obtidos e o tratamento de dados, e finalmente, nossas consideraes finais.

  • 20

    CAPTULO I DARWIN, DARWINISMOS E A EVOLUO

    Ao abrir este captulo citamos alguns recortes da autobiografia de

    Darwin. Trata-se de uma traduo de trechos do documento redigido por

    este em 1876 e publicado pelo seu filho Sir Francis Darwin. O objetivo desse

    recorte fazer uma breve retrospectiva histrica dos passos que Darwin

    percorreu na elaborao das Origens das Espcies descrita por ele mesmo.

    Disseram-me algumas vezes que o sucesso do Origin

    mostrou que o assunto estava no ar ou que os espritos

    estavam preparados para ele . No penso que isto seja

    estritamente verdadeiro, pois ocasionalmente sondei no

    poucos naturalistas e nunca me aconteceu descobrir um

    nico que parecesse duvidar da permanncia das espcies.

    Mesmo Lyell e Hooker, que me ouviam com muito interesse,

    nunca pareciam concordar comigo. Tentei uma ou duas

    vezes explicar a pessoas competentes o que eu queria dizer

    com Seleo Natural, mas evidentemente fracassei. O que

    creio ser absolutamente verdadeiro que inmeros fatos

    bem observados estavam armazenados no esprito dos

    naturalistas, prontos a tomarem seu lugar certo logo que

    alguma teoria que os acolhesse fosse competentemente

    exposta. Outro elemento de sucesso do livro foi o seu

    tamanho moderado; devo isto ao aparecimento do ensaio do

    Sr. Wallace. Se o tivesse publicado na escala em que

    comecei a escrev-lo em 1856, o livro teria sido quatro a

    cinco vezes maior do que o Origin, e poucos teriam a

    pacincia de l-lo. (...) Fui, quase sempre, tratado

    honestamente pelos meus crticos, deixando de lado os

    destitudos de conhecimento cientfico e que, por isto no

    merecem referncia. Meus pontos de vista foram, em geral,

    grosseiramente deturpados, amargamente combatidos e

    ridicularizados, mas creio que tudo isto foi feito em boa f.

    No todo, no duvido de que meus trabalhos foram, acima de

  • 21

    tudo, louvados com exagero. O meu Descent of Man foi

    publicado em fevereiro de 1871. Logo que me convenci, em

    1837 ou 1838, de que as espcies eram produes

    mutveis, no poderia evitar a convico de que o Homem

    deve estar sob a mesma lei. A redao do Descent of Man

    tomou-se trs anos, mas, na poca, como de costume,

    algum desse tempo era perdido devido minha m sade

    (apud FREIRE-MAIA, 1988, p. 32).

    Darwin, um ilustre naturalista, deixou para seus sucessores seu

    legado, A Origem das Espcies, que contribuiu para que no meio cientfico

    se desvendassem uma das importantes questes da poca, a origem da

    vida, contendo os intrigantes dados levantados e coletados por Darwin em

    suas viagens no HMS Beagle (1832 a 1835) ao redor da costa da Amrica

    do Sul a servio do imprio britnico. A partir dessa viagem ele pode

    observar caractersticas de relevos, aves, florestas, povos e muito mais que

    encontrava pelo caminho, somando elementos para que pudesse elaborar

    sua teoria. Esses dados serviram de anlise para compor os fatos sobre as

    idias da descendncia comum entre os organismos vivos, juntamente com

    os pensamentos de outros pesquisadores.

    Darwin se encontrava no sculo XIX, poca onde o Iluminismo

    teve um campo frtil na Inglaterra. Com a idia de progresso, os filsofos e

    naturalistas desse sculo acreditavam que a razo seria a explicao para

    todas as coisas no universo, e essa idia se contrapunha a crenas

    religiosas, como a f crist (base comum de todo pensamento da poca). De

    acordo com esses pensadores, as pessoas deveriam pensar por si prprias,

    e no se deixar levar por outras ideologias que, apesar de no concordarem,

    eram forados a seguir. O Iluminismo trouxe consigo grandes avanos que,

    juntamente com a Revoluo Industrial, abriram espao para a profunda

    mudana poltica instaurada pela Revoluo Francesa.

  • 22

    Darwin vivia nessa poca de fomento de novas idias, e sua

    orientao religiosa junto com sua cosmo-viso estava pautada por vrias

    influncias. De um lado, as idias da maonaria recebida na casa paterna,

    de outro lado, o testemunho cristo que conhecido por ele atravs das duas

    irms e da sua esposa. O background religioso, social e poltico da

    Inglaterra, influenciaram os pensamentos de Darwin. Cuidadosamente

    Darwin sabia o que poderia acontecer com a publicao de sua teoria. O que

    ele apresentaria ao mundo cientfico e na sociedade poderia provocar um

    dilema em todas as classes sociais, por isso, demorou tanto para publicar

    sua teoria na Origem das Espcies (DESMOND e MOORE, 2001). Todo

    cuidado era pouco com sua publicao, mesmo vislumbrando um

    pensamento mais transformista e j considerando que o organismo vivo

    poderia ser mutvel.

    As idias evolucionistas (transformistas) j pairavam no

    imaginrio cientfico permeado pelo esprito da poca, e no pensamento de

    outros pesquisadores. Antes de Darwin, muitos pensadores j entretinham

    idias sobre a transformao dos organismos vivos, ou seja, no foi s

    Darwin que pensou sobre o assunto, houve vrios antecedentes a ele. Ele

    se destacou na histria devido o momento ser propcio, por muitos

    elementos favorveis para a validao e para a concluso de seus

    pensamentos, sobretudo, a sistematizao dos dados coletados nas

    viagens. Mesmo os ventos soprando em seu favor, suas idias geraram

    enormes controvrsias no ambiente religioso. Darwin foi alvo de muitos

    ataques ao longo dos anos. Charges comparando-o a um macaco eram

    publicadas em jornais como forma de zombar da teoria, segundo a qual

    ramos parentes dos primatas (Figura 6, Captulo III, p. 130). No foi s

    Darwin que pensou numa possvel mutabilidade dos organismos vivos,

    outros os fizeram, pensadores antes de Darwin e ps Darwin contriburam

    para que fossem possveis os desenvolvimentos histricos da Teoria da

    Evoluo. Vejamos alguns deles.

  • 23

    1.1. Pensadores Pr-Darwinistas e Suas Contribuies

    Jan Swammerdam (1637-1680), naturalista holands e

    microscopista, abandonou a medicina para investigar insetos e a anatomia

    de pequenos animais. Usando novas tcnicas de laboratrio, melhorou o

    conhecimento sobre o sistema circulatrio no homem e se tornou o primeiro

    a descrever os corpsculos vermelhos em 1658. Estudou os batimentos

    cardacos, o movimento dos pulmes e dos msculos. Sua obra foi

    publicada aps sua morte sob o ttulo A Bblia da Natureza . Durante sua

    vida descreveu e classificou centenas de espcies de insetos, aracndeos,

    peixes e vermes. Seu livro Algemeene Verhandeling van bloedeloose

    diertjens, uma histria natural dos insetos publicado em 1669, foi o primeiro

    trabalho importante de entomologia. Tambm estudou embriologia e

    acreditava na teoria do homnculo, ou da existncia de um homem

    microscpico em pr-formao no esperma humano. Sua contribuio foi

    sobre a refutao da amorfia dos insetos e sua evoluo por metamorfose

    (DI MARE, 2002, p. 84).

    Pierre-Loius Moreau de Maupertuis (1698-1759), matemtico e

    cientista francs sugeriu em sua obra Vnus Physique que todos os

    organismos poderiam ter tido um ancestral comum e divergido atravs de

    variao aleatria e seleo natural. A Vnus Physique contm uma critica

    s principais teorias embriolgicas que se propem a resolver os problemas

    relacionados gerao de animais e do homem. Estes dois elementos

    aparecem igualmente nas duas partes em que a obra se divide, sendo a

    primeira, dedicada aos problemas gerais da gerao dos animais e a

    segunda questo particular das raas humanas. tambm nesta segunda

    parte que aparecem importantes idias sobre a transformao das espcies

    (RAMOS, 2005, p. 79-101).

  • 24

    George-Louis Leclerc Buffon, Conde de Buffon (1707-1788), filho

    de um conselheiro do Parlamento de Borgonha, cientista ilustre, e sua

    carreira foi um extraordinrio sucesso social. Na Academia Francesa desde

    1753, Buffon foi elevado nobreza por Luis XV em 1773. A obra de sua vida

    realizada com uma equipe de colaboradores sua Histria Natural em 15

    volumes com os ttulos: Terra, Homem, Quadrpedes, Pssaros e Minerais,

    publicados entre 1749 e 1789. As pocas da Natureza

    de 1779. Buffon

    submeteu-se censura pronunciada contra o primeiro volume da Histria

    Natural em 1749 e esforou-se em seguida em no ferir de frente as

    doutrinas crists (DI MARE, 2002, p. 91-92).

    Jean-Baptiste Pierre Antoine de Monet, Chevalier de Lamarck,

    (1744-1829), naturalista francs do sculo XIX, ele foi quem, de fato,

    introduziu o termo biologia, pois foi o primeiro a utilizar o termo para designar

    o conjunto de disciplina dedicado ao estudo dos organismos vivos que

    desenvolveu a teoria dos caracteres adquirida, uma teoria transformista. Os

    pilares de sua obra foram constitudos pelas obras de Maupertius

    (Philosophie zoologique 1809) e Buffon. Pertenceu ao exrcito francs,

    interessou-se por histria natural e escreveu uma obra de vrios volumes

    sobre a flora da Frana. Isto chamou a ateno do Conde de Buffon que o

    indicou para o Museu de Histria Natural da Frana. Depois de ter

    trabalhado durante vrios anos com plantas, Lamarck foi nomeado curador

    dos invertebrados. Antes de iniciar seus estudos com vertebrados em 1800,

    era um essencialista que acreditava que as espcies eram imutveis. Mas

    depois, graas ao seu trabalho sobre os moluscos da Bacia de Paris, ficou

    convencido da transmutao das espcies ao longo do tempo passando a

    desenvolver a sua teoria sobre a transformao dos organismos vivos

    (apresentada ao pblico em 1809 na sua Philosophie Zoologique), a fim de

    explicar a teoria criada por ele, conhecida como Lei do Uso e Desuso (Ibid.,

    p. 100-102).

  • 25

    Lamarck achava que as mudanas no ambiente faziam os

    animais e plantas adquirirem novos hbitos, e que esses novos hbitos

    tinham a capacidade de criar mudanas no organismo destes. Isto , ele

    acreditava que, h muito tempo, as girafas tinham o pescoo curto. S que,

    como elas habitavam em um lugar que tinha poucas plantas no cho,

    comearam a esticar o pescoo para comer as folhas mais altas. Com esse

    "esticamento", as girafas foram ficando com pescoos mais longos, ou seja,

    como elas precisavam usar mais o pescoo, essa parte do corpo passou a

    desenvolver-se (Ibid.).

    George Cuvier (1769-1832), naturalista francs, impressionou o

    mundo com sua teoria das catstrofes , que periodicamente abalam o

    mundo, o sistema terrestre. So elas que, segundo o estudioso, explicam as

    grandes transformaes geolgicas e os avanos da vida. Ele acreditava

    que aps cada catstrofe, Deus aperfeioaria as espcies de vida

    precedentes, que foram abaladas ou destrudas. Assim, aps a penltima

    catstrofe, teria aparecido o homem, sendo a ltima delas o dilvio,

    responsvel pelo aperfeioamento das culturas primitivas e pela inaugurao

    das civilizaes humanas (Ibid., p. 102-106).

    Charles Lyell (1797-1875), gelogo escocs, foi responsvel pela

    subdiviso das pocas do Perodo Tercirio (1833). Considerado um dos

    fundadores da estratigrafia, sua obra influenciou a geologia moderna. Com

    base em sistemticos trabalhos de campo definiu a Teoria do

    Uniformitarismo, ao afirmar que os processos naturais que ocorrem no

    presente ocorreram tambm no passado, de forma semelhante. Essa teoria

    contrariou a Teoria Catastrofista de Cuvier, bastante popular entre os

    cientistas da poca, publicada em Principles of Geology, revisado e

    reeditado 11 vezes entre 1830 e 1872. Lyell conquistou grande respeito com

    seus trabalhos. Foi nomeado Sir em 1848 e Baro em 1864 (Ibid., p. 108-

    111).

  • 26

    1.2. Pensadores Ps-Darwinistas e suas Contribuies

    Thomas Henry Huxley (1825-1895) foi bilogo britnico que ficou

    conhecido como O Buldogue de Darwin por ser o principal defensor pblico

    da Teoria da Evoluo de Charles Darwin. Confidente de Darwin foi um dos

    principais responsveis pelo sucesso da sua publicao das Origens das

    Espcies. Logo aps conhecer (mas mantendo-se critico) a Seleo Natural,

    usou sua influncia na Linnean Society a fim de divulgar os escritos de

    Darwin. Em 1858, quando Darwin foi orientado (em parte por Huxley) a

    elaborar rapidamente um artigo cientfico sobre a Teoria da Evoluo e

    apresent-la em conjunto com o artigo semelhante de Alfred Russel Wallace

    Linnean Society em Londres, a comunidade cientfica j era muito diferente

    e permevel mudana. De fato, apesar da resistncia esperada, a

    mudana de paradigma causada pela teoria da Evoluo coincidiu com uma

    ampla mudana na cincia inglesa. Huxley acreditava em uma evoluo por

    saltos bruscos. Em sua obra Homem na Natureza, publicada em 1863

    demonstrou as relaes morfolgicas e anatmicas entre o homem e os

    macacos antropides (DI MARE, 2002, p. 111-112).

    Herbert Spencer (1820-1903), filsofo ingls, foi um dos

    representantes do positivismo e profundo admirador da obra de Darwin.

    dele a expresso "sobrevivncia do mais apto". Em sua obra procurou

    aplicar as leis da evoluo a todos os nveis da atividade humana. Foi

    considerado o pai do Darwinismo social, embora jamais tenha utilizado o

    termo. Com base em suas idias, alguns autores procuraram justificar a

    diviso da sociedade em classes e o imperialismo europeu, sugerindo que

    estes seriam exemplos de seleo natural. Spencer integrou nos princpios

    de sociologia e tica que promove um entendimento confuso entre

    darwinismo e seleo social assimilando a sociedade como um

    superorganismo, aplicando a seleo natural (Ibid., p. 118-120).

  • 27

    Pierre Teilhard de Chardin (1881-1955), padre-jesuta, telogo,

    filsofo e paleontlogo francs, como escritor elaborou a obra-prima O

    Fenmeno Humano, alm de centenas de outros escritos sobre a condio

    humana. Como paleontlogo, esteve presente na descoberta do homem de

    Pequim. Segundo Di Mare (2002), Teilhard em sua obra procurou

    demonstrar que o nosso Universo, no apenas est em evoluo, mas

    uma evoluo (Ibid., p. 120-124).

    Gregrio Mendel (1822-1884), monge agostiniano, pesquisou

    sobre a transmisso de caracteres em ervilhas e estabeleceu as bases para

    o desenvolvimento da gentica. Cruzou uma ervilha de flor vermelha e casca

    lisa com uma ervilha de flor branca e casca rugosa. Tal experincia resultou

    em ervilhas de flor vermelha e casca lisa e ervilhas de flor branca e casca

    rugosa. Com isso Mendel conseguiu comprovar que as caractersticas de um

    organismo poderiam ser transmitidas de uma gerao a outra a partir de um

    segmento, ou seja, um nico gene (SYSBIBLI, 1975, p. 89-120).

    1.3. Pensadores Neodarwinistas e Suas Contribuies

    Thomas Hunt Morgan (1866-1945) trabalhou em Histria Natural,

    Zoologia, e macro-mutaes da Drosophila. Baseou seus trabalhos na

    evoluo experimental em um esforo para distinguir entre teorias

    evolucionistas darwinistas, neolamarckistas atravs de cruzamentos

    experimentais e anlise mendeliana, e tornou-se um dos principais modelos

    na rea da gentica com animais. Suas contribuies mais importantes se

    deram no campo da gentica. Graas a isso, foi premiado com o Nobel da

    Medicina (1933), pelo fato de haver provado que os cromossomos so

    portadores de genes. Contriburam tambm Alfred Henry Sturtevant (1891-

    1970) trabalhando com pedigree de cavalos e Ernst Mayr (1904-2005)

    bilogo de origem alem que dedicou grande parte da sua carreira ao estudo

    da evoluo, gentica de populaes e taxonomia. Descendente de diversas

    geraes de mdicos, abriu mo da carreira, voltando-se para o estudo da

  • 28

    Zoologia. Durante os anos 30 tomou parte numa expedio Nova Guin e

    s Ilhas Salomo, onde estudou a fauna, especialmente a ornitolgica.

    Dedicou-se a aprofundar a teoria de Darwin, elucidando o percurso do

    darwinismo nas cincias modernas. Contribuiu ao vislumbrar na teoria

    darwiniana a possibilidade de cinco teorias em uma s: evoluo como tal,

    ascendente comum, gradualismo, multiplicao das espcies e seleo

    natural (MAYR, 2006).

    Assim sendo, apresentamos at aqui, pensadores que marcaram

    poca nas cincias e na biologia. Foram marcos de referenciais na

    elucidao de fatos que contriburam na construo e interpretao da

    Teoria da Evoluo. Entretanto, sabemos que no foram mencionados

    outros importantes nomes de ilustre pensadores como Carl von Linn (1707-

    1778), Louis Pasteur (1821-1892), Ernst Heinrich Haeckel (1834-1919), entre

    outros. Mas neste momento queremos evidenciar que a Teoria da Evoluo

    teve um processo histrico longo e controvertido para se chegar nas

    proposies atuais. medida que o tempo foi passando, a complexidade da

    origem do homem ganhou destaque na cincia moderna.

    1.4. O Darwinismo

    Uma das personalidades mais comentadas nos anos de 1860 foi

    Darwin sob a tica Huxleyana. Huxley criou uma frase que ficou marcada na

    histria como referncia para indicar princpios e idias embasados nos

    postulados darwinianos, chamando-o de darwinismo. Em 1864 Huxley (e

    mais tarde o senhor Wallace), publicou um volume inteiro intitulado

    Darwinismo (MAYR, 2006).

    A palavra darwinismo tem significados diferentes entre fatores

    ideolgicos e na compreenso de outros pases e nas diferentes pocas.

    Quem pode clarificar quanto questo sobre o darwinismo o prprio

    Darwin, quando postulou sua prpria teoria como monoltica a teoria da

  • 29

    descendncia com modificao pela seleo natural , como se a teoria da

    origem comum fosse inseparvel da teoria da seleo natural (MAYR, 2006).

    Entretanto, segundo o mesmo, esta teoria foi sendo estudada com o passar

    do tempo por diversos pesquisadores evolucionistas e se chegou a uma

    concluso: a Teoria da Evoluo de Darwin poderia ser estudada a partir de

    cinco teorias: a evoluo propriamente dita; descendncia comum;

    gradualismo versus saltacionismo; multiplicao das espcies e a seleo

    natural. Alm disso, o darwinismo se consolidou em 1940 com o impacto da

    revoluo molecular, ou seja, biologia molecular, sempre estando firmada

    em seu conceito original a variao das espcies e a descendncia comum

    (MAYR, 2006).

    Ante o exposto, precisamos considerar alguns conceitos para

    elucidao da trajetria evolutiva dos seres vivos e do homem. Entendemos

    que se faz necessrio apresentar conceitos explicativos a respeito da teoria

    da evoluo. Contaremos para essa apresentao com Freire-Maia (1988),

    Futuyma (2002) e Foley (2003).

    1.5. Evoluo e Conceitos

    A palavra, ou termo evoluo tem diversas formas de designao:

    srie de modificaes graduais e contnuas susceptveis de reger o mundo

    fsico (e cosmolgico), o dos vivos, ou, ainda, a sociedade. Outra delas

    segundo Freire-Maia (1988), significa qualquer mudana ocorrida na

    constituio gentica das unidades taxonmicas dos animais e das plantas,

    na formao de novas variedades ou subespcie, por exemplo, de evoluo.

    Outras definies sugeridas, a exemplo de Teilhard de Chardin, consistem

    na evoluo como algo que transborda os limites da biologia e envolve todo

    o desenvolver do universo, da matria primeira ao reino de Deus. Para

    Branco (2004), a palavra evoluo tem origem latina, evoluir significa

    literalmente desenrolar passar progressivamente de um estado para outro.

  • 30

    De acordo com Freire-Maia (1988), na evoluo, a tendncia de

    produzir formas primitivas (organismos vivos) acaba por originar outras

    formas futuras. Dentro de um ponto de vista gradualista, ou seja, a vida

    partindo de um microorganismo simples para um organismo mais complexo,

    lembra a seleo natural de Darwin. Nesse contexto, todo processo evolutivo

    representa um processo complexo.

    As mudanas culturais e tecnolgicas partem de um princpio

    evolutivo, lembrando as idias gradualistas. A teoria da evoluo como uma

    boa teoria, apresenta alguns princpios metodolgicos ou mtodos empricos

    para sua compreenso.

    Sendo assim, as definies apresentadas foram retiradas de

    Freire-Maia (1988, p. 93), que nos forneceu dados para melhor

    identificarmos pontos cruciais na evoluo da biologia, dividindo as etapas

    evolutivas de formas vivas em diversos nveis como, por exemplo:

    (1) Micro-evoluo: variao, ou freqncia de uma ou poucas variantes

    genticas (mutaes).

    (2) Meso-evoluo: origem das raas geogrficas pela variao das

    freqncias de um nmero aprecivel de mutaes, isto , criao de

    comunidade gentica adaptada e integrada.

    (3) Macro-evoluo: origem das espcies e sua conseqente diversificao

    em categorias sistemticas situadas pouco acima delas (subgnero,

    gneros, subfamlias, famlias, tribo, etc.).

    (4) Mega-evoluo: origem das mais altas categorias sistemticas (reinos,

    filo, subfilos, superclasses, classes, etc.).

  • 31

    Mediante tais fatos, a Evoluo opera de duas formas: primeiro,

    por diversificao ou ramificaes de populaes diferentes em que cada

    qual passa a seguir caminho diferente; e segundo, pela diferena ao longo

    de tempo, de uma mesma populao podendo diversificar-se a si mesma.

    1.6. Quanto Velocidade em que Ocorre a Evoluo

    A evoluo um processo que envolve mudana no tempo,

    podendo ser medida pela velocidade atravs dos anos, com base nos

    fsseis disponveis. Essas velocidades so classificadas em rpidas, lentas

    e moderadas.

    Evoluo lenta (bradeditelia) atravessa dezenas ou centenas de

    milhes de anos sem mudana morfolgica aparente, exemplos dessa

    evoluo lenta so as ostras, os gambs, as liblulas, as lampreias, o

    celacanto, as baratas, etc., chamados de fsseis vivos . A evoluo normal

    surgiu com uma grande exploso de vrias espcies de animais no

    Jurssico, h cerca de 170 milhes de anos, nesse perodo a transio de

    rptil-mamfero deve ter ocorrido alguns milhes de anos antes, a partir dos

    rpteis terapsidos do trissico. Os animais que participaram dessa evoluo

    foram os cavalos e elefantes apesar de apresentarem uma evoluo normal,

    se comparamos os fsseis vivos acima mencionados, ento essa evoluo

    pode ser considerada bem rpida (taquitelia). Segundo Freire-Maia (1988),

    as exploses evolutivas se concentram nesses grandes grupos sistemticos,

    que se deram to depressa que no deixaram suficiente documentao

    (registros fsseis).

    (...) O primeiro peixe j era peixe, a primeira ave j era ave,

    o primeiro mamfero j era mamfero. claro que h formas

    intermedirias, mas elas no se encontram nem no incio e

    nem no meio do prprio meio; elas se acham j no fim do

    meio. Assim que os intermedirios entre os rpteis e as

  • 32

    aves apresentam traos reptilianos, mas j so aves (isto

    esto mais prximos das aves do que dos rpteis). Os

    mamferos derivaram, provavelmente, de um grupo bem

    especfico de rpteis, mas suas primeiras formas, se bem

    que apresentando traos reptilianos, esto mais prximas

    dos mamferos do que dos rpteis. Mas no s preciso ir

    to alto: os primeiros morcegos cujos fsseis possumos j

    tinham asas membranosas e voavam (FREIRE-MAIA, 1988,

    p. 97).

    Podemos catalogar a evoluo em trs nveis como j vimos,

    lenta, normal e rpida, entretanto, esses nveis de evoluo so

    determinados na base dos fsseis disponveis. Como em geral esses fsseis

    so fragmentos de apenas partes dos organismos ento a evoluo se torna

    difcil de ser investigada e sistematizada principalmente quanto aos fsseis

    de elos de ligao e os problemas na verificao dos fsseis quanto ao

    critrio e a determinao das categorias, o que dificulta a comparao das

    mesmas. A velocidade da evoluo nos ajuda a compreender quanto ao

    processo evolutivo das espcies e os desafios que esto por vir.

    Essas definies apresentam as seguintes caractersticas: a

    evoluo abrange sucessivas dimenses para se consolidar; necessita de

    espao (geogrfico), tempo, adaptaes e mutaes. Contudo, no s

    dessa forma que se baseia a evoluo, mas envolve uma gama de

    complexidade que promove essas mudanas nas geraes futuras.

    1.7. Seleo Natural

    A seleo natural consiste num mecanismo gerador de um alto

    grau de improbabilidade, principalmente quando depende da adaptividade.

    Explica que a Seleo Natural atuao de viabilidades e fertilidades

    diferenciais por motivos genticos (FREIRE-MAIA, 1988). O mesmo cita

  • 33

    alguns autores a fim de elucidar a seleo natural, como por exemplo,

    Dobzhansky, para quem: a essncia da seleo natural a reproduo

    diferencial dos portadores de diferentes dotaes hereditrias . Depois, cita

    Ayala, para quem: a seleo natural simplesmente o processo de

    reproduo diferencial de variantes genticas alternativas ou uma distoro

    estatstica da eficincia reprodutiva a favor das variantes genticas, mais

    adaptativas . Outro mencionado Julian Huxley que diz: a teoria da seleo

    natural baseia-se em trs fatos e duas dedues, primeiro nas tendncias

    gerais dos seres vivos em aumentar em nmero; segundo, apesar dessa

    tendncia, o seu nmero mantm-se mais ou menos constante . De acordo

    com os princpios darwinianos, sob a tica Huxleyana, Freire-Maia (1988, p.

    108), apresenta seis itens importantes ao entendimento da seleo natural, a

    saber:

    (1) O nmero de indivduos em qualquer populao tende a aumentar

    geometricamente quando as condies permitem a sobrevivncia de toda a

    prognie.

    (2) O potencial para rpido aumento raramente se cumpre.

    (3) Darwin deduziu destes fatos que ocorre uma competio ou luta pela

    sobrevivncia na qual muitos indivduos so eliminados.

    (4) Variao na forma de diferenas individuais existe em cada espcie ou

    populao.

    (5) Pelas diferenas observadas entre indivduos e entre variedades, Darwin

    deduziu que o processo de eliminao era seletivo.

    (6) Evoluo uma mudana gradual na composio hereditria da espcie.

  • 34

    Esses pontos que levantamos aqui so relevantes para perceber

    o processo evolutivo dos seres vivos e do homem em geral e os critrios

    metodolgicos oriundos das pesquisas de Darwin que nos auxiliaram at

    agora. A histria evolutiva do homem composta de mudanas e

    adaptaes comportamentais e anatmicas. Os padres de alterao

    ambiental e do desenvolvimento comportamental so, portanto, partes da

    histria da evoluo da nossa espcie. O primeiro est gravado no registro

    geolgico e paleontolgico, o segundo nos restos materiais que constituem a

    base da arqueologia. Os humanos se tornaram o que so atravs de uma

    aprendizagem intensa das habilidades de sobrevivncia e costumes sociais

    que os diferenciam em grande parte dos outros animais.

    A evoluo da espcie humana apenas mais uma dentre as

    milhes de espcies que evoluram com o passar do tempo, e tem habitado

    este planeta. Para tentar compreender a evoluo do bicho homem e dos

    homindeos como um todo necessrio consider-la sob o ponto de vista da

    evoluo da vida em geral (FOLEY, 1993, p. 29-31).

    Os caminhos percorridos pelo homem moderno, assim como suas

    origens, so pontos primordiais de muitas pesquisas no mundo todo. Os

    achados em arqueologia e paleontologia traam as possveis migraes

    populacionais que ocorreram ao longo da histria. Na busca das nossas

    origens precisamos estar atentos ancestralidade e ao processo evolutivo

    humano, que se fazem necessrios para melhor entendermos os aspectos

    biolgicos dos nossos antepassados. O foco at aqui foi descrio do

    processo de formao e consolidao da Teoria da Evoluo e seu percurso

    nestes ltimos 150 anos quanto origem do homem, sobretudo e

    fundamentalmente, a partir dos escritos darwinianos, refazendo a trajetria

    da espcie.

  • 35

    1.8. A Trajetria dos Antepassados Humanos

    Ao tratar da questo de nossos antepassados, Darwin em A

    descendncia do homem, publicado em fevereiro de 1871, exps o seguinte:

    logo que me convenci, em 1837 ou 1838, de que as espcies eram

    produes mutveis, no poderia evitar a convico de que o Homem deve

    estar sob a mesma lei . (apud Freire Maia, 1988, p. 33).

    Segundo Freire-Maia (1988), a origem e evoluo do Homem so

    terrenos movedios incertos, todo cuidado pouco. Nesse sentido, os dados

    muitas vezes so escassos e pouco seguros. Mas nas ltimas dcadas

    aumentou a descoberta de stios arqueolgicos e paleontolgicos, onde o

    nmero de fsseis de homindeos cresceu significativamente.

    Por isso, concordamos com a idia de Montanari (1995), e nos

    propomos a, fazer uma aproximao terica com os escritos de Freire-Maia

    (1988), Futuyma (2002) e Foley (2003), quanto representao

    esquemtica da possvel linha evolutiva dos Austrolopitecus ao Homo

    sapiens. Para situar o leitor sobre a ancestralidade humana, assim esta ser

    mais bem elucidada conforme o que est na Figura 2 do questionrio

    aplicado na pesquisa, lembrando que as informaes sobre os respectivos

    homindeos e dos macacos do Velho Mundo constituem uma sntese retirada

    dos trs autores acima mencionados.

    A ancestralidade dos primatas percorre um longo caminho

    distinto, e para melhor elucid-la, observaremos a Tabela 1 a seguir.

    Segundo Futuyma (2002), a classificao dos primatas atuais :

  • 36

    Tabela 1: Classificao dos primatas atuais

    Ordem Primata

    Subordem Prosimii

    Infra-ordem Lemuriformes

    Famlia Lemuridae, indriidae, Daubentoniidae (lmures, indrie e

    daubentonia)

    Infra-ordem Lorisiformes

    Famlia Lorisidae (prossmios africanos do Sri-Lanka e Java)

    Famlia Tarsiidae (trsio)

    Subordem Anthropoidea

    Infra-ordem Platyrrhini

    Superfamlia Ceboidea

    Famlia Callitrichidae, Cebidae (sagis, micos e outros macacos do Novo

    Mundo)

    Infra-ordem Catarrhini

    Superfamlia Cereopithecoidea

    Famlia Cercopithecidade (macaco do Velho Mundo)

    Supre famlia Hominoidea

    Famlia Hylobatidae (gibes, gibo gigante de Sumatra, siamang )

    Famlia Pongidae (gnero Pongo, orangotango; Pan, Chimpanz: Gorilla,

    gorila)

    Famlia Hominidae (Gnero Homo)

    Fonte: FUTUYMA, 2002, p. 533.

  • 37

    Tabela 2: Taxonomia homdea: o lugar dos humanos e dos homindeos no

    mundo biolgico (baseado em Le Gros Clark, 1949; Szalay e Delson,1979)

    Categoria

    Taxonmica

    Nome

    lineano

    Nome

    comum

    Grupo de animais

    Classe Mammalia Mamferos

    Todos os animais de sangue quente, com plos, que carregam crias vivparas.

    Ordem Primates Primatas Prossmios, macacos smios e homem. Subordem Haplorhini Haplorrneos Trsios, macacos, smios e

    homem. Infraordem Catarrhini Catarrineos Macacos do Velho Mundo,

    smios e homem. Superfamlia Hominoidea Hominides Smios e homem

    Famlia Hominidae Homindeos Homem e seus ancestrais

    Gnero Homo Hominneos Homem

    Espcie H. Sapiens Homem recente

    Subespecie H.s.sapiens Homem anatomicamente moderno (humanos)

    Fonte: FOLEY, 1993, p. 43.

    Nessa escala evolutiva iniciaremos com as vrias espcies de

    Australopithecus dos quais j se encontraram fsseis persuasivos. Incluem

    alm de A. afarensis e A. africanus, apesar da aparncia simiesca, o

    Australopithecus (Macaco do Sul), cuja ocorrncia alguns situam pouco

    menos de dois milhes de anos atrs e, sem dvida o mais antigo gnero

    conhecido de homindeos.

    Australopithecus afarensis um dos mais completos homindeos

    encontrados; seus fsseis foram datados entre 3,6 e 3,8 milhes de anos.

    Lucy o exemplar feminino considerado o fssil do pr-Homo mais completo

    at hoje. Possveis pegadas suas foram encontradas, reconhecidas no

    mesmo sitio arqueolgico. As anlises das pegadas mostram que no

    diferem substancialmente das nossas, quando feitas sobre o mesmo

  • 38

    substrato o que demonstra bipedia, que vivia em terreno aberto e

    relativamente seco.

    Australopithecus africanus, o primeiro Australopitecneo a ser

    descoberto, em 1924, na regio da Taung, sul da frica, pelo paleontlogo

    australiano Raymond Dart, mostrava muitas caractersticas homindeas,

    apesar de o crnio ter aparncia simiesca. Muitos colocaram em dvida a

    descoberta e afirmaram ser crnio de um pequeno gorila. Mas a dentio era

    semelhante demais do ser humano. Estima-se que tenha vivido entre 3,5 e

    2,5 milhes de anos atrs. Era bpede pelo que indica a anatomia de sua

    espinha, de sua plvis e de seu fmur; devido ao clima que enfrentou na

    regio equatorial, supe-se que a espcie tinha pele escura e poucos plos.

    Paranthropus Boise, encontrado em 1959 no desfiladeiro de

    Oldupai, na Tanznia, leva o nome do industrial britnico que financiou os

    trabalhos arqueolgicos. Foi um homindeo que habitou nos pastos da

    savana entre 2 milhes e 1 milho de anos atrs. Tinha crnio grande com

    acentuadas, e estrias nos ligamentos musculares, mandbulas pesadas e

    grandes molares dentes trituradores. A configurao das mos indica que

    era apto a fabricar ferramentas.

    Homo habilis foi a primeira espcie do gnero Homo encontrada

    na garganta de Olduvai (1960), na Tanznia. Viveu entre 2,4 e 1,5 milhes

    de anos atrs. Distingue-se dos Australopithecus por possuir face e

    mandbulas e dentio menores, com dentes pequenos. Sua capacidade

    craniana est entre 600 e 700 cc em contraste ao valor de 380 a 450 cc do

    Australopithecus afarensis. Fabricava ferramentas simples de pedra e,

    possivelmente, com ossos de animais. Os cientistas se dividem quanto sua

    condio de ancestral direto do homem moderno. Alguns afirmam que ao

    invs dele ser nosso antepassado, foi seu contemporneo, o Homo

    rudolfensis, (antecessor do homem, encontrado em uma caverna na

    Espanha,e que possui a face muito semelhante ao homem moderno).

  • 39

    Homo erectus. Seus fsseis foram achados na sia, na frica e

    na Europa; era um ser totalmente bpede, com capacidade craniana de 900

    cm, quase o dobro do ancestral, o Australopithecus, mas com rbitas e

    mandbulas semelhantes s dos macacos antropides. Morava em cavernas

    e foi, possivelmente, o primeiro homindeo a utilizar fogo e vestimentas, o

    que propiciou migraes para lugares mais frios. Tinha como ferramenta de

    caa, a lana, feita de madeira ou de presa de elefante. A antiga

    denominao que compreendia tambm o chamado homem de Pequim foi

    substituda pela de Homo erectus. Mais tarde se localizaram outros fsseis

    semelhantes a este na Europa (homem de Heidelberg) e na frica

    (Atlanthropus). Tais variedades da espcie genericamente Homo erectus

    tiveram, segundo as diversas hipteses paleontolgicas, um perodo de

    durao varivel, entre 1,6 milhes a 130.000 anos atrs.

    Homo sapiens neandertalensis. Eram indivduos de caixa

    craniana e rosto grande, que teriam vivido no sul e no centro da Europa,

    assim no Oriente Mdio, entre 135.000 e 30.000 anos atrs. Supe-se que o

    desaparecimento do homem de Neandertal resultou do predomnio da outra

    subespcie, o homem de Cro-Magnon, que procedia do Oriente.

    Os primeiros fsseis de Cro-Magnon (localidade do sul da Frana)

    tm cerca de 32.000 anos, mas provvel que tenham penetrado na Europa

    antes dessa data. Outra hiptese atribui a extino do homem de Neandertal

    ao cruzamento entre as duas subespcies. Os dois tipos de esqueletos

    foram encontrados, praticamente juntos, no Monte Carmelo, em Israel.

    Homo sapiens, homem moderno poderia ter surgido

    aproximadamente h 150 mil anos, descendentes dos Neandertais. H

    controvrsias entre correntes de pesquisadores supondo que os Neandertais

    no seriam nossos descendentes, mas apenas competimos com eles quanto

    ao espao geogrfico, desalojando-os de sua regio e levando-os ao

  • 40

    desaparecimento; isto uma hiptese, segundo Freire-Maia (1988) mais

    plausvel.

    A histria dos homindeos deriva de uma srie de radiaes

    adaptativas ao longo do tempo, de origem muitas vezes incerta. A

    classificao dos homindeos pode mudar a qualquer momento, a partir de

    uma nova descoberta de fssil, constituindo-se numa nova viso alternativa,

    de interpretao proposta pela cincia.

    Sendo assim, conclumos que o passo da evoluo humana est

    cada vez mais claro para o mundo cientfico. A certeza da origem no existe

    fielmente. A cada fssil encontrado, sugere uma nova histria ou um

    complemento da histria j existente. Nos dias atuais a certeza que temos

    que os primeiros primatas surgiram na era Cenozica e que, da evoluo

    destes, surgiu o Homo Sapiens, mas ao certo, nunca teremos respostas,

    pois cada descoberta possui diversas interpretaes e atravs destas, que

    se tenta desvendar os mistrios da evoluo humana.

    Figura 1: Os humanos antes da humanidade.

    Fonte: FOLEY, 2003, p. 141.

  • 41

    1.9. O Homem Veio do Macaco ou No?

    Afinal, o homem descende ou no do macaco? A resposta que

    Freire-Maia (1988) nos d que o homem no descende do macaco, mas a

    linha evolutiva entre o homem e o macaco diverge aproximadamente de 15

    milhes de anos ou mais. Em outras palavras, essa divergncia teve incio

    na famlia Pongidae que possivelmente originou o homindeo. Contudo, a

    nica certeza que temos que surgiro novas pistas.

    De qualquer modo, o certo que a publicao do Origem das

    Espcies chocou as cincias do sculo XIX. Podemos dizer que, a

    compreenso do mundo antes de Darwin, era regida pela fsica, a natureza

    viva era postulada por reflexo filosfica; com o advento da seleo natural

    mesclada nas idias vigentes da poca instaurou-se uma nova viso de

    mundo na cincia secular.

    O darwinismo conhecido como um agente antagnico dos

    pensamentos fisicalistas revigorou a biologia. A biologia estava ganhando

    uma ateno, principalmente aps a contribuio do pensamento Darwinista.

    Antes de Darwin a biologia era regida por pensamentos essencialistas,

    deterministas e reducionistas, baseando-se em leis cartesianas.

    Com a complexidade que os estudos dos organismos vivos

    estavam emergindo, eles no cabiam mais como uma roupa justa para a

    biologia. Mesmo a biologia sendo filha do positivismo, foi um avano muito

    grande livr-la de leis fisicalistas e adapt-la a uma abordagem mais

    conceitual. Com isso, esta entrou no sculo XX ganhando autonomia. Uma

    das vertentes da biologia foi a Antropologia, pois o paradigma darwiniano

    possibilitou um novo vis ao estudo do homem, muitas outras reas do

    conhecimento se fortaleceram assumindo uma abordagem darwinista.

    Lembrando que muitos naturalistas e bilogos adentraram o sculo XX

  • 42

    sabendo das idias de Darwin, mas passaram-se quase oitenta anos para

    que as idias de Darwin ganhassem o espao merecido.

    1.10. A Biologia como Cincia

    A biologia tem um espao de destaque nas cincias, talvez seja o

    mais novo dos empreendimentos intelectuais humanos, o saber cientfico se

    configura a partir do senso comum at chegar ao conhecimento cientfico. A

    surge uma gama de importantes conquistas humanas, principalmente, o que

    se refere aos artefatos tecnolgicos, contribuindo para melhorar a qualidade

    de vida. Compreender as cincias em todas suas vertentes significa

    compreender um pouco do mundo contemporneo incluindo sua

    subjetividade.

    No mbito educacional, o ensino de cincias se encontra em

    qualquer grade curricular de estudos para crianas jovens e adultos. Um

    adolescente hoje em qualquer lugar do mundo sabe mais sobre cincias do

    que um adolescente do inicio do sculo XIX.

    Entendemos que Darwin foi uma pea importante para a cincia e

    a biologia. Alm da publicao do Origem das Espcies em 1859, que foi um

    dos fatores relevantes para os avanos da cincia moderna, as idias de

    evoluo por meio de seleo natural ameaaram diversas posturas

    intelectuais, no s os fundamentalistas cristos, mas uma oposio dos

    cientistas sociais que naquele momento acharam as idias de Darwin

    irrelevantes. Em Origem das Espcies e Linhagem do Homem, Charles

    Darwin colocou disposio um importante mecanismo cientfico por meio

    do qual os humanos poderiam ter surgido sem necessidade de interveno

    divina. O fato que na medida que as idias darwinianas foram ganhando

    espao, ou seja, mais adeptos, as controvrsias passaram a existir. Contudo

    nos prximos captulos vamos vislumbrar um pouco do contexto da evoluo

  • 43

    no mbito educacional e no mbito religioso onde ainda se propagam

    controvrsias entre criao e evoluo.

    1.11. A Cincia no Brasil

    No Brasil, o ensino de cincias est normatizado nas leis de

    diretrizes e bases da educao nacional (LDB n 9.394/96), e a mesma est

    vinculada ao desenvolvimento cientfico do pas ou regio, e ao

    desenvolvimento cientfico mundial. Historicamente, pases de longa tradio

    cientfica, como Inglaterra, Frana, Alemanha, Itlia e Espanha, contriburam

    para definir prioridades e inclinaes para o que se deve ensinar em

    Cincias, Biologia, Qumica e muitas outras disciplinas, desde o elementar

    at ao ensino superior (DELIZOICOV; ANGOTTI, 1994).

    No entanto, desde o incio do sculo XX, no Brasil,

    especificamente em 1920, comeou a haver uma preocupao com o ensino

    de cincias. O Estado interveio na educao fundamental a partir de 1950,

    poca fervorosa da industrializao. A partir dos anos 70, a nova direo do

    programa de cincias, estava baseada nos avanos tecnolgicos de uma

    economia industrial emergente. Os anos 80 foram marcados pelo fim da

    ditadura, as diretas-j e a democracia; o momento de transio da educao

    era regido pelo mercado de trabalho. Nessa dcada o Brasil caminhava para

    disputar um lugar no ranking dos pases desenvolvidos. Cuidadosamente, o

    mercado de trabalho brasileiro incitou o meio educacional a traar o novo

    perfil de sua mo-de-obra: a qualificao passou a ser um ponto decisivo,

    pois o que antes exigia tcnicas, agora alm das tcnicas, exigia-se o

    conhecimento mais abrangente, para satisfazer os consumidores cada vez

    mais exigentes, pois, o mercado havia se tornado muito mais competitivo.

    Portanto, no bastava mais s saber apertar o boto, as especialidades se

    tornaram um ponto de limitao para este mercado.

  • 44

    Os anos 90 foram marcados pela globalizao, o mercado de

    trabalho passou por uma forte mudana e a educao teve que se adaptar.

    Agora, se antes era necessrio ter uma especializao apenas para entrar

    no mercado de trabalho, agora se fazia necessria uma especializao e um

    amplo conhecimento do produto a ser oferecido. A Educao teve que se

    reorganizar para qualificar essa mo-de-obra. A Lei de Diretrizes e Bases da

    Educao Nacional ou LDB, dentro da dcada dos anos 90, comeou a

    traar uma nova viso de educao.

    Nossa educao sempre foi influenciada por aquela educao

    norte-americana ou europia, sempre flutuando de acordo com as correntes

    pedaggicas ou a influncia do capital estrangeiro.

    Para nortear e normatizar os currculos mnimos da educao

    brasileira dentro das unidades federativas, props-se um referencial de

    qualidade para a educao no ensino fundamental e no ensino mdio: os

    parmetros curriculares nacionais, os PCN s, com base em uma proposta

    flexvel, caracterizada nas decises regionais do Estado, a fim de garantir as

    diversidades culturais, regionais, tnicas, religiosas e polticas. Assim sendo,

    as propostas curriculares dos Estados passaram a ficar imbricadas nas

    exigncias do mercado de trabalho, e conseqentemente, atreladas aos

    PCN s, normatizando os diversos currculos e as disciplinas que os

    compem.

    Contudo, o Ensino de biologia tem sido analisado pelos

    especialistas (educadores/bilogos) com muita ateno nestes ltimos anos.

    Isso o que iremos ver a seguir.

    1.12. O Currculo de Biologia e os PCN s

    O currculo de biologia, por muitos anos foi centrado na

    memorizao e no preparo dos alunos para o vestibular. Com as

  • 45

    problemticas ambientais que nesses ltimos anos vm sendo apontados

    pela mdia, houve uma necessidade de se elaborar uma nova proposta

    curricular. Logo aps a publicao da Lei de Diretrizes e Bases da Educao

    Brasileira (LDB), foram publicadas normatizaes para ajustar a nova

    realidade educacional com as tendncias curriculares, na formao dos

    jovens de todo Brasil. A primeira preposio quanto ao ensino mdio,

    resumiu-se s Diretrizes Curriculares do Ensino Mdio (DCNEM), que por

    sua vez, no foram suficientes para definir essa organizao curricular.

    Em complementao ao DCNEM surgiu o PCNEM (Parmetro

    Curricular Nacional para o Ensino Mdio). Segundo Bizzo (2004), o PCNEM

    apresenta algumas lacunas que precisam ser preenchidas; as propostas

    oferecidas como sugesto, no aprofundam suficientemente suas principais

    questes junto aos professores; o texto perde-se em exerccios de reflexo

    que so pouco efetivos quando aplicados em sala de aula. Portanto, apesar

    do documento trazer orientaes gerais sobre os princpios norteadores da

    prtica didtica faltam, na verdade, sugestes e propostas ao professor do

    como fazer .

    (...) O texto sobre Conhecimentos de biologia nos PCNEM s

    tenta apresentar sugestes para uma abordagem que

    relacione teoria e prtica. Ela seria fruto de uma educao

    tecnolgica bsica, na qual o educando poderia demonstrar

    domnio dos princpios cientficos e tecnolgicos da Biologia

    que a produo moderna. No entanto, enveredou por um

    caminho de frases feitas no qual os professores de Biologia

    podem encontrar pouca ou nenhuma contribuio para zelar

    pela aprendizagem de seus alunos (BIZZO, 2004, p.165-

    166).

    Recentemente, pesquisadores e especialistas

    (educadores/bilogos) se curvaram em direo aos PCNEM s e

  • 46

    (re)elaboraram sua proposta didtica com um complemento, o PCN+, que

    apresenta um dilogo direto com professores e educadores, tornando a

    menor distncia entre a proposio das idias e sua execuo. O texto

    reafirma seu compromisso, possibilitando um ajuste entre as competncias

    gerais e com os conhecimentos disciplinares e organizando as formas mais

    sistemticas de muitas das propostas pretendidas pelos PCNEM s.

    Entretanto, as propostas do PCN+ em relao ao ensino de

    biologia enfrentam alguns desafios: um deles seria possibilitar ao aluno a

    participao nos debates contemporneos que exigem conhecimento

    biolgico; outro, a formao do indivduo com um slido conhecimento de

    Biologia e com um raciocnio crtico; e tambm fazer com que o educando

    opine sobre os temas que refletem suas aes do dia-a-dia. Para enfrentar

    esse desafio o professor deve pautar-se na alfabetizao cientfica, que se

    resume em trs pontos: aquisio de um vocabulrio bsico de conceitos

    cientficos, compreenso da natureza do mtodo cientfico e compreenso

    sobre o impacto da cincia e da tecnologia sobre os indivduos e a

    sociedade. Sendo assim o professor dever mediar os conhecimentos de

    senso comum do educando e sistematizar de acordo com contedo

    apropriado sala de aula.

    O que nos leva prtica pedaggica do docente, sendo que o

    mesmo dever estar sempre em processo de qualificao no que se refere

    abordagem dos contedos em especial PCN+ - origem e evoluo da vida -

    deve ser contemplado dentro de outros contedos, como a diversidade

    biolgica ou o estudo sobre a identidade e a classe dos seres vivos, por

    exemplo. O tema origem e evoluo da vida ao longo de diferentes

    contedos no representa a diluio do tema evoluo, mas sim, sua

    articulao com outros, como elemento central e unificador no estudo da

    Biologia.

  • 47

    Quanto aos valores pessoais e sociais do PCN+ propem uma

    articulao cuidadosa quanto a esses aspectos. Um caso tpico a

    discusso sobre o ensino (ou no) do criacionismo em aulas de Biologia em

    que se discute sobre a origem e a evoluo da vida. Essa discusso de

    grande valia, pois, d oportunidade para que o professor destaque o papel

    da cincia, mais especificamente o da biologia.

    1.13. A Biologia numa Perspectiva da Educao Transformadora

    Ao pensar em ensino de biologia dentro da atual proposta

    curricular, notamos que a perspectiva de possibilitar ao educando uma

    educao transformadora para a cidadania trabalhando com o cotidiano.

    Essa idia no recente, existe desde 1973 com os Guias Curriculares de

    Cincias (GCC So Paulo, 1973), e j havia uma valorizao dos contedos

    relacionados com a vida dos educandos, embora no houvesse uma

    definio detalhada do que deveria ser trabalhado. A mesma preocupao

    est caracterizada nos Parmetros Curriculares Nacionais (PCN s) de 1999,

    a preocupao com o cotidiano. Estes no utilizam esse termo, mas se

    apresentam com domnio vivencial, universo vivencial e contedo vivencial.

    Em outras palavras, a realidade social e o meio social tambm so muito

    utilizados para sugerir o cotidiano do aluno e as interaes entre os

    contedos propostos.

    O fato que vivemos na sala de aula na maioria das vezes com

    os problemas sociais que afetam os educandos. Isso implica que os

    contedos nem sempre esto pertinentes com a situao real dos

    educandos, mesmo escolhendo contedos que se aproximem de seu

    cotidiano. Em outras palavras, conseguimos ensinar muito bem temas que

    fazem parte das relaes fisiolgicas e morfolgicas (corpo e sade) do que

    temas que implicam com questes ticas, por exemplo. A questo evolutiva

    do ser humano e a origem da vida est sendo o calcanhar de Aquiles no

    ensino de biologia. Devido alterao no campo religioso nestas ltimas

  • 48

    dcadas, notamos uma mudana na situao social que invade a sala de

    aula, nos colocando em confronto com campos doutrinrios religiosos que

    ainda no nos demos conta.

    A questo mais polmica vivenciada pelos professores de biologia

    nestes ltimos trs anos a criacionista. Ou seja, o fato de o campo

    religioso protestante estar quase equiparado com o campo religioso catlico

    acaba promovendo confrontos entre a teoria da evoluo e a criao bblica

    de forma inevitvel.

    De acordo com a proposta curricular j mencionada acima,

    notamos que o ensino de biologia para ser uma educao transformadora e

    cidad tem que valorizar o cotidiano deste educando. Como trabalhar essas

    concepes cujas vises de mundo esto embasadas na doutrina da

    criao? E mais, sabendo das fragilidades do ensino da evoluo que ainda

    estamos no mundo cientfico aprendendo, descobrindo sobre nossas origens

    atravs da antropologia, como lidarmos com essa situao?

    O tema evoluo reconhecido como difcil de ser trabalhado na

    escola por envolver contedos abstratos, dificultando o entendimento e a

    compreenso dos alunos. Alm disso, muitos alunos possuem concepes

    criacionistas/fixistas disseminadas por igrejas e outras instituies similares

    (NARDI; BASTOS e DINIZ, 2004).

    1.14. O Papel do Professor de Biologia

    Cabe ao professor de biologia mediar a construo do

    conhecimento, levando em conta, que o educando dever ter uma ampla

    capacidade de abstrao com relao aos conceitos, teorias, princpios,

    formulaes de hipteses e pressupostos para o entendimento das relaes

    entre os seres vivos. E isto, lembrando que a construo de uma idia em

  • 49

    uma determinada situao exige a participao ativa do aluno (NARDI;

    BASTOS e DINIZ, 2004).

    Lembrando tambm que os professores, a todo momento,

    realizam atos polticos, pois so pessoas que tomam decises: escolher o

    contedo dado em sala de aula, optar por uma metodologia de ensino,

    decidir manter ou no um dilogo com os alunos, escolher ou no avaliar ou

    trazer ou no a realidade social, poltico econmica do pas ou ficar omissos

    quanto a tudo. Ou tambm escolher o contedo que mais lhes parecer

    pertinente quanto questo de domnio intelectual, deixando os outros

    contedos de fora do previsto por falta de domnio de outros assuntos.

    Haja vista que se o tema for polmico ou o professor no tiver

    domnio do contedo, isto passar desapercebido pelos alunos a ponto de

    criar um analfabetismo cientfico, cheio de lacunas.

    Evolucionismo uma idia que permeia um terreno frtil de idias

    filosficas na tentativa de clarificar a possvel origem da vida sem um Deus

    que guie a trajetria da origem da vida. Ou seja, Deus no teria a batuta da

    vida ela apenas teria surgido pelo processo longo e gradual da evoluo, isto

    dentro de uma viso darwinista.

    Seguiremos adiante com as idias criacionistas, e situaremos no

    tempo e no espao esse paradigma que anda se contrapondo com o

    evolucionismo desde que este surgiu em 1859, e esclareceremos o

    evolucionismo e o criacionismo, que desde seus surgimentos tm trazido

    inmeras controvrsias e batalhas.

  • 50

    CAPTULO II RELIGIO, EVOLUCIONISMO E

    CRIACIONISMO

    O que religio? Como poderamos definir esse objeto que tem

    sido alvo de estudo e discusso to diferenciada e contraditria? O que quer

    que se encerre nela (religio), nenhuma definio singular ou simples

    bastaria. As definies de dicionrios, (como por exemplo, reconhecimentos

    humanos do poder sobrenatural , a crena em Deus , qualquer sistema de

    f e de culto), o uso de vrias palavras preconceituosas ou to genricas

    que se tornam inteis. Talvez por isso, alguns estudiosos propem que os

    empregos de nomes prprios para as chamadas religies (prtica incomum

    antes do sculo XIX), sejam substitudos pela terminologia a religio de

    (um povo ou uma rea cultural, por exemplo). Tambm encontramos em

    dicionrios que a palavra religio deriva do termo latino Re-Ligare , que

    significa religao com o divino. Essa definio engloba necessariamente

    qualquer forma de aspecto mstico e religioso, abrangendo seitas, mitologias

    e quaisquer outras doutrinas ou formas de pensamento que tenham como

    caracterstica fundamental um contedo metafsico, ou seja, de alm do

    mundo fsico.

    Hinnells (1995, p. 217), define a religio como: sistema de

    crenas e prticas por meio das quais um grupo de pessoas luta com os

    problemas bsicos da vida humana . J para Durkheim (1996, p. 5), a

    religio encontra-se na prpria natureza social das coisas. Se assim no

    fosse, logo a realidade faria uma oposio qual a religio no resistiria. A

    natureza da religio indica que ela est muito mais atenta a explicar o que

    comum e constante no mundo do que extraordinrio.

  • 51

    Todas as crenas religiosas conhecidas sejam simples ou

    complexas, apresentam um mesmo carter comum: supem

    uma classificao das coisas, reais ou ideais, que os

    homens concebem, em duas classes, em dois gneros

    opostos, designados geralmente por dois termos distintos

    que as palavras profano e sagrado traduzem bem. A diviso

    do mundo em dois domnios compreende um tudo sagrado,

    e outro, profano, tal o trao distintivo do pensamento

    religioso: as crenas, os mitos, os gnomos, as lendas, so

    representaes ou sistemas de representaes que

    exprimem a natureza das coisas sagradas, as virtudes e os

    poderes que lhes so atribudos, sua histria, suas relaes

    mtuas e com coisas profanas (DURKHEIM, 1996, p. 19-

    20).

    Sobre o assunto Weber (2004) nos explica que num primeiro

    momento, o desenvolvimento da religio deu-se em uma poca e