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FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho,v. 4, n. 3/2014 – ISSN 2179-8222 – Semestral – Montes Claros

EditorEditorEditorEditorEditorProf. Ms. Waldir de Pinho Veloso

Conselho EditorialConselho EditorialConselho EditorialConselho EditorialConselho EditorialProf. Ms. Edson Pires da Fonseca

Prof. Ms. Rafael Soares Duarte de MouraProf. Ms. Richardson Xavier BrantProf. Ms. Waldir de Pinho Veloso

e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho

ISSN 2179-8222

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FAS@JUS - e-Revista do Curso de Direito da Faculdade de Direito Santo Agostinho

EditorProf. Ms. Waldir de Pinho Veloso

Conselho EditorialProf. Ms. Edson Pires da Fonseca (Faculdade UBRES – Bahia)

Prof. Ms. Rafael Soares Duarte de Moura (Faculdade de Direito Santo Agostinho, Minas Gerais)Prof. Ms. Richardson Xavier Brant (Universidade Estadual de Montes Claros, Minas Gerais)

Prof. Ms. Waldir de Pinho Veloso (Faculdade de Direito Santo Agostinho, Minas Gerais)

Organização e Correção LinguísticaProf. Ms. Waldir de Pinho Veloso

Editoração GráficaMaria Rodrigues Mendes

CapaAdriano Magno de FreitasMaria Rodrigues Mendes

Ficha catalográfica elaborada por Edmar dos Reis de Deus CRB6 2486.

FAS@JUS : e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho / Faculdade de Direito SantoAgostinho. – Vol. 4, n. 3, 2014 - . - Montes Claros, MG. Fundação Santo Agostinho, 2014-

v. : il. 21 x 29cm.

SemestralISSN 2179-8222

1. Direito. I. Faculdade de Direito Santo Agostinho. lI. Título.

CDU: 34 (05)

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................

ENTREVISTA..............................................................................................................................

ARTIGOS DO CORPO DOCENTE

PROCESSO FALIMENTAR: O DEPÓSITO ELISIVO EXTEMPORÂNEO COM FUNDAMENTONA PRESERVAÇÃO DA EMPRESAKelle Grace Mendes Caldeira e Castro............................................................................................

ARTIGOS DO CORPO DISCENTE

O ACESSO À JUSTIÇA FORMAL: UM OLHAR SOB O VIÉS DA PERSPECTIVASOCIOLÓGICA DO DIREITOAntônio Maria e Silva.....................................................................................................................

A RESPEITO DE EVOLUCIONISMO NAS OBRAS DE ÉMILE DURKHEIM E DE MAXWEBERArnon Arruda Simões....................................................................................................................

A VIOLÊNCIA NA EDUCAÇÃO BÁSICA E A INTERVENÇÃO DO DIREITORodrigo de Souza Borges...............................................................................................................

UMA ANÁLISE DO EGOÍSMO PELA APROXIMAÇÃO DOS PENSAMENTOS DE HOBBESE ARENDT COM A ATUALIDADEThaís Carolina Sousa Guedes........................................................................................................

ARTIGOS DE EGRESSOS

A ESSENCIALIDADE DO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA NO SISTEMA JURÍDICOBRASILEIRO: UMA ABORDAGEM SISTEMÁTICA DA IMPORTÂNCIA DO ADVOGADOIgor Coelho Antunes Ribeiro...........................................................................................................

ASPECTOS DA AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO PREVISTA NO DECRETO-LEI N.º 911/69Pollyana de Fátima Medeiros Gonçalves............................................................................................

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ELO COM OUTRAS IES

PARTO ANÔNIMO, CELERIDADE DOS PROCESSOS DE ADOÇÃO E ANTEPROJETODO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVILIonete de Magalhães SouzaAna Clarice Albuquerque Teixeira LealMaria Isabel Rodrigues Ferraz.......................................................................................................

AUTOR CONVIDADO

DEMOCRACIA PARTICIPATIVA: OS INSTRUMENTOS DE SUA CONSOLIDAÇÃO EAS PERSPECTIVAS DO CONTROLE SOCIAL COM O ADVENTO DA LEI DE ACESSO ÀINFORMAÇÃO N.º 12.527/2011Antônio Luiz Nunes SalgadoJosikelle de Souza Santos.............................................................................................................

RESENHA

UMA LIÇÃO DE HERMENÊUTICA E ARGUMENTAÇÃO EM POUCAS PÁGINASSimone Rosiane Corrêa Araújo....................................................................................................

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APRESENTAÇÃO

Vez por outra, vira-se para trás e analisa-seo que foi feito de válido. O balanço, a despeito deser obrigação empresarial, é de bom tom para avida como um todo. O recenseamento, a conta-gem e a recontagem, a conferência, a aferição.São tópicos de uma vida de números. Sãomarcadores de uma sequência lógica, gradual, per-manente. A vida é uma dança de números. Feliz équem tem a vida com a numeração em par, comqualidade ímpar, nunes, isolado na cabeceira.

A Revista Eletrônica Fas@Jus, do Curso deDireito da Faculdade de Direito Santo Agostinho,é uma comprovação de que os números são o com-bustível da vida. Em um ano em que a Revistaprometeu a publicação de dois números, o terceirovem como uma sobrecoroa, como uma dúplicecoroa, a comprovar o poder superior pelo menosem uma dimensão a mais do que a pretendida ori-ginalmente.

O Volume 4 da e-Revista do Curso de Direi-to da Faculdade de Direito Santo Agostinho vemmarcado por três números. O primeiro, foi divul-gado em abril. Em repetição: a publicação seriadaé semestral. Portanto, dois números por ano com-pletam o compromisso. Com a publicação do nú-mero dois, em maio de 2014, vencida estava a eta-pa anual. Mas, a volúpia foi empecilho de um es-tacionar sobre a vitória. Assim, somente a prepa-ração de um terceiro número traria paz à angústiade quem tem anseio em tornar público o que es-creve. Motivo para que este trabalho seja apre-sentado ao público.

A Revista Eletrônica Fas@Jus – que leva aidentificação e personificação como Volume 4, Nú-mero 3 – cumpre para com a tradição e tem a En-trevista como ponto de partida. Considerando asquestões ambientais, a falta de planejamento go-vernamental quanto a obras que tornem perenes oscursos d’água e o descaso ou a falta de educaçãoambiental do homem como gênero, o tema da En-trevista gira em torno da Bacia do Rio São Francis-co. Para tal, há a imponente participação do Pro-motor de Justiça Daniel Oliveira de Ornelas.

A seção destinada aos Professores do Cur-so de Direito da Faculdade de Direito Santo Agos-tinho está ocupada pela Professora Kelle GraceMendes Caldeira e Castro. Ela desvenda ques-tões referentes ao processo falimentar, e, sob otítulo “Processo Falimentar: o depósito elisivo

extemporâneo com fundamento na preserva-ção da empresa”, informa detalhes da pesquisacientífica que empreendeu sobre o segmento so-bre o qual se debruçou em estudos. Aponta, emcomplemento, a consonância dos Tribunais de Jus-tiça de nível superior quanto à interpretação eintegração da Lei, bem como a comparação dalegislação mais atual com a que reinou durantequase meio século no Brasil, quanto à falência.De passagem, fala da recuperação de empresas,instituto definido na Lei em comentário, e que veioem substituição à concordata.

A mais vitoriosa seção do presente númeroé a destinada aos integrantes do Corpo Discenteda Faculdade de Direito Santo Agostinho. Os arti-gos científicos publicados comprovam que não seprecisa esperar a chegada ao último período doCurso para fazer pesquisa científica. Tendo disci-plina para com o estudo, e incentivo por parte dosProfessores – em especial, e credora de aplausos,a Professora Noêmia Coutinho Pereira Lopes,a veia científica explode mesmo em quem acabade se adentrar à Faculdade, em quem está se ini-ciando na seara do ensino superior.

O primeiro texto tem a autoria do AcadêmicoAntônio Maria e Silva e leva o título “O Acessoà Justiça Formal: um olhar sob o viés daperspectiva sociológica do direito”. O trato équanto à possibilidade de que o Poder Judiciárioesteja ao alcance do maior número de pessoas.Analisa os fatores econômico, social e culturalcomo fixadores de maiores ou menores facilidadesde acesso à Justiça. E, em complemento, mostraque a administração da Justiça, muitas vezes, vemencorpada pelas ideologias dos seus componentesou integrantes mas, principalmente, dos seuscomandantes.

Há também o texto científico da lavra doAcadêmico Arnon Arruda Simões, sob o título“A Respeito de Evolucionismo nas obras deÉmile Durkheim e de Max Weber”. São refle-xões acerca da Sociologia do Direito. Além dosdois autores cujos nomes integram o título do arti-go científico, o texto ainda tem por fundamento asconsiderações e análises de Niklas Luhmann. Obenefício para a sociedade e para o Direito (daí,Sociologia Jurídica ou Sociologia do Direito) vemdemonstrado em cada obra estudada, dos autoresÉmile Durkheim e de Max Weber.

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O terceiro artigo científico deste segmentodo presente número da Revista Fas@Jus é de au-toria do Acadêmico Rodrigo de Souza Borges.Utilizando-se da sua experiência de pesquisadorem cursos de Graduação e Pós-Graduação já fre-quentados, o autor apresenta a pesquisa de campocom o título “A Violência na Educação Básica ea Intervenção do Direito”, na qual mostra osalarmantes – porém reais – números da violênciacontra os Professores, as doenças típicas da ativi-dade do magistério e a sensação de impotência daparte dos Professores e Diretores de Escolas Pú-blica de Ensinos Fundamental e Médio, perante acriminalidade que afeta os ambientes que seriamde passagem e captação de aprendizagem.

Há um quarto texto científico escrito pormembro do Corpo Discente. Desta vez, o espaçovem validamente ocupado pela Acadêmica ThaísCarolina Sousa Guedes. Em estilo bastante filo-sófico, entremeado pelo sabor de um ensaio, o ar-tigo científico traz como título “Uma Análise doEgoísmo pela Aproximação dos Pensamen-tos de Hobbes e Arendt com a Atualidade”.Desta feita, a autora traça comentários fundamen-tados em Thomas Hobbes e Hannah Arendt quan-do, direta ou transversalmente, os filósofos defi-nem e se imiscuem no trato do egoísmo como fa-tor de importância para o estudo do Direito.

A participação do Corpo Discente da Facul-dade de Direito Santo Agostinho reflete o com-promisso que o Curso de Direito tem para com oconstante no Projeto Pedagógico do Curso (PPC).Todo PPC de todo Curso Superior costuma afir-mar, perante o Ministério da Educação, que pautapor um tripé indissociável formado pelo Ensino, aPesquisa e a Extensão. O Ensino e a Extensãosão facilmente levados a efeito até mesmo pelosmais capitalistas dos empreendedores da educa-ção superior. Afinal, são fontes de renda. Difícil éver a outra vertente, a da pesquisa. A cada publi-cação de um número da Revista Fas@Jus, há acomprovação de que existe incentivo à pesquisano Curso de Direito da Faculdade de Direito San-to Agostinho. Fato que diferencia este Curso emrelação aos demais de praticamente todo o Brasil.O espaço do Acadêmico é incentivado pelos Pro-fessores e é correspondido pelos integrantes doCorpo Discente. A prova está mais uma vez explí-cita: somente neste número, a Fas@Jus tem o pri-vilégio de ver constar, em suas páginas, quatroautores que ainda são estudantes de Direito. E,normalmente, os hoje iniciantes na pesquisa cien-tífica serão os pesquisadores – normalmente, bons

Professores – de um amanhã muitíssimo próximo.Outro ponto de relevância para um Curso

Superior é o não desprezar dos seus egressos.Quem se gradua em uma Faculdade leva umamarca indelével do que viveu nos bancos escola-res. E leva, por consequência, o nome da Faculda-de umbilical e indissociavelmente ligado ao seupróprio nome.

Nada mais justo, destarte, do que destinaruma seção da Fas@Jus, a e-Revista do Curso deDireito da Faculdade de Direito Santo Agostinho,para que os Egressos não se desfiliem da Insti-tuição.

O primeiro texto científico é escrito peloAdvogado Igor Coelho Antunes Ribeiro. Gra-duado em Direito pela Faculdade Santo Agostinhono fim de 2013, o egresso continua com ligaçõespara com o Curso, ao apresentar o artigo científi-co denominado “A Essencialidade do Exercí-cio da Advocacia no Sistema Jurídico Brasi-leiro: uma abordagem sistemática da impor-tância do advogado”. O texto faz uma análise,resultado de uma pesquisa que teve início ainda nagraduação, quanto ao exercício da profissão deAdvogado, uma das variadas funções que podeexercer o operador do Direito. A busca científicapasseia pela doutrina mais ampliada, pela legisla-ção – inclusive a Constituição, como Lei Maiorque é – e pelas constatações acerca daessencialidade e indispensabilidade do advogadopara que haja Justiça.

O outro texto científico da seção destinadaaos egressos é de autoria da Advogada Pollyanade Fátima Medeiros Gonçalves, que de encantousobre a Ação de Busca e Apreensão resultante daAlienação Fiduciária em Garantia e, assim, produziuo artigo cujo título é “Aspectos da Ação de Buscae Apreensão Prevista no Decreto-Lei N.º 911/69”. Com fundamentos na doutrina e jurisprudência,o Decreto-Lei 911, de 1969, tem a análisepormenorizada, principalmente quanto às inovaçõestrazidas pela Lei n.º 10.931, de 2 de agosto de 2004,que autorizou, dentre outros, a alienação do bemapreendido sem muitas formalidades. A autorademonstra a constitucionalidade do Decreto-Lei 911,de 1969, e o tem como um fomento – ou umfermento – incentivador da concessão e crédito, umavez que os agentes financiadores se sentem maisseguros quanto ao retorno do dinheiro emprestado.

Um espaço que vem sendo reconhecidocomo extremamente válido é o denominado “Elocom Outras IES”. Na sociedade moderna, de-monstrado está que não se vive de forma isolada.

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Também as Instituições de Ensino Superior (IES)não têm importância, quando consideradas de for-ma singular. Motivo pelo qual houve a modifica-ção da estrutura da Revista Eletrônica Fas@Jus,para contemplar publicações de autores capazes,que tenham as qualidades de graduandos, gradua-dos ou Professores de outras Instituições de Ensi-no Superior que não a Faculdade de Direito SantoAgostinho.

O texto desta referida seção tem por título etema “Parto Anônimo, Celeridade dos Proces-sos de Adoção e Anteprojeto do Novo Códi-go de Processo Civil” e tem como autorasIonete de Magalhães Souza (Professora eDoutora em Direito); Ana Clarice AlbuquerqueTeixeira Leal (Professora) e Maria IsabelRodrigues Ferraz (Acadêmica de Direito). Apesquisa científica aborda aspectos do “abando-no” de filhos em locais apropriadamente prepara-dos para que fossem colocados os “expostos”,passa pelas questões da adoção e aponta cami-nhos para que sejam acelerados os procedimentosque intermedeiam a decisão de alguém em adotaroutrem e a formalização da filiação (tanto a filiaçãoadotiva quanto a filiação biológica têm igual valor,perante a lei).

A coluna que é ofertada um Autor Con-vidado, desta vez, é ocupada pelo ProfessorAntônio Luiz Nunes Salgado, em parceriacoma Acadêmica Josikelle de Souza Santos.Eles tratam do tema “DemocraciaParticipativa: os instrumentos de sua con-solidação e as perspectivas do controlesocial com o advento da lei de acesso à in-formação n.º 12.527/2011” que, como se podever, faz profunda e fundamentada análise quan-to à Lei de Acesso à Informação e a sua contri-buição para com a gestão pública. A doutrina e

as leis são os fundamentos científicos principaisque o texto traz.

O encerramento do Revista EletrônicaFas@Jus é por conta da seção Resenha. Destavez, a Professora Simone Rosiane CorrêaAraújo faz a análise crítica e reflexiva (por isso,chamada Resenha, porque é um resumo recheadode comparações com outros livros ou autores,análises, críticas e observações pessoais) sobre olivro “O caso dos exploradores de cavernas”, deL. Lon Fuller. Sob o título “Uma Lição deHermenêutica e Argumentação em PoucasPáginas”, a autora passeia pelas disciplinas“Hermenêutica Jurídica” e “Argumentação eLógica”, bases propedêuticas para os Acadêmicosde Direito que querem vencer como operadoresdo Direito. E apresenta, em reduzidas letras, o queo livro traz em seu conteúdo como um todo.

A repetição é proposital, para celebrar o fei-to: este é o terceiro número de uma publicaçãoseriada que se contentava com dois. É uma glóriaexcedente. É a prova incontestável da aceitação,do sucesso, do aceitar e do se encantar por partedos autores, em relação à publicação. É a síntesede que o nascimento da Fas@Jus, como RevistaEletrônica – que tem como costume a publicaçãode alguns exemplares em versão impressa, paraefeitos de divulgação e comprovação material doque os arquivos digitais anunciam – está coroada,laureada e, principalmente, dourada pela partici-pação de tantas pessoas de qualidade.

Em arquivo digital – e a versão impressa emmãos – portanto, o Volume 4, Número 3 daFas@Jus, e-Revista do Curso de Direito da Fa-culdade de Direito Santo Agostinho.

Prof. Ms. Waldir de Pinho VelosoEditor

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O nascer da Constituição Federal, em seuatual corpo, em 5 out. 1988, trouxe funções explí-citas ao Ministério Público que, em verdade, jáestavam impregnadas na formação de tal órgãocomponente da Justiça brasileira. O fortalecimen-to não se deu apenas pela autonomia, pela inde-pendência funcional do Ministério Público e pelasua essencialidade à consolidação da Justiça e daDemocracia: trouxe mais destaques às funções.Fatos outros contribuíram para a divulgação, emmassa, das atividades do Ministério Público.

Pertencer ao Ministério Público, após aConstituição Federal de 1988, passou a ser objeti-vo de muitos estudantes dos Cursos de Direito.Após a Emenda Constitucionaln.º 45, de 8 dez. 2004, o concur-so para ingresso na carreira doMinistério Público passou a tercomo requisito a prática de ati-vidades privativa de Direito peloprazo mínimo de três anos (§ 3.ºdo art. 129 da Constituição Fe-deral de 1988). Não se pode –como se podia até então – ter-minar o Curso de Direito em umdia e iniciar um concurso públi-co para ingresso na carreira nodia seguinte. São necessáriostrês anos de prévia prática doDireito, como Advogado, Delegado ou alguma ati-vidade privativa de Bacharel em Direito. Esta últi-ma, em dependendo da análise dos afazeres típi-cos da função exercida.

Os integrantes do Ministério Público são maisconhecidos como Promotores de Justiça. Exata-mente por promoverem atos típicos que conduzemàs decisões de acordo com a Lei e com o que éJusto. Em degraus correspondentes à segunda ins-tância, são denominados Procuradores.

O Ministério Público é composto pelo Minis-tério Público da União e pelo Ministério Públicodos Estados-membros da República Federativa doBrasil. O Ministério Público Federal é dividido, emtermos de carreira, em Ministério Público Federal,

ENTREVISTA

Entrevistado: Promotor de Justiça Daniel Oliveira de Ornelas

Ministério Público do Trabalho, Ministério PúblicoMilitar e Ministério Público do Distrito Federal eTerritórios. O segundo, não tem divisão. Mas, cadaEstado-membro brasileiro tem sua carreira inde-pendente.

Um dos integrantes do Ministério Público doEstado de Minas Gerais é o Doutor Daniel Olivei-ra de Ornelas. Graduado em Direito pela Faculda-de de Direito Milton Campos (de Belo Horizonte),em 2002, fez dois cursos de especialização (pós-graduação lato sensu) em Direito Processual Ci-vil e em Direito da Economia e da Empresa. Porconcurso público de provas e títulos, ingressou noMinistério Público em 6 ago. 2009. Desde então,

atuou em Monte Azul, Barãode Cocais, Diamantina e Go-vernador Valadares. Atualmen-te, é o Promotor de Justiça daComarca de Montes Clarosencarregado da Promotoria deDefesa da Bacia do Rio SãoFrancisco.

Como se pode notar, tra-ta-se de uma Promotoria espe-cializada, característica dasComarcas que têm diversosPromotores de Justiça em ati-vidade (quando a Comarca temapenas um Promotor, suas ati-

vidades são múltiplas: desde ações de alimentos eenvolvendo menores de idade até a face mais ex-terna, que é a atuação no Tribunal do Júri). EmMontes Claros, há várias Promotoriasespecializadas em alguns segmentos. A especiali-zação traduz a maior possibilidade de estudos por-menorizados acerca de um tema; e a concentra-ção em tema único possibilita a dedicação commaiores êxitos.

Em tempos de discussão quanto à falta deplanejamento dos governantes quanto à necessi-dade de armazenamento de água, bem como à faltade uma educação disseminada quanto à economiade tal imprescindível líquido, a Fas@Jus, a e-Revista do Curso de Direito da Faculdade de

[...] Há diversascausas que podem ser

apontadas. Cremosque o maior causador

da seca do rio, semsombra de dúvidas, é

o homem.

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Direito Santo Agostinho, entrevistou o Promo-tor de Justiça Daniel Oliveira de Ornelas. O tema,dos mais interessantes, contemporâneos eatualizados, é o tratado com maestria, como se podever a seguir.

Fas@Jus: O Ministério Público tem, previs-tos no artigo 127 da Constituição, três prin-cípios. Quais os seus comentários sobre taisprincípios? Promotor de Justiça Daniel Oliveira deOrnelas: O artigo 127, § 1.º, da Constituiçãoda República, elenca como princípiosinstitucionais do Ministério Publico a unida-de, indivisibilidade e independência funcional,que também estão contemplados no artigo 1.°,parágrafo único, da Lei Orgânica do Ministé-rio Público do Estado de Minas Gerais (LC n.º34/1994). O princípio da unidade informa eorienta a atuação político-institucional do Mi-nistério Público, que, por meio do conjunto deseus membros deve estar voltado à consecu-ção de seus objetivos. O princípio daindivisibilidade decorre do princípio da uni-dade. Indivisível é porque seus membros nãose vinculam aos processos nos quais atuam,podendo ser substituídos reciprocamente, deacordo com as normas legais. Pelo princípioda indivisibilidade, todas as pessoas que com-põem o Ministério Público podem ser substitu-ídas umas pelas outras. Já o princípio da inde-pendência funcional é caracterizado pelo di-reito de atuar de acordo com a sua consciên-cia e a lei, não havendo subordinação hierár-quica no desempenho de suas funções. Visapossibilitar ao membro do Ministério Públicoo exercício independente de suas atribuiçõesfuncionais, tornando-o imune a pressões deterceiros que de algum modo tentem frustrar ocumprimento de sua missão institucional, ten-do como objetivo principal garantir uma atua-ção ministerial absolutamente desvinculada dequalquer interesse que não seja o de cumprircom fidelidade o ofício destinado à Instituição.

Fas@Jus: O Ministério Público, emComarcas de maior movimento, apresenta-se segmentado por especializações. Quais asespecializações do Ministério Público emMontes Claros?

Promotor de Justiça Daniel Oliveira deOrnelas: O Ministério Público em Montes Cla-

ros subdivide-se em 16 Promotorias de Justiçaque atuam em diferentes áreas:

– 1.ª Promotoria de Justiça - Atua perante oTribunal do Júri; no controle externo da ati-vidade policial e na realização de audiênciasde execução penal;

– 2.ª Promotoria de Justiça - Promotoria Auxi-liar;

– 3.ª Promotoria de Justiça - Atuação proces-sual e extraprocessual perante a 2.ª Vara deFamília da Comarca de Montes Claros;

– 4.ª Promotoria de Justiça - Atua nos feitos da1.ª e 2.ª Varas da Fazenda Pública e nos fei-tos da 1.ª, 2.ª, 3.ª, 4.ª e 5.ª Varas Cíveis daComarca de Montes Claros. E a PromotoriaEleitoral: atua na 325.ª Zona Eleitoral;

– 5.ª Promotoria de Justiça - Atuação proces-sual e extraprocessual perante a 1.ª Vara deFamília da Comarca de Montes Claros. E Pro-motoria Eleitoral da 185.ª Zona Eleitoral;

– 6.ª Promotoria de Justiça - Atua perante o1.° Juizado Especial Criminal e em 50% dosprocessos de execução penal;

– 7.ª Promotoria de Justiça - Atua na defesado Meio Ambiente; na defesa do patrimôniohistórico e cultural; defesa da habitação eurbanismo e nos conflitos agrários;

– 8.ª Promotoria de Justiça - Atua perante aVara da Infância e Juventude e PrecatóriasCriminais (atuação Criminal);

– 9.ª Promotoria de Justiça - Atua em 50% dosinquéritos e processos da 1.ª Vara Criminal eem 50% de suas audiências. Responde por25% dos crimes contra a ordem econômica etributária;

– 10.ª Promotoria de Justiça - Atua em 50%dos inquéritos e processos da 2.ª Vara Crimi-nal e em 50% de suas audiências. Respondepor 25% dos crimes contra a ordem econômi-ca e tributária;

– 11.ª Promotoria de Justiça - Atua em 50%dos feitos em relação à defesa do patrimôniopúblico; na tutela das Fundações e na defe-sa dos Direitos Humanos. É, cumulativamen-te, a Promotoria Eleitoral da 184ª Zona Elei-toral;

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– 12.ª Promotoria de Justiça - Atua perante o2.° Juizado Especial Criminal e em 50% dosprocessos de Execução Penal;

– 13.ª Promotoria de Justiça - Atua em 50%dos feitos em relação à defesa do patrimôniopúblico e na defesa do consumidor. É a Pro-motoria Eleitoral da 317.ª Zona Eleitoral;

– 14.ª Promotoria de Justiça - Atua em 50%dos inquéritos e processos da 1.ª Vara Crimi-nal e em 50% de suas audiências. Respondepor 25% dos crimes contra a ordem econômi-ca e tributária;

– 15.ª Promotoria de Justiça – Atua na defesada saúde; na defesa dos deficientes e idosose na defesa da infância e juventude (atuaçãocível);

– 16ª Promotoria de Justiça - Atua em 50% dosinquéritos e processos da 2.ª Vara Criminal eem 50% de suas audiências. Responde por25% dos crimes contra a ordem econômica etributária.

Além das Promotorias de Justiça, comatribuição limitada à Comarca de MontesClaros, o Ministério Público ainda é dotadode três Coordenadorias Regionais, sendo umarelacionada à defesa do Meio Ambiente, umareferente à Curadoria da Infância e Juventudee outra relacionada à defesa do PatrimônioPúblico e da ordem econômica e tributária,todas sediadas em Montes Claros.

Fas@Jus: Uma das funções do MinistérioPúblico é a defesa dos interesses sociais eindividuais indisponíveis. Neste segmento,uma das atividades está ligada à defesa daBacia do Rio São Francisco. Qual a atuaçãodo Ministério Público nesta especialidade?

Promotor de Justiça Daniel Oliveira deOrnelas: A defesa dos interesses sociais e indi-viduais indisponíveis pode se dar judicial ouextrajudicialmente. Em juízo, o principal ins-trumento utilizado pelo Ministério Público é aação civil pública para tutela dos interessesmetaindividuais. Malgrado não seja o únicolegitimado ativo para tanto, há dados no senti-do de que mais de 80% das ações civis públi-cas são propostas pelo Ministério Público. Nãoobstante, todas as ações e todas as tutelas po-

dem ser utilizadas para viabilizar a pretensãodo Parquet. Já no campo extrajudicial, o Mi-nistério Público possui eficazes instrumentosde atuação, a exemplo do Inquérito Civil Pú-blico, do Termo de Ajustamento de Conduta(TAC, conforme costumam divulgar os meios decomunicação), das requisições, notificações erecomendações, todos voltados à efetividade egarantia do cumprimento de sua missão cons-titucional de defesa dos interessestransindividuais.

No que se refere à atuação ligada à Bacia doRio São Francisco, o Ministério Público ins-taura diversos inquéritos civis para apurarsupostas intervenções que possam causar da-nos às áreas especialmente protegidas no inte-rior da bacia, bem como nas matas ciliares doRio São Francisco ou mesmo intervenções ir-regulares no próprio leito do rio. Tamanha é aimportância conferida à Bacia do Rio SãoFrancisco que o Ministério Público do Estadode Minas Gerais criou, em 2004, algumasCoordenadorias por bacia hidrográfica, quesão, em síntese, Promotorias de Justiça especí-ficas para defesa da bacia do Rio São Fran-cisco. A Coordenadoria Regional sediada emMontes visa atender às Promotorias de Justiçado Meio Ambiente das bacias dos rios VerdeGrande e Pardo de Minas.

Fas@Jus: O Rio São Francisco está secan-do. As notícias são no sentido de que nestesegundo semestre de 2014 registra-se a maisarrasadora situação, a mais próxima situaçãoda morte, quanto ao Rio São Francisco. Hácomo apontar algumas causas?

Promotor de Justiça Daniel Oliveira deOrnelas: Há diversas causas que podem serapontadas. Cremos que o maior causador daseca do rio, sem sombra de dúvidas, é o ho-mem. Com efeito, o desmatamento das matasciliares, o assoreamento dos rios, a degrada-ção das nascentes, as captações irregulares deágua, a não preservação das reservas legais edas áreas de preservação permanente são al-gumas das causas fundamentais para a situa-ção em que vivemos. Aliados a esses fatores,temos a falta de fiscalização e punição efetivapelos órgãos públicos responsáveis, bem comoa legislação frágil e benevolente ao setor pro-dutivo.

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Fas@Jus: O que cabe ao Ministério Públicona tentativa de evitar a degradação do RioSão Francisco, suas margens e afluentes?

Promotor de Justiça Daniel Oliveira de Ornelas:Na tentativa de evitar a degradação do Rio SãoFrancisco, cabe ao Ministério Público continuara velar pelo princípio da prevenção e da precau-ção, atuando de forma preventiva e afastando apossibilidade de ocorrência dos danosambientais. Não obstante, o próprio constituinte,no artigo 225 da atual Carta Magna, incumbiutal missão não só ao Ministério Público, mas atodos e ao Poder Público. Logo, o corretoenfrentamento dos ilícitos ambientais demandaatuação integrativa, interinstitucional, democra-tizada, que passa logicamente pela mudança cul-tural no uso dos recursos naturais. De nada adi-anta o Ministério Público promover operaçõesde combate à “máfia do carvão”, por exemplo,se os órgãos ambientais responsáveis pela fisca-lização eventualmente negligenciarem em sua atu-ação. De nada adianta exigir a recuperação deuma mata ciliar se o próprio ordenamento jurídi-co, a exemplo do novo Código Florestal, isenta oinfrator, em algumas hipóteses, de diversas obri-gações nesse sentido. De igual modo, de nadaadianta propor ações civis públicas para con-servação da água se a própria população fazuso desordenado de um bem tão caro, por vezeslavando calçadas, passeios ou, até mesmo, ruas,bem como eventualmente fraudando o sistema decaptação de água, sem a devida outorga, enfim.Trata-se de uma obrigação que é de todos e oMinistério Público, no âmbito de sua atribuição,tem cumprido sua árdua missão constitucional dereceber todas as notícias de ilícito ambiental, re-alizar as investigações necessárias para apura-ção dos fatos e atribuir responsabilidades civis,penais e administrativas aos respectivos infrato-res.

Fas@Jus: Mesmo com o Ministério Públicoagindo em busca de evitar a danificação doRio São Francisco, qual o futuro para este Riopode ser hoje anunciado?

Promotor de Justiça Daniel Oliveira de Ornelas:Deve-se ter muito cuidado com prognósticos tãoprecisos, sobretudo a curto e médio prazos. Oque se tem como certo, já há algum tempo, é quepara revitalizar o Rio São Francisco é necessá-rio revitalizar suas sub-bacias, seus afluentes.

No entanto, esse trabalho de revitalização nãoconsiste exclusivamente em recuperar as matasciliares dos corpos hídricos. Depende de umapolítica específica voltada para preservaçãoambiental, da atuação conjunta e eficaz dosórgãos ambientais e sobretudo daconscientização da população que faz uso dosrecursos naturais. O equilíbrio entre tais situa-ções favorece ideais de sustentabilidade. Alémdisso, o índice anual de precipitação na baciado Rio São Francisco não deveria reduzir parase ter um horizonte mais seguro.

Fas@Jus: Em defesa das questõesambientais, o Ministério Público propõeações junto ao Poder Judiciário, em busca deevitar degradação, reparar a degradação oucompensar os estragos irreversíveis?

Promotor de Justiça Daniel Oliveira deOrnelas: Em defesa das questões ambientais,o Ministério Público propõe diversas açõesperante o Poder Judiciário. Os dados são nosentido de que mais de 80% das ações civispúblicas são aforadas pelo Ministério Públi-co. Tais números revelam que o Ministério Pú-blico é o órgão que mais tem demandado napretensa tutela do meio ambiente. É considera-do o principal legitimado ativo não só pelonúmero de ações propostas, mas também peloseficazes instrumentos constitucionais postos àsua disposição para defesa do interessemetaindividual, a exemplo do inquérito civil,da requisição, da recomendação, do termo deajustamento de conduta, do oferecimento dedenúncia por crimes ambientais e das açõescivis públicas propostas. Aliás, o MinistérioPúblico de Minas Gerais, de acordo com pes-quisa feita pelo Conselho Nacional do Minis-tério Público (CNMP), foi quem mais ajuizouações civis públicas voltadas para a proteçãodo meio ambiente no ano de 2013.

Fas@Jus: Para dar início a uma ação judicial,o Ministério Público age somente por si sóou pode receber informação, denúncia ou in-dicação de qualquer do povo?

Promotor de Justiça Daniel Oliveira deOrnelas: O Ministério Público age de ofícioou por provocação. Será de ofício sempre quetomar conhecimento, por qualquer meio, deum ilícito ambiental. Em tais casos, tem o de-ver funcional de promover apurações a atri-

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buir responsabilidades. Por outro lado, atuatambém por provocação, ocasião em que qual-quer do povo leva ao conhecimento do Minis-tério Público a notícia do ilícito ambiental.Nesta última hipótese, tal “representação”pode ser formulada por qualquer meio, sejaoral, escrito ou, até mesmo, via internet. Sefor uma representação oral, serão colhidas as

declarações do representante, será instaura-do um procedimento específico, podendo sero Inquérito Civil, uma Notícia de Fato ou mes-mo um Procedimento Preparatório, para apu-ração das informações trazidas ao conheci-mento do Parquet, como forma de subsidiar asua atuação, seja extrajudicial ou judicial-mente.

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ARTIGOS DOCORPO DOCENTE

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RESUMO

A Lei 11.101/2005, ao regulamentar os institutosda recuperação de empresas e falência noordenamento pátrio, orienta-se em princípios comoo da preservação da empresa, sua função social eviabilidade econômica. Estes preceitos servem defundamento para a interpretação e aplicação daLei. O diploma legal prevê procedimentos própriospara o processamento da ação, buscando assegurarsegurança jurídica às decisões. Contudo, diante dodinamismo que envolve o cenário econômico daempresa, o aplicador da Lei tem se mostradoflexível ao rigor formal quando verifica apossibilidade de manutenção da unidade produtiva.Diante da possibilidade de realização de depósitoelisivo para afastar a falência, tem crescido oentendimento de aceitação de pagamentoextemporâneo baseado na sobrevivência donegócio.

Palavras-chave: Falência. Depósito Elisivo.Flexibilização. Preservação da Empresa.

1 INTRODUÇÃO

A atividade empresarial representa uma dasmolas propulsoras da economia do país. O seuexercício se encontra positivado no arcabouço le-gal, o que confere segurança e legitimidade àsnegociações realizadas.

A legislação pátria voltada às práticas em-presariais prevê a regulamentação do seu exercí-cio, sistematiza os títulos utilizados nas transaçõescotidianas, confere os delineamentos aos contra-tos entabulados, além de dispor de instrumentosjurídicos específicos para empresas que se encon-tram em situação de crise.

Por seu turno, a Lei 11.101/05, ao dispor so-bre os institutos da recuperação de empresas e

PROCESSO FALIMENTAR: o depósito elisivo extemporâneo comfundamento na preservação da empresa

Kelle Grace Mendes Caldeira e Castro1

falência, oferece ao empresário meios de supera-ção da situação anômala ou de proceder à liquida-ção do patrimônio da empresa de forma transpa-rente e assistida.

O referido texto legal, através de preceitosde ordem material e processual, estrutura os pro-cedimentos que deverão ser observados pelas par-tes e operadores da lei no curso do processo.

Nos termos do artigo 94 da Lei em comentá-rio, será decretada a falência do devedor empre-sário se uma das seguintes situações restar confi-gurada: não pagamento, sem argumento jurídicopertinente, de obrigação materializada em título cujovalor ultrapasse quarenta salários mínimos; queapós ter sido executado, não pagou ou nomeou bensà penhora; ou que tenha praticado atos de falên-cia, elencados no texto da lei.

Em contrapartida, no prazo de defesa, o de-vedor poderá pleitear sua recuperação judicial,apresentar justificativa de direito para oinadimplemento, ou afastar os indícios de exercí-cio ruinoso da atividade. Também é conferido aoempresário a oportunidade de reconhecer a pro-cedência da dívida e efetuar pagamento, afastan-do a presunção de insolvência jurídica.

Segundo o diploma legal, a possibilidade deelisão da falência através da liquidação do débitodeve ser feita dentro no prazo de contestação, fi-xado em dez dias, desde que o devedor o faça naintegralidade, acrescidos de correção monetária,juros e honorários advocatícios.

Superadas as situações de defesa e dianteda impossibilidade do empresário em cumprir osrequisitos legais a falência será decretada.

Ocorre que, diante do dinamismo do cená-rio empresarial, o aplicador do direito se deparacom situações em que o empresário não cumpreem tempo hábil a obrigação de pagamento da dí-vida, mas extemporaneamente se mostra apto asaldá-la. Em tais casos, o julgador enfrenta doiscaminhos: aplica o texto de lei e decreta a sua

1 Professora da Faculdade de Direito Santo Agostinho. Mestranda em Direito Empresarial pela Faculdade de DireitoMilton Campos. Especialista em Direito Empresarial pela Escola Superior de Advocacia da OAB/MG. Advogada.

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falência ou se vale de princípios orientadores dodiploma legal e, com fundamento na preservaçãoda empresa, afasta a quebra e dá oportunidade àmanutenção do negócio.

O presente artigo apresenta apontamentosque reforçam a importância da consideração dodiploma falimentar dentro de um contexto maisamplo. Através da análise da atividade empresari-al inserida em um complexo integrado por normas,enfatiza-se, contudo, a sua avaliação de forma sis-temática, atendendo a fins maiores de manuten-ção da unidade produtiva e circulação de riqueza.

Trata-se de um esboço sobre a possibilidadede se aceitar depósito elisivo extemporâneo, afas-tando a decretação da quebra da empresa, comrespaldo no princípio da preservação da empresa.

2 A LEI DE FALÊNCIAS E O PRINCÍPIODA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA

A Lei 11.101/05, ao dispor sobre instrumen-tos que a empresa em crise econômico financeira,pode se valer para superar uma situação atípicano exercício regular de sua atividade, bem comodos elementos delineadores do processo de falên-cia, corrobora para a segurança jurídica necessá-ria ao estabelecimento das atividades negociais.

A intenção do legislador na ordenação dosdispositivos é observada através de princípios quese mostram presentes de forma expressa, mas tam-bém implícitos no corpo da lei.

Desde o relatório (BRASIL, 2014) que ex-pôs os fundamentos para aprovação da Lei apre-sentado pela Comissão de Assuntos Econômicosdo Senado Federal, seu Relator, Senador RamezTebet, esclareceu que o texto foi planejado de modoa proporcionar, principalmente, a superação da crisee manutenção da atividade econômica. E apresen-tou doze princípios que podem ser apreendidos nainterpretação da Lei. Ao listá-los elenca no topo oprincípio da preservação da empresa, sob os se-guintes fundamentos:

Preservação da empresa: em razão de suafunção social, a empresa deve ser preser-vada sempre que possível, pois gera rique-za econômica e cria emprego e renda, con-tribuindo para o crescimento e o desenvol-vimento social do País. Além disso, aextinção da empresa provoca a perda doagregado econômico representado peloschamados “intangíveis”, como nome, pon-to comercial, reputação, marcas, clientela,rede de fornecedores, know-how, treina-

mento, perspectiva de lucro futuro, entreoutros (BRASIL, 2014).

Eleva-se o princípio da preservação da em-presa, como consentâneo da função social que devepermear o exercício da atividade empresarial,corolário da dignidade da pessoa humana inseridono artigo 170 do texto constitucional, que arrola osprincípios da ordem econômica.

Na doutrina de Bruscato (2011, p. 515), aautora esclarece:

A vedete do moderno direito concursal é,sem dúvida, o princípio da preservação daempresa espelhado, entre nós, no art. 47 dalei. Deve a empresa ser preservada para queseus agregados sociais não sofram soluçãode continuidade, ou seja, para que postosde trabalho sejam mantidos, para que a inci-dência fiscal continue, para que se preser-vem as possibilidades de investimento eminovação tecnológica, para que se mante-nham as facilidades de acesso da popula-ção a bens e serviços e para que a economiado lugar não sofra com a extinção de iniciati-vas empresariais. A empresa merece ser pre-servada pela função social que exerce.

A preservação da empresa está presente emtoda a Lei 11.101/05 ao oferecer ao empresáriocondições para que continue a sua atividade. Atra-vés de um planejamento de renegociação de dívi-das, alterações na estrutura da empresa e contan-do com a participação ativa dos credores, a Leiprevê a Recuperação de Empresas, que pode serefetivada de forma judicial ou extrajudicial. Tam-bém dispõe de um procedimento especial para quemicroempresas e empresas de pequeno porte ob-tenham dilações de prazo no pagamento de dívi-das.

A manutenção da fonte produtora também éevidenciada no instituto da falência. Apesar de setratar de um processo de liquidação do patrimôniodo devedor para pagamento de suas dívidas, antesde se ultimar esta consequência máxima, a Leioferece ao devedor oportunidades de afastar a in-solvência jurídica. Poderá exercer a ampla defe-sa, através dos meios em Direito admitidos e des-locar a discussão acerca da falência, realizando odepósito elisivo. Ademais, ao estabelecer um piso,um patamar mínimo, para propositura da ação defalência com base na impontualidade, restringe apropositura de ações com o simples intuito de dis-por de instrumento mais coercitivo de cobrançade dívida.

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Contudo, o princípio da preservação da em-presa deve ser sopesado com outros preceitoscomo a da viabilidade econômica. Restando de-monstrada que a manutenção da atividade peloempresário é inócua, a falência deve ser decreta-da. E, mesmo neste caso, a Lei prevê situaçõesem que o negócio poderá ser exercido por tercei-ros com vistas à manutenção da fonte produtora.São inúmeras as possibilidades de alienação dosbens da empresa que proporcionam osoerguimento da atividade. Dentre elas, a aliena-ção do estabelecimento em bloco, de suas filiaisou de unidades isoladas. Destaca-se, como estí-mulo à alienação, a não sucessão pelo adquirentedas obrigações do devedor, independentemente desua natureza.

A essência da Lei comprova o relevante pa-pel da empresa para o equilíbrio da economia dopaís, na circulação de riquezas, na produção denovas tecnologias e geração de empregos. Sobre-leva-se o seu desempenho como fontearrecadadora de recursos para o desenvolvimentodas funções do Estado, através do pagamento detributos.

3 MEIOS DE DEFESA NA FALÊNCIA

A ação falimentar é o instrumento legal quedispõe o credor para demonstrar a incapacidadedo empresário devedor de se manter no exercícioda atividade, por se encontrar em situação de in-solvência. Esta falta de habilidade do empresáriopara o exercício dos negócios se traduz nodescumprimento de obrigações perante seus cre-dores ou na prática de atos que evidenciam o es-tado ruinoso.

Dos ensinamentos de Ricardo Negrão:

Falência é um processo de execução coleti-va, no qual todo o patrimônio de um empre-sário declarado falido – pessoa física oujurídica- é arrecadado, visando o pagamen-to da universalidade de seus credores, deforma completa ou proporcional. É um pro-cesso judicial complexo que compreende aarrecadação dos bens, sua administração econservação, bem como a verificação e oacertamento dos créditos, para posterior li-quidação dos bens e rateio entre os credo-res. Compreende também a punição de atoscriminosos praticados pelo devedor falido(NEGRÃO, 2001, p. 247).

Diante dos diversos aspectos que envolvemo procedimento, tem-se inicialmente uma fase pré-

-falimentar em que se verifica o preenchimentodos pressupostos para a decretação de falência.

A Lei 11.101/05 elenca no seu artigo 94 situ-ações que se restarem caracterizadas tornam pa-tente a insolvência jurídica do empresário e acar-retam a decretação de falência. A quebra serádeterminada nos casos de impontualidade, em ra-zão do inadimplemento de título devidamente pro-testado no valor mínimo de quarenta salários míni-mos, ou pela execução frustrada. E, ainda, pelaprática de atos considerados ruinosos, que com-provam o intuito do devedor de não manter o ne-gócio e de frustrar as responsabilidades peranteseus credores.

Por seu turno, a Lei oferece ao devedor pos-sibilidades de afastar a decretação da falência pormeio de contestação, no prazo de dez dias, apre-sentando matéria de defesa condizente com osfundamentos do pedido.

Nos pedidos de falência com base naimpontualidade (art. 94, I, da Lei 11.101, de 2005)poderão ser apresentadas como matéria de defe-sa: falsidade do título, prescrição, nulidade de obri-gação ou de título, pagamento da dívida, qualqueroutro fato que extinga ou suspenda obrigação ounão legitime a cobrança de título, vício em protes-to ou seu instrumento, cessação de atividade em-presarial há mais de dois anos.

Nos pedidos fundados na execução frustra-da (art. 94, II), é possível que se apresente fatoimpeditivo, suspensivo ou modificativo do direitodo credor.

Na ação com suporte na prática de atos rui-nosos (art. 94, III) não há discussão sobre a legiti-midade de dívida. Portanto, a defesa deverá serdirecionada à inocorrência do ato de falência quetenha sido atribuído à empresa devedora.

Possibilita-se, também ao devedor, durante oprazo da contestação, requerer a sua recuperaçãojudicial.

O texto legal ainda prevê, nos pedidos defalência baseados na impontualidade e execuçãofrustrada, que o devedor apresente depósito elisivode falência com o objetivo de afastar a presunçãode insolvência e a consequente decretação da que-bra.

4 O DEPÓSITO ELISIVO:CARACTERÍSTICAS

Nos termos do art. 98, parágrafo único, dodiploma falimentar, durante o prazo da contesta-ção o devedor poderá afastar a falência através

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do pagamento da dívida principal, acrescida de ju-ros e honorários advocatícios.

O depósito elisivo se traduz na demonstra-ção do devedor de que possui condições de semanter à frente do negócio e retira o foco da açãoacerca da sua insolvência.

Caso o devedor opte simplesmente por de-positar o valor devido, reconhecendo a procedên-cia da dívida, o juiz determinará o levantamento dovalor pelo autor. Nesta situação a ação assumeum caráter de cobrança.

Entretanto, o devedor também poderá reali-zar o depósito e discutir a validade da dívida, cir-cunstância em que o pagamento tem a naturezade caução, deslocando a demanda para a legitimi-dade do título. Se a defesa apresentada pelo em-presário devedor for acolhida, este estará autori-zado a fazer o levantamento do valor. Mas, se nãoobtiver êxito em sua contestação, o credor terá oseu crédito satisfeito. Todavia, a falência não serádecretada em razão do depósito realizado.

O afastamento da falência através do depó-sito elisivo gera discussões de ordem prática, prin-cipalmente acerca do valor integral a ser consig-nado, no que se refere aos honorários advocatícios,juros e correção monetária. Há dúvidas se a faltado depósito na sua totalidade impõe a decretaçãoda quebra.

Segundo enfatiza Ricardo Negrão:

Observa-se, contudo, que nem sempre, noexíguo prazo de defesa há possibilidade deo devedor se assegurar do valor total dodébito, sobretudo porque ainda desconhe-cido o montante que será arbitrado a títulode honorários. Se houver essa dificuldade,o devedor deve depositar o principal e, jun-to com este, requerer o arbitramento doshonorários e a elaboração de conta paracomplementação de seu depósito(NEGRÃO, 2001, p. 280).

Sobre o assunto Coelho (2013, p. 285) expõeo seu posicionamento sob os seguintes fundamen-tos:

O pedido de falência deve ser visto semprecomo processo de cobrança, não havendorazão para deixar de satisfazer integralmen-te o direito do credor. Mesmo a doutrinaque não o considera assim entende que opedido de falência elidido frustra o objeti-vo da instauração da execução concursal econverte-se num processo de cobrança. Acorreção monetária é devida a partir do

vencimento do título executivo queembasou o pedido. A Súmula 29 do STJ,editada nos anos 1980, preceitua que o pró-prio depósito elisivo deve compreender,desde logo, a correção monetária, além dejuros e honorários de advogado. A lei atualincorporou o entendimento jurisprudencial(LF, art. 98, par. único). A aplicação rigoro-sa da norma legal ou do preceito simuladoconduz ao reconhecimento da ineficáciaelisiva do depósito feito sem essas verbas,isto é levando-se o critério às últimasconsequências o juiz deve aplicar a falên-cia do requerido que decretou apenas ovalor histórico ou nominal da dívida. Con-sidero, porém, que esse apenas é o casoquando a economia é significantemente in-flacionária, e o montante histórico consig-nado em juízo não representa parte subs-tancial da quantia efetivamente devida.Quando estabilizado o poder de compra damoeda, o Judiciário deve atribuir efeitoelisivo ao depósito do principal, denegandoa falência; o recebimento dos juros e corre-ção monetária decorrerá, nesse caso, daexecução da sentença denegatória, junta-mente com os ônus de sucumbência.

Por outro lado, quando o credor sinaliza po-sitivamente para um possível acordo com o deve-dor e posteriormente este acerto não se efetiva,fica em situação vulnerável, pois o seu pedido ini-cial se transfigurou para uma renegociação de dí-vida e a falência não será decretada.

Sobre o tema, há a seguinte elucidação:

Interessante notar que, se dentro do prazo dacontestação o credor requerer osobrestamento do feito por estar em entendi-mento com o devedor para composição dalide ou informar acordo ou parcelamento, casoseja improfícua essa tentativa ou o devedorvenha a descumprir o acordo feito, existe ten-dência a não mais ser decretada a falência,pois se caracteriza a concessão de moratóriapor parte do credor, o que desnatura aimpontualidade, impedindo a decretação defalência (BRUSCATO, 2011, p. 657).

Um dos pontos de maior impasse a respeitodo depósito elisivo gira em torno da possibilidadede flexibilização do prazo para a sua realização.

Diante das consequências gravosas que o en-cerramento da atividade acarreta, como paralisaçãodo negócio, desemprego, desvalorização do patrimônioda empresa, perda de receita de tributos, revela-senecessária a discussão sobre a não decretação daquebra em caso de depósito elisivo extemporâneo.

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5 DA FLEXIBILIZAÇÃO DO PRAZOPARA APRESENTAÇÃO DE DEPÓSITOELISIVO

O procedimento falimentar prescreve que odevedor, nas hipóteses de falência fundada naimpontualidade e execução frustrada, tem o prazode dez dias para apresentar contestação e, que-rendo, realizar depósito elisivo, situação em que apresunção de quebra ficará definitivamente afas-tada.

Em que pese a letra da lei que prevê expres-samente o prazo de dez dias, o que representaavanço em relação a legislação anterior (Decreto7.661/45) cujo prazo era de vinte e quatro horas, odiploma legal merece ser analisado sob uma pers-pectiva sistêmica.

O aplicador da lei, ao apreciar um pedido defalência, depara-se com uma situação fática a serobservada sob diversas variáveis. A segurança ju-rídica que se busca em um posicionamento judicialserá obtida pela observância da lei, mas tambémem respeito aos princípios da preservação da em-presa, sua função social e viabilidade econômica.

Conforme descreve Écio Perin Júnior:

Levando em conta o princípio da preserva-ção da empresa, espírito da novel legisla-ção, entendemos que deve-se admitir o de-pósito elisivo extemporâneo, posto que,mesmo com a ampliação do prazo para de-pósito (10 dias), este ainda é, na prática,difícil de ser cumprido (PERIN JÚNIOR,2011, p. 146).

Também neste sentido, a jurisprudência temsido receptiva à possibilidade de conceder ao de-vedor a oportunidade de ter elidida a falência emrazão de depósito ou acordo extemporâneo cele-brado entre as partes. Em casos concretos, o fun-damento da manutenção do negócio e menor pre-juízo para a economia tem levado juízes a permitiressa prática.

O posicionamento de tribunais tem reforça-do as circunstâncias de depósito ou acordo reali-zados a destempo:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. FALÊN-CIA. QUEBRA DECRETADA COM BASENA IMPONTUALIDADE. ART. 94, I, DALEI 11.101/2005. PAGAMENTO INTE-GRAL. PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DAEMPRESA. REVOGAÇÃO DAFALÊNCIA. Deve ser levantada a quebrada recorrente, tendo em vista que a decre-

tação da falência foi feita com base naimpontualidade, ou seja, na falta de paga-mento de obrigação líquida e certa no seuvencimento, tendo, contudo, após a decre-tação da quebra, a recorrente pago aintegralidade do débito, inclusive com seusconsectários legais. O depósito realizadomesmo após a decretação da quebra tem ocondão de elidir a falência decretada. Deveser aplicado à hipótese o princípio da pre-servação da empresa, devendo este preva-lecer sobre o rigorismo formal. (TJRS. Agra-vo de Instrumento n. 70045338365, Relator:Des. Romeu Marques Ribeiro Filho. Datada decisão: 14.12.2011).

COMERCIAL E PROCESSUAL CIVIL. FA-LÊNCIA DECRETADA. ACORDO CELE-BRADO APÓS O JULGAMENTO DA APE-LAÇÃO. RECURSO ESPECIAL. HOMOLO-GAÇÃO PRÉVIA DA TRANSAÇÃO. POS-SIBILIDADE. PROCESSO FALENCIAL.EXTINÇÃO. I. Possível a homologação deacordo entre a autora do pedido de quebrae a devedora, quando celebrado posterior-mente ao julgamento da apelação que de-cretou a falência, configurado, no caso, opropósito de mera cobrança de dívidaexecutável, indemonstrado o estado de in-solvência. II. Transação homologada, re-curso especial não conhecido, por prejudi-cado (STJ. Resp n.º 602.107 - MG (2003D0194419- 5). Relator: Ministro Aldir Passa-rinho Junior. Julgado em 15/12/2009).

AGRAVO DE INSTRUMENTO. Se, mesmono curso do processo de falência, o deve-dor satisfaz sua obrigação com o credor –e, pois, demonstra não ser insolvente – podeo Magistrado, atendendo aos fins sociaisda lei, deixar de decretar-lhe a quebra (art.1.º do Decreto-Lei n.º 7.661/45). O Decreto--Lei n.º 7.661/45 deve interpretar-se à luz daConstituição Federal de 1988 e, destarte,fomentar a preservação “da empresa eco-nômica viável, ainda que atravesse dificul-dades financeiras transitórias” (cf. CarlosAlberto Farracha de Castro, in Rev. Tribs.,vol. 776, p. 90). Princípio esse de grandesabedoria e relevo social, que a nova Lei deFalências (Lei n.º 11.101/2005) consagrouem seu art. 47, in verbis: “A recuperaçãojudicial tem por objetivo a superação da si-tuação de crise econômico-financeira dodevedor, a fim de permitir a manutenção dafonte produtora, do emprego dos trabalha-dores e dos interesses dos credores, pro-movendo, assim, a preservação da empre-sa, sua função social e o estímulo à ativida-de econômica”. A aceitação de pagamentoparcial do débito, circunstância que equi-

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vale a moratória, elide a falência (cf. Rev.Tribs., vol. 777, p. 261; Rel. Roberto Stucchi).(TJSP - AI n.º 359.785-4/0-00-Mirassol-SP;4.ª Câm. de Direito Privado; Rel. Des. CarlosBiasotti; j. 28/4/2005; v.u.).

AGRAVO DE INSTRUMENTO - DECRE-TAÇÃO DE FALÊNCIA - O valor inicial-mente pretendido pela credora, ora agrava-da, foi substancialmente reduzido quandoda prolação da r. decisão recorrida - Prece-dentes deste Egrégio Tribunal de Justiçaaceitam o depósito elisivo extemporâneo.Aceita a possibilidade do depósito elisivotardio, com maior razão deve ser aceito,neste caso, a concessão do prazo de 10(dez) dias para realização de depósitoelisivo, pois houve grande redução no va-lor, de fato, devido. RECURSO PROVIDO,COM OBSERVAÇÃO (TJSP. AI414605020128260000-SP 0041460-50.2012.8.26.0000. 2.ª Câmara Reservada deDireito Empresarial. Relator: Roberto MacCracken. Julgamento: 6/11/2012).

Diante da possibilidade de manutenção daatividade econômica produtiva, devem ser sope-sados o texto da lei e a sua real intenção. Desdeque seja razoável a preservação da empresa edemonstrado que não houve maiores prejuízos aterceiros a quebra deve ser afastada.

6 CONCLUSÃO

A legislação falimentar constitui arcabouçoespecífico para ofertar segurança jurídica àquelesque procuram meios de restruturação da atividadeempresarial que passa por crise econômico-finan-ceira, através dos institutos da recuperação deempresas.

A lei também norteia a proteção jurídica decredores que, ao verificarem os pressupostos queevidenciam a insolvência da empresa devedora,recorrem a instrumento apto a resguardar os seusinteresses e da coletividade.

O exame das circunstâncias concretas quepodem acarretar a falência de uma empresa deveser feito para propiciar uma condução justa do pro-cesso falimentar, garantindo uma prestaçãojurisdicional adequada.

Busca-se segurança jurídica a partir do tex-to da lei, mas o excessivo rigor formal prejudicauma solução apropriada à necessidade das partes.Assim, a análise da situação concreta deve serfeita com fundamento em princípios como a fun-ção social da empresa, a continuidade da ativida-

de e sua viabilidade econômica.O dinamismo das práticas negociais e a im-

portância da empresa na geração de riquezas temexigido do julgador uma visão diferenciada na apli-cação do direito.

Diante de tais perspectivas, a jurisprudênciatem se mostrado aberta a uma interpretação siste-mática do diploma legal.

Nos casos de recuperação judicial, tem-sepermitido a prorrogação do prazo de 180 dias desuspensão das ações e execuções contra o deve-dor, proporcionando melhores condições pararestruturação das dívidas. A Corte Especial doSuperior Tribunal de Justiça, reconheceu a dispensade apresentação de certidão negativa de débitotributário para a homologação do plano de recupe-ração judicial (BRASIL, 2013).

Nas ações de falência a aceitação tardia dodepósito elisivo e celebração de acordo entre aspartes possibilitam a manutenção da atividade.

Contudo, a preservação da empresa não re-presenta princípio inconteste. Verificada ainviabilidade econômica do negócio, a falência deveser decretada, evitando-se maiores prejuízos paraa coletividade de credores e no âmbito de influên-cia da atividade.

Cada caso deve ser visto de forma pontual,aplicando-se a medida adequada à situação eco-nômica da empresa.

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BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. RecursoEspecial N.º 1.187.404 - MT (2010/0054048-4).Relator: Ministro Luís Felipe Salomão. Diárioda Justiça Eletrônico. Brasília, DF, 21 ago.2013.

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MAMEDE, Gladston. Direito empresarialbrasileiro: falência e recuperação de empresas.v. 4. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2008.

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ARTIGOS DOCORPO DISCENTE

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RESUMO

A justiça é para todos. É o que se afirma no art.5.º, XXXV, da Constituição da República Federa-tiva do Brasil de 1988. No entanto, faz-se impor-tante questionar sobre como se encontra a aplica-ção da acessibilidade ao Judiciário. O presenteartigo tem como objetivo não tão somente argu-mentar, como despertar e contribuir para a forma-ção de opinião quanto à realidade atual do Judiciá-rio. Ao se observar o contexto geral e, posterior-mente trazendo para a realidade vivenciada noBrasil, percebe-se que acessar os Tribunais for-mais, ou seja, ter contato com a Justiça Formal,muitas vezes se torna uma tarefa extremamentedifícil e, para alguns, até mesmo impossível, devi-do à estrutura e aos altos custos da justiça formal.

Palavras-chave: Acesso à Justiça; abarrotamentodos Tribunais; parcialidade.

ABSTRACT

Justice is for everyone. That is what is stated inthe article 5, XXXV, of the Constitution of theFederative Republic of Brazil, 1988. However, itis important to find out about how the applicationof accessibility to the courts is. This article aims tonot only argue, but also awaken and contribute toforming an opinion about the current reality of thejudiciary. By observing in a general context andsubsequently bringing to the reality experienced inBrazil, it is noticed that access to the formal courts,that is, having contact with the Formal Justice, oftenbecomes an extremely difficult task and for some,

O ACESSO À JUSTIÇA FORMAL:um olhar sob o viés da perspectiva sociológica do direito1

Antônio Maria e Silva2

even impossible, because of the structure and thehigh costs of formal justice.

Keywords: Access to justice; overcrowding ofcourts; partiality.

1 INTRODUÇÃO

O acesso à Justiça Formal3 não é para to-dos. A Justiça dos Tribunais – Justiça em que há oenvolvimento do Estado – se mostra inacessívelaos indivíduos em alguns casos, devido a diversosfatores, como o abarrotamento dos Tribunais, fa-tores sociais e econômicos, que serão apresenta-dos ao longo deste artigo. Ao se analisar a socie-dade contemporânea como um todo e, sob a visãodo sociólogo português Boaventura de Sousa San-tos, é possível observar os graves problemas queassolam a Justiça e impedem que o homem médioa acesse.

A preocupação com os Tribunais e a formade atuação na sociedade se deu após a década desessenta. Antes disso, a Sociologia, assim como oDireito4 de uma forma ampla (até 1945), que viviaa fase do positivismo jurídico, a norma pura e apli-cada, tinham como centro das atenções a norma ea sua aplicação segundo uma estrutura silogísticaperfeita, construída por Aristóteles e aperfeiçoadapelo filósofo polonês Chaim Perelman.

Dessa forma, a preocupação da Sociologiaera com a teoria. Na década de sessenta, o Direitose encontra no pós-positivismo jurídico, queconsistia em uma mescla do positivismo jurídicocom a capacidade de observação e interpretaçãode cada caso. Sendo assim, a Sociologia passou a

1 Artigo apresentado à disciplina Português II, ministrada pela Professora Noêmia Coutinho Pereira Lopes.2 Acadêmico do Quarto Período de Direito da Faculdade de Direito Santo Agostinho.3 Justiça Formal ou Estatuída diz respeito aos Tribunais formais, aos mecanismos formais de acesso à Justiça. O

Tribunal, o Juiz, Promotor e Advogado são exemplos de mecanismos apresentados pelo Estado para a resoluçãodos litígios da sociedade.

4 O Direito está sendo empregado em dois sentidos: enquanto Ciência; enquanto Norma, ou seja, como um conjuntode normas jurídicas que regulam a sociedade, capaz de determinar seu comportamento.

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buscar avaliar a prática. Nesse ponto, pode-seperceber certa inversão no que diz respeito àsteorias. Os teóricos e seus postulados deixam deganhar tamanha notoriedade e os impactos geradosna sociedade ganham maior visibilidade naSociologia.

Esse fator mostra a preocupação com aatuação de forma efetiva dos Tribunais perantetoda a sociedade. O que realmente importa agorapara a Sociologia, assim como para o Direito, écomo os Tribunais vão agir. Tem-se uma grandepreocupação com o acesso das pessoas à JustiçaFormal: se os Tribunais, de fato, são abertos a todoo público e se o fato de serem abertos a todos é osuficiente. A questão é se as pessoas de classessociais, econômicas e culturais distintas terão omesmo acesso aos Tribunais formais, e não tãosomente as classes hegemônicas, como se temobservado no estudo realizado por Boaventura deSousa.

Nesse momento surgem questionamentosquanto à aplicabilidade da Justiça Formal e de seualcance. Segundo Santos (2013, p. 206):

[...] a contribuição da sociologia constituiem investigar sistemática e empiricamenteos obstáculos ao acesso efetivo à justiçapor parte das classes populares com vistaa propor as soluções que melhor os pudes-sem superar. Muito em geral do que podedizer-se que os resultados desta investiga-ção permitiram concluir que eram três obs-táculos: econômicos, sociais e culturais.

Esses três fatores proporcionam uma bar-reira entre os indivíduos e o Tribunal, gerando nãoapenas desigualdade, como também, uma refle-xão quanto à Lei5 postulada e ao que essa provo-ca na sociedade.

Outra questão a ser levantada diz respeito àAdministração da Justiça Formal. A estrutura ju-diciária, como se encontra hoje, seria suficientepara atender a todos? Sendo outra fonte de gran-de preocupação, seja da Sociologia, seja do Direi-to, a estrutura dos Tribunais formais vem se mos-trando responsável também pela obstrução ao aces-so à Justiça Formal. O abarrotamento dos tribu-nais e a parcialidade apresentada pelo magistradocontribuem para o afastamento dos indivíduos emrelação aos Tribunais. Por isso, a necessidade demeios alternativos de acesso à Justiça, que pos-

sam contribuir para o fim do abarrotamento dosTribunais formais, e meios que permitam aos indi-víduos resolverem seus litígios.

2 FATOR ECONÔMICO

Pagar por direitos, pagar pelo que lhe é ga-rantido e não obstante a isso, pagar mais quandose tem menos. O fator econômico se mostra comoum inibidor do acesso à Justiça Formal. Com avitimização feita ao indivíduo devido aos altos cus-tos de um processo formal surge o questionamentose o Tribunal de fato é para todos. Sabe-se queexistem medidas tomadas pelo Estado como Justi-ça Gratuita aos hipossuficientes – mas, o fato denão se encaixar como hipossuficiente significa tercondições de arcar com um processo? O investi-mento das Faculdades de Direito nos Núcleos dePesquisas Jurídicas ou Núcleos de Práticas Jurídi-cas (NPJ’s) seria uma possível solução.

O fator econômico destaca-se pelos custoselevados gastos na Justiça Formal. Resolver litígiosem um Tribunal formal é caro, muito caro. Ao avaliaro custo de um processo, percebe-se a vitimizaçãofeita ao indivíduo, o que Santos chama de duplavitimização, que consiste numa inversão incoerentee até mesmo cruel dos gastos com a resolução delitígios através dos Tribunais. Os processos de causasmenores se comparados a processos de causasmaiores são proporcionalmente mais caros.

Para ilustrar esse quadro de desigualdade –e por que não dizer exploração? – é apresentado,na obra de Santos, Pela mão de Alice: o social eo político na pós-modernidade, uma pesquisarealizada por Cappelletti e Garth, em países euro-peus, demostrando que:

[...] na Alemanha, verificou-se que alitigação de uma causa de valor médio naprimeira instância de recurso custaria cercade metade do valor da causa. Na Inglaterra,verificou-se que, em cerca de um terço dascausas em que houve contestação, oscustos globais foram superiores aos do valorda causa. Na Itália, os custos da litigaçãopodem atingir 8,4% do valor da causa nascausas com valor elevado, enquanto nascausas com valor diminuto essa percentagempoder elevar-se a 170% (CAPPELLETTI;GARTH, apud SANTOS, 2013, p. 206).

5 Instrumento composto do texto normativo do qual se extrai regras (normas e princípios) através de atividadeinterpretativa.

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Seria esse motivo o suficiente para afastar oindivíduo dos Tribunais formais, principalmenteaquele que tem como litígio uma causa mais sim-ples, algo que envolva interesses menores. Comoexposto, há casos em que o gasto com o processoserá maior do que os frutos positivos gerados porele. Assim, se um trabalhador, ao ser despedido dedeterminada empresa, recorre à Justiça Formalpara exigir todos os seus direitos trabalhistas, como,por exemplo, salários atrasados e benefícios, podeocorrer de gastar mais com o processo do que re-ceberá. O que provoca, de certo modo, espanto éque ao acessar a Justiça Formal, na situaçãoespecificada, deve-se pagar para obter direitos,direitos estes já pertencentes ao indivíduo que emvez de reconhecidos, acabam sendo comprados.Por isso, a necessidade de meios alternativos paraa resolução de litígios.

Seguindo a linha da vitimização, observa-seoutro ponto: a tripla vitimização, além de caro einversamente proporcional quanto aos custos, oprocesso é moroso, sendo a lentidão convertidaem mais gastos. Sobre isso, vem a doutrina paraaclarar, assim:

No final da década de 60, a duração média deum processo civil na Itália era, para o percur-so de três instâncias, 6 anos e 5 meses (RES-TA, 1977, p. 80); alguns anos mais tarda, naEspanha, essa duração era cerca de 5 anos e3 meses (CAPPELLETTI; GARTH, 1978, p.14). No final da década 60, as ações civisperante o tribunal de grande instância emFrança duravam 1,9 ano e perante o tribunalde primeira instância na Bélgica 2,3 anos(CAPPELLETTI; GARTH, 1978).

Observam-se os três grandes golpes do fa-tor econômico ao acesso aos Tribunais formais. Ademora em obter a resolução do litígio ou o trâmi-te processual é convertida em mais gastos. Comose não fosse suficiente a vitimização econômica esua inversão de valores, o que já era caro, é maiscaro proporcionalmente às causas menores. Alémdo mais, torna-se mais caro ainda pela lentidãoprocessual – o que é extremamente contraditório,ter que pagar mais por um erro do próprio sistemajudiciário – ganhando destaque, pois, trata-se deuma realidade conhecida no Brasil, salientando-seapós a redemocratização.

3 FATOR SOCIAL

Sendo o segundo fator elencado por Santos,o fator social destaca-se por ser um elemento que,

apesar de ligado a fatores econômicos, possui suaspeculiaridades. As diferenças no estrato social dosindivíduos afetam diretamente não tão somente aoacesso, quanto à compreensão da Justiça comoem geral. Como expõe a visão sociológica,

Estudos revelam que a distância dos cida-dãos em relação à administração da justiçaé tanto maior quanto mais baixo é o estratosocial a que pertencem e que essa distân-cia tem como causas próximas não apenasfatores econômicos, mas também fatoressociais e culturais [...]. Em primeiro lugar,os cidadãos de menores recursos tendem aconhecer pior os seus direitos e, portanto,a ter mais dificuldades em reconhecer umproblema que os afeta como sendo proble-ma jurídico (SANTOS, 2013, p. 208).

Vê-se que a questão social, provocada pordiversos fatores, tanto externos (deficiência edu-cacional e estrutural) quanto internos (deficiênciaapresentada já no seio familiar) reflete naexercibilidade de direitos. Há casos em que o ci-dadão de estrato social mais baixo sequer é capazde reconhecer ou ao menos buscar informaçõessobre os profissionais do Direito. Advogados, de-fensores públicos, promotores e juízes são peçasdesconhecidas por esse público.

Outro ponto explorado é quanto à localiza-ção geográfica do cidadão de estrato economica-mente inferior. Devido a sua fragilidade econômi-ca, reside em locais afastados, geralmente distan-tes dos centros provedores de Justiça, como Es-critórios de Advocacia e Tribunais. É possível ob-servar a necessidade de aproximação da Justiçaformal ao indivíduo até mesmo espacialmente, per-mitir que o cidadão tenha contato com os órgãosformais, não tão somente permitir o acesso à Jus-tiça, mas levar a Justiça ao cidadão. Como citadoanteriormente, os NPJ’s possuem um papel fun-damental no que diz respeito ao acesso e princi-palmente fomentar o acesso dos indivíduos aoamparo da Justiça.

4 FATOR CULTURAL

Estando a maioria dos casos ligados a fato-res sociais, este último fator apresenta como ca-racterística o temor, desencanto e até mesmo osentimento de indiferença quanto à Justiça For-mal. Como em um ciclo vicioso, a cultura e o meiosocial em que o indivíduo se encontra acabam setornando interdependentes, gerando novamente oafastamento dessas pessoas aos Tribunais formais.

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Os mesmos indivíduos de estrato social mais bai-xo, que deixam de acessar os Tribunais, deixamde fazê-lo por questões culturais também.

A Justiça Formal se mostra inacessível nes-te caso devido à falta de conhecimento dos indiví-duos – que acaba tocando a questão social – dis-tanciando-se de seu real papel, o que provoca nes-sas pessoas a formação de convicções culturaisde que a Justiça dos Tribunais não funciona, ouque não compensa nem mesmo buscá-la, pois acre-ditam que nada mudará. Ao se falar em conheci-mento – ou, melhor dizendo, a falta dele – é que sepode ver a importância dos cursos de Direito daatualidade e seus programas. Diversos são os pro-gramas que contribuem para levar informação àpopulação, sendo um destes – apenas a título deexemplo – o projeto SOS Direito.

O Projeto SOS Direito, iniciado em 2002, cominiciativa do Professor José Roberto BolonhiniJúnior, da Universidade São Judas Tadeu, na capi-tal paulista, tem como objetivo orientar a popula-ção sobre seus direitos básicos. Pessoalmente, pormeio de palestras e até mesmo através de progra-mas de rádio e televisivos, o Professor Bolonhiniesclarece dúvidas da população, no que tange àesfera do Direito Civil, Direito do Consumidor bemcomo no que diz respeito à Proteção aos Defici-entes. Pode-se observar o quão eficazes são taisprogramas, permitindo a integração do indivíduoao Direito, buscando romper – como será expostoa seguir – com essa barreira cultural.

Os fatores culturais podem ser divididos emtrês aspectos: o primeiro é quanto ao temor. Emalguns casos, devido ao medo de represálias, mui-tas pessoas deixam de prosseguir com o processoformal ou sequer a ele dão início, por medo.

O desencanto ou descrença quanto à Justi-ça, sendo esse o segundo aspecto, deve-se a doismotivos: o primeiro consiste em experiências frus-trantes – o indivíduo em algum momento já recor-reu ao Tribunal formal e não conseguiu efetivarum suposto direito subjetivo – e o segundo motivose deve ao conhecimento de experiências frustran-tes de outrem relacionadas à Justiça Formal. Aspessoas deixam de procurar os Tribunais por játerem passado por alguma situação que as envol-va e, nesse contexto, não terem alcançado o re-sultado esperado. Desse modo, a descrença éoriunda da deficiência processual em sua moro-

sidade e gastos ou quanto ao contato traumáticoque o Direito lhe proporcionou.

Outro ponto de extrema relevância diz res-peito ao tratamento diferenciado – nesse caso, umtratamento negativo – ao qual os indivíduos aca-bam sendo submetidos. “[...] à luz dos estudos querevelam ser grande a diferença de qualidade entreos serviços advocatícios prestados às classes demenores recursos.” (SANTOS, 2013, p. 219). Per-cebe-se uma discrepância enorme: quem pagamais terá um serviço melhor6. Desse modo, a Jus-tiça Formal, quanto ao seu acesso, mostra-se maisuma vez dificultosa para aqueles de estratosocioeconômico debilitado e culturalmente distan-te do Direito Formal.

Por fim, a indiferença vai além da descren-ça. Na verdade, é a crença de que a Justiça emnada acrescenta. Simplesmente, acreditam os in-tegrantes das classes sociais menos abastadas quea Justiça não possui utilidade efetiva e que em nadacontribuirá para suas vidas. Finaliza-se o ciclo, queilustra as barreiras quanto ao acesso aos Tribunaisformais. Os fatores apresentados compõem umarealidade que pode e deve ser modificada. Paraisso, é necessário que o Direito seja pensado porseus profissionais e acadêmicos que, juntos, pos-sam desenvolver projetos que atendam à socieda-de e derrubem de fato tais barreiras.

5 A ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA

Após expor os três pontos socais que impe-dem o acesso do indivíduo à Justiça Formal, é ne-cessário apresentar o outro lado da moeda. Se deum lado a sociedade deixa a desejar quanto a suaconcepção sobre o que seria a Justiça, a parte es-trutural do Juízo se mostra um fator que jamaispoderia ser ignorado quanto ao afastamento doindivíduo aos Tribunais.

Visando uma reflexão sobre esse contexto,analisa-se a questão sob duas vertentes, sendo aprimeira quanto a critérios subjetivos, apresentadospelos magistrados, e a segunda, quanto a critériosobjetivos, explicitados na estrutura do Tribunal.

5.1 A Parcialidade do Magistrado em suasDecisões

O juiz seria mesmo imparcial em suas deci-sões? Não, de fato, não é imparcial. Tendo como

6 O indivíduo que pertence a uma esfera econômica superior, ao resolver determinado conflito nos Tribunais formais,tem condição de contratar advogados e custear todos os gastos de um processo. Todavia, há casos em que oindivíduo não possui condições de arcar com todas essas despesas e não se encaixa na condição de hipossuficiente.

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objeto de estudo as decisões judiciais, vê-se a par-cialidade dos juízes em suas decisões, como afir-ma Santos (2013, p. 212):

[...] as decisões por eles proferidas e asmotivações delas constantes, passaram aser uma variável dependente cuja aplicaçãose procurou nas correlações com variáveisindependentes, fossem elas a origem declasse, a formação profissional, a idade ou,sobretudo, a ideologia política e social dosjuízes.

Pode-se observar nesse trecho a parcialida-de dos magistrados durante o seu julgamento.Como visto, juízes mais longevos julgam de formadiferente de juízes mais novos, assim como as de-cisões se diferem de acordo com a formação, como estrato social e ideologia de quem as profere.Nesse momento, é necessário tomar certo cuida-do para que não se caia em equívoco. O detentordo poder jurisdicional não necessariamente fere oPrincípio da Imparcialidade7 positivado ao se por-tar dessa forma. O juiz pode estar apto a julgar –segundo o Princípio da Imparcialidade – mesmopossuindo suas convicções para o determinadocaso.

A questão a ser discutida é de extrema com-plexidade. Deve-se avaliar o magistrado como umhomem, uma mulher, enfim, um ser humano. As-sim, é possível observar melhor essa parcialidadevelada, que acaba sendo inerente não tão somentea ele, mas a cada um dos componentes da socie-dade. A parcialidade é, na verdade, composta porsuas convicções, suas paixões, de certa forma umaverdade ontológica que é moldada desde sua in-fância até a sua fase adulta, em que, o magistradoacaba levando consigo toda essa bagagem de co-nhecimento que influencia – de forma subjetiva –em seus julgamentos.

No entanto, a participação subjetiva do juiz éde extrema importância, sendo essa imprescindí-vel para o Direito pós-positivista. Fazendo umabreve retomada histórica, percebe-se o valor des-sa participação.

5.2 O Impacto das Decisões Judiciais e oAbarrotamento dos Tribunais

Utilizando como marco histórico e ponto departida para a sustentação desse raciocínio, tem-

se o ano de 1945, fim da Segunda Guerra Mundial,que seria um divisor de águas para o mundo e parao Direito. Antes de 45, o Direito vivia o momentodo positivismo jurídico. Após a Segunda GuerraMundial, observou-se a grande devastação queessa trouxe, além de feridas profundas aos direi-tos individuais e coletivos. Diante dessa situação,o Direito sente necessidade de modificações. En-tende-se que a norma fria, como era antes de 45,não é mais interessante e que a aplicação pura esimples da lei não é o suficiente para a sociedade.Portanto, implanta-se o pós-positivismo.

O juiz toma o centro da Justiça e, não so-mente detentor do poder jurisdicional, esse podeinterpretar a norma posta e observar suaaplicabilidade para cada caso. E é nesse momentoque a sua parcialidade se dá e, ao decorrer dotempo se acentua e se torna um problema para oacesso à Justiça Formal. A interpretação ganhaespaço para as paixões e torna o magistrado par-cial.

Essa situação contribui para o afastamentodo indivíduo dos Tribunais formais. O julgamentosubjetivo do magistrado, acoplado ao fator cultural– analisado anteriormente – pode contribuir paraesse afastamento, pois, se o juiz julga de acordocom suas convicções, do que adiantaria levar umprocesso a ele, sabendo que esse julgará de formasubjetiva?

O segundo ponto a ser abordado é quanto àestrutura dos Tribunais e sobre essa última, é dadauma atenção especial, tanto pela Sociologia Jurídi-ca, quanto pelo Direito propriamente dito. Os Tri-bunais estão abarrotados e isso é uma realidadeinegável que está presente de forma nítida nasestruturas judiciárias do Brasil, provocando umasituação extremamente desfavorável ao cidadãoquanto ao acesso à Justiça.

Para que se possa entender essa situação,é necessário recorrer à história novamente. Emcaráter global, especificamente no âmbitoeuropeu, a década de 60 se torna o divisor deáguas, demarcando o início da crise doabarrotamento dos Tribunais na Europa, que, deforma simplificada, consiste em pouca estruturae maior demanda.

No Brasil, tal fenômeno ocorre um poucomais tarde. Dá-se o caos na estrutura judiciáriacom a redemocratização. Durante a segunda dita-dura militar (1964 a 1985), o Estado brasileiro se

7 O Princípio da Imparcialidade consiste na equidistância do juiz perante as partes, ou seja, o magistrado deve serimparcial, tratando ambas as partes evolvidas no processo da mesma forma.

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encontrava como um Estado Liberal8. Parece con-traditório o emprego de tais termos no mesmo con-texto, mas deve-se observar que a liberdade doEstado estava relacionada a não garantir direitosaos indivíduos e não em permitir liberdade oumultiplicidade de direitos.

O Ato Institucional n.º 5 foi a implantaçãoacabada do totalitarismo estatal, o comandode todos os brasileiros por uma únicavontade, a ditadura sem qualquer disfarce.Ao contrário dos atos anteriores, o AI-5 nãovinha com vigência de prazo. Seus dozeartigos permitiam o fechamentoindiscriminado do Congresso Nacional,assembleias estaduais e câmaras municipais;reabria as cassações de direitos políticos,dessa vez por tempo indeterminado; aboliao habeas corpus para os detidos por infraçãoda Lei de Segurança Nacional; permitia ademissão de qualquer funcionário públicofederal, estadual, e municipal, inclusivejuízes; suspendia garantias concedidas peloPoder Judiciário; permitia o confisco de benscomo punição pelo que o governoconsiderasse corrupção, além de outrasarbitrariedades (BARROS, 1997, p. 42).

Durante o período militar, muitos dos direitosindividuais foram suspensos, principalmente apósa implantação do AI-5, como exposto anteriormen-te, o que afetou diretamente o acesso do cidadãoaos Tribunais – como exigir um direito que nãomais lhe pertence? Desse modo, a estrutura judi-ciária se encontrava estável.

Todavia, após o término do Governo do Ge-neral João Batista de Figueiredo, quinto e últimoditador militar, e com o processo deredemocratização, o quadro do sistema judiciáriomuda drasticamente. Nesse momento surge – oupelo menos se inicia – o abarrotamento dos Tribu-nais que, novamente constrói um ciclo vicioso. Tri-bunais abarrotados geram morosidade na resolu-ção dos processos, o que acarreta maiores gastos– vitimização do indivíduo – e, atrelada ao fatorcultural, a descrença na eficiência e efetividadedos Tribunais.

Agora o Estado, antes Liberal, passa para oEstado de Providência9. O problema surge exata-mente nesse ponto: garantias, promessas, compro-missos. Todavia, tudo isso sem estrutura ou com

baixa estrutura para atender tamanha demanda.Após 1988, os direitos individuais sãoreestabelecidos, remontados e criados. Ou seja,mais direitos; logo, mais obrigações do Estado.Com a mesma diminuta infraestrutura.

Quando sofre lesão em seus direitos, o cida-dão recorre à Justiça Formal, sendo essa a res-ponsável por garantir a estabilidade da sociedadequanto a litígios e sua resolução. A demanda au-menta, mas a estrutura judiciária não a acompa-nha com a mesma velocidade. Sendo assim, surgea crise na administração da Justiça, tendo o abar-rotamento dos Tribunais como a sua exteriorização.Tendo em vista essa situação caótica, faz-se ex-tremamente necessário repensar o papel dos ju-ristas e dos acadêmicos enquanto pensadores doDireito.

Vejam, se o problema em alguns casos podeser resolvido com uma simples conversa ou cominformações a respeito do Direito, por que não in-centivar tais medidas? Ou melhor, por que nãopermitir ao acadêmico de Direito uma oportunida-de de mostrar seus conhecimentos na prática? OsNPJ’s, por exemplo, permitem que o graduandoatue de forma efetiva na sociedade. Ao longo des-te artigo vai-se apresentar – e até mesmo defen-der – quanto à importância dos NPJ’s e como osacadêmicos de Direito podem ser úteis nesse pro-cesso.

6 RESOLUÇÃO DOS CONFLITOS

Apresentados foram os conflitos e seus res-pectivos fatores, sejam esses, oriundos da socie-dade propriamente dita (fatores sociais, culturaise econômicos) ou da estrutura judiciária (abarro-tamento dos Tribunais e parcialidade nos julgamen-tos) como causadores do afastamento do cidadãoda Justiça Formal. Para tantos problemas que setornam complexos devido ao seu enraizamento nasociedade e sua extensão, Santos aponta possí-veis soluções que, combinadas e empregadas tan-to pelo povo, quanto por profissionais do Direito,poderiam, sim, ocasionar um acesso justo e iguali-tário à sociedade perante aos Tribunais formais.

Quanto ao abarrotamento dos Tribunais, oautor em destaque traz uma solução, de certo modosimples – o que não significa ser fácil. Embasando-

8 O Estado não mais intervinha na vida das pessoas, nesse caso, em específico – Ditadura Militar - o Estado Liberalse deu na suspensão e até mesmo ausência de direitos, ou seja, o Estado não assegurava o indivíduo.

9 O Estado de Providência passa a assegurar os indivíduos, torna-se intervencionista, garantindo direitos à sociedade.

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-se no sociólogo austríaco Eugen Ehrlich, é apre-sentado o Direito Fático, teoria defendida pelo aus-tríaco e tomada de empréstimo por Santos comosolução, ou pelo menos minimizador, do abarrota-mento nos Tribunais.

Ehrlich considera insuficiente o DireitoEstatuído, ou seja, as Leis e sua aplicação. Segun-do Luhmann (1983, p. 32), sociólogo alemão con-temporâneo,

Ehrlich divide com os juristas progressis-tas da sua época a convicção na insufici-ência de uma jurisprudência puramenteconceitual que pretensamente acreditariapoder decidir sobre qualquer questão jurí-dica através da dedução lógica, a partir deum completo sistema conceitual regulativo[...]. Ehrlich procura, em sua “Fundamenta-ção da sociologia do direito” (1913), funda-mentar a própria ciência jurídica na socio-logia do direito [...]. O direito formulado porjuristas em conceitos e preceitos, e aindamais o direito estruído pelo Estado são umfenômeno secundário, derivado e deficien-temente verbalizado.

Eugen Ehrlich considera não somente a utili-zação do Direito Fático ou Direito Vivo, como de-fende, como exposto no fragmento anterior, a suaprioridade. O Direito Estatuído é visto em segun-do plano, enquanto o Direito Fático é colocado emprimeiro plano, por se tratar das relaçõesinterindividuais de forma direta. Ou seja, o Direitoestá na própria sociedade. Ehrlich propõe que oDireito não esteja presente apenas nos Tribunaisformais: a sociedade toma o poder jurisdicional parasi e resolve seus litígios sem precisar recorrer aoEstado.

O Direito Fático consiste em atribuir poder àsociedade, permitir que a sociedade resolva seusconflitos dentro da própria sociedade, longe dosolhos do Estado; logo, longe dos Tribunais formais.A princípio, pode parecer antagônico resolver lití-gios fora dos Tribunais para que seja possível al-cançar os Tribunais formais. Sim, dessa forma seriapossível atingir tal objetivo. Nesse momento, pode--se observar novamente a importância dos acadê-micos de Direito. Tendo em vista o conhecimentoadquirido em sala de aulas, poderiam os acadêmi-cos de Direito exercer o papel de colaborar, ins-truir a sociedade sobre o que é o Direito Fático ecomo aplicá-lo.

Como defendido por Santos, Eugen Ehrlich,Campilongo e por diversos outros sociólogos e ju-ristas, propõe-se, nesse artigo, que seja pensado

sobre a importância do Direito Vivo perante a so-ciedade. Sendo imprescindível, o Direito Fático semostra uma ferramenta prática, rápida e eficazpara a solução de litígios, além de contribuir para oacesso à Justiça Formal.

Entendê-lo é compreender a cerne do Direi-to, permitindo maior percepção – principalmente,pelo jurista – das relações interpessoaisestabelecidas dentro da sociedade. Permite que ojurista apreenda até mesmo a formação do DireitoEstatuído, sua base, seus princípios, a lógica portrás da Lei posta que, no fim das contas, consisteem regular, organizar e atender às necessidadesdo meio em que se vive.

Como exposto, o Direito Vivo, ou DireitoFático, tem em sua essência a sociedade. Seu ob-jetivo é observar a dinâmica da sociedade comoela se comporta e, ninguém melhor do que os indi-víduos que a compõem para saber qual a necessi-dade. Santos, ao realizar estudos nas Favelas doRio de Janeiro na década de 70, exemplifica o Di-reito Vivo. Para o autor (2013, p. 216)

[...] nas favelas do Rio de Janeiro e onde mefoi possível detectar e analisar a existênciano interior destes bairros urbanos de umdireito informal não oficial, nãoprofissionalizado, centrado na Associaçãode moradores que funcionava como instân-cia de resolução de litígios entre vizinhos,sobretudo nos domínios da habitação e dapropriedade de terra.

A obra A Sociologia Jurídica no Brasil, deJosé Eduardo Faria e Celso Fernandes Campilongo,traz também um estudo do Direito Fático no Bra-sil. Nessa obra, é exposto um projeto realizado naUniversidade de Brasília (UnB) que diz respeitoao Direito Fático. O Direito Achado na Rua éum projeto que tem como objetivo não apenas de-monstrar como ocorre, mas de auxiliá-lo e atémesmo incentivá-lo. Segundo Faria e Campilongo(1991, p. 38):

[...] trata-se de um programa de educaçãojurídica à distância, destinado principalmen-te a grupos como as organizações sindi-cais, comunidades religiosas e associaçõesde bairros [...], como o próprio nome da ini-ciativa indica, têm uma preocupação nãotanto com o direito dos códigos, ensinadonas faculdades, mas com as diferentes for-mas jurídicas efetivamente praticadas nasrelações sociais [...], tratando a experiênciajurídica sob um ângulo assumidamente po-lítico – a partir não só da exploração das

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antinomias do direito positivo e das lacu-nas da lei pelos movimentos populares, mastambém dos diferentes direitos alternativosforjados por comunidades marginalizadasem termos sociais e econômicos.

Percebe-se, então, a presença desse Direitoauxiliar, que por sua vez, é mais barato, mais rápido,mais acessível à sua comunidade e,consequentemente, menos desgastante. O DireitoFático mostra que, assim como a sociedade seestruturou, ela é capaz de resolver seus conflitos.Resolvendo-os, dessa maneira o número de litígiosnos Tribunais formais diminui, permitindo que todaa estrutura judiciária possa se recompor, e osTribunais consigam resolver os conflitosapresentados. Trata-se, portanto, de uma forma dedesjudicializar a solução das questões, filtrando,assim, o acesso ao Poder Judiciário. O filtro, porém,não é para que menos pessoas sejam atendidas peloPoder Judiciário, mas que menos pessoas a eleprecisem recorrer.

O Direito Vivo pode ser, se não uma solu-ção, ao menos uma válvula de escape para essacrise estrutural em que o sistema judiciário se en-contra. Utilizando-o de forma correta, quando alei permitir seu uso, como nos casos de direitosdisponíveis. Na prática, o Direito Fático seria vistocomo as próprias relações interpessoais observa-das dentro da sociedade. Seu uso acarretaria inú-meros benefícios à sociedade e, claro, ao sistemajudiciário, no que diz respeito ao abarrotamento dostribunais.

Nesse sentido, surge a seguinte indagação:se a sociedade pode resolver seus conflitos por sisó, para que o Direito Estatuído? O Direito Vivoapresenta um problema: não é seguro, por ser algototalmente informal. Longe dos olhos do Estado,ele acaba sendo difícil de provar determinada si-tuação. Por isso é necessário conciliá-lo ao Direi-to Formal. Se esses trabalharem juntos, o proble-ma do abarrotamento dos Tribunais poderá seramenizado consideravelmente. Pode-se dizer queo Direito Fático vai até aonde o Estado o permiteir. Portanto, há a necessidade de as duas formasde Direito trabalharem juntas.

7 O DIREITO VIVO E O DIREITO FORMAL

Aplicando o Direito Fático aos conflitos depequenas causas, tratando-se de direitos disponí-veis, como por exemplo, uma discussão entre vizi-nhos, uma pequena batida de carro, enfim, confli-tos que aparecem quotidianamente nos Tribunais

formais, o Direito Estatuído ficaria responsável porcausas que necessitassem de fato dos Tribunaisformais: causas de direitos indisponíveis, que mes-mo se tratando de pequenas causas necessitamdo auxílio do Estado como intermediador.

A mescla dessas duas fontes de Direitoresulta em deixar para o Estado o que houverrealmente a necessidade da ação estatal. Assim,litígios que possam ser resolvidos através de umaconversa ou um acordo entre as partes devem serresolvidos pela própria sociedade. Essa uniãopermite maior dinamização do Direito Formal emaior interação entre os membros da sociedade.Com o fim do acúmulo exagerado de ações – peçasiniciais e seus desdobramentos, como os quaseintermináveis recursos – perante os Tribunais, oprocesso seria menos moroso, o acesso seria maisamplo e o homem médio poderia alcançar maisfacilmente à Justiça Formal.

A utilização desse método vem obtendo re-sultados extremamente positivos. Na Europa, éobservado que os conflitos nos Tribunais formaisvêm diminuindo. Longe de estar relacionado coma queda de litígios na sociedade europeia, na ver-dade, trata-se da utilização do Direito Fático emque, cada vez mais, a população europeia vem re-solvendo seus conflitos dentro da própria socieda-de. Entretanto, no Brasil tal realidade não está sendoaplicada.

8 A REALIDADE BRASILEIRA E OSMECANISMOS PARA O ACESSO ÀJUSTIÇA FORMAL

Por que não se aplica ao Brasil? O DireitoVivo, antes de mais nada, está vinculado à tradi-ção e aos costumes, pois, como visto, trata-se deum direito consuetudinário. Para que ele possa seraplicado no Brasil e, contribuir para o fim do abar-rotamento dos Tribunais seria necessária uma evo-lução da própria sociedade brasileira. Só será pos-sível reverter essa situação com a conscientizaçãoda sociedade. Tendo como uma das possíveis so-luções a participação efetiva dos acadêmicos deDireito, por exemplo, na sociedade. Através dosNPJ’s os acadêmicos podem expor suas ideias arespeito do Direito Fático, apresentar à sociedadeos benefícios da utilização desse Direito e como outilizar.

Claro, a educação do indivíduo é crucial paraessa evolução. Investir em uma educação quevalorize a sociedade juntamente com suas normase princípios, e ensinar desde cedo sobre o funcio-

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namento, estrutura e comportamento da socieda-de, permitirão que os indivíduos que a compõemcompreendam a importância das relaçõesinterpessoais. O Direito Vivo está ligado às rela-ções interpessoais. Compreendendo essa relaçãoe possuindo essa bagagem de conhecimento quantoà sociedade – ou ao menos noções do que vem aser – é possível aplicar efetivamente o Direito Vivo,pois a sociedade passará a ver o Direito nas rela-ções do dia a dia.

Outra forma de resolução apresentada paracombater o acúmulo de feitos nos Tribunais, sen-do essa trazida pelo Direito Estatuído, ou seja, pelopróprio Estado, diz respeito aos juizados especiais.É um órgão do Poder Judiciário que tem comoobjetivo agilizar o processo, cuidando de causasde menor complexidade processual, deixando ascausas de maior complexidade para o Tribunal pro-priamente dito, o que contribui, de certo modo, paraamenizar o a grande quantidade de processos aserem conduzidos e julgados pelos Tribunais.

Apesar de ser uma ideia que facilita o aces-so aos Tribunais formais, os Juizados Especiais nãodeixam de fazer parte da estrutura judiciária e,como se sabe, essa estrutura não é suficiente. Altademanda, pouca estrutura, em poucas palavras seresume esse grande problema que assola a Justi-ça Formal, o que emperra o Judiciário, deixando aJustiça morosa, cara – como abordado neste estu-do – e, consequentemente, prejudicando suaefetividade.

Outros mecanismos advindos do DireitoEstatuído buscam oferecer suporte aos Tribunais,como a conciliação, mediação (ambas, em certoponto tocam o Direito Fático) e arbitragem, sendoessa última desigual, pois, consiste em uma espé-cie de tribunal privado e caro, o que impede o aces-so das classes mais débeis economicamente, masainda assim, apresentado pelo Estado como umapossível solução para a crise que afeta os Tribu-nais.

A quarta possível solução para contribuir como acesso à Justiça Formal – como citado no de-correr deste artigo – e que, acaba tocando o fatorsocial apresentado neste estudo, diz respeita aosNúcleos de Práticas Jurídicas (NPJ’s). Consisteem um projeto oferecido ao graduando do cursode Direito, permitindo que ele, sob a orientação docorpo docente, possa realizar atividades práticasdo Direito. Em suma, o acadêmico pode trabalharna prática, atendendo a população, buscando re-solver ou pelo menos orientar seus litígios.

Os NPJ’s permitem que o acadêmico conhe-

ça a prática jurídica e permitem um serviço extraà população, contribuindo expressivamente com oacesso à Justiça, pois propiciam o acesso daqueleque não possui condições de arcar com o valor doprocesso – como os honorários do advogado ecustas. Sendo assim, percebe-se como esse insti-tuto pode ser não somente eficaz como efetivoquanto à questão social. Aqueles que não possu-em condições financeiras poderiam ter acesso àJustiça, permitindo uma nova forma para resolverlitígios, além de contribuir para amenizar a crisenos Tribunais formais. Por isso, a importância detal projeto e de sua ampliação, devendo ser incen-tivado cada vez mais pelas instituições de ensino,pelos professores e pelos próprios profissionais doDireito. Desse modo, o NPJ – com o devido in-vestimento – poderia vir a se tornar um grandemeio de acesso à Justiça, pois colabora para dimi-nuir com a quantidade de processos, além de apro-ximar a população da Justiça, permitindo que asociedade possa ver e até mesmo ser atendida porprofissionais que compõem a Justiça Formal.

9 A IMPORTÂNCIA DE UMAFORMAÇÃO HUMANISTA E OACESSO À JUSTIÇA

Após o debate acerca da quantidade de fei-tos judiciais que se acumulam nas salas do PoderJudiciário, entra-se no segundo problema: o ma-gistrado e sua parcialidade. A questão é: comoimpedir que essas convicções influenciem seu jul-gamento ou, ao menos, voltá-las para o que sejajusto? Santos mostra que para isso, o juiz deveriaser dotado de uma formação mais humanista.

Uma formação humanista consiste em valo-rizar questões de cunho social, filosófico, psicoló-gico e antropológico, ou seja, consiste em dar mai-or atenção àquelas disciplinas julgadas por muitoscomo propedêuticas, que, na verdade, são de sumaimportância para o juiz, assim como todo e qual-quer profissional do Direito.

Compreender o domínio do homem pelo ho-mem como a Antropologia oferece, entender oporquê de a sociedade se comportar de tal manei-ra como a Sociologia permite analisar são exem-plos que mostram a importância dessa formação.Antes de aplicar a norma posta, devem-se conhe-cer as situações em que ela será aplicada.

Possuindo esse conhecimento aprofundadoda sociedade, as decisões judiciais proferidas con-seguirão se aproximar do primado pela Justiça, poiso magistrado tomará suas decisões sob a luz da

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Lei, mas observando como essa incidirá sobre asociedade. Porém, observa-se – infelizmente – emmuitos acadêmicos o descaso com tais disciplinas,sendo essas, como fora ressaltado acima, de sumaimportância não só para a formação profissional,como para a formação enquanto ser humano. Essaé uma realidade que pode ser melhorada e paraque isso ocorra, os acadêmicos devem entender oque de fato estão fazendo no curso de Direito ecomo vão atuar na prática. Os NPJ’s são grandesferramentas para essa compreensão. Além decontribuir com a sociedade como exposto ao lon-go deste artigo – a respeito das questões econô-micas, sociais e culturais – os Núcleos de Progra-mas Jurídicos proporcionariam ao acadêmico aoportunidade de conhecer a prática do Direito.Proporcionaria uma proximidade do acadêmico coma realidade, permitindo que ele – ao executar de-terminadas tarefas – possa associar a teoria apren-dida em sala de aulas ao serviço prestado aosNPJ’s.

Inclusive, nos NPJ’s, há oportunidade de oacadêmico de Direito conviver com outras áreasdo conhecimento, já que é comum que em taisNúcleos também atendam os acadêmicos de áre-as afins ao Direito, como os estudantes de ServiçoSocial. A interdisciplinaridade é, portanto, pratica-da nos NPJ’s que juntam acadêmicos de áreascomplementares.

Se se analisar o Direito como instrumento dasociedade, como uma criação do homem destina-da ao homem, é possível detectar a importânciade uma formação mais humanista. O juiz, sendo ocentro do poder jurisdicional, deve ter em mente asociedade como um todo, seu multiculturalismo,suas mazelas, suas divisões socioeconômicas, paraque possa proferir decisões que, de fato, atuemsobre a sociedade, observando a Justiça e osconsequentes impactos sofridos pela sociedadecom a aplicação da Lei. Empregando omulticulturalismo, contribui com o acesso aos Tri-bunais.

Ao se retomar ao anunciado ciclo vicioso,exposto no decorrer deste estudo, percebe-se quea parcialidade do magistrado acarreta barreiras –fatores culturais – quanto ao acesso à Justiça For-mal. Portanto, o multiculturalismo permitiria a que-bra de qualquer barreira existente, proporcionan-do uma abertura maior à Justiça dos Tribunais.

Trazendo essa discussão para um campo maisabrangente, aponta-se a importância de uma for-mação mais humanista para todo profissional doDireito. Seja autônomo ou servidor público, na po-

sição de acusar, defender ou julgar, deve-se terem mente que, no fim das contas, esses, são servi-dores – acima de tudo – da sociedade. Por isso, aimportância de conhecer bem a sociedade.

Se o graduando em Direito se prepara du-rante todo o curso para atuar, seja como for, nasociedade, não deveria ter consciência de seu fun-cionamento? Não deveria o acadêmico tomar umapostura mais ativa?

Enquanto estudantes e até mesmo no que dizrespeito aos profissionais do Direito se percebeum comportamento passivo diante de tudo o queacontece. Na verdade, percebe-se até um confor-mismo com essa situação anunciadamente caóti-ca que se encontra nos Tribunais. Como se fossenormal a deficiência na estrutura judiciária, a par-cialidade velada do juiz e os fatoressocioeconômicos, fecham-se os olhos e acaba-seconsentindo com um ciclo de barreiras que provo-ca o inacesso à Justiça Formal.

Deve-se ser pensador do Direito, transmitira opinião para a sociedade e provocarquestionamentos e, consequentemente soluções –ao menos tentativas – para todos esses problemaslevantados no decorrer deste artigo.

O Direito, em sua definição mais simplista –direito como ciência – é visto como um conjuntode normas e princípios que regulam as relaçõeshumanas. Um instrumento, seja ele criação dohomem ou a ele inerente, que tem como funçãoorganizar determinado espaço para que haja or-dem dentro dessas relações. Tudo isso leva à so-ciedade, desde a mais primitiva à mais avançada.

Sendo assim, o Direito, assim como seus ope-radores, devem observar aquilo de que a socieda-de necessita. O Direito só tem sentido se for paraa sociedade e seus operadores só serão efetiva-mente úteis se servirem à sociedade. Só assim serápossível mudar o rumo do Judiciário e permitir –de fato – o acesso aos Tribunais de forma justa eigualitária a todos.

10 CONSIDERAÇÕES FINAIS

De acordo com o exposto, é possível inferirque a deficiência no sistema Judiciário, no que dizrespeito ao acesso à Justiça Formal é uma reali-dade. Ao se avaliar todo o problema, desde suaorigem até os dias de hoje, e suas diversas verten-tes, é possível compreender a lógica por trás detudo.

O resultado do inacesso à Justiça dos Tribu-nais se deve à falta de conhecimento e preparo da

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população em geral quanto à sociedade. Os fato-res culturais, sociais e econômicos permite ver oquão segregadora a Justiça Formal pode ser e,como uma parcela significativa da sociedade éexcluída devido a isso.

Além disso, o abarrotamento dos Tribunais ea parcialidade nos julgamentos – compondo a par-te estrutural do Judiciário – contribuem veemen-temente para o afastamento do indivíduo em rela-ção aos Tribunais, alimentando um ciclo sem fim.

Diante de toda essa situação, o presente ar-tigo apresenta uma síntese do que possa ser umadas possíveis soluções para esse problema, que,no fim de tudo, se resume em uma palavra: socie-dade. Saber ouvir, observar e sentir as necessida-des da sociedade através do Direito que dela ema-na, o Direito Vivo. Deve-se observar que para asLeis surtirem efeitos é necessária a total harmo-nia entre sociedade e o Estado. E quanto à admi-nistração da Justiça, é preciso entender que a re-solução de litígios pode ser resolvida de outras for-mas, permitindo assim a estabilização da estruturajudiciária. Não podendo deixar de ressaltar a im-portância da atuação dos acadêmicos nesse pro-cesso, através de questionamentos, apresentaçãode possíveis soluções e projetos desenvolvidos coma própria sociedade.

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RESUMO

Sem dúvida, as obras de Émile Durkheim e de MaxWeber são de grande relevância tanto para a So-ciologia, quanto para o Direito, já que abordaramde forma ampla o aspecto social da Ciência Jurídi-ca. Fato que levou teóricos de vários ramos doconhecimento a estudar suas obras, e sob diver-sos aspectos. Dentre tais aspectos, pode-se des-tacar um: haveria uma perspectiva evolucionistada sociedade e do Direito nas obras dos autoresreferidos? Se há evolucionismo, como ele se veri-fica na sociedade? Para responder a esta questão,o presente artigo utiliza de pesquisa bibliográfica edocumental, para, da análise exploratória de obrasde Émile Durkheim, de Max Weber e também detrabalhos interpretativos acerca da teoria destesautores, responder a questão, com especial desta-que às análises do sociólogo alemão NiklasLuhmann que, ao estudar os trabalhos de Durkheime de Weber, abordou também, a questão do even-tual evolucionismo nas suas obras.

Palavras-chave: Durkheim. Weber. Luhmann.Direito. Evolucionismo.

RESUMEN

Sin duda, las obras de Émile Durkheim y de MaxWeber son de gran relevancia tanto para lasociología, cuanto para el derecho, ya queabordaron de forma amplia el aspecto social de laciencia jurídica, lo que llevó teóricos de varios ra-mos del conocimiento a estudiar sus obras, y bajodiversos aspectos. Dentro de tales aspectos, sepuede destacar un: ¿habría una perspectivaevolucionista de la sociedad y del derecho en lasobras de los autores referidos? Si hayevolucionismo, ¿cómo el mismo se verifica en lasociedad? Para responder esta cuestión, el pre-sente artículo utiliza pesquisa bibliográfica y docu-

A RESPEITO DE EVOLUCIONISMO NAS OBRAS DE ÉMILE DURKHEIM E DEMAX WEBER

SOBRE EL EVOLUCIONISMO EN LAS OBRAS DE ÉMILE DURKHEIM Y MAXWEBER

Arnon Arruda Simões1

mental, para, del análisis exploratorio de obras deÉmile Durkheim, de Max Weber y también detrabajos interpretativos acerca de la teoría de estosautores responder a la cuestión, con especial des-taque a los análisis del sociólogo alemán, NiklasLuhmann, que al estudiar los trabajos de Durkheimy de Weber, abordó también, la cuestión del even-tual evolucionismo en sus obras.

Palabras-clave: Durkheim. Weber. Luhmann.Derecho. Evolucionismo.

1 INTRODUÇÃO

Os trabalhos sociológicos de Émile Durkheime de Max Weber são comumente estudados porprofissionais e acadêmicos de diversas áreas, prin-cipalmente por abordarem os problemas sociaisatravés de uma perspectiva ampla, permitindo umarelação multidisciplinar. Em seus trabalhos, os so-ciólogos mencionados apresentam um quadro ana-lítico de diversas configurações sociais, que vãodesde sociedades antigas, até sociedades moder-nas, das quais faziam parte. O presente artigo bus-ca, através da exploração de obras de Durkheim eWeber, além de trabalhos interpretativos destasobras, responder a algumas questões sobre os es-tudos dos dois sociólogos citados.

Observando os trabalhos de Durkheim e deWeber sobre as diversas configurações sociais, écomum se deparar com a seguinte questão: há umaperspectiva evolucionista nestas obras? Se há talevolucionismo, como ele se afigura nas socieda-des? Ressalta-se que a eventual perspectivaevolucionista remete a um processo gradual e or-denado pelo qual passariam as sociedades, partin-do de um modelo social em direção a outro.

O presente artigo visa apontar respostas paraas questões levantadas, reconhecendo as limita-ções que existem, em se tratando de obras com-

1 Estudante do Terceiro Período de Direito da Faculdade de Direito Santo Agostinho de Montes Claros-MG.

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plexas e amplas, como são as de Durkheim e deWeber.

O artigo ora lido, além dessa introdução, estádivido do seguinte modo: na primeira parte, “Per-cepções de Luhmann quanto à Sociologia deDurkheim e de Weber”, procura-se apresentar aanálise de Niklas Luhmann, da sociologia jurídica,como texto de crítica, explicitando seuposicionamento de que há o evolucionismo inves-tigado, nos trabalhos dos dois teóricos. Na segun-da parte, “Perspectivas de Durkheim Acerca daSociedade e do Direito”, busca-se a confirmaçãodos argumentos elencados por Luhmann para clas-sificar as análises de Durkheim como evolucionista,no livro “Da Divisão do Trabalho Social”, do pró-prio Durkheim. Na terceira parte, que tem comotítulo “Perspectivas de Weber Acerca da Socie-dade e do Direito”, busca-se, através da análisedo livro “Economia e Sociedade”, do próprio Weber,averiguar se, de fato, há uma perspectivaevolucionista, como afirma Luhmann. E por fim,nas considerações finais, faz-se uma síntese dasinformações obtidas ao longo do artigo, a fim deresponder as questões levantadas.

2 PERCEPÇÕES DE LUHMANNQUANTO À SOCIOLOGIA DEDURKHEIM E DE WEBER

O sociólogo alemão Niklas Luhmann, em seulivro “Sociologia do Direito I”, especificamente nocapítulo I “Abordagens Clássicas à Sociologia doDireito”, trata a temática da origem da SociologiaJurídica. Sociologia esta que, divergindo da tradi-ção doutrinária europeia, enxergava o Direito comouma produção social e não uma estrutura imanentee anterior à própria sociedade. A sociologia jurídi-ca buscava a obtenção de um conhecimento cau-sal, empiricamente embasado, a respeito da socie-dade e sua relação com o Direito.

Apesar das diferenças entre os trabalhos dossociólogos analisados nas abordagens clássicas porLuhmann (1983), este traçou três premissas co-muns à Sociologia do Direito, distintivas da tradi-ção europeia embasada no direito natural. São elas:

1) O direito é diferenciado como estruturanormativa da sociedade, como um conjuntofático de vida e ação (O direito não mais é asociedade.) 2) Direito e sociedade são con-cebidos como duas variáveis dependentesentre si, e correlação em sua variação é con-cebida em termos evolucionistas – no sécu-lo XIX geralmente como o progresso regu-

lar da civilização. 3) Sob tais condições po-dem ser estabelecidas hipóteses sobre a re-lação entre direito e sociedade, as quais sãoempiricamente controláveis e verificáveisatravés da observação da correlação, em suasvariações (LUHMANN, 1983, p. 22 e 23).

Os sociólogos analisados por Luhmann (1983)aos quais são referidos no parágrafo anterior, sãoKarl Marx, Henry Maine, Talcott Parsons, EugenEhrlich, Émile Durkheim e por fim, Max Weber.Contudo, o presente artigo limitar-se-á às perspec-tivas de Niklas Luhmann (1983) sobre as teoriasde Durkheim e de Weber, a despeito de quereranalisar os três clássicos, porque os trabalhos deKarl Marx extrapolam os limites do que é socioló-gico, chegando a trabalhar conceitos filosóficos.

Ao analisar os trabalhos de Émile Durkheim,Luhmann (1983) inicia suas observações com otema do contrato, em seguida passa para a análiseda evolução social na teoria sociológica deDurkheim, perpassando por três aspectos impor-tantes, a saber, o tipo de solidariedade presentenas sociedades, a diferenciação dos indivíduos nasmesmas e, por fim, o caráter das sanções e dodireito nas sociedades.

A respeito da solidariedade social, Luhmann(1983) a associa, com a evolução da sociedade etambém do Direito, porque os tipos de solidariedadetrazidos por Durkheim, mecânica e orgânica,verificam-se em sociedades primitivas e emsociedades complexas, respectivamente.

No que tange à diferenciação dos indivíduosna sociedade, Luhmann (1983) apresenta umaperspectiva de evolução contida no trabalhosociológico de Durkheim. Nas sociedades cujadiferenciação dos indivíduos é segmentária, taisindivíduos são agrupados por similitudes, de formasimples, isto é, basicamente em famílias oulinhagens. Já nas sociedades de divisão funcional,eles se diferenciam na sociedade através de umacomplexa distribuição do trabalho. Assim, cadaparte realiza sua função específica, contribuindocom o corpo social. Daí a solidariedade presentese chamar de orgânica. Nestas circunstâncias, háuma menor (mas, ainda presente) consciênciacoletiva e uma maior consciência dos indivíduos.

Sobre a evolução do Direito na perspectivade Durkheim, Luhmann (1983) apresenta a pro-gressão jurídica de sociedades simples, de solida-riedade mecânica e diferenciação segmentáriapara sociedades complexas, de solidariedade or-gânica, cuja diferenciação é funcional. Nas pri-meiras, observa-se a predominância do Direito

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Penal, de cunho repressivo, pois as transgressõesatacavam a consciência coletiva, gerando uma vin-gança desta, que é a sanção.

A partir daí, o Direito evolui para atender àsnecessidades das sociedades complexas. Afinal, oDireito é uma construção social. Nas sociedadesde diferenciação funcional, isto é, de grande divi-são das funções, o Direito precisa se preocuparem estabilizar novamente a ordem social abalada,restituindo o que foi perdido. É a predominânciado Direito Civil.

Observando assim, no posicionamento deNiklas Luhmann, há evolucionismo social e jurídi-co na teoria de Durkheim. Todavia, faz-se neces-sário analisar a própria obra do sociólogo, pararatificar, ou não, a argumentação de Luhmann(1983), como será feito no presente artigo.

Ao estudar a sociologia de Max Weber,Luhmann (1983) apresenta como tema central aindagação quanto à racionalização como traço fun-damental do desenvolvimento da sociedadeeuropeia, principalmente no seu tempo.

Posteriormente, Luhmann (1983) se refereao “desencantamento do mundo” e sua importân-cia para a sociedade capitalista, que vê o Direitose adequar à nova realidade social. Este novo Di-reito deveria deixar as qualidades materiais, decunho ético, e adquirir qualidades formais, quepossibilitem formação de conceitos e conhecimen-tos gerais.

Luhmann (1983) em seguida expõe seuposicionamento acerca das transformações doDireito na sociologia weberiana, que para ele sãoevolucionistas. Evolucionistas no sentido de quehá um desenvolvimento crescente que diferenciae autonomiza o Direito, desligando-o de outroscampos sociais.

A racionalização presente na sociedadeeuropeia da época de Weber é, de acordo comLuhmann (1983), resultado de um processoevolutivo supostamente cunhado na sociologiaweberiana. Este estágio de racionalização permi-te uma certa previsibilidade das relações sociais,pois o Direito assegura padrões que permitem àspessoas calcularem, por assim dizer, os efeitos dedeterminada relação jurídica.

Entretanto, é pertinente observar se os argu-mentos levantados por Luhmann (1983), para ta-xar a sociologia weberiana como evolucionista, sãoratificados nas obras do próprio Max Weber. Comoserá feito no artigo presente.

A partir de agora serão analisadas diretamen-te as teorias de Émile Durkheim e de Max Weber,

com maior atenção, a fim de verificar, ou não, ainterpretação evolucionista da sociedade e do Di-reito.

3 PERSPECTIVAS DE DURKHEIMACERCA DA SOCIEDADE E DODIREITO

Buscar-se-á avaliar neste tópico, através daobra “Da Divisão do Trabalho Social”, de ÉmileDurkheim, se a sociologia em questão defende aexistência de evolucionismo nas sociedades e porconseguinte no Direito, já que este é um produtosocial.

As análises de Durkheim acerca da socie-dade pautam-se primordialmente no Direito, comosalientou Luhmann (1983). A partir da perspectivajurídica, o sociólogo francês explicou o desenvol-vimento social.

Durkheim (2004), no capítulo II “Solidarie-dade Mecânica ou por Similitudes”, do livro “DaDivisão do Trabalho Social”, inicia suas análisesafirmando que na solidariedade social cujo direitoé predominantemente repressivo, a transgressãoconfigura crime, que a partir de então, passa a serestudado.

Durkheim (2004), ao analisar os crimes, pos-tula haver algo comum entre eles, já que são viola-ções à coesão social em que se observa mais for-temente o direito repressivo. Com o desenrolar deseu trabalho, conclui que todos os crimes são atosreprovados universalmente pelo corpo social. Con-tudo, esta definição ainda é incompleta, como aduzo próprio Durkheim (2004).

Ao contrário do que se observa no direitorestitutivo, o direito repressivo estabelece penassem explicitar a obrigação positiva a respeito. ParaDurkheim (2004), no direito repressivo há umanorma que pune o homicídio, mas não há uma queobrigue o respeito à vida alheia, por exemplo. Istosó é possível porque as regras sociais são conhe-cidas e aceitas por todos. Prova disto é que a ad-ministração do direito repressivo é difusa nas so-ciedades primitivas. Assembleias populares sãocomuns na prestação jurisdicional nestas socieda-des.

Durkheim (2004), a partir disto, chegou a umadefinição completa de crime: é o ato que ofendesentimentos fortemente arraigados e bem defini-dos da consciência coletiva. E justamente aí, nocapítulo II “Solidariedade Mecânica ou porSimilitudes”, do livro “Da Divisão do TrabalhoSocial”, o sociólogo dá um conceito de grande re-

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levância para o estudo da solidariedade mencio-nada, o de consciência coletiva: “O conjunto dascrenças e dos sentimentos comuns à média dosmembros de uma mesma sociedade forma um sis-tema determinado que tem vida própria; podemoschamá-lo de consciência coletiva ou comum.”(DURKHEIM, 2004, p. 50).

Durkheim (2004), após analisar o crime, es-tuda a pena, enquanto resposta ao delito. O soció-logo mencionado afirma que a sanção em socie-dades primitivas se dá de forma passional, visandoo sofrimento do apenado e sem trazer benefíciospara quem pune. Apesar de a pena servir comoproteção social frente aos criminosos.

Por obviedade, se o crime é uma ofensa asentimentos coletivos e ao corpo social, é este queo pune e não propriamente os indivíduos envolvi-dos na aplicação da sanção.

Conforme Durkheim (2004) aduz, a consci-ência coletiva é fonte de vitalidade da sociedade ese baseia nas crenças basilares do corpo social.Logo, uma simples restituição ante uma ofensa aela não bastaria. Por isso, a pena tem o caráterque tem. Neste sentido, Durkheim (2004)exemplifica de maneira pertinente que sentimen-tos adquirem grandes proporções quando corro-borados em grupo.

Por fim, o sociólogo francês confirma, atra-vés da análise da pena, a definição atribuída aocrime. E mostra que na reação ao crime há umaaglutinação das consciências honestas que foramabaladas, para reprimir o criminoso, de forma asatisfazer a vingança do grupo e manter forte aconsciência coletiva. Assegurando, desta forma, apreservação dos padrões, que são o fator de coe-são social.

No capítulo III, “Solidariedade Devida à Di-visão do Trabalho ou Orgânica”, Durkheim (2004)analisa as sociedades mais complexas, nas quaishá uma crescente divisão do trabalho social, umfortalecimento das consciências individuais e por-tanto, uma solidariedade peculiar.

Durkheim (2004) inicia suas análises a partirda figura da pena. Nesta nova configuração soci-al, a pena possui um caráter de restituição. Elavisa retornar as partes envolvidas ao estado ante-rior à perturbação e não constitui uma vingança.Isto só é possível porque as regras a quecorresponde o direito restitutivo, isto é, de cunhocivil, não representam estados fracos da consci-ência comum.

Durkheim (2004) sustenta que nas sociedadescomplexas, ao contrário do que se observa no direito

repressivo, o Direito não permanece difuso nasociedade. Pelo contrário, são criadas instânciasjurisdicionais cada vez mais especializadas.Contudo, o Direito Civil não diz respeito somentea fatos de interesse puramente particular, porquedo contrário não serviria como um fator de coesãosocial. É o caso do casamento: embora estacerimônia se faça pela vontade dos cônjuges, elase faz por um contrato e como todo contrato, temsua eficácia emanada da sociedade.

Posteriormente, Durkheim (2004) defende aexistência de duas formas de relações em socie-dades: as negativas, que implicam abstenção e aspositivas ou de cooperação.

As relações negativas são aquelas que têmpor escopo ligar uma coisa à pessoa, mas não ligauma pessoa a outra. Entretanto, a solidariedadenegativa só pode existir se houver uma positiva,sendo a primeira uma emanação da segunda.

Já as relações positivas, de acordo comDurkheim (2004), implicam ações por parte dosindivíduos, especificamente cooperação entre eles.Esta cooperação deriva essencialmente da divi-são do trabalho. Ao analisar a figura do contrato,Durkheim (2004) apresenta, de forma inequívoca,a reciprocidade contratual como sendo possívelapenas onde há cooperação.

Acerca da divisão do trabalho social,Durkheim (2004) aduz que havendo uma divisãopor tarefas qualitativamente similares, a divisãoseria simples ou de primeiro grau, mas se fossepor tarefas qualitativamente distintas, a divisão seriacomplexa. Como é o caso da sociedade moderna.

Durkheim (2004) mostra no longo capítuloora analisado que a divisão do trabalho social pro-duz a coesão da sociedade, na medida em que hácada vez mais grupos especializados em uma áreaespecífica e que, portanto, dependem fortementedos demais grupos para sua própria sobrevivên-cia. Ao defender isto, Durkheim (2004) comparaas sociedades complexas com um organismo, noqual há um sistema nervoso que coordena as fun-ções orgânicas, mas que, por sua vez, morreriasem os demais sistemas, tecidos, órgãos, etc.

Porém, conforme comprova Durkheim(2004), a divisão do trabalho na sociedade só épossível na medida em que os indivíduos adquiremautonomia frente a ela. E esta autonomia só é pos-sível graças a um enfraquecimento da consciên-cia coletiva e um imediato fortalecimento das cons-ciências individuais, o que individualiza as pessoase, por conseguinte, as especializam em determina-do trabalho social. Portanto, Durkheim (2004) apre-

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senta uma razão de inversa proporcionalidade narelação entre a consciência coletiva e a consciên-cia individual, também na relação entre assimilitudes dos membros da sociedade e a divisãodas funções no corpo social. Neste sentido, aduz opróprio autor em destaque:

Há em cada uma de nossas consciências,como dissemos, duas consciências: uma,que é comum a nós e ao nosso grupo intei-ro e que, por conseguinte, não é nós mes-mos, mas a sociedade que vive e age emnós; a outra, que, ao contrário, só nos re-presenta no que temos de pessoal e distin-to, no que faz de nós um indivíduo(DURKHEIM, 2004, p. 106).

Em seus estudos acerca das sociedades pri-mitivas, cuja coesão se baseia nas similitudes enos sentimentos fortes e amplamente aceitos querepresentam a consciência coletiva, e em seguidaao analisar as sociedades complexas, cuja divisãose dá essencialmente pela divisão do trabalho,Durkheim (2004) deixa nítido um patenteevolucionismo em sua obra. As análises do soció-logo mencionado apresentam um quadroevolucionista bem fundamentado, no qual se per-cebe uma verdadeira progressão da força da cons-ciência individual, em detrimento do enfraqueci-mento da consciência coletiva. E esta nova confi-guração social é mais coesa do que a antiga, con-forme prova Durkheim (2004) em seus trabalhos,ao exemplificar com o fato de que em sociedadescomplexas é mais difícil anexar outros territóriosem uma nação, dificuldade que é menor quando oconflito envolve sociedades mais simples.

Sobre a evolução da sociedade, ÉmileDurkheim (2004), assevera:

É, pois, uma lei da história a de que asolidariedade mecânica, que a princípio, é aúnica ou quase, perde terrenoprogressivamente e que a solidariedadeorgânica se torna pouco a poucopreponderante. Mas quando a maneira comoos homens são solidários se modifica, aestrutura das sociedades não pode deixar demudar (DURKHEIM, 2004, p. 157).

Diante de todo o exposto fica evidente oinconteste posicionamento evolucionista deDurkheim acerca da sociedade e, por conseguin-te, do Direito.

4 PERSPECTIVAS DE WEBER ACERCADA SOCIEDADE E DO DIREITO

Ao explorar a obra “Economia e Socieda-de”, de Max Weber, no capítulo IX “Sociologia daDominação”, percebe-se que suas análises acer-ca da sociedade e do Direito se baseiam no estudodas relações de dominação existentes em todas associedades. Dominação no sentido de ser uma in-fluência demasiado forte da vontade do dominadorsobre a vontade do dominado, implicando obedi-ência. Weber (1999) classificou as relações dedominação em três: dominação burocrática, domi-nação patriarcal (tradicional) e dominaçãocarismática. A partir de agora serão analisados ostipos de dominação mencionados.

Weber (1999) inicia suas análises da domi-nação burocrática, também conhecida como do-minação racional-legal, apresentando alguns prin-cípios fundamentais desta estrutura social racio-nal, que são: competência oficial definida por re-gras, hierarquia de funções, administração docu-mental, atividade funcional especializada, exigên-cia de produtividade e administração baseada emregras gerais.

O principal aspecto da dominação burocráti-ca é a racionalidade. Racionalidade esta que seprojeta em todas as características desta estrutu-ra. Neste tipo de dominação, segundo Weber(1999), há uma predominante impessoalidade dasrelações, pois os que estão submetidos à domina-ção assim o fazem em virtude da determinação deregulamentos, visando fins objetivos, racionalmenteestipulados.

Posteriormente, Weber (1999) analisa ascaracterísticas do funcionalismo público e privadoda sua época que, segundo ele, elucidam o caráterburocrático da dominação estudada. Nesta estru-tura, o cargo é uma profissão, gerando a especia-lização e a cobrança por resultados. O funcionáriorecebe um salário como remuneração, que progri-de com a evolução da hierarquia de sua função.

Em seguida, Weber (1999) mostra que estemoderno sistema de cargos acarreta um desen-volvimento da economia monetária e também, umdesenvolvimento dos aspectos quantitativos equalitativos em diversas áreas do corpo social.

Weber (1999) defende que o fatordeterminante para o avanço da burocracia é a su-perioridade da técnica. Há a figura do especialistaque, por não se envolver pessoalmente, teria uma

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ação estritamente objetiva. Tal fator contribui paraque o Direito e a sociedade tenham o que Weberchama de “razões” racionalmente discutíveis, con-ferindo uma característica imprescindível ao Di-reito: a possibilidade de “calcular” as relações.

Por fim, Weber (1999) mostra como os ide-ais democráticos contribuem para a dominaçãoburocrática, por pregarem a igualdade jurídica.Mostra também, como esta dominação se mani-festa de maneira bastante intensa no capitalismoemergente.

Após analisar a burocracia, Weber (1999)analisa o que ele chama de estrutura pré-burocrá-tica de maior importância, a dominação patriarcal,também conhecida como tradicional. Weber (1999)começa seus estudos argumentando que a domi-nação referida se baseia primordialmente na obe-diência do dominado não a uma finalidade objeti-va, mas a um detentor de autoridade, uma piedadepessoal que está fundamentada na tradição, na-quilo que a repetição tacitamente tornou sagrado.

Weber (1999) mostra que a tradição é res-peitada pelo corpo social em decorrência do te-mor que este tem de eventuais consequências so-brenaturais, em resposta à quebra do costume. Talcaracterística e sua estrutura conferem estabili-dade à dominação patriarcal.

Seguidamente, Weber (1999) aduz que adominação patriarcal tem origem na autoridadedoméstica. Historicamente, o poder paterno cons-tituiu uma verdadeira relação de dominação tradi-cional, ainda que inicialmente este poder não sebaseasse no vínculo sanguíneo, por ficar nas mãosdo dominador.

Dentro da dominação patriarcal, Weber(1999) destaca uma espécie de dominação que éa patrimonial. Assim definida por ele:

A este caso especial da estrutura de domi-nação patriarcal: o poder doméstico des-centralizado mediante a cessão de terras eeventualmente de utensílios a filhos ououtros dependentes da comunidade domés-tica, queremos chamar de dominaçãopatrimonial (WEBER, 1999, p. 238).

Nesta estrutura de dominação patriarcal, afigura do funcionário se resume a um servidor pes-soal de quem exerce a dominação.

Após analisar as dominações burocrática epatriarcal, analisa-se a dominação carismática.Weber (1999) principia esta análise apresentandoque a dominação referida se dá pelo carisma de

quem exerce o poder. Cumpre ressaltar que“carisma” na sociologia weberiana é um conceitoisento de carga valorativa, referindo-se a qualida-des de liderança por parte do dominador.

O carisma, segundo Weber (1999), são atri-butos de pessoas que perante situações extremasdemonstraram habilidades sobre-humanas, levan-do as pessoas a aceitarem sua liderança por con-fiarem nestas habilidades.

De acordo com Weber (1999), pelo fato de adominação carismática estabelecer uma subordi-nação vinculada ao titular do carisma, esta rela-ção é evidentemente irracional e além daprevisibilidade humana. Esta dominação desconhe-ce procedimentos, ordens, carreiras, promoções ourelação entre meios fins objetivos. Portanto, a re-lação carismática é instável, por ser imprevisível,ainda que os sujeitos desta dominação a tentempreservar. Conforme assevera Weber (1999):

Portanto, a dominação carismática “pura”é instável num sentido muito específico, etodas as suas alterações têm, em última ins-tância, uma única fonte. Na maioria das ve-zes, o desejo do próprio senhor, mas sem-pre o de seus discípulos e mais ainda o dosadeptos carismaticamente dominados, é detransformar o carisma e a felicidadecarismática de uma agraciação livre, única,externamente transitória de épocas e pes-soas extraordinárias em uma propriedadepermanente da vida cotidiana (WEBER,1999, p. 332).

Weber (1999) exemplifica seuposicionamento acerca do modo de preservaçãoda relação carismática através de grupos religio-sos. Ele mostra como os escritos do profeta ououtra autoridade carismática se consolidam inevi-tavelmente como dogma.

Analisando a obra de Max Weber, do pontode vista da averiguação da indagação do presenteartigo, a saber, há evolucionismo nas obras estu-dadas? A resposta seria não. A despeito de Webertratar de um processo determinado de racionaliza-ção pelo qual as sociedades passam, este não éum processo linear que se possa nomear de evolu-ção social, pois evolução implicaria um desenvol-vimento ordenado de um ponto de partida em dire-ção a um ponto de chegada, o que não se verificana obra weberiana.

A racionalidade quando aprimorada tende aconverter as relações sociais e também o direitopara uma estrutura burocrática e legal. Contudo,

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Max Weber apresenta um quadro de fluxos e re-fluxos de racionalidade das sociedades ao longoda história e não propriamente um evolucionismocom um ponto de partida e outro ponto de chega-da. Prova disto é a afirmação de Max Weber(1999), no capítulo VII, “Sociologia do Direito”,do seu livro “Economia e Sociedade”, de que odireito romano estava muito mais racionalizado doque o medieval, nos aspectos lógicos.

Por fim, o próprio Weber atesta não haveruma perspectiva evolucionista nas suas concep-ções sobre a sociedade:

Conforme mostram esses exemplos, a do-minação carismática não se limita, de modoalgum, às fases primitivas do desenvolvi-mento, bem como não podem ser coloca-dos simplesmente numa linhaevolucionária, um atrás do outro, os trêstipos fundamentais da estrutura de domi-nação, aparecendo eles, ao contrário, com-binados um com o outro de forma mais va-riada (WEBER, 1999, p. 342).

Diante do que foi analisado na obra “Econo-mia e Sociedade”, de Max Weber, percebe-se onítido posicionamento do autor de que os três prin-cipais tipos de dominação, por ele elencados, en-trelaçam-se de maneira variada ao longo de todaa história. Constituindo um sistema de predomi-nância de um ou mais tipos e não um processolinear, partindo de um em direção ao outro. Nãohavendo, portanto, a perspectiva evolucionistainvestigada pelo presente artigo.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir das questões incialmente apontadasnesse artigo e pelas discussões realizadas no seudesenvolvimento acerca do assunto, pode-se apu-rar que de fato há uma perspectiva evolucionistada sociedade, portanto do Direito, nas obras deDurkheim, pois este apresenta um quadro de de-senvolvimento social, partindo de sociedades sim-ples, cuja solidariedade é mecânica, culminandoem sociedades complexas, cuja solidariedade éorgânica, devido à grande diversificação de fun-ções sociais.

Luhmann aponta com precisão o processovivido pelas sociedades, segundo Émile Durkheim,

mostrando que se trata de uma verdadeira evolu-ção de configurações sociais simplórias rumo aestágios mais complexos, mais desenvolvidos.

As análises do livro “Economia e Sociedade”,de Max Weber, entretanto, apontam para o contráriodo que se percebe em Durkheim. A despeito deWeber reconhecer que as sociedades podem passarpor processos, ou seja, uma sociedade na qual háuma predominância da dominação carismática, podevir a ter como manifestação predominante dedominação, a burocrática ou a racional, ele nãoapresenta esse processo como uma evoluçãopropriamente. Fica claro que Weber apresenta umcenário no qual há fluxos e refluxos das três formasde dominação.

As dominações carismática, patriarcal/tradi-cional e burocrática, necessariamente, coexistemdentro da sociedade. Não há um quadro evolutivono qual se parte de uma situação em que predomi-ne uma das dominações, em direção a outra situa-ção em que predomine outra dominação. A des-peito de o carisma estar mais ligado às sociedadesantigas, o patriarcalismo às sociedades medievaise a burocracias às sociedades modernas, o carismasempre existiu e continua existindo nas socieda-des modernas.

Em suma, diante de todo o exposto, consta-ta-se que, diferentemente do que defende o soció-logo Niklas Luhmann, só se verifica a presença deevolucionismo social e, portanto, jurídico, nas obrasde Durkheim, não sendo possível afirmar o mes-mo da sociologia weberiana.

REFERÊNCIAS

DURKHEIM, Émile. Da divisão do trabalhosocial. Tradução de Eduardo Brandão. SãoPaulo: Martins Fontes, 2004.

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RESUMO

O presente artigo objetiva apresentar o resultadode uma pesquisa desenvolvida nas escolas públicasde educação básica, com foco para o estudo daviolência escolar e propor ações estratégicas, bemcomo o envolvimento das comunidades acadêmicasno problema, explorando ideias e argumentos quecontribuam para melhorar os resultados apurados eproduzir requisito parcial de avaliação de estágioobrigatório do acadêmico. Observa-se um crescentenúmero de licenças para tratamento de saúdepsicológica dos docentes, demonstrando como o nívelde crescimento da violência nas escolas vemproduzindo o adoecimento psíquico dos profissionaisde ensino. A metodologia utilizada neste trabalho,pelo método hipotético-dedutivo, envolve aexploração de literaturas e pesquisa de campo sobreo tema, no intuito de suscitar uma discussãosociológica e referencial. A violência traz, na suaessência, um conceito polissêmico, vez que o seuentendimento perpassa pela dependência dasrealidades histórica, social, política e cultural de umadeterminada comunidade. Não há que se falar emviolência sem antes constituir uma abordagemabrangente sobre como a comunidade na qual oambiente escolar está inserto, compreende e viveas relações interpessoais, os tratamentos sociais epolíticos dispensados a ela, as políticas públicas e,principalmente, os hábitos e valores culturais e moraisvigentes naquele lugar. Não se pode negar é que,independentemente da cultura abordada, hácomportamentos, hábitos e valores morais e sociaisque são compreendidos e julgados, unanimemente,como bons ou como maus. Há atitudes que causamrepúdio social e são temerárias nas relações sociaisde qualquer cultura e, a cada dia mais os professoresse tornam reféns delas. Demasiadamenteconstrangidos a suportarem o suplício de conviveremem relacionamentos frustrantes, conflituosos eemborrascados, sem quaisquer garantias da

A VIOLÊNCIA NA EDUCAÇÃO BÁSICA E A INTERVENÇÃO DO DIREITOVIOLENCE IN BASIC EDUCATION AND INTERVENTION OF RIGHT

Rodrigo de Souza Borges1

1 Graduado em Ciências Biológicas. Pós-Graduado, lato sensu, em Metodologia do Ensino. Servidor Público efetivodo Estado de Minas Gerais. Acadêmico do Terceiro Período de Direito da Faculdade de Direito Santo Agostinho.

segurança pública e de justiça social que, aliados àdesvalorização profissional e descrédito social,apresentam a face frágil e ineficaz do Estado, queproduz queda da autoestima dos professores etendem, ao longo do tempo, a se converterem emperturbações e enfermidades físicas, mentais eemocionais. A realidade dos profissionais daeducação básica parece encerrar expectativasdesanimadoras de um futuro funesto na rede públicada educação básica e é neste contexto que se chamao Direito à lide para promover a pacificação justada situação, enveredando, sempre que possível, pelocaminho da mediação e conciliação e, por últimainstância, requerer a jurisdição necessária paraminorar e resolver os conflitos encontrados nestetrabalho.

Palavras-chave: Violência; Escola; Direito.

ABSTRACT

This article presents the results of a researchconducted in public elementary schools, with afocus for the study of school violence and proposestrategic actions and involvement in the problemof academic communities, exploring ideas andarguments which help to improve the resultsobtained and produce partial evaluation requirementof compulsory internship academic. There is anincreasing number of licenses for treatment ofpsychological health of teachers, demonstratinghow the growth level of violence in schools hasbeen producing the mental illness of teachingprofessionals. The methodology used in this study,the hypothetical-deductive method, involves theexploration of literature and field research on thetopic in order to elicit a sociological frameworkand discussion. Violence brings, in essence, apolysemic concept, since his understanding

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permeates the dependence of historical, social,political and cultural realities of a given community.There is no need to talk about violence withoutfirst provide a comprehensive approach about thecommunity in which the school environment isinserted, understands and lives the interpersonalrelationships, social and political waived hertreatments, public policies, and especially the habitsand current cultural and moral values that place.One can not deny is that, regardless of cultureaddressed, there behaviors, habits, and moral andsocial values that are understood and judgedunanimously as good or as bad. There are attitudesthat cause social rejection and social relations arereckless in any culture, and every day more teachersbecome hostages of them. Too constrained toendure the ordeal of living together in frustratingand conflicting relationships without any guaranteesof public safety and social justice, coupled withprofessional devaluation and social discredit, havea weak and ineffective against the state, whichproduces drop in self-esteem teachers and tend,over time, to convert disorders and in physical,mental and emotional disorders. The reality of theprofessional basic education seems closediscouraging expectations of a dismal future inpublic primary education and it is in this contextthat we call the Right to promote fair deal forpacifying the situation, embarking, wheneverpossible, by way of mediation and reconciliationand ultimately require the necessary jurisdiction tomitigate and resolve conflicts found in this work.

Keywords: Violence; school; Right.

1 INTRODUÇÃO

O propósito de desenvolver este trabalho ci-entífico surgiu da necessidade de ser suscitada umadiscussão com base na investigação e análise acer-ca de um tema que se constitui objeto de inúmerosestudos em diversas áreas como Sociologia, Edu-cação, Medicina, Segurança Pública e Privada,etc., a saber: a violência nas escolas de educaçãobásica.

Por se tratar de um assunto tão relevante, ecom o temer de não ser perdido o fio encaminhadordo assunto abordado e para evitar uma discussãoautofágica em sua essência, optou-se por restrin-gir o tema à extensão limitada do espaço das es-colas públicas de Minas Gerais. Porém, não se podeesquecer de abordar o problema da violência nas

escolas de educação básica como um todo, atémesmo para se ter uma comparação em torno daamplitude do problema e levar o texto à promoçãode uma reflexão coerente. A intenção é formulara proposição de hipóteses e deduções que possamservir de base para possíveis considerações maio-res e intervenções futuras por parte do Direito,principalmente no ramo dos Direitos Humanos e,sobretudo, requerer a participação de membros dacomunidade do Direito na criação de estratégias epolíticas públicas que possam minorar o sofrimen-to enfrentado pelos profissionais da educação.

A violência traz, na sua essência, um conceitopolissêmico, vez que o seu entendimento perpassapela dependência das realidades históricas, sociais,políticas e culturais de uma determinadacomunidade. Não há como se falar em violênciasem antes constituir uma pesquisa abrangente sobrecomo a comunidade, na qual o ambiente escolarestá inserto, compreende e vive as relaçõesinterpessoais, os tratamentos sociais e políticosdispensados a ela, as políticas públicas, os hábitose valores culturais e morais vigentes naquele lugare principalmente o acesso à Justiça. Não se podenegar que, independente da cultura do lugar, hácomportamentos, hábitos e valores morais e sociaisque são compreendidos pelo

Direito como desvios sociais, apresentando--se no ordenamento jurídico como contravençõese até como crimes. Há posturas que causam re-púdio social e são temerárias nas relações sociais;infelizes são aqueles que estão constrangidos asuportar o suplício de conviver diariamente emrelacionamentos frustrantes e conflituosos, semquaisquer garantias de segurança e de justiça que,aliados à desvalorização profissional, descréditosocial e grande queda da autoestima dos educado-res, tendem, ao longo do tempo, a se converter emperturbações e enfermidades físicas, mentais eemocionais.

O professor tem encontrado enormes difi-culdades para entender e administrar os conflitosque vêm de encontro com a realização de suasfunções pedagógicas, muitas vezes impedindo-o documprimento do papel que se espera dele enquan-to profissional da educação em relação à aprendi-zagem e formação crítica dos seus alunos.

Tem-se consciência que o professor é o pro-fissional mais vulnerável na execução de suas ta-refas. Não obstante a sua importância, este pro-fissional sofre agressões de todo tipo, dada a suaexposição por conta da grande proximidade comos seus clientes e a dificuldade de acesso a uma

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atuação mais eficiente dos órgãos de segurançapública e a ineficácia da legislação que trata doassunto.

2 O DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA

Uma das principais características das pes-quisas qualitativas, segundo Patton (1986, apudFERREIRA, 2014), é o fato de que elas partemdo pressuposto de que as pessoas agem em fun-ção de suas crenças, percepções, sentimentos evalores e seu comportamento tem sempre um sen-tido a ser desvelado.

Para embasar a investigação, análise ereflexão sobre os temas em tela neste trabalho, foirealizada uma pesquisa de abordagem poramostragem qualitativa de um universo deprofessores de duas escolas estaduais de Pirapora,Minas Gerais, para balizar a realidade dosprofessores das escolas públicas estaduais de MinasGerais pertencentes à Superintendência Regionalde Educação de Pirapora-MG, no Norte de Minas.Um dos educandários envolvidos é a EscolaEstadual Argelce Carvalho Santos da Mota. Além

desta, mais quatro endereços de estabelecimentosde ensino em institutos prisionais e de educaçãoespecial para o que tange contratação eadministração de servidores. Nos estabelecimentospesquisados, há recebimento de matrículas dealunos, bem como administração de aulas, daAssociação de Pais e Amigos dos Excepcionais(APAE) de Pirapora; Sistema Prisional de Pirapora(SUAPI); Centro Socioeducativo de Pirapora(CSEP) e Sistema Prisional Assistência aoCondenado de Pirapora (APAC).

A supramencionada pesquisa foi realizadacom todos os profissionais que quiseram oupuderam colaborar, sem distinção entreprofissionais que trabalham na sede ou emquaisquer outros endereços da instituição em foco.Também foi desconsiderada a sexualidade, idade,cor, raça e condição socioeconômica dosparticipantes, de forma que a intencionadainvestigação apresentasse um resultado o maisheterogêneo e imparcial possível. Ao seremconcluídos os trabalhos de campo, alcançou-se umresultado que pode ser considerado surpreendente,conforme o relato abaixo pode esclarecer.

Tabela 1: Pesquisa de Campo

Fonte: Pesquisa de Campo na Escola Estadual Argelce Carvalho Santos da Mota

3 INTERPRETAÇÃO DA PESQUISA

Nas instituições pesquisadas, havia 93 docen-tes em atividade. Não foi possível entrevistar cin-co deles, com o percentual de 5,4%. Assim, 88professores (significando 94,6% do total) respon-deram à pesquisa, sendo este o corpus real dapesquisa. O resultado é o apresentado, assim. Dos88 respondentes, 31 (em percentual de 35,2%) são

efetivos/concursados e 57 (64,8%) são efetivadospela Lei 100 ou contratados. Questionados sobreas condições de trabalho oferecidas pela escola,seis (representando o percentual de 6,9%) disse-ram ser boas, 42 (47,7%) acham ruins e quarenta(45,5%) consideram péssimas. Não houve partici-pante que julgou ótimas as condições de trabalho.Oitenta e dois professores (93%) disseram já tersido desrespeitados por aluno; 78 (88,6%) já fo-

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ram agredidos direta e verbalmente; 25 (28,4%) jásofreram algum tipo de agressão física; 35 (39,8%)já se sentiram ameaçados ou intimidados por alu-no e 32 professores (36,4%) já foram diretamenteameaçados por aluno. Apenas cinco respondentes(5,4%) acionaram os órgãos de segurança públicapara denunciar as agressões ou ameaças sofridas.O restante dos casos ficou “entre os muros” doestabelecimento de ensino. Cinquenta e cinco pro-fessores participantes da pesquisa (representati-vos de 62,5% do total) admitiram já ter perdido ocontrole com o aluno e 80 (90,9%) já sentiramvontade de agredir algum aluno em determinadomomento. Trinta e um professores (35,2%) sofremde alguma doença física ou psíquica resultante dotrabalho docente; 55 (62,5%) já ficaram afastadosdo trabalho em licença para tratamento de saúdepor conta da lide na sala de aula. Os problemaslaborais mais citados foram cansaço mental,estresse e depressão. Em relação à vida social dosparticipantes quando estão fora da escola, 18(20,5%) responderam que nunca frequentam lu-gares públicos de lazer; a metade, ou seja, 44 ra-ramente e 26 (29,5%) frequentam normalmentelugares públicos.

As informações descortinadas na pesquisademonstram que no momento das entrevistas, tre-ze dos 93 professores, perfazendo (14,8%) dosdocentes efetivos, encontram-se desligados do tra-balho em licença para tratamento de saúde, sendoque desses enfermos, doze (92,3%), quase a tota-lidade, estão afastados com laudo de enfermidademental e/ou transtorno psíquico. Sendo assim, namesma pesquisa, foram entrevistados os substitu-tos dos docentes com enfermidades e impedidosde laborar.

Importante faz-se o estudo desta aferiçãocom o levantamento inédito feito pelo Jornal Esta-do de Minas (de 15 abr. 2013), que mapeou ascidades mineiras onde os índices de violência es-colar são mais elevados e põem em risco a segu-rança dos alunos e professores. Segundo a repor-tagem

Lições de Matemática e Português eramensinadas quando a voz dos professoresfoi abafada por estampidos de tiros na por-ta da escola. Os meninos começaram a ber-rar e a correr assustados para todos os la-dos”, lembra Ana Rosa, Secretária de umainstituição de ensino estadual de Patos deMinas, no Alto Paranaíba. A mulher teve deser corajosa. Correu pelos corredores, en-tre meninos e meninas de mochilas nas cos-

tas, até poder fechar a porta do colégio.“Quando estoura um tiroteio desses narua, a gente tranca as portas, segura osalunos e torce para ninguém se machu-car”, desabafa a secretária, que por motivode segurança pediu para usar um nome fic-tício. O clima de tensão e violência não érealidade apenas desse colégio, uma vezque Patos de Minas é o município com maisocorrências de crimes em que a referência éa escola, por alunos, entre as 29 cidadescom mais de 100 mil habitantes do estado.Cruzando as ocorrências da Polícia Militarregistradas dentro e nos arredores de insti-tuições das redes particular, municipal, es-tadual e federal em 2011, com o número deestudantes de cada cidade, segundo da-dos oficiais do Censo Escolar elaboradopelo Ministério da Educação, o Estado deMinas fez um mapeamento inédito dos mu-nicípios onde há mais violência no meioescolar. A PM não informou o número deocorrências em escolas no último ano (PAR-REIRAS, 2013).

Importante é, principalmente para acadêmi-cos de Direito, o estudo desta aferição, compa-rando-a com um levantamento inédito e até maisabrangente, feito pelo jornal Estado de Minas edivulgado em sua edição de 15 de abril do ano de2013, mapeando as cidades mineiras em que osíndices de violência escolar são mais elevados,colocando em risco a segurança dos alunos e pro-fissionais da educação.

Na mencionada pesquisa, o Jornal entrevistaa Secretária de uma escola estadual em Patos deMinas, no Alto Paranaíba, aonde, corriqueiramen-te, ocorrem inusitadas cenas de violência. Pormotivo de segurança, a entrevistada pediu parausar um nome fictício de “Ana” e relembra que oúltimo episódio funesto que ocorrera naquela es-cola fora marcado por tiroteios na porta da escola,o que apavorou a todos. Contudo, a Secretáriadeixa claro que são comuns, naquela escola, acon-tecimentos do tipo. Notou-se ainda, nas paredesda Instituição, a exibição de pichações com assi-naturas de gangues manifestando a sua rebeldia eo seu poder, enquanto nos livros de registros daSecretária, alunas de quinze anos que, após seremrepreendidas por fazerem uso de maconha no in-terior da sala, ameaçaram professores e diretores,indo parar na delegacia.

Observa-se, pela reportagem inserta no Jornalreferido, que a pesquisa se ateve aos municípiosmineiros com mais de cem mil alunos. E,comparando os dados levantados em suas unidades

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escolares com as ocorrências policiais de cadamunicípio, chega-se à conclusão que a maioria dasações de violência que ocorrem no interior da escolanão são registradas, por desinteresse da vítima ouameaças agressor, por demora ou indisposição dospoliciais que atenderam a ocorrência, ou até mesmopor conta de um processo conciliatório promovidopela própria Escola no intuito de diminuir arepercussão do caso. Inscreve-se, assim, parte dosdelitos ocorridos no ambiente escolar na cifra ocultadas ocorrências policiais. Fato é que, não havendopunição, o clima de tensão e violência se engrandecetomando proporções, muitas vezes, descontroladas.

Voltando a analisar os dados da mencionadapesquisa, constata-se que, dentre as 29 cidadescom mais de cem mil alunos (deve-se ressaltar),as escolas de Patos de Minas apresentaram a piortaxa, de 267,2 ocorrências para cada grupo de cemmil estudantes. Índice 48% maior que o segundolugar no ranking, Juiz de Fora, na Zona da Mata,com 180,4 ocorrências por grupo de cem mil dis-centes.

Assustadora, ainda, é a constatação da osci-lação dos índices de violência entre a comunidadeescolar, vez que autor da reportagem em assuntoapurou que em 2011 foram 1.363 ocorrências nasescolas desses 29 municípios, um número 3,9%menor que 2010, quando houve 1.417; mas, 53,3%superior aos registros de 2009, que somaram 889queixas. A Polícia Militar computou ainda 280 cri-mes violentos contra estudantes, professores efuncionários, chegando a 20,5% do total. Foram127 os registros de agressões, 72 de lesões corpo-rais, quinze de roubos, três estupros e atentadosviolentos ao pudor, um assédio sexual, um homicí-dio e 61 que constaram como “outras infraçõescontra a pessoa.”. Os furtos foram as ocorrênciasque mais apareceram nas instituições de ensinomineiras, com 393 registros, correspondendo a 29%do volume total de 2011.

Apesar de um pouco mais amena, em Juizde Fora, com segunda maior taxa de ocorrênciaspor estudantes, a realidade não é muito diferente,sendo que os furtos se destacam com 72 (33%)registros entre os 216 anotados em 2011, seguidospelos atos de violência, com 35 ameaças (16%),quinze danos às instituições (7%), treze atritosverbais (6%) e treze lesões corporais (6%).

Não obstante à pesquisa do mencionado jor-nal apontar uma maior concentração de violêncianos municípios da região Centro-Sul do Estado, énotória a incidência dos mesmos índices nas de-mais cidades que não possuíam o perfil da

amostragem. Outrossim, não foram abordadas,sobretudo as da região Norte do Estado.

Este exame leva à conclusão da necessida-de imediata de uma intervenção técnica ehumanizada nestes estabelecimentos, que deveri-am ser espaços de urbanidade, respeito, cidadaniae sonhos, e vêm se transformando em ringues deviolência e seara do crime.

Ferreira (2011) elenca, ainda na introduçãodo seu trabalho, estudos e levantamentos sobre oadoecimento do professor. Segundo estudo divul-gado pela Organização Internacional do Trabalho(OIT), uma realidade de sofrimento de centenasde milhões de pessoas que, em todo o mundo pa-decem de várias enfermidades, por decorrênciade suas atividades laborais, levando a admitir queo ambiente de trabalho, especialmente o dos pro-fessores, cujas relações interpessoais são mais in-tensas, é considerado um desencadeador dessasenfermidades como depressão, ansiedade esíndrome do pânico, além dos distúrbiososteomusculares, cardiopáticos e circulatórios.

Martins (2005) aponta o índice de 69%, emmédia, de professores do ensino fundamental darede pública no Brasil sofrendo de estresse e de-pressão, por conta das condições de trabalho. Si-tuação que corrobora com os demais estudos queapontam o ambiente escolar público no Brasil comoum fator determinante para produzir a doençalaboral do profissional da educação.

Lipp (2004) e Codo (1999, 2002) tambémabordam a questão do ambiente laboral prejudiciale produtor de enfermidade no professor. Codo(1999), realizou trabalho investigativo nas escolaspúblicas de todo o Estado, e constatou uma gran-de preocupação com a saúde mental e física des-ses trabalhadores por conta da exaustão emocio-nal. Em sua pesquisa de 2002, destacou, principal-mente uma enfermidade que tem se tornado co-mum dentro do magistério que é o burnout”, ousíndrome da desistência, que se manifesta atravésda perda do sentido da relação do profissional daeducação com o seu trabalho. Lipp, em 2004, cha-ma a atenção para a responsabilidade de cada umno cuidado com a escola e seus relacionamentosinterpessoais.

Partindo dessas pesquisas e analisando aimportância da contribuição que as academias deDireito poderiam apresentar havendo um maiorenvolvimento com o dilema, chega-se à conclusãode que a direção, os professores e o estudante deDireito podem se tornar atores importantes no pla-nejamento e execução de práticas estratégicas de

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composição dos mencionados conflitos, quando seobserva as partes adotando o meio mais arcaicode resolução de conflitos, a autotutela. Naautotutela, prevalece a lei do mais forte em detri-mento a um ordenamento jurídico vigente, eficien-te e eficaz na sociedade. Fica claro o quanto rele-vante se torna esta discussão para os causídicos,no afã de buscar o convencimento dos protagonis-tas da educação para uma intermediação mais justadas relações interpessoais que circundam os fatosjurídicos de extrema importância, a apropriação deum ambiente harmônico e saudável e a produçãoda justiça social no âmbito de normas jurídicasmais humanísticas. Em assim ocorrendo – ambi-ente harmônico e saudável e justiça social – pro-duziria conforto e segurança jurídica para que osprofessores pudessem ter melhores condições detrabalho, e o desenvolvimento de um ambiente quefavorecesse a aprendizagem do conhecimento.

Tudo isso é consequência de legislações quese pode classificar de frouxas, que incentivam oconstante litígio em sala de aula, promovem a ten-são no ambiente educacional e acabam afetandodiretamente a qualidade da prestação funcional edo papel desempenhado pelos professores. Sendoque atividade dos Professores é, indubitavelmente,relevante em qualquer sociedade.

Rigotti e Tosta (2008) salienta em pesquisarealizada pelo Sindicato dos Professores do Estadode Minas Gerais (SinproMinas), em parceria como Programa de Pós-Graduação em Educação e oPrograma de Pós-Graduação em Tratamento daInformação Espacial da Pontifícia UniversidadeCatólica de Minas Gerais (PUC-Minas). Sob otítulo “Rede de Ensino: Vida de Professor eViolência na Escola”, a pesquisa mostra, após ouvir2.500 profissionais, um índice que 41% dosentrevistados que já sofreram algum tipo deagressão, (27%) dos pesquisados já foram vítimasde ameaças, assédio moral ou violência psicológica.E 5% dos professores denunciaram ter sofridoviolência física.

Noronha (2001, p. 95) procurou identificaros conflitos do dia a dia, bem como os fatores in-ternos e externos vivenciados no ambiente esco-lar que agravam o estado de saúde dos professo-res do ensino fundamental em Montes Claros, MinasGerais, produzindo insatisfação, cansaço emocio-nal. Noronha associa estes fatores à sobrecargade trabalho e situações de violência.

Vasconcellos (1997) critica a ampliação dosíndices de impunidade dos violentadores da edu-cação. Aponta, também que, conforme a Organi-

zação Internacional do Trabalho (OIT), em 1983,a segunda categoria profissional a portar doençasde caráter ocupacional são os professores. Isto anível mundial.

Marra (2004), abordou o tema “Violênciaescolar: um estudo de caso sobre a percepção dosatores escolares a respeito dos fenômenos de vio-lência explícita e sua repercussão no cotidiano daescola” em sua Dissertação. E, além dasconstatações próprias, citou estudos como os deAlba Zaluar (1985, 1994) e Angelina Peralva (1997)que ressaltam a forma individualista e consumistada sociabilidade dos jovens da época da pesquisa.Para os pesquisados, a atividade do professor éum trabalho considerado como mal remunerado.E, desta forma, é facilmente vinculado – ainda navisão dos entrevistados – a uma atividade e umafunção desvalorizadas, destituídas de respeito.

Um grande descontentamento dos professo-res pesquisados se refere à ingerência dos órgãospúblicos despreparados na escola, impondo regrasque retiram completamente a autonomia da esco-la em prol de estatísticas que escondem a realida-de escolar sobre a aprendizagem e o apreenderdos alunos em relação às competências de leitura,escrita e matemática exigidas deles para a sérieque ele frequenta.

O déficit de aprendizagem é histórico e vemaumentando muito porque há muito tempo os alu-nos têm detectado que é quase impossível ficaremretidos em alguma série, inclusive porque tal atitu-de rebaixaria sobremaneira os índices da escola, asua reputação junto aos órgãos públicos e à socie-dade e, por conseguinte, a depreciação da avalia-ção de desempenho do profissional. Quem vai seatrever a reprovar um aluno por mais que ele nãotenha competências para progredir? Este é o pen-samento reinante entre os componentes do corpodiscente das escolas públicas de ensinos funda-mental e médio.

Só que o aluno também tem consciência daprogressão automática instituída como um “direi-to” seu e um dever do professor. O deslinde dessaquestão é, se não a construção de um analfabetofuncional que não apresenta desempenho de apren-dizagem não condizente com a sua matrícula, issocom a coerção do Estado, apoio dos pais e anuênciada sociedade.

Marra cita a afirmação de Maffesoli (1987),no sentido de que a burocracia do poder públicoobedece à lógica da homogeneização que impede,no anonimato, a expressão dos antagonismos in-ternos do corpo social. A escola, agência social

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por excelência, passa a ser manipulada por umEstado tutelar sob a promessa de segurança. Essadominação acaba por instaurar um autocontroledos seus atores, cuja herança é o recalque deemoções, impulsos e imaginação. E, quanto maiorfor a uniformização, mais força terá a violência,pelo enfraquecimento da coesão social, condiçãonecessária para o reconhecimento daquilo quemantém a força ou potência social. A imposiçãode um modelo de escola não discutido, em que asdiferenças não são levadas em conta, paulatina-mente vai dando lugar à reunião de forças queimpedem o êxito completo do modelo totalitário,sempre de maneira prejudicial.

Considerando-se que a baixa aprendizagem,evasão e repetência são as maiores preocupaçõesdo Governo, algumas tentativas governamentaispara minorar as questões têm sido colocadas emprática com o Sistema Mineiro de Avaliação daEducação (SIMAVE) e outras ferramentas admi-nistrativas para orientar políticas públicas nestaárea. Outrossim, fora feito no passado com a Es-cola Sagarana, os projetos “A Caminho da Cida-dania”, “Acertando o Passo” e outros, visando aocombate da exclusão escolar, mas que não apre-sentaram resultados satisfatórios.

4 A PROPOSTA DE PARTICIPAÇÃO DOSPROFISSIONAIS DO DIREITO NAAMENIZAÇÃO DO PROBLEMA

A proposta deste trabalho em relação aosprofissionais e estudantes/estagiários de Direito dasFaculdades de Minas Gerais é o projeto deenvolvimento das academias, para que os acadê-micos passem parte do período referente ao está-gio obrigatório em escolas públicas, dando prefe-rência àquelas que se encontram em áreas de ris-co e apresentem realidades coincidentes com es-tatísticas de violência. A intervenção dos acadê-micos no ambiente escolar seria na busca de da-dos para instruírem a produção de trabalhos estra-tégicos junto à direção, corpo docente, discente,familiares e órgãos públicos de Segurança Públicado município em que se encontra o estabelecimentoescolar, no intuito de, através de palestras, reuni-ões, oficinas e intervenções sociológicas ehumanísticas, atuarem na realidade da violência,uso e tráfico de drogas, vandalismo, desacato eoutros desvios de comportamentos dos atores dacomunidade escolar.

A proposta envolveria um convênio das Fa-culdades mineiras de Direito com a Secretaria

Estadual de Educação de Minas Gerais, o Minis-tério de Educação (MEC) e o Ministério PúblicoEstadual de Minas Gerais para validação das ho-ras contabilizadas no projeto, suporte acadêmico ejurídico para favorecer o efetivo envolvimento doacadêmico no desenvolvimento de programas es-tratégicos de intervenção contra a violência esco-lar e transformação da realidade hostil, atravésda autocomposição ou heterocomposição, quandofor o caso.

É esperado que o acadêmico, ou grupo deacadêmicos, envide todos os esforços possíveispara produzir efeitos satisfatórios junto à comuni-dade designada, na intenção de trazer conhecimen-tos através da prestação técnica aos membrosdaquela comunidade que estejam ligados de algu-ma forma à escola abordada. Após aprovação erecepção do convênio pela direção do estabeleci-mento de ensino público, o acadêmico deve per-manecer de duas a quatro horas no ambiente es-colar conhecendo a realidade que se lhe apresen-ta, traçando, juntamente com diretores e especia-listas de ensino, os planos que serão desenvolvi-dos junto aos atores daquela escola.

O estagiário deverá lançar toda a sua obser-vação, impressão e estratégia em relatórios apre-sentados como requisito parcial para avaliação doestágio obrigatório, descrevendo o seu tempo ecampo de atuação em cada situação-problemadetectada, o tempo necessário para a execuçãodas tarefas do planejamento e os resultados espe-rados e obtidos.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Observa-se uma nuvem negra que seagiganta sobre a educação mineira, com profes-sores desmotivados, desmoralizados, agredidos, queministram aulas desinteressantes para alunos re-beldes, agressores, desinformados e despreparadosque engrossam as fileiras dos repetentes e dos forada escola. Isto, quando não são empurrados paraas séries seguintes pelo sistema educacional deuma nova política governamental preocupada comestatísticas que forçam a aprovação. Fatos queocupam o lugar de desnudar o problema que vemsendo agravado pela falta de investimentos empolíticas públicas, desfazimento da autonomia daunidade escolar e ausência da família na vida es-colar do aluno.

Esse quadro se desemboca numadesmotivação completa do aluno, quando essedetecta que já se desvinculou, pelo caminho, o fio

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do novelo da aprendizagem e que agora se senteperdido em um universo que ele se reconhece comomarginal, diante de uma linguagem desconhecida.O aluno perde, então, a sua autoestima e sua con-fiança, e se torna um problema sério para a esco-la, pois ele não aceita permanecer em sala de aula,não respeita regras e normas, tampouco se vê en-volvido pelo ambiente escolar ou pela prática pe-dagógica ali desenvolvida. Posto isto, o aluno emquestão, quando pressionado, ataca com o seu ar-senal de ameaças, agressões verbais, brigas, inti-midação psicológica e física, uso de armas,bullying, depredações, palavras de baixo calão,chacotas e lesões corporais seguidos ou não demorte, deixando aflorar o seu estado de natureza,como cita Tomas Hobbes, no afã de desvencilhar--se do ambiente escolar opressor.

São múltiplas situações de violência que ocor-rem concomitantemente no dia a dia dos profissio-nais de educação, contudo, o que provoca ansie-dade, desestímulo, frustração e desmoralizaçãosocial, concorre também para a perda de autori-dade e inviabilidade do projeto educativo, assimsendo, os profissionais da sala de aula caem emdescrédito até para eles mesmos, vez que eles sa-bem que poderiam estar desempenhando melhoras tarefas do seu ofício. Entretanto, as condiçõesadversas abordadas neste trabalho científico nãopermitem.

Segundo Arendt (1985), a autoridade é ine-rente a uma pessoa, a um cargo e prescinde decoerção, tampouco de persuasão. A sua caracte-rística é o reconhecimento sem contestação, semdiscussão. Esta perda de autoridade dos professo-res, também por conta de sua desvalorização sa-larial, coloca em cheque a questão da ordem, pro-piciando a que a desordem se instale, não só entreos alunos, mas também com a conivência de seuspais. O modelo de sociedade pragmática econsumista a que se está submetido vincula a au-toridade ao reconhecimento também pela remu-neração ligada à função. “O maior inimigo da au-toridade é, portanto, o desprezo e, a maneira maissegura de solapá-la é a chacota”, diz Arendt (1985,p. 25).

Cabe, nesta reflexão, parafrasear o escritorPaulo Freire (2000, p. 67), que dizia: “Não é possí-vel refazer este país, democratizá-lo, humanizá-lo,torná-lo sério, com adolescentes brincando dematar gente, ofendendo a vida, destruindo o so-nho, inviabilizando o amor. Se a educação sozinhanão transforma a sociedade, sem ela tampouco asociedade muda.”.

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UMA ANÁLISE DO EGOÍSMO PELA APROXIMAÇÃODOS PENSAMENTOS DE HOBBES E ARENDT COM A ATUALIDADE

Thaís Carolina Sousa Guedes1

1 Acadêmica do Primeiro Período do Curso de Direito da Faculdade de Direito Santo Agostinho.

RESUMO

O objetivo do estudo é comparar a relação egoísmoversus altruísmo da conduta individual para aesfera coletiva. É possível fazer uma analogia dasideias acerca do egoísmo humano analisando obrasde Thomas Hobbes (2000) e Hannah Arendt(2004). Hobbes viveu na transição do século XVIpara XVII. Uma época conflituosa, marcada porum período de turbulência e instabilidade em quese encontrava a Inglaterra. Em sua obra, “OLeviatã”, Hobbes (2000) explanou o seu ponto devista a respeito da natureza humana. Para ele, ohomem é naturalmente mau e egoísta. Arendt, porsua vez, viveu durante o século XX. Em uma épocanão menos conflituosa, ela vivencioutransformações políticas deste século e conflitoscomo a primeira e segunda guerras mundiais. Na“Condição Humana”, Arendt (2004) não falapropriamente da natureza humana, que, para ela éalgo cabível apenas ao conhecimento divino, masfala a respeito da existência humana em que, asações humanas, como o egoísmo, sãocondicionadas pela sociedade. Fazendo essacomparação, percebe-se uma aproximação dostemas, embora os autores tenham vivido em épocasdistintas, no que diz respeito à época conflituosaem que ambos viveram e de que, para eles, oegoísmo está presente no convívio em sociedade,assim, como também, está presente na época atual,independentemente da sua origem. Conclui-seentão que o egoísmo é algo presente na sociedade,e é esse egoísmo que faz com que as relaçõeshumanas hoje sejam cada vez mais indiferentes eindividualistas e produz a atual estrutura social.

Palavras-chave: Hobbes, Arendt, Egoísmo, Na-tureza Humana, Condição Humana.

ABSTRACT

The objective of the study is to compare the ratiobetween selfishness and altruism of individualbehavior to the collective sphere. Is possible todo an analogy of ideas about the human egoismanalyzing works of Thomas Hobbes (2000) andHannah Arendt (2004). Hobbes lived in thetransition from the sixteenth century to theseventeenth. Conflictive age, marked by a periodof turbulence and instability that existed inEngland. In his work, “Leviathan” Hobbes (2000)expounded his point of view about human nature.For him, the man is naturally evil and selfish.Arendt, on the other hand, lived during thetwentieth century. Also in a conflictive times, sheexperienced political transformations and conflictsof this century such as first and second WorldWars. In “Human Condition”, Arendt (2004) doesnot speak of human nature strictly, which for heris something applicable only to the Divineknowledge, but argues about human existence inwhich human actions, such as selfishness, areconditioned by society. With this comparison, wecan see an approximation of the issues, althoughauthors have lived at different times, in relationto conflicting time when both lived and that, forthem, selfishness is present in life in society, aswell as also is present in the current time,independently of their origin. It is concluded thatselfishness is something present in society, and itis this selfishness that causes human relationshipstoday are increasingly indifferent andindividualistic and produces the current socialstructure.

Keywords: Hobbes, Arendt, Selfishness, HumanNature, Human Condition.

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1 INTRODUÇÃO

Considerando a importância das relaçõeshumanas na sociedade, e que estas se encontramcada vez mais individualistas e pouco preocupa-das com a esfera coletiva, é coerente analisar oprecursor dessa individualização, o egoísmo, ca-racterizado como um impulso natural de preserva-ção dos próprios interesses a despeito dos de ou-trem. O egoísmo é, em maior ou menor intensida-de, próprio da espécie animal.

No homem, esse impulso é fator limitante daexpansão da consciência fazendo com que a suarestrita percepção do Todo passe a ser mais limi-tada ainda. Ou seja, as ações são cada vez maisvistas apenas pela própria perspectiva, pouco sepreocupando com o coletivo. O egoísmo natural-mente se contrapõe ao altruísmo, que se caracte-riza por aquelas ações que se preocupam com ocoletivo, não se confundindo, portanto, com soli-dariedade, que é um sentimento de identificaçãoem relação ao sofrimento dos outros.

E esse egoísmo é facilmente perceptível nasociedade atual, nas ações observadas no cotidia-no em que, reiterando, a conduta individual, poucose preocupa com a esfera coletiva, faz com queas ações individuais e egoístas interfiram de for-ma negativa nessa esfera.

Essa forma negativa se mostra, por exem-plo, pela indiferença que se tem pelo outro, por,muitas vezes, o tratar como coisa, o conhecidoprocesso de coisificação, e, principalmente, pelasdisputas de poder. Entretanto, esse egoísmo queparece ser algo característico somente dessa ge-ração, não é novo, específico do século XXI, masalgo antigo, podendo ser percebido em diversasépocas e contextos. E sem o intuito generativo,quem sabe esteve presente em todas as épocas aque se tem conhecimento?

Para o presente estudo, será feito um recor-te, trazendo à luz dois momentos significativos eimportantes obras, que permitem uma análise daforma e do contexto ao qual o egoísmo esteve atre-lado. São os livros de Thomas Hobbes (2000), sé-culo XVI para o XVII, denominado “O Leviatã”;e Hannah Arendt (2004), século XX, e sua obra“A Condição Humana”.

2 DA VISÃO DE THOMAS HOBBES

Para Hobbes (2000), o egoísmo é caracte-rístico do estado natural do ser humano. O homemé, em sua essência, mau e egoísta.

Hobbes desconsidera que o altruísmo nãoseja algo natural no ser humano, pois paraele, todos os homens são egoístas natural-mente, preocupando-se apenas com seupróprio bem-estar. Ao afirmar que o princí-pio de conservação norteia todas as açõeshumanas e o estado de natureza se caracte-riza exatamente pela ausência de um podercoercitivo para regular as ações dos ho-mens e dar-lhes a medida do justo e do in-justo, do certo e do errado, Hobbes revelaque todos os homens são levados a usarde quaisquer meios para assegurar para sio que lhes é primordial, isto é, a sua própriaconservação (ALMEIDA, 2014).

Esse egoísmo advém da compreensão dohomem como um ser que deseja o poder, comouma forma de sobrevivência, sendo todos deten-tores dele; o conflito, a insegurança e o estado deguerra são apenas consequências. É nesse mo-mento que, na visão de Hobbes, seria necessário einteressante que as ações e vontades individuaisse sobrepusessem às coletivas. Desta forma, asoma dessas vontades individuais iria se transfor-mar na figura do Estado, uma entidade detentorado poder.

Hobbes descreve o homem em seu estadonatural, como egoísta, egocêntrico e inse-guro. Ele não conhece leis e não tem con-ceito de justiça, ele somente segue suaspaixões e desejos misturados com suges-tões de sua razão natural (CAIXETA, 2014).

Por isso, ele acreditava que esse egoísmo seriaamenizado se as pessoas passassem a viver emsociedade, com a instituição de um estado sobera-no. A principal finalidade do Estado seria ameni-zar os conflitos entre os seres humanos e assegu-rar a paz entre os homens. Ou seja, seria precisoum ser com maior estatura e força que o homemnatural, que assegurasse proteção e defesa à po-pulação, como um verdadeiro Leviatã, que seriarepresentado na condição de Estado. Tendo emvista isso, Hobbes (2000) defendia uma posturaconservadora e colocou-se a favor do Estadomonárquico. Ponto de vista este defendido peloautor em seu livro “O Leviatã”.

[...] Quando o representante é um só ho-mem, o governo chama-se monarquia.Quando é uma assembleia de todos os quese uniram, é uma democracia, ou governopopular. Quando é uma assembleia apenasde uma parte, chama-se lhe uma aristocra-cia. Não pode haver outras espécies de

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governo, porque o poder soberano inteiro(que já mostrei ser indivisível) tem que per-tencer a um ou mais homens, ou a todos.(HOBBES, 2000, p. 114).

É importante que se faça uma análise a res-peito do contexto histórico no qual Thomas Hobbesvivera para que se tenha um melhor entendimentode suas ideias, tendo em vista que o fator históricoé de grande influência para a formação das ideiasde quaisquer autores.

Hobbes viveu durante a idade moderna natransição do século XVI para o XVII, época emque a Inglaterra se encontrava imersa em diver-sos conflitos e em um período de grande turbulên-cia, segundo afirma Almeida (2014), e grandesconflitos religiosos como, por exemplo, a ReformaProtestante. Esses conflitos foram marcados, prin-cipalmente, pelas disputas de poder, tanto no âm-bito político, quanto no religioso. E para Hobbes, oprincipal motivo que o levou a considerar que opoder não deveria ser contestado e que fosse ab-soluto foram as intensas disputas de poder entrerei e Parlamento inglês que, em sua opinião, de-sencadeou uma guerra civil, levando-o a entendero poder como uma capacidade que não deveriaser dividida. “Hobbes parte da constatação de queas disputas entre rei e parlamento inglês teriamlevado à guerra civil, o que o faz concluir que opoder do soberano deve ser indivisível.”(CAIXETA, 2014).

3 DA VISÃO DE HANNAH ARENDT

Analisando-se o egoísmo na visão de Arendt(2004), percebe-se que ele não é umacaracterística natural do ser humano. No entanto,é condicionado na sociedade através das açõeshumanas que, para ela, correspondem à condiçãohumana da pluralidade.

A ação, única atividade que se exerce dire-tamente entre os homens sem a mediaçãodas coisas ou da matéria, corresponde àcondição humana da pluralidade, ao fatode que homens, e não homem, vivem naterra e habitam o mundo (ARENDT, 2004,p. 15).

Ou seja, o egoísmo não seria algo específicoda individualidade, e não sairia do indivíduo para ocoletivo, e sim, do coletivo para o individual. Issoporque os humanos são seres condicionados.

Essa condição humana defendida por Arendt(2004) diferencia-se do conceito de natureza hu-

mana. Para ela, a conceituação e explicação denatureza humana são cabíveis apenas ao conheci-mento divino, como se vê nas seguintes palavras:

O problema da natureza humana [...], pare-ce insolúvel, tanto em seu sentido psicoló-gico como em seu sentido filosófico geral.É altamente improvável que nós, que pode-mos conhecer, determinar e definir a essên-cia natural de todas as coisas que nos ro-deiam e que não somos, venhamos a sercapazes de fazer o mesmo a nosso respeito[...]. Em outras palavras, se temos uma na-tureza ou essência, então certamente só umdeus pode conhecê-la e defini-la [...].(ARENDT, 2004, p. 15).

Todas essas ações humanas, na esfera pú-blica, são baseadas na questão política, isso por-que os seres humanos são seres políticos, o quefaz alusão à ideia de Aristóteles de que o homem éum animal político, ou seja, os seres humanos sãoseres sociais, que precisam viver em coletividade.Consequentemente, o egoísmo seria a raiz para omal. Arendt defendia o pluralismo político, em quea igualdade política e a liberdade se manifestamnaturalmente entre as pessoas. Há tolerância erespeito às diferenças, possibilitando a inclusão.Assim, ações egoístas não possibilitam esses acon-tecimentos. Em consequência dessa ideia, ela pri-vilegiava a democracia direta na qual todos se ex-pressam e tomam suas decisões sem intermédioou um sistema de conselhos em detrimento de for-mas de democracia representativa no qual as pes-soas elegem um representante para expressar odesejo do coletivo e decidir pela população e paraa população.

Como em Hobbes (2000), o ponto de vistade Hannah Arendt (2004) também pode ser en-tendido pela análise do tempo histórico em que elaviveu.

Arendt viveu durante o século XX, uma épo-ca, assim como a de Hobbes, marcada por confli-tos e grandes transformações políticas que influ-enciaram significantemente a estrutura política vi-gente.

Dentre esses conflitos, destacam-se as guer-ras mundiais, primeira e segunda, consideradas porEric Hobsbawm (1995), como a Grande GuerraMundial; e também a guerra-fria. Esses conflitosforam marcados por interesses políticos, e, comona época de Hobbes, basearam-se na intensa dis-puta de poder e na ausência de democracia devi-do aos diversos governos ditatoriais, como, porexemplo, o Nazismo de Hitler, na Alemanha.

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4 HOBBES VERSUS ARENDT

Hobbes e Arendt, direta e indiretamente, dis-correm a respeito do egoísmo e de como ele inter-fere na esfera coletiva, na sociedade. Suas ideiasapresentam semelhanças e diferenças. Aproxi-mam-se porque, apesar da diferença de quasequatro séculos, foram escritas em épocas marcadaspor conflitos e transformações políticas. Diferen-ciam-se pelas suas distintas perspectivas ao se tra-tar do assunto. Enquanto para Hobbes o egoísmoé característico da natureza humana e que viverem sociedade ameniza o estado de guerra causa-do pelo egoísmo humano, para Arendt, o egoísmofunciona como uma ação humana que é condicio-nada pela sociedade.

Outra marcante diferença é ao que diz res-peito às suas preferências por governos que po-dem ser facilmente explicadas pelo contexto his-tórico de ambos. Hobbes defendia a monarquia eo poder absoluto, tendo em vista que o século XVIIfoi marcado por grandes disputas de poder entrereis e monarcas. Já Arendt, defendia a democra-cia, sendo direta ou representativa, tendo em vistaos grandes ditadores presenciados por ela duranteo século XX.

Percebe-se, também, a presença, em ambasas épocas, da constante disputa pelo poder, princi-palmente o poder político; social, e que para Hobbese Arendt, esse poder é uma forma de igualdadeentre os humanos, já que todos o têm ou possuema capacidade de tê-lo.

De uma forma ou de outra, o egoísmo, paraambos, interferiu na relação entre privado e cole-tivo, e esteve bem mais presente na sociedade doque o altruísmo.

5 DA VISÃO ATUAL

Na a análise atual do egoísmo, pode-se fazera seguinte pergunta: dentre as ideias estudadassobre a relação do egoísmo versus o altruísmo daesfera individual para a coletiva, qual ideia, entreHobbes (2000) e Arendt (2004), se assemelha emais bem se encaixa com a ideia de egoísmo quese tem percebido na atualidade? Para uma res-posta, primeiramente é preciso entender a ideia doegoísmo na atualidade.

Hoje o egoísmo, como já foi dito, é de fácilpercepção. Ele está presente em muitas açõespraticadas pelo ser humano. Isso porque o mundoé analisado apenas pelo seu próprio ponto de vis-ta. E esses atos egoístas podem ser vistos em pe-

quenas ações, como jogar um lixo na rua, não res-peitar a faixa de pedestre, ou em ações com maiorrepercussão, como a prática da violência e do ra-cismo, por exemplo. O simples ato de jogar umlixo na rua demonstra a pouca preocupação com ocoletivo, tanto com a questão estética, quanto coma ambiental. É não se preocupar com asconsequências que esses atos podem trazer à vidade outras pessoas. Assim como a violência, queem grande parte é baseada em disputas de poder.Ou seja, o egoísmo, hoje, pode ser observado emdiversas ações.

Logo, pode-se dizer que não é interessanteadotar partido entre as ideias de Hobbes (2000) eArendt (2004), mas, sim, correlacioná-las, já queuma, na visão atual, completa a outra. É possíveldizer que o egoísmo é característico da naturezahumana, assim, como, também se pode dizer queé algo condicionado pela sociedade. Em outraspalavras, as ações individualistas estão completa-mente ligadas à esfera coletiva, independente se éo coletivo que interfere nas ações individuais ouse é o contrário, além de que, na sociedade vigen-te, é difícil dizer que há ações completamente indi-viduais, tendo em vista que praticamente todas asações de um indivíduo interferem, de uma formaou de outra, na vida de outrem.

Entretanto, se for indispensável que se adoteum partido entre essas ideias, o mais provável éque se opte pela ideia de Arendt, tendo em vista agrande interferência que a esfera coletiva tem di-ante da conduta individual e a proximidade que setem entre a sua época e a atual.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O egoísmo é algo presente na sociedade. Eé ele que faz com que as ações hoje sejam cadavez mais individualistas e indiferentes, constituin-do uma estrutura social baseada em ações quepouco se preocupam com o coletivo, com pessoasque visam apenas sua perspectiva sem se impor-tar com a de outrem. Não se espera, portanto, quese chegue a uma sociedade em que o egoísmo nãoexista e que as pessoas sejam altruístas. Isso éutopia. Espera-se, sim, que as pessoas reconhe-çam a existência do egoísmo e de como ele é ca-paz de moldar diversas ações na sociedade, comoo crime, a violência, o preconceito, e em pequenasações, muitas vezes consideradas insignificantespelas pessoas. Como disse o crítico irlandês Os-car Wilde (1854-1900), “Toda a gente é capaz desentir os sofrimentos de um amigo. Ver com agra-

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do os seus êxitos exige uma natureza muito deli-cada.”.

Em outras palavras, Wilde quer dizer que osentimento egocêntrico faz com que seja difícil li-dar com as alegrias alheias porque as pessoas es-tão acostumadas apenas com suas perspectivas eolhar o mundo através delas. Espera-se, por fim,que ao se fazer reconhecido esse egoísmo, as pes-soas pensem e analisem mais suas atitudes e en-tendam melhor as atitudes de outrem. Assim, ten-do uma maior possibilidade de mudá-las e de sechegar a uma sociedade na qual as ações altruís-tas sejam bem mais percebidas do que as açõesegoístas.

REFERÊNCIAS

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ARTIGOS DEEGRESSOS

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RESUMO

Desde os primórdios da humanidade, o desempe-nho da advocacia tem se perpetuado nas socieda-des, não como detentor de capacidadepersonalíssima, mas como aquele que reconheci-damente empregava métodos para influir em de-cisões essenciais ao progresso da sociedade. Opresente estudo, a partir disso, tem por escopoapontar a atual importância do profissional da ad-vocacia no desempenho da tutela jurisdicional.Legitimamente, o desempenho da capacidadepostulatória é conferido ao profissional da advo-cacia em todo o mundo. No Brasil, onde este estu-do se dispõe a analisar, sua importância é reco-nhecida pela atual Constituição Brasileira, na me-dida em que prevê em seu artigo 133 ser o advo-gado indispensável à administração da Justiça. Anorma constitucional, todavia, não pode ser admi-tida de forma absoluta, assim como vem enten-dendo as Cortes Superiores do País. Por essa ra-zão, além de apontar a essencialidade desse pro-fissional, é o presente para apontar os mais diver-sos pontos de vista sobre o tema, sobretudo dosprincipais posicionamentos da doutrina e jurispru-dência brasileira.

Palavras-chave: advocacia; indispensabilidade;capacidade postulatória.

ABSTRACT

Since the dawn of mankind the performance oflaw is perpetuated in society, not as having verypersonal capacity, but as one who recognizedmethods employed to influence decisions essentialto the progress of society. The present study, as ithas for the current scope pointing importance of

A ESSENCIALIDADE DO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA NO SISTEMA JURÍDICOBRASILEIRO: uma abordagem sistemática da importância do advogado

THE ESSENTIALITY THE PURSUIT OF ADVOCACY IN BRAZILIAN LEGALSYSTEM: a systematic approach to the importance of attorney

Igor Coelho Antunes Ribeiro1

1 Graduado em Direito pela Faculdade de Direito Santo Agostinho.

professional advocacy in the performance of judi-cial review. Rightfully, the performance capacitypleading is given to professional advocacyworldwide. In Brazil, where this study sets out toexamine their importance is recognized by thecurrent Brazilian Constitution, in that it provides inits Article 133, be the lawyer indispensable to theadministration of justice. The constitutionalprovision, however, can not be accepted asabsolute, as is understanding the Superior Courtsof the country Therefore, besides indicating theessentiality of this professional, this is to point outthe various points of view on the topic especiallythe main positions of the doctrine and jurisprudenceBrazilian.

Keywords: advocacy; indispensability; abilitypleading.

1 LIÇÕES PROPEDÊUTICAS

O desempenho da advocacia revela a neces-sidade da atuação de um profissional no desempe-nho da chancela jurisdicional do Estado. Isso por-que o mecanismo judicial tem se mostradoexageradamente complexo, mormente em se tra-tando dos diversos procedimentos a seremadotados, bem assim da complexidade processualna condução do processo ao seu julgamento final.

A atuação do advogado vem de muito temposendo reconhecida nas modernas sociedades, sen-do certo não se tratar originariamente de meracapacidade personalíssima, podendo qualquer ci-dadão exercê-la. Com o passar do tempo, porém,o exercício da advocacia, em face da sociedademoderna, passou a ter reconhecimento no sistemajurídico contemporâneo, necessitando que esse

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profissional, a partir de então, passasse por um lon-go estudo de capacitação especializado.

Com efeito, malgrado o sistema jurídico pátriohá muito tempo tenha reconhecido a importânciado advogado, foi apenas a partir da atual Consti-tuição brasileira de 1988 que esse profissional pas-sou a ter seu exercício indispensável à administra-ção da Justiça. Pelo menos, em nível constitucio-nal, como se vê do disposto no artigo 133 da CartaMagna.

Dispondo a analisar o desempenho da advo-cacia no Brasil, o presente estudo tem por objetivodesenvolver os principais temas que disciplinamsobre o assunto, assim considerados aqueles quese configuram essenciais ao sistema jurídico inter-no.

2 O EXERCÍCIO DA ADVOCACIA: UMMISTER PROFISSIONAL

Na medida em que a sociedade evolui, sur-ge, juntamente a ela, uma série de conflitosinterpessoais, sendo que os anseios individuais doscidadãos nem sempre prevalecerão de maneiraharmônica. As soluções para tais controvérsiaspodem ocorrer por diversos métodos, como a par-ticipação de um terceiro ou, ainda, por autonomiaprópria dos conflitantes.

No assessoramento às partes em litígio, embusca do fim desejado em nome do acordo ou dadecisão justa, e utilizando-se de qualquer dessesmétodos, a figura do advogado se mostra de ex-trema importância. Sobretudo se almejarem a so-lução deste conflito mediante provocação do Po-der Judiciário.

Quanto a isso, é o que se lê em Branco (2012),a seguir transcrito.

É o advogado quem procura, comorepresentante de uma das partes, influir noespírito do julgador para que este diga qualo direito aplicável. É natural, portanto, quea lealdade processual também lhe devaorientar a conduta coram judicem. Mas, aatuação do advogado começa antes que seinstaure o processo e se proponha a ação.Nos episódios e momentos que antecedemao processo, o advogado inescrupulosocostuma empregar métodos de guerra denervos para obter, como diz Calamandrei, otriunfo de seu cliente, na luta extrajudicial,com o engano e manobras sub-reptícias.

O detentor do exercício da advocacia deve,por essa razão, lutar permanentemente pela justi-

ça social, sempre em defesa da ordem jurídica,conforme demonstra Lôbo (2009, p. 262), verbis:

Em várias Conferências Nacionais, a OABconsolidou seu compromisso com a pro-moção da justiça social, elevada a uma desuas finalidades explícitas. A justiça socialdifere das espécies aristotélicas da justiçacomutativa e da justiça distributiva, por-que é dotada da função de suprimir ou re-duzir as desigualdades sociais ou regionais(pressupostas) e promover a sociedade jus-ta e solidária. A Constituição de 1988 ele-vou-a a objetivo fundamental da República(art. 3.º) e a princípio reitor da atividade eco-nômica (art. 170). Cabe à OAB e aos advo-gados brasileiros contribuírem para essagrandiosa tarefa, na medida de suas possi-bilidades.

As atividades exercidas pelo profissional daadvocacia são fundamentais à sociedade, permi-tindo que as pretensões dos litigantes se revistamde técnica jurídica especializada, apta à consecu-ção dos direitos presumidos a seu favor.

Sobre essa perspectiva, Mamede (2011, p.10), advém que

[...] o advogado é um servidor da socieda-de, permitindo a cada pessoa apresentar-se perante o Estado, bem como peranteoutras pessoas de Direito Privado, postu-lando suas pretensões jurídicas e exerci-tando seus direitos. É, portanto, um “pro-tetor”, aquele que “defende e intercede afavor”. Um assistente, um consultor, umpatrono, um protetor, um padroeiro. O ad-vogado é marcado, em sua atividade, poressa parcialidade: ela é essencial em suaatuação. Seu trabalho é justamente dar ex-pressão técnica à pretensão de seu repre-sentado, permitindo que esta se revista deforma jurídica, hábil a ser aceita ou refutadapelo Judiciário.

Além das disposições pertinentes ao desem-penho da profissão, são também morais os valoresdestinados ao seu exercício, devendo o advogado“encarar o exercício da profissão com responsa-bilidade suficiente para perceber sua importânciana sociedade independentemente dodisciplinamento legal a que está submetido.” (AZE-VEDO, 2004, p. 35). São, assim, os preceitos éti-cos que guiam a atividade advocatícia.

A Constituição da República Federativa doBrasil de 1988 (CRFB/88) conferiu ao exercícioda advocacia um encargo jurídico de múnus públi-co, destinando-lhe uma série de pressupostos ínsitos

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ao interesse da sociedade, e não apenas aos inte-resses individualmente postos à sua disposição.

Sobre essa prerrogativa, Cardella (2006, p.4) ressalva que o advogado

[...] mesmo em seu ministério privado, éconsiderado um prestador de serviço pú-blico, pois, ainda que não participe comoagente da administração pública, é indis-pensável à administração da justiça, exer-cendo com isso função de caráter social,de forma que seus atos constituem ummúnus público.

O tratamento constitucional impõe ao advo-gado o exercício de serviço público e de funçãosocial, devendo exercê-lo teleologicamente, pois àluz da Constituição Federal “não pode ser vistocomo um mero defensor de interesses privados,mas fundamentalmente como um dos sujeitos in-dispensáveis para que o Estado possa cumprir le-gitimamente sua função jurisdicional.”(RODRIGUES, 2006, p. 72).

Considerando a importância do advogado nabusca da plena satisfação do direito de seu consti-tuinte e da sociedade é que decorre a necessidadede regulamentar os comportamentos e deveres aserem observados por este profissional.

Definindo essa premissa como deontologiaforense, Nalini (2006) designa o conjunto das nor-mas éticas e comportamentais a serem observa-das por este profissional.

Esta atividade, no Brasil, é regulamentada,além das disposições constitucionais aplicáveis aoseu exercício, pela Lei 8.906/94, denominado deEstatuto da Advocacia, pelo Regulamento Geraldo Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advo-gados do Brasil (OAB), Código de Ética e Disci-plina, bem como os Provimentos do Conselho Fe-deral da OAB.

O desempenho das suas funções é privativoaos Bacharéis em Direito que possuam inscriçãono quadro da Ordem dos Advogados do Brasil,sendo sua inscrição obtida com a aprovação emexame de suficiência realizado pela Ordem dosAdvogados do Brasil.

O advento da Constituição brasileira distin-guiu ainda a advocacia privada e pública, dispondoque a representação dos órgãos públicos caberáagora à Advocacia-Geral da União. A EmendaConstitucional 19, de 1998, acrescentou sobre otema, e organizou a representação judicial dosEstados e do Distrito Federal através de Procura-dorias próprias.

Não obstante, Carvalho (2011) assevera queo artigo 69 do Ato das Disposições Constitucio-nais Transitórias já permitia aos Estados em man-ter consultorias jurídicas separadas, cabendo àsConstituições Estaduais fixar a forma de nomea-ção do Procurador-Geral do Estado.

A observação no desempenho deste profis-sional fez com Eduardo Couture (1979) discipli-nasse alguns mandamentos essenciais ao cumpri-mento do exercício de advogar. Para o autor, énecessário admitir uma série de fatores para quea prática indique as reais virtudes dessa profissão.

Comentando sobre os mandamentos do ad-vogado, Bulos (2010, p. 1.398) expõe o seguinteexcerto:

Consignam máximas hauridas da vivência,que revelam a linhagem da condutaprofissional. Intentam dizer, de forma simples,a hierarquia do mister advocatício. Ao mesmotempo, ordenam e confortam, buscando ainteração da condição humana do advogadocom a missão quase divina da defesa.

Assim, têm-se como mandamentos do advo-gado nas lições de Couture (1979): estudar, pen-sar, trabalhar, lutar, ser leal, tolerar, ter paciência,ter fé, esquecer e amar a profissão.

Não obstante, o exercício da advocacia noBrasil é, atualmente, identificado por uma série deproblemas. Contemporaneamente denominado deteoria da crise da advocacia, Roberto A. R. deAguiar (A crise na advocacia do Brasil. SãoPaulo: Alfa-Ômega, 1991) apud Rodrigues (2006,p. 71) constitui como problemas conceituais, polí-ticos, estruturais, de exercício profissional e delegitimação, a seguinte vértice:

A questão conceitual é fundamental e refe-re-se à dissociação entre o conhecimentojurídico e as necessidades do mundo con-temporâneo. Já o principal problema políti-co da advocacia é a dissociação efetuadaentre a atuação profissional e o exercícioda cidadania, sendo a dependência do Po-der Judiciário o seu principal problema es-trutural. Como problemas de exercício pro-fissional podem ser destacadas algumasquestões fundamentais, tais como: ainexistência de uma divisão racional do tra-balho, o exercício plural de profissões e odesconhecimento em relação aos conflitosda contemporaneidade.

Esse conjunto de problemas evidencia adissociação dos valores inerentes ao advogado,

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desestimulando o seu exercício em face de novaspossibilidades de mercado.

Há ainda a crise do mercado de trabalho,oriunda da quantidade de profissionais ligados àadvocacia, bem como a crise da identidade, para aqual o advogado “continua cultivando essa ima-gem, projetando-a como meta a ser alcançada. Noentanto, a realidade demonstra ser ele, hoje, umsonho descontextualizado.”2 (RODRIGUES, 2006,p. 72).

Outrossim, a advocacia não consiste em umsimples exercício profissional, pois a mera ativida-de técnica é insuficiente para configurar a impor-tância que lhe é dada. Também há, ainda, o papelna intermediação de controvérsias, bem como noinstrumento de efetivação da cidadania.

3 CAPACIDADE POSTULATÓRIA

Malgrado seja uníssono o entendimento deque a ação é um direito inerente a qualquer indiví-duo, exige-se para a admissibilidade da tutelajurisdicional a existência de determinadas condi-ções e pressupostos. As condições da ação se clas-sificam em legitimidade (ad causam), interesse emagir e possibilidade jurídica do pedido (artigo 3.º doCódigo de Processo Civil). Os pressupostos pro-cessuais, por sua vez, são interpretados de acordocom a existência e validade de tais elementos.

Seja em qualquer destes planos, o estudo dascapacidades tem sido prática recorrente daquelesque permeiam da atividade judiciária. A simplesformação processual exige o preenchimento dealguns requisitos, fazendo com que a demanda sejaconstituída regularmente.

A capacidade processual pode ser compre-endida como gênero, identificada por três espéciesdistintas, capacidade de ser parte, capacidade de estarem juízo e capacidade postulatória.

De acordo com Donizetti (2012), a capaci-dade de ser parte está ligada a aspectos subjetivose se refere à aptidão conferida a qualquer pessoade adquirir direitos e contrair obrigações.

Ao revés, para a capacidade de estar emjuízo, como acentua Wambier et al (2008, p. 263)

Não basta que a parte seja capaz de ter di-reitos e assumir obrigações. É preciso que,além dessa capacidade, exista também a

capacidade de fato, ou capacidade de exer-cício, que se consubstancia na aptidão paraa prática dos atos decorrentes da capaci-dade de direito. Têm capacidade de fato,ou de exercício, aqueles que podem, por simesmos, praticar os atos da vida civil.

A validade da demanda depende ainda dahabilitação de advogado devidamente inscrito noquadro da Ordem dos Advogados do Brasil. Tra-ta-se da capacidade postulatória, inerente aos pro-fissionais da advocacia, que poderão postular emjuízo as pretensões de qualquer litigante.

Definindo esta capacidade, Nery Júnior eNery (2007) apontam essa prerrogativa como aaptidão para promover ações judiciais e elaborardefesas em juízo. No mesmo diapasão, Bedaque(2004, p. 131) expõe esta capacidade como “anecessidade de a parte atuar no processo por in-termédio de representante com habilitação técni-ca para a prática de atos processuais.”.

Há de se advertir, no entanto, que apenas aprática de atos processuais perante o Juízo (pedirou responder) exige a capacidade postulatória.Explicando essa distinção, Didier Júnior (2009, p.223) adverte que

Alguns atos processuais, porém, além dacapacidade processual, exigem do sujeitouma capacidade técnica, sem a qual não épossível a sua realização válida. É como sea capacidade, requisito indispensável à prá-tica dos atos jurídicos, fosse bipartida: a)capacidade processual; b) capacidade téc-nica. A essa capacidade técnica dá-se onome de capacidade postulatória. Frise-se:há atos processuais que não exigem capa-cidade técnica (por exemplo, o ato de teste-munhar e o ato de indicar bens à penhora);a capacidade postulatória somente é exigidapara a prática de alguns atos processuais,os postulatórios (pelos quais se solicita doEstado-juiz alguma providência).

Tema controverso ocorre ao definir a natu-reza jurídica desse pressuposto processual, já queo artigo 37, parágrafo único, do Código de Proces-so Civil prevê que os atos praticados por advoga-do sem procuração são inexistentes, enquanto oart. 4.º da Lei 8.906/94 afirma serem nulos os atospraticados por pessoa não inscrita no quadro daOrdem dos Advogados. Note-se que a prática de

2 A crise de mercado de trabalho identifica o elevado aumento dos profissionais da advocacia, acarretando umaoferta de advogados além da demanda de mercado. A crise de identidade, por sua vez, decorre da perspectivahistórico-imaginário do profissional liberal, segundo a qual o mercado de trabalho e a estrutura contemporâneaexigem um novo tipo de profissional.

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atos sem o instrumento de mandato é menosgravosa àqueles exercidos por pessoas inaptas aproduzi-las. Não foi essa a mesma interpretaçãoproduzida pelo ordenamento jurídico, que erigiuregras mais severas para as situações de menorcomplexidade.

Dando solução a essa controvérsia, Neves(2011, p. 58) ensina que

A divergência entre os dispositivos é evi-dente, porque o vício menos grave – atopraticado por advogado sem procuração –tem uma consequência mais séria –inexistência jurídica – do que o ato pratica-do por quem sequer advogado é, ou aomenos não está inscrito devidamente noórgão de classe – nulidade. Como essa di-vergência é insuportável ao sistema, o me-lhor entendimento é o que aponta que oato praticado por advogado sem procura-ção nos autos é ineficaz, enquanto o atoprivativo de advogado praticado por quemnão está inscrito na Ordem dos Advoga-dos do Brasil é absolutamente nulo.

O exercício postulacional é demonstrado peloinstrumento de mandato no qual ficaconsubstanciado que o advogado representa o liti-gante em juízo. A juntada da procuração autorizao Juiz a dar prosseguimento ao feito, mormenteem se tratando de elemento indispensável à con-dução jurisdicional, conforme expõe Donizetti(2012, p. 117), in verbis:

A capacidade para postular em nome deoutrem é comprovada pelo advogado me-diante a apresentação de mandato, instru-mento contratual por meio do qual o agen-te capaz outorga ao advogado poderes pararepresentá-lo em juízo, praticando os atospostulatórios. Sem instrumento de manda-to, o advogado não será admitido em juízo,podendo apenas praticar, em nome da par-te, atos urgentes, como a propositura deação para evitar a consumação da prescri-ção ou decadência.

Os membros do Ministério Público tambémostentam a capacidade postulatória no exercíciode suas funções. De acordo com Neves (2011, p.58) essa aptidão é “sui generis, que pode ser cha-mada de capacidade postulatória funcional, já quelimitada aos fins institucionais do Ministério Públi-co.”.

Outro profissional que goza dessa capacida-de é o Defensor Público. Não podia ser diferente,já que, conforme prevê o artigo 1.º da Lei Com-

plementar 80/1994 e artigo 134 da CRFB/88, umadas funções deste órgão é a defesa, em todos osgraus, judicial e extrajudicial, aos necessitados.

Em conclusão a isso, Coria (2012) diz existi-rem duas espécies de capacidade postulatória: umainstitucional, referida justamente aos defensorespúblicos e membros do Ministério Público, e outraindividual, própria dos advogados.

4 ADVOCACIA: ESSENCIAL E INDIS-PENSÁVEL

A atual Constituição da República é carac-terizada por uma série de preceitos isonômicos aolongo do seu texto. Logo em seu artigo 5.º, defineos direitos e garantias individuais dos cidadãos,afirmando, dentre outras garantias, que “todosiguais perante a lei, sem distinção de qualquer na-tureza.”.

O princípio da igualdade, agora com previ-são no ordenamento jurídico brasileiro, apresenta-se como equiparação dos direitos e deveres a to-dos os cidadãos, indistintamente.

A respeito do tema, Lenza (2010, p. 751)assevera que

Deve-se, contudo, buscar não somente essaaparente igualdade formal (consagrada noliberalismo clássico), mas, principalmen-te, a igualdade material, uma vez que a leideverá tratar igualmente os iguais e desi-gualmente os desiguais, na medida de suasdesigualdades. Isso porque, no EstadoSocial ativo, efetivador dos direitos huma-nos, imagina-se uma igualdade mais realperante os bens da vida, diversa daquelaformalizada perante a lei.

Nesse ínterim, o tratamento jurídico diferen-ciado das normas somente será compatível com aordem constitucional quando subsistirem finalida-de proporcional ao seu almejo.

Importante, igualmente, ressaltar as lições deMoraes (2011, p. 40) que ensina que

A desigualdade na lei se produz quando anorma se distingue de forma não razoávelou arbitrária um tratamento específico apessoas diversas. Para que as diferencia-ções normativas possam ser consideradasnão discriminatórias, torna-se indispensá-vel que exista uma justificativa objetiva erazoável, de acordo com critérios e juízosvalorativos genericamente aceitos, cuja exi-gência deve aplicar-se em relação à finali-dade e efeitos da medida considerada, de-

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vendo estar presente por isso uma razoá-vel relação de proporcionalidade entre osmeios empregados e a finalidade persegui-da, sempre em conformidade com os direi-tos e garantias constitucionalmente prote-gidos.

Além do princípio da igualdade ou daisonomia, a nova ordem constitucional consagrouainda o direito ao contraditório e à ampla defesanos processos judiciais.

Fernandes (2011, p. 334), enfático, preceituaque contraditório é atualmente “entendido comosimétrica paridade das partes na preparação doprovimento.”. Lado outro, o direito à ampla defe-sa constitui-se como a possibilidade do litiganteapresentar, no processo, todos os elementos ne-cessários à demonstração de suas pretensões.

Não obstante, a efetiva solução do litígio de-pende, inquestionavelmente, da manifestação deambas as partes no decorrer do processo. Em al-gumas situações, entretanto, a sua inércia impos-sibilita a solução da demanda de maneira justa. Apresença da parte no processo é, pois, fundamen-tal na solução de conflitos, colocando-se ambas aspartes em situações semelhantes.

É nesse contexto que a CRFB/88 atribuiu aoprofissional da advocacia tarefa ímpar à forma-ção de uma relação jurídica justa. O art. 133 daCarta Magna dispõe ser o advogado “indispensá-vel à administração da justiça, sendo inviolável porseus atos e manifestações no exercício da profis-são, nos limites da lei.”.

O mencionado artigo está inserto no textoconstitucional no capítulo que indica as funçõesessenciais à Justiça, tais como o Ministério Públi-co, a Advocacia Pública e a Defensoria Pública.

As lições de Carvalho (2011, p. 1209) sobreo tema indicam que

É a primeira vez que uma Constituição Fe-deral brasileira dedica disposição ao advo-gado. Na realidade, os advogados têm tidopapel destacado na vida judiciária e políti-ca brasileira, sendo agora de se lhes exigir adefesa não só da ordem jurídica, mas so-bretudo das instituições do Estado Demo-crático de Direito.

Há de se observar, a partir disso, que aindispensabilidade do advogado refere-se à garantiada parte no acesso à justiça e não deste profissio-nal, conforme oportuniza Lôbo (2011).

Ancorado à disposição constitucional, o Es-tatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados

do Brasil, de igual modo dispõe em seu artigo 2.ºsobre a imprescindibilidade do advogado na admi-nistração da Justiça.

A respeito da indispensabilidade do advoga-do, uníssono o entendimento atual no sentido deque essa garantia não é dotada de obrigatoriedade.Isso porque o ordenamento jurídico brasileiro, emalgumas hipóteses, faculta ao litigante, no decor-rer da demanda, não se fazer representar por ad-vogado, defendendo, pessoalmente, os direitos quelhe acham inerentes.

Registra-se, por oportuno, conforme Moraes(2011, p. 664), que o princípio constitucional daindispensabilidade

[...] previsto no art. 133 da Carta Maior, nãoé absoluto. Assim, apesar de constituir fa-tor importantíssimo a presença do advoga-do no processo, para garantia dos direitose liberdades públicas previstos na Consti-tuição Federal e em todo o ordenamentojurídico, continua existindo a possibilidadeexcepcional da lei outorgar o ius postulandia qualquer pessoa, como já ocorre nohabeas corpus e na revisão criminal.

Em complemento, Carvalho (2011, p. 1.209)explica e fundamenta assim:

Elcias Ferreira da Costa (Comentários bre-ves à constituição federal. Porto Alegre:Safe, 1989, p. 204) acha que a expressão“indispensável” no dispositivo constituci-onal tem sentido histórico-objetivo do mo-mento sociológico que lhe serviu de inspi-ração, qual seja: “respeitadas as exceçõesconsagradas pela prática jurisprudencial, oadvogado continua sendo indispensável àjustiça.”.

Imperioso reconhecer, por força da norma,que o acompanhamento do advogado, embora pa-reça ser imprescindível à formalização de condu-tas justas no decorrer da demanda, não se trata degarantia absoluta, já que a legislação permite, emsituações excepcionais, que a própria parte exer-ça o direito de postular em juízo.

A título de informações complementares, sãobreves exemplos o jus postulandi perante a Jus-tiça do Trabalho (artigo 791 da Consolidação dasLeis do Trabalho-CLT); a representação sindicalem nome dos empregados ou dos empregadores(artigo 843 da CLT); a atuação perante o JuizadoEspecial Cível nas causas até vinte salários míni-mos (artigo 9.º da Lei 9.099, de 26 set. 1995); re-presentação ou substituição do empregador de

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microempresa e empresa de pequeno porte pe-rante a Justiça do Trabalho (art. 54 da Lei Com-plementar 123, de 14 dez. 2006), a presença das“pessoas enquadradas como microempreendedoresindividuais, microempresas e empresas de peque-no porte” perante o Juizado Especial (artigo 8.º,inciso II, da Lei 9.099, de 26 set. 1995, e art. 74 daLei Complementar 123, de 14 dez. 2006); as “pes-soas físicas e as microempresas e empresas depequeno porte”, perante o Juizado Especial Fede-ral (inciso I do caput art. 6.º da Lei 10.259, de 12jul. 2001, e art. 74 da Lei Complementar 123, de14 dez. 2006); os pacientes (ou qualquer pessoapor eles) de habeas corpus (art. 654 do Códigode Processo Penal) e o condenado em caso derevisão criminal (art. 623 do Código de ProcessoPenal). Também havia a substituição processualpor entidade sindical (em favor dos empregados)conforme Enunciado 310 do Tribunal Superior doTrabalho, sendo tal Enunciado revogado pela Re-solução 119, de 25 set. 2003).

Malgrado a postulação em juízo possa ocor-rer sem a participação de advogado, grande parteda doutrina vem se manifestando contrária à suaaplicação, sendo diversos os argumentos debati-dos, tais como a insuficiência técnica postulacionale a capacidade de interpretar leis.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por tudo que foi exposto, há de se conside-rar que o ordenamento constitucional brasileiroreconheceu a advocacia como exercício indispen-sável ao desempenho da cidadania.

A tutela jurisdicional, outrossim, necessita daatuação de um profissional qualificado para a con-dução do processo levando-se em conta as garan-tias constitucionais da parte. A atuação daDefensoria Pública é, por isso, indispensável àgarantia dos cidadãos que não podem custear coma máquina jurisdicional. Essa realidade, no entan-to, não vem sendo perpetuada no sistema jurídicointerno.

É de se considerar, ainda, que a atuação doadvogado não é garantia absoluta nos atuais mol-des do ordenamento pátrio. Em determinadas hi-póteses, podem as partes desempenhar a chance-la judicial sem o acompanhamento de um advoga-do durante todo o decorrer do processo. Trata-sedo instituto do jus postulandi das partes, possibi-litando que o cidadão formule suas próprias alega-ções.

Independente de se considerar a atuação das

partes nas suas próprias defesas uma inadequaçãoprocessual ou não, o exercício da advocacia assu-me importante papel no equilíbrio da ordem jurídi-ca, assim como considerou a atual Constituiçãobrasileira.

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1 Graduada em Direito pela Faculdade de Direito Santo Agostinho. Pós-graduada em Direito Processual na Universi-dade Estadual de Montes Claros (Unimontes).

RESUMO

No presente trabalho, será abordada a medidacautelar de busca e apreensão prevista no Decre-to-Lei n.º 911/69, seu caráter de cunho satisfativo,bem como serão apontadas as principais altera-ções introduzidas pela Lei n.º 10.931, de 2004, quetrouxe pontos positivos para uma maior efetividadedo processo de busca e apreensão e satisfação docrédito em atrasa para contratos com alienaçãofiduciária em garantia.

Palavras-chave: Busca e Apreensão. Decreto-Lein.º 911/69. Ação Cautelar. Satisfação.

ABSTRACT

In this article we Will discuss the precautionrymeasure of search anda seizure provided for inthe Decrete-Law 911/69, your chacarter imprintisatisfativo as well as pointed ou the main changesintroduced by Law n.º 10,931, of 2004, whichbrought strengths to a greater effectiveness of thesearch and seizure and settlement of that claimlate contracts with disposal trust receipts.

Keywords: Fees. Defeat. Reciprocal. Compensation.Antinomy.

1 INTRODUÇÃO

Conforme preceitua o art. 839 do Código deProcesso Civil (CPC), o procedimento de busca eapreensão poderá recair sobre pessoas ou coisas.

Nas palavras de Pontes de Miranda, haverábusca e apreensão “sempre que o mandamentodo juiz é no sentido de que se faça mais do quequando só se manda exibir a coisa para se produ-zir ou exercer algum direito e se não preceita odevedor, ou possuidor da coisa ou pessoa, a que a

ASPECTOS DA AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃOPREVISTA NO DECRETO-LEI N.º 911/69

Pollyana de Fátima Medeiros Gonçalves1

apresente.” (MIRANDA, 1959, p. 353).Humberto Theodoro Júnior ensina:

[...] busca é a procura, a cata, a pesquisa deuma coisa ou pessoa. É o ato que não es-gota em si mesmo sua finalidade. Vem sem-pre ligado ao seu complemento que é a“apreensão da coisa buscada”. Não já se-paração ou autonomia entre os dois atos.Há seguimento, o buscar, e o apreender, quedepende do bom êxito da busca. Há, por-tanto, verdadeira fusão dos dois atos(THEODORO JÚNIOR, 2008, p. 587).

No Direito pátrio, observam-se dois tipos deprocedimentos de busca e apreensão. Primeiro, amedida cautelar típica descrita no CPC, nos arti-gos 839 e seguintes.

Esta possui caráter eminentemente preven-tiva e precedente como instrumento à tutela defuturo do processo principal.

Segundo, tem-se a busca e apreensão comomedida de cunho satisfativo, destinada desde o iní-cio à realização do direito, medida que só é cabívelem casos expressamente previstos em lei.

Tem-se como um dos maiores exemplos paraesta segunda modalidade a busca e apreensão combase em contrato de alienação fiduciária não cum-prindo pelo devedor, prevista no Decreto-Lei n.º911, de 1.º de outubro de 1969, objeto do presenteartigo e que será mais bem trabalhado no desen-volvimento do trabalho ora iniciado.

2 MEDIDA CAUTELAR DE BUSCA EAPREENSÃO E SEU CARÁTERSATISFATIVO

Negrão (2004, p. 837), na obra Código deprocesso civil e legislação processual em vi-gor, traz à colação o seguinte ensinamento:

Ressalvadas as hipóteses do Dec.-Lei 911/

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69 e dos art. 605 (625), 905 e 1.129 do CPC, abusca e apreensão não se apresenta comoprocesso independente, que visa à satisfa-ção do direito material da parte, pois teráentão a função subsidiária de cautela, ser-vindo ao processo onde se dará a compo-sição definitiva do litígio. (Amagis 11/228),no mesmo sentido: RT-622/118, maioria).

Por seu lado, Alexandre de Paula (1998, p.340), em sua obra O processo civil à luz da ju-risprudência, apresenta um julgado que sustentaposição de igual teor.

A busca e apreensão é um processo aces-sório, de natureza cautelar, que está na de-pendência de uma causa ou ação principal.Somente em casos especiais, como nas ven-das com garantia fiduciária, se admite o usodesse remédio preventivo como ação autô-noma. O art. 796, do atual Código de Pro-cesso Civil não inova ao dispor que “o pro-cedimento cautelar pode ser instauradoantes ou no curso do processo principal edeste é sempre dependente”. Assim já erasob a égide do Código de 1939. (Ac. Unân.Da 2.ª Câm. Esp. do TJ-RS, de 16.1.75, rel.Des. Wilson Chaves; Ver. de Jurisp. do TJ-RS, vol. 52/402).

Embora para alguns a busca e apreensão sejasempre utilizada como meio de assegurar o pro-cesso principal (processo cautelar), pelo que foipossível observar nas palavras transcritas anteri-ormente, tal cautelar também pode possuir cunhosatisfativo.

Atualmente, inclusive, existe uma correntepredominante que entende ser a busca e apreen-são uma medida satisfativa, cuja função primordi-al é a de satisfazer um direito, sendo utilizada comose uma execução fosse.

Entretanto, algumas especificações devem serobservadas. O presente trabalho tratará da ação debusca e apreensão sob o prisma do Decreto-Lei911, de 1969, e algumas dessas particularidades.

3 AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO SOBA LUZ DO DECRETO-LEI N.º 911/69

Com o advento da Lei n.º 10.931, de 2004,modificações profundas ocorreram, em especial, nosparágrafos 1.º e 6.º do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º911/69, além da inclusão dos parágrafos 7.º e 8.º nomesmo cânone. Tais alterações têm como escopomaior a tentativa de minimizar as dificuldades queoutrora as instituições financeiras enfrentavam para

alienar aquele bem retomado do devedorinadimplente.

Importante frisar que as modificações reali-zadas pela nova legislação versam principalmentesobre a ação de busca e apreensão prevista noDecreto-Lei em tela. Tais alterações propostas pelanova Lei tiveram aplicação imediata, inclusive na-queles processos já em andamento, uma vez quese trata de alterações de normas de cunho estrita-mente processual. E, em sendo normas de caráterprocessual, são aplicadas nos feitos judiciais já ini-ciados, por não haver aplicação temporal da lei daépoca do início do processo. Isto porque no Direi-to brasileiro há, entre os operadores do Direito, apredominância da teoria do isolamento dos atosprocessuais, o que se traduz pela explicação deque, em sobrevindo lei processual nova, os atosainda pendentes dos processos em curso estarãosob os efeitos da inovação, mas com respeitadoda eficácia dos atos já praticados de acordo com alegislação revogada. De forma oblíqua, por sinal,também a teoria do isolamento dos atos processu-ais aparece nos dispositivos dos artigos 50 (o as-sistente assume o processo no estado em que seencontra, sendo válidos todos os atos praticadosanteriormente) e 322 (o revel assume o processodo momento da sua intervenção para a frente, sempossibilidade de revisão do que já restou pratica-do) do CPC.

Pontualmente, é possível observar que umadas principais modificações e, consequentemente,que proporciona uma maior celeridade ao proces-so de recuperação daquele bem móvel objeto docrédito concedido, diz respeito ao texto do pará-grafo 1.º, do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 911/69,verbis.

Art. 3.º [...]§ 1.º Cinco dias após executada a liminarmencionada no caput, consolidar-se-ão apropriedade e a posse plena e exclusiva dobem no patrimônio do credor fiduciário,cabendo às repartições competentes, quan-do for o caso, expedir novo certificado deregistro de propriedade em nome do cre-dor, ou do terceiro por ele indicado, livre doônus da propriedade fiduciária.

O parágrafo 3.º, também do artigo 3.º, doDecreto-Lei n.º 911/69 estabelece:

Art. 3.º [...]§ 3.º O devedor fiduciante apresentará res-posta no prazo de quinze dias da execuçãoda liminar.

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Desta forma, em se tratando do prazo decontestação, houve a modificação, passando de trêsdias para quinze dias o prazo para resposta, conta-dos da execução da liminar, conforme preceitua oparágrafo supracitado.

Uma crítica há que ser feita à redação doparágrafo transcrito. O texto original do revogadoparágrafo 1.º, do art. 3.º, do Decreto-Lei 911/69,constava de maneira expressa que, depois de exe-cutada a liminar, o réu seria citado para oferecersua defesa.

Entretanto, a alteração imposta pelo parágrafo3.º, do artigo 3.º, por força da Lei n.º 10.931/04,não prevê a citação do réu para apresentação dacontestação, o que pode causar a nulidade do pro-cesso.

A partir da leitura do parágrafo 3.º, dada pelanova Lei, é possível a interpretação de que o pra-zo para apresentação de resposta por parte do réuse inicia a partir da efetivação da liminar, indepen-dente da citação.

Com vistas até mesmo a resguardar o cre-dor, recomendável seria que o ele não procedessecom venda do bem apreendido no caso de nãohaver ainda a citação pessoal do réu.

Há de ser realizado todos os esforços e utili-zadas todas as formas de citação do requeridoantes da venda do bem, pois, dessa forma se evitapossível declaração posterior de nulidade do pro-cesso.

Com o advento da legislação em tela, obser-va-se não mais haver a possibilidade da purgaçãoda mora pelo devedor, caso já efetuado o paga-mento de 40% do preço financiado, conforme pre-via a redação do artigo parágrafo 1.º, do art. 3.º,do Decreto-Lei n.º 911/69.

Prescreve o § 2.º, do artigo 3.º, do Decreto--Lei em tela:

Art. 3.º [...]§ 2.º No prazo do § 1.º, o devedor fiduciantepoderá pagar a integralidade da dívida pen-dente, segundo os valores apresentadospelo credor fiduciário na inicial, hipótesena qual o bem lhe será restituído livre doônus.

Logo, terá o devedor somente a faculdadede, no prazo de cinco dias da efetivação da liminar,pagar integralmente a dívida pendente, ou seja, ototal do valor financiado, excluídos os juros futu-ros, conforme planilha de cálculo apresentada napetição inicial. Apresentação unilateral, portanto.

Neste caso, o bem será devolvido ao requerido,livre do ônus da alienação fiduciária.

Todavia, muitos questionam se os parágra-fos do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 911, aqui játranscritos, não estariam eivados deinconstitucionalidades. Ora, preceitua o art. 5.º, LIV,da Constituição Federal:

Art. 5.º [...]LIV - ninguém será privado da liberdade oude seus bens sem o devido processo legal;[...].

Poderia haver também a indagação se o Prin-cípio do Contraditório não estaria sendo afronta-do.

Entretanto, o Decreto-Lei n.º 911/69, com asalterações trazidas pela Lei de 2004, modificandoos parágrafos do art. 3.º, não foi consideradoinconstitucional, tendo sido recepcionado pelaConstituição Federal, sendo este, inclusive, o en-tendimento do Supremo Tribunal Federal e do Su-perior Tribunal de Justiça, como se vê do Acórdãoseguinte:

ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO DEBUSCA E APREENSÃO. DECRETO-LEI N.º911/69. RECEPÇÃO PELA CONSTITUI-ÇÃO. ORIENTAÇÃO DO SUPREMO TRI-BUNAL FEDERAL. LIMINAR. REQUISI-TOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO DAMORA. INADIMPLEMENTO DO DEVE-DOR. CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO. PO-DER GERAL DE CAUTELA. RECURSODESACOLHIDO. I – Na linha da orienta-ção do Supremo Tribunal Federal, as dis-posições contidas no Decreto-Lei n.º 911/69 foram recepcionadas pela Constituição.II – Comprovada a mora e o inadimplementoda devedora, e ausente qualquer circuns-tância que possa afastar a aplicação da re-ferida norma (v.g, serem os bens indispen-sáveis ao sustento do devedor), a conces-são da liminar na ação de busca e apreen-são se justifica, nos termos do art. 3.º doDecreto-Lei n.º 911/69. [...] (STJ – RESP151271/ SP; 1997/0072695-9. Relator Min.Sálvio de Figueiredo Teixeira (1088), Quar-ta Turma, j. 10/12/2002).

Negrão (2004, p. 1.168) também transcrevejurisprudência sobre o questionamento em tela:

O Dec.-Lei 911/69 não ofende os princípiosconstitucionais da igualdade, da ampla de-fesa e do contraditório, ao conceder ao pro-

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prietário fiduciário a faculdade de requerera busca e apreensão do bem alienadofiduciariamente (art. 3.º, caput) e ao restrin-gir a matéria de defesa alegável em contes-tação (art. 3.º, § 2.º). (REx 141320, do RioGrande do Sul, Rel. Min. Octávio Galloti, j.em 22.10.96).

Na alienação fiduciária, o credor é oproprietário do bem desde a concessão do créditofinanciado até o pagamento integral do débito. E odevedor tem, simplesmente, a posse direta do bem,podendo dele fazer o uso contratualmente fixadono contrato de alienação fiduciária em garantia.

Desta forma, não prospera a afirmação dehaver qualquer inconstitucionalidade na legislaçãoem tela, posto ser sedimentado que o bem dadoem garantia na alienação fiduciária não faz partedo patrimônio do devedor até o pagamento inte-gral da dívida. É uma propriedade resolúvel (art.1.359 e 1.360 do Código Civil de 2002), cuja solu-ção final se dará após “o implemento da condição[o pagamento e o cumprimento das cláusulascontratais de forma integral e incondicional] ou peloadvento do termo [o prazo final contratualmentefixado]”.

Assim, na ação de busca e apreensão,embasada no Decreto-Lei n.º 911/69, desde queestejam presentes os requisitos para conhecimen-to da inicial – a saber, a mora e o inadimplementodo devedor, por meio da notificação e do contratode alienação fiduciária – o pedido liminar deve serconcedido, conforme determinação legal, não sendoesta uma faculdade do julgador. Desta forma temse posicionado a jurisprudência acerca do assun-to.

Observa-se também que não há afronta aoPrincípio do Contraditório, uma vez que a nova le-gislação propicia maior prazo para apresentaçãode defesa (15 dias da execução da liminar),ensejando a formulação de pedido contraposto pelodevedor, para restituição de pagamento a maior, oque sugere maior discussão sobre o contrato cele-brado.

Outra modificação trazida pela Lei 10.931diz respeito ao parágrafo 6.º do artigo 3.º do De-creto-Lei n.º 911/69:

Art. 3.º [...]§ 6.º Na sentença que decretar aimprocedência da ação de busca eapreensão, o juiz condenará o credorfiduciário ao pagamento de multa, em favordo devedor fiduciante, equivalente a

cinquenta por cento do valor originalmentefinanciado, devidamente atualizado, caso obem já tenha sido alienado.

Salienta-se que a multa à qual se refere areprodução anteriormente descrita não exclui aresponsabilidade do credor por perdas e danos,conforme ostenta o parágrafo 7.º, do art. 3.º, doDecreto-Lei n.º 911/69, também acrescentado pelaLei 10.931, de 2004:

Art. 3.º [...]§ 7.º A multa mencionada no § 6.º não ex-clui a responsabilidade do credor fiduciáriopor perdas e danos.

Disso, pode-se observar que o credor é be-neficiado com mecanismos facilitadores quanto àceleridade para venda daquele bem dado em ga-rantia. Entretanto, deverá tal credor se atentar paraas penalidades impostas pelo parágrafo 6.º, do ar-tigo 3.º retrotranscrito.

Antes da venda do bem, para evitar a multaprevista, deverá analisar de forma atenta todas aspossibilidades de improcedência da ação e quepossam motivar contestação e discussão do deve-dor, mormente no que tange as cláusulas e encar-gos previstos no contrato, bem como sobre os va-lores efetivamente pagos pelo devedor.

Outra inovação constante no Decreto-Lei n.º911/69, trazida pela Lei n.º 10.931/2004, é a possi-bilidade de o devedor apresentar contestação apóso pagamento integral da dívida e ter restituído obem sem qualquer gravame.

Desta forma, pode-se observar a possibili-dade de uma ampla discussão do contrato de alie-nação fiduciária nos próprios autos da ação debusca e apreensão, mesmo após a quitação do fi-nanciamento e restituição do bem ao devedor.

Anteriormente, ocorrendo a quitação da dí-vida, o processo era, consequentemente, extinto,por falta do objeto, uma vez que a defesa do deve-dor estava limitada à alegação de pagamento dodébito vencido ou o cumprimento das obrigaçõescontratuais.

Nota-se também o caráter dúplice da medi-da cautelar de busca e apreensão prevista noscasos do Decreto-Lei n.º 911/69, pois há a possibi-lidade de pedido de repetição de indébito pelo re-querido, cabendo, inclusive, a realização de perí-cia contábil para apuração de valores.

Por fim, observa-se o parágrafo 5.º do art.3.º do Decreto-Lei n.º 911/69, cujo dispositivo é o

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a seguir transcrito, e que recebeu nova redaçãopela Lei modificadora tantas vezes referida:

Art. 3.º [...]§ 5.º Da sentença cabe apelação apenas noefeito devolutivo.

Assim, em caso de recurso de apelação, aeste ainda está mantida a determinação de quedeverá ser recebido apenas no efeito devolutivo.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por todo o exposto, pode-se afirmar que asalterações impostas do Decreto-Lei 911/69, resul-taram em uma maior rapidez na venda do bemretomado e a possibilidade da recuperação daque-le crédito outrora concedido no contrato de em-préstimo de alienação fiduciária.

As novas regras impostas pela legislação,pela alteração do teor do Decreto-Lei 911, de 1.ºout. 1969, trouxeram maior segurança ao credorem contrato de alienação fiduciária em garantia.Mas, também proporcionaram a possibilidade am-pla discussão sobre o contrato de empréstimo comalienação fiduciária nos próprios autos da ação debusca e apreensão. E tal discussão tem lugar mes-mo em pagando o devedor todo o contrato e rece-bendo, de volta, o bem apreendido. Isto, de certaforma garante o contraditório, e também demandao credor a possuir uma maior cautela na propositurada ação. Atenção mais apurada deve ter o credor,especialmente, quando houver elaboração de cál-culos do valor da dívida em contratos de alienaçãofiduciária, pois, doravante, é possibilitado ao deve-dor, em peça contestatória, realizar pedido contra-posto na defesa do devedor, com a consequenterevisão de cláusulas e encargos contratuais na açãode busca e apreensão. A decisão final do pedidocontraposto – como dito, mesmo após a quitaçãoda dívida e, por consequência, já tendo o devedorrecebido o bem que fora apreendido sob alegaçãodo inadimplemento – poderá gerar aplicação dapesada multa prevista no parágrafo 6.º, do artigo3.º, do Decreto-Lei n.º 911/69.

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ELO COMOUTRAS IES

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RESUMO

Este artigo tem o escopo de analisar a possívellegalização do Parto Anônimo (Projeto de Lei n.º3.220/2008) no ordenamento jurídico brasileiro,assim como a possibilidade de contribuição para aceleridade dos processos de adoção e se,consequentemente, tal medida estaria de acordocom as propostas do Anteprojeto do Novo Códigode Processo Civil. O trabalho também abordará arepercussão social e suas consequências frente àConstituição da República Federativa do Brasil, de1988.

Palavras-chave: Parto Anônimo. Anteprojeto doCPC. Adoção. Celeridade processual.

ABSTRACT

This article has the scope to analyze the possiblelegalization of Baby Safe Haven (Bill No. 3.220/2008) in the Brazilian legal system, as well as thepossibility of contributing to the speed of adoptionprocesses, and consequently, such a measure wouldbe in accordance with the proposals of the Draftof the New Code of Civil Procedure. The paperwill also approach the social impact and itsconsequences against the Constitution of theFederative Republic of Brazil, 1988.

Keywords: Baby Safe Haven. Draft of the NewCCP. Adoption. Procedural Celerity.

PARTO ANÔNIMO, CELERIDADE DOS PROCESSOS DE ADOÇÃO EANTEPROJETO DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Ionete de Magalhães Souza1

Ana Clarice Albuquerque Teixeira Leal2

Maria Isabel Rodrigues Ferraz3

1 Graduada em Direito e Pós-Graduada lato sensu pela Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes). Pós-Graduada stricto sensu (Mestrado em Direito) pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e Doutorado emDireito pela Universidad del Museo Social Argentino (UMSA). Professora de Graduação e Pós-Graduação daUniversidade Estadual de Montes Claros (Unimontes). Advogada. Membro do IBDFam. Coordenadora do Progra-ma S.A.J. Itinerante. Orientadora de projetos de pesquisa.

2 Graduada em Direito e Pós-Graduada lato sensu pela Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes).Professora do Curso de Direito da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes). Coordenadora do Pro-grama S.A.J. Itinerante. Orientadora de projetos de pesquisa.

3 Acadêmica do 5.º Período do Curso de Direito da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes) (2.ºsemestre/2014).

1 INTRODUÇÃO

O presente artigo, mediante a utilização dametodologia dedutiva, com pesquisa bibliográfica,pretende analisar o Projeto de Lei (PL) n.º 3.220/2008 e suas contribuições para a celeridade dosprocessos de adoção, além de estabelecer as ga-rantias constitucionais que seriam efetivadas me-diante a aprovação do supracitado PL e do Ante-projeto do novo Código de Processo Civil, frenteaos artigos 5.º, rol dos direitos e garantias funda-mentais, complementado pela EmendaConstinucional n.º 45 (EC n.º 45/2004), e artigo227 da Constituição da República Federativa doBrasil, de 1988 (CRFB/1988).

Serão consideradas duas vertentes: a acei-tação ou recusa dos Projetos, partindo de análisecrítica sobre os pontos positivos e negativos dosimpactos legais e sociais que a aprovação dos Pro-jetos acarretaria.

2 NOÇÃO DE PARTO ANÔNIMO

A mulher, depois de ver o seu valor reco-nhecido pela sociedade, teve diversos direitos ga-rantidos, principalmente com relação à sua saú-de e ao seu desenvolvimento. Afinal, é a partir daconcepção de um ser humano, capacidade quesomente as mulheres possuem, que estas se co-municam com o corpo social. Destarte, questões

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relacionadas com as mulheres possuem grandeimportância para o equilíbrio e constituição dasociedade e, visando evitar eventuaisdesequilíbrios sociais, políticas de saúde e edu-cação foram demandadas para proteger a mu-lher, os seus filhos e a sua relação mãe-filho, paraque nem um e nem o outro saiam prejudicados ecom seus direitos violados.

Ainda assim, muitos casos de crianças aban-donadas pelas suas próprias mães já foram relata-dos pela imprensa. Como esclarece a Advogada eProfessora Doutora Ionete de Magalhães Souza,“ser genitor não quer dizer, necessariamente, queé um pai.”. E é partindo de definições como estaque o Instituto Brasileiro de Direito de Família(IBDFam), por meio do Deputado Sérgio BarradasCarneiro (PT/BA), propôs a legalização do PartoAnônimo, atráves do PL n.º 3.220/2008.

Define-se o Parto Anônimo como o que “dizrespeito ao direito de entrega exercido pela mu-lher que coloca a criança recém-nascida, sua fi-lha, à disposição para adoção nos hospitais e ca-sas de saúde sem qualquer imputação civil ou pe-nal.” (SOUZA; VERSIANI, 2012, p. 69). Se le-galizado o parto anônimo, as gestantes, interessa-das em entregar o filho para a adoção receberãotratamento diferenciado nos hospitais, acompanha-mento ginecológico e psiquiátrico, com garantia desigilo. A prática do parto em anonimato é legal emdiversos países, como França, Alemanha, Itália,Áustria, Suiça, Espanha e alguns estados dos Es-tados Unidos.

Certo é que essa prática nasceu da “Rodados Expostos”, desenvolvida durante a Idade Mé-dia, por volta de 1189. Essa roda consistia em umaestrutura de maderia com pequenas portas, locali-zadas, geralmente, nas Santas Casas deMisericórida, posta de uma forma para que a mãe,ao abandonar o seu filho no local, não tivesse suaidentidade revelada. A primeira Santa Casa deMisericórdia, no Brasil, a ter uma Roda para estafinalidade foi na Bahia e, em 1948, foi desativadaa última Roda dos Expostos brasileira em São Paulo(SOUZA; VERSIANI, 2012).

Esse método, por muitos anos, foi uma for-ma de fuga para as mulheres grávidas e solteirasda época. Assim, doando o seu filho para a ado-ção sem que sua identidade fosse revelada, a suaprópria imagem era preservada de discriminaçãoe segregação social.

No entanto, a sociedade contemporânea,revestida de valores e padrões diferentes das épo-cas passadas, atribui outra finalidade à prática do

parto em anonimato: o PL em questão tem comoobjetivo diminuir a ocorrência de abortos e aban-donos, além de tornar os processos de adoção maiscéleres.

Todavia, o PL, ainda em trâmite, encontraimpedimentos para a sua aprovação em princípiose garantias fundamentais da CRFB/1988, pois aprática do Parto Anônimo feriria alguns direitos donascituro, como o direito à filiação e o direito aoconhecimento da origem genética. Tais direitosseriam violados porque a criança permaneceriasem filiação até o momento de sua adoção e aidentidade de seus genitores não seria revelada. Arelevância do conhecimento da origem genética,por exemplo, é assim definida: “O direito à identi-dade genética advém da concepção do direito deidentidade pessoal, relacionado ao estabelecimen-to e identificação do estado do indivíduo.”(SALLES, 2010, p. 194). Este direito, assim comoo direito à filiação, relaciona-se com a própria se-gurança da identidade de cada indivíduo.

Ainda assim, “os que defendem a legaliza-ção do parto em anonimato afirmam que, deman-dando políticas efetivas por parte do poder públi-co, esta afastaria a clandestinidade do abandono eprotegeria, sobremaneira, a vida e a integridadedo recém-nascido.” (SOUZA; VERSIANI, 2012,p. 72). Afinal, a ideia principal desse PL é dar àscrianças indesejadas e abandonadas condiçõespara que possam usufruir de direitos previstos: di-reito à vida, à dignidade humana e à proteção es-pecial.

Para aqueles que são contra a legalização,esses direitos já são assegurados às crianças, pormeio do dever estatal frente ao artigo 227 daCRFB/1988. E – argumentam – o Estado cumprecom tal dever ao auxiliar e apoiar as mães, quandoestas manifestam o desejo de entregar o filho paraa adoção. Dessa forma, a criança indesejada e agenitora são amparadas tanto constitucionalmen-te, quanto pela Lei n.º 8.069, de 13 de julho de1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente(ECA), que normatiza a adoção e estabelece osdireitos do nascituro e da mãe, os desta última noartigo 8.º, § 5.º, e no artigo 13, parágrafo único.

3 PARTO ANÔNIMO, CELERIDADEDOS PROCESSOS DE ADOÇÃO EANTEPROJETO DO NOVO CÓDIGODE PROCESSO CIVIL

Os Estados contemporâneos trazem em suasConstituições direitos fundamentais garantidos a

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todos os cidadãos e a submissão do Estado a es-sas garantias é que caracteriza a definição de Es-tado de Direito. Para Carré de Malberg “por Es-tado de Direito deve-se entender aquele Estadoque, nas relações com seus súditos e para garan-tia deles, submete-se, ele próprio, a um regime dedireito, segundo o qual suas atividades são regidaspor um conjunto de regras de natureza diversa [...].”(apud DIAS, 2003, p. 217).

O Estado Democrático de Direito também éum Estado constitucional, e este justifica osurgimento de um Estado vinculado ao direito,consequência dos processos constituintes ameri-cano e francês e da crescente constitucionalidadedos ordenamentos jurídicos.

A função essencial do Estado é tratar os seuscidadãos de forma igualitária, garantindo-lhes osdireitos fundamentais constados na CRFB/1988.Um desses direitos é a garantia de razoável dura-ção do processo, inserido através da Emenda Cons-titucional n.º 45, acrescendo ao artigo 5.º da CRFB/1988 o inciso LXVIII.

Art. 5.º Todos são iguais perante a lei, semdistinção de qualquer natureza, garantin-do-se aos brasileiros e aos estrangeiros re-sidentes no país a inviolabilidade do direi-to à vida, à liberdade, à igualdade, à segu-rança e a propriedade, nos termos seguin-tes:[...]LXVIII - a todos, no âmbito judicial e admi-nistrativo, são assegurados a razoável du-ração do processo e os meios que garan-tam a celeridade de sua tramitação.

Acerca da garantia de um processo célere,sob pena de não ser objeto de verdadeira justiça,há os seguintes ensinamentos:

O processo deve ter uma duração razoável,sob pena de se tornar inócua uma decisãotardia. O direito ao prazo razoável significaadequação temporal da jurisdição, median-te processo sem dilações indevidas, eis queo acesso à jurisdição envolve o direito deobter do Estado uma decisão jurisdicionalem prazo razoável (NEVES, 2006, p. 55).

É partindo desses ideais e desses direitosconstitucionais que, constantemente, o PoderLegislativo busca aperfeiçoar o ordenamento jurí-dico brasileiro, com o objetivo de sempre assegu-rar as garantias fundamentais a todos os cidadãos.

O processo se apresenta como meio princi-

pal de efetivação de garantias constitucionais e,por isso, a celeridade processual tem se tornadoobjetivo dos legisladores. Desta maneira, propos-tas para alcançar tal finalidade são apresentadas,como o anteprojeto do Novo Código de ProcessoCivil. Há divergências doutrinárias acerca da efi-ciência das mudanças propostas pelo anteprojeto,que promete mudanças legislativas com o objetivode tornar os processos mais céleres.

Mediante medidas com finalidade processu-al, pode-se relacionar o PL 3.220/2008, que visa àlegalização do Parto Anônimo, com o anteprojetodo Novo Código de Processo Civil, visto que am-bos objetivam diminuir a morosidade dos seus res-pectivos processos. De acordo com aqueles quedefendem a aprovação desses projetos, tais medi-das seriam efetivas para a celeridade dos proces-sos. No entanto, os que não defendem a aprova-ção indicam que esses projetos sãoinsconstitucionais.

A prática do Parto Anônimo, como já citadoneste mesmo artigo – e segundo a parte da doutri-na que se manifesta em desconformidade com asua instituição – contraria direitos constitucionais,como o direito à filiação e ao conhecimento daorigem genética, previstos tanto na CRFB/1988como no ECA.

Já o anteprojeto do Novo Código de Proces-so Civil, apesar de pretender acelerar os proces-sos, retira dos cidadãos algumas garantias tam-bém relativas ao processo:

Tais legislações acabam por retirar do cida-dão garantias fundamentais conquistadas,tais como: o acesso ao contraditório, a am-pla defesa e, principalmente, a uma defesacômoda, já que impede a parte de levar aoconhecimento de um órgão colegiado (oTribunal), a análise de uma decisão tomadapor um único juiz retirando, com isso, o aces-so ao duplo grau de jurisdição, coroláriológico da ampla defesa (TEIXEIRA, 2006,p. 66).

Isto porque, pretendendo diminuir a duraçãodos processos, conforme texto do anteprojeto doNovo Código de Processo Civil, o legislador reti-rou ou comprimiu etapas dos processos essenciaisaos cidadãos. Uma delas foi a dialética. Essasmudanças, além de contrariar a própria CRFB/1988, contraria o conceito de Estado Democráticode Direito que o Estado brasileiro possui, já queretira dos cidadãos direitos adquiridos durante asetapas de conquistas históricas e de evolução dos

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movimentos contitucionalistas.Assim preceitua José dos Santos Carvalho

Filho, apud Pereira, 2013, p. 46:

Quando se assenta a premissa de que asoberania do Estado permite àqueles querepresentam a sociedade a edição de atoslegislativos, a suposição é a de que taisatos devem guardar a compatibilidade coma Constituição. Significa dizer que ao po-der jurídico e político de criação de leis, oEstado, por seus agentes parlamentares,tem o dever de respeitar os parâmetros cons-titucionais. Por isso, assim como se podeafirmar ser lícita a edição regular de leis,pode também asseverar-se que é líticito cri-ar lei em descompasso com a Constituição.

Constata-se, noutra vertente, que a nova Leide Adoção (Lei 12.010, de 3 de agosto de 2009),ao incluir o § 5.º no artigo 8.º do ECA, já garante oauxílio necessário às gestantes que desejam dar ofilho para a adoção. O que faz com que a criaçãode outros dispositivos legais com o mesmo objeti-vo se torne desnecessária (SOUZA; VERSIANI,2012, p. 18)

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao iniciar a análise comparada dos mencio-nados Projetos, sob a luz do ordenamento jurídicobrasileiro, constata-se que mudanças legislativasradicais não irão, por si sós, diminuir a morosidadeda atividade jurisdicional do Estado e conferirceleridade à tramitação dos processos.

Os doutrinadores, em maioria, entendem que,para atingir esses objetivos, mudanças qualitativase quantitativas nas estruturas do Poder Judiciáriose mostram mais eficazes.

Ademais, enquanto a prática do parto em ano-nimato promete, entre outras coisas, a celeridadedos processos de adoção, e o Anteprojeto, a dimi-nuição da morosidade da atividade jurisdicional, es-ses Projetos ferem direitos constitucionais funda-mentais em suas respectivas áreas.

Assim, há de se crer que há meios de legis-lar a favor de mudanças positivas sem ferir direi-tos e garantias constitucionais.

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AUTOR CONVIDADO

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RESUMO

O presente artigo analisa os aspectos darecente manifestação popular ocorrida noBrasil, neste ano de 2013, frente à celebração de25 anos da Constituição da República de 1988 eos instrumentos elencados em seu texto com vis-tas à efetivação do controle social na gestão públi-ca. A intitulada “Jornadas de Junho” representa odespertar da cidadania política no país, a qual ca-rece de colocar em prática os mecanismos dis-postos na vigente Constituição, esta que estatuiparticipação do povo na construção egerenciamento do país através de uma atuaçãoconjunta entre o Governo Federal e a sociedade.A força central de um modelo de gestão igualitá-ria permeia na ativa participaçãopopular em episódios de estruturação e execuçãodas políticas sociais no país. Para isso, existemdiversos instrumentos ao alcance do povo, quaissejam: Plebiscitos; Referendos; Iniciativa Popular;Ação Popular; participação no PPA (PlanoPlurianual), Lei de Diretrizes Orçamentárias(LDO), Lei Orçamentária Anual (LOA), nos Con-selhos de Políticas Públicas e através daconcretização dos dispositivos da Lei de Acesso àInformação (Lei n.º 12.527, de 18-11-2011). O alu-dido estudo indaga sobre o direito de acesso à in-formação aos indivíduos e a consolidação dos prin-cípios básicos da Administração Pública (legalida-de, impessoalidade, moralidade, publicidade e efi-ciência), buscando evidenciar os meios dematerialização da democracia participativa e as

DEMOCRACIA PARTICIPATIVA: os instrumentos de sua consolidação eas perspectivas do controle social com o advento da lei de acesso

à informação n.º 12.527/2011

Antônio Luiz Nunes Salgado1

Josikelle de Souza Santos2

perspectivas após o advento da Lei de Acesso àInformação.

Palavras-chave: Democracia. AdministraçãoParticipativa. Controle Social. Acesso à Informa-ção. Gestão Pública.

ABSTRACT

This article examines aspects of the recent popu-lar event held in Brazil this year, 2013, against thecelebration of 25 years of the Constitution of 1988and the instruments listed in the text with a view toeffective social control of public management. Thetitled “June Days” is the awakening of politicalcitizenship in the country, which is needed to put inplace mechanisms disposed on the currentConstitution, which states that people’s participationin the construction and management of the countrythrough a joint effort between the government fe-deral and society. The core strength of amanagement model egalitarian permeates theactive popular participation in episodes structuringand implementing social policies in the country. Forthis, there are several tools within the reach of thepeople, namely: Plebiscites; Referendums, popu-lar initiative; popular action, participation in PPA(Multi-Year Plan), Budgetary Guidelines Law(BGL), Annual Budget Law (ABL), the Board ofPublic Policy and through the implementation ofthe provisions of the Access to Information Act(Law Nº 12,527 of 18-11-2011). The

1 Bacharel em Direito pela Universidade Estadual de Montes Claros (UNIMONTES), em 2000. Pós-graduado emGestão Contábil e Controladoria Empresarial pela Universidade Estadual de Montes Claros (UNIMONTES), em2010. Professor do Núcleo de Prática Jurídica e do Centro de Pesquisa, ambos do Curso de Direito das FaculdadesIntegradas do Norte de Minas (Funorte). Presidente do Conselho de Ética da 11.ª Subseção da Ordem dos Advo-gados do Brasil em Montes Claros/MG.

2 Bacharela em Direito pelas Faculdades Integradas do Norte de Minas (Funorte), em 2013. Pós-graduanda MBA emEngenharia e Inovação do Veduca e do Centro Universitário UniSEB. Bolsista do UAITEC (programa do Governode Minas Gerais).

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aforementioned study inquires about the right ofaccess to information for individuals and theconsolidation of the basic principles of PublicAdministration (legality, impersonality, morality,publicity and efficiency), seeking to prove themeans of realization of participatory democracyand the prospects after the enactment of LawAccess to Information.

Keywords: Democracy. ParticipativeManagement. Social Control. Access toInformation. Public Management.

1 INTRODUÇÃO

A Constituição da República Federativa doBrasil, de 1988, ora vigente, de conteúdoessencialmente democrata, vislumbra em seu artigo1.º, “caput”, o Estado Democrático de Direito, aodispor ser a ”República Federativa do Brasil,formada pela união indissolúvel dos Estados eMunicípios e do Distrito Federal [...]”, além deexpressar nitidamente, em seu parágrafo único, aopção do Poder Constituinte pela afirmação dasoberania popular quando preceitua que “todo opoder emana do povo, que o exerce por meio derepresentantes eleitos ou diretamente, nos termosda Constituição.”.

A democracia, entendida como contraposiçãoa todas as formas de governo autocráticos, é ca-racterizada por um conjunto de regras que estabe-lecem quem está autorizado a tomar as decisõescoletivas e com quais procedimentos (BOBBIOapud SIQUEIRA, 2013).

A gestão democrática, por sua vez, está as-sinalada na atual Constituição da República atra-vés do instituto da democracia participativa queinstrumentaliza o controle social pressupondo anecessidade cotidiana de o Estado fornecer infor-mações compreensíveis aos cidadãos, a fim dedesempenharem sua soberana atividade de con-trole do uso de recursos e da manutenção dopatrimônio público, quando assim solicitado.

No entendimento da Controladoria-Geral daUnião (BRASIL, 2013c, p. 15), o controle socialpode ser definido como a participação do cidadãona gestão pública, na fiscalização, nomonitoramento e no controle das ações da Admi-nistração Pública, conforme segue:

Controlar significa, pois, verificar se a reali-zação de uma determinada atividade não se

desvia dos objetivos ou das normas e prin-cípios que a regem. Na Administração Pú-blica, o ato de controlar possui significadosimilar, na medida em que pressupõe exami-nar se a atividade governamental atendeuà finalidade pública, à legislação e aos prin-cípios básicos aplicáveis ao setor público.

Pereira (1997, p. 30), abalizado por uma vi-são gerencial sobre o papel das instituições de con-trole, classifica três mecanismos de controle fun-damentais: o controle hierárquico ou administrati-vo, que se exerce dentro das organizações públi-cas ou privadas; o controle democrático ou social,que se exerce quando os grupos sociais se organi-zam para defender interesses particulares ou pú-blicos; e o controle econômico, via mercado.

O cidadão, ao participar da gestão da Admi-nistração Pública, como já dizia Moreira Neto(1992, p. 40), constitui a plena realização do prin-cípio democrático, uma vez que a democracia im-plica não somente o direito de a população esco-lher quem vai governar, mas também, o de esco-lher de que modo ela será governada. Ou seja,essa gestão democrática, ao promover a interaçãoentre a Administração Pública e a sociedade, con-fere maior legitimidade à própria atuação adminis-trativa, posto que reflete o mais fielmente possívelos anseios coletivos, além de ampliar a transpa-rência na atividade estatal (MOREIRA NETO,2001, p. 15).

Enfim, o conceito de controle social está in-trinsecamente relacionado com o envolvimento dos“atores sociais” no planejamento, monitoramentoe verificação sobre a execução dos planos e dasações públicas, se alcançaram os objetivos espe-rados e se efetivamente trouxeram benefícios àsociedade.

Todavia, para que isso ocorra, é necessáriobasear-se no pressuposto da descentralização, esob o viés da transparência, criar formas nãohierarquizadas de discussão, de maneira que apopulação possa opinar numa decisão antes mes-mo que o ato seja implementado pelo Governo.

Necessário ainda que haja exposição e ins-trução quanto aos instrumentos da democraciaparticipativa, pois são meios basilares e essenciaisao ininterrupto desenvolvimento da consciênciapolítica e da cultura de fiscalização e controle porparte da coletividade sobre os atos do Poder Pú-blico.

Desta forma, as normas constitucionais seri-am colocadas em exercício e funcionariam comoferramentas de concretização das práticas sociais

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necessárias à evolução e contínuo amadurecimentosocial dos brasileiros.

Promulgada após uma era de reserva, a atu-al Constituição da República é consequência deanos de luta pela redemocratização da política na-cional. Nessa conjuntura, buscou-se favorecer aparticipação do cidadão na tomada de decisõespolíticas através de instrumentos diversos, dentreos quais se pode citar: Plebiscitos e Referendos;Iniciativa Popular; Ação Popular; participação nosinstrumentos e nos processos de apreciação doPlano Plurianual (PPA), da Lei de Diretrizes Or-çamentárias (LDO) e da Lei Orçamentária Anual(LOA); Conselhos de Políticas Públicas e da Leide Acesso à Informação.

A metodologia utilizada na consecução dopresente artigo apresenta caráter retrospectivo,descritivo e análise revisional bibliográfica. A alu-dida pesquisa foi desenvolvida através da consultaà literatura, sobre as temáticas de controle social,participação democrática na gestão pública e leissobre acesso à informação, buscando, por meiodessas matérias, identificar os conceitos e princí-pios norteadores do controle social e os instrumen-tos de sua efetivação disponíveis no Brasil, alémde indagar sobre o advento da Lei de Acesso àInformação e as novas perspectivas da participa-ção popular na fiscalização dos atos governamen-tais.

2 PRINCIPAIS INSTRUMENTOS DE PAR-TICIPAÇÃO POPULAR NO CONTRO-LE SOCIAL

Os dispositivos basilares para a efetivaçãoda participação popular na democracia brasileiraestão previstos tanto na Constituição da Repúbli-ca de 1988 como nos variados instrumentos cons-tantes na legislação infraconstitucional. Dentre eles,destacam-se: o Plebiscito e o Referendo, a Inicia-tiva Popular, a Ação Popular, a participação no pla-nejamento do Plano Plurianual e nos Conselhos dePolíticas Públicas, além da Lei de Acesso à Infor-mação.

No entanto, mesmo dispostos no texto cons-titucional há mais de 25 anos, poucas foram asvezes que desses instrumentos se utilizou paraconhecer a real vontade do povo, haja vista os

poucos exemplos relevantes a serem citados: em1993, quando da realização de plebiscito visandodecidir as formas de Governo (Monarquia/Repú-blica) e os sistemas de Governo (Parlamentarista/Presidencialista); e em 2005, a concretização dereferendo que consultou o povo acerca da possibi-lidade ou não de se admitir o porte de armas defogo e munições a civis, a qual foi rejeitada pelosbrasileiros.

No ano de 2013, porém, o uso do meio ele-trônico, especificamente o amplo acesso à redemundial de computadores (internet), eclodiu comomeio facilitador a participação na democracia. Ainformação se tornou franca, fazendo nascer umageração que pensa de forma diferente das demais,com demonstração do que se pode classificar, ini-cialmente, de instinto revolucionário.

Uma onda de manifestações marcou o anode 2013, com manifestação de sentimentos queforam estimulados, segundo estudos sociológicosdivulgados pela imprensa, pela revolta derivada daimpunidade, potencializada pela liberdade dos 25condenados na AP470 (Mensalão)3, sob alegaçõesde “crescente insegurança pessoal, ações destem-peradas de políticos, em virtude da inflação galo-pante em face de incompetência econômica go-vernamental, enfim, tudo em razão da disparatadapolítica econômica que ameaça fazer ruir as ex-pectativas futuras.”.

Em situações como tal, em que a iniciativados movimentos nasce com uns e é seguida poroutros, muitos deles, desprovidos dos reais senti-mentos dos motivos iniciais, no entanto, a coletivi-dade não sempre sabe para aonde caminha: elatanto pode se aquietar como pode eclodir numarevolução popular pela qual se reclame o poderque dela emana, para ser exercitado sem o inter-mediário, político profissional, numa nova formade Estado não pensada.

Em tentativa de elucidar o tema, um artigocientífico, intitulando o período como as “Jornadasde Junho no Brasil dos 25 anos da Constituição de1988”, tratando a oportunidade como “um momen-to de representação do despertar da cidadania bra-sileira”, traz as seguintes palavras:

[...] uma superação desse estado deanestesia em relação à vida política — o

3 Ação Penal n.º 470. Mensalão é o nome dado pela imprensa a um caso de denúncia de corrupção política mediantecompra de votos de parlamentares no Congresso Nacional do Brasil, entre 2005 e 2006. O caso teve como protago-nistas alguns integrantes do governo do Presidente Lula e membros do Partido dos Trabalhadores, sendo objetoda Ação Penal de número 470, movida pelo Ministério Público no Supremo Tribunal Federal.

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que reclama de outro lado, uma revisão dasinstituições no sentido de viabilizar essanova práxis, [...] um processo de formula-ção de prioridades nas escolhas trágicasque o mundo da vida reclama (LACOMBEet al., 2013).

Adiante, o mesmo texto referencia sobre oconstitucionalismo democrático como reconheci-mento da indispensável oxigenação de ideias a partirde um diálogo com os seus destinatários, a fim depermitir que o desejo de mudança não se transfor-me em violência, mas encontre seus canais devocalização junto às estruturas do poder. E con-cluem os autores:

A manifestação democrática dos reais de-tentores do poder é de ser vista não comouma ameaça à estabilidade das instituições,mas como um lembrete de que estas estão aserviço do povo, e portanto, devem ser re-ceptivas às suas percepções e demandas(LACOMBE et al., 2013).

Como fruto das manifestações, a Presidenteda República, em dois de julho de 2013, encami-nhou proposta ao Parlamento sugerindo a convo-cação de um plebiscito compreendendo cinco pon-tos: financiamento das campanhas; definição dosistema eleitoral; preservação eleição de suplen-tes para o Senado Federal; manutenção das coli-gações partidárias como possibilidade para os plei-tos e o fim do voto secreto no Parlamento. Noentanto, a iniciativa ainda não se concretizou. Se-quer deu os primeiros passos como discussão par-lamentar.

Bastante se discutiu sobre a possibilidadedesta “reforma política” ir a referendo e não a ple-biscito, causando entraves ideológicos entre diver-sos personagens opositores da política brasileira eas aspirações da Presidente da República.

Diante de tantos episódios, que se entrela-çam no arcabouço histórico do país, verifica-senecessário a efetivação do constitucionalismo de-mocrático a partir de um diálogo com os seus des-tinatários, a sociedade. Seja por meio de plebiscitoou referendo, fundamental é que se permita a ca-nalização do desejo de mudança inerente a estepovo junto às estruturas do poder público.

2.1 Lei de Acesso à Informação (Lei12.527/2011)

Apesar de a Constituição da República de1988 e a legislação infraconstitucional brasileira

deterem inúmeros dispositivos que visam promo-ver a participação popular direta nas ações do po-der público, o percentual de atuação da comunida-de perante tais atos ainda é insignificante.

Nesse sentido, manifesta o constitucionalistaPaulo Bonavides, ao explanar sobre o assunto:

No Direito Constitucional positivo do Brasiljá existe um fragmento normativo dedemocracia participativa; um núcleo deirradiação, um germe com que fazê-la frutificarse os executores e operadores daconstituição forem fiéis aos mandamentos eprincípios que a Carta Magna estatuiu. Comefeito, essa democracia ora em fase deformulação teórica, e que é, num país emdesenvolvimento como o nosso, a únicasaída à crise constituinte do ordenamentojurídico, já se acha parcialmente positivada,em termos normativos formais, no art. 1.º eseu parágrafo único, relativo ao exercíciodireto da vontade popular, bem como no art.14, onde as técnicas participativas estatuídaspela Constituição, para fazer eficaz essavontade, se acham enunciadas, a saber: oplebiscito, o referendum e a iniciativa popular.Mas, a aplicabilidade dessas técnicas temsido bloqueada e negada ao povo, à nação,à soberania, por obra de um esbulho(BONAVIDES, 2001, p. 40-41).

A mitigação da participação popular no Bra-sil se dá por diversos motivos, como os sociais,culturais, econômicos, etc., considerando ascontrastantes peculiaridades regionais existentesno seio brasileiro, tornando complexo garantir aplena participação social.

A maior dificuldade para conscientização damaioria da população acerca desses direitos fun-damentais se esbarra no deficitário sistema deeducação pública do país. Notadamente, a parce-la menos favorecida economicamente, pouco seutiliza dos mecanismos de controle social, haja vistaestarem isentos de instrução para tanto, além dese ocuparem com situações imediatas e urgentesdo dia a dia, tal qual a sua própria sobrevivência.

Bonavides (2001, p. 34) expressa a impor-tância de se atingir a democracia participativa, poisa considera a chave de consolidação dos direitossociais. Diz: “A chave constitucional do futuro en-tre nós reside, pois, na democracia participativa,que faz soberano o cidadão-povo, o cidadão-na-ção, o cidadão-titular efetivo de um poder invaria-velmente superior e, não raro, supremo e decisi-vo.”.

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Sucintamente, Maximiano (2006, p. 132),define a administração participativa como “umafilosofia ou doutrina que valoriza a participação daspessoas no processo de tomar decisões sobre aadministração das organizações.”.

Ainda, Luck ressalta de que maneira a uniãoentre os agentes vem garantir o sucesso de umagestão:

O entendimento do conceito de gestão jápressupõe, em si, a ideia de participação,isto é, do trabalho associado de pessoasanalisando situações, decidindo sobre seuencaminhamento e agindo sobre elas emconjunto. Isso porque o êxito de uma orga-nização depende da ação construtiva con-junta de seus componentes, pelo trabalhoassociado, mediante reciprocidade que criaum “todo” orientado por uma vontade co-letiva (LUCK, 1996, p. 37).

Diante das citações feitas pelos autoressupramencionados, verifica-se que a divisão deinformações e respectivas responsabilidades coma população representa um modelo de políticainstitucional gerida pelo próprio Governo, mas quesomente pode ser estabelecido com a prática deações voltadas para a descentralização adminis-trativa e, consequentemente, para adesconcentração do poder político. Sob esse pen-samento, já lecionava Gros:

À centralização deve se opor adescentralização; à lógica de comando econtrole, a da horizontalidade da equipe; àlógica monopolista, a competitiva; à regu-lamentação excessiva das tarefas, a propo-sição de objetivos e missões; à orientaçãopor processos, a busca de resultados; àsatisfação dos interesses da burocracia, asatisfação do cliente (GROS, 2004, p. 10).

A atual Constituição da República preceituade forma clara, em seu artigo 1.º, a participaçãodas coletividades no processo de gerenciamentopúblico tendo em vista a consolidação da demo-cracia, princípio este que só funciona mediante umEstado organizado juridicamente, ou seja, um Es-tado de Direito. Sobre o impacto das previsõesconstitucionais no seio social, Scuassante vem ar-gumentando que:

A participação popular tornou-se a essên-cia do Estado Democrático de Direito, mo-tivo pelo qual a constituição vigente, tam-bém denominada “Constituição Cidadã”,

inovou criando diversos mecanismos quepossibilitassem o exercício da democraciadireta e participativa, sendo que, para al-guns casos (orçamento participativo), obri-gou a sua observância para realização daprópria gestão pública. Por conseguinte, anoção de cidadania ganha outro significa-do, ampliando a atuação da sociedade, queanteriormente se restringia à escolha dosgovernantes (SCUASSANTE, 2009, p. 70).

Para Bonavides apud Soares e Gondim(1998, p. 75):

[...] a própria Constituição de 1988 incorpo-rou o princípio da participação popular di-reta na Administração Pública e ampliou acidadania política, estabelecendo váriosmecanismos de reforços às iniciativas po-pulares.

Os novos paradigmas gerenciais requerem,portanto, funções descentralizadas, participativas,interdependentes e integradas. Ou seja, o desen-volvimento organizacional de uma Administraçãodepende da melhoria contínua dos processos degestão, apoio e de base voltados para atendimentodas necessidades da população num todo e paraos compromissos mais amplos para com a cidada-nia.

A Lei n.º 12.527, de 18 de novembro de 2011,vem regular o acesso às informações, previsto noart. 5.º, XIV e XXXIII, art. 37, § 3.º, II, art. 216, §2.º, todos da Constituição da República, os quaistratam sobre as diretrizes, conceitos, deveres e asua aplicabilidade com vistas à segurança do di-reito de acesso à informação, conforme segue:

Art. 5.º [...]XIV - é assegurado a todos o acesso à in-formação e resguardado o sigilo da fonte,quando necessário ao exercício profissio-nal;[...]XXXIII - todos têm direito a receber dosórgãos públicos informações de seu inte-resse particular, ou de interesse coletivo ougeral, que serão prestadas no prazo da lei,sob pena de responsabilidade, ressalvadasaquelas cujo sigilo seja imprescindível àsegurança da sociedade e do Estado;

Art. 37. [...]§ 3.º A lei disciplinará as formas de partici-pação do usuário na administração públicadireta e indireta, regulando especialmente:[...]

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II - o acesso dos usuários a registros admi-nistrativos e a informações sobre atos degoverno, observado o disposto no art. 5º,X e XXXIII;

Art. 216. [...]§ 2.º Cabem à administração pública, naforma da lei, a gestão da documentaçãogovernamental e as providências para fran-quear sua consulta a quantos dela necessi-tem.

Paulo e Alexandrino (2010, p. 149) disser-tam sobre o direito de informação descrito no art.5.º, XXXIII, da Constituição Federal de 1988 (CR/88) como um “instrumento de natureza adminis-trativa, derivado do princípio da publicidade da atu-ação da Administração Pública, na acepção deexigência de atuação transparente, decorrência daprópria indisponibilidade do interesse público.”.

Direcionam, ademais, citando o art. 37, CR/88, sob quais princípios constitucionais devem taisdireitos serem tutelados:

Art. 37. A administração pública direta eindireta de qualquer dos Poderes da União,dos Estados, do Distrito Federal e dosMunicípios obedecerá aos princípios delegalidade, impessoalidade, moralidade,publicidade e eficiência.

Estabelece, a Lei n.º 12.527, em seu art. 3.º,a relação entre a necessidade de assegurar o di-reito ao acesso à informação e os princípios bási-cos da Administração Pública que devem ser efe-tivados. E o faz nos seguintes termos:

Art. 3.º Os procedimentos previstos nestaLei destinam-se a assegurar o direito fun-damental de acesso à informação e devemser executados em conformidade com osprincípios básicos da administração públi-ca e com as seguintes diretrizes:I - observância da publicidade como pre-ceito geral e do sigilo como exceção; II - divulgação de informações de interessepúblico, independentemente de solicita-ções; III - utilização de meios de comunicaçãoviabilizados pela tecnologia da informação; IV - fomento ao desenvolvimento da cultu-ra de transparência na administração públi-ca;V - desenvolvimento do controle social daadministração pública.

Moraes descreve o princípio da legalidade,

previsto no art. 5.º, II, da Constituição da Repúbli-ca, como rigoroso e especial. Em suas palavras

O administrador público somente poderáfazer o que estiver expressamente autoriza-do em lei e nas demais espécies normativas,inexistindo pois, incidência de sua vonta-de subjetiva, pois na Administração Públi-ca só é permitido fazer o que a lei autoriza[...] Esse princípio coaduna-se com a pró-pria função administrativa, de executor dodireito, que atua sem finalidade própria, massim em respeito à finalidade imposta pelalei, e com a necessidade de preservar-se aordem jurídica (MORAES, 2003, p. 311).

O princípio da impessoalidade ou finalidadeadministrativa, de acordo com Hely LopesMeirelles apud Moares, apresenta por acepçãocomo:

O princípio da impessoalidade, referido naConstituição de 1988 (art. 37, caput), nadamais é que o clássico princípio da finalida-de, o qual impõe ao administrador públicoque só pratique o ato para o seu fim legal. Eo seu fim legal é unicamente aquele que anorma de direito indica expressa ou virtual-mente como objetivo do ato, de forma im-pessoal (MORAES, 2003, p. 312).

No que concerne ao princípio da moralidade,Moraes destaca que não deve o administrador seater ao estrito cumprimento da legalidade, haja vis-ta que constitui pressuposto de validade de todoato da Administração Pública, estando intimamen-te ligado com a ideia de probidade.

Fazendo alusão ao princípio da publicidadedos atos dos gestores públicos, a Constituição daRepública consolida que tal princípio é de fato opreceito geral, sendo o sigilo a exceção. Assim, adivulgação de informações de interesse públicoindepende de solicitações, devendo sempre o ór-gão ou a entidade pública concederem o acessoimediato à informação disponível, de forma ágil,transparente, clara e de fácil compreensão.

Quanto ao princípio da transparência e daparticipação, colhem-se as seguintes palavras, doMinistério do Planejamento, Orçamento e Gestão:

São princípios basilares da gestão demo-crática que permitem aos cidadãos se infor-marem sobre a agenda proposta pelo go-verno e, por meio dos canais adequados,participarem das decisões sobre assuntosrelacionados ao interesse público e a seus

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legítimos interesses particulares (BRASIL,2003).

Já o princípio da eficiência, definido comoum princípio claramente republicano, possui a fi-nalidade de buscar a melhor aplicação dos recur-sos dos cidadãos em seu próprio benefício. Enten-dimento ratificado pela citação seguinte:

A perspectiva da eficiência deve estarbalizada em informações confiáveis sobreos custos que permitam uma avaliação cor-reta sobre os gastos. Isto evitaria o simplescorte linear de despesas que leva, usual-mente, ao aumento do custo relativo e àineficácia (BRASIL, 2003).

O art. 5.º da Lei de Acesso à Informaçãopreceitua que é “dever do Estado garantir o direitode acesso à informação, que será franqueada,mediante procedimentos objetivos e ágeis, de for-ma transparente, clara e em linguagem de fácilcompreensão.”.

Diante do exposto, verifica-se que, nesta “Erada Informação” as transformações devem atingiras relações da Administração Pública com asociedade. O povo deve estar ciente das leis,regulamentos e até paradigmas de comportamentopara que possa participar da gestão pública. Mas,isto exige um Governo aberto, transparente e comcanais de comunicação que dialoguem de formaeficaz com a população, através do lançamentode campanhas publicitárias e educativas com vistasa disseminar e estimular a participação dasociedade no controle social dos órgãos públicos(HENRIQUES JÚNIOR; SILVA, 2011).

Destarte, apesar de constituir um novo canalpara a consolidação da democracia no Brasil, aeficácia da Lei 12.527/2011, assim como dos dis-positivos criados anteriormente à edição desta lei,dependerá de ações que agreguem valoreseducativos, que tenham por objetivo instruir a po-pulação ao uso dos mecanismos disponíveis parao controle social.

Cabe, neste viés, ao gestor entender que,para que haja o interesse pelas questões referen-tes à gestão pública é necessário que, antes dequalquer coisa, o cidadão se sinta motivado a par-ticipar da Administração. E isso é possível utili-zando-se, para a divulgação das leis, o meio queseja acessível e a mensagem que seja compreen-dida pela maioria da população.

Posto isso, em virtude da realidade culturalbrasileira e em razão dos elevados índices de anal-

fabetismo que caracterizam o país, observa-se quemuitos cidadãos não serão capazes de avaliar efazer uma análise crítica.

Infere-se, portanto, que se faz necessária autilização de uma ferramenta de instrução socialcom uso de uma linguagem acessível à população,ou seja, um veículo de interlocução entre o Gover-no e seu povo leigo.

Assim sendo, é dever da Administração Pú-blica lançar campanhas (publicitárias e, principal-mente, educativas) para disseminar e estimular aparticipação da comunidade. Afinal, se o cidadãonão conhece os termos da lei e, pior, se não sabecomo utilizar os dispositivos ali contidos, o direitode acesso à informação garantido por este textonão passará de um simulacro de transparência.Porém, o cidadão é peça fundamental para aconcretização de mudanças, cabendo a este utili-zar o poder soberano outorgado a si pela Consti-tuição da República de 1988.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente debate abarca sobre a inequívo-ca necessidade de edificação plural de programasde ação do Estado com vistas ao incremento delegitimidade às decisões que envolvam a coletivi-dade no exercício do controle social.

Em tempos de construtivismo constitucional,mais do que dar vida aos preceitos que aludemexpressamente à participação, o que se busca é aconsolidação de práticas institucionais do poderorganizado que contemplem essa abertura aos in-térpretes sociais, quais sejam os cidadãos brasilei-ros.

Em razão do emergir dos valores democráti-cos até então subjacentes, somado à incapacidadedo Estado na formulação e implementação de po-líticas públicas duradouras, o Brasil demonstra hoje,após as “Jornadas de Junho”, uma crescente ne-cessidade de programar soluções em longo prazo,estruturando medidas pré-estabelecidas e fielmenteanalisadas por um conjunto de agentes, envolven-do e fortalecendo laços entre “Governo/Cidadão”.

A fragilidade no nível de organização dosmovimentos populares e sindicais, a pouca consci-ência de classe dos mesmos elementos, a culturapolítica de submissão arraigada na população bra-sileira, a baixa representatividade e consequentefalta de legitimidade dos conselheiros, e adesinformação generalizada, são alguns dos pon-tos que freiam a consolidação da democraciaparticipativa através do controle social no Brasil.

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Os meios para a utilização e fiscalização dagestão pública residem, pois, nas mãos da própriaNação, a qual não se deve isentar dequestionamentos sobre a transparência do fluxode decisão dos gestores, ou até mesmo verificardiretamente se órgãos públicos disponibilizaram ascontas e gastos em tempo real. E, ainda, se osrecursos públicos repassados pelo Governo Fede-ral estão sendo aplicados devidamente.

No entanto, para que estes meios atinjam osfins a que se destinam, fundamental que haja umamobilização dos diversos setores da sociedade ede órgãos públicos, atuando de forma conjunta econcretizando a missão de implementar a demo-cracia no país. Processo que abriria margem paraa participação livre no processo decisório, por meioda partilha entre ambos, tanto dos méritos, quantodas responsabilidades.

O uso sábio da inteligência estratégica go-vernamental e a adoção de novas práticas deinterlocução e participação entre Estado/Socieda-de são medidas inerentes ao fortalecimento dosdireitos fundamentais constituídos pela Constitui-ção da República na validação do desenvolvimen-to revolucionista da cidadania política.

Enfim, a solução para a problemática apre-sentada neste artigo vislumbra a atuação conjuntada sociedade e os órgãos públicos, de modo que,através da descentralização, a Administração Pú-blica mantenha foco em ações voltadas para amelhoria contínua do atendimento das necessida-des do cidadão.

REFERÊNCIAS

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1 Mestre em Desenvolvimento Social pela Universidade Estadual de Montes Claros. Professora da Faculdade deDireito Santo Agostinho.

FULLER, L. Lon. O caso dos exploradoresde cavernas. São Paulo: Edijur, 2012.

É inegável a importância para Acadêmicos epara qualquer operador do Direito o conhecimen-to sobre hermenêutica jurídica e o domínio em ar-gumentação e lógica. O ensaio “O caso dos ex-ploradores de caverna,” de Lon L. Fuller – escritoem 1949 quando o autor era professor deJurisprudence da Harvard Law School – servecomo bom exemplo do emprego das várias esco-las da hermenêutica. Trata-se na verdade de umprimoroso ensaio sobre argumentação jurídica quecoloca em debate o naturalismo e o positivismo eoutros importantes temas relacionados ao conhe-cimento jurídico.

O ensaio se inicia apresentando o relato docaso e dando a notícia da condenação dos acusa-dos pelo Tribunal do Condado de Stowfield. O des-moronamento de uma caverna deixa presos cincomembros da Sociedade Espeleológica, por 32 dias,quando, enfim, são resgatados depois de inúmerase dispendiosas tentativas que ocasionaram a mor-te de dez pessoas envolvidas no salvamento.

Entretanto, no vigésimo dia em que estavampresos, os exploradores são comunicados por ummédico sobre a escassa possibilidade de sobrevi-verem com os suprimentos que dispunham, masque poderiam sobreviver consumindo carne huma-na. Inicia-se aí a grande questão moral e jurídica,objeto dos debates que se seguem.

Descobre-se com o resgate que um dos ex-ploradores havia sido morto após intrincada dispu-ta da sorte por meio de lançamento de dados eservido de alimento aos demais. O fato dá ensejoa profundas análises pelo autor sobre direitos in-disponíveis e sobre os princípios que regem a teo-ria dos contratos.

Os sobreviventes foram denunciados pelohomicídio do companheiro. O Juiz de Primeira Ins-tância do Tribunal do Condado de Stowfield e os

UMA LIÇÃO DE HERMENÊUTICA E ARGUMENTAÇÃO EM POUCAS PÁGINAS

Simone Rosiane Corrêa Araújo1

jurados decidem-se pela culpa dos acusados, masrequerem ao Executivo a comutação da pena ca-pital em prisão de seis meses. Porém, o Executivonão se manifesta. O leitor passa a acompanhar,então, uma verdadeira lição sobre conflito de com-petências e divisão dos poderes e funções esta-tais: de um lado, a pretendida clemência do chefedo Poder Executivo; do outro, o julgamento doRecurso de Apelação pelo Tribunal.

As discussões que se seguem ao longo doensaio se referem aos votos emitidos pelos mem-bros da fictícia Suprema Corte de Newgart res-ponsáveis pelo julgamento do recurso de apelaçãoe visam elucidar a existência ou não da culpabili-dade dos réus. Cada voto se apresenta então parao leitor como uma lição sobre temas variados dosaber jurídico.

No voto do Presidente Truepenny, observa-sea preocupação com a literalidade do texto legal, ca-racterística marcante da escola hermenêutica daexegese. Destaca-se ainda a análise sobre a dife-rença entre as ideias de justiça e legalidade: “serárealizada a justiça sem debilitar a letra ou o espíritoda nossa lei e sem propiciar qualquer encorajamentoà sua transgressão.”.

O Juiz Foster apresenta novas questões so-bre o conflito entre legalidade e justiça fundamen-tadas nas ideias de senso comum e vontade cole-tiva. Sob o argumento de que a vontade da lei édiferente da vontade coletiva, o Juiz denuncia quese trata na verdade do julgamento da própria leique, naquele caso, não representa o senso comum.Destaca que a vontade coletiva pretende uma jus-tiça que não pode ser proporcionada com a aplica-ção literal da lei, trazendo à tona reflexões acercados princípios gerais do Direito.

São apresentadas para a análise do leitorquestões que estão relacionadas às dicotomias di-reito positivo X direito natural; sociedade civil Xestado de natureza como exemplifica o trecho aseguir:

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O direito positivo pressupõe a possibilida-de da coexistência dos homens em socie-dade. Surgindo uma situação que torne acoexistência impossível, a partir de então acondição que se encontra subjacente a to-dos os precedentes e disposições legisla-das cessou de existir.

Outras questões interessantes podem seridentificadas no voto em comento: o princípio daterritorialidade das leis apresentado como compro-vação da máxima cessant ratione legis, cessatet ipsa Lex; a hipótese de um novo contrato socialser estabelecido pelos exploradores enquanto es-tavam presos na caverna e a eleição do contratosocial como única justificativa moral para alegitimação do poder estatal frente à reflexão so-bre a legalidade e a legitimidade do poder do Esta-do.

Merecem um destaque especial as lições dehermenêutica que se seguem na exposição dasmáximas segundo as quais um homem pode in-fringir a letra da lei sem violar a própria lei; nadefesa de uma interpretação da lei segundo seuspropósitos (“espírito das leis”); na oposição à in-terpretação literal, judicial, sistemática e restritivada lei e, principalmente, na lembrança do impor-tante papel da jurisprudência e da diferença entrea vontade do legislador e a vontade da lei.

No voto do Juiz Tatting, podem seridentificadas novas questões sobre o estado civil eestado de natureza que servem como boas liçõesde Ciência Política e Teoria Geral do Estado. Sãoavaliados ainda os objetivos da lei penal e outrostemas correlatos como prevenção, necessidade deretribuição e reabilitação do delinquente. É possí-vel acompanhar um profundo embate entre o Di-reito e a Moral, com destaque para uma análisesobre o princípio da imparcialidade do juiz: “quan-to mais examino este caso e penso sobre ele, maisprofundamente envolvido emocionalmente me sin-to!”.

O Juiz Keen, por sua vez, opta por umasobreposição do positivismo jurídico: “como juiz,jurei aplicar não minhas concepções de moralidade,mas o direito deste país.”. Trata-se de um claroexemplo de interpretação literal do texto legal, pró-prio da escola da exegese: “[...] é obrigação doPoder Judiciário aplicar fielmente a lei escrita einterpretá-la de acordo com seu significado evi-dente.”. Segue-se uma crítica ao sistema do direi-to livre, segundo o qual o intérprete e aplicador da

lei pode decidir contra legis. Chamam a atençãoos argumentos fundamentados na diferença entrenormas morais e normas jurídicas e a inegável pre-sença das ideias contratualistas do século XVI deque a igualdade do poder leva ao conflito e à de-sordem.

Considerando-se que o objetivo daHermenêutica Jurídica é identificar o sentido (pro-pósito) e alcance da lei, surpreende a descriçãofeita de forma crítica do processo de integraçãodas leis. Por outro lado, admite-se a adaptação doDireito à realidade, às particularidades do caso subjudice.

Outro aspecto muito interessante é a men-ção ao papel da opinião pública. A questão que secoloca no texto em comento é: sendo o judiciáriouma das manifestações do poder do Estado, quepor sua vez é o representante da vontade coletiva,deveria a decisão judicial estar de acordo com aopinião pública, com o senso comum? Argumen-ta-se, por fim, que uma questão que se mostra tãointrincada à luz do Direito pode ser de fácil resolu-ção frente à opinião pública.

Seguem-se críticas ao excesso de formalismonas decisões judiciais e uma curiosa e atual análi-se sobre o papel da imprensa na formação da opi-nião pública e como fator que interfere nas deci-sões judiciais. Sobre o conflito de competência dosórgãos estatais que permeia a discussão, conclui oJuiz que a atuação do Judiciário é determinada pelorespeito à lei, enquanto a atuação do Executivo édeterminada pela consideração à opinião pública.

A riqueza e complexidade das discussõesdesenvolvidas ao longo de todo o ensaio fazem daobra uma leitura obrigatória para qualquer estu-dante ou profissional do Direito. Entretanto, algu-mas questões instigantes ficam sem maioreselucidações. Aparece no texto menções à “Gran-de Espiral ou hecatombe” que teria se abatido so-bre a humanidade. Seria possível fazer uma ana-logia ao estado de natureza de Thomas Hobbes,quando então explode a guerra de todos contratodos? Seria a grande hecatombe o fator que teriadeterminado a celebração do contrato social entreos homens? Como e quem teria assassinadoWhetmore dentro da caverna? Foi um linchamen-to bárbaro? Alguém teria sido escolhido para exe-cutar a função? Trata-se, no entanto, de questõesque só aguçam ainda mais o interesse pelo bri-lhante texto de Fuller.

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