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139 Educação e Pesquisa, São Paulo, v.30, n.1, p. 139-159, jan./abr. 2004 A cultura escolar como categoria de análise e como campo de investigação na história da educação brasileira Luciano Mendes de Faria Filho Irlen Antônio Gonçalves Universidade Federal de Minas Gerais Diana Gonçalves Vidal André Luiz Paulilo Universidade de São Paulo Resumo A preocupação com a problemática da cultura escolar despon- tou no âmbito de uma viragem dos trabalhos históricos educa- cionais e de uma aproximação cada vez mais fecunda com a disciplina de história, seja pelo exercício de levantamento, or- ganização e ampliação da massa documental a ser utilizada nas análises, seja pelo acolhimento de protocolos de legitimidade da narrativa historiográfica. O artigo representa uma síntese das investigações que vêm sendo realizadas pelos pesquisadores e pretende apreender como cultura escolar vem sendo apropriada pela área da História da Educação brasileira enquanto categoria de análise e campo de investigação. Para tanto foi dividido em três partes. Na primeira, aborda as definições de cultura escolar mais utilizadas. Trabalhos de Dominique Julia, André Chervel, Jean-Claude Forquin e António Viñao Frago são visitados, pro- curando-se estabelecer similitudes e diferenças entre as con- cepções dos autores. Discorre, também, sobre a disseminação desses textos no Brasil. Na segunda parte, sem pretender reali- zar uma revisão bibliográfica completa nem um exaustivo le- vantamento de títulos e autores, chama a atenção para algumas das dimensões da realidade educacional brasileira às quais os pesquisadores têm buscado entender com o concurso da noção de cultura escolar. Ao final, aponta alguns dos desafios que precisam ser levados em conta para o prosseguimento das in- vestigações e para o aprofundamento teórico-metodológico das pesquisas que utilizam os arcabouços aqui discutidos. Palavras-chave Cultura escolar História da Educação — Práticas escolares. Correspondência: Luciano Mendes de Faria Filho Rua Francisco Proença, 195/202 31255 800 Belo Horizonte – MG e-mail: [email protected]

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A cultura escolar como categoria de análise e comocampo de investigação na história da educaçãobrasileira

Luciano Mendes de Faria FilhoIrlen Antônio GonçalvesUniversidade Federal de Minas Gerais

Diana Gonçalves VidalAndré Luiz PauliloUniversidade de São Paulo

Resumo

A preocupação com a problemática da cultura escolar despon-tou no âmbito de uma viragem dos trabalhos históricos educa-cionais e de uma aproximação cada vez mais fecunda com adisciplina de história, seja pelo exercício de levantamento, or-ganização e ampliação da massa documental a ser utilizada nasanálises, seja pelo acolhimento de protocolos de legitimidadeda narrativa historiográfica. O artigo representa uma síntese dasinvestigações que vêm sendo realizadas pelos pesquisadores epretende apreender como cultura escolar vem sendo apropriadapela área da História da Educação brasileira enquanto categoriade análise e campo de investigação. Para tanto foi dividido emtrês partes. Na primeira, aborda as definições de cultura escolarmais utilizadas. Trabalhos de Dominique Julia, André Chervel,Jean-Claude Forquin e António Viñao Frago são visitados, pro-curando-se estabelecer similitudes e diferenças entre as con-cepções dos autores. Discorre, também, sobre a disseminaçãodesses textos no Brasil. Na segunda parte, sem pretender reali-zar uma revisão bibliográfica completa nem um exaustivo le-vantamento de títulos e autores, chama a atenção para algumasdas dimensões da realidade educacional brasileira às quais ospesquisadores têm buscado entender com o concurso da noçãode cultura escolar. Ao final, aponta alguns dos desafios queprecisam ser levados em conta para o prosseguimento das in-vestigações e para o aprofundamento teórico-metodológico daspesquisas que utilizam os arcabouços aqui discutidos.

Palavras-chave

Cultura escolar História da Educação — Práticas escolares.Correspondência:Luciano Mendes de Faria FilhoRua Francisco Proença, 195/20231255 800Belo Horizonte – MGe-mail: [email protected]

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School culture as an analysis category and as a fieldof study in the History of Brazilian Education

Luciano Mendes de Faria FilhoIrlen Antônio GonçalvesUniversidade Federal de Minas Gerais

Diana Gonçalves VidalAndré Luiz PauliloUniversidade de São Paulo

Abstract

The concern with the issue of school culture has arisen in thecontext of a turn taken by the works in the history of educationand of an ever so fruitful confluence with the discipline of History,be it for the practice of gathering, organization and expansion ofthe documental mass of data to be used in the analyses, be it bythe acceptance of legitimacy protocols from the historiographicnarrative. The article represents a synthesis of the investigations thathave been conducted by researchers, and intends to apprehendhow school culture has been taken on board by the field of Historyof Brazilian Education as a category of analysis and as a topic ofstudy. To such purpose, the paper is composed of three parts. Thefirst part deals with the most commonly used definitions of schoolculture. Works by Dominique Julia, André Chervel, Jean-ClaudeForquin and António Viñao Frago are focused here in an attemptto establish similarities and differences between the ideas of thevarious authors. The dissemination of these texts in Brazil is alsodiscussed in this first part. The second part of the article, withoutany intention of representing a complete bibliographic review or acomprehensive listing of titles and authors, draws attention tosome of the dimensions of the Brazilian education reality, whichthe researchers have been trying to understand with the aid of thenotion of school culture. Finally, the article points out some of thechallenges that have to be faced in carrying on these studies andin strengthening the theoretical-methodological foundations ofthe studies that use the general framework discussed here.

Keywords

School culture — History of Education — School practices.Contact:Luciano Mendes de Faria FilhoRua Francisco Proença, 195/20231255 800Belo Horizonte – MGe-mail: [email protected]

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Nos últimos trinta anos, as discussõesem torno da crise dos sistemas educacionais,impulsionadas por Bourdieu e Passeron, nofamoso livro A reprodução, editado no Brasilem 1975 pela Francisco Alves,1 ou por IvanIllich, no não menos famoso Sociedade semescolas, saído a lume em 1973 pela Vozes, têmcolocado como desafio ao campo educacionalbrasileiro não apenas a reflexão sobre as refor-mas educativas (em geral tomadas na dimensãodo seu fracasso), como também a busca denovos referenciais teóricos para interpretar ouniverso da escola. Nesse sentido, uma renova-ção de métodos vem alterando as práticas depesquisa na área, como, por exemplo, o recur-so à investigação etnográfica e aos estudos decaso na tentativa de se aproximarem aos faze-res ordinários da escola; bem como os váriossujeitos da educação vêm sendo valorizados emsuas ações cotidianas, o que se explicita noaumento de interesse pelas trajetórias de vidae profissão e no engajamento que observa emanálises organizadas em torno de questões degênero, raça e geração.

A emergência desse debate nos anos1970 se entreteceu à preocupação crescentecom a tópica da cultura, disseminada inicial-mente no seio de uma intelectualidade marxista,que cada vez mais se interrogava sobre as prá-ticas culturais como constitutivas da sociedadee não somente como produtos das relaçõessocioeconômicas. Manifestava-se, para citardois exemplos, tanto em um viés sociológico,como o fez Raymond Williams, no conhecidoCultura e sociedade, publicado em portuguêsno ano de 1969 pela editora Companhia Naci-onal; quanto em um viés histórico, como o deEdward Palmer Thompson, em A formação daclasse operária inglesa, traduzido apenas em1987, pela Paz e Terra, mas que circulou noBrasil na versão espanhola desde a décadaanterior. A problemática espraiava-se pelos vá-rios campos de conhecimento, sensibilizandolingüistas, filósofos, historiadores e sociólogose abarcando diferentes perspectivas teóricas emetodológicas que, no âmbito deste artigo, não

serão abordadas. Foi apropriada pelo campoeducacional também de maneira variada, inci-tando os educadores a reconhecer a existênciade uma cultura escolar que demandava inves-tigação.

O artigo de José Mário Pires Azanha,“Cultura escolar brasileira: um programa depesquisa”, publicado em 1991 na Revista daUSP, se situava no campo de recorrência dostextos acima. Partia de uma interrogação sobrea crise em educação e propunha um inventáriodas práticas escolares, de maneira a realizar ummapeamento cultural da escola, atento à suaconstituição histórico-social. Interrogava-sesobre a eficácia das reformas educativas, con-siderando que era no interior da sala de aulaque se decidia o destino das políticas públicas,pelas resistências oferecidas por professores àsmudanças e pelas alterações efetuadas nospadrões de trabalho vigentes. O artigo davacorpo a um Programa de Pesquisa desenvolvi-do pelos professores da Faculdade de Educa-ção da USP,2 no âmbito de acordo celebradoentre o Banco Interamericano de Desenvolvi-mento e a reitoria. Explicitava as problemáticasque vinham mobilizando a equipe, conceden-do destaque à função cultural da escola emface da diversidade da clientela, às relaçõesentre saber teórico e saber escolar e às cone-xões entre vida escolar e reformas educativas.Demonstrava a proficuidade do conceito naoperacionalização de análises sobre a institui-ção escolar a partir de diferentes vertentes doconhecimento pedagógico.

Ao mesmo tempo, a revista Teoria &Educação publicava a tradução dos artigos deAndré Chervel, “História das disciplinas escola-res: reflexões sobre um campo de pesquisa”, em

1. Afrânio e Denice Catani e Gilson Pereira, em estudo sobre a apropria-ção de Bourdieu no campo educacional, realizado pela análise de periódi-cos da área, afirmam que A reprodução é o texto mais citado do autor,presente em 67% dos artigos pesquisados (Ver Catani et al., 2001, p. 65).2. Eram eles: Marta Carvalho, Maria Cecília C. C. de Souza, CynthiaPereira de Sousa, Helena C. Chamlian, Denice B. Catani, Waldir Cauvilla,Maria Malta Campos, Belmira Bueno, Denise Trento R. de Souza, Zilma deOliveira, Marta Kohl de Oliveira, Maria Tereza F. Rocco, Marli André, MaryJulia Dietzsch, Elizabeth Mokrejs e Tizuko M. Kishimoto.

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1990, e de Jean Claude Forquin, “Saberes es-colares, imperativos didáticos e dinâmicas so-ciais”, em 1992. Dava-se início a uma reflexãoque atingiria uma gama variada de pesquisaseducacionais. Um balanço de toda essa produ-ção, que chega aos dias de hoje, seria impos-sível no limite exíguo de um artigo. Os traba-lhos que tomam a cultura escolar como catego-ria de interpretação partem das diversas áreasdisciplinares que compõem a pedagogia, comoa psicologia da educação, a sociologia da edu-cação, a filosofia da educação e a didática,entre outras. E, apesar de partilharem referên-cias comuns, traduzem os modos próprios delidar com o arsenal teórico, de assegurar pro-cedimentos de validação das pesquisas e delegitimar análises, constitutivos de cada áreadisciplinar, espelhando as múltiplas especialida-des do saber pedagógico e seu diálogo comcampos de conhecimento afins, como a psico-logia, a sociologia e a filosofia. Nesse sentido,de maneira a restringir o corpus do estudo egarantir-lhe uma certa homogeneidade, opta-mos por cingir a reflexão acerca da culturaescolar, como categoria de análise, aos estudosem história da educação, ainda que reconheça-mos que as fronteiras entre as áreas do conhe-cimento educacional sejam tênues e que ainterdisciplinaridade é uma das marcas do exer-cício em educação.

No que tange à historiografia educa-cional, há aproximadamente dez anos, a cate-goria cultura escolar vem subsidiando as aná-lises históricas e assumindo visibilidade naestruturação propriamente dita de eventos docampo. A conferência de encerramento do XVISCHE (International Standing Conference forHistory of Education), realizada em Lisboa, em1993, por Dominique Julia, tinha por título “Acultura escolar como objeto histórico”. O IIICongresso Luso-Brasileiro, ocorrido em Coimbraem 2000, trazia uma mesa-redonda sobre “Cul-turas escolares”. O periódico Cadernos Cedes n.52, editado em 2000, foi todo dedicado àtemática “Cultura escolar: história, práticas erepresentações”, realçando os estudos sobre o

livro e textos didáticos como fontes. Na XIIJornadas Argentinas de História da Educação,acontecida em Rosário, em 2001, havia entreseus painéis um dedicado a “Perspectivas teó-rico-metodológicas para a pesquisa sobre Cul-tura escolar”. O II CBHE, em 2002, organizou amesa-redonda “Cultura escolar: questões dehistoriografia”. Em 2003, foi organizado porRosa Fátima de Souza e Vera Valdemarin o ISeminário sobre Cultura escolar, estendendo-sepor três dias e envolvendo um número signifi-cativo de pesquisadores da área.

A preocupação com a problemática dacultura escolar despontou no âmbito de umaviragem dos trabalhos históricos educacionaisdecorrentes, por um lado, do cenário descritono início deste artigo e, por outro, de umaaproximação cada vez mais fecunda com adisciplina de história, seja pelo exercício delevantamento, organização e ampliação damassa documental a ser utilizada nas análises,seja pelo acolhimento de protocolos de legiti-midade da narrativa historiográfica. Para tantocontribuíram o surgimento e consolidação degrupos de pesquisa, no âmbito de sociedadescientíficas, como o GT História da Educação,criado na ANPEd em 1984, e no de instituiçõesacadêmicas, com maior ou menor distribuiçãonacional,3 mas também o investimento na cons-tituição de Centros de Documentação e Refe-rência, visando acolher, preservar e socializar adocumentação localizada. Contribuíram, ainda,a circulação e a incorporação de uma biblio-grafia que transitava da história social da cul-tura, emergente nos anos 1960, a uma históriacultural da sociedade, presente desde os anos1990.4

Para compreender os modos como acategoria foi apropriada pelos historiadores

3. Como apenas um exemplo do primeiro caso, podemos citar o HISTEDBR,coordenado por Dermeval Saviani.4. Sobre a conformação do campo da história da educação no Brasil,vários trabalhos já foram publicados, dentre eles Carvalho (1998, 2000),Nunes (1996), Lopes (1986), Lopes e Galvão (2001), Warde (1984), Saviani(1998), Monarcha (1999), Vidal e Faria Filho (2003) e Faria Filho e Vidal(2003).

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brasileiros da educação, dividimos o artigo emtrês partes. Na primeira, abordamos as defini-ções de cultura escolar mais utilizadas pelocampo. Trabalhos de Dominique Julia, AndréChervel, Jean-Claude Forquin e António ViñaoFrago são visitados, procurando-se estabelecersimilitudes e diferenças entre as concepções dosautores. Discorre-se, ainda, sobre a difusão dasidéias desses autores no Brasil. Na segundaparte, sem pretender realizar uma revisão bibli-ográfica completa nem um exaustivo levanta-mento de títulos e autores, chamamos a aten-ção para algumas das dimensões da realidadeeducacional brasileira às quais os pesquisado-res têm buscado entender com o concurso danoção de cultura escolar. Ao final, apontamosalguns dos desafios que, a nosso ver, preci-samos levar em conta ou enfrentar para oprosseguimento das investigações e para oaprofundamento teórico-metodológico daspesquisas que utilizam os arcabouços aquidiscutidos.

Cultura escolar: significadosconcorrentes

Talvez por ter sido enunciado no pres-tigioso fórum do ISCHE; talvez por ter sidodifundido no Brasil nos programas de pós-gra-duação da Faculdade de Educação da USP e daPUC-SP, ainda na versão mimeografada; outalvez porque situasse a cultura escolar como umobjeto da investigação em história; o artigo deDominique Julia, “A cultura escola como objetohistórico”, publicado em 1995 na PaedagogicaHistórica e traduzido para o português somenteem 2001, pela Revista Brasileira de História daEducação, servindo de artigo de abertura ao pri-meiro número do periódico, tem sido insisten-temente citado tanto nas investigações estran-geiras quanto nacionais. Entre o texto pronun-ciado na Conferência de encerramento do ISCHEe o editado nos periódicos algumas diferençassão perceptíveis. Apesar da proximidade dasformulações, um interesse pelas culturas infan-tis como integrantes da cultura escolar apare-

ceu na segunda versão, matizando a ênfaseconferida anteriormente ao que poderíamoschamar “culturas docentes”, sem o aval, entre-tanto, do próprio Julia.

A definição vinha já no segundo pará-grafo do artigo:

Para ser breve, poder-se-ia descrever a culturaescolar como um conjunto de normas que defi-nem conhecimentos a ensinar e condutas a in-culcar, e um conjunto de práticas que permitema transmissão desses conhecimentos e a incor-poração desses comportamentos; normas epráticas coordenadas a finalidades que podemvariar segundo as épocas (finalidades religio-sas, sociopolíticas ou simplesmente de sociali-zação). Normas e práticas não podem ser ana-lisadas sem se levar em conta o corpo profis-sional dos agentes que são chamados a obede-cer a essas ordens e, portanto, a utilizar dispo-sitivos pedagógicos encarregados de facilitarsua aplicação, a saber, os professores primáriose os demais professores. Mas, para além dos li-mites da escola, pode-se buscar identificar emum sentido mais amplo, modos de pensar e deagir largamente difundidos no interior de nossassociedades, modos que não concebem a aquisi-ção de conhecimentos e de habilidades senãopor intermédio de processos formais de es-colarização: aqui se encontra a escalada dosdispositivos propostos pela schooled society queseria preciso analisar; nova religião com seusmitos e ritos contra a qual Ivan Illich se levan-tou, com vigor, há mais de vinte anos. Enfim,por cultura escolar é conveniente compreendertambém, quando é possível, as culturas infantis(no sentido antropológico do termo), que sedesenvolvem nos pátios de recreio e o afasta-mento que apresentam em relação às culturasfamiliares. (Julia, 2001, p. 10-11)

Partindo do diagnóstico que desde adécada de 1970 a história da educação haviarefinado suas problemáticas de investigação, aproposta de Julia almejava acrescentar ao ex-cessivo peso das normas a atenção às práticas.

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Era esse o argumento fundamental. Criticandoas análises que, na esteira de Bourdieu ePasseron, pretendiam ver na escola apenas olugar de reprodução social, e as que, em vir-tude das comemorações dos cem anos deobrigatoriedade escolar na França, percebiama instituição como um triunfo técnico e cívi-co (ambas excessivamente apoiadas na idéiade uma pujança da ação da escola, que iden-tificava intenção com resultados), Julia convi-dava os historiadores da educação a se inter-rogarem sobre as práticas cotidianas, sobre ofuncionamento interno da escola. A metáforaaeronáutica da “caixa-preta” adquiria valor deargumentação. Recusando estudos essencial-mente externalistas, como a história das idéiaspedagógicas, das instituições educativas e daspopulações escolares, que tomavam como fon-tes privilegiadas os textos legais, propunha umahistória das disciplinas escolares, constituída apartir de uma ampliação das fontes tradicionais.A defesa de uma viragem nos estudos históri-cos em educação não se fazia acompanhar porum desdém às análises macropolíticas. Preten-dia, ao contrário, a aproximação entre estas eos estudos voltados para o interior das institui-ções de ensino.

A decisiva questão das fontes emergiacomo problema, ao qual Julia contornava su-gerindo a capacidade do historiador em fazer“flecha com qualquer graveto” e lembrando oinusitado das surpresas dos arquivos, reveladasapenas àqueles que se deixavam sensibilizarpor novos objetos, a despeito de reconhecer asdificuldades inerentes a uma investigação so-bre as práticas culturais, uma vez que elas nãocostumam deixar traços. Alertava, por fim, paraa necessidade de se recontextualizarem asfontes, suspeitando que a “grande inércia quepercebemos em nível global pode estar acom-panhada de mudanças muito pequenas queinsensivelmente transformam o interior dosistema” (Julia, 2001, p. 15). Externava suacrença, assim, nas inovações pedagógicas, es-posando uma concepção de cultura escolarcomo inventiva.

Para demonstrar as possibilidades deum estudo acerca das práticas que se originasseda análise de textos normativos, debruçou-sesobre o Ratio Studiorum. Na versão de 1586,Julia identificava-o como um programa de li-ções e exercícios graduados de teologia à gra-mática. Na versão de 1591, percebia-o comouma descrição da hierarquia de funções e po-deres especializados da Companhia de Jesus.Para Dominique Julia, a comparação dos doisdocumentos evidenciava que o colégio deixa-ra de ser apenas um local de aprendizagem desaberes para tornar-se também um lugar deincorporação de comportamentos e hábitosexigidos por uma “ciência de governo” quetranscendia e dirigia a formação cristã e asaprendizagens disciplinares.

Embora o artigo de Julia apareça comoseminal em vários estudos a partir da décadade 1990, o debate em torno da cultura escolarlhe era anterior. Em texto publicado no Brasil,no ano de 2002, mas propagado em línguaespanhola em 2000, fruto do Seminário orga-nizado pela Universidade Complutense de Ma-dri em 1997 (Berrio, 2000, p. 15), DominiqueJulia chamava a atenção para trabalho de AndréChervel no qual havia se inspirado (Julia, 2002,p. 42), referindo-se particularmente ao artigo“História das disciplinas escolares: reflexõessobre um campo de pesquisa”, editado pelarevista Histoire de L’Éducation, em 1988, e pu-blicado no Brasil em 1990.

Contrapondo-se à noção de transposiçãodidática defendida por Yves Chevallard (1985),André Chervel advogava a capacidade da escola emproduzir uma cultura específica, singular e original.Ao discorrer sobre a construção das disciplinasescolares, em particular sobre a ortografia france-sa, Chervel criticava os esquemas explicativos queposicionavam o saber escolar como um saber in-ferior ou derivado dos saberes superiores, funda-dos pelas universidades; e a noção da escola comosimples agente de transmissão de saberes elabora-dos fora dela, lugar portanto do conservadorismo,da rotina e da inércia. Para ele, a instituição escolarera capaz de produzir um saber específico cujos

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efeitos estendiam-se sobre a sociedade e a cultu-ra, e que emergia das determinantes do própriofuncionamento institucional.

Lingüista, Chervel produziu uma sériede estudos no âmbito da história das discipli-nas escolares sobre o ensino do francês. A or-tografia (1969), a gramática (1977), o ditado(1989) e a composição francesa (1999), nosséculos XIX e XX, estiveram sob suas lentes efundaram sua compreensão da dimensão histó-rica da cultura escolar: tanto no que ela seapropriava das circunstâncias sociais, quanto noque interferia na sociedade. O estudo sobre aortografia foi a base da interpretação. Partindoda interrogação sobre os efeitos que a institui-ção escolar produzia, por sua existência, nasociedade e na cultura e recorrendo a um con-junto documental localizado nos ArchivesNationales e às primeiras estatísticas sobre asescolas primárias, procurou averiguar o estadoreal dos conhecimentos ortográficos dos pro-fessores primários franceses em 1830 e a impor-tância do sistema de formação inicial e contí-nua, instalado pela Lei Guizot de 1833, naconfiguração dos saberes docentes a partir deentão (Chervel, 1998, p. 188). Constatou quese, em 1829, 63% dos professores desconhe-ciam a gramática, em 1850 essa porcentagemcaíra a níveis insignificantes. Com a criação dasescolas normais masculinas e a obrigação desua freqüência por parte dos mestres em exer-cício, em vinte anos, todo o corpo docenteprimário havia adquirido o saber da gramática.

As conseqüências sociais e políticasdessa transformação levaram à substituição dopadre pelo professor nos cargos da administra-ção municipal, abrindo as portas para a escolalaica francesa. A esse efeito mais conhecido dahistoriografia, Chervel acrescentou outros três,mais propriamente concernentes à cultura es-colar. O primeiro, considerado como lingüístico,se referia a uma cristalização da ortografia. Nomomento em que todos os mestres aprenderama grafar as palavras da mesma maneira, a orto-grafia havia deixado de evoluir. O segundo efei-to, de cunho cultural, concernia ao estatuto

que a ortografia alcançou na opinião pública apartir da segunda metade do Oitocentos fran-cês. Seu prestígio levou a identificar como in-culto o indivíduo que não soubesse escrevercorretamente. O terceiro efeito, que incidiasobre a gramática propriamente dita, era tam-bém o que sustentava a argumentação deChervel acerca da originalidade da cultura es-colar. Para o autor, o difícil aprendizado daortografia deu origem à elaboração de umateoria das funções, puramente escolar e opera-tória, constituída no intramuros da escola pormestres em atividade (e não por eruditos), querespondia às urgências do ensino.

Acrescentava, ainda, a esses um efeitoindireto, ligado à economia das relações disci-plinares: as dificuldades inerentes à ortografiada língua francesa fizeram com que permane-cesse a soletração como método de leituraprivilegiado a despeito das mudanças metodo-lógicas posteriores. Sua conclusão sobre a cul-tura que a escola legava à sociedade destaca-va dois aspectos. Por um lado, ela traduzia osresultados esperados pelo programa oficial. Poroutro, revelava efeitos imprevisíveis, engendra-dos independentemente pelo sistema escolar(Chervel, 1998, p. 190). Esse duplo escopo e aimportância que para ele assumiam as discipli-nas escolares na conformação da cultura escolarfizeram Chervel (1990, p. 184) afirmar:

Desde que se compreenda em toda a sua ampli-tude a noção de disciplina, desde que se reco-nheça que uma disciplina escolar comporta nãosomente as práticas docentes da aula, mas tam-bém as grandes finalidades que presidiram suaconstituição e o fenômeno de aculturação demassas que ela determina, então a história dasdisciplinas escolares pode desempenhar um pa-pel importante não somente na história da edu-cação mas na história cultural. Se se pode atri-buir um papel “estruturante” à função educativada escola na história do ensino, é devido a umapropriedade das disciplinas escolares. O estudodessas leva a pôr em evidência o caráter emi-nentemente criativo do sistema escolar, e por-

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tanto a classificar no estatuto dos acessórios aimagem de uma escola encerrada na passivida-de, de uma escola receptáculo dos subprodutosculturais da sociedade. Porque são criações es-pontâneas e originais do sistema escolar é queas disciplinas merecem um interesse todo parti-cular. E porque o sistema escolar é detentor deum poder criativo insuficientemente valorizadoaté aqui é que ele desempenha na sociedadeum papel que não se percebeu que era duplo:de fato ele forma não somente os indivíduos,mas também uma cultura que vem por sua vezpenetrar, moldar, modificar a cultura da socie-dade global.

Apesar de próximos e da influência queo trabalho de Chervel exerceu sobre Julia noque concerne à discussão em torno da consti-tuição das disciplinas escolares e dos efeitossociais da escolarização, havia diferenças nasduas acepções de cultura escolar enunciadaspelos pesquisadores. Chervel parecia afirmá-lade maneira mais contundente como original ese interessava principalmente pela construçãodos saberes escolares. Julia fazia a ênfase daanálise recair particularmente sobre as práticasescolares, o que o levava a distinguir entre umacultura escolar primária e uma cultura escolarsecundária.

Sensibilizado também pelas questõesrelativas à constituição das disciplinas escola-res, mas atuando na intersecção com os estu-dos sobre currículo, Jean Claude Forquin, emartigo publicado pela Teoria & Educação, em1992, e no livro Escola e cultura, fruto de suatese de doutorado, saído a lume em portu-guês, no ano seguinte, caracterizava a culturaescolar como seletiva, no que concerne à cul-tura social, e derivada, no que tange à suarelação com a cultura de criação ou invençãodas ciências fonte. Quanto ao primeiro aspec-to, asseverava:

A educação não transmite jamais a cultura,considerada como um patrimônio simbólico eunitário e imperiosamente coerente. Nem sequer

diremos que ela transmite fielmente uma cultu-ra ou culturas, elementos de cultura, entre osquais não há forçosamente homogeneidade, quepodem provir de fontes diversas, ser de épocasdiferentes, obedecer a princípios de produção elógicas de desenvolvimento heterogêneos e nãorecorrer aos mesmos procedimentos de legi-timação. Isto significa dizer que a relação entreeducação e cultura poderia ser mais bem com-preendida através da metáfora da bricolage(como reutilização, para fins pragmáticos mo-mentâneos, de elementos tomados de emprésti-mo de sistemas heterogêneos) do que através dametáfora do reflexo ou da correspondência ex-pressiva. (Forquin, 1993, p. 15)

Era como efeito de um trabalho dereinterpretação e reavaliação contínua do quedevia ser conservado, ao lado de um movimen-to de esquecimento de parcelas da experiênciahumana, que se operava a seleção, na herançacultural, de conteúdos tidos por imprescindí-veis à educação do homem e fundamentais àperpetuação da sociedade, incluídos no currí-culo escolar. Essa seleção decorria de fatoressociais, políticos e ideológicos que, de acordocom o autor, comportavam algo de arbitrário ede constante questionamento da escola legadapelos antepassados, e se realizava pelo entre-cruzamento de ações institucionais (currículooficial), docentes (currículo real) e discentes(currículo aprendido). Fazia-se acompanhar,ainda, de uma transformação do conhecimen-to produzido pela academia. E, nesse sentido,não apenas recortava saberes e materiais cultu-rais disponíveis em um dado momento na so-ciedade, mas efetuava a reorganização e re-estruturação desses saberes, perante a necessi-dade de transposição didática.

Forquin identificava três imperativos naconformação da transposição didática. O pri-meiro, a transposição propriamente dita, provi-nha do reconhecimento da diferença entre artede ensinar e a arte de inventar. Cabia ao pro-fessor levar o aluno a redescobrir um conheci-mento já inventado pela ciência, tendo em

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conta o estado do conhecente, do ensinado edo ensinante, sua posição respectiva com res-peito ao saber e a forma institucionalizada darelação entre um e outro, em cada contextosocial. O segundo, a interiorização, decorria douso dos dispositivos de repetição e exame comoformas de assimilação. O terceiro, os imperati-vos institucionais, referiam-se ao tempo de aula,à divisão do conhecimento por séries, aos rit-mos de exercícios e aos mecanismos de contro-le. Eram essas três ordens de questões quefaziam Forquin afirmar a cultura escolar comouma cultura segunda:

A cultura escolar apresenta-se assim como umacultura segunda com relação à cultura de cria-ção ou de invenção, uma cultura derivada etransposta, subordinada inteiramente a umafunção de mediação didática e determinadapelos imperativos que decorrem desta função,como se vê através destes produtos e destes ins-trumentos característicos constituídos pelos pro-gramas e instruções oficiais, manuais e mate-riais didáticos, temas de deveres e de exercícios,controles, notas, classificações e outras formaspropriamente escolares de recompensas e desanções. (Forquin, 1992, p. 33-34; grifos doautor)

Cabe destacar que tanto na tese, defen-dida em 1987, em que a reflexão de Chevallard(1985) sobre a transposição didática predomi-nava, quanto no artigo publicado inicialmenteem 1991, no qual o texto de Chervel, “Históriadas disciplinas escolares: reflexões sobre umcampo de pesquisa”, já apontado por Juliacomo emulador de sua escrita, emergia na bi-bliografia, Forquin parecia transitar da aprecia-ção da cultura escolar como uma cultura deri-vada de sua percepção como uma cultura origi-nal. Alertava, no artigo, que a transposição di-dática ou rotinização acadêmica não permitia acompreensão de certos aspectos mais específi-cos do funcionamento escolar, como práticasinternas às salas de aula, competên-cias opera-tórias de curto alcance e de função puramen-

te adaptativa, rituais, rotinas e receitas, indagan-do-se se a escola não poderia ser pensadacomo “verdadeiramente produtora ou criado-ra de configurações cognitivas e de habitusoriginais que constituem de qualquer forma oelemento nuclear de uma cultura escolar suigeneris” (Forquin, 1992, p. 35). Tentava, assim,conciliar duas vertentes analíticas que se pro-duziam como opostas.

António Viñao Frago, no artigo “Historiade la educación e historia cultural”, saído a lumena Revista Brasileira de Educação (Viñao, 1995)e em outros dois materiais, a conferência deabertura do I Congresso Brasileiro de História daEducação, proferida em 2000 e publicada em2001, pela Sociedade Brasileira de História daEducação, e um texto, intitulado Culturas esco-lares, cedido pelo autor em sua viagem ao Bra-sil em 2000, também discorria sobre essa cate-goria de análise.

Para o autor, cultura escolar recobre asdiferentes manifestações das práticas instaura-das no interior das escolas, transitando de alu-nos a professores, de normas a teorias. Na suainterpretação, englobava tudo o que aconteciano interior da escola.

Alguien dirá: todo. Y sí, es cierto, la culturaescolar es toda la vida escolar: hechos e ideas,mentes y cuerpos, objetos y conductas, modosde pensar, decir y hacer. Lo que sucede es queen este conjunto hay algunos aspectos que sonmás relevantes que otros, en el sentido que sonelementos organizadores que la conforman ydefinen. Dentre ellos elijo dos a lo que he dedi-cado alguna atención en los últimos años: elespacio y el tiempo escolares. Otros no menosimportantes, como las prácticas discursivas ylingüisticas o las tecnologías y modos de comu-nicación empleados, son ahora dejados a unlado. (Viñao Frago, 1995, p. 69)

Tempo e espaço escolares seriam reto-mados no ensaio incluído em Currículo, espa-ço e subjetividade (Viñao, 1998). Nele, o autordestacava que nem os espaços, nem os tempos

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escolares eram dimensões neutras da educação.Ao contrário, constituíam corporeidades dossujeitos escolares, impondo por sua materia-lidade uma determinada aprendizagem senso-rial e motora, bem como disseminavam símbolosestéticos, culturais e ideológicos. As tecnologiase modos de comunicação, por outro lado, jáhaviam sido tematizados anteriormente no livroAlfabetização na sociedade e na história, publi-cado no Brasil em 1993. Nele, o autor defen-dia que sociedades largamente escolarizadastendiam a valorizar o conhecimento da escritae conferir maior prestígio social aos indivíduosque demonstrassem capacidade em organizar opensamento pela lógica escritural. Os sujeitosque, apesar de conviverem socialmente com aescrita, faziam dela precário uso eram denomi-nados, pelo autor, analfabetos secundários, poroposição ao que chamava de analfabeto primá-rio, encontrável apenas em comunidades nasquais ler e escrever não eram saberes partilha-dos. Utilizando-se de um arcabouço teóricointerdisciplinar, incluindo antropologia, históriae psicologia, Viñao Frago alertava que o estig-ma dos analfabetos na sociedade ocidental eraresultante da absorção pelo corpo social de umcritério de julgamento puramente escolar.

Além de abarcar as mais diversas di-mensões do cotidiano da escola e de se des-folhar sobre a sociedade, a cultura escolar, parao autor, variava também de acordo com a ins-tituição investigada. Nesse sentido, preferia aacepção culturas escolares. À ampliação hori-zontal do conceito, acrescentava uma amplia-ção vertical. Haveria, assim, tantas culturas es-colares quanto instituições de ensino.

Puede ser que exista una única cultura escolar,referible a todas las instituciones educativas deun determinado lugar y período, y que, incluso,lográramos aislar sus características y elemen-tos básicos. Sin embargo, desde una perspectivahistórica parece más fructífero e interessantehablar, en plural, de culturas escolares. (...)No hay dos escuelas, colegios, institutos deenseñanza secundaria, universidades o faculda-

des exactamente iguales, aunque puedanestablecerse similitudes entre ellas. Las diferen-cias crecen cuando comparamos las culturas deinstituciones que pertenencen a distintos niveleseducativos. (Viñao Frago, 2001, p. 33)

Enquanto Dominique Julia concebia aexistência de duas culturas escolares (primáriae secundária), Viñao Frago estendia o concei-to a todas e a cada uma das instituições esco-lares. Isso permitia atribuir a cada escola, co-légio e universidade uma singularidade, o queconcorria para ampliar as possibilidades deestudos no campo da história das instituições.Ao mesmo tempo, impunha um limite à opera-cionalidade analítica da categoria quandoconfrontada com a necessidade de abarcar oconjunto das maneiras de escolarização dosocial na época moderna, como o queria Julia.

Ao lado da insistência no sentido latode cultura escolar, Viñao Frago a identificavacom as continuidades e persistências. Utilizadapara entender o relativo fracasso das reformaseducativas a partir do enfrentamento, diferen-ça e divórcio entre as culturas dos reformadorese gestores e a cultura dos professores, a cate-goria cultura escolar emergia como resistênciaa mudanças.

Concepto de cultura escolar como un conjuntode teorías, ideas, principios, normas, pautas,rituales, inercias, hábitos y prácticas — formasde hacer y pensar, mentalidades y comporta-mientos — sedimentadas a lo largo del tiempoen forma de tradiciones, regularidades y reglasde juego no puestas en entredicho y queproporcionan estrategias para integrarse endichas instituciones, para interactuar y parallevar a cabo, sobre todo en el aula, las tareascotidianas que de cada uno se esperan, asícomo para hacer frente a las exigencias ylimitaciones que dichas tareas inplican oconllevan. Sus rasgos caracteristicos serían lacontinuidad y persistencia en el tiempo, suinstitucionalización y una relativa autonomiaque le permite generar productos específicos —

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por exemplo, las disciplinas escolares — que laconfiguran como tal cultura independiente.(Viñao Frago, 2000, p. 2-3)

Ao aproximar cultura escolar e conti-nuidade, António Viñao Frago construía umaacepção diversa da enunciada por DominiqueJulia, que recorria ao conceito para rompercom a “grande inércia que percebemos em ní-vel global” e se deixar sensibilizar pelas “mu-danças muito pequenas que insensivelmentetransformam o interior do sistema”, como cita-do anteriormente.

Embora tenham pontos de partida se-melhantes, como a ênfase na constituição his-tórica e o reconhecimento do espaço e tempocomo princípios conformadores da cultura es-colar, as acepções da categoria sob a pena dosautores apresentam especificidades. No queconcerne ao estudo sobre os professores, ViñaoFrago e Forquin valorizam a diferença entresaber docente e técnico. Julia e Chervel vêemo professor como aquele que põe em funciona-mento os dispositivos escolares de maneiracriativa respeitando às normas estabelecidas. Seessa concepção está implícita em Viñao, a ên-fase da interpretação não recai sobre apositividade da ação docente, mas sobre a fa-lha ou falta das reformas.

No que tange às mudanças, ViñaoFrago reafirma a pouca permeabilidade da cul-tura escolar às transformações, enquanto Juliaparece preocupar-se com as inflexões e, assim,acolher as rupturas, ainda que em pequenaescala. O mesmo transparece em Forquin,quando se interroga sobre o contínuo proces-so de seleção e esquecimento da cultura pro-movido pela instituição escolar, e em Chervel,quando atribui um papel estruturante à funçãoeducativa da escola na história do ensino, noque demonstra seu acolhimento às lições dePierre Bourdieu.5

No que se refere ao impacto da esco-larização sobre a sociedade, Viñao aborda oshábitos e comportamentos, as experiênciascognitivas que a escola proporciona e que se

estendem ao corpo social, como as noções detempo e espaço. A aquisição da linguagemapresenta-se como importante na constituiçãodos sujeitos e na produção de seu lugar social,seja pela depreciação do analfabeto, comosugere Viñao (1993), seja pelo estigma àqueleque não escreve corretamente, como induzChervel. Julia remete à preocupação com aschooled society.

Essas semelhanças e diferenças na cons-trução conceitual reenviam às práticas de pes-quisa e aos objetos históricos investigados pe-los autores: o que serve de alerta à sua incorpo-ração nos estudos no Brasil, pela atenção àsdiversidades culturais, sociais e históricas daescolarização entre os diferentes países. Ofere-cem, entretanto, um repertório analítico que,confrontado pelos embates nos arquivos, possi-bilita discorrer sobre as invariantes estruturais daescola, mas indagar-se acerca das transforma-ções, insistindo no entendimento das práticasescolares e dos aspectos diferenciados do coti-diano, nas múltiplas apropriações do espaço e dotempo escolar.

O recurso aos artigos e livros citados eàs diferentes acepções de cultura escolar tempropiciado a produção de vários trabalhos emhistória da educação no Brasil, demarcandoapropriações que se concentram em torno detrês perspectivas, provisoriamente definidascomo saberes, conhecimentos e currículos;espaços, tempos e instituições escolares ematerialidade escolar e métodos de ensino.Nelas estão compreendidos objetos de interes-se os mais diversificados como livros e leituras,uniformes escolares, materiais didáticos entreoutros. Correndo o risco de que não se possam

5. Aqui, é necessário um esclarecimento. O diálogo com Bourdieu apa-rece tanto nas reflexões que se ocupam em criticar os estudos centradosna estabilidade das práticas culturais, em que o conceito de habitus seentrelaça ao de estrutura estruturada e reafirma a reprodução social (comofoi o caso de Julia); quanto nas que almejam identificar as mudanças, quan-do habitus assume função na estrutura estruturante e acena com a possi-bilidade de improvisações reguladas (acepção que toma em Chervel). Oconceito de habitus, como concebido por Bourdieu, permite acolher asduas vertentes de análise, segundo a ênfase recaia sobre o caráterestruturado ou estruturante da categoria.

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distinguir abordagens concentradas exclusiva-mente em apenas uma das vertentes relaciona-das anteriormente, há, nos estudos, ênfases quepermitem perceber algumas inclinações ao tra-tamento mais detalhado de um ou outro as-pecto por parte dos historiadores brasileiros daeducação. Os autores, aqui discutidos, são,assim, chamados a auxiliar as análises de diver-sas maneiras.

O artigo de Dominique Julia é possivel-mente o que se abre mais amplamente às vá-rias gamas de estudo. Apesar de o exercício deinterpretação do autor estar vinculado aosurgimento e desenvolvimento das disciplinasescolares, o que lhe franquearia a incorporaçãopor parte da investigação que tematiza saberesescolares e currículo; o destaque que efetua aspráticas e a abrangência da reflexão permite seracolhido por pesquisadores que se dedicam atodas as questões mencionadas. António ViñaoFrago também vem sendo amplamente estuda-do pelos investigadores brasileiros . No entan-to, parece-nos, tem auxiliado mais detidamen-te os estudos sobre espaços e tempos escola-res, o que lhe permite, também, ser citado emanálises sobre o currículo das escolas, os sabe-res e a materialidade escolar e métodos deensino. André Chervel e Jean-Claude Forquinaparecem mais freqüentemente nos trabalhosvoltados para discussão sobre currículo, e, igual-mente, naqueles em que o tema dos saberesescolares organiza a narrativa.

Cultura escolar: pequeno mapade investigações

Os estudos desenvolvidos pelos pes-quisadores brasileiros que tomam como refe-rência a noção de cultura escolar — seja comocategoria de análise, seja como campo de in-vestigação — têm significado, reconhecida-mente, uma renovação dos estudos em histó-ria da educação brasileira. Tais estudos, noentanto, não significam apenas uma “aplica-ção” ad limina das teorias ou definições pro-duzidas por pesquisadores estrangeiros. Lon-

ge disso, o que se observa aqui é uma gran-de riqueza de elaboração e uma criatividadeacentuada nos processos de apropriação, ha-vendo, inclusive, tentativas de se propor defi-nições alternativas àquelas trazidas pelos tex-tos anteriormente analisados (Nunes, 1992;Faria Filho, 2003).

Assim, o que nos propomos aqui é efe-tuar um pequeno inventário das pesquisasrealizadas no Brasil sobre a temática, agrupan-do-as de maneira bastante aberta, como afirma-do anteriormente, em três grandes eixos nor-teadores: saberes, conhecimentos e currículos;espaços, tempos e instituições escolares; ematerialidade escolar e métodos de ensino.

Umas das áreas da história da educaçãoque mais direta e fortemente tem se utilizadodos diversos arcabouços teóricos subjacentes àsdiversas acepções de cultura escolar e, portan-to, das tradições historiográficas que lhes dãosuporte, é aquele que se volta para a investiga-ção acerca dos saberes e conhecimentos esco-lares. Aqui, de forma interessante e criativa, aspesquisas se debruçam pelo menos sobre trêsgrandes focos interdependentes. De um lado,há aqueles que se dedicam a investigar princi-palmente os impressos pedagógicos e sua im-portância como estratégia de difusão de mode-los e idéias pedagógicos, analisando também aspráticas de apropriação a que tais objetos cul-turais estão sujeitos (Carvalho, 1991, 1998;Biccas, 2001; Souza, 2001; Catani; Bastos,1997).

Há, por outro lado, pesquisadores quese voltam mais especificamente para a análisedas práticas da leitura e da escrita, sejam estasescolares ou não, interrogando desde o seuensino e disseminação social, até a presençadesses saberes e competências na constituiçãode subjetividades, nos modos de vida e nasdiversas maneiras de estruturação dos sabres epoderes em nossa sociedade (Vidal, 2002;Esteves, 2002).

Outra vertente de estudos nesse camporefere-se à história do currículo e das discipli-nas escolares (Souza, 2000; Bittencourt, 2003).

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Um esforço importante tem sido feito para, decerta forma, retirar os estudos a respeito dahistória do currículo e dos programas de ensi-no da formalidade e do idealismo a que osmesmos foram submetidos pela tradição his-toriográfica educacional brasileira. De um lado,ao mostrar o currículo como um campo deforças e ao enfocar os aspectos sociais, cultu-rais, políticos, econômicos das escolhas efetiva-das pelos agentes que intervêm continuamen-te no processo de escolarização, tais estudostêm contribuído para que tenhamos uma claravisão do quão é dinâmica a cultura escolar. Deoutra parte, ao lançar luzes sobre as práticas deapropriação das quais, de alto a baixo, os sa-beres escolarizados são produto, tais investiga-ções nos permitem perceber os constrangimen-tos sociais e escolares a que os sujeitos esco-lares estão submetidos e, por outro lado, asartimanhas criativas postas em ação por estesmesmos sujeitos para dar conta de dar sentidoàs suas ações e, de uma forma mais geral, àprópria escola.

Noutra vertente de pesquisas, os inves-tigadores têm, cada vez mais, posto o acentosobre as práticas escolares, a materialidade eformalidade da cultura escolar. Nessa direção,ganha relevo um número significativo de traba-lhos que tem renovado de forma marcante osestudos sobre os métodos escolares ou peda-gógicos no Brasil (Camargo, 1997; Bastos eFaria Filho, 1999; Valdemarin, 1998; Barra,2001; Inácio, 2003; Schelbauer, 2003; Gonçal-ves, 2004).

De uma forma geral, os estudos que seconcentram nesta vertente, em íntimo diálogocom outros desenvolvidos na área, têm afirma-do o quanto os praticantes da cultura escolardesenvolvem suas práticas a partir de seus lu-gares, de suas posições no interior de um sis-tema de forças assimétricas. Tais práticas, noentanto, não visam apenas a operacionalizaçãodestas ou daquelas prescrições, mas objetivamproduzir lugares de poder/saber, inteligibi-lidades e sentidos para a ação pedagógica es-colar junto às novas gerações. Tais práticas são

entendidas, nesses estudos, como produtorasde sujeitos e de seus respectivos lugares nointerior do campo pedagógico.

De fato, tais práticas produzidas pelossujeitos no seu dia-a-dia escolar, também osproduzem. Essas práticas têm sido concebidaspor muitos pesquisadores (Carvalho, 1998;Faria Filho, 2000; Vago, 1999; Paulilo, 2002)como maneiras de fazer peculiar dos sujeitos daescola e que ocorrem no interior do cotidianoescolar. Mas esse lugar ocupado por eles nãotem sido entendido enquanto um lugar próprioe, sim, como um lugar onde desenvolvem táti-cas, isto é, ações calculadas que são determi-nadas pela ausência de um próprio, como con-vém a Certeau (2000, p. 100), que tem sidocitado por muitos desses estudiosos das práti-cas escolares.

Percebe-se que os estudos a respeitodos métodos de ensino têm se concentradosobre a divulgação e apropriação efetuadaspelos sujeitos educacionais brasileiros e porpolíticos e intelectuais a respeito dos métodosmútuo — a partir da segunda década do séculoXIX — e intuitivo — a partir dos anos 1960. Taisestudos têm demonstrado a imensa criatividadedos sujeitos em suas práticas de apropriação e,por outro lado, a inserção do Brasil no proces-so de internacionalização da educação e dossistemas de ensino.

Relacionado aos métodos, importantefaceta dos estudos é o fato de eles revelarem osconstrangimentos e as possibilidades trazidospelos materiais à prática escolar. Investigaçõescomo aquelas que estudam as práticas de en-sino da leitura e da escrita (Vidal; Gvirtz, 1998;Inácio, 2003) estão a nos revelar que a materia-lidade da escola é fator às vezes preponderantena constituição de determinadas práticas esco-lares e, sobretudo, constrangem ou estimulama disseminação social de certos conhecimentosou competências.

Entre as novas temáticas enfocadaspelos estudiosos da cultura escolar brasileira,aquelas relacionadas aos tempos e espaçosescolares são, sem dúvida, algumas das mais

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relevantes. Entre nós é muito recente o inte-resse por essas dimensões da dinâmica esco-lar e foi, sem dúvida, com a emergência dosestudos sobre a cultura escolar que elas seconstituíram como objetos dignos de atençãopor parte dos pesquisadores em história daeducação no Brasil.

Nesses estudos os pesquisadores bus-cam jogar luz sobre aspectos das relações dosespaços e tempos escolares com outros aspec-tos intrínsecos da experiência escolar e, aomesmo tempo, buscam articulá-los com ostempos e espaços sociais mais amplos (Souza,1998; Faria Filho; Vago, 2001; Faria Filho;Vidal, 2000). Interessante articulação é feita poralguns estudos entre as culturas escolares e asculturas urbanas, tendo os tempos e espaçosescolares como fios condutores da investigação(Nunes, 1992; Bencosta, 2001; Veiga, 2002;Faria Filho, 2002; Silva, 2004).

Ao enfocarem a multiplicidade dos pro-jetos, das projeções e dos sentidos instituídosou apropriados pelos sujeitos escolares em tor-no dos tempos e espaços escolares e, sobretu-do, ao colocarem estas dimensões em íntimarelação com as representações e práticas so-ciais a respeito destas mesmas dimensõesestruturantes da vida social e cultural, tais pes-quisas têm contribuído para uma desnatura-lização da própria instituição escolar no Brasil.Isto não é pouco se considerarmos que até bempouco tempo as reflexões e pesquisas desenvol-vidas em várias áreas da educação, inclusive nahistória da educação, acabavam por trabalhar eproduzir uma representação da escola comouma instituição estática e acabada desde ostempos coloniais.

É nessa linha de preocupação que seinsere, pelo menos em parte, os diversos estu-dos que têm sido realizados sobre as relaçõesentre culturas e instituições escolares. Tais es-tudos (Hilsdorf, 2001; Gatti, 2001) têm de-monstrado não apenas que o espaço e o tem-po são elementos estruturantes das instituiçõese experiências escolares, mas também que su-jeitos sociais os mais diversos se mobilizam —

e mobilizam conhecimentos e experiências dediversas áreas — na pretensão de dotar as ins-tituições escolares de racionalidades ora seme-lhantes ora distintas de outras instituições eformas de socialização tais como a família, aIgreja e o mundo do trabalho.

Uma das facetas mais instigantes des-ses estudos sobre as culturas escolares é queeles buscam articulá-las a várias outras catego-rias de reconhecido potencial analítico, dotan-do as investigações de importantes ferramentas— inclusive discursivas — para dar uma maior emelhor inteligibilidade aos estudos históricosrealizados. Assim, os trabalhos que se debruçamsobre os sujeitos escolares (professores, alunos,diretores, inspetores, etc.) e suas ações con-formadoras e instituidoras das culturas escola-res têm crescentemente utilizado as categoriasde gênero, classe, raça, geração, etnia, entreoutras, como instrumental teórico-metodoló-gico para entender as ações e os lugares ocu-pados por esses sujeitos nas teias que envolveme fabricam as culturas escolares (Vidal; Carva-lho, 2001; Rosa, 2001; Peres, 2000; Vieira,2002; Villela, 2000). Nessa mesma linha, éimportante ressaltar o trabalho desenvolvidopor alguns estudiosos da história da infância, osquais têm demonstrado o grande vínculo exis-tente entre a cultura escolar e o processo deescolarização com a produção da modernanoção de criança no Brasil, e, ainda, chamam aatenção para a importância de se debruçarespecificamente sobre os processos de transfor-mação das crianças em alunos no âmbito dopensamento educacional brasileiro (Gouvêa,2003; Carvalho, 1997).

Ainda no que se refere às categori-as mobilizadas por aqueles que atuam nessecampo de estudo que estamos discutindo,cabe chamar a atenção para o esforço dealguns grupos de pesquisa em articular ànoção de cultura escolar as de escolari-zação (Faria Filho, 2003) e forma escolar(Vincent, 1980; Vidal 2004). Para Faria Fi-lho, a noção de escolarização remete a doissentidos que se relacionam: o estabeleci-

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mento de processos e políticas de “orga-nização” de uma rede de ensino e a paula-tina produção de referências sociais em quea escola se torna eixo articulador de senti-dos e significados. Para Guy Vincent, é aemersão da escola como um lugar específi-co e separado das outras práticas sociais,por meio do qual se constituem saberesescritos formalizados, produzem-se efeitosduráveis de socialização sobre os estudan-tes, dissemina-se a aprendizagem das ma-neiras de exercício de poder e propaga-seo ensino da língua na construção de umarelação escr i tural com a l inguagem e omundo, que configura a forma escolar.

Nas duas articulações, a noção decultura escolar ocupa um lugar de particu-lar importância. Isso pelo fato de ela “per-mitir articular, descrever e analisar, de umaforma muito rica e complexa, os elementoschave que compõem o fenômeno educativo”(Faria Filho, 2003, p. 8), dentro de umahistória concreta e particular, isto é, a cul-tura escolar como uma categoria para seestudar o processo de escolarização que sedá num momento determinado. E, por elapossibilitar a

apreciação das mudanças, manifestas não ape-nas como uma cultura conformista ou confor-madora, mas como rebelde ou subversiva, resul-tante de apropriações docentes e discentes doarsenal disponibilizado pela escola no seu inte-rior, evidenciadas em suas práticas. (Vidal, 2004,p. 42-43)

Busca-se, com isso, interrogar os pro-cessos de constituição, no Brasil, de uma so-ciedade escolarizada, bem como os diversos fa-tores intervenientes, os limites e as possibilida-des e, finalmente, os constrangimentos sociais,culturais, políticos e econômicos postos emfuncionamento, ou impostos, sobretudo aosgrupos subalternos, pela generalização de umacultura escolar e, portanto, da escrita na so-ciedade brasileira.

História das culturas escolares:alguns desafios

A noção de cultura escolar tem signifi-cado, sem dúvida, um refinamento metodoló-gico e analítico de nossas pesquisas e tempossibilitado o fortalecimento do diálogo, porum lado, com a historiografia e, por outro, comas demais áreas e ciências da educação. Noentanto, esse refinamento, geralmente acompa-nhado pela produção de objetos cada vez maisespecíficos e que demandam estudos cada vezmais verticalizados, traz, também, alguns pro-blemas. O primeiro e, a nosso ver, mais sério, éa ausência de pesquisas de base no âmbito dahistória da educação. Acreditamos que a passoslargos, muito largos, passamos de uma históriadas políticas, da organização e do pensamen-to educacionais, para uma história das culturasescolares sem que, no entanto, tenhamos pro-duzido uma cultura historiográfica e pesquisasde base que dêem suporte a esta passagem.

Em países como a França, por exemplo,a investigação sobre objetos cada vez mais espe-cíficos, seja na área da história do livro, da leitu-ra ou da educação, foi antecedida e, em boaparte, possibilitada por investimentos de peso napesquisa de base na área da editoração, da circu-lação de livros e de localização e organização defontes, às quais se relacionam, também, a umacultura historiográfica bastante consolidada.

Já no Brasil, estas mesmas condições nãose verificaram (e não se verificam) no momentoem que, no fecundo e criativo diálogo com ahistoriografia e com a produção de outras ciên-cias, em âmbito nacional e internacional, os his-toriadores propuseram-se a recortar objetos espe-cíficos e efetuar estudos cada vez mais vertica-lizados. Se a este elemento, adicionarmos a dimi-nuição dos prazos de formação dos novos pes-quisadores, a pressão por publicação advindosde órgãos financiadores e avaliadores e a pre-carização de nossas condições de trabalho, temosingredientes mais que suficientes para grandesdiscussões sobre a dinâmica da pesquisa emnossa área e a qualidade dos produtos.

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Na mesma linha de argumentação, cre-mos que os estudos sobre cultura escolar têmpermitido desnaturalizar a escola e empreenderestudos sobre o processo mesmo de sua emer-gência como instituição de socialização nostempos modernos. Articulada aos estudos doprocesso de escolarização, tal perspectiva traz,desde logo, a necessidade de pensar a relaçãoda escola com as outras instituições responsá-veis pela socialização da infância e da juventu-de, principalmente com a família, a Igreja e omundo do trabalho. É aqui que se encontra umdos grandes limites à realização de nossas in-vestigações: são poucos os estudos historio-gráficos sobre essas instituições que nos ofere-cem subsídios para pensarmos a relação com acultura escolar.

Todos sabemos que uma das dimen-sões fundamentais dos estudos sobre as cultu-ras escolares é aquela que enfoca as práticasescolares. Aliás, para alguns de nós, o estudodas práticas é a pedra de toque da renovaçãodos estudos históricos em educação. No entan-to, também sabemos o quanto é difícil realizara pesquisa histórica que pretenda ter acesso àspráticas escolares. Nos últimos anos, o diálogoestabelecido pelos historiadores da educaçãocom a historiografia e com outras áreas dasciências humanas e sociais (antropologia, so-ciologia, lingüística, entre outros), muito temcontribuído para uma melhor delimitação teó-rico-metodológica das pesquisas sobre as prá-ticas e para uma discussão do próprio estatu-to epistemológico deste objeto.

Pode-se argumentar, por um lado, quenosso olhar e perguntas devem nos levar aperceber, nos indícios, nos sinais, na materia-lidade, as práticas de que os objetos são por-tadores ou que formalizam. Se temos avança-do muito nesa direção, isto, no entanto, nãopode esconder o fato de que, em boa parte dasvezes, estamos lidando com exercícios de pres-crição de práticas, ou seja, em boa parte es-tamos lidando mais com culturas escolaresprescritas do que com culturas escolares prati-cadas no interior das escolas. Por outro lado,

esta pode ser uma das pistas para o aumentoexpressivo dos trabalhos com fontes orais emnossa área pois, para muitos, os relatos oraisparecem oferecer a ilusão de que abordam(diretamente) práticas.

Não por acaso a emergência e conso-lidação do tema cultura escolar nas pesquisasem história da educação se dá ao mesmo tem-po em que se amplia o diálogo com a chama-da história cultural francesa. Uma das explica-ções para isso é que tanto a temática — a cul-tura escolar — quanto a abordagem — a histó-ria cultural — contribuam para a criação delugar confortável para a educação no terrenoda cultura, não mais ancorado nos estudossociológicos, mas historiográficos.

No entanto, a unanimidade, pelo menosaparente, não tem propiciado o debate e oaprofundamento crítico. Virou lugar-comum nahistória da educação brasileira, sobretudo nostextos publicados em congressos, a explicita-ção de que se trabalha com história cultural,com práticas e representações. Também viroulugar comum o entendimento que história cul-tural significa a de tradição francesa, propostae realizada por Roger Chartier.

Tal unanimidade discursiva acaba, algu-mas vezes, por esconder procedimentos de pes-quisas muito diversos e, ainda, apropriaçõesmuitos diferentes do referencial teórico emquestão. Mas, o mais importante, é que aquiloque poderia representar uma abertura para no-vos e instigantes diálogos com tradições his-toriográficas já estabelecidas — como a marxis-ta, por exemplo — corre o risco de converter-seem camisa-de-força para as investigações.

Ainda sobre a história cultural francesa,se, por um lado, precisamos aprofundar suasubstantiva contribuição para nossos estudos,devemos também reconhecer que temos sidomuito tímidos na explicitação de seus limitespara os trabalhos no campo da história daeducação e da cultura escolar.

O que possibilitou, em parte, a renova-ção dos estudos historiográficos no século XXfoi, entre outros aspectos, a tomada de cons-

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ciência por parte dos historiadores da relaçãodinâmica entre o passado e o presente. De outraparte, no âmbito da história da educação, nãohá dúvida de que a renovação dos estudosesteve (e está) intimamente atrelada à possibili-dade de uma nova história das instituições esco-lares e a pretensão de se produzir uma históriado cotidiano escolar — a famosa assertiva acer-ca da possibilidade de entrar na caixa preta daescola proposta pela sociologia — e de dar visi-bilidade aos diversos sujeitos que participam dacultura escolar, notadamente aos professores.

Tal virada, aliada a processos já expli-citado por outros trabalhos (Carvalho, 2000;Faria Filho; Vidal, 2003), possibilitou a consti-tuição de um outro lugar para a história daeducação dentro das “ciências da educação”bem como tem contribuído para o crescenteprestígio de nossa disciplina dentro do campoda educação.

Como parte deste novo cenário, mais emais os historiadores são chamados a participardo debate sobre os problemas atuais da educa-ção. Das reformas à formação de professores,passando pela problemática dos tempos e dosespaços, os historiadores sempre têm o quedizer! (Pelo menos é o que imaginamos e noque fazemos nossos colegas acreditarem!)

Além disso, o diálogo estabelecido sig-nifica, cada vez mais, a possibilidade de parti-cipação em projetos de reforma e de extensãouniversitária, além de uma atividade mais inten-sa no mercado editorial, seja aquele mais res-trito à produção acadêmica para os pares, sejapara o imenso mercado da divulgação científi-ca, sobretudo para professores.

Apesar desta mudança, em muito poucasoportunidades discutimos sobre este novo (?)lugar ocupado pelos historiadores da educação,bem como sobre as respostas teóricas e políticasque temos dado às demandas do presente. Tal-vez esteja na hora de refletirmos sobre este novolugar e sobre as nossas respostas às exigências dopresente sob pena de estarmos alimentando pers-pectivas teóricas e políticas que, no campo dahistoriografia, estaríamos combatendo.

Até que ponto, por exemplo, não estamosproduzindo um conhecimento historiográficodemandado pelas constantes reformas educacio-nais do presente? Até que ponto o presentismo eo pragmatismo das políticas educacionais estãoatingindo nossas pesquisas? Até que pontoestamos aparelhados (ou nos aparelhando) paraum diálogo fecundo e crítico com os nossoscolegas das demais áreas da educação e com osresponsáveis pelas políticas educacionais?

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Recebido em 22.02.04Aprovado em16.04.04

Luciano Mendes de Faria Filho é doutor em Educação, professor de História da Educação na UFMG e pesquisador bolsistado CNPq.

Diana Gonçalves Vidal é doutora em Educação, professora de História da Educação na USP e pesquisadora bolsista doCNPq.

Irlen Antônio Gonçalves é doutorando em educação na UFMG e professor de História da Educação da Universidade Fumec.

André Luiz Paulilo é mestre em Educação pela Feusp.