Expressões de preconceito racial na UFS

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Artigo de iniciação científica relacionada a questão das relações raciais desenvolvidas no ambiente acadêmico da Universidade Federal de Sergipe. O autor articula o pensamento voltado para as questões raciais no Brasil e a realidade da instituição mencionada com um olhar voltado para as relações raciais após a implementação das cotas raciais e seu impacto em relação ao racismo.

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPEPR-REITORIA DE PS-GRADUAO E PESQUISA

    COORDENAO DE PESQUISAPrograma Institucional de Bolsas de Iniciao Cientfica PIBIC

    Perfil social e acadmico dos alunos cotistas da UFS

    Expresses de preconceito racial no ambiente acadmico Jos Alison Nascimento Garcia*

    Frank Nilton Marcon**

    *Graduando no curso de Cincias Sociais pela Universidade Federal de Sergipe, integrante

    do GERTS (Grupo de Estudos Culturais, Identidades e Relaes Inter tnicas).

    **Professor adjunto na rea de Antropologia do departamento de Cincias Sociais,

    professor adjunto do programa de ps-graduao e pesquisa em Cincias Sociais da

    Universidade Federal de Sergipe, coordenador do GERTS (Grupo de estudos Culturais,

    Identidades e Relaes Inter tnicas).

  • Resumo

    O objetivo deste artigo identificar expor e analisar as possveis formas de preconceito

    racial, que ocorrem no ambiente acadmico na Universidade Federal de Sergipe, atravs

    dos dados coletados em um questionrio, aplicado junto ao SIGAA (Sistema de Gesto e

    Administrao Acadmica), na tentativa de colaborar com as pesquisas que versam sobre

    raa e identidade. Os dados coletados podero ser comparados a outros encontrados no

    dirio de campo, tentando atenuar as semelhanas e disparidades encontradas em ambas

    situaes trazendo a discusso sobre estes, no que tange ao impacto das cotas raciais,

    buscando assim, destacar a implantao das aes afirmativas como parte de um amplo

    plano de incluso social, com o entendimento de que a questo racial a chave para

    entender e superar as desigualdades sociais existentes no Brasil.

    Palavras-chave: Relaes Raciais; Desigualdades Sociais; Aes

    Afirmativas.

  • Introduo

    Este artigo faz parte da concretizao de nossa pesquisa na rea da antropologia que deu

    origem ao nosso projeto de iniciao cientfica, fazendo parte, portanto do Programa

    Institucional de Bolsas de Iniciao Cientfica PIBIC, com o ttulo original de: Perfil

    social e acadmico dos alunos cotistas da UFS, na qual segue com a orientao

    institucional, terica e pedaggica do professor Frank Nilton Marcon, da Universidade

    Federal de Sergipe.

    No sentido especfico ao qual propomos nesse trabalho, ele resultado que

    obtivemos, por meio de um recorte direcionado em relao pesquisa acima citada, tendo

    como caracterstica bsica a tentativa de compreender e refletir no que diz respeito s

    relaes entre os jovens universitrios que compem a instituio de ensino da

    Universidade Federal de Sergipe, focando nas possveis expresses de preconceito racial

    dentro da Universidade, investigando de forma sistemtica portanto, se h relaes na qual

    apresentam algumas tenses e deformidades sociais, ou se h uma harmonia entre as raas

    para lembrar a ideia do autor Gilberto Freyre nesse ambiente, nos quais possam caracterizar

    melhor as relaes raciais na UFS. Tendo como peculiaridade significativa a

    implementao das cotas social e tnico/racial como forma de ingresso nas Universidades

    pblicas brasileiras.

    necessrio ento, tentar fazer uma breve contextualizao de como se

    desenvolveu a ideia de usar as aes afirmativas para tentar democratizar a sociedade e de

    promover a igualdade racial em nosso pas por meio da educao, ento vemos na

    Conferncia Contra Racismo, Xenofobia e Intolerncias Correlatas, realizada pela

    Organizao das Naes Unidas, a ONU, que ocorreu no ano de 2001, em Durban, como

    marco inicial, no qual, as autoridades brasileiras realmente se apresentaram como

    interessadas em discutir e possivelmente criar mecanismos nos quais promovesse a

    igualdade racial e amenizasse as desigualdades sociais e raciais no Brasil.

    Esse evento junto a criao posteriormente da SEPPIR-PR (Secretaria de Polticas

    de Promoo da Igualdade Racial da Presidncia da Repblica, na qual tem proporcionado

    uma maior discusso acerca de reserva de vagas para negros em universidades, bem como

  • contribuiu na adeso das aes afirmativas por parte de vrios estados brasileiros

    (PAAF/UFS, 2008).

    Mas bom salientar que a discusso sobre o uso de cotas raciais e sociais j vinha

    sendo discutido em algumas universidades brasileiras, como o exemplo, da UnB,

    Universidade de Braslia, tal qual foi a primeira universidade a aderir a reserva de vagas

    destinadas para negros em universidades pblicas federais, no ano de 1999, ou seja antes,

    mesmo da criao da lei 12.711, sancionada pela presidente Dilma Rousseff em 29 de

    Agosto de 2012. Conhecida popularmente como lei das cotas, que dispe sobre a reserva

    de vagas com critrios para estudantes da escola pblica, negros e indgenas, definindo em

    no mnimo 50% o acesso destes s universidades federais e s instituies federais de

    ensino tcnico e mdio (SEPPIR-PR, 2013).

    Tivemos tambm aps dois anos da iniciativa da UnB, as Universidades do Estado

    do Rio de Janeiro e da Bahia, portanto UERJ e UNEB respectivamente, tambm haviam

    adotado o sistema de cotas. (Queiroz e Santos, 2006).

    Mais adiante tentaremos expor algumas contribuies de autores acerca do tema

    pesquisado, bem como algumas ponderaes nossa referente aos nosso objeto e nossos

    resultados obtidos.

    A discusso sobre aes afirmativas e cotas tem ganhado fora nos ltimos anos,

    sempre relacionando tais polticas pblicas como meio de combate ao preconceito racial em

    todas as esferas da vida em sociedade do brasileiro, pois, tem sido um assunto muito

    comum e ao mesmo tempo peculiar, nesta nova roupagem est indissoluvelmente ligado

    aos debates em torno da implementao das chamadas Aes Afirmativas e Polticas

    Inclusivas no Ensino Pblico Superior como j mencionamos, bem como; uma maneira de

    combater o racismo para alguns, como uma maneira mais contundente de inserir os ditos

    homens e mulheres de cor em ambientes nos quais possam sair do ostracismo scio

    histrico, um meio de diluir uma dvida histrica, e ento, conseguir sua aceitao e

    conseguir ocupar e dividir espaos em ambientes antes ocupado apenas por uma parcela da

    sociedade, os chamados de homens brancos.

  • Preferimos no entrar nesses campo que no faz nada alm de apenas reduzir toda

    uma discusso histrica acerca do preconceito racial em seu suas meras vises de mundo,

    mas sim tentar trazer a discusso de como esse tema tem sido tratado ou convivido no

    ambiente acadmico, ou seja, buscamos olhar para as formas que o preconceito racial vem

    sendo produzido e reproduzido aps o uso de meios que em tese objetiva a democratizao

    do ensino pblico superior, apresentando perspectivas para o futuro da juventude

    universitria, juventude essa que essencialmente formada por negros, pardos, mulatos, etc.

    As discusses em torno da equidade nas condies de acesso, com o intento de

    combater as desigualdades de oportunidades a grupos comprovadamente marginalizados no

    que tange ao acesso ao ensino pblico superior, baseado nas questes socioeconmicas,

    tnico-racial e deficincias fsicas.

    Na tentativa de contextualizar alguns trabalhos que discutem o uso das cotas nas

    universidades pblicas, observando se alguns desses podem contribuir no ensejo de nossa

    pesquisa na UFS, buscamos assim, traar o perfil socioeconmico e cultural que se

    encontram alunos de cursos diversos nesta instituio de ensino superior, por meio de um

    questionrio aplicado via SIGAA, portal no qual detm informaes sobre os alunos

    matriculados e promove feedbacks entre UFS e aluno.

    de grande importncia para nossa pesquisa na rea relacionada a relaes tnico

    raciais, buscar entender e analisar as narrativas destes jovens que fazem uso das aes

    afirmativas e de que forma eles se entendem como parte da mesma, nosso foco tanto acota social, quanto racial e o acesso por alunos oriundos de escola pblica e que

    autodeclaram negros (ou pretos), pardos, ou indgenas para o ingresso universidade

    pblica, dando nfase na questo do preconceito racial no ambiente acadmico e os

    desdobramentos que o racismo vem sendo caracterizado no cotidiano dos jovens

    universitrios, tanto no mbito da visibilidade como o da invisibilidade, mas falaremos um

    pouco mais sobre isso mais tarde.

    Os textos que antecederam a construo e aplicao do questionrio foram de

    extrema importncia, pois tais leituras nos direcionaram no campo de pesquisa, como

    tambm deram uma viso geral sobre a temtica pesquisada, propondo uma compreenso

    melhor do impacto das polticas afirmativas em universidades, para da se fazer uma anlise

  • das informaes do questionrio e organiza-las. Por isso, realizamos juntamente com as

    leituras bibliogrficas, a aplicao de um questionrio como anteriormente citado, buscando

    verificar a forma como os alunos cotistas e tambm no cotistas se comportam frente ao

    programa de aes afirmativas (PAAF).

    Acreditamos que interessante para um melhor entendimento do leitor, que se faa

    uma breve contextualizao scio histrica das ditas desigualdades sociais e relaes

    raciais, nas quais, em muitos momentos chegam a se confundirem, pois sabemos que no

    necessrio mostrar censos demogrficos que comprovem uma concentrao maior de

    negros e mulatos em reas que apontam maiores ndices de desigualdades sociais, menor

    concentrao de renda, enfim, vive ao meio das mazelas que assola o nosso pas.

    No temos a inteno de discutir o mito da democracia racial, mas em algum

    momento de nosso trabalho podemos tentar trazer ao menos nuances que isto possa ter

    possibilitado resultados predominantes em nosso questionrio aplicado junto aos alunos da

    UFS, pois temos vistos como as relaes raciais tem sido muito debatida mundo afora com

    casos de racismo em vrios contextos do cotidiano, como o exemplo do futebol, que um

    esporte muito difundido no mundo inteiro e os atos de racismos se repetem mesmo com

    campanhas contrrias ao mesmo por parte de instituies e entidades que organizam

    campeonatos e similares do gnero, provavelmente iremos retomar essa questo por ser o

    futebol estar intimamente ligado ao contexto que concerne as identidades, fronteiras

    tnicas, econmica social e cultural, vemos no futebol, um esporte que consegue unir

    atores sociais de vrios contextos, e isso peculiar nele, pois os conflitos entre os atores

    sociais esto imbudos de sentidos que s podem ser identificados de forma emprica, essa

    no a nossa rea de atuao, no s no caso do futebol, mas no cotidiano, onde as relaes

    sociais se processam, mencionamos o futebol apenas pela relevncia que tem e que um

    campo onde tambm ocorre expresses de preconceito racial, quando muitas vezes pode

    partir de jogadores adversrios, torcida rival, prpria torcida e etc.

    Ento se no futebol tem sido um campo minado de expresses diversas de racismo,

    no ocorre muito diferente com alunos que optam por concorrer a uma vaga para ingresso

    em uma universidade pblica por meio das aes afirmativas, cotas raciais e sociais para

    ser mais exato.

  • Mais adiante tentaremos expor como tem se processado o preconceito racial no

    ambiente acadmico, a forma como tem sido encarado, ao mesmo tempo refletindo diante

    das teorias raciais que deram uma melhor conotao para a razo de nosso trabalho.

    Como mencionamos o termo identidade, e de fato , algo que est em questo nos

    dias atuais por sua complexidade em um contexto social, pois remete no apenas o sujeito

    objetivo como tambm subjetivo, a atribuio de pertencer ou no a um grupo tnico est

    inteiramente condensada na autoafirmao do prprio autor, em ele mesmo declarar sua

    identificao a tal grupo, seguindo noo de fronteira tnica (BARTH, 1998). Podemos

    supor que havendo essa fronteira o autor tem possibilidade de intercalar sua dita

    identidade para momentos em que pode ser oportuno o uso de certa identidade, como por

    exemplo, o uso da identidade negra para conseguir entrar na universidade, atravs das cotas

    raciais e sociais. Seguindo o raciocnio de Fredrik Barth entendemos que as fronteiras

    tnicas so utilizadas para compreender as dinmicas do grupo em que ele encontra-se

    inserido. Barth dinamiza a identidade tnica como algo que no pode ser vista como

    esttica, podendo se decompor a partir de relaes como alguma coisa que pode ser

    impressa em qualquer outra identidade, mesmo apresentando coletividade ou

    individualidade, sendo ento relativo ao interesse, situao, enfim, o contexto em se

    passa. A relao mutua existente entre os sujeitos e grupos, deixam mudanas continuas que

    de certa forma acaba figurando e modelando a identidade, estando sempre alheio a um

    chamado processo de excluso ou incluso, definindo quem est inserida no grupo e quem

    no esto no mesmo (BARTH, 1998).

    Em um certo contexto podemos incluir a excluso ao qual o negro foi submetido no

    panorama social como sequela do processo de abolio da escravido. Ou seja, a introduo

    do negro na sociedade aconteceu de forma lenta e gradual com a sua insero em locais

    mais menores na sociedade, como o exemplo nas ocupaes em cargos de empregos.

    Frente a economia concorrente, na qual o imigrante europeu tornou-se como o smbolo da

    modernizao de produo na sociedade brasileira ps escravido brasileira, colocando o

    negro em segundo plano se compararmos com a concorrncia com o europeu branco

    para Florestan Fernandes Essas facetas da situao humana do antigo agente do trabalho

    escravo imprimiram abolio o carter de uma espoliao extrema e cruel ( Florestan

  • Fernandes, 1978, pp 15), temos ento ai a antiga mo de obra jogada na sarjeta, podemos

    interpretar esse momento como uma forma de expressiva de preconceito racial, no que diz

    respeito as opes de trabalho? algo que devemos refletir.

    Pretendemos fazer a primeira parte desse trabalho tratando apenas os aspectos conceituais e

    tericos sobre a temtica relacionada a identidade tnica, relaes raciais, e o impacto das

    aes afirmativas, partindo sempre da esfera nacional, mas sempre voltando ao caso da

    Universidade Federal de Sergipe.

    Na segunda parte deste artigo estaremos expondo os casos ocorridos de expresses

    raciais no ambiente acadmico desta instituio frente aos alunos da mesma que

    responderam ao nosso questionrio, com uma perspectiva de deixar ao leitor as

    interpretaes e reflexes para tais situaes.

  • A invisibilidade do preconceito racial

    O preconceito ao longo dos anos tem se reproduzido em formas diversas, mas

    sabemos que o racismo carrega em si, um manifesto para tentar definir como se processam

    as relaes de poder, pois para quem pratica um simples atos de racismo ou algo mais grave

    no h outra forma de determinar que o objetivo de tal conduta estabelecer em qual

    posio em que se encontram, mas com surgimento de polticas antirracistas as coisas

    foram mudando ao ponto do racismo ser caracterizado atualmente como algo velado e sutil,

    esboando portanto uma invisibilidade que faz-nos lembrar das teorias desenvolvidas,

    tendo como fio condutor e ideia central da democracia racial defendia na obra Casa grande

    & senzala de Gilberto Freyre, que mais adiante foi rebatida e se tornou mito, sem diminuir a

    importncia histrica, sociolgica e a contribuio que foi dada no que concerne as relaes

    raciais no Brasil, na qual antes era sempre baseada na ideologia do branqueamento atravs

    da mestiagem, a obra de Gilberto Freyre, que de certa forma marcou uma verdadeira

    revoluo ao valorizar e enaltecer de maneira sistemtica o mestio em um contexto de

    civilizao prpria e nova, criada por meio da mistura de raas. Entendemos que foram

    teorias nas quais contriburam de forma significativa para adentrar o campo que tratamos

    neste momento, mesmo sendo, mas no deixou de ser conotar tambm uma mera, mas

    espetacular atualizao do pensamento conservador e, na verdade tratou de fazer um elogio

    ao ofcio da tradicionalssima oligarquia dominante, como uma construtora da nova era, a

    civilizao da sociedade brasileira.

    Aos que ainda no entendem o porqu de tantas regalias que o negro vem

    conquistando, em outras palavras o direito a aes afirmativas no caso dos alunos negros,

    oriundo de escola pblica, que obtm ingresso a universidades federais por meio de cotas,

    salientamos que essas conquistas no caram no colo dos ditos homens de cor, mas foram

    conquistas que teve grandes embates tericos e polticos, com a massiva participao de

    movimentos negros e sociais na busca de tentar diminuir as desigualdades sociais. Aqueles

    que se aceita como negro, pardo, mulato ou qualquer classificao de cor que seja, como

    segue as anlises que (SHERIF, 2002) faz em relao auto declarao de cor ligado ao

    que muitos antroplogos chamam de identidade de raa, pois um indivduo pode

  • declarar-se negro, pardo, mestio, enfim, homens de cor, como costumam mencionar em

    nosso cotidiano, fazendo que suscite assim o slogan No deixe sua cor passar em branco,

    Slogan esse do movimento negro, segundo a autora (SHERIF, 2002, pg. 216) na tentativa

    assim, de evitar o termo negro que segundo a mesma autora no mesmo texto, diz que as

    pessoas acreditam ser mais pejorativo o fato de serem chamadas de negro do que de

    preto ou pardo, j que o primeiro termo mencionado remete a memria da escravido e

    de como normalmente os escravos eram chamados por seus patres. Acompanhemos o

    raciocnio do autor

    ... As palavras que usamos para falar de afro-brasilidade no so apenassinais claros micro polticos que dizem que aos nossos interlocutores qual a nossaposio no labirinto de discursos sobre raa e seus significados, mas indicamtambm um fato incontestvel: o portugus falado no Brasil sempre teve umvocabulrio rico, ambguo e politicamente eloquente para se referir-se a cor e araa. (...) o peso da palavra negro sempre foi mais descritivo ou taxonmico(SHERIF, 2002, pg. 217).

    Como tambm nos faz trazer as indagaes de Stuart Hall, raa no uma categoria

    biolgica, logo no tem validade cientfica. No entanto, uma categoria discursiva que

    abarca formas de falar, prticas sociais, caractersticas fsicas etc. Se a grande maioria das

    naes formada por diversos povos um equvoco dizermos que raa determina a

    nacionalidade. Da, Stuart Hall coloca que as identidades nacionais so passveis do jogo de

    poder e das contradies internas, j que contam com significante diversidade em suas

    composies (HALL, 2001, pg. 47-54). Retomando ao racismo como uma expresso social

    que vem sendo analisada por muitos tericos, principalmente e aps a implementao de

    polticas que viso a promoo da igualdade racial no Brasil, no qual foi caracterizado por

    polmicas na qual at hoje no entram em consenso e aos poucos tem estimulado posies

    contrrias de diversos setores da sociedade em geral, trazendo tona discursos nos quais

    conseguimos identificar muitas vezes narrativas nas quais conseguimos identificar

    expresses de preconceitos raciais, nas quais o negro no Brasil encara em seu cotidiano um

    oponente de um porte assustador, a invisibilidade. Poucos conseguem ser perspicaz ao

    ponto de captar as dificuldades que so enfrentadas no dia a dia.

  • Acreditamos que o racismo se apresenta de forma onipresente ou subliminarmente,

    permeia toda a forma da vida em sociedade do negro e assim o martiriza de forma coletiva,

    como tambm individualizada, mas sempre mascarada, com elementos precisos para o

    tornar marginalizvel, categorizando constantemente e endossado por nossa historiografia

    como uma classe perigosa e assim por diante.

    Quando Florestan Fernandes escreve que

    A sociedade brasileira largou o negro ao seu prprio destino, deitandosobre seus ombros a responsabilidade de reeducar-se e de transformar-se paracorresponder aos novos padres e ideais de homem, criados pelo advento dotrabalho livre, do regime republicano e do capitalismo. (Florestan Fernandes,1978, pp. 20)

    Nos faz refletir que o isolamento de um grupo tnico pode ser entendido como umsimples modo de expor o preconceito que uma sociedade dominada por uma elite quecarregava as ambies de se industrializar e chegar ao dito topo do processo civilizatrio,amparando-se nas relaes de poder como tal, o dominante e em outros casos na prpriacincia como pano de fundo para justificar a inferioridade e superioridade entre as raas,o uso constante de esteretipos que certamente visam macular e inferiorizar a imagem epapel respectivamente do negro na sociedade uma estratgia muito bem sucedida no quediz respeito ao imaginrio sociocultural, infelizmente, pois acreditamos que tal forma depensar e ver o negro no contexto social no soma a tese de igualdade racial que constantemente debatida em todo pas.

    Por isso preferimos o postulado de Fredrik Barth no qual

    a distribuio dos grupos tnicos no controlada por reas naturaisfixas, e objetivas, mas pela distribuio em nichos especficos, que cada grupoexplora mediante sua organizao poltica e econmica e um pouco mais adianteoutro postulado que segue se diferentes grupos tnicos exploram os mesmos nichos,mas o mais fraco dentre eles capaz de explorar os ambientes, recursos e climasmarginais, coexistir com os outros na mesma rea sem maiores problemas. (Villar,2004, pp. 4).

    Essas conceituaes tericas de Barth nos direciona para o cotidiano histrico social

    brasileiro.

  • Acreditamos que o que justifica grosso modo a nossa ateno nessa rea do

    conhecimento que de todas as grandes questes nacionais nenhuma outra to oculta,

    velada e invisibilizada quanto as relaes raciais em nosso pas, negro no est afastado

    apenas dos meios de comunicao em seu contexto geral, como tambm pouco retratado

    como um sujeito importante da vida histrica social do Brasil, quando o retratado, visto

    muitas vezes como insignificante, em posies subalternas, vemos sempre como ele

    passado para o pblico em geral por meio da TV, novelas, filmes, etc. a presena sempre

    ausente da forma ou maneira mais adequada e muito menos na dimenso correta.

    Por isso entendemos que as relaes raciais e as desigualdades sociais caminham

    juntas, mas no assim apresentada a sociedade brasileira.

    E o que resta para os negros? Retomamos Florestan Fernandes quando ele fala da

    encruzilhada que foi imposta para se seguir:

    Diante do negro do mulato abrem-se duas escolhas irremediveis, semalternativas. Vedado o caminho da classificao econmica e social pelaproletarizao, restava-lhes aceitar a incorporao gradual a escria do operariadourbano em crescimento ou abater-se penosamente, procurando no cio dissimulado,na vagabundagem sistemtica ou na criminalidade fortuita meios para salvar asaparncias e a dignidade de homem livre. (Florestan Fernandes, 1978, pp. 28).

    Mais adiante na mesma obra Florestan endossa aquilo que podemos trabalhar com a

    ideia de ser entre outras coisas a gnese do racismo:

    (...) prevalece a convico profunda e generalizada de que o negro saiu

    da escravido fsica para entrar na escravido moral ... esta mais difcil decombater, por no ser reconhecida e suscitar controvrsias at entre suas prpriasvtimas. (Florestan Fernandes, 1978, pp. 91).

    Temos ai ento ainda, em nvel de definio, a existncia da questo do racismo

    invertido ou do racismo negro, caracterizando assim, o preconceito racial cruzado como

    mais visvel e fcil de identificar, pois algo mais espontneo.

    Sendo assim, o racismo se encontra presente de modo implcito na ideia de natureza

    geral que ir determinar os aspectos socioculturais e individuais entre as diferentes relaes

    sociais. Ou seja, o racismo est ligado a uma estrutura de classes que naturaliza e legitima

    as desigualdades sociais. Entendendo raa como um conceito social, podemos enxergar o

  • racismo como algo estruturante, legitimador, algo natural de determinadas deformidades

    sociais. Dessa formas plausvel para ns visualiza-lo de tal forma:

    como o argumento racial foi poltica e historicamente construdo, assimcomo o conceito raa que alm de sua definio biolgica acabou recebendo umainterpretao, sobretudo social. (Schwarcz, 1993 pp. 17).

    Nesta parte tentamos trazer a discusso no campo terico e conceitual que

    caracterizam o racismo como ponto culminante e vigente nas relaes raciais, apontando

    nas cotas raciais e sociais como promoo da igualdade racial, enquanto que com o uso dela

    nas universidades tem crescido o debate por apresentar a possibilidade de surgir outras

    formas de preconceito racial, pois um espao regado a polmicas por todo o Brasil e que

    remete a velha discusso sobre as desigualdades sociais existentes em nosso pas, mas

    apontando nas relaes raciais como algo que no pode ser separado e esquecido das

    mazelas que convivemos no cotidiano em nossa sociedade.

  • Narrativas que problematizam o preconceito scio racial

    Dentro da argumentao dos entrevistados da amostra h um repertrio discursivo

    argumentativo que reflete a uma heterodoxia de opinies que por hora se complementa, por

    outra se contradizem e se sobrepem. Entretanto dentro desta amostra encontramos

    algumas regularidades que definem o perfil scio racial, isso mesmo, essas categorias se

    fundem e uma no anula a outra, como defendido por Florestan Fernandes e Roger Bastide

    em Brancos e negros em So Paulo como um ziguezague entre as duas categorias.

    Voltando aos resultados, fomos percebendo aos poucos que h uma regularidade

    argumentativa no discurso dos entrevistados centrados em duas categorias de preconceito

    scio racial no ambiente acadmico na UFS, uma matizada na ideia da meritocracia, uma

    outra na excluso de cotistas na formao de grupos de estudos. Pois bem, vamos agora

    expor exemplos de narrativas discursivas nas quais entendemos ser uma expresso de

    preconceito scio racial sentida e percebida por alunos cotistas e no cotistas. Na pergunta

    Em que situao voc acha que existe alguma diferena no tratamento dos alunos cotistas

    por parte dos alunos no cotistas? presente no questionrio aplicado, obtivemos respostas

    dessa categoria:

    H pessoas que os consideram incapazes ou favorecidos pelo sistema.(Entrevistado do questionrio n 348).

    Nunca presenciei, mas conheo pessoas que tem a opinio de quecotistas so incapazes mesmo. Imagino que essas pessoas no gostariam deestar no mesmo grupo de trabalho que um cotista, por exemplo.(Entrevistado do questionrio n 289).

    Acho que o fato da pontuao ser menor para o ingresso por cotas, deixao aluno no cotista meio com raiva ou chateado pelo fato de muitas vezesum conhecido ter feito mais pontos que um cotista e no ter entrado nauniversidade. (Entrevistado do questionrio 433).

    Alguns alunos no cotistas agem de forma agressiva e preconceituosacontra cotistas. (Entrevistado do questionrio 512).

  • Concluso

  • Referncias Bibliogrficas

    BARTH, Fredrik. Grupos tnicos e suas fronteiras. In: POUTINGNAT. Teoria da

    etnicidade. So Paulo: UNESP, 1998.

    FERNANDES, Florestan. A integrao do negro na sociedade de classes. Editora tica,

    So Paulo, 1978.

    HALL, S. A identidade cultural na ps-modernidade. Traduo Toms Tadeu da Silva,

    Guaracira Lopes Louro. 6. Ed. Rio de Janeiro.

  • MARCON, Frank. SOBRINHO, Josu Modesto dos Passos. Aes afirmativas e polticas

    inclusivas no ensino pblico superior: a experincia da Universidade Federal de Sergipe.

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    SCHWARCZ, Lilia Moritz. O espetculo das raas: Cientistas, Instituies e Questo

    Racial no Brasil 1870-1930. Companhia das letras, So Paulo, 1993.

    VILLAR, Diego. Uma abordagem crtica do conceito de etnicidade na obra de Fredrik

    Barth. Mana vol. 10. Rio de Janeiro, 2004.