EXPERIÊNCIA DE PLANTIO CONSORCIADO COM … · extensão Geografia da Produção Alimentar (GPA) em...
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EXPERIÊNCIA DE PLANTIO CONSORCIADO COM COMUNIDADES TRADICIONAIS NA AMAZÔNIA ORIENTAL (RIO TROMBETAS)
Bruno Fernandes G. Cova Universidade Federal Fluminense - UFF
Caio Barros Matos Universidade Federal Fluminense - UFF
Pedro D’ Andrea Costa Universidade Federal Fluminense - UFF
Resumo O artigo se baseia na análise das experiências nas unidades experimentais de plantio consorciado com comunidades remanescentes de quilombolas promovidos pelo programa de extensão Geografia da Produção Alimentar (GPA) em 2011 e 2012, realizado por graduandos da Universidade Federal Fluminense (UFF), junto aos agricultores da região do Alto Trombetas município de Oriximiná-Pará. A região carece atualmente de fontes de renda alternativas e de diversificação das culturas alimentícias produzidas. A principal fonte de renda da região se concentra nas colheitas de castanhas no primeiro semestre do ano e na venda da farinha de mandioca. Essa renda sazonal fica sujeita às intempéries ambientais e oscilações de mercado, trazendo uma problemática para manutenção dos seus modos de vida. Essa carência de fontes de renda acaba gerando um processo migratório em busca de empregos e subempregos na área da mineração encontrada em Porto Trombetas, uma região abaixo das comunidades onde atua o GPA. Esse processo migratório altera os hábitos dos remanescentes que passam a apenas vender sua mão-de-obra entrando em dissintonia com seus próprios meios. Além de perderem parte de sua rica cultura, eles deixam de ajudar na manutenção do ambiente. A motivação para execução do projeto nesses locais se baseou na metodologia de pesquisa-ação com o objetivo de diversificar esta produção. Por se tratar de territórios situados dentro da FLONA Saracá-taquera, exigiu-se um modelo de plantio sustentável com o ambiente. Sendo assim, o grupo decidiu adotar como modelo de plantio os chamados sistemas agroflorestais (SAF). Palavras-Chave: Trombetas. GPA. Quilombolas. SAF. Introdução GPA (Geografia da Produção Alimentar) A ação de extensão é realizada há aproximadamente dois anos com comunitários de
áreas localizadas no Alto Trombetas, município de Oriximiná-PA. Esta ação consiste no
enriquecimento de capoeiras e reeducação nos hábitos de plantio, que eram direcionados
apenas para o roçado de maniva. Depois da queda de produtividade, esses terrenos
agricultáveis eram postos em pousio na forma de capoeiras. Com o GPA, as áreas de
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capoeira são reaproveitadas em formas de plantios consorciados adequados para cada
área. As espécies são distribuídas e introduzidas de acordo com interesse da família
atendida e de acordo com as características e capacidade da área, criando assim nossas
unidades experimentais de plantio. Esta ação atendeu cerca de 25 famílias em 2011 e 18
em 2012, consolidando a presença do trabalho da equipe na região, o que nos faz crer
que caminhamos para o principal objetivo almejado pela equipe, que é a segurança
alimentar, preservação do ambiente e uma geração sustentável de renda futura. O
programa GPA surgiu a partir de um projeto de pesquisa sobre os hábitos alimentares e
de plantio dos moradores da região, realizado por graduandos em Geografia pela UFFi,
com o apoio da PROEXii, que ao se depararem com a realidade local optaram por uma
ação que se adequasse à realidade local. A renda na região se concentra na bolsa
família, bolsa verde, aposentadorias ou fica resumida ao extrativismo. Além de sofrer
uma sazonalidade muito forte, o extrativismo não tem garantido certeza de sustento.
Outras atividades como extração de copaíba e castanha também pode gerar renda, mas
em uma escala muito reduzida. Uma variedade nos gêneros de plantio se faz necessário.
A dificuldade de obtenção de sementes era uma barreira para a garantia de uma
segurança alimentar. A dieta alimentar se resume: a farinha, uma variedade de frutas
(dependo da família) somadas finalmente à caça e pesca. O GPA começou a articular
com órgãos locais como a SEMAGRIiii, SEMEDiv, ICMBiov, entre outros na obtenção
destas sementes e mudas.
O contexto Histórico Várias são as teorias para a chegada desses grupos de negros que vieram a formar os
então Quilombos da região. Por relatos ouvidos nos campos que fizemos, muitos
falavam sobre a chegada dos quilombolas vindo do norte. Os próprios remanescentes de
quilombolas falavam que vinham de escravos oriundos das guianas inglesa, holandesa e
francesa de forma que esse movimento começou por volta de 200 anos atrás, quando o
processo de abolição começou no mundo. Porém originalmente os relatos científicos e a
literatura que tivemos acesso contam que os negros do Rio Trombetas vieram na
verdade refugiados de fazendas das áreas do entorno de Santarém e Alenquer. Somente
com a abolição concretizada, os então os ex-escravos foram capazes de se refugiar no
Trombetas num fluxo mais intenso, formando um dos maiores espaços físicos
conquistados e controlados por escravos fugitivos no Brasil. Por uma visão empírica,
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esses remanescentes ficaram isolados durante muito tempo, até a chegada do homem
branco. Os modos de vida tradicionais se manteriam por muito tempo estável e já num
equilíbrio relativo com a natureza, até o rompimento brutal dos seus costumes e cultura
tradicional. É fato que a mudança drástica constatada naquele território veio com a
criação das unidades de conservação (moradores sendo expulsos da margem esquerda
por causa da Reserva Biológica do Trombetas), com o crescimento urbano de Oriximiná
(como também dos outros centros urbanos no entorno) e claro e muito impactante, a
criação da Mineradora Rio do Norte (MRN). Porém, com literaturas adequadas,
constatamos que de forma legítima, eles são os verdadeiros herdeiros do território, e
assim devem ser tratados, como podemos ver nesse trecho: significa reconstruir momentos e situações ocorridos durante praticamente mais de dois séculos quando esses grupos, etnicamente identificados, estabeleceram, nesse hábitat, um complexo sistema de organização social articulando práticas econômicas e culturais que lhes são particulares. A reconfiguração de sua vida nesse espaço leva-os, hoje, a reconhecerem-se como filhos do Rio. (ACEVEDO 1998, CASTRO, 1998 – p.41 – “Negros do Trombetas”)
Objetivos principais e específicos O principal objetivo da equipe era de estabelecer unidades agrícolas experimentais
plenas com mais ou menos 25 agricultores da região, marcando com GPS toda a
unidade experimental. Além disso, após a implantação dos SAFs, nossa equipe fez um
croqui em papel milimetrado, que dava a posição de cada plântula. Estes agricultores
contemplados integravam quatro comunidades diferentes do território quilombola Mãe
Domingas, sendo elas: Abuí, Paraná do Abuí, Tapagem, Mãe-Cué. Além delas, atuamos
também na comunidade de Cachoeira Porteira. Todas essas localizadas no entorno do
Rio Trombetas. Nossa equipe buscou explicar a importância dos SAFs para o ambiente
amazônico, fatos como: enriquecimentos das capoeiras, diminuição das queimadas e dos
desmatamentos, além de claro, trazer uma variedade de alimentos para os quilombolas
vencerem o problema crônico da fome endêmica e garantir assim a almejada segurança
alimentar. O estimulo e assessoria técnica para os comunitários produzirem mudas
também era um objetivo da equipe. Outro fato proposto era o de encararmos a ação
como uma grande chance de aprender as técnicas e culturas quilombolas. Estimular uma
troca empírica de saberes era algo importante para o sucesso de nossa ação.
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Metodologia Preparando as terras onde seriam realizados os plantios das mudas, entendemos que a
não utilização de queimadas era uma prioridade do GPA, pois a quebra desse paradigma
de certa forma evitava que queimadas se devastassem pela região. Era pra muitos a
descoberta de uma nova técnica de se fazer roçado, limpando o terreno através da
brocagem de matos e arbustos. Dentre as espécies retiradas ou cortadas podemos citar o
grande número de embaúbas, tiririca, rabo-de-camaleão e curuminzeiros (situados nas
árvores médias), típicos de capoeiras previamente já queimadas. Durante o roçado
vimos que o agricultor era capaz de entender que esse mato em decomposição iria servir
de adubo para o solo e para o processo contínuo do plantio. Encontramos dificuldades,
pois muitos não estavam disponíveis na hora que precisávamos, já que tinham que
caçar, pescar ou ir à cidade em busca de cestas básicas dadas pela prefeitura de
Oriximiná. O trabalho coletivo (puxirum / mutirão) veio a suprir, em parte, esse tempo
perdido pelas dificuldades citadas anteriormente. Com relação direta às nossas
aplicações do SAF, com apoio dado da UAJVvi e a PROEX conseguimos segurança,
eficiência e um caráter técnico nas nossas ações. Após cadastro dos agricultores, num
campo anterior que serviu só pra isso, chegávamos já no campo do plantio, com o
terreno já demarcado e escolhido. Roçando essa área, então preparávamos o terreno para
o SAF. Em sua maioria, as unidades agrícolas tinham 25m x 25m, com espaçamento de
5 metros entre as mudas de cupuaçu. Depois de fixada ao chão, essa muda tinha sua
altura medida, além de calcular também o diâmetro do seu caule (DAPvii). Em terrenos
de 25mx25m, cinco pontos eram marcados no GPS identificando esse quadrado na
precisão necessária para o satélite. Em terreno de 50m x 50m nós marcávamos então
nove pontos, seguindo a precisão necessária que o satélite demandava. Como relação
aos métodos de segurança, todos estavam equipados e munidos com galochas, luvas e
terçados (facão). Além disso, para plantio tínhamos a Draga (boca de lobo), enxadas,
trenas (para medição), caixotes e dois botes com motores rabetas para transporte entre
outros acessórios importantes. Em matéria de metodologia, muitos estudantes atuam na
extensão, e sentem a necessidade de apoio, capacitação e acompanhamento para
elaboração de projetos de extensão com mais qualidade, em termos de metodologia
científica, metodologia de ensino-aprendizagem, de investigação ou de comunicação. A
metodologia apropriada para extensão que utilizamos é, necessariamente, diversificada,
em virtude de sua articulação com aspectos investigativos, educativos, comunicativos
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da região Amazônica. A metodologia da pesquisa-ação (THIOLLENT, 2005) objetiva
contribuir para questões relacionadas à aplicação de conhecimento, intercâmbio entre
saberes, sobretudo empíricos, como do povo quilombola, abordagem de comunicação e
linguagem contribuindo assim para a troca de saberes entre nós extensionistas e os
comunitários quilombolas ou ribeirinhos da região do Alto Trombetas.
Justificativa
Os produtos florestais não madeireiros denominados produtos naturais têm sido apresentados na mídia como oportunidade de negócio. O termo é conceituado como segmento do mercado que reúne produtos e serviços que se propõe a solucionar problemas ambientais. Com esse objetivo utilizam métodos mais racionais de exploração e manejo dos recursos naturais para bens e serviços. Do ponto de vista dessa conceituação, fala-se também em econegócios, isto é, uma atividade econômica baseada na utilização de recursos de biodiversidade para o desenvolvimento de produtos e serviços com valor agregado para os mercados local, nacional e internacional (PRESSLER p.161).
Fundamentado nas prerrogativas para gerar renda para as comunidades de uma maneira
que mantenha a biodiversidade local e os modos de vida tradicionais, junto às novas
possibilidades de mercado, os chamados “econegócios” aparecem como um contraponto
às atividades que degradem o espaço para a obtenção de renda. Essas alternativas então
devem ser iniciadas, articuladas e fundamentadas junto aos comunitários, demonstrando
reais possibilidades de beneficiamento de produtos com todos os “porquês” de sua
aplicação para que haja uma real aceitação das ações de extensão. A execução deste tipo
de ação se enquadra no ambiente de trabalho devido a uma forte pressão existente por
parte de mineradoras, madeireiras e empreiteiras, que buscam uma utilização predatória
do espaço, não se importando com a fragilidade do ambiente florestal e das
comunidades tradicionais. Por isso a justificativa para a execução desta ação se torna
primordialmente a vontade dos próprios comunitários de manterem seus hábitos e
cultura sem que tenham que perder seu ambiente natural.
Desenvolvimento Sistema Agro Florestal (SAF)
Os SAFs são formas de uso e manejo da terra, nos quais árvores ou arbustos são utilizados em associação com cultivos agrícolas e/ou com animais, em uma mesma área, de maneira simultânea ou em uma seqüência temporal. (VIANA, DUBOIS e ANTHONY, 1996).
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Possuem uma grande semelhança com os ecossistemas naturais, apresentando uma elevada biodiversidade, complexa estrutura e grande acúmulo de biomassa gerada. Exploram a relação ecológica entre plantas e animais, preservam o solo através da ciclagem de nutrientes e combatem a erosão, aproveitam melhor a radiação solar e não necessitam de adubos químicos (AMADOR, 2003; COSTA, 2008; DANTAS, 1994; VAZ 2002).
Os SAFs então se enquadram perfeitamente com a justificativa da ação, pois auxiliam
na manutenção do ambiente sem comprometer a capacidade produtiva do sistema. As
mudas mais frágeis necessitam das sombras geradas pela capoeira para as fases iniciais
de seu desenvolvimento (e isso foi observado pela equipe) e os nutrientes são postos no
sistema pelas podas e manutenção das próprias capoeiras, garantindo a não necessidade
de queimadas. A utilização das unidades experimentais em forma de pequenos sistemas
agroflorestais de plantio consorciado priorizou o cupuaçu como espécie principal devido
aos produtos que podem ser gerados pelo mesmo e pelas características de espécie
secundária (necessidade de sombreamento) que ajudam na preservação da própria
floresta. As outras espécies consorciadas têm uma maior funcionalidade de garantia da
segurança alimentar sejam gêneros de plantio ou espécies arbóreas. Porém no que se diz
respeito à produção de farinha para consumo foi preconizado pelo grupo uma
manutenção dos hábitos antigos de plantio, para que qualquer erro não comprometesse
ainda mais a segurança alimentar que já é frágil na região.
O porquê de sua aplicação especificamente em solo amazônico. Os solos amazônicos têm uma grande necessidade de manutenção de matéria orgânica
para garantir sua fertilidade, devido a pouca capacidade de recursos minerais pré-
existente na bacia amazônica, como podemos ver nessa citação:
São comuns Latossolos Amarelos (Latossolos Amarelos Distrocoesos) e Podzólicos Amarelos (Argissolos Amarelos), ambos álicos (alta saturação por Al), pobres em Fe e de baixíssima capacidade de troca catiônica.... (RESENDE, p-175). Os latossolos e Podzólicos (Argissolos) são tipicamente cauliníticos e goethíticos e possuem um horizonte A delgado. A riqueza química encontra-se ligada a vegetação (fitossela). A queima faz aumentar temporariamente o teor de nutriente na superfície; as colheitas decrescem a níveis não compensadores a partir do terceiro ano (RESENDE, p-175).
Sendo assim, os sistemas agroflorestais encontram justificativa relevante para a sua
aplicação em solos amazônicos devido à fragilidade do próprio sistema perante a
realização de queimadas para a função da agricultura. Com exceção da terra preta de
índioviii, a maioria dos solos amazônicos necessita da ciclagem do material orgânico
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para a riqueza do solo agricultável. Porém até hoje, mesmo com muitos estudos é difícil
entender sua existência, mas um ponto em comum é indiscutível; esse tipo de solo tem
influência antropogênica.
Resultados esperados com o SAF Os resultados almejados pela equipe eram de que todas as unidades agrícolas
experimentais fossem implantadas de forma profissional e eficiente. A aceitação da
idéia dos SAFs pela comunidade também era um dos objetivos primordiais. Ao fim do
longo plantio, a equipe esperava também se reunir com os comunitários e estimulá-los a
entrar no processo de compra da merenda escolar por parte da prefeitura de Oriximiná,
pois segundo os as normas do PNAE e do PRONAF cerca de 80% da alimentação das
escolas municipais (em cidades mais urbanas essa cota é de 30%) tem que vir de
agricultores locais do município. Então, aliado aos novos plantios de SAFs realizados
na região, essa reunião (que aconteceu dia 07/05/2011) buscaria auxiliar a organizar os
agricultores em torno dessa questão da merenda escola, estimulando o cooperativismo e
buscando assim uma alimentação mais rica para os estudantes e um beneficiamento
futuro dos agricultores locais.
A escolha de espécies A escolha das espécies varia de acordo com a possibilidade de obtenção e com o
interesse de cada comunitário. Foram realizadas entrevistas com os participantes e o
arranjo de espécies foi feito para atender a necessidade dos comunitários. Também foi
debatido a possibilidade de comercialização desses produtos já almejando uma futura
comercialização não só dos derivados de cupuaçu, mas de outros gêneros como a
graviola, o açaí e a bacaba. Esse fato mostra como essas frutas da Amazônia hoje fazem
parte do cotidiano de muitos, como vemos nessa citação: Os enunciados referentes na Amazônia na mídia mundial também chamaram a atenção para diversos frutos regionais denominados produtos florestais não madeireiros, como guaraná, cupuaçu, pupunha, bacuri, açaí, entre outros. Os enunciados a exposição na mídia provocaram um aumento considerável de demanda e consumo por esses produtos. Nesse contexto, a partir da década de 1990, com a pressão internacional para preservação da Amazônia esses produtos florestais não madeireiros ganharam visibilidade como alternativa para evitar desmatamentos e queimadas. Em decorrência dessa nova demanda houve um crescimento no mercado nacional e, posteriormente, esses produtos atraíram o interesse do mercado internacional (EMBRAPA, 2008).
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Diante desse fato, as ações do GPA mostraram às comunidades tradicionais uma nova
realidade para obtenção de renda, das ricas frutas da Amazônia.
O Cupuaçu devido as suas capacidades de beneficiamento e pelas características de
crescimento rápido e produtividade foi escolhido como espécie principal das unidades
experimentais de plantio consorciado. Do cupuaçu derivam três subprodutos principais:
a polpa de fruta, o “cupulate” (espécies de chocolate feito a partir das sementes, popular
na região) e a venda da própria casca para a indústria de cosméticos, sendo uma ótima
fonte para fundamentação de um econegócio.
Resultados obtidos Os resultados obtidos superaram as expectativas. Todas as cinco comunidades do
território Mãe Domingas fora alcançado com sucesso. Ao todo foram 25 agricultores
envolvidos em 2011 e 18 em 2012, chegando a 43 agricultores no projeto. Em uma
contagem aproximada de cerca de 3750 mudas plantadas nos anos de 2011 e 2012 em
solo amazônico. Sendo a maioria espécies de cupuaçu (principal foco de análise),
espécies como graviola, itaperibá, tangerina, laranja, maracujá, jabuticaba, noni, açaí,
abacate, jambo, bacaba, itaúba e cacau. Desse total recebemos doações da SEMAGRI e
ICMIBio, e outras compradas com recursos da PROEX/UFF. Além disso, conseguimos
com novas técnicas, medir cada espécie de cupuaçu, além de medir seu caule.
Resultando em mapas (croquis) localizando cada plântula. Uma planilha organizada
também foi confeccionada onde guardamos todos esses dados para análise de
comparação posterior.
Análise espacial da Região O domínio morfoclimático da região O domínio morfoclimático: “Amazônia”; é o maior domínio morfoclimático do Brasil,
com 4,2 milhões km² de extensão territorial, que é 60% de todo o território nacional.
Este domínio abrange os Estados do Amazonas, Amapá, Acre, Pará, Maranhão,
Rondônia, Roraima, Tocantins e Mato Grosso. Como falamos anteriormente, esse
domínio em geral possui solos pobres, raros, sujeitos ao desgaste da água (lixiviação),
algumas vezes muito ricos em alumínio, como ricos em ferro, gerando a exploração
mineral. Existem basicamente duas estações na região, as de enchente (chuvas
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constantes, empiricamente chamadas de “inverno”, devido a uma temperatura mais
amena, controlada pela água e seu alto calor específico) e as de vazante (poucas chuvas,
empiricamente chamado de “verão”, devido à ausência de nuvens e conseqüente calor).
Basicamente, o clima é classificado como: Equatorial quente e úmido e de grande
sazonalidade.“O imenso domínio amazônico se destaca pela extraordinária
continuidade de suas florestas, pela ordem de grandeza de sua principal rede
hidrográfica e pelas sutis variações de seus ecossistemas, em nível regional e de
altitude” (Ab’Sáber, 2003).
Figura I: Mapa do Estado do Pará, dando destaque para as unidades de conservação de proteção integral, os principais rios que cortam o estado, além das principais cidades.
Fonte: IBGE.
O Rio Trombetas e o imenso município de Oriximiná O Rio Trombetas é um dos principais afluentes do Rio Amazonas e se localiza
basicamente na região chamada de Amazônia Oriental. Tem em sua extensão um total
de aproximadamente 800 km, porém ele é navegável apenas por 260 km, ou seja, da sua
foz até o local conhecido como Cachoeira Porteira, onde o GPA atua. Nesse ponto do
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rio por acaso é onde o seu principal afluente, o Rio Mapuera, o encontra. Oriximiná se
localiza na jusante do Trombetas, e claro é sempre relacionada a esse rio na região. É
fato que além de Oriximiná, nos tempos atuais, a cidade da mineração, ou Porto
Trombetas é também lembrada pela atuação nesse rio, com toda a produção mineral da
MRN. (Ver Figura I)
MRN - Mineradora Rio do Norte Criada oficialmente em 1979, a Mineradora Rio do Norte, essencialmente mudou a cara
da região do Rio Trombetas. Para ter a real noção de sua dimensão, numa localização
acima do centro urbano do município de Oriximiná, a mineradora foi capaz de criar uma
“cidade da mineração” como é popularmente chamada, ou simplesmente Porto
Trombetas, que hoje além de bem estruturado, tem até pontes aéreas entre as cidades de
Manaus, Santarém, Belém, etc. Por experiências de campo, pudemos perceber que a
MRN tem certos compromissos com o meio ambiente, de produção de mudas,
obrigações com o meio ambiente, além de ser vistoriado ou vigiado pelo órgão ICMBio,
criado em 2002 a partir do IBAMA em convênio com o ministério do Meio Ambiente.
É importante ressaltar que uma parte das mudas doadas para o GPA veio da MRN.
Figura II: Mapa temático de todas as comunidades quilombolas do alto Trombetas (em azul) onde atua o programa de extensão Geografia da Produção Alimentar.
Fonte: GPA
Floresta Nacional (FLONA) Saracá-Taquera
A Floresta Nacional (FLONA) Saracá-Taquera foi criada pelo decreto nº 98.704 em 27
de dezembro de 1989. É uma unidade de uso sustentável que prevê a sua conservação
direta, além de promover o devido direito das remanescentes quilombolas do uso
extrativismo de suas terras. É uma área onde foi observado o desenvolvimento de
projetos e pesquisas como o nosso, entre outras atividades. A mata ciliar chama a
atenção nessa onde muitos consideram ser uma das mais altas já encontradas, além de
possuir altos índices de biodiversidade em suas fauna e flora. A unidade de conservação
engloba territórios quilombolas e faz limites com a Reserva Biológica do Trombetas,
FLOTA de Faro e o Território Indígena Trombetas-Mapuera, que juntos fazem parte de
um corredor ecológico que muitos falam pertencer a calha norte, uma espécie de
corredor ecológico que vai do extremo noroeste do Brasil até o oceano Atlântico. A
FLONA Saracá-Taquera basicamente se encontra na margem direita do rio Trombetas.
Figura 3: Mapa detalhado das unidades de conservação e território indígenas da região do Trombetas. A malha urbana, as estradas “hídricas” e limites quilombolas.
Fonte: Imazn.
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O Avanço de outras culturas e a anunciada extinção da cultura Quilombola É claro e evidente que a modernização causa uma série de impactos aos povos em todo
o globo terrestre, porém em alguns casos constata-se o que nós do GPA gostamos de
chamar de etnocídio. O avanço de outras culturas diante dos remanescentes de
quilombolas é grave. Muitas de suas histórias, costumes, lendas, ou seja, sua rica cultura
está sendo perdida a cada ano que passa, e podemos constatar isso nos campos
realizados. Com o crescimento urbano de Oriximiná, acompanhando claro, o Brasil, nós
do GPA temos percebido um grande êxodo rural na região, já que os pequenos não mais
se interessam pelos modos sustentáveis e tradicionais de viver dos antigos (exatamente
como acontece com os índios). Para nós é aí que entra a troca de saberes, onde tentamos
entender sua cultura, datando histórias e tentando assim passar de modo positivo, o
quanto é admirável esse modo de vida, levando muitos a repensar e valorizar o que eles
têm nas mãos. Esse trecho mostra o que hoje infelizmente está sendo deixado de lado:
Tempo de festa, tempo de cheias, tempo da castanha - era este o tempo da fuga. Os escravos buscavam o rio, à noite, em canoas tomavam os furos, os igarapés, passando de um lago a outro. Pelos paranãs varavam de um braço a outro do rio. Adentravam pelo Amazonas, subiam para as cabeceiras de seus afluentes da margem esquerda, onde se estabeleciam acima das primeiras corredeiras e cachoeiras, as "águas bravas", interpondo assim, obstáculos naturais entre eles e seus perseguidores. (Comunidades Remanescentes dos Mocambos do Alto Trombetas, FUNES, 2000)
Considerações Finais No “II curso de capacitação dos professores de técnicas agrícolas” podemos perceber a
importância da introdução dos SAFs (Sistema Agro-Florestais) e do nosso programa nas
comunidades quilombolas da FLONA Sacará-Taquera (ver Figura II). Além de
caminhar para a garantia da segurança alimentar das comunidades, diversificando sua
alimentação, esse fato inspirou certamente o povo quilombola a acreditar que são
possíveis outras fontes de renda. Como efeito positivo e paralelo, se obtém assim a
conservação de certos recursos naturais chaves do bioma amazônico. A extração ilegal
de madeiras e a caça predatória na região ficariam assim em segundo plano. Como fora
introduzido no referente curso, no processo de criação da MRN na década de 1970 a
população de tartarugas, por exemplo, foi dizimada já que muitos quilombolas viram
nelas e nas madeiras ilegais uma forma rápida, porém não correta de obter fonte de
renda. Foi algo tão grave na região, que juntamente com a inauguração da MRN em
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1979, o governo viu a necessidade de salvar a região, e no mesmo ano de sua
inauguração a ReBio do Trombetas foi criada. (Ver Figura III). A rica cultura
quilombola se vê hoje refém dos grandes centros urbanos. Um forte exemplo disso é a
proximidade da comunidade de “Boa Vista” com a cidade da mineração (Porto
Trombetas). A MRN trouxe o capital para os quilombos próximos e isso contribui
aceleradamente para a sobreposição de culturas urbanas sobre modos de vida
tradicional. Refletindo sobre o assunto percebemos a enorme importância do programa
de extensão da UFF Geografia da Produção Alimentar (GPA) em tal território.
Consideramos todas as ações do GPA um sucesso, pelo fato da boa aceitação das
comunidades quilombolas da região. Podemos destacar a importância da continuidade
dos projetos de extensão no trabalho com comunidades tradicionais. Temos orgulho em
saber que o nome da UFF, juntamente com a PROEX e a UAJV foi levado de forma
profissional e positivo na área. A aceitação por parte de toda população da área foi um
quesito importante, que dá notoriedade a nossa instituição, além de inspirar discentes e
docentes para projetos futuros na área. Para nós do curso Geografia, entendemos essa
extensão como fundamental para o graduando, pois leva todas as teorias da sala de aula
para a prática extensiva nesse campo tão fértil que é a Amazônia, assim validando o uso
da metodologia de pesquisa-ação e o compromisso e respeito que temos pelos
verdadeiros guardiões da floresta.
Notas i UFF – Universidade Federal Fluminense ii PROEX – Pró Reitoria de Extensão da Universidade Federal Fluminense iii SEMAGRI – Secretaria Municipal de Agricultura iv SEMED – Secretaria Municipal de Educação v ICMBio – Instituto Chico Mendes da Conservação da Biodiversidade vi UAJV – Unidade Avançada José Veríssimo (Campus avançado da Universidade Federal Fluminense) vii DAP – Diâmetro da Altura do Peito viii Terra Preta de Índio: “Dados mais recentes apontam que a TPA teria origem antrópica, ou seja, seria resultado de antigos assentamentos indígenas. As evidências da passagem do ser humano por essas áreas são os próprios elementos que faziam parte do cotidiano dos povos pré-históricos da Amazônia. A matéria orgânica que formou a TPA é composta principalmente por folhas que serviam para a cobertura de casas, além de sementes, cipós e restos de animais (ossos, carapaças, conchas, fezes, urina, etc.).” (Kern, 1986, Museu Paraense Emílio Goeldi). Referências MMA - MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. “Plano de manejo da Floresta nacional de Sacará-Taquera, estado do Pará – Brasil”. Curitiba, dezembro de 2001.
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BOLLE, Willi; CASTRO, Edna; VEJMELKA, Marcel (Orgs.). Amazônia - região universal e teatro do mundo. São Paulo: Globo, 2010. ACEVEDO, Rosa & CASTRO, Edna. “Negros do Trombetas: guardiães de matas e rios”. Cejup/UFPA-NAEA. Belém, 1998. O’DWYER, Eliane Cantarino. “Remanescentes de Quilombos na Fronteira Amazônica: A etnicidade como instrumento de luta pela terra.” Departamento de Antropologia, ICHF-UFF. Rio de Janeiro, 1993. RESENDE, Mauro; CURI, Nilton; REZENDE, Sérvulo Batista; CORRÊA, Gilberto Fernandes. Pedologia: Base para distinção de ambientes. 5ª edição. Viçosa: NEPUT, 1995. FUNES, Eurípides Antonio. “Comunidades Remanescentes dos Mocambos do Alto Trombetas”. Dep. de História, UFC. Fortaleza, 2000. THIOLLENT, M. Metodologia da Pesquisa-Ação nas Organizações. 6ª edição Ed. Cortez. São Paulo, 1994. THIOLLENT, M. Pesquisa-Ação nas Organizações. Ed. Atlas. São Paulo, 1997.