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Exmo. Senhor

Presidente da Câmara Municipal do Porto

Dr. Rui de Carvalho de Araújo Moreira

Lisboa, 27 de Outubro de 2017

Assunto: Reconhecimento da Confeitaria Cunha como Património Arquitectónico de Interesse

Municipal.

Na qualidade de Arquitectos e Historiadores da obra da dupla de arquitectos Victor Palla

(1922-2006) e Joaquim Bento d’Almeida (1918-1997), vimos por este meio solicitar a Vossa

Excelência a atenção para o facto de se encontrar em perigo de despejo e consequente fecho a

Confeitaria Cunha, localizada na Rua de Sá da Bandeira 676, no Porto.

Contactados pelo atual proprietário da Confeitaria Cunha, o Sr. Fernando Ferraz, tivemos

conhecimento que a empresa senhoria da fração onde está situada a Confeitaria Cunha,

EMPORIUM 658 - INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS LDA, manifestou “oposição à renovação do

referido contrato de arrendamento no termo do prazo, 30 de Abril de 2018” (ver Anexo 1).

A Confeitaria Cunha (ver Anexo 2) corresponde ao culminar de mais de três dezenas de

projetos de snack-bares elaborados pelos arquitectos Victor Palla e Bento d’Almeida, pioneiros

na introdução deste modelo de restaurante em Portugal. Nos dias de hoje, destas três dezenas

de projetos, o Snack-Bar Galeto (1966-1968), localizado em Lisboa, e a Confeitaria Cunha

(1970-1973), localizada no Porto, são os únicos que resistiram ao passar dos anos, tornando-se

assim peças-chave no panorama da História da Arquitectura Portuguesa. Deste modo, o Snack-

Bar Galeto foi recentemente abrangido pelo Programa Lojas com História (2017).

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O projeto da Confeitaria Cunha (ver Anexo 3), executado com a colaboração do então jovem

arquitecto João Bento d’Almeida (1947-1997), à data do seu licenciamento (1972) englobava

as áreas de charcutaria, pastelaria e snack-bar. A constante adesão que se fez sentir durante a

década de 1970, levou à sua ampliação em 1980, dando-se preferência ao serviço de

restaurante em mesas, mantendo o ambiente original, tão particular no cenário da

Arquitectura Portuense.

A particularidade da Confeitaria Cunha recai no caracter experimental da obra arquitectónica.

A cultura do cinema instalara-se em Portugal despois da Segunda Guerra Mundial e imagens

de snack-bares introduzidas nas “películas” estrangeiras motivavam um novo leque de clientes

que, procurando vivenciar ambientes iguais aos que viam nos grandes écrans, solicitavam

estabelecimentos semelhantes no nosso país. À semelhança do que já se construía na capital,

esta dupla de arquitectos vai oferecer a possibilidade dos habitantes da cidade do Porto

experimentarem, na zona da Baixa, um ambiente moderno. Tratou-se de conjugar um serviço

rápido ao longo de um reticulado balcão de madeira, com um serviço compartimentado de

mesas e bancos fixos, que nos remete para os diners americanos. Aqui, a criação de encostos

altos vai produzir um sistema de divisórias que diferenciam mesas, convidando os clientes a

um ambiente mais reservado do que o movimentado balcão, onde o cliente anónimo se senta

ao lado de um desconhecido.

A inexistência no mercado português de mobiliário e acessórios modernos específicos deste

tipo de estabelecimento de restauração motivou, mais uma vez, os arquitectos a desenhar e

mandar construir em carpinteiros e serralheiros locais grande parte das peças necessárias ao

apetrechamento da Confeitaria Cunha. Conforme testemunhou o primeiro proprietário,

Valdemar Bonito, a execução da cadeira-de-balcão, alta, rotativa e fixada a um embasamento

de pedra que diferencia os pavimentos do snack-bar, levou a um estudo aturado do protótipo

por parte dos arquitectos. Para além desta particular peça de mobiliário, Victor Palla e Bento

d’Almeida desenharam ainda as mesas (com prateleira amovível), balcões, inúmeros

candeeiros e os suportes para colocação das ementas, cujo desenho gráfico é atribuído a João

Bento d’Almeida.

Caracterizadas pelo uso de alcatifa, napa, acrílico, madeiras e latão, as salas do “Snack-Bar”

(1973) e “Restaurante” (1980) da Confeitaria Cunha dialogam com um painel de azulejos de

Francisco Relógio (1926-1997). O projeto foi trabalhado como uma Obra de Arte Total. A

modernidade do estabelecimento alcançou aquilo que hoje designamos por “imagem de

marca”. A pormenorização do mobiliário e o desenho do grafismo demonstram que o domínio

deste atelier vai muito além da arquitectura.

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Neste momento, as salas do “Snack-Bar” e do “Restaurante” mantém-se iguais à data da

inauguração, justificando a sua preservação para memória e vivência futura.

Reconhecendo a importância e particularidade da obra, a Confeitaria Cunha foi integrada no

Inquérito à Arquitectura do Século XX em Portugal (Ficha Nº N101006), iniciativa da Ordem dos

Arquitectos em parceria com a Fundació Mies van der Rohe e o Instituto das Artes,

cofinanciada pelo Interreg III – SUDOE, que teve como objetivo registar numa base de dados

digital o levantamento do Património Arquitectónico construído em Portugal durante o século

XX.

Recentemente, esta obra foi destacada na exposição “Victor Palla e Bento d’Almeida.

Arquitetura de outro tempo”, patente na Garagem-Sul do Centro Cultural de Belém (11 de

Abril a 18 de Junho, 2017), comissariada por Patrícia Bento d’Almeida e João Palla Martins.

Local de eleição para inúmeros clientes anónimos e figuras públicas do nosso país e do

estrangeiro, a Confeitaria Cunha tem sido alvo de divulgação em múltiplas publicações (ver

Anexo 4).

Nestas circunstâncias, atendendo ao carácter de urgência a que a situação obriga, vimos por

este meio solicitar o reconhecimento da Confeitaria Cunha como Património de Interesse

Municipal a fim de evitar o seu encerramento.

Com os nosso cordiais cumprimentos,

João Palla Martins Arquitecto Doutor em Ciências da Arte pela FBAUL joaopalla@gmail.com

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ANEXO 1 – Oposição da EMPORIUM 658 - INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS LDA à renovação

do contrato de arrendamento da fração onde está localizada a Confeitaria Cunha.

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ANEXO 2 – Levantamento Fotográfico da autoria de Arménio Teixeira

(©Arménio Teixeira, Centro Cultural de Belém)

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ANEXO 3 – Desenhos Técnicos (Arquivo Câmara Municipal do Porto)

Ref. LO-1972-0157-0018

Ref. LO-1980-0028-0039

Ref. LO-1980-0028-0107

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ANEXO 4 – Principais Referências à Confeitaria Cunha

I. MEDIA:

JORNAL DE NEGÓCIOS, Lúcia Crespo “Patrícia Bento d’Almeida: Lisboa é uma manta de

retalhos urbanística” (28-07-2017). In

http://www.jornaldenegocios.pt/weekend/detalhe/patricia-bento-dalmeida-lisboa-e-uma-

manta-de-retalhos-urbanistica

SÁBADO, Diogo Barreto “Primeira mostra dos arquitectos Victor Palla e Bento d'Almeida no

CCB” (12-04-2017). In http://www.sabado.pt/gps/palco-plateia/artes-plasticas/detalhe/victor-

palla-e-bento-dalmeida---arquitectos-de-outro-tempo

VISÃO, Cláudia Marques Santos “Victor Palla e Joaquim Bento d'Almeida: Arquitetos de outro

tempo” (20-04-2017). In http://visao.sapo.pt/actualidade/visaose7e/ver/2017-04-20-Victor-

Palla-e-Joaquim-Bento-dAlmeida-Arquitetos-de-outro-tempo

TIME-OUT, Catarina Moura “Os snack-bares mais modernos de Lisboa nos anos 50 e 60” (12-

04-2017). In https://www.timeout.pt/lisboa/pt/arte/os-snack-bars-mais-modernos-de-lisboa-

nos-anos-50-e-60

PÚBLICO, Isabel Salema em “A arquitectura alegre” (20-04-2017). In

https://www.publico.pt/2017/04/20/culturaipsilon/noticia/a-arquitectura-alegre-1769208

GUIA DN, GRAMA, João em “Derretidos por uma francesinha” (2/12/2005)

DIÁRIO DE NOTÍCIAS, LOBO, Paula em “Victor Palla despede-se da cidade que fotografou”

(30/04/2006)

PÚBLICO, RALHA, Diana em “’Snack-Bar’ Ritz, um ‘ex libris’ dos anos 70, fechou as portas”

(27/09/2004)

SIC-NOTÍCIAS, “Cartaz Cultural” (Maio 2017)

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TSF, José Carlos Barreto “Encontros com o Património: Victor Palla e Bento d'Almeida,

Arquitetura de Outro Tempo” (17-04-2017). In http://www.tsf.pt/cultura/interior/victor-palla-

e-bento-dalmeida-arquitetura-de-outro-tempo-6224543.html

II. BIBLIOGRAFIA:

COLAÇO, Isabel; DIAS, Manuel Graça (Programa); FELDMAN, Edgar (Realização) (1994). Victor

Palla. Magazine de Artes Visuais, Arquivo RTP.

D’ALMEIDA, Patrícia Bento; MARTINS, João Palla (coord. científica) (2017) Victor Palla e Bento

d’Almeida. Arquitectura de outro tempo. Lisboa: Caleidoscópio Edição. ISBN: 978-989-658-413-

9.

D’ALMEIDA, Patrícia (2007) “Victor Palla e Bento d’Almeida. Obras e Projectos de um Atelier de

Arquitectura, 1946-1973”. Dissertação de Mestrado em História da Arte apresentado à

Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.

MARTINS, João Palla (2012) O Lugar do desenho na Obra de Victor Palla. Tese de

Doutoramento em Ciências da Arte apresentada à Faculdade de Belas Artes de Lisboa da

Universidade de Lisboa.

MARTINS, João Palla (2007) Victor Palla (1922-2006). Um levantamento crítico. Dissertação de

Mestrado em Design e Cultura Visual apresentada ao Instituto de Artes Visuais Design e

Marketing.

TOSTÕES, Ana (Junho 2006) “Homenagem a Victor Palla. Um criador multifacetado”,

Arquitectura e Vida. Lisboa, Nº 72.

III. CINEMA

GROSS, Larry (argumento); KLINGER, Gabe (realização) (). Porto: A insuficiente Carta de Amor à

Invicta.