EXCELENTÍSSIMA SENHORA JUÍZA DE DIREITO DA COMARCA DE … · agir de um lado, vincular-se à...

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS 2 a Promotor/a de Justiça de Minaçu EXCELENTÍSSIMA SENHORA_ JUÍZA DE DIREITO DA COMARCA DE MINAÇU URGENTE IDOSO f LEI n.° 11.741 r . r _ rr . pUERENTE ; MINISTÉRIO PUBI ECO DP F^Tfi = JOGE PEREIRA PINTO - Rn" REQUERIDO : EANCO ITAU S/A O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, por intermédio do Promotor de Justiça infrafirmado, titular da 2* Promotoria de Justiça de Minaçu, com fulcro nos artigos 5°, inciso XXXII, 127, caput e 129, inciso III, todos da Constituição da República, nas disposições do Código de Defesa do Consumidor e no Código de Processo Civil, ajuíza a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA com pedido de liminar em face do BANCO ITAÚ S.A, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob 60.701.190/0001-04, com sede na Praça Alfredo Egydio de Souza Aranha, 100, Torre Itaúsa, Parque Jabaguara, CEP: 04344-902, São Paulo - SP, pelos fatos e fundamentos a seguir expostos: I - DOS FATOS No dia 23 do mês de setembro do corrente ano, compareceu na 2 a Promotoria de Justiça, a consumidora Rita Gomes Correia, narrando gue acerca de 28 anos atrás, fez um empréstimo junto ao Banco BEG, a ser descontado em débito automático. Segundo o narrado pela idosa, durante todos estes anos, o Banco vern resgatando todo o dinheiro de sua aposentadoria para saldar a dívida. Por diversas vezes a cliente tentou renegociar a dívida, contudo não consegue pagá-la, motivo pelo qual teve gue fazer novos empréstimos, aumentando ainda mais seu saldo devedor. O próprio Réu confirma que a idosa RITA GOMES, entrou em contato como Banco Itaú através da agência bancária situada neste município e reguereu algumas propostas de acordo para que pudesse quitar suas dívidas, porém, nenhuma proposta apresentada pelo Banco é satisfatória para a idosa,~pojs N o dinheiro de sua aposentadoria é muito pouco, o que dificulta o pagai "-"~ J ~ -j>>-^=—

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS2a Promotor/a de Justiça de Minaçu

EXCELENTÍSSIMA SENHORA_ JUÍZA DE DIREITO DA COMARCA DEMINAÇU

URGENTEIDOSO f LEI n.° 11.741 r.r_ rr.

pUERENTE ; MINISTÉRIO PUBI ECO DP F^Tfi= JOGE PEREIRA PINTO - Rn"

REQUERIDO : EANCO ITAU S/A

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, por intermédio doPromotor de Justiça infrafirmado, titular da 2* Promotoria de Justiça de Minaçu, comfulcro nos artigos 5°, inciso XXXII, 127, caput e 129, inciso III, todos da Constituição daRepública, nas disposições do Código de Defesa do Consumidor e no Código de ProcessoCivil, ajuíza a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICAcom pedido de liminar

em face do BANCO ITAÚ S.A, pessoa jurídica de direito privado, inscritano CNPJ sob n° 60.701.190/0001-04, com sede na Praça Alfredo Egydio de SouzaAranha, 100, Torre Itaúsa, Parque Jabaguara, CEP: 04344-902, São Paulo - SP, pelosfatos e fundamentos a seguir expostos:

I - DOS FATOS

No dia 23 do mês de setembro do corrente ano, compareceu na 2a

Promotoria de Justiça, a consumidora Rita Gomes Correia, narrando gue acerca de 28anos atrás, fez um empréstimo junto ao Banco BEG, a ser descontado em débitoautomático.

Segundo o narrado pela idosa, durante todos estes anos, o Banco vernresgatando todo o dinheiro de sua aposentadoria para saldar a dívida.

Por diversas vezes a cliente tentou renegociar a dívida, contudo nãoconsegue pagá-la, motivo pelo qual teve gue fazer novos empréstimos, aumentandoainda mais seu saldo devedor. O próprio Réu confirma que a idosa RITA GOMES, entrouem contato como Banco Itaú através da agência bancária situada neste município ereguereu algumas propostas de acordo para que pudesse quitar suas dívidas, porém,nenhuma proposta apresentada pelo Banco é satisfatória para a idosa,~pojsNo dinheiro desua aposentadoria é muito pouco, o que dificulta o pagai "-"~J~ -j>>-^=—

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A idosa reconhece que pegou dinheiro emprestado do Banco e é de suavontade saldar a dívida, todavia, as dificuldades financeiras, fato superveniente eimprevisível após a celebração dos contratos, e ainda, os juros excessivamente onerososcobrados pela instituição ré, impossibilitam o adimplernento do contrato, caracterizandoa verdadeira desigualdade entre o fornecedor e o consumidor.

Vale lembrar que todo o salário da aposentada está sendo retido pelainstituição financeira para o pagamento da divida, conforme demonstrado nos extratosbancários anexados, o que torna impossível suprir suas necessidades básicas, uma vezque o dinheiro de sua aposentadoria.

Diante dos fatos narrados pela consumidora, o Ministério Público do Estadode Goiás, com embasamento no artigo 129, incisos II, III e VI, da Constituição Federal, ecom alicerce no artigo 80 da Lei n» 8.625/93, combinado com o artigo 6°, inciso XX, daLei Complementar 75/93, expediu Recomendação ao réu (Recomendação n.° 18/2008),para abster-se de reter ou descontar qualquer valor relativo a salários e benefíciosprevidenciários, para amortizar eventuais débitos existentes com os clientes do Banco,em especial da idosa RITA GOMES CORREIA, e ainda, devolver aos clientes lesados, noprazo de 30 (trinta) dias, todos os valores retidos ou descontados ao arrepio da ordemjurídica, sobretudo os referentes a descontos de benefícios previdenciários.

Em resposta à recomendação, o réu Banco Itaú enviou a esta Prornotoriade Justiça, expediente aduzindo que verificou a natureza dos empréstimos feito à clientee apurou que os contratos realizados pela titular da conta são de Crediarios Automáticos,contratados no caixa eletrônico, com a utilização do cartão do titular e de sua senha deuso pessoal, o que consistiria na prévia e expressa manifestação da vontade daconsumidora, na contratação de empréstimos corn a instituição financeira.

O réu aduz, também, ser lícito o débito em conta corrente para opagamento de empréstimo, uma vez que a conta da qual a consumidora é titular édenominada "conta depósito" e tem como característica a livre movimentação por partedo cliente, sendo, inclusive, permitido que se contraia operações de empréstimos efinanciamentos. Outrossim, alega o réu que não há ato abusivo do banco ao prever nocontrato firmado o pagamento dos valores devidos mediante débito automático na contado correntista, ainda que nesta conta sejam colhidos créditos de salário, aposentadoriaou de qualquer outra natureza, pois esse procedimento resulta de um acordo devontades entre as partes, indo de acordo com os princípios basilares das obrigações econtratos, como o da autonomia da vontade privada, boa fé objetiva e o "pacta suntservanda".

Segundo o réu, o fato de a consumidora ter sido reconhecida comohipossuficiente pelo Código de Defesa do Consumidor não pode servir de fundamentopara que ela venha a se desobrigar das obrigações que foram avençadas a seu alvedrio,pois estaria a desconsiderar o "pacta sunt servanda".

Ocorre que, as assertivas lançadas pelo réu não merecem ser acolhidas,uma vez que é vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, aproveitar-se da fraquezaou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade e sua fragilidade financeira(condição social), para impingir-lhe seus serviços ou produtos, exigir do consumidorvantagem manifestamente excessiva e reter verbas de cunho salajiat-serrrautorizaçãolegal.

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E mais. O réu não observou a transparência nas relações contratuais, um

dos importantes princípios que deve ser observado pelas ̂ ^™^'*£*i ™dlsponlblllzar empréstimos no caixa eletrôníco, não mformou a idosa as «ntagen e osriscos do contrato, evidenciando, inclusive, os dispositivos que imputerresponsabilidades e penalidades do contrato realizado.

Diante desse esquadro fático, resta cristalina a agressão aos direitos dosconsumidores clientes do Banco Itaú, que sofrem com os abusos perpetrados pelo réu,que demite-se do gravíssimo encargo de tornar efetivos os direitos difusos e coletivos doconsumidores, o que indica a imperiosa necessidade do Judiciário, por intermédio desteinstrumento processual de tutela coletiva, resguardar os direitos dos consumidorescatalogados no CDC, como preceitua a Constituição da República.

A lesão aos direitos coletivos dos consumidores autoriza a defesa coletivaem juízo, porque o Ministério Público é parte legitimidade para aforar ação civil públicana tutela de direitos difusos e coletivos.

II - DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS

II.A) DA LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO

A Constituição da República apregoa que ao Ministério Público compete, noexercício de suas excelsas missões institucionais, a promoção de ação civil pública para aproteção de interesses difusos e coletivos, senão vejamos a redação do artigo 129, III,da Lei Fundamental:

"Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção dopatrimónio público e social, do meio ambiente e de outros interessesdifusos e coletivos".

Ern consonância com essa orientação, a Lei Orgânica do Ministério Público- Lei federal n.° 8.625/93 - assim estatui:

"Art. 25. Além das funções previstas nas Constituições Federal e Estadual,na Lei Orgânica e em outras leis, incumbe, ainda, ao Ministério Público:IV - promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei:a) para a proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio

ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico,estético, histórico, turístico e paisagístico, e a outros interessesdifusos, coletivos e individuais indisponíveis e homogéneos;

Com a introdução no sistema de direito positivo do Código de Defesa doConsumidor, que inaugurou uma nova fase na Jurisdição Coletiva, é indene de dúvidasque o Ministério Público é parte legítima para aforar ação civil pública com a finalidade detutelar direitos coletivos dos consumidores hipossuficientes. Esta é a exegese que seextrai do artigo 82, inciso II, do CDC.

Benjamin, MlnSío^SS^de " * «SS*™ Herman

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"A legitimação do Ministério Público e a ampliação das suas funções peloCódigo vem no esteio do estabelecido pela Lei da Ação Civil Publica e peloperfil que a Constituição de 1988 imprimiu à Instituição, sobretudo emrelação a sua independência e sua autonomia. O Ministério Publico, nestesentido, aparece tanto sob o aspecto criminal, como titular da açao penalpública quanto no âmbito civil, como órgão vocacionado a tutela dosinteresses coletivos. Nesse particular, a proteção do consumidor constituiinteresse indisponível, cabendo ao Ministério Público, como legitimado paraagir de um lado, vincular-se à proteção do consumidor, cuja presunção ede hipossuficiência, promovendo o equilíbrio na defesa judicial dos direitoslesados, e, de outro, contemplar os diversos consumidores lesados emdecorrência de uma dada conduta do fornecedor. A dimensão coletiva daatuação do Ministério Público: Segundo estabelece o CDC, a rigor oMinistério Público tem legitimação para interpor ação coletiva com o fim detutelar qualquer dos interesses e direitos contemplados no art. 81,parágrafo único. Para tanto, comunicam-se as normas do Código e da Leida Ação Civil Pública no que diz respeito aos procedimentos observadospara interposição da ação. A atuação do Ministério Público pode se dartanto no controle repressivo, a posteriori, com o objetivo de cominarsanção a violação de direitos dos consumidores por parte dos fornecedores,ou ainda o controle preventivo que, mesmo tendo sido vetado o dispositivoespecífico que autoriza o Ministério Público efetuar controle administrativodas cláusulas abusivas, não se pode desconsiderar que o CDC elenca comodireito básico do consumidor a prevenção de danos (art. 6°, VI),mantendo-se em vigor, de todo modo, o § 4° do art. 51, pelo qual oMinistério Público, mediante requerimento, é legítimo para provocar ocontrole judicial destas mesmas cláusulas. Neste sentido, a atuaçãopreventiva, em matéria de cláusulas abusivas ou qualquer outra lesão adireitos dos consumidores, encontra fundamento no Código. Para esseefeito o Ministério Público pode lançar mão dos diversos instrumentos quese encontram a disposição, tanto no Código quanto na Lei da Ação CivilPública e na sua legislação institucional, dentre os quais, o inquéritocivil" (Benjamin, António Herman V. et alii. Comentários ao Código deDefesa do Consumidor. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, oáq987).

A legitimação autónoma para a condução do processo do Ministério Públicodecorre inexoravelmente do direito fundamental previsto no artigo 5°, XXXII, daConstituição Federal, porquanto a instituição ministerial reveste-se dos atributosnecessários para perseguir a adequada tutela jurisdicional.

Com efeito, a situação retratada na vestibular indica desrespeito aosdireitos coletivos dos consumidores, nos moldes do artigo 81, parágrafo único, inciso II,do CDC, segundo o qual interesses ou direitos coletivos são ttos transindividuais denatureza indivisível, de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadasentre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base".

A defesa do consumidor é direito fundamental previsto no artigo 5°, incisoXXXII e principio da ordem económica consagrado no artigo 170, V, da Constituição daRepublica. Dentre desse contexto, a facilitação do acesso à Justiça estreito-básico doconsumidor (artigo 6°, VII e VIII, CDC), de sorte que a tutel.a.-cblitivV-d^rreJtps dos

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consumidores consiste no mais imortante instrumento ^acesso e efetivi d«e

m K a n i S moanCanne lê™ a segunda onda do movimento de acesso à Justiça refere-se a proteçao dosSe e ístr^^ndivlduais, fenómeno que surgiu com toda a ̂ '^^\^^evidência a absoluta falta de adequação dos velhos esquemas, ip cos da , tradici onalimposição individualista do processo civil, à tutela dos d.rertos cole ivos e :d, usos ; (Laprotección de los interesses colectivos o difusos. In XIII Jornadas iberoamencanas deDerecho Procesal. Ciudad Del México: UNAM, 1993, p. 245).

O cabimento da tutela coletiva, em demandas desta envergadura, encontraamparo no artigo 91 do Código de Defesa do Consumidor, segundo o qual oslegitimados de que trata o art. 82 poderão propor, em nome próprio e no interesse dasvítimas ou seus sucessores, ação civil coletiva de responsabilidade pelos danosindividualmente sofridos".

O Ministério Público é o órgão com vocação natural para a defesa coletivados consumidores, com legitimação expressamente prevista no artigo 82 do Código deDefesa do Consumidor.

Patente, portanto, que o Ministério Público é parte legítima para patrocinara defesa coletiva dos interesses difusos e coletivos dos consumidores lesados, comlegitimidade autónoma para a condução do processo.

II. B) DA LEGITIMIDADE PASSIVA

A legitimidade passiva do RÉU BANCO ITAÚ S. A. não apresenta grandesdificuldades, porquanto ele é o responsável pela prestação de serviço que causou oevento danoso à consumidora RITA GOMES CORREIA e aos demais clientes destainstituição financeira, uma vez que não observou os princípios da relação de consumo.

Conforme redação da cabeça do artigo 14 do CDC, "O fornecedor deserviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danoscausados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem comopor informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos".

É inegável o fato de que o réu BANCO ITAÚ S.A se enquadra perfeitamenteno conceito de fornecedor. Conforme estatui o artigo 3° do CDC, "fornecedor é todapessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entesdespersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criaçãoconstrução, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização dêprodutos ou prestação de serviços".

Conforme o parágrafo segundo do artigo 3° do CDC, "serviço é qualqueratividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as denatureza bancaria, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes de carátertrabalhista . O serviço prestado pelo réu BANCO ITAÚ S.A, çonsiste-fva atividade

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bancária, financeira, de crédito e securitáría, o que configura serviço apto a gerar relação

de consumo. Tr,bunal Federa| concluiu peia constitucional ida d e do § 2° doartigo 3° do CDC por ocasião do julgamento da ação direta de inconstitucionalidade n.2591, cuja ementa do acórdão é a seguinte:

EMENTA- CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR- ART. 5o, XXXII, DACB/88 ART 170 V, DA CB/88. INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. SUJEIÇÃODELAS AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, EXCLUÍDAS DE SUAABRANGÈNCIA A DEFINIÇÃO DO CUSTO DAS OPERAÇÕES ATIVAS E AREMUNERAÇÃO DAS OPERAÇÕES PASSIVAS PRATICADAS NA EXPLORAÇÃODA INTERMEDIAÇÃO DE DINHEIRO NA ECONOMIA [ART. 3°, § 2°CDC]. MOEDA E TAXA DE JUROS. DEVER-PODER DO BANCO CENTRAL DOBRASIL. SUJEIÇÃO AO CÓDIGO CIVIL. 1. As instituições financeiras estão,todas elas, alcançadas pela incidência das normas veiculadas pelo Códigode Defesa do Consumidor. 2. "Consumidor", para os efeitos do Código deDefesa do Consumidor, é toda pessoa física ou jurídica que utiliza, comodestinatário final, atividade bancária, financeira e de crédito. 3. O preceitoveiculado pelo art. 3°, § 2°, do Código de Defesa do Consumidor deve serinterpretado em coerência com a Constituição, o que importa em que ocusto das operações ativas e a remuneração das operações passivaspraticadas por instituições financeiras na exploração da intermediação dedinheiro na economia estejam excluídas da sua abrangência. 4. AoConselho Monetário Nacional incumbe a fixação, desde a perspectivamacroeconõmica, da taxa base de juros praticável no mercado financeiro.5. O Banco Central do Brasil está vinculado pelo dever-poder de fiscalizaras instituições financeiras, em especial na estipulação contratual das taxasde juros por elas praticadas no desempenho da intermediação de dinheirona economia. 6. Ação direta julgada improcedente, afastando-se a exegeseque submete às normas do Código de Defesa do Consumidor [Lei n.S.078/90] a definição do custo das operações ativas e da remuneração dasoperações passivas praticadas por instituições financeiras no desempenhoda intermediação de dinheiro na economia, sem prejuízo do controle, peloBanco Central do Brasil, e do controle e revisão, pelo Poder Judiciário, nostermos do disposto no Código Civil, em cada caso, de eventualabusividade, onerosidade excessiva ou outras distorções na composiçãocontratual da taxa de juros. ART. 192, DA CB/88. NORMA-OB3ETIVO.EXIGÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR EXCLUSIVAMENTE PARA AREGULAMENTAÇÃO DO SISTEMA FINANCEIRO. 7. O preceito veiculado peloart. 192 da Constituição do Brasil consubstancia norrna-objetivo queestabelece os fins a serem perseguidos pelo sistema financeiro nacional, apromoção do desenvolvimento equilibrado do País e a realização dosinteresses da coletividade. 8. A exigência de lei complementar veiculadapelo art. 192 da Constituição abrange exclusivamente a regulamentação daestrutura do sistema financeiro. CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL, ART4°, VIII, DA LEI N. 4.595/64. CAPACIDADE NORMATIVA ATINENTE ÀCONSTITUIÇÃO, FUNCIONAMENTO E FISCALIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕESFINANCEIRAS. ILEGALIDADE DE RESOLUÇÕES QUÊ EXCEDEM ESSAMATÉRIA. 9. O Conselho Monetário Nacional é titular de capacidadenormativa — a chamada capacidade normativa de conjuntuxa__ — noexercício da qual lhe incumbe regular, além da constitdjçrò.5Ji2aÍÍzação, o

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funcionamento das instituições financeiras, isto é, o desempenho de suasativ dadeTno plano do sistema financeiro. 10. Tudo o quanto exceda essedesempenho não pode ser objeto de regulação por ato normativoproduzido pelo Conselho Monetário Nacional. 11. A produção de atosnormativos pelo Conselho Monetário Nacional, quando não respeitemfuncionamento das instituições financeiras, é abusiva, consubstanciando

afronta à legalidade.

Inegável, à evidência, a legitimidade passiva do réu BANCO ITAÚ S.A.

II.C) DA IMPOSSIBILIDADE DE O DÉBITO SER ABATIDO DA APOSENTADORIA

Como fartamente demonstrado e confessado pela própria instituiçãofinanceira, o réu desrespeitou alguns direitos básicos da consumidora idosa, além de nãocumprir às determinações do artigo 39, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor,que dispõe sobre os procedimentos a serem adotados pelas instituições financeiras nascontratações e operações.

Neste sentido, a jurisprudência de escol não admite a retenção oudescontos de valores relativo a salários e benefícios previdenciários, para amortização dedébitos, veja-se:

EMENTA: JUIZADO ESPECIAL FEDERAL. DÉBITO AUTOMÁTICO DE VERBASALARIAL PARA O FIM DE SATISFAÇÃO DO CREDOR. ANTECIPAÇÃO DETUTELA EM FAVOR DO CORRENTISTA. POSSIBILIDADE. Crédito em contacorrente de valores de natureza salarial, inclusive 13° salário, éinsuscetível de apropriação por banco credor, responsável pela agencia daconta corrente do trabalhador, a pretexto de satisfazer dívida resultante dodescumprimento de contrato de crédito rotativo automático, dada suanatureza alimentar. Recurso parcialmente provido (Turma RecursalFederal, Processo: 200240007010681, relator Juiz Federal Rui CostaGonçalves).

O Superior Tribunal de Justiça tem sólido repertório jurisprudencial nosentido de considerar inadmissível que a instituição financeira amortize débitos mediantedesconto de depósitos de natureza salarial. A propósito:

EMENTA: RECURSO ESPECIAL. CONTA-CORRENTE. SALDO DEVEDORSALÁRIO. RETENÇÃO.IMPOSSIBILIDADE.- Não é lícito ao banco valer-se do salário do correntista, que lhe é confiadoem depósito, pelo empregador, para cobrir saldo devedor de conta-corrente. Cabe-lhe obter o pagamento da dívida em ação judicial.- Se nem mesmo ao Judiciário é lícito penhorar salários, não seráinstituição privada autorizada a fazê-lo.(REsp 831.774/RS, Rei. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROSTERCEIRA TURMA, julgado em 09/08/2007, DJ 29/10/2007 p. 221)

de Barros:Por oportuno, urge transcrever parte do voto do Mlnlst»-«amBf?to^omes

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"Na 4a Turma, existem precedentes específicos. Cito, a exemplo:"{ ) O banco não pode apropriar-se da integralidade dos depósitos feitos atítulo de salários, na conta do seu cliente, para cobrar-se de debitodecorrente de contrato bancário, ainda que para isso haja clausulapermissiva no contrato de adesão (...)" (REsp ^2.777/RUY) No mesmosentido' AgRg no AG 353.291/PASSARINHO, REsp 264.085/SCARTEZZINI,dentre outros. Ao julgar o REsp 507.044, conduzi a 3a Turma ao seguinteentendimento: „"( ) Mesmo com cláusula contratual permissiva, a apropriação do saláriodo correntista pelo banco-credor para pagamento^de cheque especial eilícita e dá margem a reparação por dano moral (...)"Embora a norma do Art. 7°, X, da Constituição Federal, se dirija ao

empregador, quando proíbe a retenção dolosa do salário, a vedaçãoestende-se a todos aqueles que, por sua atividade, manejem o vakir dosalário. No caso, o banco financiou como intermediário entre o patrão e oempregado. Não é lícito à instituição financeira pagar-se integralmente, àscustas da subsistência do correntista. Ao bloquear o salário - ainda queamparado em cláusula contratual permissiva - o banco comete ato ilícito,porque constitucionalmente vedado. Tal conduta não se equipara aocontrato de mútuo com consignação em folha de pagamento. Neste último,apenas uma parcela pré-fixada do salário é retida, ante a expressa eirrevogável autorização do mutuário (2a Seção, REsp728.653/PASSARINHO). A garantia de pagamento é condição para o mútuoem condições mais vantajosas. Mas ao compensar o saldo devedor naconta-corrente com o salário do correntista, o banco vai além de apropriar-se de parte dos vencimentos. A depender do saldo devedor - e aqui nãoimporta de que forma ele tenha se constituído - todo o salário é bloqueado,obrigando-se o correntista a valer-se novamente do crédito fornecido pelobanco, a fim de custear suas outras despesas. O ilustre Juiz Luis ChristianoEnger Aires bem captou o problema:"( • • • ) Aliás, fosse assim, certamente entraria o correntista num círculovicioso que o conduziria sempre e sempre a aumentar sua dívida, já quenão tendo com o que se sustentar, obrigar-se-ia a recorrer ao limite decrédito autorizado, que seria pago com seu salário, obrigando-o novamentea recorrer ao banco e assim interminavelmente (...)" (fls. 62/63) Em nossoordenamento jurídico, nem mesmo ao Poder Judiciário é lícito penhorarsalários, no processo de execução (CPC, Art. 649, IV). Se assim ocorre,não se há de permitir ao credor expropriar - sem discussão - o ordenado deseu^ mutuário. Em verdade, a autorização para que o credor se aproprie dosalário pago ao devedor constitui evidente fraude ao Art. 649, IV, do CPC.Em resumo: não é licito ao banco valer-se do salário do correntista, que lheé confiado em depósito, para cobrir o saldo devedor da conta-corrente.Cabe-lhe obter o pagamento da dívida pelos meios ordinários (excerto devoto proferido no julgamento do REsp 831.774/RS) .

O magistral voto do Ministro do STJ enfoca a questão pelo prismacorreio, porque sequer o Poder Judiciário, em processo judicial submetido aocrivo do devido processo legal, tem o poder de penhorar verbas salariais,quanto mais uma instituição financeira, que norteia sua conduta-em cláusulacontratual nula, por ofensa a normas de ordem feffeã^obretúàe as

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disposições do artigo 7°, inciso X, da Constituição Federal e do artigo 649, IV,do Código de Processo Civil.

SSSr̂ ,̂"ni-r5SoSSo^ ,̂̂ ^c^dignidade da pessoa humana, valor supremo da ordem jurídica.

Além do supracitado entendimento do Superior Tribunal de Dustiça, valecitar os seguintes acórdãos que também consideram a retenção de verbas salariaisinconstitucional:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CAUTELAR - DINHEIRO DEPOSITADOINDEVIDAMENTE - RETENÇÃO DE SALÁRIO EM CONTA-CORRENTE PARAQUITAÇÃO DE DÉBITO - INCONSTITUCIONALIDADE.Caso entenda haver um débito, surge para a parte credora o direito públicosubjetivo de acionar o Estado por meio do Poder Judiciário para obter oreconhecimento judicial da existência da dívida.' A posteriori', com base nacerteza e liquidez do título, executa-se o valor devido. Essa execução deveser feita pelos meios adequados, e não pelas mãos do banco credor, Nomomento em que a instituição financeira utiliza-se de sua condição deoperante e depositária dos valores financeiros que lhe são submetidos paraapropriar-se destes, materializa-se intolerável prática de autotutela.Ademais, a inadmissibilidade de tal procedimento agrava-se quandoenvolve a retenção de verba salarial, porquanto possui natureza alimentar,constituindo garantia fundamental albergada pela Constituição Federal, emseu art. 7°, inciso X. (Apelação Cível n° 2,0000.00.475144-6/000(1), 16a

Câmara Cível do TJMG, Rei. Mauro Soares de Freitas, j. 07.03.2007,unânime, Publ. 13.04.2007).

EMENTA: INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. EXISTÊNCIA DE DÍVIDA. BLOQUEIODO USO DO TALÃO DE CHEQUE E DO CARTÃO MAGNÉTICO.O bloqueio da movimentação da conta-corrente pelo banco para buscar seucrédito, em virtude de débito existente, é desprovido de qualquer amparolegal. O nosso ordenamento jurídico veda expressamente a retenção desalários e verbas alimentícias, ainda que exista cláusula permissivaexpressa em pacto firmado entre as partes. É o que se extrai dos arts. 5°,LIV e 7o, x da Constituição Federal, os quais impedem a privação de bensdo devedor sem anterior provimento jurisdicional e a retenção salarial. Oquantum indenizatório observou os princípios da razoabilidade e daproporcionalidade. Manutenção da sentença. Recursos conhecidos edesprovidos. (Apelação Cível n° 2008.001.06570, 19^ Câmara Cível doTJRJ, Rei. Ferdinaldo do Nascimento. Publ. 25.03.2008).

Caso este juízo entenda pela validade do artigo 115, inciso VI, da Lei deBenefícios, urge enfatizar que tal regrarnento não aplica-se à eapécrè-" -pois osempréstimos foram contraídos antes de 17 de dezembro de 2Õfiè^&1em=-aue~\fni

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acrescentado o inciso VI ao artigo 115 da LB. Na época da formalização dos empréstimospela consumidora não havia lei autorizando a amortização direta, razão pela qual talregra não pode retroagir para prejudicar a consumidora.

Ainda que se entenda pela incidência do artigo 115, inciso VI, da LB aosempréstimos em questão, sobressai de forma cristalina que o Banco Itau não observouas diretrizes delineadas no indigitado preceito legal. A urna, porque não ha provas de quea consumidora expressamente autorizou o desconto, tendo a instituição financeirajuntado algumas "telas" que supostamente fazem parte do procedimento de obtenção deempréstimos no caixa eletrônico. As "telas" são confusas e o consumidor não einformado de forma clara e objetiva dos descontos e dos patamares dos descontos, o quevulnera o direito colateral à informação. A duas, porque o Banco Itau desconta toevalor da aposentadoria da consumidora, sendo que o artigo 115, VI, da LB, apenasadmite o desconto de 30% do valor do benefício. Flagrante o desrespeito ao artigo 115,VI, da LB.

E mais. Segundo preconiza o artigo 6°, inciso V, do CDC, é direito básicodo consumidor, dentre outros, "a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçamprestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que astornem excessivamente onerosas".

Neste sentido, a jurisprudência vai redigida no sentido que

EMENTA: "AÇÃO REVISIONAL C/C CONSIGNATÓRIA. LEASING.PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA. PACTA SUNT SERVANDA.APLICAÇÃO DA LEI 8.078/90. l (...). 2 - O pacta sunt servanda obrigaas partes devendo, sendo possível, entretanto, revisão dasclausulas consideradas abusivas. 3 - 0 Leasing caracteriza-se comocontrato de adesão, estando sujeito ao controle do CDC. 4 - Em época deestabilidade financeira não se permite elevação de juros acima dopermitido legalmente.(...)" (TJGO, Relator: Dês. Dr. António Nery da Silva,Primeira Câmara Cível. Fonte: DJ. N.12.782, de 13.04.1998. Livro: 507) -grifo nosso.

EMENTA: "EMBARGOS INFRINGENTES. AÇÃO REVISIONAL C/CCONSIGNATÓRIA. CONTRATO DE LEASING. MANUTENÇÃO DO ACÓRDÃODESAFIADO. 2. Cabe ao Judiciário corrigir distorções contratuais queresultam no desequilíbrio financeiro dos pactos, afastando-se, fortenos preceitos do CDC (Lei 8.078/90) clausulas abusivas,atenuando-se, pois, o princípio do pacta sunt servanda, no maximeem se tratando de contrato de adesão; devendo prevalecer, in casua pactuação inicial de reajuste das parcelas com base no IGP-M 3Inobstante o artigo 192, parágrafo 3, da CF/88, ter sido declarado, peloSTF, não auto-aphcavel, os juros acham-se limitados pela Lei de Usuranunca revogada a taxa de 12% ao ano, lei esta recepcionada pela nossaCarta Maior. EMBARGOS INFRINGENTES CONHECIDOS E REJEITADOS"(TJGO, Relator: Dês. Dr. Noe Gonçalves Ferreira. Fonte: DJ n 13 082 de30.06.99) - grifo nosso.

O artigo 51 do Código de Defesa do Consumidoras clausulas abusivas, nulas de pleno direito. Vejamos

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"Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulascontratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

IV - estabeleçam obrigações consideradas iniquas, abusivas, quecoloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejamincompatíveis com a boa-fé ou a equidade;VI - estabeleçam inversão do ónus da prova em prejuízo doconsumidor;

Xlil'- autorizem o fornecedor a modificar uniteteralmente o conteúdoou a qualidade do contrato, após sua celebração;

XV - estejar)Le!TLjaesacordo_c9nLO_sjstema_de_Broiecão_aQconsumidor;XVI - possibilitem a renúncia do direito de indenizaçao porbenfeitorias necessárias.§ 1° Presume-se exagerada, entre outros casos, a vontade que:I - ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a quepertence;(...);III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor,considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse daspartes e outras circunstâncias peculiares ao caso.(...).§ 4° É facultado a qualquer consumidor ou entidade que o representerequerer ao Ministério Público que ajuíze a competente ação para serdeclarada a nulidade de cláusula contratual que contrarie o dispostoneste código ou de qualquer forma não assegure o justo equilíbrioentre direitos e obrigações das partes. (Grifos nossos).

Nessa quadra, a cláusula contratual que admite descontos superiores a30% do valor dos benefícios previdenciários é abusiva.

Importante lembrar, também, que o artigo 7° do CDC dispõe que "osdireitos ^previstos neste código não excluem outros decorrentes de tratados ouconvenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária,de regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem comodos que derivem dos princípios gerias do direito, analogia, costumes e equidade".

O artigo 7° do CDC funciona como uma cláusula de abertura, uma interfacecom toda a ordem jurídica. Muito embora o CDC ostenta o caráter de lei especial, opróprio CDC autoriza a aplicação de outra regra prevista em outro ato normativo, desdeque mais favorável ao consumidor. O legislador agiu preocupado em arquitetar uma leimaleável, com válvulas de escape para a máxima efetividade da adequada proteção doconsumidor, como determina o artigo 5°, inciso XXXII, da Constituição Federal. Nessaquadra, ha que se utilizar a norma mais favorável aos direitos dos consumidores.

A propósito, tenho como imprescindível citar â douta lição da professoraClaudia Lima Marques, in verbis:

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«Diante da pluralidade atual de leis, há que se procurar o diálogo,utilizando a lei mais favorável ao consumidor. Assim, no caso do CC/2002,o ideal não é mais perguntar somente qual o campo de aplicação do novoCódigo Civil de 2002, quais seus limites, qual o campo de aplicação do CDCe quais seus limites, mas visualizar que a relação jurídica de consumo ecivil e é especial, tem uma lei geral subsidiária por base e uma (ou mais)lei especial para proteger o sujeito de direito, sujeito de direitosfundamentais, o consumidor. Nesta ática, ambas as leis se aplicam amesma relação jurídica de consumo e colaboram com a mesma finalidade,concorrendo, dialogando, protegendo, com luzes e eficácias diferentes casoa caso, rnas com uma mesma finalidade, a cumprir o mandamentoconstitucional. Neste sentido, não é o CDC que limita o Código Civil, e oCódigo Civil que dá base e ajuda ao CDC, e se o Código Civil for maisfavorável ao consumidor do que o CDC, não será esta lei especial quelimitará a aplicação da lei geral (art. 7° do CDC), mas sirn dialogarão aprocura da realização do mandamento constitucional de proteção especialdo sujeito mais fraco. Assim, por exemplo, se o prazo prescricional oudecadencial do CC/2002 é mais favorável ao consumidor, deve ser esteusado, ex vi art. 7° do CDC, deve-se usar o prazo prescricional maisfavorável ao consumidor" (Comentários ao Código de Defesa doConsumidor. 2a edição. São Paulo: 2006, p. 221).

O artigo 7° do CDC é a cláusula de abertura do microssistema (interface),viabilizando a aplicação de leis mais favoráveis ao consumidor, inclusive gerais, como oCódigo Civil, no sentido do favor debilis.

Todo o consumidor, por presunção absoluta, é vulnerável (artigo 4°, incisoI, CDC). O princípio da vulnerabilidade é razão da existência do CDC, seu fundamentobásico. Não fosse o consumidor considerado vulnerável, não haveria necessidade doCDC.

Segundo a dicção do artigo 4°, III, do CDC, um dos objetivos da políticanacional de consumo é a "harmonização dos interesses dos participantes das relações deconsumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade dedesenvolvimento económico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais sefunda a ordem económica {art. 170 da Constituição Federal), sempre com base na boa-fée equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores".

O princípio da boa-fé objetiva impõe a observância de um padrão ético deconduta nas relações de consumo, sendo fonte de deveres anexos, laterais, tais como alealdade, a probidade e a honestidade. Impende consignar que o princípio da boa-féobjetiva, plasmado no artigo 4°, inciso III, CDC, têm origem germânica (artigo 242 doBGB) e significa lealdade e confiança nas relações de consumo.

Em consonância com a doutrina de vanguarda dispõe o artigo 113 doCódigo Civil que "os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e osusos do lugar de sua celebração".

Não é por outra razão que o professor Miguel Reale, presidente daComissão encarregada de elaborar o vigente Código Civil, denomina o^arttgcrT.̂ â doCódigo Civil de o "artigo chave", por condensar em seu texto "-1--

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orientaram a elaboração do código, a saber, a eticidade, a socialidade e a operabilidade(História do Novo Código Civil. 2005. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 240).

A respeito da boa-fé, o professor Miguel Reale leciona que a boa-fé "é ocerne ou a matriz da eticidade, a qual não existe sem a intentio, sem o elementopsicológico da intencionalidade ou do propósito de guardar fidelidade ou lealdade aopassado. Dessa intencionalidade, no amplo sentido dessa palavra, resulta a boa-feobjetiva, como norma de conduta que deve salvaguardar a veracidade do que foiestipulado. Boa-fé é, assim, uma das condições essenciais da atividade ética, nelaincluída a jurídica, caracterizando-se pela sinceridade e probidade dos que delaparticipam, em virtude do que se pode esperar que será cumprido e pactuado semdistorções ou tergiversações, máxime se dolosas, tendo-se sempre em vista _ oadimplemento do fim visado ou declarado como tal pelas partes. Como se vê, a boa-fe etanto forma de conduta como norma de comportamento, numa correlação objetiva entremeios e fins, como exigência de adequada e fiel execução do que tenha sido acordadopelas partes, o que significa que a intenção destas só pode ser endereçada ao objetivo aser alcançado, tal como este se acha definitivamente configurado nos documentos que olegitimam" (História do Novo Código Civil. 2005. São Paulo: Revista dos Tribunais, p.241/242).

Os deveres anexos ou laterais, agora encontram previsão expressa noartigo 422 do Código Civil, segundo o qual "os contratantes são obrigados a guardar,assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade eboa-fé".

Vale observar que "os princípios da probidade e da confiança são de ordempública, estando a parte lesada somente obrigada a demonstrar a existência da violação"(enunciado 363 do CJF).

Nessa quadra, em razão do primado da boa-fé objetiva, a instituiçãofinanceira deveria ter informado a consumidora, de forma clara, direta e objetiva, dosdescontos dos valores salariais, além de observar o limite máximo de 30% de retenção.Houve quebra da boa-fé objetiva, razão pela qual instaurou-se a presente demandaco l et i vá.

Síntese das teses articuladas:

1) qualquer desconto de verbas de natureza salarial, promovido por instituiçõesFinanceiras, ainda que com autorização do consumidor, é inconstitucional, nos termos doentendimento do STJ, TJMG e TH RJ;

? ° '"M80*,1-' d°na'ríÍ,9° 115' da L6Í n'° 8'213'91- Portanto, é inconstitucional, razão pelaqual o Ministério Publico, em sede de controle concreto, requer que este juízo declaremcidentalmente a inconstitucionalidade deste preceito legal;

P6la constitucionalidade do inciso VI, artigo 115, da LB, on u P n defende a tese de que tal regramento não se aplica ao contrato emquestão, por ter s,do formalizado em data anterior à vigência da regra guerreada;

4) não foram observadas as diretrizes do inciso VI do artigo 115 da LB, pois não háprovas de que a consumidora expressamente autorizou o

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todo o valor do beneficio previdenciário, sendo que é permitido apenas o desconto de30% do valor;

II. D- DA INVERSÃO DO ÓNUS DA PROVA

A regra geral imposta pelo sistema do Código de Processo Civil (artigo333) é a de que o ónus da prova cabe ao autor (em regra, portanto, o ónus da provacompete a quem alega).

Conforme consabido, existe uma interação e complementaridade entre asnormas do Código de Defesa do Consumidor, do Código de Processo Civil e da Lei n.7.347/85, com aplicação destas duas últimas levando-se em consideração os preceitosprincipiológicos do Código de Defesa do Consumidor e desde que não contrariem asdisposições protecionistas deste estatuto,

Os dispositivos processuais do Código de Processo Civil que se aplicam aoautor e ao réu, notadamente os pontos que assegurem o cumprimento da garantiaconstitucional da ampla defesa e do contraditório, são aplicáveis na tutela jurídica darelação de consumo.

JOÃO BATISA DE ALMEIDA enfoca o principio da isonomia, dentre osprincípios específicos aplicáveis à tutela do consumidor, como pilar básico que envolveessa problemática. Ele leciona que:

"Os consumidores devem ser tratados de forma desigual pelo CDC epela legislação em geral a fim de que consigam chegar à igualdadereal. Nos termos do art. 5° da Constituição Federal, todos são iguaisperante a lei, entendendo-se daí que devem os desiguais ser tratadosdesigualmente na exata medida de suas desigualdades" ' .

É certo que, os dois pólos da relação de consumo (consumidor/fornecedor)são compostos por partes desiguais em ordem técnica e económica, visto que ofornecedor possui, via de regra a técnica da produção que vai de acordo com seusinteresses e o poder económico superior ao consumidor. A vulnerabilidade do consumidoré patente e a sua proteção como uma garantia é uma consequência da evolução jurídicapela qual passamos.

Por sua vez, o fornecedor (fabricante, produtor, comerciante, ou prestadorde serviços) não fica refém de um sistema protecionista, pois tem sua ampla defesaassegurada, fazendo uso dos instrumentos processuais necessários para sua defesa comoos dos artigos 301 e incisos, 265, IV, a, e 267, IV, todos do Código de Processo Civil,entre outros.

A inversão do ónus da prova como um direito básico do consumidor, e asdemais normas que o protege, não ofendem de maneira alguma a isonomia das partes.Ao contrário, é um instrumento processual com vistas a impedir o desequilíbrio darelação jurídica.

A inversão do ónus da prova é urn direito conferido ao cpnsufFridot̂ para

ALMEIDA, João Batista de. A Proteção Jurídica do Consumidor, 2a ed., São

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s-, riência art. 6» , VIII, do Cod.go dehiposuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência (art.Defesa do Consumidor).

A norma em exame estipula que fica à critério do juiz a inversão quando

ónus da prova.

Critério como bem observou Luiz António Rizzatto, não tern nada desubjetivo é aquilo que serve de comparação. A verossimilhança ou a hiposuficienciaservirão como base para que o juiz decida pela inversão. "... Presente uma das duas,está o magistrado obrigado a inverter o ónus da prova".2

No entender de BEATRIZ CATARINA DIAS ao tratar de principio daverossimilhança: "Por verossimilhança entende-se algo semelhante à verdade. Deacordo com esse princípio, no processo civil o juiz deverá se contentar, ante asprovas produzidas, em descobrir a verdade aparente". Ela acrescenta que deve-seter cuidado para não relativizar demais este princípio, pois "... é indispensável que doprocesso resulte efetiva aparência de verdade material, sob pena de não ser acolhida apretensão por insuficiência de prova - o que equivale à ausência ou insuficiência deverossimilhança" 3.

Neste sentido CECÍLIA MATOS aponta a verossimilhança como um patamarna escala do conhecimento. "Não mais se exige do órgão judicial a certeza sobreos fatos, contentando-se com o Código de Defesa do Consumidor com acomprovação do verossímil, que varia conforme o caso concreto"*.

O juiz vai conceder a inversão baseado no juízo de simples verossimilhançaa respeito da verdade das alegações feitas.

Para VOLTAIRE DE LIMA "Uma alegação torna-se verossímil quandoadquire foros de veracidade, quer porque se torna aceitável diante damodalidade de relação de consumo posta em juízo, quer porque, de antemão,em sede de cognição sumária, não enseja o convencimento de que possa sertida como descabida"5.

Kazuo Watanabe6 comenta sobre a verossimilhança, afirmando que naverdade não há uma verdadeira inversão do ónus da prova, pois o magistrado, com aajuda das máximas de experiência e das regras de vida, considera produzida a prova que

" RIZZATTO NUNES, Luiz António. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, Direito Material {arts. Ia a54), São Paulo: Saraiva, 2000.

DIAS, Beatriz Catarina. A Jurisdição na Tutela Antecipada, São Paulo: Saraiva, 1999.

MATOS, Cecília, o Ónus da Prova no Código de Defesa do Consumidor, Dissertação de Mestrado apresentadatqq

a-íuldacle de direito da Universidade de São Paulo, sob a orientação do Professor Doutor Kazuo Watanabe,19935

MORAIS, Voltaire de Lima. Anotações Sobre o Ónus da Prova no Código de Processo Civil e no Código deDefesa do Consumidor, Revista do Consumidor, 5o ano , vol. 31, São Paulo: RT, Revista' WATANABE, Kazuo, Anotações de palestra proferida no XXI Encontro Nacionalocorrido em João Pessoa /PB em 21.06.01.

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incumbe a urna das partes, a menos que a outra parte demonstre o contrário.

O outro critério que deve ser analisado pelo juiz para que se possa l,nvertero ónus da prova é o da hipossuficiencia do consumidor o que se traduz em razão dacapacidade económica e técnica do consumidor.

Conforme Cecília Matos a hipossuficiência do consumidor é característicaintegrante da vulnerabilidade deste. É demonstrada pela diminuição de capacidade cconsumidor, não apenas no aspecto económico, mas no social, de informações, deeducação, de participação, de associação, entre outros.

Para Watanabe se a inversão ocorrer pelo critério de hipossuficiência doconsumidor se tem uma verdadeira inversão do ónus da prova. Esclarecendo que aintenção do legislador não foi de interpretar restritivamente a hipossuficiência no sentidoeconómico. Senão o consumidor que fosse dotado de situação económica capaz desuportar os custos da demanda teria que assumir o ónus da prova. De acordo com seuraciocínio a hipossuficiência dispõe de outro sentido, está ligada ao domínio deconhecimento técnico especializado que desequilibra a relação de consumo e manifesta aposição de superioridade do fornecedor em relação ao consumidor demonstrando ahipossuficiência do consumidor.

Rizzatto entende que o significado de hipossuficiência insculpido no textolegal do Código de Defesa do Consumidor, não é económico. É técnico. O conceito devulnerabilidade é que abrange a fragilidade económica e técnica do consumidor. Ahipossuficiência para fins da possibilidade de inversão do ónus da prova:

"... tem sentido de desconhecimento técnico e informativo do produtoe do serviço, de suas propriedades, de seu funcionamento vital e/ouintrínseco, dos modos especiais de controle, dos aspectos que podemter gerado o acidente de consumo e o dano, das características dovício etc". 7

Nesse quadrante, o macrossistema (aberto) processual de defesa dosinteresses difusos e coletivos, concebido em virtude da integração harmónica dasregras processuais estabelecidas na Lei da Ação Civil Pública (7347/85) e no Código deDefesa do Consumidor (8078/90), em decorrência da conjugação impositiva entre taisdiplomas (estabelecida pela análise conglobante dos artigos 21 da LACP e 90 do CDC)8,previu a regra da inversão do ónus da prova como regra a ser seguida, sempre que asalegações do autor, a critério do juiz, forem verossírneis (artigo 6°, VIII, do CDC).

Sobre o tema, é relevante buscar fundamento na aula do professorCristiano Chaves, membro do Ministério Público baiano, que observa, com maestria sempar, que a inversão do ónus da prova é regra de julgamento:

RIZZATTO MUNES, Luiz António. Comentários ao Código de Defesa do Consumiaor, Direito Material (atts Ia a54), São Paulo: Saraiva, 2000.

(...) o sistema das ações civis públicas e coletivas interage completamente (LACP, art̂ -eTTJCT-art. 90)".

(MAZZILLI, Hugo Migro. Aspectos Polémicos da Ação Civil Pública. Júris Plenun^Êgx^ f̂fifpiríuívVa, n.97, nov./dez. 2007. 2 CD-ROM.

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D

Ónus da prova quando da decisão da causa). çnmprit(3 conferirPprrebe-se então que a tensiênçia^atuaL e de somente conremportlnda ao ônus^a prova quando ausente ou insuficiente a provaproduzida. É que se o juiz dispuser de provas suficientes para o seuconvencimento, pouco interessa quern a produziu, uma vez que a prova edo juízo e não das partes. Somente quando o magistrado não consegueformar, pelo manancial probatório colhido, o seu juízo de valor sobre osfatos postos à sua apreciação é que incide, como regride julgamento, adistribuição do ónus da prova. Este é o entendimento cimentado najurisprudência (,..). Tem-se, pois, um nítido caráter supletivo na regra dedistribuição do ónus da prova". (FARIAS, Cristiano Chaves de. Direito Civil- Teoria Geral, 3a ed. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2005, p. 547).

Além disso, importa notar que o Ministério Público, ao propor ações civispúblicas em defesa dos direitos básicos dos consumidores, age em prol da coletividade enão em seu próprio interesse. Este, sem dúvida alguma, se afigura como mais umargumento apto a reforçar a opção feita pelo macrossistema de proteção coletiva pelaregra da inversão do ónus da prova (que tem a pretensão de facilitar a defesa dasociedade e do meio ambiente), atribuindo ao sujeito passivo da relação processual oónus de desconstituir as asserções do autor.

Nas pegadas dessas ideias, RODOLFO MANCUSO aduz que:

(...) cm verdade, cabe salientar que hoje podemos contar com umregime integrado de mútua complementariedade entre as diversasa coes _ exercitáveis na jurisdição coletiva: a ação civil pública'recepcionou1 a ação popular, ao indicá-la expressamente no caput do art.1° da Lei 7.347/85; a parte processual do CDC ... é de se aplicar, noque for cabível, à ação civil pública (art. 21 da Lei 7.347/85); outras açõespodem ser exercitadas no trato de matéria integrante do universo coletivo(arts. 83 e 90 do CDC); finalmente ... o CPC aparece como fontesubsidiária (CDC, art. 90, Lei 7.347/85, art. 19; LAP, art. 22).9

No mesmo sentido, o talentoso professor MARCELO ABELHA leciona que;

(...) devido ao objeto deste trabalho versar sobre as relações de consumo,procuraremos, sempre, ter como base a figura do consumidor e seurespectivo Código. Entretanto, como dissemos, dada à visceralinterligação entre a Lei de Ação Civil e o Código de Pj-gtgçãr^gDefesa do Consumidor, quando falarmos em defesa do consumidorem juízo, visando à tutela de direitos coletivos lato sensu e seusgrincípios que serão minuciosamente analisados, nada impede qug^resguardadas algumas peculiaridades que dizem respeito àsnormas materiais do Código de Defesa do Consumidor, possam (e

Ação Civil Pública. 5a ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 31.

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Portanto, para assegurar o concreto e efetivo acesso à adequada prestaçãojurlsdicional, é indispensável a inversão do ónus da prova.

II. E) DO DANO MORAL COLETIVO

Corn o advento do Código de Defesa do Consumidor, firmou-se a certezade que a atividade bancária constitui um serviço, com a conclusão de que a

conforme o disposto nos artigosDesta maneira, os Bancos respondem

objetivamente perante os consumidores de seus serviços em razão dos defeitos queestes, porventura, apresentem.

Além de desrespeitar as normas da Constituição Federal, do Código Civil edo Código de Defesa do Consumidor, o réu violou frontalmente o Estatuto do Idoso,observe:

Art. 3a É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e doPoder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, aefetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, àeducação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, àcidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivênciafamiliar e comunitária.

Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:

I - atendimento preferencial imediato e individualizado juntoaos órgãos públicos e privados prestadores de serviços à população;

(...).

Art. 4e Nenhum _ idoso será objeto de qualquer tipo denegligência,, discriminação, violência, crueldade ou opressão, e todoatentado aos seus direitos, por ação ou omissão, será punidona forma da lei.

§ l2 E dever de todos prevenir a ameaça ou violação aosdireitos do idoso.

§ 2Q As obrigações previstas nesta Lei não excluem da prevençãooutras decorrentes dos princípios por ela adotados.Art- 5fi A inobservância das normas de prevenção importará emresponsabilidade ã pessoa física ou jurídica nos termos da lei.

Preceitua o nosso Código de Defesa do Consumidor, dentre os chamadosdireitos básicos dos consumidores, "a efetiva prevenção e reparação de danospatrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos" (Lei 8.078/90, art. 6°, VI) Damesma forma, o inciso VII do referido artigo, ao assegurar o direito dos consumidores de

HTítulo III do Código de Proteção e Defesa do Consumidor. Júris Plenum,

nov./dez. 2007. 2 CD-ROM.

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reparação deindividuais,

danos, explicita estatcoletivos ou difusos".

Pelo acima exposto, primeira conclusão que exsurge é que embora amatéria sobre dLnosmorais^etívos seja tratada^como novidade a verdade e que ta,matéria foi expressamente prevista na legislação consumensta datada de U desetembro de 1990, e por isso, não deveria ser tratada como algo tão novo assim.

O dano moral na moderna doutrina é toda agressão injusta àqueles bensimateriais, tanto de pessoa física quanto jurídica, insusceptível de quantificaçãopecuniária, porém indenizável corn tríplice finalidade: satisfativo para a vitima,dissuasório para o ofensor e de exemplaridade para a sociedade.

Exemplificando tão tormentosa questão André de Carvalho Ramos afirma,"imagine-se o dano moral gerado por propaganda enganosa ou abusiva. O consumidorem potencial sente-se lesionado e vê aumentar seu sentimento de desconfiança naproteção legal do consumidor, bem como no seu sentimento de cidadania". "

Uma vez a recusa do réu em cumprir com presteza a determinações legaise regulamentares, tem ele o inarredável dever de indenizar a sociedade brasileira, commais ênfase, ante o tratamento abusivo dispensado aos idosos. No entanto, só odescumprirnento e pela instituição bancária das leis e das normas constitucionais jáensejaria o dever de indenizar a sociedade.

Pela lesão causada ao interesse ou direito coletivo, o sujeito passivo daação civil pública poderá ser condenado ao pagamento de uma determinada quantia emdinheiro a título de indenização pelos danos coletivos causados, sem prejuízo da multapelo eventual descumprirnento da ordem judicial.

A fixação de indenização por dano moral coletivo tem por maior escopoevitar a reincidência da pratica ilícita ou abusiva, trata-se de medida pedagógica,dissuasório para o ofensor e de exemplaridade para a sociedade.

Como ensina Carlos Alberto Bittar Filho:

"(...) O DANO MORAL COLETIVO É A INJUSTA LESÃO DA ESFERAMORAL DE UMA DADA COMUNIDADE, OU SEJA, É A VIOLAÇÃOANTIJURÍDICA DE UM DETERMINADO CÍRCULO DE VALORESCOLETIVOS. Quando se fala em dano moral coletivo, está-se fazendomenção ao fato de que o património valorativo de uma certacomunidade (maior ou menor), idealmente considerado, foi agredidode maneira absolutamente injustificável do ponto de vista jurídico:quer isso dizer, em última instância, que se feriu a própria cultura, emseu aspecto imaterial."12

A ação civil pública e o dano moral coletivo. In: Revista de Direito do Consumidor, n. 25/98, p. 82"Do dano moral coletivo no atual contexto jurídico brasileiro" in Direito do Consumidor vol 12-Ed RT Vale

destacar, ainda a manifestação de André de Carvalho Ramos que, ao analisar o dano mQ»HcOléHv6-assimdissertou: (...) e preciso sempre enfatizar o imenso dano moral coletivo cauMdO'--felãVagB2SSÕes'laosinteresses transmdividuais. Afeta-se a boa-imagem da proteção legal a estes "

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Em abalizado comentário, aduz Luís Gustavo Grandinetti Castanho De

Carvalho:

-n Direito se preocupou durante séculos com os conflitosintersubjetivos. A sociedade de massas, a^omple^ade das reiaço,

económicas e

para o interesse difuso ou coletivo; do dano individual para o danodifuso ou coletivo. Se o dano individual ocupou tanto e tãoprofundamente o Direito, o que dizer do dano que atinge um numeroconsiderável de pessoas? É natural que o Direito se volte, agora, paraelucidar as intrincadas relações coletivas e difusas e especialmente areparação de um dano que tenha esse caráter" 13.

Xisto Tiago de Medeiros Neto, procurador do Ministério Público do Trabalho,leciona que assim, há de se ressaltar que, no tempo atual, tornou-se necessária esignificativa para a ordem e a harmonia social, a reação do Direito em face de situaçõesem que determinadas condutas vêm a configurar lesão a interesses: 1} juridicamenteprotegidos; 2) de caráter extrapatrimonial; 3) titularizados por urna determinadacoletividade. Ou seja: adquiriu relevo jurídico, no âmbito da responsabilidade civil, areparação do dano moral coletivo (em sentido lato)14.

André de Carvalho Ramos, captando esse aspecto, registra que oentendimento jurisprudencial de aceitação do dano moral em relação a pessoas jurídicas,"é o primeiro passo para que se aceite a reparabilidade do dano moral em face de umacoletividade". E ainda acresce: "o ponto chave para a aceitação do chamado dano moralcoletivo está na ampliação de seu conceito, deixando de ser o dano moral umequivalente da dor psíquica, que seria exclusividade de pessoas físicas" 1S.

Rogério Tadeu Romano, Procurador da República, em artigo disponível nainternet, considera "perfeitamente aceitável a reparabilidade do dano moral em face dacoletividade, que apesar de ente despersonalizado, possui valores morais e umpatrimónio ideal a ser receber proteção do Direito. Ora, se aceita-se a reparabilidade dodano moral em face das pessoas jurídicas, quanto a honra objetiva, a fortiori, deverá seraceita tal tese em face da coletividade".

Xisto doutrina de forma conclusiva que "Resta evidente, com efeito, que,toda vez em que se vislumbrar o ferimento a interesse moral (ressalte-se,extrapatrimonial) de uma coletividade, configurar-se-á dano passível de reparação,tendo em vista o abalo, o sentimento negativo, a desalentadora indignação, ou adiminuição da estima, infligida e apreendida em dimensão coletiva. Nesse passo, é

do cidadão, que se vê em verdadeira selva, onde a lei do mais forte impera. ("A ação civil pública e o danomoral coletivo", Revista de Direito do Consumidor, vol. 25- Ed. RT, p. 83). Continua o citado autor, dizendo:"Tal intranquilidade e sentimento de desapreço gerado pelos danos coletivos, justamente por serem indivisíveis,acarretam lesão moral que também deve ser reparada coletivamente. Ou será que alguém duvida que oCidadão brasileiro, a cada noticia de lesão a seus direitos não se vê desprestigiado e ofendido noseu sentimento de pertencer a uma comunidade séria, onde as leis são cumpridas? A expressãopopular 'o Brasil é assim mesmo' deveria sensibilizar todos os operadores do Direito sobre a urgência nareparação do dano moral coletivo" (idem, ibidem).

Responsabilidade por dano não-patnmonial a interesse difuso: dano moral coletivo, p..Revista do Ministério Público do Trabalho n.° 24, ano 2002, pág. 79A ação civil pública e o dano moral coletivo. In: Revista de Direito do Consur

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que se apresente o dano como injusto, usurpando a esfera jurídica daem detrimento dos valores fundamentais do seu acervo «.

A partir da Constituição da República de 1988, desro?inou-*horizonte quanto à tutela dos danos morais (particularmente no que tange » J« Wçiocoletiva), face à adoção do princípio basilar da reparação integral tart . V e XConstituição federal) e diante do direcionamento do amparo jurídico a esfera dosinteresses transindividuais, valorizando-se, pois, destacadamente os d.re itos de talnatureza (a exemplo dos artigos 6°, 7°, 194, 196, 205, 215, 220 225 e 227) e osinstrumentos para a sua proteção (art. 5°, LXX e LXXIII, e art. 129, III).

Com isso, a tutela do dano moral coletivo passou a ter, explicita eindiscutivelmente, fundamento de validade constitucional. Destaque-se, por oportuno, aampliação do objeto da ação popular manejada pelo cidadão, que, ern decorrência doreferido artigo 5°, LXXIII, da Lei Maior, passou a visar a anulação de ato lesivo (e aconsequente reparação por perdas e danos — art. 11 da Lei n. 4.717/65) ao patrimóniopúblico e também à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimóniohistórico e cultural. Daí a pertinência dessa ação no campo do dano moral coletivo,conforme destacado por Carlos Alberto Bittar Filho, ao citar Hely Lopes Meirelles:

"Embora os casos mais frequentes de lesão se refiram ao danopecuniário, a lesividade a que alude o texto constitucional tantoabrange o património material quanto o moral, o estético, o espiritual,o histórico. Na verdade, tanto é lesiva ao património público aalienação de um imóvel por preço vil, realizada por favoritismo, quantoa destruição de um recanto ou de objetos sem valor económico, masde alto valor histórico, cultural, ecológico ou artístico para acoletividade local".

Ainda dentro do enfoque constitucional, vê-se que o artigo 129, inciso III,ao conferir legitimação qualificada ao Ministério Público para o manuseio da ação civilpública, também abriu o leque do seu objeto para qualquer interesse difuso e coletivo,além daqueles referentes ao património público e social e ao meio ambiente. Assim, aaçao civil pública tornou-se instrumento de alçada constitucional apto a ser utilizado peloparquet na busca da proteção irrestrita de todo interesse de natureza transindividual,inclusive os de caráter moral. E por força do § 1° do mesmo artigo 129 da Lei Maior,também foram legitimados para este fim os entes arrolados no artigo 5° (caput e incisosI e II) da Lei da Ação Civil Pública (Lei n. 7.347/85).

Frise-se, também, que sob a égide do regime constitucional passadoquando do surgimento da Lei da Ação Civil Pública (Lei n. 7.347/85), o respectivo artigo

1 limitava o seu uso somente nas hipóteses de lesão ao meio ambiente, ao consumidore ao património cultural, além de não fazer referência específica ao dano moraiutilizando o termo dano, sem qualificativo.

Com efeito, a redação original, em seu caput, previa: "Art. 1° Regem- sepeias disposições desta lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidadepor danos causados: (...)."

A possibilidade jurídica do pedido de indenização p ivo

Revista do Ministério Público do Trabalho, n.° 24, ano 2002, pág. 84

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decorre de expresso dispositivo ,ega,: o art. L, cap,t, da Lei da Ação Civi, Púb,ica (Lei

Federal n° 7.347/85):

DIFUSO OU COLETIVO.

Xisto arremata a exposição da configuração do dano mora! coletivo com as

seguintes ponderações:

"Na atualidade, a ação impositiva, por meio dos mecanismos e órgãoscompetentes, objetivando a efetivação dos direitos, em prol dosindivíduos e da coletividade, é o que dá concretude a ideiacidadania. Em muito maior dimensão isso ocorrerá quando tratar-se devalores fundamentais, status reconhecido constitucionalmente aosdireitos ou interesses coletivos, materiais ou morais.17

Sem dúvida, a evolução do regime da responsabilidade civil, tendo pornorte o equilíbrio e o desenvolvimento sociais, possibilitou a devidaproteção em face de danos infligidos aos valores morais reconhecidos acoletividades de pessoas, fruto da arnpla projeção que adquiriu oconceito de dignidade humana. A ordem jurídica, assim, considera sera coletividade titular de direitos ou interesses extrapatrirnoniais, osquais são passíveis de tutela por meio do sistema processual apto aessa finalidade, definidor da chamada jurisdição civil coletiva, cujosfundamentos principais encontram-se gizados na Carta Constitucionalde 1988 (art. 5°, XXXV e LV, e art. 129, III e § 1°), ordenando-seinstrumentalmente com a interação das normas da Lei da Ação CivilPública (art. 21) e da parte processual do Código de Defesa doConsumidor (arts. 90 e 117).

O VALOR DEVIDO a título de indenização pelos danos moraiscoletivos , observa Carlos Alberto Bittar:

" ( • • • ) deve traduzir-se em MONTANTE QUE REPRESENTEADVERTÊNCIA AO LESANTE E À SOCIEDADE DE QUE SE NÃO SEACEITA O COMPORTAMENTO ASSUMIDO, OU O EVENTO LESIVOADVINDO. Consubstancia-se, portanto, em IMPORTÂNCIA COMPATÍVELCOM O VULTO DOS INTERESSES EM CONFLITO, REFLETINDO-SE DEMODO EXPRESSIVO, NO PATRIMÓNIO DO LESANTE, A FIM DE QUESINTA, EFETIVAMENTE, A RESPOSTA DA ORDEM JURÍDICA AOSEFEITOS DO RESULTADO LESIVO PRODUZIDO. DEVE, POIS, SERQUANTIA ECONOMICAMENTE SIGNIFICATIVA, EM RAZÃO DASPOTENCIALIDADES DO PATRIMÓNIO DO LESANTE. Coaduna-se essapostura, ademais, com a própria índole da teoria em debate, possibilitandoque se realize com maior ênfase, a sua função inibidora decomportamentos. Com efeito, o peso do ónus financeiro é, em um mundoem que cintilam interesses económicos, a resposta pecuniária maisadequada a lesionamentos de ordem moral." (Grifos nossos.).̂

Revista do Ministério Público do Trabalho, n.° 24, ano 2002 oáa 84i o '

"Reparação Civil por Danos Morais" in RT, 1993, pp. 220-222.

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O Egrégio Tribunal Regional Federal da 4a Região também admite aconfiguração do dano moral com repercussão coletiva, senão vejamos-

ACÃO CIVIL PÚBLICA. OFENSAS CONTRA COMUNIDADEÍNDÍGENA. DANO MORAL COLETIVO. MAJORAÇÃO. 1. Tendorestado demonstrada a discriminação e o preconceitopraticados pelos réus contra grupo indígena Kamgang, e devidaindenização por danos moral. 2. O dano moral colet.vo temlugar nas hipóteses onde exista um ato ilícito que, tomadoindividualmente, tem pouca relevância para cada pessoa; mas,frente à coletividade, assume proporções que afrontam o sens<comum. 3. Indenização por danos morais majorada para l20.000,00, a ser suportada de forma solidária por ambos osréus desta ação (TRF 4^ Região, Apelação Cível, Processo n.°200371010019370, relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA).

UtiHzando-se, agora, urn pouco da teoria do dano moral individual,observar-se que durante muito tempo, os tribunais pátrios utilizaram-se apenas da Lei deImprensa e do Código Brasileiro de Telecomunicações para avaliar o dano moral. Atarifação do valor indenizatório por dano moral foi abandonada, pois o resultadorotineiramente era injusto. Hoje a indenização íem caráter compensatório e punitivo.Qualquer valor que se fixar deve imprimir tais características: a compensação do lesadoe a punição do lesante para que não mais reincida em atos ilícitos.

Ainda no campo do dano moral individual, o valor deverá ser fixadolevando em consideração as condições pessoais do pleiteante e da instituição financeira,sopesadas pelo prudente arbítrio do Juiz, com a observância da TEORIA DODESESTIMULO, ou seja, o valor não deve enriquecer ilicitamente o ofendido, mas há deser suficientemente elevado para desencorajar novas violações ao direito. Não é outra aconclusão a ser adotada, em face do que abaixo se expõe, transcrito ipsis litteris do votovencedor da Ilustríssima Desembargadora do Tribunal de Justiça do DistritoFederal, Dra. Fátima Nancy Andrighi, emérita doutrinadora no campo daresponsabilidade civil, na Apelação Cível n°. 47.303/98 (Danos Morais - Eliomar de S.Nogueira versus UNIBANCO):

"Corno já tive oportunidade de asseverar reiteradas vezes, a indenizaçãopor danos morais tem função diversa daquela exercida pela dos danospatrimoniais, não podendo ser aplicados critérios iguais para a fixação deseu quantum. Assim preleciona o professor Carlos Alberto Bittar, litteris:'... a reparação de danos morais exerce função diversa daquela dos danosmateriais. Enquanto estes se voltam para a recomposição do patrimónioofendido, através da aplicação da fórmula danos emergentes e lucroscessantes (C. Civ., art. 1.059), AQUELES PROCURAM OFERECERCOMPENSAÇÃO AO LESADO, PARA ATENUAÇÃO DO SOFRIMENTO HAVIDODe outra parte, QUANTO AO LESANTE, OBJETIVA A REPARAÇÃOIMPINGIR-LHE SANÇÃO, A FIM DE QUE NÃO VOLTE A PRATICARATOS LESIVOS A PERSONALIDADE DE OUTREM. É que interessa aoDireito e à sociedade que o relacionamento entre os -̂erites quecontracenam no orbe jurídico se mantenha dentro de padrÕéVnpTfhais de

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equilíbrio e de respeito mútuo. Assim, em hipótese deao agente suportar as consequências de sua atuaçao,com a atribuição de pesadas indenizações, atos ilícitosos referidos aspectos da personalidade humana. (...) omissis (...) tssadiretriz vem de há muito tempo sendo adotada na jurisprudência norte-arnericana, em que cifras vultosas têm sido impostas aos infratores, comoindutoras de comportamentos adequados, sob os prismas moral e jurídico,nas interações sociais e jurídicas'. Relativamente ao escopo da mdemzaçaopor danos morais, coaduno, modestamente, com a abalizada opinião domestre Caio Mário da Silva Pereira, sustentando que na reparação por danomoral estão conjugados dois motivos, ou duas concausas: I) punição doinfrator pelo fato de haver ofendido um bem jurídico da vítima,posto que imaterial; II) dar a vítima compensação capaz de lheconseguir satisfação de qualquer espécie, ainda que de cunhomaterial. Defendo, acautelada na finalidade punitiva da reparaçãomoral, a rigidez do sistema repressivo, de MANEIRA QUE SEJAMAIS VANTAJOSO, TANTO PARA PESSOAS QUANTO PARAEMPRESAS, O RESPEITO AOS DIREITOS ALHEIOS, QUE ACONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÕES. Na fixação doquantum indenizatório por gravames morais, deve-se buscar atender àduplicidade de fins a que a indenização se presta, ATENTANDO para aCONDIÇÃO ECONÓMICA DA VÍTIMA, bem como para a CAPACIDADE DOAGENTE CAUSADOR DO DANO e amoldando-lhes a condenação de modoque as finalidades de reparar a vítima e punir o infrator sejam atingidas.".(Grifos nossos).

Por todo o exposto, o Ministério Público do Estado de Goiás entende que émais do que razoável a FIXAÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAISCOLETIVOS NO VALOR DE R$ 1.000,000,00 (um milhão de reais).

O valor deverá ser revertido ao Fundo Nacional para a Criança e oAdolescente, instituído pelo art. 6° da Lei n° 8.242/91 e regulado pelo DecretoPresidencial n.° 1.196/94.

III - DOS PEDIDOS

III.A) DO PEDIDO LIMINAR

Conforme preconiza o artigo 84, § 3° do Código de Defesa do Consumidorsendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do

"révia^cíado '* G" "dt° a° JUÍZ C°nCeder a tutela linearmente ou após justificação

Nesta esteira, é indene de dúvidas que a demanda retratada na exordialrevela fundamento relevante, sobretudo porque comprovada a lesão aos direitos básicosdos consumidores catalogados no Código de Defesa do Consumidor, o que configura

V 0 H a dÍreít° fur!damental (*^o 5° , XXXII, CF), devendo o JudicSdas normas definidoras de direitos fundamentais nas relações dea

nit^r?d tCT a ^^ ré' /resti9iarid° a Acácia horizontal o n o s etutelando todos os consumidores do BANCO ITAU S. A.

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O Ministério Público entende que a relevância da demanda já' estásuficiente demonstrada, porquanto gravita em torno de retenção ̂ í̂ a ??mína*cunho salarial o que agride de forma frontal o principio da dignidade da pessoa humanaque existe risco de ineficácia do provimento final, em virtude da idade da titular da contae da alta probabilidade de mais idosos serem vítimas de obrigações iníquas, abusivas quecoloquem o consumidor em desvantagem exagerada e ilegal, sendo que tal retençãopode colocar em risco a vida digna de incalculáveis consumidores; que existe provainequívoca das alegações formuladas nesta exordlal; e que a continuidade da neg igenciae da indiferença do réu para com os idosos certamente provocara dano irreparável.

Tecidas estas razões, o Ministério Público requer, liminarmente, odeferimento das seguintes obrigações de fazer e não-fazer:

a) Que o BANCO ITAÚ S.A. seja obrigado a abster-se de reter oudescontar qualquer valor relativo a salários e benefícios previdenciáriospara amortizar eventuais débitos existentes com a instituiçãofinanceira ré, em especial da idosa RITA GOMES CORREIA, titular daconta corrente n.° 00869-0, agência 4331 e de todos os clientes dobanco das cidades de Minaçu e Campinaçu ou, alternativamente, queo BANCO ITAÚ S.A seja obrigado a abster-se de reter ou descontarqualquer valor relativo a salários e benefícios previdenciários empatamares superiores a 30% por mês dos consumidores clientes docitado banco;

b) Devolver aos clientes lesados, de Minaçu e Campinaçu, no prazo de 30(trinta) dias, todos os valores salariais retidos ou descontados aoarrepio da ordem jurídica, sobretudo os referentes a descontos debenefícios previdenciários, corrigidos com juros de mora de 1% ao rnêse correção monetária pelo IPCA-E;

c) Em caso de descumprimento das obrigações acima descritas, requerque o BANCO ITAÚ S.A. seja condenado a pagar uma multa diária novalor de 100.000,00 {cem mil reais), nos termos dos pedidoscominatórios deferidos liminarmente, multa esta que será revertida emfavor do Fundo Municipal da Criança e do Adolescente.

III.B) DOS PEDIDOS DEFINITIVOS

Gizadas estas singelas considerações, o MINISTÉRIO PÚBLICO DOESTADO DE GOIÁS formula os seguintes pedidos e requerimentos:

a) Que sejam concedidos os pedidos liminares na forma do item III.A,condenando o réu a cumprir todas as obrigações acima alinhavadas;

b) Que a presente açao civil coletiva seja recebida, autuada e processadaeis que presentes os requisitos dos artigos 282 e 283 do CPC e da Lein,o 7.347/85;

c) Que o réu seja citado na pessoa de seu representante legal, na formado que preceitua o Código de_Processo Civil, para, querendo, ofertarresposta, sob pena de confissão quanto à matéria de fato e sob osefeitos da revelia;

d) Ajnversão do ónus da prova, como estatui o artiao^o^ncíso^VlTi doCódigo de Defesa do Consumidor;

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e) Após o despacho liminar positivo e do deferimento da tutelaantecipada, o Ministério Público, com arrimo no artigo 94 do CDC,requer a publicação de edital no órgão oficial, a fim de que osinteressados possam intervir no processo como litisconsortes;

f) A total procedência dos seguintes pedidos:f.l) Que o BANCO ITAÚ S.A. seja obrigado a abster-se de reter oudescontar qualquer valor relativo a salários e benefícios previdenciariospara amortizar eventuais débitos existentes com a instituiçãofinanceira ré, em especial da idosa RITA GOMES CORREIA, titular daconta corrente n.° 00869-0, agência 4331 e de todos os clientes dobanco das cidades de Minaçu e Campinaçu ou, alternativamente, queo BANCO ITAÚ S.A seja obrigado a abster-se de reter ou descontarqualquer valor relativo a salários e benefícios previdenciarios empatamares superiores a 30% por mês dos salários e benefíciosrecebidos pelos consumidores clientes do citado banco;f.2) Devolver aos clientes lesados, de Minaçu e Campinaçu, no prazode 30 (trinta) dias, contados da data da sentença, todos os valoressalariais retidos ou descontados ao arrepio da ordem jurídica,sobretudo os referentes a descontos de benefícios previdenciarios,corrigidos com juros de mora de 1% ao mês e correção monetária peloIPCA-E;

f,3) Em caso de descumprimento das obrigações acima descritas,requer que o BANCO ITAÚ S.A. seja condenado a pagar uma multadiária no valor de 100.000,00 (cem mil reais), multa esta que serárevertida em favor do Fundo Municipal da Criança e do Adolescente.;

g) Que seja declarada, em caráter incidental, a inconstitucionalidade doinciso VI do artigo 115 da Lei n.° 8.213/91;

h) A condenação do réu ao pagamento de INDENIZAÇÃO POR DANOSMORAIS COLETIVOS, em valor não inferior a R$ 1.000.000,00 (ummilhão de reais), valor esse que deverá ser revertido em favor doFundo Nacional da Criança e o Adolescente;

i) que seja assegurada prioridade na tramitação da presente ação,conforme preconizado no artigo 71 da lei 10,741/2003 (Estatuto doIdoso);

j) Ao final, a condenação do réu a pagar as despesas e custasprocessuais,

k) Cominação de astreintes, nos mesmos valores da multa diária supra,para assegurar o cumprimento da decisão final;

Este Órgão Ministerial protesta pela produção de outras provasjuridicamente admitidas - em especial o depoimento pessoal dos réus, a oitiva detestemunhas, a realização de perícia e a posterior juntada de documentos - e dápresente causa o valor de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), para fins de alçada.

Termos em que pede deferimento.

inistério Público (Miriaçu), 13 de janeiro de 2009.

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