Etnomatemática: saberes discentes e práticas docentes

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ETNOMATEMÁTICA: SABERES DISCENTES E PRÁTICAS DOCENTES Maio / 2010 – Niterói

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Minicurso da V Semana da Matemática da UFF, ministrado pelo Grupo de Estudo e Pesquisa em Etnomatemática da FEUFF

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ETNOMATEMÁTICA: SABERES DISCENTES EPRÁTICAS DOCENTES

Maio / 2010 – Niterói

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Participantes:Alexis SilveiraAndré Luiz GilsAndréa TheesGisele Americo SoaresLuciana Getirana de SantanaNúbia VergettiRaphael GualterSonia Maria SchneiderWellington R. Galvão

Grupo de Estudos e Pesquisas em Etnomatemática

O grupo, coordenado pela Profª Maria Cecilia de Castello Branco Fantinato, reúne-se quinzenalmente na FE UFF, desde 2004.

Contato:[email protected]

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Apresentação dos integrantes do GEPEM Sondagem das expectativas dos participantes

18h – 18h 30min

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Situação problema 118h 30min – 18h 45min

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OBJETIVOS

Pretendemos neste minicurso:Refletir sobre a importância de se considerar os saberes discentes e a cultura cotidiana nas práticas docentes;Apresentar a proposta da Etnomatemática;Discutir a perspectiva da Etnomatemática para a prática docente.

18h 45min – 18h 50min

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ATIVIDADES PARA O GRUPO

18h 50min – 19h 30min

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Situação problema 1“Joelton! Você é pedreiro?”

O professor Gilberto se dirige ao quadro-negro e inicia a aula direcionando o olhar para o aluno Joelton, que está sentado na primeira carteira da fileira, o que o deixa muito próximo ao quadro-negro.Professor Gilberto: Você é pedreiro, não? Joelton: Sou.

Enquanto desenha no quadro um retângulo e indica as medidas de seu comprimento pergunta:

5 m

4 m

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Professor Gilberto: Para colocar um piso, sem rodapé, quantas caixas de dois metros você vai precisar?Roberto: Vinte metros! Professor Gilberto [olhando para Joelton]: Imagine que a Sonia chamou você para colocar um piso em sua casa...O professor Gilberto muda de estratégia. Dirige-se ao quadro, aponta para a figura do retângulo e as medidas e faz uma pergunta em voz alta:Professor Gilberto: De quantas caixas de dois metros você precisa para fazer isso?Joelton [falando baixinho e olhando somente para o professor Gilberto]: Vinte?Professor Gilberto [olhando para “a turma”]: Quantas vezes o dois cabe no vinte?Roberto: Vinte?Joelton: Vinte?Roberto: Dez! São dez!Professor Gilberto: Cada caixa tem dois metros, então, se vou cobrir vinte metros, de quantas caixas vou precisar?E a seguir escreve no quadro:

2 + 2 + 2 + 2 + 2 + 2 + 2 + 2 + 2 + 2

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Professor Gilberto [contando, ordenadamente, cada número dois que escreveu no quadro]: um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove, dez.Joelton, sem sair de seu lugar, chama o professor e fala baixinho: Eu não preciso fazer conta. Eu só preciso saber a área que vou cobrir. O vendedor da loja de material é que faz... Tem caixa de um e meio, tem caixa de dois...Professor Gilberto [volta ao quadro e fala alto]: Mas, não é bom deixar sobrar alguma coisa? Não tem sempre quebra de alguns pisos?Joelton [fala alto]: Sim. Uma sobra de dois dá. Professor Gilberto [escrevendo novas medidas no quadro]: E se eu tiver onze por dois? Qual deverá ser a minha sobra?Joelton: A mesma! Dois metros!Professor Gilberto: Qual é a área do retângulo?Joelton: Vinte e dois metros.Professor Gilberto: Então? Qual deve ser a minha sobra?Joelton: A mesma! Dois metros bastam!Joelton e o professor Gilberto continuam discutindo a questão da sobra e não chegam a um consenso, uma vez que, para Joelton, bastam dois metros e o professor Gilberto afirma que deve haver uma proporcionalidade entre a área e a sobra e que quanto maior a área, maior deveria ser a sobra.

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Situação problema 2“Problema dos talheres”

Dona Maria ia receber visitas em sua casa e ao arrumar a mesa percebeu que não tinha talheres suficientes para receber as visitas. Dona Maria chamou seu filho Joãozinho e pediu para que ele fosse à loja comprar mais talheres, porém Dona Maria deu uma recomendação ao filho. – Joãozinho, só compre talheres naquela loja se o preço de um talher não for maior que R$ 5,00.

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Joãozinho foi pra loja repetindo o preço máximo na cabeça mas, ao chegar à loja ele descobriu que lá não vendia talheres avulsos, e sim pacotes com vários talheres juntos. Os três pacotes disponíveis eram os seguintes:•Um pacote com uma faca, duas colheres e três garfos custando R$ 23,50.•Um pacote com duas facas, cinco colheres e seis garfos custando R$ 50,00.•Um pacote com duas facas, três colheres e quatro garfos custando R$ 36,00.

As únicas informações que o vendedor soube dar eram que o preço de cada talher era o mesmo e todos os pacotes, ou seja, uma faca tinha um só preço em todos os pacotes, a mesma situação para a colher e o garfo e, que o preço de uma faca, de uma colher e de um garfo eram diferentes entre si.E agora, quanto será que custa cada talher? Será que Joãozinho pode comprar algum desses pacotes atendendo à restrição imposta pela mãe?

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Situação problema 3“A costureira”

Ana trabalha como costureira, sempre divide seus ganhos com a sua comadre, também costureira. Quem “fecha” o serviço ganha um pouco mais, “coisa pouca, dependendo do valor da encomenda”.

Ana havia fechado uma encomenda de um vestido e duas blusas e iria receber pelo serviço R$ 55,00. Quando foi perguntada sobre quanto ela e a sua comadre iriam receber, ela disse:- Fico com dez reais e o resto a gente racha.Torno a perguntar quanto cada uma irá receber e ela diz que a comadre vai receber R$ 22,50.

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Algumas considerações

•Ana não sabe realizar as operações simples no conjunto dos números naturais utilizando os algoritmos.•Também não sabe usar a calculadora.•Quando falamos de divisão, ela acha uma dificuldade. •Para ela, a divisão por 2 é o “racha”, e o resultado é correto, feito de cabeça.•Não utiliza nenhum registro no papel para dar o resultado.•Sugeri o “racha” de outras quantias em dinheiro e todos os resultados estão sempre corretos.

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Situação problema 4“A experiência com Maria”

O fato aconteceu numa aula de Matemática em EJA* com alunos que cursam a 1ª Unidade de Progressão do Bloco I, correspondente à 5ª série do Ensino Fundamental regular.

O conteúdo ministrado era divisão dos números naturais e seus métodos de resolução, longo e curto. Após algumas situações problemas, o professor propôs a seguinte divisão:

12015 : 10 =

* EJA - Educação de Jovens e Adultos

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Uma das alunas, de nome MARIA, efetuou a conta usando o seguinte processo:

1 2 0 1 5 1 0 -1 0 1 2 0 1 * CÁLCULOS: 2 0 a) IIIII IIIII II - 2 0 b) IIIII IIIII IIIII IIIII 0 0 1 5 c) I - 1 0 d) IIIII IIIII IIIII 0 5

Após observar, explique o que Maria fez?

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Situação problema 5“A porcentagem de Lenohn”

Lenohn cursou até a 5ª série em uma escola pública. Quando passou para série seguinte, perdeu a mãe e, junto com o pai, precisou manter a casa e seus irmãos menores.

Parou de estudar e começou a trabalhar como trocador de Kombi ganhando um salário mínimo mais 1% do faturamento do dia. Para continuar os estudos, Lenohn matriculou-se em 2005 no PEJA*, cursando a 2ª Unidade de Progressão do Bloco I, correspondente à 6ª série.

* PEJA - Programa de Educação de Jovens e Adultos, da SME da Prefeitura do Rio de Janeiro

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O professor iniciou fazendo uma revisão dos números racionais nas formas fracionária e decimal, com jogos, introduziu as 4 operações básicas e apresentou situações-problemas.Após um mês e meio de aula (6 dias/aula) existiam condição de estudar as porcentagens, seus cálculos e suas aplicações. Foi proposto à turma, através de uma situação problema, o seguinte exercício:

Cálculos propostos/esperados:

de R$ 50,00 = R$ 10,00100

20

100

000.1

100

5020

Calcular 20 % de R$ 50, 00

Cálculos de Lenohn:

10% de R$ 50,00 são R$ 5,001% de R$ 50,00 são R$ 0,50Então, 20% = 20 x 1% = 20 x R$ 0,50Portanto, R$ 10,00

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DEBATE COLETIVO

19h 30min – 20h 10min

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A opção pela Etnomatemática

Foto de Lia Lubambo em http://bonsfluidos.abril.com.br/livre/edicoes/0115/10/01.shtml

20h 10min – 21h

DEBATECOLETIVO

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19h 30min – 20h 10min

A abordagem etnomatemática e sua dimensão pedagógica

EtnomatemáticaA aproximação etimológica a que nos referimos nos permite dizer que etnomatemática é a arte ou técnica (techné=tica) de explicar, de entender, de se desempenhar na realidade (matema), dentro de um contexto cultural próprio (etno).

(D’Ambrosio, 1993:9)

D´Ambrosio (2001) Dimensão educacional da etnomatemática

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Aqui reside um desafio: a herança cultural africana deveria ser o ponto de partida para o desenvolvimento do currículo em matemática de maneira a melhorar sua qualidade, aumentar a autoconfiança cultural e social de todos os alunos, tanto meninas como meninos. A pesquisa etnomatemática pode contribuir para encontrar algumas respostas.

(Gerdes, 1995:199)

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Para Gelsa Knijnik, a abordagem etnomatemática é

...a investigação das tradições, práticas e concepções de um grupo social subordinado (quanto ao volume e composição de capital social, cultural e econômico) e o trabalho pedagógico que se desenvolve com o objetivo de que o grupo

- interprete e decodifique seu conhecimento;- adquira o conhecimento produzido pela

matemática acadêmica e estabeleça comparações entre o seu conhecimento e o conhecimento acadêmico, analisando as relações de poder envolvidas no uso destes dois saberes. (KNIJNIK, 1996:88)

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Uma proposta educacional centrada na Etnomatemática reclama por uma transformação na organização escolar, nas relações tempo/espaço, na inclusão de espaços para a diversidade, para a valorização do saber cotidiano, para a compreensão do currículo como um sistema de valores e identidade, o qual representa conhecimentos socialmente válidos e, mais ainda, que permita que os alunos e professores sejam agentes desse processo.

(Monteiro, Orey & Domite, 2004, p.31)

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• Relações da etnomatemática com o campo educacional contraste entre a idéia de aceitação de múltiplas formas de representar quantitativamente e espacialmente o mundo e a idéia de uma matemática, única, universal, presente nos currículos escolares homogeneizadores.

• Indiferença de alguns educadores matemáticos quanto à influência da cultura na compreensão das idéias matemáticas. (Domite, 2005)

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• Trabalhar em etnomatemática numa perspectiva educacional lidar com a contradição entre a matemática escolar homogênea e a diversidade de saberes matemáticos presentes nas salas de aula

• Maioria dos trabalhos em etnomatemática etnografias de grupos específicos (como nações indígenas, grupos profissionais, entre outros), que compartilham saberes, técnicas e práticas que podemos associar à matemática.

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BIBLIOGRAFIA

D’ AMBRÓSIO, U.. Etnomatemática: elo entre as tradições e a modernidade . Belo Horizonte. Autêntica, 2001.

DOMITE, M. C. S.. Da compreensão sobre formação de professores e professoras numa perspectiva etnomatemática. In: G. Knijnik, F. Wanderer, F. & C. J. Oliveira (orgs). Etnomatemática: currículo e formação de professores. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2004.

FANTINATO, M. C.C.B. Contribuições da etnomatemática na educação de jovens e adultos: algumas reflexões iniciais. In: J. P. M. Ribeiro, M. C. S. Domite & R. Ferreira (orgs). Etnomatemática: papel, valor e significado. Porto Alegre, RS. Zouk, 2004.

FANTINATO, M. C. C. B. & SANTOS, R. K. Etnomatemática e prática docente na educação de jovens e adultos. Anais do IX ENEM. Belo Horizonte, 2007.

FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1974.

MONTEIRO, A., OREY, D. & DOMITE, M. C. S. . Etnomatemática: papel, valor e significado. In: J. P. M. Ribeiro, M. C. S. Domite & R. Ferreira (orgs). Etnomatemática: papel, valor e significado. Porto Alegre, RS. Zouk, 2004.

TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. 8ª ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.