Estudos sobre o folclore no brasil

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Biblioteca Virtual do Governo do Estado de São Paulo http://www.bv.sp.gov.br [email protected] ESTUDOS SOBRE FOLCLORE NO BRASIL: breve panorama A palavra “folclore” foi criada, em 22 de agosto 1846, pelo pesquisador de cultura européia e antiquário inglês William John Thoms (1803-1885), para denominar um campo de estudos até então identificado como “antiguidades populares” ou “literatura popular”. Essa proposta foi publicada no jornal londrino “The Atheneum” e tinha como objetivo designar os registros dos cantos, das narrativas, dos costumes e usos dos tempos antigos. Thoms escolheu duas palavras de origem saxônica: “Folk”, que significa povo, e “Lore”, que significa saber; formando assim o “folk-lore”, ou a “sabedoria do povo”. Com o tempo, a palavra foi sendo utilizada sem o hífen, tornando-se simplesmente “folklore” ou “folclore”, como foi usada no Brasil. Inclusive o dia do folclore – 22 de agosto – lembra o advento do conceito criado por Thoms. Nesse sentido amplo de “saber do povo”, a idéia de folclore designa muito simplesmente as formas de conhecimento nas criações culturais dos diversos grupos de uma sociedade. Em princípio, pensa-se o folclore a partir do conjunto de tradições culturais transmitidas, em geral, de forma oral e sem influência acadêmica, tais como as danças, músicas, manifestações religiosas, festas tradicionais, brincadeiras infantis, superstições, lendas, mitos, entre outras. Tem-se aí o contraponto entre a chamada cultura erudita e a cultura popular. Mas essa delimitação nunca é muito clara, pois onde começa e termina o folclore? Considera-se, por exemplo, a Festa do Divino uma manifestação do folclore ou cultura popular, mas o que pensar do desfile de escolas de samba? Uma coisa que é clara é que o conceito de folclore e do que pode ser considerado folclore foi sendo modificado ao longo da história, de acordo com as discussões teóricas e vieses de várias linhas de pensamento. Para se ter uma idéia, no Brasil – no início do século XX – os estudos de folclore incidiam basicamente sobre a literatura oral, sobretudo a poesia popular, guiadas por correntes filosóficas e científicas vigentes na Europa. O musicólogo e folclorista brasileiro Renato Almeida (1895 – 1981) propôs uma aproximação com a Etnologia ou a Antropologia Cultural, onde o foco de estudo não fosse somente a literatura, mas outros aspectos da vida social e material, como o artesanato, as indumentárias, os instrumentos musicais e suas formas de execução, as danças, a culinária, etc. Mário de Andrade (1893 – 1945) também concordou com esta proposta, e buscou diálogo com as ciências sociais e humanas. Ele estruturou um curso de formação de folcloristas para orientar trabalhos de campo e criou a Sociedade de Etnografia e Folclore, que organizou um guia classificatório de folclore e propôs diretrizes para equipar museus de folclore. Em 1938, quando estava à frente do Departamento de Cultura de São Paulo, Mário de Andrade enviou um grupo de pesquisadores ao Norte e Nordeste para que registrassem, durante seis meses, os cantos e danças populares dessas regiões. A idéia era documentar com filmes, fotos e discos as manifestações encontradas por Mário de Andrade dez anos antes. Cada seção de gravação (aproveitada, também, para fotografias e filmagem) era antecedida por pesquisas orais, complementadas por registros mecânicos.

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ESTUDOS SOBRE FOLCLORE NO BRASIL: breve panorama

A palavra “folclore” foi criada, em 22 de agosto 1846, pelo pesquisador de cultura

européia e antiquário inglês William John Thoms (1803-1885), para denominar um campo de estudos até então identificado como “antiguidades populares” ou “literatura popular”. Essa proposta foi publicada no jornal londrino “The Atheneum” e tinha como objetivo designar os

registros dos cantos, das narrativas, dos costumes e usos dos tempos antigos. Thoms escolheu duas palavras de origem saxônica: “Folk”, que significa povo, e “Lore”, que significa saber; formando assim o “folk-lore”, ou a “sabedoria do povo”. Com o tempo, a palavra foi sendo utilizada sem o hífen, tornando-se simplesmente “folklore” ou “folclore”, como foi usada no Brasil. Inclusive o dia do folclore – 22 de agosto – lembra o advento do conceito criado por Thoms.

Nesse sentido amplo de “saber do povo”, a idéia de folclore designa muito simplesmente as formas de conhecimento nas criações culturais dos diversos grupos de uma sociedade. Em princípio, pensa-se o folclore a partir do conjunto de tradições culturais transmitidas, em geral, de forma oral e sem influência acadêmica, tais como as danças, músicas, manifestações religiosas, festas tradicionais, brincadeiras infantis, superstições, lendas, mitos, entre outras. Tem-se aí o contraponto entre a chamada cultura erudita e a cultura popular. Mas essa delimitação nunca é muito clara, pois onde começa e termina o folclore? Considera-se, por exemplo, a Festa do Divino uma manifestação do folclore ou

cultura popular, mas o que pensar do desfile de escolas de samba? Uma coisa que é clara é que o conceito de folclore e do que pode ser considerado

folclore foi sendo modificado ao longo da história, de acordo com as discussões teóricas e vieses de várias linhas de pensamento. Para se ter uma idéia, no Brasil – no início do século XX – os estudos de folclore incidiam basicamente sobre a literatura oral, sobretudo a poesia popular, guiadas por correntes filosóficas e científicas vigentes na Europa.

O musicólogo e folclorista brasileiro Renato Almeida (1895 – 1981) propôs uma aproximação com a Etnologia ou a Antropologia Cultural, onde o foco de estudo não fosse somente a literatura, mas outros aspectos da vida social e material, como o artesanato, as indumentárias, os instrumentos musicais e suas formas de execução, as danças, a culinária, etc.

Mário de Andrade (1893 – 1945) também concordou com esta proposta, e buscou diálogo com as ciências sociais e humanas. Ele estruturou um curso de formação de folcloristas para orientar trabalhos de campo e criou a Sociedade de Etnografia e Folclore,

que organizou um guia classificatório de folclore e propôs diretrizes para equipar museus de folclore.

Em 1938, quando estava à frente do Departamento de Cultura de São Paulo, Mário

de Andrade enviou um grupo de pesquisadores ao Norte e Nordeste para que registrassem, durante seis meses, os cantos e danças populares dessas regiões. A idéia era documentar com filmes, fotos e discos as manifestações encontradas por Mário de Andrade dez anos

antes. Cada seção de gravação (aproveitada, também, para fotografias e filmagem) era antecedida por pesquisas orais, complementadas por registros mecânicos.

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Mais tarde, em 1946, Renato Almeida - que nesse momento era presidente do Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura (IBEC), do Ministério do Exterior e vinculada à Unesco – criou a Comissão Nacional de Folclore (CNF).

Luís da Câmara Cascudo (1898 – 1986) também se destacou como grande estudioso

e divulgador do folclore brasileiro, produzindo uma obra fundamental para os estudos

etnográficos e antropológicos no Brasil. O seu Dicionário do Folclore Brasileiro (de 1954) é referência mundial para qualquer estudo sobre o assunto.

Em 1951, a Carta do Folclore foi aprovada no I Congresso Brasileiro de Folclore. Ela dizia entre outras coisas que "constitui o fato folclórico a maneira de pensar, sentir e agir de um povo, preservada pela tradição popular e pela imitação, e que não seja diretamente influenciada pelos círculos eruditos e instituições que se dedicam, ou à renovação e conservação do patrimônio científico humano, ou à fixação de uma orientação religiosa e filosófica". Nesse documento registrou-se a definição do fato folclórico, elaborado com o consenso dos folcloristas brasileiros.

Em decorrência das grandes transformações sociais e do avanço das ciências, nas

últimas décadas, estudiosos da cultura popular propuseram uma releitura da Carta de 1951. Em dezembro de 1995, então, realizou-se o VIII Congresso Brasileiro do Folclore, em Salvador (BA). Neste congresso foram atualizados os conceitos e considerou-se que: "o folclore é o conjunto de criações culturais de uma comunidade, baseado nas suas tradições expressas individual ou coletivamente, representativo de sua identidade social. Constituem-se fatores de identificação da manifestação folclórica: aceitação coletiva, tradicionalidade, dinamicidade, funcionalidade". FONTES:

- Conceito de Folclore (Roberto Benjamim, presidente da Comissão Pernambucana de

Folclore) http://www.unicamp.br/folclore/Material/extra_conceito.pdf - Folclore/ cultura popular: aspectos de sua história (Cáscia Frade) http://www.unicamp.br/folclore/Material/extra_aspectos.pdf - Missão de Pesquisas Folclóricas – Mário de Andrade http://www.centrocultural.sp.gov.br/mario2/index.htm Página que apresenta o percurso e o resultado da missão de pesquisa folclórica que Mário de Andrade e sua equipe desenvolveram em 1938, nas regiões do Norte e Nordeste do país

- Câmara Cascudo (Marcos Faerman) http://www.histedbr.fae.unicamp.br/navegando/glossario/verb_b_camara_cascudo.htm

- Dia do Folclore (Site Educaterra) http://educaterra.terra.com.br/almanaque/datas/folclore.htm - Carta do Folclore Brasileiro de 1995 (íntegra) http://www.fundaj.gov.br/geral/folclore/carta.pdf