ESTUDO SOBRE A PSICOPATIA ENTRE OS ANOS DE 1992 A 2012: … Saberes... · 2018-06-28 · ESTUDO...
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ESTUDO SOBRE A PSICOPATIA ENTRE OS ANOS DE 1992 A 2012: REVISÃO
BIBLIOGRÁFICA
Fernanda Miranda Cavalcante1 Abraão Roberto Fonseca²
RESUMO: Este artigo tem por objetivo investigar os estudos realizados sobre a psicopatia ao longo dos últimos dez anos, através de uma revisão bibliográfica com diversos autores que buscam conceituar o que é esta patologia, o método mais eficaz para a avaliação e a busca pelo tratamento. Foram coletados 8 (oito) artigos da fonte Scielo (Scientific Electronic Library) e 1 (um) artigo do bireme. Os artigos obedeceram aos critérios de serem publicados nacionalmente, nos últimos dez anos (2002-2012), e com o descritor psicopatia. Conclui-se que ao longo desses dez últimos anos ainda não se chegou a uma definição universal da psicopatia. Percebe-se que houve avanços quanto a sua concepção e o que se pode definir com a leitura da maioria dos autores é que as causas da psicopatia envolvem não só um aspecto, mas vários, como o biológico, o afetivo, o histórico, o ambiente.
Palavras-Chave: Psicopatia. Revisão. Padrão comportamental. 2
INTRODUÇÃO
Esta pesquisa teve por objetivo investigar os estudos realizados sobre a
psicopatia ao longo dos últimos dez anos, através de uma revisão bibliográfica com
diversos autores que buscam conceituar o que é esta patologia, o método mais
eficaz para a avaliação e a busca pelo tratamento.
No decorrer do trabalho será apresentado o conceito de psicopatia de acordo
com o DSM-IV e outros autores. Dessa forma, Soeiro e Gonçalves (2010) afirmam
ser a psicopatia uma das perturbações da personalidade mais investigadas, pois as
¹ Possui graduação em Psicologia - Faculdades Integradas de Cacoal (2011). Especialista em
Psicologia Organizacional com ênfase em Gestão Estratégica de Pessoas – Faculdades Associadas de Ariquemes (FAAR) – 2014. ² Mestre em Psicologia: Teoria e Pesquisa do Comportamento - Universidade Federal do Pará (UFPA) (2010).
2
consequências dos atos destes indivíduos afetam negativamente a população
convivente com os mesmos. Gonçalves (1999b apud Soeiro e Gonçalves, 2010) diz
que a psicopatia está relacionada diretamente com o conceito de “loucos” e
“criminosos”.
Cleckley é um dos autores que mais contribuíram para os estudos da
psicopatia, já que seus conceitos perduram até os dias de hoje, pois ele considera
que a principal característica para a psicopatia é a falta de empatia, o que
esclareceria o fato de altas condutas antissociais nestes indivíduos (SOEIRO E
GONÇALVES, 2010).
Nos estudos de Hare (1970 apud Soeiro e Gonçalves, 2010) percebe-se uma
influência dos trabalhos de Cleckley, pois pra ele o psicopata é alguém com total
falta de empatia, que não se preocupa com os outros, que manipulam os outros para
assim alcançar seus objetivos, sem cunho social, correspondem a desenvolvimento
pessoal. Eles ainda possuem uma cordialidade ilusória que faz com que os outros
acreditem nas suas boas intenções e na sua pureza.
Ainda para Hare (1980, 1991; Harpur, Hasktian e Hare, 1988; Hart, Hare e
Harpur, 1992 apud Soeiro e Gonçalves, 2010) o constructo de psicopatia é
compreendido através de dois fatores interrelacionados, o clínico que define a
“perturbação da personalidade” e o outro mais comportamental que diz sobre o estilo
de vida antissocial do psicopata, comportamentos estes que, em geral, não são
apreendidos em uma rotina clínica, mas observacionalmente podem ser detectados
e mensurados.
Assim, após várias investigações do termo psicopatia, percebe-se que houve
muitas influências para a concepção do mesmo de acordo com suas características,
o que fez com que se originasse mais de um constructo. Entretanto, mesmo com
várias definições, observa-se relativamente uma evolução em relação a este
constructo (GONÇALVES, 2000; SOEIRO, 2006 apud SOEIRO E GONÇALVES,
2010).
O trabalho teve como proposta apresentar o conceito de psicopatia, para que
assim possa conhecer a evolução que este conceito teve ao longo dos anos e se já
há indicativos de avaliação e tratamento eficaz.
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1. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Foram coletados 8 (oito) artigos da fonte Scielo (Scientific Electronic Library) e
1 (um) artigo do bireme.
Os artigos obedeceram aos critérios de serem publicados nacionalmente, nos
últimos dez anos (2002-2012), e com o descritor psicopatia.
2 ANÁLISE DOS DADOS
A partir da leitura dos documentos selecionados foi criado o Quadro I -
Seleção e Organização de Artigos, com os seguintes elementos: Ano/fonte; Título;
Autor; Objetivos; Metodologia e Resultados. Segue o quadro abaixo.
Quadro I Seleção e organização dos artigos
Ano/Fonte Autor Título Objetivos Metodologia Resultados
2006/Scielo. MORANA, H. CP;
STONE, M. H;
ABDALLA-FILHO,
E.
Transtornos
de
Personalidade,
Psicopatia e
Serial Killers.
Apresentar as
características
básicas dos
diversos
transtornos
específicos de
personalidade, mas
centrando-se no
transtorno de
personalidade
antissocial, fazendo
sua diferenciação
com psicopatia.
Revisão
Bibliográfica.
Enquanto o
transtorno de
personalidade
antissocial é um
diagnóstico
médico, pode-se
entender o termo
“psicopatia”,
pertencente à
esfera psiquiátrico-
forense, como um
“diagnóstico legal”.
Não se pode falar
ainda de
tratamento eficaz
para os chamados
“serial killers”.
2006/Scielo AMBIEL, R. A. M. Diagnóstico de
psicopatia: a
Apresentar o
manual escala
Revisão
Bibliográfica.
Em virtude da
importância social
4
avaliação
psicológica no
âmbito judicial.
Hare PCL: critérios
para pontuação de
psicopatia –
revisados na
versão brasileira
por Hilda Morana.
que os
instrumentos de
avaliação
psicológica têm, a
disponibilização
desse instrumento
para os
profissionais das
áreas de psicologia
e psiquiatria
forense se faz de
grande utilidade
para avaliação da
personalidade de
criminosos, área
em que a
psicologia tem
tanto a contribuir e
a crescer.
2006/Bireme. SCHMITT, R;
PINTO, T. P;
GOMES, K. M;
QUEVEDO, J;
STEIN, A.
Personalidade
Psicopática
em uma
amostra de
adolescentes
infratores
brasileiros.
Comparar a
psicopatia, a
reincidência
criminal e a história
de maus-tratos
entre adolescentes
infratores versus a
vida e outros
adolescentes
infratores.
Estudo
transversal,
controlado,
utilizando a
escala Hare’s
Psychopathy
Checklist
Revised (PCL
– R) para
avaliação de
psicopatia em
uma amostra
de
adolescentes
cumprindo
medida
socioeducativa
em
decorrência da
prática de ato
infracional.
Os adolescentes
que cometeram
crimes contra a
vida apresentaram
prevalência de
psicopatia maior do
que outros
adolescentes
infratores – RP =
2,86 (IC95% 1,49 –
5,47). A
reincidência
criminal foi mais
prevalente entre os
adolescentes que
possuíam
psicopatia e
história de crimes
contra a vida – RP
= 2,96 (IC95% 1,32
– 6,60). O estudo
5
não conseguiu
demonstrar
prevalência
significativa de
história de abuso
na infância entre os
adolescentes com
psicopatia em
comparação ao
grupo-controle –
RP = 0,88 (IC95%
0,66 – 1,15).
2009/Scielo. HAUCK FILHO, N;
TEIXEIRA, M. A.
P; DIAS, A. C. G.
Psicopatia: O
construto e
sua avaliação.
Revisão seletiva da
literatura da
psicopatia
enfocando algumas
dificuldades
relacionadas ao
conceito e sua
avaliação.
Revisão
Bibliográfica.
A psicopatia é
apresentada como
um construto
resultante de
décadas de
pesquisas clínicas
e empíricas cuja
possibilidade de
avaliação na
população geral se
justifica por sua
natureza
dimensional.
Argumenta-se que
a psicopatia e
Transtorno de
Personalidade
Antissocial são
construtos
diversos, embora
correlacionados.
2009/Scielo HENRIQUES, R.
P.
De H. Cleckley
ao DSM – IV –
TR: a
evolução do
conceito de
psicopatia
rumo à
Discutir os manuais
nosográficos CID –
10 e DSM – IV –
TR entre si quanto
aos critérios
diagnósticos
propostos para a
Revisão
Bibliográfica.
A psicopatia
certamente é uma
das anomalias da
personalidade que
apresenta
consequências
sociais mais
6
medicalização
da
delinquência.
psicopatia,
assinalando as
consequências de
sua
operacionalização,
promovida,
sobretudo pelo
DSM.
graves, dadas as
condutas
antissociais dos
psicopatas,
associadas ao
delito e ao crime.
Nesse sentido,
pode-se questionar
se a medicalização
desta condição não
refletiria um esforço
do Estado
republicano de
reforçar o seu
controle por outros
meios, para além
daquele já exercido
pelo direito
positivo? Um misto
de psiquiatria e
Poder Judiciário,
tratamento e
punição,
certamente
mostrar-se-ia mais
eficaz em sua
função de controle
social desses
desviantes.
2010/Scielo. GOMES, C. C;
ALMEIDA, R. M.
M. DE.
Psicopatia em
Homens e
Mulheres
Discutir as
características da
psicopatia e de
forma específica,
buscar identificar
as diferenças
existentes entre os
sexos.
Revisão
Bibliográfica.
Esse transtorno ocorre tanto em homens quanto em mulheres, mas cada sexo apresenta peculiaridades, principalmente em relação à forma do comportamento manifesto. Os principais
norteadores desta
pesquisa foram à
violência e a
7
criminalidade, que
sempre estiveram
presentes nas mais
diferentes
sociedades, mas
que, atualmente,
vem apresentando
ocorrências
progressivamente
mais numerosas.
Suas repercussões
atingem cada vez
mais o convívio
social. Quando a
psicopatia ocorre
em mulheres, a sua
identificação
parece ser mais
difícil, pois existem
diferenças na
apresentação
clínica dos
comportamentos
antissociais,
principalmente
quando se trata da
agressividade,
característica mais
visível e mais
presente nos
homens que nas
mulheres.
2011/Scielo. DAVOGLIO, T. R;
GAUER, G. J. C;
VASCONCELLOS,
S. J. L; LÜHRING,
G.
Medida
Interpessoal
de Psicopatia
(IM –P):
estudo
preliminar no
contexto
brasileiro.
Descrever
resultados
preliminares sobre
a investigação de
aspectos
interpessoais da
psicopatia
mediante a
Estudo
transversal,
descritivo e
correlacional.
Os resultados
estatísticos, obtidos
através do
coeficiente de
concordância de
Kendall, revelaram
grau de
concordância
8
utilização da IM –
P, incluindo as
etapas de
tradução/adaptação
e avaliação de
confiabilidade
interavaliadores da
IM – P, em uma
amostra de
adolescentes
brasileiros.
interavaliadores
elevado e
satisfatório para os
escores totais da
IM – P (W = 0,84; p
< 0,001). Alguns
itens da escala que
apresentaram
resultados
discrepantes foram
discutidos e
avaliados
isoladamente.
2011/Scielo. NUNES, L. M. Sobre a
psicopatia e
sua avaliação.
Explorar as
variadas
abordagens ao
conceito de
psicopatia e
conciliar diferentes
pontos de vista,
visando à
apresentação de
uma proposta de
avaliação
integrada.
Revisão
Bibliográfica.
Poder-se-á
compreender
suficientemente o
sujeito, em uma
avaliação que
integre as
informações
fornecidas pela
vertente clínica,
sem perda dos
aspectos mais
objetivos facultados
pela análise
forense. Apenas
com essa
complementaridade
das duas análises,
a clínica e a
padronizada, se
poderá alcançar a
compreensão do
indivíduo portador
de psicopatia.
Para a análise pormenorizada dos resultados contidos no quadro anterior, foi
criado o Quadro II – Análise de Artigos por Categorias, com os seguintes elementos:
9
Categoria; Subcategoria; Pesquisa/autor/ano; Resultados e Discussão. Segue o
quadro abaixo.
Quadro de análise dos artigos por categorias
Categoria 1 – Explicação Intrínseca – Biológica Pesquisa / Autor / Ano Resultados Discussão Psicopatia em homens e mulheres. GOMES, C. C; ALMEIDA, R. M. M. DE. 2010.
Esse transtorno ocorre tanto em homens quanto em mulheres, mas cada sexo apresenta peculiaridades, principalmente em relação à forma do comportamento manifesto. Os principais norteadores desta pesquisa foram à violência e a criminalidade, que sempre estiveram presentes nas mais diferentes sociedades, mas que, atualmente, vem apresentando ocorrências progressivamente mais numerosas. Suas repercussões atingem cada vez mais o convívio social. Quando a psicopatia ocorre em mulheres, a sua identificação parece ser mais difícil, pois existem diferenças na apresentação clínica dos comportamentos antissociais, principalmente quando se trata da agressividade, característica mais visível e mais presente nos homens que nas mulheres.
Transtornos de Personalidade, Psicopatia e Serial Killers. MORANA, H. CP; STONE, M. H; ABDALLA-FILHO, E. 2006.
Enquanto o transtorno de personalidade antissocial é um diagnóstico médico, pode-se entender o termo “psicopatia”, pertencente à esfera psiquiátrico-forense, como um “diagnóstico legal”. Não se pode falar ainda de tratamento eficaz para os chamados “serial killers”.
Categoria 1 – Explicação Intrínseca – Inconsciente Pesquisa / Autor / Ano Resultados Discussão Personalidade psicopática em uma amostra de adolescentes infratores brasileiros. SCHMITT, R; PINTO, T. P; GOMES, K. M; QUEVEDO, J; STEIN, A. 2006.
Os adolescentes que cometeram crimes contra a vida apresentaram prevalência de psicopatia maior do que outros adolescentes infratores – RP = 2,86 (IC95% 1,49 – 5,47). A reincidência criminal foi mais prevalente entre os adolescentes que possuíam psicopatia e história de crimes contra a vida – RP = 2,96 (IC95% 1,32 – 6,60). O estudo não conseguiu demonstrar prevalência significativa de história de abuso na infância entre os adolescentes com psicopatia em comparação ao grupo-controle – RP = 0,88 (IC95% 0,66 – 1,15).
De H. Cleckley ao DSM – IV – TR: a evolução do conceito de psicopatia rumo à medicalização da delinquência. HENRIQUES, R. P. 2009.
A psicopatia certamente é uma das anomalias da personalidade que apresenta conseqüências sociais mais graves, dadas as condutas antissociais dos psicopatas, associadas ao delito e ao crime. Nesse sentido, pode-se questionar se a medicalização desta condição não refletiria um esforço do Estado republicano de reforçar o seu controle por outros meios, para além daquele já exercido pelo direito positivo? Um misto de psiquiatria e Poder Judiciário, tratamento e punição, certamente mostrar-se-
10
ia mais eficaz em sua função de controle social desses desviantes.
Psicopatia: O Construto e sua Avaliação. HAUCK FILHO, N; TEIXEIRA, M. A. P; DIAS, A. C. G. 2009.
A psicopatia é apresentada como um construto resultante de décadas de pesquisas clínicas e empíricas cuja possibilidade de avaliação na população geral se justifica por sua natureza dimensional. Argumenta-se que a psicopatia e Transtorno de Personalidade Antissocial são construtos diversos, embora correlacionados.
Categoria 2 – Explicação Extrínseca – Histórico Pesquisa / Autor / Ano Resultados Discussão Sobre a Psicopatia e sua Avaliação. NUNES, L. M. 2011.
Poder-se-á compreender suficientemente o sujeito, em uma avaliação que integre as informações fornecidas pela vertente clínica, sem perda dos aspectos mais objetivos facultados pela análise forense. Apenas com essa complementaridade das duas análises, a clínica e a padronizada, se poderá alcançar a compreensão do indivíduo portador de psicopatia.
Categoria 2 – Explicação Extrínseca – Interpessoal Pesquisa / Autor / Ano Resultados Discussão Medida Interpessoal de Psicopatia (IM – P): estudo preliminar no contexto brasileiro. DAVOGLIO, T. R; GAUER, G. J. C; VASCONCELLOS, S. J. L; LÜHRING, G. 2011.
Os resultados estatísticos, obtidos através do coeficiente de concordância de Kendall, revelaram grau de concordância interavaliadores elevado e satisfatório para os escores totais da IM – P (W = 0,84; p < 0,001). Alguns itens da escala que apresentaram resultados discrepantes foram discutidos e avaliados isoladamente.
Diagnóstico de Psicopatia: A Avaliação Psicológica no Âmbito Judicial. AMBIEL, R. A. M. 2006.
Em virtude da importância social que os instrumentos de avaliação psicológica têm, a disponibilização desse instrumento para os profissionais das áreas de psicologia e psiquiatria forense se faz de grande utilidade para avaliação da personalidade de criminosos, área em que a psicologia tem tanto a contribuir e a crescer.
A coluna ‘Discussão’ deste quadro será desenvolvida de forma detalhada na
seção Resultados e Discussão.
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Ao analisar os artigos e de acordo com os seus significados, encontraram-se
as seguintes categorias que serão apresentadas de acordo com a categorização e
seus argumentos apresentados a seguir.
Em relação à categoria explicação intrínseca – biológica
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Como resultado, observa-se que os ditos psicopatas demonstraram indícios
de traços psicopáticos, iniciando-se na infância e alcançando os 18 anos, durante
este tempo os indicativos são nomeados como transtorno de conduta, pois não se
deve diagnosticar a psicopatia antes dos 18 anos. (DSM – IV, 2002). Esses dados
comprovam o que o Manual da APA (2002; KAPLAN; SADOCK; GREBB, 2003 apud
GOMES E ALMEIDA 2010) diz sobre estes desvios, que vão se estruturando ao
longo da infância. Na maior parte das vezes alguns dos sinais podem ser analisados
na infância e na adolescência, através de condutas agressivas, que durante esta
fase é caracterizado como transtornos de conduta.
Ao caracterizar a categoria como uma das explicações da psicopatia a
condição intrínseca, caracterizada como biológica Gomes e Almeida (2010)
confirmam os dados dizendo que a psicopatia é uma condição mental patológica,
que se caracteriza por desvios, especialmente, de “caráter que desencadeiam
comportamentos antissociais”. Além destes estudos, Brenan e Raine (1997; YANG
et. al., 2005 apud GOMES e ALMEIDA, 2010) encontraram uma ligação entre
“lesões pré-frontais e comportamentos impulsivos, agressividade e inadequação
social”.O que permite afirmar que esses comportamentos são característicos dos
ditos psicopatas. Um exemplo desta situação é quando um indivíduo se mostra
dentro dos padrões considerados normais e após o acidente corrompendo o córtex
começa a demonstrar inadequação social (DEL–BEM, 2005 apud GOMES E
ALMEIDA, 2010). Contudo, de acordo com esta pesquisa percebe-se que a
psicopatia se apresenta em uma explicação extrínseca e biológica ao mesmo tempo.
Desta forma, pode-se dizer que há um “componente cerebral” submergido as
condutas dos psicopatas (RAINE et al., 1994; SOUZA et al., 2008 apud GOMES E
ALMEIDA, 2010).
Ainda contextualizando a psicopatia como um dos fatores de suas causas, a
biologia, em um estudo realizado com a neuroimagem e com o objetivo de entender
quais os fatores cerebrais estariam envolvidos com a psicopatia, obteve como
resultado a redução da “matéria cinzenta na região pré-frontal”, uma redução do
“volume do hipocampo posterior” e um acréscimo da “matéria branca do corpo
caloso”, pendências estas, que segundo os autores facilitaram a manifestação de
condutas mais agressivas (MOLL; ESLINGER; SOUZA, 2001; PRIDMORE;
CHAMBERS; MC ARTHUR, 2005 apud GOMES E ALMEIDA, 2010).
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Há uma condição biologicamente comum relacionada às pré- disposições dos
comportamentos dos psicopatas, isso explicaria o fato de serem extrovertidos,
impulsivos e caçadores de emoções, demonstrando um sistema nervoso
relativamente indiferente a baixos níveis de estímulos (EYSENCK E
GUDJOHNSSON, 1989 apud MORANA, STONE, ABDALLA-FILHO, 2006), como
não há determinação experimental ou informação acerca de acidentes que levaram
ao lesionamento ou aumento de uma determinada região do cérebro, pode-se
considerar os estudos acima como de base intrínseca e biológica.
Em relação à categoria explicação intrínseca - inconsciente
A categoria explana um conceito de psicopatia em que o ambiente não faz
parte da constituição de tal transtorno. Assim, estudos propõem que a psicopatia
surge já na infância, de forma que independe do ambiente o qual o indivíduo está
inserido (WOOTTON et al., 1997; STEVENSON E GOODMAN, 2001 apud
SCHMITT, PINTO, GOMES, QUEVEDO E STEIN, 2006).
Ao analisar o conceito dos “maníacos instintivos”, descrito por Morel (1860)
percebe-se que há uma semelhança com o conceito da psicopatia moderna, de
forma que ele considera que as tendências inatas voltadas para o mal fizeram com
que este autor designasse do ponto de vista da medicina legal, o nome de maníacos
instintivos (MOREL, 1860 apud HENRIQUES, 2009).
Outro autor importante para a constituição do conceito da psicopatia foi Pinel
(1801), que criou o termo “mania sem delírio” que descrevia comportamentos de
alguns pacientes que se envolviam em violência severas tanto para com os outros,
como para si mesmo, assim, compreendiam perfeitamente o caráter irracional de
suas atitudes e dessa forma não podiam ser delirantes (ARRIGO E SHIPLEY, 2001
apud HAUCK FILHO, TEIXEIRA E DIAS, 2009). Pode-se refletir com este argumento
até onde os atos dos psicopatas são considerados conscientes e até onde atuam de
maneira inconsciente, pois eles possuem a noção do que está fazendo, mas não
possuem a capacidade de impedir suas ações.
Em relação à categoria explicação extrínseca - histórica
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Esta categoria se baseia na explicação de que a psicopatia possui também
como base o aspecto extrínseco, que decorrerá da história de vida do indivíduo.
Assim, um dos fatores a ser considerados no diagnóstico para a psicopatia é em
relação “às dinâmicas familiares” (HOEVE et al., 2008 apud NUNES, 2011). É certo
afirmar que há o predomínio das características individuais do sujeito, mas
principalmente aquelas relacionadas ao padrão relacional do sujeito, o baixo lado
afetivo e emocional, e os seus costumes (NUNES, 2011).
Em relação à avaliação da psicopatia é importante dar uma atenção especial
às informações que permitem acessar a história de vida do indivíduo. O fato é que a
história de vida do sujeito vai interferir na manifestação de comportamentos
problemáticos e no desenvolvimento de distúrbios, como a psicopatia (NUNES,
2011).
Tratando-se ainda da avaliação da psicopatia, em termos clínicos, a
anamnese é uma ferramenta indispensável para fornecer os dados sobre a história
de vida do sujeito, o seu desenvolvimento, os problemas os quais ele enfrentou, a
história de saúde mental do mesmo e familiar, a maneira como enfrentou as diversas
fases de desenvolvimento e como foram superadas (ABDALLA-FILHO, 2004a apud
NUNES, 2011). Com esta afirmação dos autores, percebe-se que o histórico de vida
do sujeito influencia em muito na constituição do quadro da psicopatia.
Em relação à categoria explicação extrínseca - interpessoal
Ao tentar compreender as faces da psicopatia deve-se levar em consideração
também o aspecto interpessoal, como se dá a interação do indivíduo com psicopatia
com os demais sujeitos. Dessa forma, Kosson, Forth, Kirkhart (1997 apud
DAVOGLIO, GAUER, VASCONCELLOS, LÜHRING, 2011) expõe que o ponto
principal deste transtorno se revela fundamentalmente nas relações interpessoais
disfuncionais. A conduta interpessoal é um ponto essencial na descrição e no
diagnóstico de todas as perturbações da personalidade (DSM – IV, 2002 apud
DAVOGLIO et al., 2011), inclusive a psicopatia (KOSSON et al., apud DAVOGLIO et
al., 2011).
O psicopata apresenta um estilo interpessoal trapaceiro, audacioso,
desinibido, egoísta e de autoengrandecimento, fazendo com que ele minta, engane
e manipule com facilidade os outros (HARE, 2003 apud DAVOGLIO et al., 2011).
14
Referindo-se a avaliação, a observação direta da conduta interpessoal
(BORNSTEIN, 2003 apud DAVOGLIO et al., 2011) é assinalada como um ponto
importante na investigação dos transtornos de personalidade. A observação e
assimilação dos comportamentos em ocasiões acentuadas para o funcionamento
interpessoal adaptável pode contribuir para a compreensão das dificuldades
interpessoais que se reproduzem e que mantém estes transtornos (LEISING,
SPORBERG, REHBEIN, 2006 apud DAVOGLIO et al., 2011). Assim, é possível
fazer induções sobre a personalidade fundamentando-se na conduta interpessoal de
uma pessoa perante a observação de sua interação com os outros (KOSSON, et al.,
1997 apud DAVOGLIO, et al., 2011).
Já para Ambiel (2006), a psicopatia é recentemente percebida pelo meio
jurídico como uma série de traços ou alterações de comportamentos em indivíduos
com pré-disposição ativa nas condutas, as quais pode-se citar “avidez por estímulos,
delinquência juvenil”, comportamentos impulsivos, “reincidência juvenil, entre
outros”.
Em resposta ao segundo objetivo específico do trabalho os instrumentos
encontrados validados para o diagnóstico da psicopatia são o IM – P (Medida
Interpessoal de Psicopatia), e o PCL – R (Hare Psychopathy Checklist Revised),
recentemente validada no Brasil por Morana, nas suas diversas versões. Com os
adolescentes é utilizado o PCL: YV (Hare Psychopathy Checklist – Youth Version),
recentemente validada no Brasil por Morana (DAVOGLIO, et al., 2011).
Já em relação ao terceiro objetivo do trabalho, tratando-se do tratamento,
existe alguma evidência que sugere que os indivíduos que preenchem os critérios
para o diagnóstico de psicopatia não podem ser tratados por qualquer tipo de terapia
existente atualmente. O egoísmo e a aversão pela psiquiatria unicamente
atrapalham muito o tratamento (HARE, 1993 apud MORANA, STONE E ABDALLA-
FILHO, 2006).
Várias formas de intervenção psicoterápica estão sendo desenvolvidas. Os
melhores efeitos surgem naqueles tratamentos que propõe os sintomas específicos,
a terapia comportamental dialética está sendo internacionalmente reconhecida por
sua eficácia em Transtorno de Personalidade. A terapia cognitiva-comportamental
pode ser benéfica, mas ainda são precários os estudos que dedicam atenção a essa
modalidade terapêutica aplicada ao Transtorno de Personalidade (BECK,
FREEMAN, 1990 apud MORANA et. al., 2006).
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conclui-se que ao longo desses dez últimos anos ainda não se chegou a uma
definição universal da psicopatia. Percebe-se que houve avanços quanto a sua
concepção e o que se pode definir com a leitura da maioria dos autores é que as
causas da psicopatia envolvem não só um aspecto, mas vários, como o biológico, o
afetivo, o histórico, o ambiente. Esses foram os aspectos mais próximos para tentar
explicar todos os comportamentos destes indivíduos.
Ao investigar os sintomas da psicopatia, analisando todos estes autores,
chega-se ao consenso de que a psicopatia é compreendida como uma patologia que
apresenta uma série de comportamentos inadequados socialmente, sendo que suas
principais características são falta de empatia, remorso, falsidade, comportamento
mentiroso, manipulador, entre outros.
Os estudos de Hare e Cleckley são os mais conceitualmente reconhecidos
por terem abrangido os maiores sintomas da psicopatia. Percebe-se isso na leitura
dos outros textos que os citam como os precursores desta temática.
Quanto aos instrumentos, ainda são poucos os que podem ser utilizados no
diagnóstico, já que devem ser validados.
Em relação ao tratamento, ainda não se pode falar em um tratamento eficaz
para a psicopatia, pois os mesmos não respondem ao tratamento, desconsiderando
o processo terapêutico.
REFERÊNCIAS
AMBIEL, Rodolfo Augusto Matteo. Diagnóstico de psicopatia: a avaliação
psicológica no âmbito judicial. Psico-USF (Impr.) [online]. 2006, vol.11, n.2, pp.
265-266. ISSN 1413-8271. Acesso: 06 de Abril 2012.
16
ASSOCIAÇÃO Psiquiátrica Americana (APA). Manual Diagnóstico e Estatístico de
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