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Estudo e acompanhamento da construção de uma barragem de enrocamento com cortina a montante André Filipe Fonseca Serrano Dissertação para a obtenção do Grau de Mestre em Engenharia Civil Orientadores: Professora Doutora Laura Maria Mello Saraiva Caldeira Professor Doutor João Marcelino Mateus da Silva Júri: Presidente: Professor Doutor Jaime Alberto dos Santos Orientador: Professor Doutor João Marcelino Mateus da Silva Vogal: Engenheira Ana Alexandra Matthes Quintela Cruz Dezembro de 2014

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Estudo e acompanhamento da construção de uma barragem de enrocamento com cortina a montante

André Filipe Fonseca Serrano

Dissertação para a obtenção do Grau de Mestre em

Engenharia Civil

Orientadores: Professora Doutora Laura Maria Mello Saraiva Caldeira

Professor Doutor João Marcelino Mateus da Silva

Júri:

Presidente: Professor Doutor Jaime Alberto dos Santos

Orientador: Professor Doutor João Marcelino Mateus da Silva

Vogal: Engenheira Ana Alexandra Matthes Quintela Cruz

Dezembro de 2014

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Resumo

A construção de barragens de enrocamento com cortina de betão a montante (BECB) tem vindo

a aumentar um pouco por todo o mundo. Contudo, o projecto e construção, deste tipo de

barragem de enrocamento, é fortemente baseado na experiência em casos precedentes, em

correlações empíricas e no julgamento de engenharia. Os métodos de análise numérica

específicos para este tipo de estruturas foram pouco desenvolvidos com vista à correcta

avaliação da deformabilidade das BECB.

Este trabalho consiste na implementação do método dos elementos finitos em simulações

tridimensionais e bidimensionais das fases de construção e de primeiro enchimento da albufeira

de uma barragem de enrocamento, utilizando o software open-source Code_Aster. O trabalho

inclui também um estudo de percolação, permitindo criar uma previsão dos caudais percolados

pela barragem e fundação. O caso de estudo é a Barragem de Veiguinhas do Reservatório de

Água de Montesinho, com 36,5 m de altura. A barragem está localizada no norte de Portugal,

perto da fronteira com Espanha e encontra-se na fase final de construção. Para modelar as

características dos materiais de enrocamento da barragem foi usado um modelo elastoplástico.

Os parâmetros do modelo foram calibrados através de ensaios triaxiais de grandes dimensões

realizados sobre materiais provenientes da obra. Foram simulados a construção da barragem, o

enchimento da albufeira e estudada a percolação. Os resultados obtidos para a simulação da

construção da barragem estão de acordo com os valores registados nos sistemas de observação

em obra, o que suporta a previsão do comportamento para a fase de primeiro enchimento da

albufeira.

Palavras-chave:

Barragens (BECB)

Enrocamento

Método dos elementos finitos (MEF)

Open Souce

Code_Aster

Barragem de Veiguinhas

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Abstract

Concrete face rockfill dams (CFRDs) are becoming a widely used type of rockfill dam all over the

world. However the design and construction of CFRDs are primarily based on precedent cases

and engineering judgments. Few numerical analysis methods have been developed to properly

evaluate the deformation of CFRDs.

This thesis describes the setup of finite element method (FEM) models for the three dimensional

and two dimensional simulations of the construction of a concrete face rockfill dam and first filling

of its reservoir using the Code-Aster code. This work also includes a seepage analysis to predict

the flow through the foundation and rockfill embankment. The prototype of the study is the 36.5 m

high Montesinho dam, located at the north of Portugal near the Spain border; which is finishing

its construction. In this study, a finite element procedure was developed to simulate the

construction process of the dam, the first filling and the seepage analysis. An elastic plastic model

was used to represent the rockfill materials. The model parameters were calibrated by large-scale

triaxial tests performed on materials used in the dam. The step-by-step construction followed by

subsequent impounding of the reservoir was simulated in the numerical procedure. The numerical

results agree well with in situ monitoring records of dam settlements during construction,

indicating that a finite element procedure can be used evaluate the deformations of CFRDs.

Keywords:

Concrete face rockfill dams (CFRD),

Rockfill,

Finite element method,

Open Souce,

Code_Aster,

Veiguinhas dam

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Agradecimentos

A realização desta tese só foi possível graças à contribuição de inúmeras pessoas. A todas

gostaria de expressar os meus profundos e sinceros agradecimentos. No entanto, não posso

deixar de mencionar algumas das pessoas e entidades que tiveram um contributo especial para

o desenvolvimento deste trabalho.

Ao orientador científico, Professora Doutora Laura Maria Mello Saraiva Caldeira, agradeço o

apoio, incentivo e a forma clara e objectiva como transmitiu o seu vasto conhecimento nesta

área. Agradeço especialmente a inspiração transmitida pelas suas palavras em cada uma das

inúmeras conversas que tivemos durante o desenvolvimento desta dissertação.

Ao orientador científico externo, Professor Doutor João Marcelino Mateus da Silva, agradeço o

apoio incondicional, os vastos conhecimentos transmitidos e os excelentes momentos

proporcionados ao longo de todo o meu período de acolhimento no LNEC e nas visitas realizadas

à Barragem de Veiguinhas.

Ao Laboratório Nacional de Engenharia Civil, em especial ao Departamento de Geotecnia

agradeço os meios facultados e a ajuda das várias pessoas que contribuíram para o

desenvolvimento desta dissertação. Agradeço em especial ao Engenheiro João Manso pela

amizade e pela ajuda importantíssima para a realização deste trabalho. Agradeço também ao

Joaquim Timóteo da Silva por todo o conhecimento transmitido e pelo apoio prestado nos ensaios

de laboratório e dados de obra.

Às Águas de Trás os Montes e Alto Douro, nomeadamente aos Engenheiros José Paixão, José

Cordeiro e Sotero Ribeiro pelo apoio prestado nas visitas à obra e por toda a informação

fornecida, essencial ao desenvolvimento deste trabalho.

A todos os meus amigos, sem excepção, pelo interesse, apoio e compreensão que

demonstraram durante este período.

Finalmente gostaria de realçar o contributo de toda a minha família ao longo do meu percurso

académico, em especial o dos meus pais, do meu irmão e da Sofia. Agradeço-lhes o apoio

incondicional, o incentivo e os valores que me transmitiram. A eles dedico esta dissertação.

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Índice Geral

1 Introdução .............................................................................................................................. 1

1.1 Âmbito ........................................................................................................................... 1

1.2 Objectivos ...................................................................................................................... 1

1.3 Metodologia e Organização .......................................................................................... 2

2 Abordagem geral às barragens de enrocamento com cortina de betão a montante ............ 5

2.1 Elementos constituintes de uma BECB......................................................................... 7

2.2 Critérios de Projecto ...................................................................................................... 7

2.2.1 Maciço de enrocamento ........................................................................................ 8

2.2.2 Cortina de Betão Armado .................................................................................... 10

2.2.3 Juntas .................................................................................................................. 13

2.2.4 Plinto .................................................................................................................... 15

2.2.5 Muro Parapeito .................................................................................................... 16

2.2.6 Estruturas Anexas ............................................................................................... 17

2.2.7 Instrumentação .................................................................................................... 19

2.3 Comportamento das BECB ......................................................................................... 20

2.3.1 Factores que condicionam o desempenho das BECB ........................................ 21

2.3.2 Casos Históricos e Problemas Recentes em BECB ........................................... 24

2.3.3 Conclusões .......................................................................................................... 28

3 Mecânica dos Enrocamentos .............................................................................................. 29

3.1 Definição de Enrocamento .......................................................................................... 29

3.2 Modelação de enrocamentos e ensaios laboratoriais ................................................. 30

3.2.1 Equipamento e técnicas de ensaio ..................................................................... 31

3.3 Comportamento mecânico de enrocamentos ............................................................. 33

3.3.1 Factores que condicionam o comportamento reológico de enrocamentos ........ 33

3.4 Características Tensão – Deformação dos Enrocamentos em BECB ........................ 41

3.5 Conclusões .................................................................................................................. 43

4 Modelação numérica ........................................................................................................... 45

4.1 Software Utilizado........................................................................................................ 45

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4.2 Geometria e malha de elementos finitos ..................................................................... 45

4.2.1 Geometria e Malha 2D ........................................................................................ 45

4.2.2 Geometria e Malha 3D ........................................................................................ 47

4.3 Ficheiro de comando ................................................................................................... 48

4.3.1 Fase inicial ........................................................................................................... 48

4.3.2 Simulação da Fase de Construção ..................................................................... 51

4.3.3 Simulação da fase de primeiro enchimento ........................................................ 54

4.3.4 Estudo de percolação .......................................................................................... 55

4.4 Modelos constitutivos .................................................................................................. 56

4.4.1 Relação tensão-deformação elástica .................................................................. 56

4.4.2 Elastoplasticidade ................................................................................................ 59

4.4.3 Modelo elástico perfeitamente plástico de Drucker-Prager ................................ 64

5 Barragem de Veiguinhas – Caso de Estudo ....................................................................... 67

5.1 Descrição geral da barragem ...................................................................................... 67

5.2 Caracterização mecânica dos materiais da Barragem de Veiguinhas ....................... 69

5.2.1 Pesos Volúmicos ................................................................................................. 70

5.2.2 Ensaio de Compressão Triaxial .......................................................................... 70

5.3 Caracterização hidráulica dos materiais da Barragem de Veiguinhas ....................... 74

5.3.1 Considerações prévias ........................................................................................ 74

5.3.2 Permeabilidade no estado saturado .................................................................... 75

5.3.3 Grau de Saturação .............................................................................................. 76

6 Apresentação e análise dos resultados .............................................................................. 79

6.1 Fase de final de construção ........................................................................................ 79

6.1.1 Estado de Tensão ............................................................................................... 79

6.1.2 Deslocamentos na fase de construção ............................................................... 82

6.2 Fase de primeiro enchimento ...................................................................................... 86

6.2.1 Tensões após o primeiro enchimento ................................................................. 87

6.2.2 Deslocamentos após o primeiro enchimento ...................................................... 88

6.3 Estudo de percolação .................................................................................................. 92

7 Considerações finais ........................................................................................................... 95

7.1 Conclusões .................................................................................................................. 95

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7.2 Desenvolvimentos Futuros .......................................................................................... 96

8 Bibliografia ............................................................................................................................. 1

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Indice de Figuras

Figura 1: Cronologia das BECB em número e altura, ICOLD, (2010) .......................................... 6

Figura 2: Zonamento de uma BECB (adaptado de Cooke e Sherard, 1987) ............................... 8

Figura 3: Molhagem e espalhamento do enrocamento em cordão, Barragem de Veiguinhas .. 10

Figura 4: Execução dos blocos de betão extrudido de apoio da cortina, Resende e Materón,

(2000) .......................................................................................................................................... 10

Figura 5: Execução do aterro e camada de betão de regularização utilizado na Barragem de

Veiguinhas ................................................................................................................................... 11

Figura 6: Execução da cortina de betão armado da Barragem de Veiguinhas .......................... 11

Figura 7: (a) Pormenor da ligação da cortina ao plinto; (b) Pormenor da armadura dupla na zona

inferior (Goulart et al, 2003, in Frutuoso da Silva, 2007). ........................................................... 13

Figura 8: Sistema de vedação da junta perimetral usada na barragem de Shuibuya (IWHR-KHL,

2013) ........................................................................................................................................... 14

Figura 9: Dimensão do plinto e do seu prolongamento para jusante (Marulanda e Pinto, 2000, in

ICOLD, 2010) .............................................................................................................................. 15

Figura 10: Redução do volume de aterro propiciada pelo muro parapeito (Carter, 2013). ........ 17

Figura 11: Ligação entre a torre da tomada de água/descarga de fundo e a cortina de betão,

(ICOLD, (2010) ............................................................................................................................ 18

Figura 12: Ligação descarregador e cortina da barragem de Caruachi, Venezuela, (ICOLD,

2010). .......................................................................................................................................... 19

Figura 13: Pormenor da instalação de um inclinómetro da Barragem de Veiguinhas. ............... 20

Figura 14: Deformada: (a) antes e (b) após o enchimento de uma secção transversal de uma

BECB (Mori, 1999). ..................................................................................................................... 21

Figura 15: Comportamento de uma BECB quando sujeita à carga imposta pela água: (a) corte

transversal; (b) plano da cortina; (c) zona do plinto, (Giudici et al., 2000). ................................ 22

Figura 16: Evolução dos assentamentos no coroamento da barragem com a altura (Cruz et al.,

(2009)) ......................................................................................................................................... 23

Figura 17: Variação da percentagem de assentamentos com a forma do vale (Johannesson,

2007) ........................................................................................................................................... 23

Figura 18: Relação do factor A/H2 (Pinto, 2007) ......................................................................... 24

Figura 19: Deformações da cortina da barragem de Aguamilpa (Marques Filho e Pinto, 2005) 25

Figura 20: Barragem de Xingó: deformada da cortina no período de exploração. (Penman e

Rocha Filho in Basso, (2007)) ..................................................................................................... 26

Figura 21: Rotura numa junta de compressão na Barragem de Mohale. (Johannesson and

Tohlang, 2007) ............................................................................................................................ 26

Figura 22: Ruptura na junta de compressão da Barragem de Barra Grande (Borges, 2007) .... 27

Figura 23: Reparações na Cortina de Barra Grande (Borges, 2007) ......................................... 27

Figura 24: Vista geral das fendas na cortina de Campos Novos (Sobrinho et al., (2007) .......... 28

Figura 25: Características granulométricas dos enrocamentos (Maranha Das Neves 2002) .... 29

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Figura 26: Equipamento de ensaio triaxial: (a) colocação do provete na câmara; (b) compactação

do provete no molde de compactação. ....................................................................................... 32

Figura 27: Diferentes métodos de modelar curvas granulométricas laboratoriais de

enrocamentos, (Veiga Pinto, 1982) ............................................................................................. 33

Figura 28: Condicionantes do comportamento reológico dos materiais de enrocamento, (Veiga

Pinto, 1983) ................................................................................................................................. 34

Figura 29: Redução do ângulo de atrito com o aumento da tensão de confinamento, (Nieto

Gamboa, 2011)............................................................................................................................ 35

Figura 30: Estudo da resistência ao corte com a tensão de confinamento em ensaios triaxiais de

grandes dimensões, (Leps, 1970) ............................................................................................... 36

Figura 31: Evolução da deformação volumétrica com a tensão de confinamento para

granulometrias distintas de enrocamento de basalto, (Marachi et al., 1969) ............................. 37

Figura 32: Comportamento edométrico de amostras com o mesmo índice de vazios e diferentes

granulometrias e compacidades relativas, (Santos et al., 2005). ............................................... 38

Figura 33: Distribuição normal das forças de contacto e das forças de esmagamento, (Marsal,

1969) ........................................................................................................................................... 40

Figura 34: Curvas tensão-deformação de ensaios edométricos dos enrocamentos da barragem

de Pyramid em amostras secas e saturadas, (Nobari and Duncan, 1972). ............................... 41

Figura 35: Relação tensão-deformação e trajectórias de tensão na construção e enchimento de

uma BECB, (Mori, 1999). ............................................................................................................ 42

Figura 36: Relação tensão-deformação e trajectórias de tensão na construção e enchimento de

uma BECB, (Mori, 1999). ............................................................................................................ 43

Figura 37: Interinfluência dos parâmetros que condicionam o comportamento dos enrocamentos,

(Nieto Gamboa, 2011) ................................................................................................................. 44

Figura 38: Malha 2D da barragem de Veiguinhas ...................................................................... 47

Figura 39: Malha 3D da barragem de Veiguinhas ...................................................................... 48

Figura 40: Início do comando, definição de variáveis e leitura da malha ................................... 49

Figura 41: Definição do grupo ELEM a usar no ciclo e definição de um dos materiais.............. 49

Figura 42: Definição do grupo ELEM a usar no ciclo e definição do modelo, condições de fronteira

e cargas aplicadas. ..................................................................................................................... 50

Figura 43: Processo de cálculo, extracção e zeragem dos campos de deslocamentos ............ 51

Figura 44: Cálculo de deslocamentos para construção de aterros, (Marcelino, 1996). ............. 52

Figura 45: Esquema de construção em camadas (Pellet, 2011) ................................................ 53

Figura 46: Processo de cálculo, extracção e manipulação dos campos de deslocamentos ...... 54

Figura 47: Definição da função de enchimento no ficheiro de comando .................................... 55

Figura 48: Métodos de obtenção dos módulos de deformabilidade (Basso, 2007). ................... 58

Figura 49: Curva Hiperbólica (Kondner, (1963) .......................................................................... 58

Figura 50: (a) Material elástico perfeitamente plástico; (b) material elastoplástico com

endurecimento; (c) material elatoplástico com amolecimento (De Mendonça, 2005). ............... 59

Figura 51: Superfície de cedência (De Mendonça, 2005). ......................................................... 61

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Figura 52: Função potencial plástica (De Mendonça, 2005). ..................................................... 62

Figura 53: a) Endurecimento isotrópico; b)endurecimento cinemático. (De Mendonça, 2005). . 63

Figura 54: Critério de cedência de Drucker-Prager. (Frutuoso da Silva, 2007) .......................... 65

Figura 55: Superfícies de cedência de Mohr-Coulomb e de Drucker-Prager. (Frutuoso da Silva,

2007) ........................................................................................................................................... 66

Figura 56: Planta da barragem do reservatório de água do Montesinho, (Cenor, 2002 b) ........ 67

Figura 57: Perfil transversal de maior altura da barragem. ......................................................... 68

Figura 58: Fusos granulométricos das diferentes zonas do maciço da Barragem de Veiguinhas,

(Cenor, 2002 b). .......................................................................................................................... 69

Figura 59: (a) Variação da tensão deviatórica em função da extensão axial. (b) Variação da

extensão volumétrica com a extensão axial. .............................................................................. 71

Figura 60: Regressão linear para obtenção da curva de variação do módulo de elasticidade inicial

com a tensão de confinamento. .................................................................................................. 72

Figura 61: Variação do módulo de elasticidade inicial com a tensão de confinamento, equação

de Janbu. ..................................................................................................................................... 73

Figura 62: Redução do ângulo de atrito com a tensão de confinamento: materiais EP e E2 .... 74

Figura 63: Variação do grau de saturação (S) com a pressão capilar........................................ 77

Figura 64: Variação do factor de redução de permeabilidade (r) com o grau de saturação. ..... 77

Figura 65: Estado de tensão na direcção longitudinal (𝜎𝑥𝑥), modelo 3D ................................... 79

Figura 66: Estado de tensão na direcção longitudinal (𝜎𝑥𝑥), modelo 3D ................................... 80

Figura 67: Estado de tensão na direcção vertical (𝜎𝑧𝑧), modelo 3D .......................................... 80

Figura 68: Estado de tensão na direcção horizontal (𝜎𝑥𝑥), modelo 2D ...................................... 81

Figura 69: Estado de tensão na direcção vertical (𝜎𝑦𝑦), modelo 2D .......................................... 81

Figura 70: Deslocamentos na direcção longitudinal, modelo 3D ................................................ 82

Figura 71: Deslocamentos na direcção transversal, modelo 3D ................................................ 82

Figura 72: Deslocamentos verticais (DZ), modelo 3D ................................................................ 83

Figura 73: Deslocamentos horizontais (DX), modelo 2D ............................................................ 84

Figura 74: Deslocamentos verticais (DY), modelo 2D ................................................................ 84

Figura 75: Comparação entre os assentamentos registados no inclinómetro vertical central e a

previsão de assentamentos obtida nos modelos 2D e 3D para a mesma zona. ........................ 85

Figura 76: Comparação entre os assentamentos registados nos inclinómetros verticais e a

previsão no modelo 3D na zona: (a) do encontro esquerdo; (b) do encontro direito. ................ 86

Figura 77: Estado de tensão na direcção transversal no final do primeiro enchimento (𝜎𝑦𝑦),

modelo 3D ................................................................................................................................... 87

Figura 78: Estado de tensão na direcção vertical no final do primeiro enchimento (𝜎𝑧𝑧), modelo

3D ................................................................................................................................................ 88

Figura 79: Estado de tensão horizontal na fase de final de primeiro enchimento (𝜎𝑥𝑥), modelo 2D

..................................................................................................................................................... 88

Figura 80: Deslocamentos longitudinais (DX), no final do primeiro enchimento, modelo 3D ..... 89

Figura 81: Deslocamentos longitudinais (DX), no final do primeiro enchimento, modelo 3D ..... 89

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Figura 82: Deslocamentos na direcção transversal (DY), modelo 3D ........................................ 90

Figura 83: Deslocamentos verticais (DZ), modelo 3D ................................................................ 90

Figura 84: Deslocamentos verticais provocados pelo enchimento na zona dos inclinómetros

verticais: (a) margem esquerda, secção 0+236; (b) zona central, secção 0+256; (c) margem

direita, secção 0+286 .................................................................................................................. 91

Figura 85: Deslocamentos perpendiculares à cortina, provocados pelo enchimento: (a) margem

esquerda secção 0+236; (b) zona central, secção 0+256; (c) margem direita, secção 0+286 .. 91

Figura 86: Deslocamentos obtidos no modelo 2D: (a) deslocamentos horizontais no final da fase

de enchimento; (b) deslocamentos normais à cortina, devidos ao enchimento. ........................ 92

Figura 87: Velocidade de percolação – magnitude. .................................................................... 93

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Indice de Tabelas

Tabela 1: Critério para dimensionamento do plinto: correlação entre RMR (Bieniawski, 1973) e o

gradiente hidráulico, (Cruz et al., 2009) ...................................................................................... 16

Tabela 2: Instrumentação de barragens de enrocamento com cortina de betão armado a

montante ...................................................................................................................................... 20

Tabela 3: Estrutura do ciclo de construção em camadas. .......................................................... 53

Tabela 4: Variação do peso volúmico seco (ϒd) nas diversas fases de ensaios triaxiais. ......... 70

Tabela 5: Resultados da fase de corte: variação do módulo de Young. .................................... 72

Tabela 6: Resultados da fase de corte: variação do ângulo de atrito. ........................................ 74

Tabela 7: Valor e método de obtenção dos parâmetros de permeabilidade dos materiais da

barragem ..................................................................................................................................... 76

Tabela 8: Parâmetros da função de saturação ........................................................................... 76

Tabela 9: Caudais percolados na barragem. .............................................................................. 94

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1 Introdução

Neste capítulo apresentam-se as motivações que levaram ao desenvolvimento desta dissertação,

assim como os objectivos que se pretendem alcançar e uma breve descrição dos conteúdos e dos

diferentes capítulos que constituem este trabalho.

1.1 Âmbito

O início da utilização de materiais de enrocamento na construção de barragens data de 1850, na

Califórnia. Nesta zona mineira, a utilização dos materiais de enrocamento era justificada pela

abundância de material rochoso disponível. No que respeita aos métodos construtivos, o material era

simplesmente lançado e o sistema de impermeabilização era constituído por madeira, (ICOLD, 2010)

Desde o início da utilização dos materiais de enrocamento em barragens até aos dias de hoje foram

conseguidos inúmeros progressos e desenvolvidas diversas tecnologias e investigações na área das

barragens de enrocamento. A utilização dos cilindros vibradores veio revolucionar o modo como este

tipo de barragens era construído, bem como o seu desempenho. No caso específico das barragens de

enrocamento com cortina de betão a montante (BECB), a utilização de cilindros vibradores na

compactação dos materiais de enrocamento veio melhorar drasticamente o comportamento deste tipo

de barragens.

Com o aumento do número de barragens deste tipo, o nível de experiência foi aumentando, e

consequentemente o grau de confiança dos projectistas, havendo poucas alterações às directivas de

projecto, que se foram mantendo essencialmente empíricas. Associado a uma maior confiança do

funcionamento deste tipo de estrutura, nas últimas décadas assistiu-se a um aumento, em altura, dos

projectos de BECB. Porém, devido ao excesso de empirismo dos projectos, onde se aplicaram a

barragens de grandes dimensões regras que se tinham mostrado eficientes em barragens de menores

dimensões, diversos casos de problemas de deformação excessiva e de rotura da cortina de betão

armado foram registados nessas barragens de maior altura.

Os casos históricos de problemas registados revelam a necessidade de aliar as potentes técnicas de

cálculo numérico disponíveis, hoje em dia, aos estudos teóricos e laboratoriais de caracterização das

propriedades mecânicas dos materiais e a sistemas de observação em obra para que se consiga um

desenvolvimento sustentado nesta área específica das barragens.

1.2 Objectivos

O principal objectivo desta tese consiste em desenvolver um conjunto de modelos numéricos que

permitam simular o comportamento de BECB nas diferentes fases do seu ciclo de vida, contribuindo

desta forma para a criação de ferramentas de análise de comportamento aplicáveis aos projectos e à

aferição do seu comportamento. Optou-se por desenvolver as ferramentas através do uso de software

“open source”, sem custos de aquisição e manutenção para o utilizador. Neste sentido pretende-se,

por um lado, reduzir a dependência de contractos de licenciamento, por outro garantir a longevidade

dos modelos desenvolvidos. Procurou-se também construir um modelo devidamente parametrizado e

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automatizado permitindo a rápida aplicação a diferentes barragens, que não aquela que constitui o

caso de estudo deste trabalho.

Seguindo a linha de pensamento de Clough (1980), apontado como um dos autores que mais contribuiu

para a concepção do método dos elementos finitos, considerou-se que “…a observação do

comportamento das estruturas é o antídoto mais seguro para o excesso de confiança para os

entusiastas do computador…”. Deste modo, neste trabalho pretende-se conjugar o desenvolvimento

dos modelos numéricos com a verificação experimental, através do acompanhamento da obra e dos

ensaios laboratoriais de caracterização das propriedades mecânicas dos materiais.

Apesar de existirem algumas barragens de enrocamento com cortina de betão a montante, em Portugal,

incluindo a Barragem de Paradela, que foi, em tempos, a maior barragem da Europa, a divulgação

deste tipo de estrutura é bastante reduzida. Assim sendo, o objectivo inicial deste trabalho é apresentar

as BECB de uma forma geral, incluindo os critérios de projecto e o comportamento deste tipo de

barragens.

1.3 Metodologia e Organização

A dissertação está essencialmente dividida em duas partes, na primeira é apresentada a

fundamentação teórica que serve de base ao trabalho desenvolvido (capítulos 2,3 e 4) e na segunda

parte descrevem-se os modelos desenvolvidos, as simulações realizadas, a caracterização dos

materiais do caso de estudo e os resultados e conclusões alcançados (capítulos 5,6,7 e 8).

No capítulo 2 apresenta-se uma descrição geral das características das barragens de enrocamento

com cortina de betão a montante. Após um breve enquadramento histórico, são definidos os seus

elementos constituintes e expostos alguns dos critérios de projecto actuais. Neste capítulo apresenta-

se ainda o comportamento típico das BECB, incluindo diversos casos históricos onde se registaram

problemas de deformação excessiva.

No capítulo 3 define-se o material enrocamento e apresentam-se as suas características mecânicas.

São ainda descritos neste capítulo os factores que condicionam o comportamento dos materiais de

enrocamento e as particularidades dos ensaios laboratoriais neste tipo de material, quer em termos de

equipamentos, quer em termos de metodologia de ensaio.

No capítulo 4 descreve-se todo o processo de construção dos modelos numéricos 2D e 3D.Começa

por se apresentar, sucintamente, o software utilizado, apresentando-se de seguida o processo de

criação da geometria e a geração da malha de elementos finitos dos modelos da barragem. É ainda

descrito em pormenor o ficheiro de comando desenvolvido e, finalmente, apresentam-se os modelos

constitutivos utilizados.

O capítulo 5 consiste na descrição do caso de estudo, englobando a análise das propriedades

mecânicas e hidráulicas dos materiais utilizados em obra para obtenção dos parâmetros do modelo.

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No capítulo 6 são apresentados os resultados obtidos nas diferentes modelações. São feitas análises

comparativas dos resultados dos modelos entre si e com os dados do sistema de observação da

barragem. É apresentada uma previsão do comportamento da barragem na fase de primeiro

enchimento e uma estimativa dos caudais percolados.

O capítulo 7 apresenta as conclusões e as considerações finais sobre o trabalho desenvolvido,

complementadas por sugestões de desenvolvimentos futuros sobre o tema.

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2 Abordagem geral às barragens de enrocamento com cortina de

betão a montante

No presente capitulo, são descritas as características fundamentais das barragens de enrocamento

com cortina de betão a montante (BECB). Após uma breve contextualização histórica, apresentam-se

os seus elementos constituintes, o comportamento mecânico dos materiais, o processo construtivo

associado a esta solução, o sistema de observação fundamental para a monotorização da construção

e exploração e alguns exemplos de problemas ocorridos em barragens deste tipo.

As barragens podem ser construídas com diferentes tipos de materiais. De acordo com os materiais

que as constituem podem ser classificadas em três grandes grupos: barragens de betão, barragens de

alvenaria ou barragens de aterro. As barragens de aterro são constituídas por diversos materiais soltos,

de forma irregular, sem ligações cimentícias, quando comparados com o betão. Pode-se considerar

três grupos de barragens de aterro: barragens de terra, barragens de terra e enrocamento e barragens

de enrocamento. As barragens de enrocamento com cortina de betão a montante são um caso

particular do último grupo.

As BECB até, por volta de 1960, eram construídas com enrocamento lançado e eram consideradas

seguras e de baixo custo. Contudo, devido à elevada compressibilidade do enrocamento segregado,

este tipo de barragem encontrava-se sujeito à fissuração da cortina e a fugas de água impossíveis de

desprezar. Por estas razões, verificou-se o declínio desta solução, apesar de ser reconhecido que o

material enrocamento combinava uma alta resistência a um baixo custo. Em parte, como resposta a

estes problemas, acabaram por ser desenvolvidas as barragens de enrocamento lançado com núcleo

de terra impermeável. A partir da década de 1950, a evolução nos equipamentos de compactação,

nomeadamente os cilindros compactadores vibratórios, propiciou o regresso das barragens de

enrocamento com cortina de betão a montante, desta feita com maciço de enrocamento compactado.

As bases de projecto utilizadas começaram por ser as usadas nas barragens antigas, porém com a

crescente experiência foram sujeitas a diversas revisões e desenvolvimentos. Hoje em dia as BECB

são novamente um tipo de barragem largamente utilizado, registando-se uma assinalável tendência de

crescimento do número e da altura destas barragens (ICOLD, 2010). A figura 1 ilustra o histórico de

desenvolvimento das barragens de enrocamento com cortina a montante até ao ano de 2000. Para

além dos registos presentes na figura, foram construídas e planeadas diversas barragens de grande

altura na última década, das quais se destacam, entre outras:

Mohale, Lesoto, 145 m de altura, concluída em 2006;

Campos Novos, Brasil, 202 m de altura, concluída em 2006;

Kárahnjúkar, Islândia, 196 m de altura, concluída em 2007;

Bakún, Malásia, 205 m de altura, concluída em 2009;

Shuibuya, China, 233 m de altura, concluída em 2009.

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Figura 1: Cronologia das BECB em número e altura, ICOLD, (2010)

As BECB são estruturas muito seguras, assegurando a estabilidade estática e dinâmica. A resistência

do maciço de enrocamento à acção sísmica é uma das suas valias mais relevantes. A alternativa de

BECB é geralmente uma solução de baixo custo quando comparada com as alternativas de terra ou

betão, quer em vales abertos, quer em vales fechados.

A viabilidade económica desta tecnologia está relacionada com a sua flexibilidade construtiva, seja no

aproveitamento dos diferentes materiais das escavações, através de diversas soluções de zonamento

interno do maciço, seja também pela independência do avanço dos aterros em relação às condições

meteorológicas, em particular da chuva. Os trabalhos de tratamento da fundação são independentes

do avanço na construção dos maciços, pois são realizados a montante, na zona do plinto. Ao contrário

das barragens de terra, em que a chuva tem um efeito adverso na compactação das camadas de aterro,

nas BECB o efeito da chuva pode até ser benéfico, pois ajuda no processo de compactação e contribui

para a diminuição dos assentamentos. As características mecânicas do material de enrocamento

permitem, em geral, a adopção de taludes relativamente íngremes, quer a montante quer a jusante,

com valores da ordem de 1,3H:1,0V, propiciando uma redução da base da barragem e

consequentemente uma optimização dos órgãos de desvio e da descarga de fundo. A escolha da zona

de implantação da barragem é flexível, sendo mesmo possível a sua implantação em zonas com

camadas aluvionares espessas, sem a necessidade de remoções significativas, o que seria obrigatório

nas soluções de betão. Neste caso, a estanqueidade da fundação poderá ser garantida pela execução

de uma parede moldada.

Período inicial Período de transição Período actual

Alt

ura

(m

)

A. 68 BECB construídas entre 1990 e 2000

com alturas entre 40 e 120m

Enrocamento Lançado Enrocamento Compactado

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Os avanços tecnológicos conseguidos nas últimas décadas são uma alavanca para este tipo de

barragem. Com equipamentos de escavação, transporte, lançamento e compactação cada vez mais

eficazes são conseguidos rendimentos e resultados que tornam esta solução extremamente apelativa.

A betonagem da cortina de impermeabilização de betão armado beneficiou do desenvolvimento das

cofragens deslizantes, que permitem a execução dos painéis da cortina numa única etapa, eliminando,

desta forma, as juntas horizontais, que eram prática comum neste tipo de solução.

2.1 Elementos constituintes de uma BECB

Nas barragens de enrocamento com cortina de betão armado a montante, a estabilidade é garantida

pelo maciço de enrocamento.

A cortina de betão armado encontra-se simplesmente apoiada no maciço e numa estrutura de betão

armado que se desenvolve no pé do talude de montante, o plinto. A ligação entre o plinto e a cortina

de impermeabilização é denominada de junta perimetral e é um elemento crítico no desempenho da

barragem, visto que estabelece a ligação entre os dois elementos do sistema de impermeabilização,

um do corpo da barragem e o outro da fundação. Uma BECB é essencialmente constituída por um

maciço de enrocamento, uma cortina de betão armado, um plinto, as respectivas juntas, bem como o

tratamento da fundação.

O maciço de enrocamento constitui o corpo estrutural da barragem que garante a sua estabilidade, o

controlo do fluxo proveniente da cortina e da fundação e o suporte da cortina de betão armado.

A cortina é uma estrutura de betão armado, de alta resistência e baixa permeabilidade apoiada no

talude de montante de modo a garantir a impermeabilização da barragem. A cortina deve ser

suficientemente flexível, ou seja, de espessura reduzida, por forma a acomodar as deformações do

maciço de enrocamento.

O plinto é também uma estrutura de betão armado que se desenvolve ao longo do pé do talude de

montante e que propicia a ligação da cortina com a fundação garantindo a sua funcionalidade. A ligação

à fundação é materializada através de ancoragens e/ou pregagens. O plinto serve também como área

de trabalho para a execução de injecções de impermeabilização e melhoramento da fundação.

As juntas, perimetral e verticais, estabelecem a ligação entre os vários elementos impermeabilizantes

da barragem. A junta perimetral liga o plinto à cortina e as juntas verticais ligam os diferentes painéis

da cortina entre si.

2.2 Critérios de Projecto

As bases para o projecto e construção de barragens de enrocamento com cortina de betão a montante,

um pouco por todo o mundo, nas últimas décadas, advêm dos princípios e critérios definidos por Cooke

e Sherard nos dois artigos publicados no Journal of Geotechnical Engineering da American Society of

Civil Engineering em 1987 – Concret Face Rockfill Dams I: Assessment e Concrete Face Rockfill Dams

II: Design. Estes critérios de projecto são baseados, essencialmente, na experiência e no desempenho

de barragens construídas anteriormente, tendo um carácter muito empírico e pouco teórico. Contudo,

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ao longo dos últimos anos o número e a altura de barragens deste tipo têm vindo a aumentar

significativamente, tendo-se registado alguns acidentes de rotura da cortina de betão armado, o que

levou a revisão dos critérios de projecto. Neste capítulo vão ser apresentados os critérios de projecto

actuais resultantes dessas mesmas revisões.

2.2.1 Maciço de enrocamento

2.2.1.1 Zonamento

O maciço de enrocamento é dividido em diferentes zonas, com diferentes granulometrias e energias

de compactação. Na maior parte das barragens, o zonamento do maciço segue as directivas prescritas

por Cooke & Sherard (1987). Embora muitos projectistas utilizem diferentes nomenclaturas para a

definição das diferentes zonas, os conceitos básicos têm sido preservados. A Figura 2, adaptada de

Cooke & Sherard (1987), mostra o zonamento de uma BECB, onde se distinguem, essencialmente,

três zonas:

a) Zona 1 – Impermeável.

b) Zona 2 – Filtro ou zona de transição sob a cortina de betão armado.

c) Zona 3 – Maciço de enrocamento.

Figura 2: Zonamento de uma BECB (adaptado de Cooke e Sherard, 1987)

O objectivo da zona 1 é cobrir a junta perimetral e a parte inferior da cortina com material impermeável,

para que, no caso de ocorrerem fissuras na cortina ou aberturas na junta, estas possam ser colmatadas

pelo material fino, preferencialmente não argiloso. É colocado um tapete de solo de reduzida

permeabilidade compactado (por exemplo silte), com uma espessura mínima construtiva (Zona 1A),

coberto por um material de baixo custo que ofereça estabilidade (Zona 1B). Esta zona é aconselhada

para barragens muito altas, sendo prescindível em barragens de pequena dimensão.

A zona 2 é constituída por areia e brita, de pequena espessura para promover um suporte uniforme e

firme para a cortina de betão armado. Este material, de dimensão máxima de 75 mm, é compactado

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em camadas de 0,4 a 0,5 m, e normalmente engloba uma percentagem de areia para constituir um filtro

no controlo da percolação através das juntas e fissuras na cortina.

O maciço de enrocamento constitui a zona 3 e materializa o corpo da barragem. Tendo em conta que

a carga imposta pela água é transmitida à fundação maioritariamente através da zona de montante da

barragem, é fundamental garantir uma baixa compressibilidade desta zona para minimizar os

assentamentos na cortina impermeabilizante. Partindo deste raciocínio, pode concluir-se que, na zona

mais afastada da cortina, não são necessárias especificações tão rigorosas quanto à

compressibilidade, uma vez que os assentamentos nessa zona não afectam directamente a cortina de

betão. Assim sendo, podem-se definir três zonas do maciço: uma zona de transição (3A), composta

por enrocamento fino ou britado compactado em camadas de espessura idêntica às da zona 2; a zona

de enrocamento de montante (3B), compactada em camadas, normalmente, de 0,6 a 1 m, recorrendo

a um cilindro vibratório de rasto liso; e a zona de enrocamento de jusante (3C), altamente permeável,

como tal, compactada em camadas mais altas, normalmente entre 1 a 2 m. A disposição das zonas 3B

e 3C no corpo da barragem é variável e depende da qualidade da rocha, como ilustra a Figura 2. Para

enrocamentos de melhores características a fronteira entre estas zonas pode ser definida mais perto

do paramento de montante. No caso do material de enrocamento ser de pior qualidade a zona 3B

deverá prolongar-se até próximo do paramento de jusante. Pelo contrário, nos casos em que exista

material de boa qualidade em quantidade suficiente, a zona 3 pode ser uniforme.

2.2.1.2 Granulometria e adição de água

As propriedades mais importantes nos maciços de enrocamento das BECB são a sua elevada rigidez

e resistência ao corte, conseguidas com enrocamentos compostos por rocha sã e que respeitem os

requisitos básicos de compactação e de granulometria. Alguns autores sugerem que a percentagem

de partículas de dimensão inferior a 2,5 cm não deve exceder os 30%. Contudo esta especificação não

é consensual, uma vez que enrocamentos com percentagens superiores apresentaram bons

comportamentos. Uma granulometria extensa contribui, significativamente, para a diminuição da

quebra de partículas e do índice de vazios, efeitos que se traduzem na minoração dos deslocamentos

ocorridos no maciço. A definição de enrocamento está naturalmente associada à granulometria do

material, definida através do fuso granulométrico.

A molhagem do enrocamento antes da sua compactação é uma prática comum na construção de

barragens de enrocamento e tem a finalidade de minimizar os assentamentos após a fase construtiva.

O principal objectivo da adição de água é humedecer o material e promover a fracturação e o rearranjo

dos blocos, ou seja, induzir o colapso por molhagem durante a compactação, minimizando, desta forma,

os assentamentos pós-construtivos. A quantidade de água aplicada na molhagem do enrocamento tem

variado entre 10 a 30% do volume total do enrocamento. Na Figura 3 apresenta-se o espalhamento em

cordão do enrocamento da Barragem de Veiguinhas e o processo de molhagem.

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Figura 3: Molhagem e espalhamento do enrocamento em cordão, Barragem de Veiguinhas

2.2.2 Cortina de Betão Armado

A principal barreira impermeável das BECB é a sua cortina de betão armado, apoiada nas camadas de

suporte subjacentes ou em blocos de betão extrudido, construídos para o efeito. A cortina está

totalmente apoiada no maciço de enrocamento, e encontra-se maioritariamente à compressão quando

sujeita ao impulso da água, excepto nas zonas próximas dos encontros. Assim, o projecto da cortina

de betão armado tem como foco a sua estanqueidade e não tanto a resistência. O controlo e detecção

da fendilhação na cortina é também extremamente relevante.

Segundo ICOLD (2010), os blocos de betão extrudido foram provavelmente a inovação mais importante

dos últimos anos na construção de BECB. O método introduzido pela primeira vez na construção da

barragem de Itá, no Brasil, é descrito na Figura 4.

Figura 4: Execução dos blocos de betão extrudido de apoio da cortina, Resende e Materón, (2000)

Na Barragem de Veiguinhas, o caso de estudo desta tese, os blocos de betão extrudido não foram

utilizados, uma vez que a dimensão da barragem não justificava a sua utilização. Contudo foi executada

uma camada de regularização, de betão pobre, no paramento de montante, sobre a qual assentará a

cortina de betão armado (Figura 5).

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Figura 5: Execução do aterro e camada de betão de regularização utilizado na Barragem de

Veiguinhas

O dimensionamento da cortina em termos de espessura e de armaduras tem sido baseado

maioritariamente na experiência e menos em análises rigorosas, baseadas, por exemplo em cálculos

tensão-deformação. Contudo, casos recentes, revelaram que os métodos utilizados podem levar a

consideráveis deformações da cortina e a fissuras indesejáveis. A experiência em casos semelhantes

é uma ferramenta muito útil, contudo revela-se necessária uma análise cuidadosa das condicionantes

do projecto. Pequenos detalhes podem afectar o comportamento da cortina, como tal devem ser tidos

em conta no dimensionamento. Como exemplo, devem ser considerados importantes reforços de

armadura nas zonas próximas da junta perimetral, se forem detectadas condições de fundação que

conduzam a deformações diferenciais da cortina, por exemplo, variações acentuadas da inclinação da

fundação.

Figura 6: Execução da cortina de betão armado da Barragem de Veiguinhas

A largura dos painéis de cortina está, maioritariamente, relacionada com as características das

cofragens deslizantes e dos equipamentos de colocação do betão. Os painéis têm larguras variáveis

entre os 12 e os 18 metros. Sendo que os mais estreitos são utilizados quando é desejável adoptar um

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maior número de juntas verticais devido a variações da geometria do plinto, da geometria ou

características da fundação ou próximo dos encontros, onde existe maior tendência para movimentos

nos painéis.

A Figura 6 apresenta a execução da cortina de betão armado da Barragem de Veiguinhas com recurso

a cofragem deslizante. A figura mostra também a colocação de waterstops, bandas amarelas, na junta

perimetral e nas juntas verticais.

Nas primeiras barragens de enrocamento lançado, a espessura da cortina era tradicionalmente igual a

0,3 + 0,0067H m, sendo H a altura da barragem, em metros. Actualmente, com o enrocamento

compactado e com a melhoria da qualidade dos betões, o segundo termo foi reduzido para 0,003H, ou

mesmo 0,002H. Com base na experiência disponível actualmente é razoável projectar cortinas de

espessura constante, de 0,25 ou 0,30 m, para barragens moderadamente altas (até 100 m) e aumentar

a espessura de 0,002H para barragens mais altas.

2.2.2.1 Características do Betão

Para o betão utilizado na cortina de montante, a durabilidade e a impermeabilização são características

mais importantes que a resistência. Um betão com 20 MPa a 25 MPa de resistência à compressão

simples aos 28 dias é considerado adequado. Maiores resistências do betão requerem maiores

dosagens de cimento e aumentam o potencial de fendas de retracção. As pozolanas são um bom

substituto do cimento, pois ajudam a reduzir o calor de hidratação, sem sacrificar a resistência dos

betões, aumentam a resistência a longo prazo, aumentam o módulo de elasticidade e aumentam a

resistência à tracção, diminuindo desta forma a probabilidade de fendilhação.

A impermeabilização, a resistência a reacções químicas adversas e a resistência ao gelo/degelo, em

determinados climas, são características essenciais para assegurar a durabilidade das cortinas. A

resistência química é conseguida através de uma adequada selecção do cimento, dos agregados e da

água usada no betão e verificada através da execução de ensaios adequados. Para combater os efeitos

do gelo/degelo a técnica que tem produzido melhores resultados é a de incorporação de ar. Uma forma

de produzir um betão impermeável e durável é estabelecer um valor limite para a razão água/cimento.

Jiang e Zhao (2000), resumiram a investigação e a experiência de betões usados para BECB muito

altas na China. As suas prescrições vão ao encontro da experiência e conhecimentos generalizados

sobre esta matéria, e são os seguintes:

limitar a razão água/cimento até 0,5, em climas quentes, e 0,45, em climas mais frios;

manter o “slump” do betão entre 30 e 70 mm, podendo ser introduzidos plastificantes para

melhorar a trabalhabilidade, se necessário;

a incorporação de ar deve variar entre 4 a 6%, em climas quentes, e entre 5 a 7%, em climas

frios;

manter a superfície do betão fresco húmida, de forma a obter uma cura adequada.

2.2.2.2 Armaduras

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É importante notar que, de todos os tipos de fracturas observadas em cortinas de BECB, muito poucas

são atribuídas à falta de armaduras, tendo sido apontadas as irregularidades e singularidades na

fundação ou outros pormenores da barragem como causa principal.

Assim, devem ser considerados reforços nas zonas em que as irregularidades na fundação possam

causar potenciais esforços de flexão na cortina, em zonas de mudanças bruscas do alinhamento do

plinto e em todos os locais em que características específicas possam induzir esforços de flexão. Deste

modo, é necessária uma correcta avaliação das condições locais de fundação e dos encontros para

que se consiga um correcto dimensionamento das armaduras da cortina, ao invés de basear o

dimensionamento unicamente em casos precedentes.

Segundo Cooke e Sherard (1987), a aplicação de 0,4% de armaduras em cada direcção nas cortinas

de barragens de enrocamento compactado, ao invés dos tradicionais 0,5% usados nas barragens de

enrocamento lançado, foi uma mudança económica e bem-sucedida. Em várias barragens recentes

foram utilizadas percentagens de armaduras de 0,3% na zona central da barragem, sendo a taxa de

armadura na zona do perímetro, próxima do plinto, mais elevada. Nesta zona, onde os esforços

solicitantes apresentam maiores valores, recomenda-se a utilização de 0,5% de armaduras como forma

de melhorar o seu desempenho. Deve também ser considerada a utilização de armadura dupla nesta

zona mais solicitada da laje, como apresentado na Figura 7. As armaduras podem, ou não, ser

continuadas nas juntas construtivas, contudo são terminadas nas juntas verticais de contracção e na

junta perimetral.

(a)

(b)

Figura 7: (a) Pormenor da ligação da cortina ao plinto; (b) Pormenor da armadura dupla na zona

inferior (Goulart et al, 2003, in Frutuoso da Silva, 2007).

2.2.3 Juntas

As juntas estabelecem a conexão entre os vários elementos de impermeabilização da barragem.

Desempenham um papel fundamental na prevenção de perdas de água e também na acomodação,

por parte da cortina, dos deslocamentos ocorridos nos maciços e dos esforços de compressão gerados

pelo impulso hidrostático da água. Numa barragem de enrocamento com cortina de betão a montante

existem três tipos de junta, a junta perimetral que liga o plinto à cortina, as juntas verticais que

estabelecem a ligação entre diferentes painéis de laje e as juntas horizontais que são somente

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construtivas e materializam-se pelo empalme das armaduras. Estas últimas podem ser suprimidas, se

a betonagem dos painéis de cortina for executada de uma só vez, recorrendo a cofragens deslizantes.

2.2.3.1 Junta Perimetral

Na junta perimetral, elemento fundamental no funcionamento da barragem, é conveniente ter associado

um sistema de vedação das juntas composto por várias linhas de defesa. Inúmeros sistemas deste tipo

foram utilizados nas diversas barragens já construídas, contudo neste trabalho far-se-á referência ao

sistema inovador utilizado na barragem de Shuibuya, a mais alta do mundo, nesta classe de barragens.

Como ilustrado na Figura 8, o sistema de vedação múltiplo é constituído por uma junta de borracha

corrugada, protegida por um enchimento plástico (GB) e um cilindro de borracha sintética, todos

protegidos no exterior por uma geomembrana. No interior é colocada uma water stop. De realçar que,

com o enchimento, as juntas, principalmente em barragens muito altas, tendem a abrir

significativamente, sendo, como tal, importante que o sistema de cobertura das juntas tenha a

elasticidade necessária de forma a garantir a impermeabilização. É também recomendável a colocação

de uma cobertura de material fino a montante, na zona da junta, que permita colmatar qualquer

abertura, caso esta ocorra. Durante a construção e a fase de primeiro enchimento, a cortina assenta

directamente sobre o plinto, podendo gerar uma concentração de tensões de compressão nas juntas

que, para barragens altas, pode ultrapassar a resistência à compressão do betão. Para evitar este

fenómeno deve ser colocado um material compressível (madeira ou similar), que propicie a distribuição

dessas tensões.

Figura 8: Sistema de vedação da junta perimetral usada na barragem de Shuibuya (IWHR-KHL,

2013)

2.2.3.2 Juntas Verticais

As juntas verticais estabelecem a ligação entre os vários painéis de laje que constituem a cortina. É

relevante salientar que os diferentes painéis de laje devem ser independentes, não havendo passagem

de armaduras entre si. Na região dos encontros da barragem, onde os esforços são de tracção, é

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comum utilizarem-se cobrejuntas de cobre na base da laje e cobrejuntas de PVC no topo. Tendo em

conta o comportamento de algumas barragens recentes que apresentaram grande nível de fissuração

nas lajes centrais, devido a esforços de compressão nestas juntas, recomendam-se juntas de maiores

dimensões e a utilização de material compressível entre os painéis de laje que absorva esses esforços

de compressão.

2.2.4 Plinto

O plinto é uma estrutura de betão armado situado no pé do talude de montante e que se estende ao

longo de todo o perímetro da barragem. Esta estrutura tem como função dar apoio à cortina, permitir a

realização dos tratamentos da fundação e garantir as condições de estabilidade e de controlo do fluxo

na fundação, dado que o gradiente hidráulico tende a ser bastante elevado na zona sob o plinto. Como

tal, o plinto deve ser assente em rocha sã, não erodível e injectável. Caso a rocha tenha características

menos boas é necessário prever o seu tratamento para reduzir os caudais e eliminar a possibilidade

de erosão interna na fundação.

Para a fundação em rocha dura e injectável, a largura mínima do plinto tem sido da ordem de 1/20 a

1/30 da carga hidráulica, ou de 1/10 da mesma para fundação em rocha de qualidade inferior,

garantindo uma largura mínima de 3 m, (Cooke e Sherard, 1987).

Nos projectos mais recentes, os critérios de dimensionamento do plinto têm vindo a sofrer algumas

alterações quanto à sua concepção, ou seja, a largura continua relacionada com a carga hidráulica,

contudo tem sido prolongado para jusante. Esta alteração traduz-se numa economia, quer em volume

de escavação, quer em quantidade de betão a aplicar e propicia também uma maior flexibilidade na

construção. A Figura 9 ilustra a proposta de concepção variante acima apresentada.

Figura 9: Dimensão do plinto e do seu prolongamento para jusante (Marulanda e Pinto, 2000, in

ICOLD, 2010)

Segundo Cruz et al. (2009), a largura do plinto pode ser estimada com base na classificação RMR

(Bieniawski, 1973) da rocha de fundação e no gradiente hidráulico, como apresentado na Tabela 1. De

notar que esta metodologia foi utilizada em várias barragens brasileiras, entre as quais a de Itá, de

Barra Grande e de Campos Novos.

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16

A espessura de projecto tem sido frequentemente igual à da laje de arranque da cortina, considerando

uma espessura mínima de 0,3 a 0,4 m, que é normalmente excedida devido a escavações excessivas

e à topografia irregular.

Tabela 1: Critério para dimensionamento do plinto: correlação entre RMR (Bieniawski, 1973) e o

gradiente hidráulico, (Cruz et al., 2009)

RMR Gradiente H/B Comprimento B

80-100 18-20 0,053H

60-80 14-18 0,065H

40-60 10-14 0,083H

20-40 4-10 -

<20 Fundação profunda

ou corta-águas

Nota: B=H/G (B – comprimento do plinto; H – Carga Hidráulica; G – Gradiente).

A armadura do plinto, tal como a da laje da cortina, tem como principal finalidade evitar a fendilhação

devida às eventuais variações de temperatura na fase construtiva, à retracção e aos assentamentos

diferenciais, fomentar a distribuição das fissuras ao longo da estrutura e minimizar a abertura de

qualquer fissura que se desenvolva por flexão. A utilização de armadura dupla é uma prática em

desuso, como tal a armadura é colocada 10 a 15 cm abaixo da superfície superior, onde é ligada às

ancoragens. Uma taxa de armadura de 0,3% em cada direcção é considerada adequada. As pregagens

são elementos passivos, tendo como função solidarizar o plinto à fundação. São, normalmente,

constituídas por varões de 25 a 35 mm de diâmetro, espaçadas de 1 a 1,5 m entre si.

O plinto serve ainda como tampão para a calda de cimento das injecções. Assim sendo, é

recomendável que as injecções sejam executadas através desta estrutura, por forma a maximizar a

eficiência das injecções na zona superficial imediatamente sob o plinto. As injecções pelo plinto têm

como finalidade reduzir a percolação pela fundação. Como tal, é fundamental realizar uma campanha

de prospecção que permita identificar as zonas mais permeáveis, a partir da qual seja possível definir

a profundidade da cortina de injecções.

2.2.5 Muro Parapeito

Ao contrário das barragens de terra-enrocamento, as barragens de enrocamento com cortina de betão

a montante podem ter associado um muro parapeito no topo do talude de montante. O principal

objectivo deste elemento é reduzir o volume de enrocamento necessário para atingir o nível prescrito,

como ilustra a Figura 10.

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17

Figura 10: Redução do volume de aterro propiciada pelo muro parapeito (Carter, 2013).

Este muro torna-se particularmente importante quando o material obtido nas escavações executadas

no local da obra não é suficiente para satisfazer as necessidades, sendo necessário recorrer a zonas

de empréstimo ou pedreiras que encarecem substancialmente a obra. O volume de enrocamento

poupado aumenta com a altura da barragem. Normalmente, só é executado um muro parapeito,

contudo, para maiores reduções de aterro, pode ser executado um segundo muro no topo do paramento

de jusante, normalmente com dimensões inferiores às do primeiro.

A construção da cortina impermeável de betão armado requer o uso de guinchos que suportem as

cofragens deslizantes e outros materiais essenciais a uma construção eficiente. É também necessário

espaço adicional para a movimentação de veículos e equipamentos que providenciem o fornecimento

de betão, aço e outros materiais. Como tal, para suportar esta actividade, é necessário, segundo ICOLD

(2010), uma largura mínima de 12 m, no topo do aterro. A utilização do muro parapeito providencia um

amplo espaço de trabalho na base do muro para a execução da cortina. O muro parapeito serve ainda

como barreira contra as ondas da albufeira.

2.2.6 Estruturas Anexas

O projecto de barragens inclui a sua ligação e interacção com estruturas anexas. Por vezes, um traçado

condicionado por condições especiais requer uma ligação especial entre a cortina ou o plinto e o

descarregador de superfície ou a descarga de fundo. Neste capítulo são apresentadas algumas

particularidades da ligação e interacção entre a barragem e as estruturas anexas a ela associadas.

2.2.6.1 Descarga de Fundo e torre de tomada de água

As descargas de fundo são obrigatórias em Portugal. Este elemento é usado no controlo do enchimento

e para o esvaziamento da albufeira. Nas barragens com núcleo não é aconselhável que a descarga de

fundo atravesse o núcleo, uma vez que podem ser criados caminhos preferenciais de percolação na

ligação entre o solo e a estrutura de descarga. No caso das BECB, a descarga de fundo e a torre de

tomada de água apresentam uma nova série de desafios. Um exemplo de tratamento utilizado nesta

ligação é apresentado na Figura 11 para uma torre de tomada de água, à qual está associada também

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18

a descarga de fundo. Segundo ICOLD, (2010), a torre de tomada de água deve ser fundada a montante

do plinto, sendo que a descarga de fundo pode, ou não, atravessar plinto. O zonamento da barragem

deve ser alterado na zona envolvente da conduta para evitar danos causados por pontos angulosos de

blocos de grandes dimensões. Desta forma, a conduta, deve ser envolvida por uma zona de transição

de protecção.

Figura 11: Ligação entre a torre da tomada de água/descarga de fundo e a cortina de betão,

(ICOLD, (2010)

Uma conduta da descarga de fundo que atravesse o plinto deve ser tratada como parte integrante do

plinto. A base da conduta pode ser usada como tampão de injecções, tal como o restante do plinto.

Contudo a conduta aumenta a complexidade da geometria da junta perimetral e requer medidas

especiais na vedação das juntas, que podem provocar movimentos maiores que o esperado. Este factor

pode induzir fugas de água substanciais nas juntas de contacto com a descarga de fundo, (ICOLD,

2010).

2.2.6.2 Descarregador de Superfície

A localização dos descarregadores e das tomadas de água podem também induzir alguma

complexidade no dimensionamento do plinto e da cortina de montante.

Caso existam, as paredes adjacentes à cortina devem ser tratadas como encontros muito íngremes.

Os pormenores de dimensionamento do plinto, que se torna parte integrante da parede, da junta

perimetral e das zonas de suporte associadas devem considerar todas as particularidades geométricas

introduzidas por esta estrutura adjacente. A altura das paredes deve ser limitada, quando possível, para

prevenir eventuais roturas nos sistemas de vedação das juntas devido a deformações na camada de

suporte, e prevenir também a tendência de afastamento da cortina da parede ou do encontro natural.

As juntas nesta situação devem ser semelhantes às usadas em BECB implantadas em vales

extremamente estreitos, considerando algumas experiências anteriores neste tipo de obra, como por

exemplo a barragem de Golillas, na Colômbia. A Figura 12 ilustra o pormenor usado na Barragem de

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19

Caruachi, na Venezuela, onde foi efectuada a ligação com a parede de um descarregador de 50 metros

de altura, que tem apresentado um funcionamento adequado.

Figura 12: Ligação descarregador e cortina da barragem de Caruachi, Venezuela , (ICOLD, 2010).

2.2.7 Instrumentação

Para que se consiga um acompanhamento do comportamento das barragens de enrocamento com

cortina de betão a montante nas suas diferentes fases construtivas e de exploração é essencial a

implementação de um rigoroso plano de observação. Este permite, não só a avaliação do

comportamento da barragem, contribuindo para que se possam evitar acidentes, como também

representa um factor importante de melhoria dos projectos futuros deste tipo de obra. A instrumentação

em Portugal é obrigatória em barragens e o seu nível de complexidade está relacionado com a altura

da barragem e com o nível de risco, de acordo com o que está definido nas Normas de Observação e

Inspecção de Barragens (NOIB, 1993) e no Regulamento de Segurança de Barragens (RSB, 2007).

Portugal é tido como exemplo por autores de renome nesta matéria, sendo referido por Cruz et al.

(2009) que “Portugal é um dos países que se destacam neste aspecto, porque avaliações periódicas

das barragens portuguesas são feitas por especialistas do Laboratório Nacional de Engenharia Civil

(LNEC)”.

Salienta-se a importância de tomar medidas no sentido de proteger os equipamentos de observação

durante a construção de BECB. A Figura 13 mostra a camada de protecção executada em redor de um

inclinómetro.

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20

z

Figura 13: Pormenor da instalação de um inclinómetro da Barragem de Veiguinhas.

Na Tabela 2 apresentam-se os principais instrumentos utilizados na monotorização de BECB, incluindo

as grandezas medidas e os locais de implementação.

Tabela 2: Instrumentação de barragens de enrocamento com cortina de betão armado a montante

Instrumento Grandezas Medidas Local de instalação

Tacos de nivelamento Assentamentos Coroamento e banquetas

Inclinómetros verticais Deslocamentos internos horizontais e verticais

Maciço de enrocamento

Inclinómetros inclinados Deformações na cortina de betão armado

Transição maciço/cortina

Fibras ópticas Presença de água Maciço de enrocamento e cortina

Piezómetros Pressões intersticiais na fundação

Fundação

Medidor triortogonal de juntas Deslocamentos da junta segundo 3 direcções

Junta perimetral

Medidor eléctrico de juntas Abertura/Fecho da Junta Juntas verticais

Electro nível Variação Angular Cortina

Medidor de caudais Caudal afluente no pé de jusante Pé do talude de jusante

Complementando o plano de observação, devem ser definidas as visitas de inspecção visual com o

objectivo de detectar sinais ou evidências de deteriorações ou sintomas de envelhecimento, bem como

anomalias no sistema de observação.

2.3 Comportamento das BECB

Uma barragem de enrocamento com cortina de betão armado apresenta, em situação estática, duas

fases distintas de solicitação. Numa primeira fase, que ocorre durante o período de construção e no

período anterior ao enchimento da albufeira, ela é sujeita unicamente ao peso próprio das camadas à

medida que o maciço sobe. Numa fase posterior, após o enchimento da albufeira, a barragem é sujeita

à pressão hidrostática. As deformadas típicas correspondentes às duas fases são apresentadas na

Figura 14.

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21

Figura 14: Deformada: (a) antes e (b) após o enchimento de uma secção transversal de uma

BECB (Mori, 1999).

Durante a fase de construção ocorrem deformações e assentamentos significativos no corpo da

barragem. Os deslocamentos horizontais, nesta fase, ocorrem na direcção do eixo da barragem na

metade superior, provocando um estreitamento do maciço de enrocamento. Na metade inferior o

maciço deforma-se no sentido oposto, o que leva a um alargamento desta zona. Com o enchimento da

albufeira, a pressão da água influencia a deformação da barragem. Os seus efeitos são sentidos

maioritariamente no talude de montante, onde se inverte o sentido da deformação da metade inferior

da barragem.

Este comportamento representa, em geral, as deformações ocorridas numa BECB, contudo o

funcionamento deste tipo de barragem é bem mais complexo e requer uma análise pormenorizada de

diversas grandezas. Assim sendo, neste subcapítulo procurar-se-á apresentar o comportamento de

algumas barragens bem instrumentadas, estabelecendo uma relação entre os assentamentos medidos

e a altura das barragens, os módulos de deformabilidade e a forma dos vales.

2.3.1 Factores que condicionam o desempenho das BECB

O desempenho das barragens de enrocamento com cortina de betão a montante é, em boa medida,

função da integridade da cortina de betão, que lhe confere a estanqueidade. A estabilidade do maciço

de enrocamento não é, em geral, colocada em causa, mesmo sob condições extremamente adversas,

como as ocorridas na barragem de Zingpingpu, onde um sismo de magnitude 8,0 na escala de Richter,

com epicentro a 17,17 km do local da barragem, não comprometeu de forma alguma a estabilidade da

barragem, tendo contudo provocado danos consideráveis na cortina.

Embora, o maciço de enrocamento, seja uma estrutura extremamente estável, as deformações aí

ocorridas repercutem-se no comportamento da barragem, na medida em que provocam a deformação

e fracturação da cortina de betão, dando origem a infiltrações indesejáveis. As deformações no maciço

são, normalmente, consequência de variações significativas da rigidez das diferentes zonas, de uma

sequência construtiva assimétrica, que pode levar à deformação da zona de transição, e dos efeitos de

uma geometria e condições de fundação irregulares ou variáveis. Para além das deformações do

maciço, os deslocamentos da cortina e a sua fissuração estão também relacionados com o efeito de

arco que se gera aquando do enchimento da albufeira. Este efeito de arco traduz-se na existência de

uma região traccionada, perto dos encontros, e de uma região comprimida, na zona central da

barragem, como representado na Figura 15. A compressão imposta nessa zona, especialmente em

barragens muito altas, pode ser de tal forma elevada que provoca a rotura das juntas de compressão

verticais, promovendo a infiltração de água e a percolação através do maciço. A fissuração e a

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22

infiltração de água provocam a saturação e o humedecimento de determinadas zonas do maciço, que,

por sua vez, reduzem a resistência do enrocamento e promovem a sua fracturação. Desta forma, é

possível que as deformações do maciço continuem durante o período de exploração da barragem.

Figura 15: Comportamento de uma BECB quando sujeita à carga imposta pela água: (a) corte

transversal; (b) plano da cortina; (c) zona do plinto, (Giudici et al., 2000).

.

Os assentamentos e as deformações ocorridas, quer no corpo da barragem, quer na cortina

impermeável, estão relacionados com diversos factores, como a deformabilidade dos

materiais que constituem o maciço, a altura da barragem e a forma do vale, pelo que, alguns

autores relacionaram estas grandezas entre si , visando a previsão do comportamento de

futuras barragens. Os valores dos assentamentos, no coroamento, relacionados com a altura

da barragem e o tipo de material são representados na Figura 16. Para além do aumento dos

assentamentos com a altura da barragem, são notórias as diferenças entre os deslocamentos

observados em barragens de enrocamento e de cascalho. Visto que a compressibilidade do

cascalho é muito inferior à do enrocamento, é natural que os valores de assentamentos em

barragens deste material sejam inferiores quando comparadas com as de enrocamento.

De Pinto e Marques Filho, (1998), propuseram a avaliação da forma do vale através da relação A/H2 (A

= área da cortina e H = altura da barragem). Devido ao fenómeno de arqueamento, as tensões

actuantes no maciço variam de vales abertos para vales estreitos. Na Figura 17 apresenta-se a relação,

definida por Johannesson, (2007), entre os deslocamentos verticais expressos relativamente à altura

da barragem (D/H em percentagem) e o factor de forma do vale (A/H2) para várias barragens. As

percentagens de assentamentos em vales abertos, como o de Foz do Areia, são superiores às

registadas em vales fechados como é o caso de El Cajon e Golillas.

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23

Figura 16: Evolução dos assentamentos no coroamento da barragem com a altura (Cruz et al.,

(2009))

Figura 17: Variação da percentagem de assentamentos com a forma do vale (Johannesson, 2007)

Pinto (2007), chama a atenção para o facto de, na maior parte das barragens, não serem medidos os

deslocamentos em verdadeira grandeza, ou seja em 3D, sendo raros os casos em que são medidos

deslocamentos horizontais na direcção do vale. Em vales estreitos há a tendência de os deslocamentos

do maciço se dirigirem para o centro do vale, gerando tensões elevadas na cortina de betão. Pinto

(2007), mostra num gráfico E/ϒH (parâmetro adimensional de deformação, onde E representa o módulo

de deformabilidade, ϒ o peso volúmico e H a altura da barragem) versus A/H2, em que as barragens

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24

que apresentaram problemas de fracturação da laje (Campos Novos, Barra Grande, Mohale e TSQ1)

se encontram abaixo de uma “linha de segurança” definida pela seguinte equação:

E

ϒH= 125 − 20

𝐴

𝐻2

Figura 18: Relação do factor A/H2 (Pinto, 2007)

2.3.2 Casos Históricos e Problemas Recentes em BECB

O desempenho das barragens de enrocamento com cortina de betão a montante pode ser agrupado

em 3 classes. As barragens com altura até 50 metros apresentam valores de deformação e infiltrações

pouco significativos, e sem registo de problemas no comportamento da cortina. Nas barragens com

altura entre os 50 e os 100 metros, verifica-se a existência de algumas fissuras na cortina de betão,

contudo estas não constituem uma ameaça para o correcto funcionamento da barragem. Por outro

lado, nas barragens muito altas, com alturas superiores a 100 metros, têm sido registados alguns

problemas, alguns deles em projectos recentes. Os casos históricos que irão ser apresentados incluem-

se nesta última classe das barragens de altura superior a 100 metros.

2.3.2.1 Aguamilpa

A barragem de Aguamilpa, com 187 m de altura, localizada no México, revelou fendas sub-horizontais

no terço superior da cortina de betão armado e as infiltrações medidas foram da ordem dos 250 l/s. O

maciço é composto por cascalho compactado na zona de montante, enquanto na zona de jusante se

utilizou enrocamento. Os módulos de deformabilidade construtivos foram, respectivamente, iguais a

260 MPa e 47 MPa, para as zonas de montante e jusante. Esta grande diferença de rigidez foi a

principal causa das deformações ocorridas no maciço e consequentemente das fissuras na parte

superior da cortina (Marques Filho e Pinto, 2005). A deformação da cortina é apresentada na Figura 19

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25

Figura 19: Deformações da cortina da barragem de Aguamilpa (Marques Filho e Pinto, 2005)

2.3.2.2 Xingó

A barragem de Xingó, no Brasil, com 150 m de altura, é de enrocamento proveniente de gnaisse na

zona 3B, compactado em camadas de 1 m, enquanto, na zona 3C, as camadas foram compactadas

com 2 m de espessura e o material é proveniente de rocha de pior qualidade. Na zona 2, seguindo as

recomendações de Sherard, foi utilizada areia, com um teor em finos não superior a 12%. Durante a

construção, desenvolveram-se grandes deformações na zona 2, próximo do encontro esquerdo. Na

parte superior do encontro esquerdo, a montante, existe uma rocha entalhada que produziu

significativas variações de cotas da fundação.

Os módulos de deformabilidade obtidos na fase construtiva, revelaram diferenças de rigidez

significativas entre as zonas 3B e 3C. Na zona 3B foram medidos valores de 68 MPa, e na zona 3C os

valores não passaram os 24 MPa. Assim sendo, podem explicar-se as deformações desenvolvidas na

fase de construção, pelas deformações diferenciais entre as diferentes zonas do maciço e pela

existência de regiões traccionadas próximas dos encontros. Antes da betonagem da cortina, todas as

zonas afectadas e fendas foram preenchidas.

Com o enchimento da albufeira, observou-se que as infiltrações variavam entre 110 e 160 l/s,

dependendo do nível da água na albufeira. No encontro esquerdo, voltaram a verificar-se fendas, que

se propagaram para além da zona de transição. Este facto foi explicado devido à geometria da fundação

e também pelo alto teor de finos usado na zona de transição.

É interessante notar que, após o enchimento da albufeira, continuaram a ser registados movimentos

na cortina durante alguns anos, como representado na Figura 20. Mesmo sob uma solicitação não

variável, o maciço continuou a deformar-se, talvez por efeito de colapso e fluência em regiões onde

houve alteração do teor em água, proveniente das infiltrações através da cortina (Penman e Rocha

Filho in Basso, 2007), ou devido à erosão interna dos finos da zona 2.

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26

Figura 20: Barragem de Xingó: deformada da cortina no período de exploração. (Penman e Rocha

Filho in Basso, (2007))

2.3.2.3 Mohale

Nos últimos anos foram registados problemas consideráveis em diversas barragens, levantando-se a

questão se os critérios de projecto actuais são adequados e conseguem acompanhar a tendência de

crescimento, em altura, das barragens deste tipo.

A barragem de Mohale, construída no Lesotho, em África, é um desses casos. Trata-se de uma

barragem de 145 m, construída de acordo com as directivas de projecto actuais, baseadas nas

prescrições de Cooke e Sherard, (1987). O primeiro enchimento foi concluído em Março de 2006, após

um período de chuvas intensas. Após o enchimento, observou-se a fracturação da cortina, que

provocou deformações consideráveis e quebrou a ligação entre a cortina e o betão extrudido dos

muretes de apoio. O resultado final foi a abertura das juntas, tanto as verticais como a perimetral.

Consequentemente, os níveis de infiltração subiram rapidamente, atingindo valores próximos dos 600

l/s (Johannesson e Tohlang, 2007).

Figura 21: Rotura numa junta de compressão na Barragem de Mohale. (Johannesson and Tohlang,

2007)

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27

2.3.2.4 Barra Grande

Na barragem de Barra Grande, no Brasil, o enchimento da albufeira começou em Julho de 2005 e

desenrolou-se com uma taxa aproximada de 2,15 m/dia, devido à forte precipitação que se fez sentir

nesse período. Em Setembro do mesmo ano, os valores das infiltrações medidos registaram um

aumento preocupante, observando-se, pouco tempo depois, a ruptura da junta de compressão, por

desplacamento do betão (spalling), entre as lajes 19 e 20, como ilustra a Figura 22. Na Figura 23

mostram-se os trabalhos de reparação da cortina danificada. Esta ruptura deveu-se à incapacidade de

acomodação, por parte da laje, de esforços de compressão muito elevados que se desenvolveram na

zona central da barragem. Mesmo após as reparações, os valores de infiltração medidos eram

superiores a 1100l/s, tendo-se reduzido este valor para 800 l/s com o lançamento de material silto-

argiloso, que promoveu a colmatação das fendas abertas. (Pritchard, 2008)

Figura 22: Ruptura na junta de compressão da

Barragem de Barra Grande (Borges, 2007)

Figura 23: Reparações na Cortina de Barra

Grande (Borges, 2007)

2.3.2.5 Campos Novos

Em Campos Novos verificou-se um comportamento idêntico ao observado na barragem de Barra

Grande, com a ruptura numa junta de compressão. Contudo, um problema no túnel de desvio provocou

o esvaziamento da barragem, o que revelou a existência de mais fendas de grande dimensão ao longo

da cortina. Na Figura 24 é apresentada uma vista geral das fendas da cortina de Campos Novos. O

fenómeno apresentado na figura é denominado por “spalling” e ocorreu em diversas barragens de

grande altura construídas nos últimos anos, nomeadamente em Barra Grande, Mohale e TSQ 1 (China).

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28

Figura 24: Vista geral das fendas na cortina de Campos Novos (Sobrinho et al., (2007)

2.3.3 Conclusões

Os diferentes casos históricos apresentados neste subcapítulo constituem uma excelente amostra dos

principais problemas ocorridos em barragens de enrocamento com cortina de betão a montante. Como

se havia introduzido, estes problemas fazem-se sentir maioritariamente em barragens de grande altura.

Contudo é evidente que o futuro das BECB passa por projectos cada vez mais ambiciosos com

barragens cada vez mais altas. Assim sendo, é importante uma exposição rigorosa das principais

anomalias registadas e identificar e analisar as causas da sua ocorrência. A previsão destes problemas

é um factor essencial para um maior desenvolvimento das barragens de enrocamento com cortina de

betão a montante.

Ressalva-se, no entanto, que em todos os casos descritos a segurança das barragens nunca esteve

em causa. Todos os problemas ocorridos, embora de alguma gravidade foram problemas de

funcionalidade.

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29

3 Mecânica dos Enrocamentos

3.1 Definição de Enrocamento

As definições de enrocamento evoluíram ao longo do tempo, à medida que mais investigações eram

realizadas nesta área. O conceito de enrocamento foi sugerido ao longo dos anos por diversos

investigadores e está muitas vezes associado à granulometria, à origem e às propriedades mecânicas

dos materiais. De seguida são apresentados alguns conceitos sugeridos por diversos autores.

Segundo Leps (1970), o conceito “enrocamento” é utilizado para definir um conjunto de fragmentos de

rocha cuja distribuição granulométrica corresponde essencialmente a grãos maiores que 12,5 mm com

uma fracção máxima de 30% (preferivelmente 10%) de material de dimensão inferior a 4.8 mm (peneiro

nº 4 da série ASTM).

Marsal (1973) definiu enrocamento como “materiais que, quando submetidos a variações de tensão,

sofrem transformações estruturais devidas a deslocamentos, rotações e fracturação de partículas.”.

Sugeriu ainda que o material para enrocamento deve ter menos de 10% em peso de partículas menores

que 0,2 mm, dimensão máxima entre 20 e 30 cm e ainda um coeficiente de uniformidade maior ou igual

a 1,5.

De acordo com Maranha das Neves (2002), num enrocamento a percentagem de fragmentos com

dimensão inferior a 0,074 mm (peneiro nº 200 da série ASTM) não deve exceder 10%, e a dimensão

máxima dificilmente ultrapassa os 1000 mm. A percentagem de partículas maiores que 50 mm é muitas

vezes maior que 60%. Neste caso, são os blocos de maior dimensão que controlam o comportamento

do maciço. Maranha das Neves (2002) sugeriu ainda uma faixa granulométrica, apresentada na Figura

26, em que devem encaixar as granulometrias dos materiais de enrocamento.

Figura 25: Características granulométricas dos enrocamentos (Maranha Das Neves 2002)

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30

Hoje em dia, o enrocamento utilizado em barragens é um material constituído, maioritariamente, por

blocos rochosos obtidos através do desmonte de maciços rochosos, podendo ser sujeitos a um

processo de britagem.

3.2 Modelação de enrocamentos e ensaios laboratoriais

Segundo Veiga Pinto (1983), as dificuldades na construção de equipamento de elevadas dimensões e

no domínio das técnicas laboratoriais podem considerar-se responsáveis pelo facto de os ensaios sobre

materiais de enrocamento terem sido, um pouco por todo o mundo, adiados ou mesmo postos de parte.

O mesmo autor apresenta esta como uma das razões para que este tipo de material tenha deixado de

ser utilizado, mesmo em situações em que seria economicamente viável, ou não tenha sido utilizado

nas condições mais adequadas.

A lacuna existente em equipamentos de ensaio de grandes dimensões para materiais de enrocamento,

em Portugal, foi suprimida com a instalação, em 1983, de dois equipamentos no Laboratório Nacional

de Engenharia Civil. A câmara de compressão triaxial e a câmara de compressão unidimensional do

LNEC constituem, ainda hoje, os únicos equipamentos de ensaio específicos de materiais de

enrocamento em Portugal.

O cálculo dos deslocamentos e das tensões duma estrutura implica o conhecimento dos efeitos

provocados no material dessa mesma estrutura por uma determinada solicitação. No caso de uma

barragem de enrocamento com cortina de betão a montante o nível de solicitação da estrutura pode

ser obtido com relativa facilidade, uma vez que o peso próprio é o factor mais relevante. Contudo, as

características de deformabilidade dos enrocamentos, segundo Veiga Pinto, (1983) podem variar entre

20 e 140 MPa, o que representa uma gama de variação de 7 vezes. Esta grande variabilidade das

propriedades reológicas dos materiais geotécnicos acentua a necessidade de realização de ensaios

laboratoriais adequados para a obtenção das suas propriedades mecânicas.

No caso particular das BECB, o projecto tem sido maioritariamente baseado no empirismo e na

experiência. No entanto com o constante crescimento, em altura, das barragens têm sido registados

diversos problemas de deformação no maciço de enrocamento, como se referiu anteriormente. Como

tal, é imperativo adaptar o dimensionamento contemplando as técnicas potentes de modelação

numérica disponíveis. A validade dos resultados destes métodos está intimamente ligada à

quantificação dos parâmetros introduzidos nas equações constitutivas. Marsal (1967) sublinhou que,

com a utilização do método dos elementos finitos é comum obterem-se diferenças, entre os resultados

dos modelos e o comportamento real, da ordem dos 100% e que a principal fonte de erro reside na

quantificação dos parâmetros das equações constitutivas dos materiais a partir de ensaios laboratoriais.

Esta afirmação feita há quase 40 anos ainda se pode considerar, apesar de, no que respeita às

ferramentas de cálculo, o panorama ser muito diferente. A mensagem a reter é que a utilização de

ferramentas de cálculo sofisticadas dever ser sempre apoiada numa boa caracterização dos materiais,

sob pena de se poderem obter resultados pouco relevantes.

Atendendo ao panorama apresentado, o cálculo numérico realizado neste trabalho terá como fonte de

parâmetros das equações constitutivas os ensaios de laboratório e de campo realizados pelo LNEC no

âmbito da obra que constitui o caso de estudo deste projecto.

Neste capítulo são descritos os diversos ensaios realizados e algumas das suas particularidades.

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31

3.2.1 Equipamento e técnicas de ensaio

No âmbito do projecto e construção da Barragem das Veiguinhas foram realizados, no Departamento

de Geotecnia do LNEC, diversos ensaios de laboratório complementados por alguns ensaios de campo

realizados no local da obra. A realização desta dissertação envolveu o acompanhamento de alguns

desses ensaios, quer laboratoriais, quer de campo, essenciais à caracterização das propriedades dos

materiais a usar no modelo numérico. Os resultados desses ensaios serão posteriormente

apresentados, servindo o presente capitulo para introduzir algumas particularidades dos equipamentos

e da metodologia de ensaio usada para os materiais de enrocamento.

3.2.1.1 Câmara de Compressão Triaxial T30

Segundo Veiga Pinto, (1982) é possível a determinação das características tensão-deformação de

materiais de enrocamento em laboratório, em provetes de 300 mm de diâmetro, desde que a dimensão

máxima das partículas não seja inferior a 50 mm. Para tal, foi usado o equipamento triaxial de grande

dimensão existente no LNEC, a câmara de compressão triaxial T30.

Este equipamento é composto essencialmente por três partes. A primeira é uma base amovível com

diâmetro exterior de 570 mm e que possui quatro ligações de entrada de água. Uma para a câmara de

pressão e as três restantes para o interior do provete, duas pela base e uma pelo topo. A segunda parte

é uma camara de pressão cilíndrica de aço, com 20 mm de espessura, e a terceira é um conjunto que

permite o guiamento do êmbolo na câmara e a inspecção da amostra, antes e após o ensaio, sem

retirar a câmara de pressão. O interior da câmara tem um diâmetro de 450 mm e uma altura de 850

mm. As placas de aço na base e no topo da amostra têm 300 mm de diâmetro e uma espessura de 30

mm. Entre estas placas e o provete colocam-se duas placas porosas com 10 mm de espessura. Uma

das maiores dificuldades na condução de ensaios triaxiais de materiais de enrocamento diz respeito ao

isolamento do provete do fluido que se utiliza como meio de aplicação da tensão de confinamento. Por

um lado, o revestimento deve ser flexível de modo a não perturbar a tensão de confinamento aplicada

ao provete. No entanto, deverá também ser suficientemente rígido para não ser perfurado pelas

saliências pontiagudas dos elementos rochosos (Veiga Pinto, 1983). Este revestimento é materializado

por camisas de borracha, com 295 mm de diâmetro interno, com espessuras de 1 a 2 mm. Outra

dificuldade na preparação dos provetes de enrocamento está relacionada com a compactação de forma

a conseguir níveis de compacidade próximos daqueles obtidos nos aterros quando compactados com

pesados cilindros vibradores. Para ultrapassar esta dificuldade usa-se um molde de compactação

seccionado, segundo planos transversais e um plano longitudinal, em várias peças de mais fácil

manuseio, com 300 mm de altura cada. Na Figura 26 são apresentados: o provete envolto pelas

camisas de borracha e o processo de compactação no respectivo molde.

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32

(a)

(b)

Figura 26: Equipamento de ensaio triaxial : (a) colocação do provete na câmara; (b) compactação

do provete no molde de compactação.

3.2.1.2 Representatividade das amostras laboratoriais

Considerando as dificuldades envolvidas no espalhamento, compactação e instrumentação de uma

amostra de enrocamento em tamanho real, é praticamente impossível simular em laboratório as

condições de campo. Porém, a aplicação de qualquer método de análise para barragens de

enrocamento requer conhecimentos das propriedades de resistência e deformabilidade do material.

Sendo assim, é necessário procurar alternativas que levem às informações necessárias. Essas

alternativas normalmente envolvem ensaios laboratoriais em material de enrocamento que não

apresentam a granulometria de campo (Marachi et al. 1969).

Veiga Pinto, (1982) afirma que, para uma amostra de enrocamento apresentar uma boa

reprodutibilidade das condições de campo tem de possuir semelhança:

1. na granulometria;

2. no estado de compacidade;

3. na forma das partículas.

As dificuldades dos estudos de laboratório dos materiais de enrocamento estão associadas à dimensão

de algumas das suas partículas. Devido à impossibilidade de preparação dos corpos de prova com

amostras de dimensão real, é necessário analisar o efeito da modelação da dimensão das partículas

em relação à dimensão da amostra ensaiada no laboratório.

Em relação à granulometria, Veiga Pinto, (1982) refere que se utilizam normalmente ou curvas

granulométricas paralelas às do material de campo (1), ou a substituição de fracções mais grosseiras,

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33

de dimensão superior às que podem ser utilizadas nos provetes laboratoriais, por material de menor

dimensão (2), Figura 27.

Figura 27: Diferentes métodos de modelar curvas granulométricas laboratoriais de enrocamentos,

(Veiga Pinto, 1982)

O primeiro método consiste numa granulometria paralela à de campo, com uma diferença de ΔD, que

representa a diferença entre o diâmetro máximo dos blocos de enrocamento de campo e o das

partículas da amostra, cujo valor depende do tamanho do provete. No segundo método eliminam-se as

fracções do enrocamento de campo superiores ao diâmetro máximo das partículas da amostra e

substituem-se por partículas correspondentes ao mesmo peso de material dessa fracção. Segundo

Basso, (2007) estes procedimentos devem ser analisados cuidadosamente, pois cada um dos casos

tem as suas particularidades. Por exemplo, a utilização de curvas paralelas pode fornecer uma

quantidade elevada de finos, o que muda muito o comportamento da amostra. O segundo método

produz uma amostra mais uniforme, que também tem influência no comportamento do enrocamento.

Apesar da maior quantidade de finos, o método das curvas paralelas tem sido o mais utilizado.

3.3 Comportamento mecânico de enrocamentos

O comportamento mecânico dos materiais de enrocamento é condicionado maioritariamente, pela

resistência ao corte, que garante a estabilidade global da estrutura, e pelas características de

deformabilidade que condicionam a verificação aos estados limites de serviço. No caso das BECB, os

níveis altos de deformabilidade no maciço de enrocamento podem provocar fendas e rupturas na

cortina de betão armado, provocando caudais excessivos. A estabilidade do maciço de enrocamento

raramente é determinante no comportamento da barragem, uma vez que a resistência ao corte do

maciço de enrocamento é suficiente para mantê-lo em equilibro estático. Desta forma, este subcapítulo

incidirá sobre a deformabilidade dos enrocamentos e os fenómenos que a condicionam.

3.3.1 Factores que condicionam o comportamento reológico de enrocamentos

Ao longo do tempo, diversos estudos experimentais têm mostrado que o comportamento mecânico dos

materiais de enrocamento é caracterizado por:

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34

1. Um comportamento tensão-deformação não linear, não elástico e dependente do estado de

tensão;

2. Um aumento, com a tensão de confinamento, da tensão tangencial, da deformação axial e da

deformação volumétrica na ruptura;

3. Um aumento na deformação volumétrica com o aumento do tamanho das partículas para

tensões de confinamento idênticas.

Estas três características principais são afectadas em diferentes escalas, por diferentes factores,

incluindo: o estado de tensão inicial, a trajectória de tensão, o estado de compacidade inicial, a origem

mineral das partículas de enrocamento, o tamanho e forma das partículas, o teor em água e a

granulometria. Veiga Pinto, (1983) expõe em esquema os diversos factores que influenciam o

comportamento mecânico dos enrocamentos, como mostra a Figura 28. Segundo o autor, os factores

mais importantes são o estado de tensão (dependente da trajectória de tensão), o estado de

compacidade e a resistência ao esmagamento dos elementos rochosos. Contudo não existem formas

de prever exactamente o efeito dos diversos factores uma vez que as características naturais do

enrocamento são alteradas em presença das diversas condicionantes mencionadas.

Figura 28: Condicionantes do comportamento reológico dos materiais de enrocamento , (Veiga

Pinto, 1983)

3.3.1.1 Estado de Tensão

Sabendo-se a priori que a resistência ao corte do enrocamento não é uma característica condicionante

do comportamento das barragens de enrocamento, apresentar-se à de seguida a influência do estado

de tensão nas propriedades de resistência dos enrocamentos, por se considerar uma característica

Fact

ore

s q

ue

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dic

ion

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co

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gico

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nro

cam

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Tipo de elementos rochosos

Estrutura do meio granular

Modalidade de ensaio

- Resistência ao esmagamento - Forma das partículas - Tipo litológico - Atrito entre partículas

- Estado de compacidade - Dispersão granulométrica - Teor em água - Finos

- Trajectória de tensão - Tensão ou deformação controlada - Revestimento da amostra - Velocidade de aplicação da deformação

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35

particular, relevante, do comportamento dos enrocamentos. Será também abordada a influência do

estado de tensão na deformabilidade das BECB.

É um facto bem conhecido, que devido ao comportamento não linear dos geomateriais, a resposta a

uma dada solicitação mecânica é diferente consoante o estado de tensão inicial. Nos solos granulares

os efeitos são observados ao nível da máxima tensão deviatórica, da dilatância, do ângulo de atrito e

do módulo de deformabilidade, como concluído por inúmeros trabalhos experimentais desenvolvidos

para estudar as propriedades mecânicas das areias. Contudo, os ensaios com enrocamentos são bem

menos frequentes, embora possam ser encontrados em diversos trabalhos de referência realizados por

Marsal et al. (1965), Fumagalli, (1969),Marachi et al. (1969), Charles and Watts, (1980), Veiga Pinto,

(1983), Maranha das Neves, (1991), Indraratna et al. (1993), Chavez e Alonso, (2003), Varadarajan et

al. (2003), Kohgo et al. (2007), entre outros. Com base nos dados de alguns dos trabalhos acima

referidos, Nieto Gamboa, (2011), representou a evolução do ângulo de atrito de pico (φpico) com a

tensão de confinamento, sugerindo uma redução do ângulo de atrito com o aumento da tensão de

confinamento (Figura 29).

Figura 29: Redução do ângulo de atrito com o aumento da tensão de confinamento, (Nieto

Gamboa, 2011)

Leps (1970), apresentou, também, um estudo sobre influência da tensão de confinamento na

resistência ao corte de enrocamentos, recorrendo a resultados de ensaios triaxiais publicados entre

1930 e 1970 provenientes de 100 materiais diferentes, correspondentes a 15 variedades de rocha. Os

resultados obtidos por Leps, (1970) apontam claramente para a redução do angulo de atrito com o

aumento da tensão de confinamento.

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36

Figura 30: Estudo da resistência ao corte com a tensão de confinamento em ensaios triaxiais de

grandes dimensões, (Leps, 1970)

Leps (1970) alerta para o facto de o efeito da quebra das partículas ser pouco perceptível. A escala

semi logarítmica na Figura 30 é usada de forma a evidenciar a grande variação do ângulo de atrito para

baixas e médias tensões de confinamento, ou seja pretende mostrar com maior detalhe a gama de

tensões onde o material de enrocamento se deforma mais pelo rearranjo das suas partículas e não

tanto pela sua fracturação.

A figura apresenta também três linhas de tendência, que obedecem de forma geral à equação sugerida

por Duncan et al. (1989):

𝜑′ = 𝜑′0 − ∆𝜑′𝑙𝑜𝑔10 (

𝜎′3𝑝𝑎𝑡𝑚

) [1]

A envolvente de rotura é normalmente representada pelo critério de Mohr-Coulomb, que se assume

como uma função linear no plano das tensões normal e tangencial, ou seja, um ângulo de atrito

constante. Contudo, como se mostra na Figura 29 e na Figura 30, o ângulo de atrito para o material de

enrocamento varia com a tensão de confinamento. Este facto levou ao desenvolvimento de envolventes

de rotura curvas.

Charles and Watts (1980) propuseram uma envolvente de rotura do tipo:

𝜏 = 𝐴 ∙ 𝜑′

𝑏 ⋰⋱ 𝑏 < 1 [2]

onde A e b são constantes, que podem ser obtidas por ajuste de dados de ensaios laboratoriais. A

curvatura da envolvente está relacionada com a fractura das partículas. Por outro lado, Terzaghi et al.,

(1996) propuseram uma formulação em que o ângulo de atrito é a soma de duas componentes

independentes. A primeira componente é o atrito entre partículas (𝜑′𝑢), dada pelo atrito entre duas

superfícies lisas e relacionada maioritariamente com a composição mineral das partículas. A segunda

é uma componente de interferência geométrica (𝜑′𝑔). Assim o ângulo de atrito é representado por:

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37

𝜑′ = 𝜑′𝑔 + 𝜑′𝑢 [3]

Quando o confinamento e a tensão aumentam, a sobreposição e deslocamento de grãos, fora do plano

de corte torna-se mais difícil. O movimento entre partículas é completado pela fractura e pelo

esmagamento das partículas, o que resulta numa diminuição do ângulo de interferência geométrica

(𝜑′𝑔). Este efeito tem como consequência a redução do ângulo de atrito global para altas tensões de

confinamento. Como a fractura aumenta com o aumento do estado de tensão, isto pode explicar a

curvatura da envolvente.

A deformação volumétrica é também dependente do nível de tensão. O enrocamento, sob elevada

tensão de confinamento, exibe uma substancial fractura das partículas, enquanto, para baixa tensão

de confinamento, a deformação é dominada pelos deslocamentos entre partículas, através do seu

rearranjo. Como tal, o aumento da deformação volumétrica é muito mais acentuado para tensões de

confinamento menores, como mostra a Figura 31.

Figura 31: Evolução da deformação volumétrica com a tensão de confinamento para

granulometrias distintas de enrocamento de basalto, (Marachi et al., 1969)

3.3.1.2 Índice de vazios e densidade relativa

O índice de vazios é um factor que influência a deformabilidade e a resistência dos materiais granulares.

Segundo Terzaghi e Peck (1948) a compressibilidade para amostras inicialmente soltas é bem maior

que para amostras densas. Contudo, apesar de alguns autores terem usado o índice de vazios como

parâmetro representativo da deformabilidade, como foi o caso de Fumagalli, (1969), este parâmetro

não é o mais adequado. Maranha das Neves (2002) mostra que ao serem ensaiadas duas amostras

do mesmo material, com distribuições granulométricas paralelas e iguais índices de vazios iniciais,

estas não apresentam comportamento semelhante. Santos et al. (2005), através de ensaios

edométricos, mostra que a compacidade relativa (DR) é o parâmetro mais representativo. Na Figura 32

apresentam-se as curvas tensão-deformação de duas granulometrias diferentes (Фmax= 3” e 1”) com

pesos volúmicos praticamente iguais, ou seja, índices de vazios idênticos.

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38

Figura 32: Comportamento edométrico de amostras com o mesmo índice de vazios e diferentes

granulometrias e compacidades relativas, (Santos et al., 2005).

Pode verificar-se a diferença significativa na deformabilidade das duas amostras. Sabendo-se que em

barragens de enrocamento compactado não são obtidos enrocamentos com compacidades relativas

de 55%, sendo este valor mais próximo da compacidade dos enrocamentos em barragens de

enrocamento lançado, a Figura 32 mostra claramente a diferença de comportamento entre os dois tipos

de barragem, ou seja, a influência do processo de compactação na deformabilidade dos maciços de

enrocamento.

3.3.1.3 Granulometria

A granulometria influencia a compacidade do material. Materiais de enrocamento com granulometrias

uniformes no seu estado mais compacto são menos densos que materiais com uma granulometria

extensa.

Marsal (1973) verificou que um material bem graduado, por apresentar partículas de diversos

diâmetros, tem um número de contactos entre grãos significativamente maior que um material uniforme.

Este comportamento verifica-se porque as partículas de menor dimensão tendem a ocupar os vazios

entre as partículas maiores. O aumento do número de contactos resulta numa maior distribuição das

tensões de contacto e numa redução das forças inter-granulares que, por sua vez, reduz a fracturação

e o rearranjo das partículas.

Pelo exposto anteriormente, a baixa compressibilidade de um enrocamento é conseguida através da

minoração das tensões de contacto e do rearranjo das partículas, para o que é necessário obter altos

níveis de compacidade. Uma granulometria extensa permite obter um menor índice de vazios e o

consequente aumento do número de contactos.

3.3.1.4 Forma das partículas

Segundo Veiga Pinto (1983) a forma das partículas afecta as propriedades mecânicas dos

enrocamentos porque influencia o seu imbricamento. Para baixos estados de tensão, a angulosidade

das partículas parece conduzir a um decréscimo da deformabilidade do meio granular. No entanto, para

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39

níveis de tensão mais elevados pode originar um acréscimo do esmagamento e fracturação das

partículas e, naturalmente, uma maior deformabilidade.

Penman (1969) observou que quando a forma das partículas apresenta saliências mais arredondadas,

a compressibilidade do enrocamento é significativamente menor. Este comportamento é justificado com

o maior índice de vazios apresentado por enrocamentos compostos por partículas angulares. Esta

influência da forma das partículas na compressibilidade dos aterros é comprovada pela utilização de

seixos em algumas barragens que apresentam valores de deformação bastante inferiores aos do

enrocamento, como ilustrado em 2.3.1 na Figura 16.

Um dos parâmetros utilizados para quantificar os blocos de enrocamentos do ponto de vista geométrico

é o coeficiente de forma (Cf). Este parâmetro exprime a relação entre o volume da partícula e o volume

de uma esfera fictícia equivalente. No caso de um conjunto de partículas, o seu valor pode ser obtido

através da seguinte equação (Marsal, 1973):

𝐶𝑓 =

∑𝑝𝑖𝛾𝑑𝑔

𝑛𝑖=1

∑𝜋6

𝑛𝑖=1 𝐷𝑖

3 [4]

Em que 𝑝𝑖 é o peso duma partícula à qual corresponde uma dimensão média 𝐷𝑖 e 𝛾𝑑𝑔 é o peso

volúmico dos grãos.

3.3.1.5 Resistência ao esmagamento e influência da dimensão das partículas

A variação da resistência ao esmagamento com a dimensão das partículas representa o efeito de

escala característico do comportamento dos enrocamentos. Este facto foi observado

experimentalmente por diversos autores, entre eles Marsal (1973) e Maranha das Neves e Veiga Pinto

(1977). A explicação para este efeito remete para a distribuição probabilística dos defeitos e

imperfeições no interior das partículas. Assim, para um material com as mesmas características

mineralógicas e uma distribuição homogénea de fracturas, uma partícula maior terá mais defeitos que

uma partícula de menores dimensões. Como tal, para o mesmo nível de tensão terá maior probabilidade

de fracturar.

De acordo com Marsal (1973) os blocos de enrocamento são friáveis e têm uma resistência à

compressão de quatro a cinco vezes maior que a resistência à tracção.

Marsal (1969), propôs um ensaio, bastante expedito, para avaliar a resistência das partículas

enrocamento, quando submetidas a uma determinada solicitação. O ensaio consiste em colocar três

blocos de enrocamento de dimensões aproximadamente iguais entre duas placas de aço. Aplicam-se

forças crescentes e regista-se o valor de (𝑃1), correspondente ao esmagamento da primeira partícula.

A relação 𝑃1/𝑁𝑐, em que 𝑁𝑐 é o menor número de contactos dos fragmentos rochosos com cada uma

das placas (superior e inferior), designa-se por resistência ao esmagamento (𝑃𝑎).

Quanto à influência do tamanho das partículas, as forças de contacto 𝑃 entre partículas individuais

exibem uma distribuição aproximadamente normal. De acordo com Maranha das Neves e Veiga Pinto

(1977) a força de contacto média é dada pela equação [5]:

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40

𝑃 = 𝑘 ∙ 𝐷𝑏 [5]

onde D é o diâmetro nominal das partículas e k e b são constantes determináveis experimentalmente.

De acordo com Marsal (1969) a força que provoca o esmagamento de uma partícula obedece a uma

lei cujo valor médio é dado pela equação [6]

𝑃𝑎 = 𝜂 ∙ 𝐷𝜆 [6]

O valor de 𝜆 varia normalmente entre 1,2 e 1,8, e o de 𝜂 corresponde à resistência ao esmagamento

do material rochoso para um diâmetro médio de 1 cm. D é a média aritmética de três dimensões com

direcções aproximadamente ortogonais. Exprimindo as forças e diâmetro nas equações [5] e [6], nas

mesmas unidades, verifica-se que 𝜆 é menor que b, visto que a fracturação aumenta com o diâmetro

das partículas, o que se comprova com o aumento da área de sobreposição das curvas de distribuição

de 𝑃 e 𝑃𝑎, quando aumenta a dimensão da partícula, como mostra a Figura 33.

Figura 33: Distribuição normal das forças de contacto e das forças de esmagamento, (Marsal,

1969)

Marsal (1973) através de um modelo matemático e estatístico para a distribuição de forças de contacto,

sob tensão constante, numa determinada área, obtêm-se as seguintes relações de forças de contacto

médias:

𝑃𝑒𝑛𝑟𝑜𝑐𝑎𝑚𝑒𝑛𝑡𝑜 = 103 × 𝑃𝑐𝑎𝑠𝑐𝑎𝑙ℎ𝑜 = 10

6 × 𝑃𝑎𝑟𝑒𝑖𝑎 𝑚é𝑑𝑖𝑎

Verifica-se com este estudo que a fractura de partículas de enrocamento pode ocorrer para baixos

níveis de tensão, tendo em conta as elevadas forças de contacto.

3.3.1.6 Teor em água

Como já referido e confirmado por diversos autores, como Marsal, (1973), Nobari and Duncan, (1972),

entre outros, o material de enrocamento sofre colapso a tensão efectiva constante em resultado da

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41

alteração do seu teor em água. Nobari e Duncan, (1972) nos trabalhos realizados com enrocamentos

da barragem de Pyramid, mostram claramente este comportamento característico dos enrocamentos,

ilustrado na Figura 34.

Figura 34: Curvas tensão-deformação de ensaios edométricos dos enrocamentos da

barragem de Pyramid em amostras secas e saturadas, (Nobari and Duncan, 1972).

A maior facilidade de ocorrência de fracturação nas partículas e esmagamentos nas zonas salientes

dos fragmentos rochosos, no estado húmido, prende-se com a alteração de pressões intersticiais no

interior das partículas, que diminuem a sua resistência à fracturação.

Alonso e Oldecop (2001), através de um estudo experimental, verificaram que a fracturação de

partículas rochosas e a propagação das fracturas no seu interior são mecanismos básicos subjacentes

ao comportamento do material, controlados pela humidade relativa que preenche os vazios do

enrocamento. Verificou-se, neste estudo, que as deformações por colapso obtidas em meio saturado

eram semelhantes àquelas obtidas com valores de humidade relativa próximos de 100%.

Posto isto, é natural que com uma molhagem abundante, durante a compactação, as estruturas de

enrocamento fiquem com elevados níveis de compacidade, baixos índices de vazios, devido à

fracturação, induzida pela saturação do material. No entanto, a variação dos níveis de tensão e eventual

sufusão podem dar origem a novas deformações por colapso. O fenómeno de sufusão está associado

à lavagem dos materiais finos pela percolação de água, mantendo-se inalterada a macro estrutura, ou

seja, os blocos de maior dimensão.

3.4 Características Tensão – Deformação dos Enrocamentos em BECB

O aterro compactado de uma barragem de enrocamento com cortina de betão armado a montante é

uma estrutura deformável com as características de um material elastoplástico, com deformações

elásticas muito pequenas na descarga, (Basso, 2007). Veiga Pinto, (1983) mostra que o

comportamento tensão deformação de materiais de enrocamento é completamente diferente em

condições de carga e de descarga. O enrocamento é muito mais rígido na descarga, o módulo de

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42

compressibilidade (K) nesta fase é da ordem de 5 a 6 vezes maior que o mesmo módulo na fase de

carregamento.

Analisando o estado de tensão em três pontos distintos no interior do maciço de enrocamento de uma

BECB, pode afirmar-se que um ponto situado perto da cortina de impermeabilização, no final da

construção, é sujeito a baixas tensões, ao contrário de um ponto situado na zona central do maciço.

Na fase de enchimento, com o aumento das pressões hidrostáticas, a zona próxima da cortina, até aqui

submetida a baixos níveis de tensão, passa a ter um novo estado de compressão e apresenta

deformações significativamente maiores que na fase de construção. Por outro lado, a zona central do

aterro, submetida a maiores tensões de confinamento, tem tensões de corte inferiores às verificadas

durante o carregamento, sofrendo, desta forma, deslocamentos muito menores, na fase de enchimento

(Figura 35). O efeito do enchimento é, assim, sentindo quase na sua totalidade, na zona imediatamente

a jusante da cortina.

Figura 35: Relação tensão-deformação e trajectórias de tensão na construção e enchimento de

uma BECB, (Mori, 1999).

É notório que o enrocamento de montante é sujeito a um carregamento, em valor e em direcção, muito

diferente daquele a que está sujeito o enrocamento de jusante, na fase de enchimento da albufeira. Há

zonas de recompressão, embora algumas estejam associadas também a mudanças de direcção da

tensão. Segundo Cruz (2005) o material de enrocamento, para baixas tensões, pode apresentar um

comportamento “linear elástico”, contudo o comportamento do material na descarga apresenta

deformações permanentes.

A deformabilidade dos enrocamentos é diferente para os diferentes estados e trajectórias de tensão.

Como tal, o cálculo de deslocamentos em estruturas de material de enrocamento deve contemplar

diferentes módulos de deformabilidade, dependentes do estado e da trajectória de tensões.

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43

O estado de tensão varia expressivamente da fase de construção para a fase de enchimento. Os

deslocamentos horizontais, na fase de enchimento, são muito grandes quando comparados com os

apresentados na fase de construção. Este comportamento indica que existe uma rotação das tensões

principais, devida ao carregamento hidrostático da água, e que esta rotação é mais pronunciada na

zona inferior imediatamente a jusante da cortina, (Basso e Cruz, 2006).

A Figura 36 apresenta a rotação das tensões principais ao longo do enchimento da albufeira da

barragem.

Figura 36: Relação tensão-deformação e trajectórias de tensão na construção e enchimento de

uma BECB, (Mori, 1999).

3.5 Conclusões

A grande variabilidade no comportamento dos materiais de enrocamento, demonstrada por vários

estudos de diversos autores, mostra a necessidade de uma detalhada caracterização dos materiais. A

correcta definição das propriedades mecânicas dos materiais de enrocamento depende claramente do

programa de ensaios prescrito. Este deve englobar a influência dos diversos factores que condicionam

o comportamento dos materiais de enrocamento. Estes factores, apresentados no presente capítulo,

são diversos, actuam simultaneamente e são interactivos, tal como mostra a Figura 37.

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44

Aumento em:

Res

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ção

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de

ten

são

Pro

voca

:

Resistência das

partículas ↓

Ângulo de atritoa ↓

Índice de vazios ↑b ↑ ↓ ↓ ↓ ↓

Granulometria ↑ ↑

Fracturação ↓ ↑ ↑ ↓ ↑

a Ângulo de atrito entre partículas b Um ângulo de atrito maior torna a compactação do material mais difícil, precisa de maior energia para atingir um dado índice de vazios.

Figura 37: Interinfluência dos parâmetros que condicionam o comportamento dos enrocamentos,

(Nieto Gamboa, 2011)

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45

4 Modelação numérica

4.1 Software Utilizado

Um dos objectivos da presente dissertação foi o de desenvolver um modelo numérico de uma barragem

de enrocamento com cortina de betão a montante, capaz de permitir uma modelação do

comportamento tensão/deformação e representar um complemento ou até uma alternativa às

formulações empíricas usadas normalmente no projecto de BECB.

Em linha com este objectivo, pretendeu-se conceber um modelo facilmente adaptável, devidamente

parametrizado, capaz de ser aplicado, sem esforço significativo, não só ao caso de estudo desta tese,

como também a qualquer barragem deste tipo. A definição desta meta prende-se com a convicção de

que a maioria dos softwares comerciais, apesar de representarem uma solução muito expedita e útil

para diversos problemas de cálculo numérico aplicado à Engenharia Civil, oferecem demasiadas

simplificações, escondendo frequentemente opções importantes em valores por omissão (default

values), podendo induzir em erro um utilizador menos experiente.

Desta forma, optou-se por usar o software “open-source”, Code_Aster, desenvolvido pela Électricité De

France (EDF). Code_Aster, acrónimo para Análise de Estruturas e Termomecânica para Estudos e

Investigações é um software geral de elementos finitos capaz de executar análises: estáticas lineares,

estáticas não lineares, dinâmicas e termo-hidro-mecânicas. O Code_Aster não oferece qualquer

interface gráfica de pré e pós processamento, recebe um ficheiro de comandos, e um ficheiro com a

definição da malha e fornece ficheiros de resultados. Como tal para a visualização da malha e dos

resultados utilizaram-se os softwares Salome e Gmsh.

4.2 Geometria e malha de elementos finitos

As malhas de elementos finitos e as geometrias necessárias para a sua criação foram desenvolvidas

através de dois scripts em linguagem de programação Python: o primeiro para uma modelação 2D e o

segundo para um modelo 3D. Estes scripts, foram escritos para que a barragem, fundação e

respectivas malhas possam ser desenhadas em função de uma série de inputs, introduzidos pelo

utilizador. Neste capítulo descrever-se-á a forma como foi estruturado o código e algumas

características relevantes, fazendo referência separadamente a cada um dos modelos desenvolvidos.

4.2.1 Geometria e Malha 2D

O primeiro passo deste trabalho de cálculo passou pelo desenvolvimento de um modelo bidimensional

de uma BECB. Este processo teve início com a criação de um script parametrizado para a geração da

geometria e da malha a usar no modelo 2D. Este conjunto de linhas de código foi inicialmente criado

com o intuito de servir de base para um cálculo tensão-deformação, sendo que os parâmetros pedidos

ao utilizador são referentes às características geométricas da barragem e fundação, como por exemplo

coordenadas de pontos relevantes (coroamento e base da barragem e limites da fundação), inclinação

dos taludes, número de camadas, etc. Contudo, durante o desenvolvimento desta dissertação,

considerou-se relevante realizar uma análise de percolação. Como tal, foi necessário proceder à

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46

alteração do script previamente criado para fazer face às exigências do novo cálculo. Assim sendo,

foram definidas várias zonas de diferentes permeabilidades com base em dados introduzidos pelo

utilizador, como por exemplo as dimensões da cortina de injecções, as coordenadas de pontos que

definem o zonamento interno da barragem e a existência, ou não, de uma camada mais permeável no

topo da fundação e respectiva espessura. O processo de criação da geometria consistiu basicamente

na geração dos elementos da fundação e aterro, que foram manipulados através de um conjunto de

operações booleanas por forma a dividir o aterro em camadas e a criar o zonamento da fundação e do

maciço. A malha de elementos triangulares, de seis nós, foi gerada a partir da geometria produzida,

recorrendo ao algoritmo muito simples Netgen2D (Schoberl, 1997), e foram criados os grupos de nós

e de malha essenciais ao cálculo, com base nos grupos definidos para a geometria. É permitido ao

utilizador definir a dimensão média dos triângulos para os diferentes grupos, podendo desta forma

refinar a malha onde achar necessário. O ficheiro Python desenvolvido tem incluído um conjunto de

comentários elucidativos que permitem ao utilizador, não só perceber os dados que tem de introduzir,

como também o processo de geração da geometria e da malha. Para a visualização e manipulação

dos elementos de geometria e da malha, o ficheiro Python foi executado no software Salome. Na

criação da geometria e geração da respectiva malha foram assumidas diversas simplificações:

a cota da fundação foi considerada constante e igual a 1188 m;

o zonamento interno só foi admitido no cálculo de percolação;

a construção do aterro foi realizada em 10 camadas;

a malha não inclui elementos de modelação da cortina;

a fundação tem os deslocamentos horizontais impedidos na base e nos limites laterais e os

deslocamentos verticais impedidos na base;

os limites da fundação foram definidos suficientemente afastados de modo a não interferir com

o comportamento do aterro;

foi definida uma zona com a largura do plinto e com 15 m de profundidade, correspondente à

cortina de injecções;

foi definida uma camada de 10 m abaixo da base do aterro, correspondente à zona superficial

da fundação de maior permeabilidade;

não foi considerada a banqueta existente no paramento de jusante.

A cota da fundação definida foi superior à cota real em grande parte do perfil de maior altura da

barragem para permitir a comparação com os resultados do modelo 3D, visto que, neste modelo, a

fundação se encontra a uma cota superior, na zona central é próxima de 1188 m.

As visitas realizadas à obra e os relatórios de obra revelaram que os materiais C e D apresentam

características muito semelhantes, com excepção dos primeiros metros de aterro. Com base nestes

dados assumiu-se a homogeneidade do maciço para o cálculo tensão-deformação.

O número de camadas associado à simulação da construção da barragem foi definido com base nos

estudos de Clough e Woodward (1967) e de Naylor et al. (1981), descritos em 4.3.2.

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47

À data da criação do código de geração da geometria e da malha ainda não existia, nem estava prevista,

uma banqueta no talude de jusante. Por constrangimentos de obra houve a necessidade de alterar o

projecto e construir a referida banqueta. Quando esta alteração foi comunicada, o modelo 2D achava-

se terminado e estava já em curso o desenvolvimento do modelo 3D. Assim sendo, optou-se por incluir

esta modificação somente no último modelo.

A malha constituída por 3318 elementos triangulares de 6 nós é apresentada na Figura 38.

Figura 38: Malha 2D da barragem de Veiguinhas

4.2.2 Geometria e Malha 3D

A geometria do modelo tridimensional foi construída em duas partes. A fundação foi gerada a partir de

um conjunto de prismas triangulares. A superfície da fundação foi obtida através de um conjunto de

pontos da cartografia da zona de implantação da barragem. Este conjunto de pontos, introduzido

através de um simples ficheiro de texto, é submetido a uma triangulação de Delaunay, e assim é criado

o grupo de prismas. Este conjunto de prismas é agrupado dando origem à geometria da fundação. Tal

como na geometria 2D, todo este processo é facilmente obtido através de um script em Python. A

barragem é criada independentemente da fundação, como um sólido regular. Este volume é

condicionado pela geometria da fundação. Esta operação booleana, de corte, permite ajustar a

geometria da barragem à superfície da fundação. Tendo em conta que as trajectórias de tensão e de

deformação são relevantes para o comportamento do enrocamento, a simulação da construção da

barragem deve ser executada em camadas. Assim, o aterro é dividido em camadas através de vários

planos de corte, permitindo um conjunto de camadas arbitrário definido pelo utilizador. A malha, tal

como no modelo bidimensional, foi obtida através do algoritmo Netgen, neste caso 3D. Os grupos foram

definidos com base na geometria. Tal como no caso 2D, à geometria e à malha 3D estão associadas

algumas simplificações:

o maciço foi considerado homogéneo;

a malha não inclui os elementos de modelação da cortina;

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o aterro foi construído em 15 camadas;

a fundação tem os deslocamentos horizontais impedidos na base e nos limites laterais e os

deslocamentos verticais impedidos na base;

os limites da fundação foram definidos suficientemente afastados de modo a não interferir no

comportamento do aterro.

A malha constituída por 113987 elementos tetraédricos de 10 nós é apresentada na Figura 39. O

número de camadas da modelação 3D é maior que o da modelação 2D para permitir uma adequada

adaptação à geometria irregular da fundação.

Figura 39: Malha 3D da barragem de Veiguinhas

4.3 Ficheiro de comando

É no ficheiro de comando que são definidos todos os passos do cálculo. Desde a importação da malha,

à extracção dos resultados, todo o processo é definido neste ficheiro. As linhas de comando para os

modelos 2D e 3D apresentam algumas diferenças, contudo, o “esqueleto” é comum, com excepção do

estudo de percolação no modelo 2D. Como tal são apresentadas seguidamente as linhas gerais que

definem o comando dos cálculos realizados.

4.3.1 Fase inicial

O cálculo inicia-se com o comando DEBUT(). De seguida, definem-se todas as variáveis que vão ser

usadas no ciclo “for()”, de simulação da construção da barragem. Como tal, atribuem-se os nomes das

variáveis e a sua dimensão. Na Figura 40, está representado o início do cálculo, a definição de 3

variáveis, correspondentes a campos de deslocamentos, de tensões e de variáveis internas, e o

comando que lê a malha.

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DEBUT();

DEP=range(12)

SIG=range(12)

VARI=range(12)

MA=LIRE_MAILLAGE(FORMAT='MED',);

Figura 40: Início do comando, definição de variáveis e leitura da malha

Depois de introduzida a malha é criado um grupo de elementos que será actualizado a cada novo ciclo,

ou seja, serão incluídas, neste grupo, as camadas novas à medida que são construídas. Na fase inicial

este grupo (ELEM) é constituído somente pela fundação, como mostra a Figura 41. O nome dos grupos

de malha foi atribuído de forma incremental, isto é, E1 corresponde à fundação, E2 à primeira camada

e assim sucessivamente. Desta forma é possível simular a construção em camadas através de um

ciclo. A manipulação dos campos de resultados pode também ser automatizada. É também necessário

definir os materiais associados à malha. Para se obter um modelo devidamente parametrizado optou-

se por definir previamente os parâmetros dos materiais e chamá-los no comando de definição dos

materiais. A Figura 41 mostra também o comando de definição do material da fundação com base em

parâmetros previamente introduzidos pelo utilizador.

MA=DEFI_GROUP(reuse =MA,

MAILLAGE=MA,

CREA_GROUP_MA=_F(NOM='camadas',

GROUP_MA='E1',),);

#---------------Introduzir parâmetros da fundação

E_FUND=25E09;

NU_FUND=0.2;

RHO_FUND=2600;

#---------------

pedra= DEFI_MATERIAU(ELAS=_F(E=E_FUND,

NU=NU_FUND,

RHO=RHO_FUND,),);

Figura 41: Definição do grupo ELEM a usar no ciclo e definição de um dos materiais

Concluída a fase de caracterização dos materiais, definiu-se o tipo de modelação: deformação plana

para o cálculo 2D e 3D para o modelo a três dimensões. Este processo foi realizado através do

comando AFFE_MODELE. Definido o modelo, atribuíram-se aos grupos de malha os respectivos

materiais, recorrendo ao comando AFFE_MATERIAU. Posto isto, foi necessário definir as condições

de fronteira e as solicitações. Através do comando AFFE_CHAR_MECA, foi então atribuído ao modelo

a única solicitação a que é sujeito, o peso próprio, e impostas as condições de fronteira, deslocamentos

horizontais impedidos na base e nos lados da fundação e deslocamentos verticais impedidos na base.

As definições acima referidas, foram também realizadas de forma incremental para a fundação -

MOD[0], MAT[0] e CHA[0], crescentes com o número de camadas.

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50

#------------------------------------------------------------

Modelo, Material e Condições de Fronteira da fase 0 (fundação)

MOD[0]=AFFE_MODELE(MAILLAGE=MA,

AFFE=_F(GROUP_MA='ELEM',

PHENOMENE='MECANIQUE',

MODELISATION='D_PLAN',),);

MAT[0]=AFFE_MATERIAU(MAILLAGE=MA,

MODELE=MOD[0],

AFFE=_F(GROUP_MA=('ELEM'),

MATER=pedra,),);

CHA[0]=AFFE_CHAR_MECA(MODELE=MOD[0],

PESANTEUR=_F(GROUP_MA='ELEM',

GRAVITE=9.8,

DIRECTION=(0,-1,0,),),

DDL_IMPO=(_F(GROUP_NO='apoio',

DX=0.0,

DY=0.0,),

_F(GROUP_MA=('fund1','fund2',),

DX=0.0,),),);

Figura 42: Definição do grupo ELEM a usar no ciclo e definição do modelo, condições de fronteira

e cargas aplicadas.

Caracterizados o modelo, os materiais e as condições de fronteira, procedeu-se ao cálculo

propriamente dito. O cálculo efectuado é estático não linear e os incrementos de carga são realizados

com base numa lista previamente definida. Concluída a fase de cálculo, extraíram-se os campos das

grandezas que vão servir de estado inicial na fase seguinte, neste caso, o campo de deslocamentos e

de tensões e as variáveis internas do modelo Drucker-Prager (V1 – deformação plástica volúmica; V2

– deformação plástica deviatórica; V3 – indicador de plasticidade). Para concluir a etapa inicial da

fundação, o campo de deslocamentos foi zerado, assim poderá ser utilizado como estado inicial da

construção da primeira camada de aterro. O conjunto de comandos que realiza as operações acima

descritas é representado em parte na Figura 43.

#-----------------------------------Lista a usar no calculo

lista=DEFI_LIST_REEL(DEBUT=0,

INTERVALLE=_F(JUSQU_A=5,

PAS=1,),);

#-----------------------------------Calculo da fundação

U[0]=STAT_NON_LINE(

MODELE=MOD[0],

CHAM_MATER=MAT[0],

EXCIT=_F(CHARGE=CHA[0]),

COMP_INCR=(_F(RELATION='ELAS',GROUP_MA=('E1',),),),

INCREMENT=_F(LIST_INST=lista,),);

#-----------------------------------Extrair campos de

deslocamentos, tensões e variáveis internas do cálculo anterior

DEP[0]=CREA_CHAMP (TYPE_CHAM='NOEU_DEPL_R',

OPERATION='EXTR',

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RESULTAT=U[0],

NOM_CHAM='DEPL',

INST=1);

#------------------------------------Zerar o campos de

deslocamentos da fundação

DEPC[0]=CREA_CHAMP (TYPE_CHAM='NOEU_DEPL_R',

OPERATION='ASSE',

MODELE=MOD[0],

OPTION='DEPL',

ASSE= (_F (GROUP_MA='ELEM',

CHAM_GD=DEP0[0],

CUMUL='OUI',

COEF_R=0.0),),);

Figura 43: Processo de cálculo, extracção e zeragem dos campos de deslocamentos

4.3.2 Simulação da Fase de Construção

De acordo com Goodman e Brown (1963), para se obter deslocamentos representativos da fase de

construção de barragens de aterro ter-se-á de utilizar uma técnica incremental de aplicação de cargas,

de modo a simular a sequência de construção da barragem.

A necessidade de implementar este procedimento no MEF foi demonstrada por Clough e Woodward

(1967) através da realização de dois cálculos de uma barragem homogénea com fundação rígida. No

primeiro cálculo as cargas foram aplicadas de uma só vez, tendo no segundo sido aplicadas por via de

uma análise incremental constituída por dez camadas. No cálculo incremental obtiveram-se os maiores

assentamentos sensivelmente a meia altura da barragem, sendo nulos no coroamento e na base. Esta

distribuição é bastante aproximada dos valores reais medidos em barragens de aterro. No entanto, no

cálculo realizado de uma só vez obtiveram-se os assentamentos máximos no coroamento da barragem

e nulos na base.

Deste modo, torna-se evidente a necessidade da realização de um cálculo incremental, capaz de

simular devidamente a construção da barragem. Contudo, coloca-se a questão do número de camadas

a usar na simulação. As barragens de enrocamento com cortina de betão são construídas em camadas

de 0,6 a 2 m de espessura. Em termos teóricos é conveniente que na simulação da construção da

barragem se utilize um número elevado de camadas. No entanto, esta hipótese é proibitiva, pelo

elevado tempo de cálculo que lhe estaria associado. Deste modo, vários investigadores procuraram

definir o número mínimo de camadas a usar na simulação da fase construtiva de barragens de aterro

de modo a obter resultados aproximados aos da solução real. Clough e Woodward (1967) verificaram

que, na análise da barragem homogénea, os valores de assentamentos eram muito aproximados

quando adoptaram sete ou catorze camadas, tendo por isso sugerido o uso de sete camadas. É

importante salientar que, em análises não lineares, o tempo de cálculo pode ser reduzido com o

aumento do número de camadas. Supondo que são definidos 50 incrementos, caso existam 5 camadas

de aterro, a cada uma delas devem estar associados 10 incrementos de carga. Contudo se o número

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de camadas for aumentado para 10, 5 incrementos de carga serão suficientes, e assim sucessivamente

(Naylor et al. 1981).

Para além do número de camadas, numa análise incremental, é importante definir a posição de

referência a partir da qual se irão processar os deslocamentos (King, 1965).Os deslocamentos

ocorridos na nova camada devem ser ignorados, ao passo que os deslocamentos sob a nova camada

devem ser considerados. Existem duas hipóteses para a consideração deste efeito. Na primeira, toda

a malha é considerada, contudo, é associada uma rigidez nula a todos os elementos acima da nova

camada, tornando-os elementos “fantasma”. Este método tem como vantagem a simplicidade, porém

exige um maior esforço de computação. Na segunda hipótese, os elementos de malha são adicionados

à medida que as camadas são colocadas. Este processo introduz uma maior complexidade, uma vez

que é necessário transportar os campos de tensão para a análise seguinte (Naylor et al. 1981).

A posição de referência dos deslocamentos foi definida considerando a segunda hipótese sugerida por

Naylor et al. (1981). Este processo foi executado através da anulação do campo de deslocamentos na

camada acabada de construir. Isto é, quando determinada camada é colocada, contribui com o seu

peso próprio, contudo, após o cálculo, o campo de deslocamentos é corrigido, multiplicando-o por zero

nos nós da camada em questão como mostra a Figura 44 (Marcelino, 1996). Este novo campo de

deslocamentos servirá de estado inicial para o cálculo da fase seguinte, como mostra a Tabela 3. Assim

sendo, os deslocamentos nos pontos nodais da nova camada são considerados nulos em conformidade

com o que é verificado na prática da construção de barragens. Repare-se que apenas o campo de

deslocamentos é anulado, mantendo-se inalterados os campos de tensão e as variáveis internas.

Figura 44: Cálculo de deslocamentos para construção de aterros, (Marcelino, 1996).

A construção do aterro de enrocamento em camadas foi definida através de um ciclo que automatiza,

em função de uma variável, todo o processo de criação dos grupos de malha, de definição dos modelos,

dos materiais e das condições de fronteira; de cálculo estático não linear; de extracção dos campos;

de manipulação dos campos; e de exportação dos resultados. A estrutura do ciclo foi definida de acordo

com o representado na Figura 45 e na Tabela 3

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Figura 45: Esquema de construção em camadas (Pellet, 2011)

Comandos Etapa 0 Etapa 1 Etapa 2

Malha LIRE_MAILLAGE

DEFI_GROUP E1 E1+E2 E1+E2+E3

Modelo AFFE_MODELE MOD[0] MOD[1] MOD[2]

Materiais AFFE_MATERIAU MAT[0] MAT[1] MAT[2]

Condições de fronteira/ cargas AFFE_CHAR_MECA CHA[0] CHA[1] CHA[2]

Estado inicial CREA_CHAMP/ASSE

DEPC[0]

SIGC[0]

VARIC[0]

DEPC[1]

SIGC[1]

VARIC[1]

Resultados STAT_NON_LINE U[0] U[1] U[2]

Extracção CREA_CHAMP/EXTR

DEP[0]

SIG[0]

VARI[0]

DEP[1]

SIG[1]

VARI[1]

DEP[2]

SIG[2]

VARI[2]

Correcção (deslocamentos nulos na

nova camada) CREA_CHAMP/ASSE

DEPC[0]

SIGC[0]

VARIC[0]

DEPC[1]

SIGC[1]

VARIC[1]

DEPC[2]

SIGC[2]

VARIC[2]

Tabela 3: Estrutura do ciclo de construção em camadas.

Uma vez que, no Code_Aster, uma entidade não pode ser criada duas vezes, a actualização do grupo

ELEM, implica a destruição do grupo anterior e, como tal, a transferência da informação para um novo

grupo de elementos. Na Figura 46 estão representadas: a criação do grupo de malha “antes”, igual ao

grupo ELEM da etapa de cálculo anterior; a destruição do grupo ELEM; a criação do novo grupo ELEM

com uma nova camada (E[I+1]). Encontra-se também, na Figura 46, a representação do inicio do ciclo

de construção com 10 camadas. Em linguagem python o comando “in range” define um intervalo aberto

do tipo [x,y[.

Após todo o processo descrito na Tabela 3, os resultados são obtidos a partir dos campos corrigidos e

exportados em ficheiros que permitem a sua visualização e pós-processamento.

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54

#------------------------------Inicio de ciclo de construção

for I in range(1,11):

#------------------------------Grupo antes[I]=grupo ELEM da fase

anterior

MA=DEFI_GROUP(reuse =MA,

MAILLAGE=MA,

CREA_GROUP_MA=_F(NOM='antes'+str(I),

GROUP_MA='ELEM',),);

#------------------------------Destrói grupo ELEM da fase anterior

MA=DEFI_GROUP(reuse =MA,

MAILLAGE=MA,

DETR_GROUP_MA=_F(NOM='ELEM',),);

#------------------------------Define grupo de cálculo (União) =

antes[I] + camada nova(E[I+1])

MA=DEFI_GROUP(reuse =MA,

MAILLAGE=MA,

CREA_GROUP_MA=_F(NOM='ELEM',

UNION=('antes'+str(I),'E'+str(I+1),),),);

Figura 46: Processo de cálculo, extracção e manipulação dos campos de deslocamentos

4.3.3 Simulação da fase de primeiro enchimento

Segundo Veiga Pinto (1983), uma das fases mais críticas das barragens de enrocamento é a situação

de primeiro enchimento, pois verifica-se um apreciável acréscimo de cargas num período relativamente

curto.

Veiga Pinto (1983), no trabalho desenvolvido no âmbito de barragens de terra-enrocamento, aponta

diversos factores que condicionam os efeitos do primeiro enchimento da albufeira da barragem. Dentro

desses agentes condicionantes, dois deles são também relevantes nas barragens de enrocamento com

cortina a montante. O assentamento junto à cortina de betão devido ao colapso do material de

enrocamento, provocado pela saturação desse material em caso de fissuras na cortina, pode ser um

factor condicionante do comportamento da barragem. Contudo, esse aspecto não vai ser tido em

consideração na modelação efectuada, uma vez que se assume que este efeito só é significativo para

barragens de grande dimensão. O efeito considerado no cálculo é o mais condicionante, ou seja, a

pressão hidrostática actuante na cortina de betão a montante que produz deformações significativas.

Uma vez que a fase de primeiro enchimento, vem no seguimento da fase de construção, o estado inicial

do cálculo do primeiro enchimento é obtido através dos campos corrigidos da última etapa de

construção.

A simulação do primeiro enchimento da barragem é feita através da aplicação de uma carga distribuída

triangular, nos elementos do paramento de montante, que é função do nível da água. Esta função foi

implementada como apresentado no Figura 47, e depende da cota da albufeira e do instante de cálculo.

Neste caso, optou-se por dividir a fase de enchimento em 6 incrementos.

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#---------------------------------------------------------

#Dados geométricos da barragem a fornecer pelo utilizador

BASE = 1188.0; #cota do fundo da albufeira

NPA = 1217.5;

#----------------------------------------------------------

def press(INST,Z):

NA=BASE+((NPA-BASE)/6)*(INST)

if Z<NA:

return (NA-Z)*1E4

else:

return 0.0

pre=FORMULE(VALE='press(INST,Z)',NOM_PARA=('INST','Z',),);

#-----------------------------------------------------------

Figura 47: Definição da função de enchimento no ficheiro de comando

4.3.4 Estudo de percolação

Durante o desenvolvimento desta tese, considerou-se relevante produzir um estudo de percolação em

barragens de enrocamento com cortina de betão a montante, quer pela fundação, quer pelo corpo da

barragem. Como referido anteriormente, foi feita uma adaptação da geometria e da malha utilizada no

cálculo tensão-deformação para ter em conta a variação das propriedades hidráulicas dos diferentes

materiais.

O objectivo deste estudo consiste na quantificação dos caudais percolados ao longo da fundação e do

corpo da barragem, na identificação das zonas de maior velocidade de percolação e na obtenção de

campos de cargas hidráulicas e de pressões intersticiais. Pretende-se também estudar a influência que

a ocorrência de fissuras na cortina ou defeitos nas juntas têm na percolação através da barragem.

Uma adequada caracterização da permeabilidade dos materiais é fundamental para o sucesso das

análises de escoamento. É importante salientar que a condutividade hidráulica dos materiais não é

constante, dependendo da saturação dos materiais. De forma geral, pode afirmar-se que a

condutividade hidráulica assume o seu valor máximo no estado saturado (sendo correntemente este o

valor que é determinado nos ensaios), decrescendo em condições não saturadas.

No ficheiro de comando, esta característica da condutividade hidráulica foi tida em conta, definindo-se

o coeficiente de condutividade hidráulica da seguinte forma:

𝑘=𝜌𝑤 × 𝑔

𝜇𝑐× 𝜅 [7]

em que:

𝜅 = 𝑘𝑠𝑎𝑡 × 𝑟: onde 𝑘𝑠𝑎𝑡 representa o coeficiente de permeabilidade no estado saturado e r representa

um factor de redução de permeabilidade devido à não saturação.

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56

c: coeficiente de viscosidade dinâmica do fluido (função da temperatura do fluído, tendo sido

considerado, de forma aproximada, o valor de 1,0x10-3 N.s/m2);

c: massa volúmica do fluido;

g : aceleração da gravidade.

Outra particularidade no escoamento em barragens de aterro que foi considerada no cálculo é a

anisotropia resultante da compactação dos materiais de enrocamento, ou seja, a permeabilidade

vertical do aterro é significativamente diferente da permeabilidade horizontal. Este aspecto foi

considerado, assumindo diferentes coeficientes de condutividade hidráulica para as direcções x e y.

Nos cálculos efectuados, foram ainda assumidas as seguintes simplificações:

Na análise 2D as características de escoamento foram admitidas constantes ao longo do eixo

da barragem;

O regime de percolação foi considerado permanente;

H=H(𝑥, 𝑦) [8]

Regime laminar de escoamento, pelo que é válida a Lei de Darcy;

Para estimar o efeito de fissuras na cortina ou defeitos nas juntas simularam-se defeitos na cortina de

montante. Estes defeitos são materializados através da atribuição de uma permeabilidade equivalente,

idêntica à do material enrocamento, a elementos da cortina com 1,5 m de comprimento na zona inferior

da barragem, onde é mais comum a ocorrência de fissuração. Segundo Cruz et al., (2009) uma

permeabilidade equivalente de 10-4 representa uma área de fendas generalizada ou fissuras de 0,5 a

5 mm espassadas de 0,5 a 1 m.

4.4 Modelos constitutivos

Este capítulo terá como propósito abordar as leis constitutivas associadas às barragens constituídas

por materiais de enrocamento. Procurar-se-á também justificar as leis constitutivas que foram

adoptadas nesta tese.

De modo a obter os factores que condicionam o comportamento fenomenológico dos materiais foram

realizados alguns ensaios triaxiais, a diferentes níveis de tensão. O objectivo é avaliar as características

de deformabilidade do material.

Serão apresentadas de seguida as teorias da elasticidade e da plasticidade e expostos os modelos

constitutivos utilizados neste trabalho, entre eles: (i) linear elásticos; (ii) elásticos não lineares; (iii)

elastoplásticos.

4.4.1 Relação tensão-deformação elástica

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57

Um material apresenta um comportamento elástico quando a tensão é dada, em cada ponto, pelo

gradiente da deformação no ponto, independentemente da história da deformação até ao instante

considerado. Para os materiais elásticos a equação constitutiva é dada na forma:

𝑇(𝑥, 𝑡) = �̂�(𝐹(𝑥, 𝑡)) [9]

onde F é o gradiente da deformação e x a posição do ponto considerado em relação a uma configuração

de referência. Desta forma pode caracterizar-se o tensor das tensões a partir do gradiente de

deformações no ponto e no instante t considerados.

Os modelos elásticos podem assumir diversas formas, dependendo se o material é considerado

isotrópico ou anisotrópico, e ainda, se apresenta comportamento linear ou não linear

4.4.1.1 Modelos lineares elásticos

Os modelos lineares elásticos estão amplamente divulgados e têm grande aplicação no cálculo

estrutural em geral. No modelo linear elástico a relação tensão-deformação é dada pela lei de Hooke

generalizada. Para o material linear elástico a equação constitutiva pode ser escrita, em notação

tensorial, segundo a equação [10]:

𝜎𝑖𝑗 = 𝐷𝑖𝑗𝑘𝑙 ∙ 휀𝑘𝑙 [10]

sendo s o tensor das tensões de Cauchy, D a matriz constitutiva do material, geralmente designada de

matriz de rigidez, e ε o tensor das deformações infinitesimais.

Caso o material seja isotrópico, a matriz constitutiva é simétrica, existindo apenas duas constantes

elásticas independentes, o módulo de Young (E) e o coeficiente de Poisson (ν). Por outro lado, se o

material apresentar anisotropia em todas as direcções, são necessários 36 parâmetros independentes

na determinação da matriz [D]

Entre as limitações destes modelos destacam-se: a não previsão do aumento de rigidez na descarga,

a não consideração da não linearidade da curva tensão-deformação e a não previsão de deformações

plásticas.

4.4.1.2 Modelos de elasticidade variável

Os modelos elásticos não lineares têm sido muito utilizados em barragens de enrocamento, porque são

capazes de reproduzir de forma satisfatória o comportamento de materiais granulares. Para além disso,

modelos deste tipo são significativamente mais simples de implementar e exigem menos tempo de

computação que os modelos elastoplásticos.

Nos materiais elásticos não lineares, a principal diferença em relação aos materiais elásticos lineares,

reside no facto de que os parâmetros elásticos passarem a depender do estado de tensão e/ou

deformação em que se encontram.

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58

Estes modelos estabelecem leis empíricas que devem simular a curva tensão-deformação dos

materiais, o mais aproximadamente possível. Os modelos de elasticidade variável são, por vezes,

complementados por módulos de descarga.

Dentro deste tipo de modelos destaca-se o modelo hiperbólico, o modelo EC-K0 e o modelo K-G

apresentado por Veiga Pinto (1983).

Tais modelos de elasticidade variável são diferenciais ou iterativos. Os diferenciais relacionam

incrementos de tensão com incrementos de deformação e, desse modo, consideram módulos

tangentes nos sucessivos incrementos. O método iterativo quantifica os módulos de elasticidade por

aproximações sucessivas (módulos secantes). Os dois métodos estão representados na Figura 48.

Das várias leis constitutivas que têm sido desenvolvidas usando o método incremental, a lei hiperbólica

é a mais aplicada em análises de barragens de enrocamento. Este modelo é atribuído a Kondner

(1963), o qual propôs uma aproximação hiperbólica da curva tensão-deformação como apresentado na

Figura 49.

Figura 48: Métodos de obtenção dos módulos de deformabilidade (Basso, 2007).

Figura 49: Curva Hiperbólica (Kondner, (1963)

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59

4.4.2 Elastoplasticidade

Uma das principais diferenças entre as respostas elástica e plástica é que, num fluxo plástico, as

deformações (plásticas) não são recuperáveis quando o estado de tensão regressa ao seu valor inicial

(apenas são recuperadas as deformações elásticas que tenham contribuído para levar o material à

cedência).

Por tal motivo, não é adequado formular uma equação constitutiva relacionando a deformação com o

estado corrente de tensão. Não há uma relação biunívoca entre a deformação e a tensão, já que pode

existir uma quantidade desconhecida de deformação plástica instalada no corpo no início da aplicação

de um carregamento. Assim, a relação mais apropriada é entre o incremento de tensão e o incremento

de deformação plástica.

A hipótese básica das equações constitutivas, aplicáveis a este tipo de materiais, é a de que o

incremento de deformação resultante de qualquer alteração na tensão pode ser dividido numa parte

elástica e noutra plástica (Maranha das Neves, 2007).

𝑑휀 = 𝑑휀𝑒 + 𝑑휀𝑝 [11]

O comportamento elastoplástico engloba, como representado na Figura 50, o comportamento elástico

perfeitamente plástico, o comportamento plástico com endurecimento e o comportamento plástico com

amolecimento.

Figura 50: (a) Material elástico perfeitamente plástico; (b) material elastoplástico com

endurecimento; (c) material elatoplástico com amolecimento (De Mendonça, 2005).

Segundo De Mendonça (2005), a formulação dos modelos constitutivos elastoplásticos, para o caso

geral, é dependente das seguintes definições:

Coincidência de eixos

Há coincidência entre as direcções das tensões principais (estado de tensão actual, resultante dos

incrementos de tensão) e as direcções das deformações incrementais. Assim é possível representar

as tensões principais e as deformações principais incrementais no mesmo sistema de eixos. Isto deve-

se ao facto de as direcções dos incrementos de deformação plástica não serem definidas pela

trajectória de tensões seguida até à superfície de plastificação, mas sim pela combinação das tensões

num dado ponto sobre esta superfície. Este comportamento diverge do comportamento elástico uma

vez que as deformações elásticas, incrementais ou não, dependem dos incrementos de tensão.

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60

Função de cedência

Em estudos unidimensionais é possível definir um valor 𝜎𝑦 para a tensão de cedência dos materiais.

Contudo, no estado multi-axial, a existência de diferentes componentes de tensão exige a definição de

uma superfície de cedência. Assim, define-se uma função de cedência 𝐹({𝜎}, {ℎ}), expressa em termos

de componentes de tensão e de parâmetros de endurecimento.

A função F representa a fronteira entre o comportamento elástico e o comportamento elastoplástico.

No espaço de tensões, F define um conjunto de superfícies, como, por exemplo, a apresentada,

esquematicamente, na Figura 51.

No interior da superfície de cedência o regime é elástico e a taxa de tensão é dada por:

�̇� = 𝑓𝑒(𝜎, 휀̇) [12]

onde, 𝑓𝑒(𝜎, 휀) representa a função elástica que relaciona o nível de tensão com o nível de deformação.

Se o regime for elastoplástico a variação da tensão passa a ser escrita na forma:

�̇� = 𝑓𝑝(𝜎, 휀̇) [13]

O incremento 𝑑휀𝑝 (Equação [11]) só ocorre quando o estado de tensão se situa e permanece na

superfície de cedência, de tal modo que

𝑑𝐹 = (

𝛿𝐹

𝛿𝜎)𝑇

𝑑𝜎 = 0 [14]

Esta relação é denominada condição de consistência (Maranha das Neves, 2007). Uma relação

equivalente pode ser definida com base nas equações [12] e [13], quando 𝐹({𝜎}, {ℎ}) = 0 e �̇� é

tangente à superfície de cedência.

𝑓𝑒(𝜎, 휀̇) = 𝑓𝑝(𝜎, 휀̇) [15]

Considerando-se uma variação no estado de tensões de um ponto segundo a trajectória de tensão 𝜎 =

𝜎(𝑡), através da função F, pode avaliar-se o regime de deformação de acordo com as seguintes

condições:

- Se 𝐹({𝜎}, {ℎ}) < 0, regime elástico, �̇� = 𝑓𝑒(𝜎, 휀̇);

- Se 𝐹({𝜎}, {ℎ}) = 0, são possíveis duas condições:

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61

-Para ∇𝐹: �̇� = 𝑓𝑒(𝜎, 휀̇) ≤ 0, regime elástico e �̇� = 𝑓𝑒(𝜎, 휀̇);

- Para ∇𝐹: �̇� = 𝑓𝑒(𝜎, 휀̇) > 0, regime elastoplástico e �̇� = 𝑓𝑝(𝜎, 휀̇) e assim:

∇𝐹: 𝜎 > 0, regime elastoplástico com endurecimento;

∇𝐹: 𝜎 < 0, regime elastoplástico com amolecimento;

- Se 𝐹({𝜎}, {ℎ}) > 0, situação impossível.

O tensor ∇𝐹 é o gradiente da função de cedência em 𝜎(𝑡) e �̇� representa o incremento de tensão (De

Mendonça, 2005).

Figura 51: Superfície de cedência (De Mendonça, 2005).

Função de potencial plástico

Enquanto, no caso unidimensional, a direcção das deformações plásticas incrementais é coincidente

com a direcção da tensão imposta, para os casos multi-axiais, a situação é, evidentemente, mais

complexa. Assim para definir a direcção das deformações plásticas incrementais recorre-se à lei de

fluxo, expressa na equação [16]:

∆휀𝑖

𝑝= 𝜆 ∙

𝛿𝐺({𝜎}, {Ψ})

𝛿𝜎𝑖 [16]

onde ∆휀𝑖𝑝 representa as seis componentes da deformação plástica incremental, (Maranha das Neves,

2007), 𝜆 é um escalar multiplicador, cuja magnitude é arbitrária uma vez que a equação [16] define

apenas o mecanismo de deformação plástica, isto é, a relação entre as várias componentes da

deformação plástica. G é a função potencial plástica, sendo escrita na forma:

𝐺({𝜎}, {Ψ}) = 0 [17]

sabendo que {Ψ} é um vector característico dos parâmetros de estado do material.

Ressalta-se que apenas as derivadas parciais de G em relação aos eixos coordenados (as

componentes de tensão) são necessárias para definir a lei de fluxo.

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62

A função de potencial plástico define uma superfície no espaço de tensões principais, como ilustrado

na Figura 52. Tendo em conta os vectores correspondentes às deformações plásticas incrementais no

espaço de tensões principais e recordando a hipótese de coincidência de eixos, discutida acima, tem-

se que estes vectores serão ortogonais à superfície de potencial plástico para cada estado de tensão

considerado.

Para alguns tipos de materiais, pode considerar-se que 𝐺({𝜎}, {Ψ}) = 𝐹({𝜎}, {ℎ}). Nestas condições, o

número de funções necessárias para descrever a resposta plástica do problema é reduzido para

metade. Isto implica um esforço computacional menor, permitindo uma solução mais rápida das

equações. Para esta condição, a lei de fluxo diz-se associada e como o vector das deformações

plásticas incrementais passa a ser normal à superfície de cedência diz-se que a condição de

normalidade é satisfeita.

Figura 52: Função potencial plástica (De Mendonça, 2005).

No entanto, para o caso de aplicações mais gerais as funções G e F são diferentes, a lei de fluxo é

não-associada e a normalidade não é satisfeita (De Mendonça, 2005).

Leis de endurecimento e amolecimento

A definição das leis de endurecimento e/ou amolecimento pode ser feita estabelecendo-se a variação

do parâmetro {h} com as deformações plásticas, ou ainda, com o trabalho plástico. Uma vez definidas,

estas leis permitem descrever as mudanças de posição e de tamanho da superfície de cedência em

relação às deformações plásticas ocorridas.

Existem basicamente duas formas de endurecimento: o isotrópico e o cinemático. No caso do isotrópico

apenas o tamanho da superfície de cedência é alterado, mantendo-se a sua forma e orientação. Já no

endurecimento cinemático, mantêm-se inalterados o tamanho, a forma e a orientação, mas a superfície

de cedência muda de posição no espaço de tensões. Estas duas modalidades de endurecimento são

apresentadas na Figura 53.

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63

Figura 53: a) Endurecimento isotrópico; b)endurecimento cinemático. (De Mendonça, 2005).

Quanto ao amolecimento, tem-se comportamento semelhante ao verificado para o endurecimento,

contudo o tamanho da superfície de cedência é reduzido com a deformação plástica.

Tensor constitutivo elasto-plástico

Tendo sido definidos os aspectos essenciais dos comportamentos elástico e plástico dos materiais,

definir-se-á a relação entre as tensões e as deformações incrementais, de acordo com o trabalho

desenvolvido no Imperial College (1997), citado em De Mendonça (2005) e no documento da disciplina

de Modelação Avançada em Geotecnia do Instituto Superior Técnico, (Maranha das Neves, 2007).

Definindo [Dep] como sendo o tensor constitutivo elastoplástico, em oposição ao tensor elástico [D], a

relação entre as tensões e as deformações incrementais para um material elastoplástico pode ser

escrita na forma:

𝑑𝜎 = [𝐷𝑒𝑝] ∙ 𝑑휀 [18]

O incremento de deformação 𝑑휀 é obtido através de da soma da parcela elástica com a parcela plástica.

{𝑑휀} = {𝑑휀𝑒} + {𝑑휀𝑝} [19]

Tendo em conta as definições de material elástico e a lei de fluxo para materiais plásticos, 𝑑휀𝑒 e 𝑑휀𝑝

são obtidos, respectivamente por:

{𝑑휀𝑒} = [𝐷]−1 ∙ 𝑑𝜎 [20]

𝑑휀𝑝 = 𝜆 ∙

𝛿𝐺({𝜎}, {Ψ})

𝛿𝜎 [21]

Combinando as equações [21] e [20] com a equação [19] pode escrever-se:

𝑑𝜎 = [𝐷] ∙ 𝑑휀 − 𝜆 ∙ [𝐷] ∙

𝛿𝐺({𝜎}, {Ψ})

𝛿𝜎 [22]

Expandindo a derivada de 𝐹({𝜎}, {ℎ}) de modo a poder abranger a alteração dos estados de tensão,

obtém-se a equação [23], denominada condição de consistência.

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𝑑𝐹 = {

𝛿𝐹

𝛿𝜎}𝑇

∙ {𝑑𝜎} + {𝛿𝐹

𝛿ℎ}𝑇

∙ {𝑑ℎ} = 0 [23]

Rescrevendo a equação [23] em função de 𝑑𝜎 e combinando a equação obtida com a equação [22],

tem-se:

𝜆 ={𝛿𝐹({𝜎}, {ℎ})

𝛿𝜎}𝑇

∙ [𝐷] ∙ {𝑑휀}

{𝛿𝐹({𝜎}, {ℎ})

𝛿𝜎}𝑇

∙ [𝐷] ∙𝛿𝐺({𝜎}, {Ψ})

𝛿𝜎+ 𝐻

[24]

onde

𝐻 = −

1

𝜆∙ {𝛿𝐹({𝜎}, {ℎ})

𝛿ℎ}

𝑇

∙ {𝑑ℎ} [25]

O parâmetro H definido na equação [25] depende do tipo de plasticidade do material: plasticidade

perfeita, plasticidade com endurecimento ou amolecimento. Para o caso de plasticidade perfeita o

vector {ℎ}é uma constante, o que implica que 𝐻 = 0. Por outro lado, no caso de endurecimento e/ou

amolecimento, como {ℎ} se relaciona com as deformações plásticas acumuladas 휀𝑝 , H pode ser

definido na forma:

𝐻 = −

1

𝜆∙ {𝛿𝐹({𝜎}, {ℎ})

𝛿ℎ}

𝑇

∙𝛿{ℎ}

𝛿{휀𝑝}∙ {𝑑휀𝑝} [26]

Observa-se que, existindo uma relação linear entre {ℎ} 𝑒 {휀𝑝} o quociente entre ambos é constante,

independentemente do valor de {휀𝑝}. Deste modo, substituindo a expressão [21], equação da lei de

fluxo, na equação [26] o parâmetro 𝜆 pode ser eliminado, e deste modo, H fica determinado. Caso a

relação seja não linear, esta simplificação não pode ser assumida e H fica indeterminado.

Substituindo a equação [24] na equação [22] pode exprimir-se a equação constitutiva que rege o

comportamento dos materiais elastoplásticos.

𝑑𝜎 =

(

[𝐷] − [𝐷] ∙ {

𝛿𝐺({𝜎}, {Ψ})𝛿𝜎

} ∙ {𝛿𝐹({𝜎}, {ℎ})

𝛿𝜎}𝑇

∙ [𝐷]

{𝛿𝐹({𝜎}, {ℎ})

𝛿𝜎}𝑇

∙ [𝐷] ∙ {𝛿𝐺({𝜎}, {Ψ})

𝛿𝜎} + 𝐻

)

𝑑휀 = [𝐷𝑒𝑝] ∙ 𝑑휀 [27]

4.4.3 Modelo elástico perfeitamente plástico de Drucker-Prager

Tendo em conta a dificuldade de implementação de novas leis constitutivas no Code_Aster, a escolha

do modelo constitutivo a usar nos cálculos numéricos, deste trabalho, foi à partida condicionada pelos

modelos disponíveis no software. Dentro das várias possibilidades, procurou-se usar um modelo

simples, de uso generalizado e com conhecimento prévio das suas limitações.

Deste modo, a critério de cedência utilizado na modelação dos materiais de enrocamento da Barragem

de Veiguinhas foi o de Drucker-Prager. Este modelo assume o comportamento linear na fase elástica.

No entanto, considerou-se que, para o baixo nível de tensões a que a Barragem de Veiguinhas irá estar

sujeita, os resultados obtidos com um módulo de elasticidade obtido a partir de ensaios triaxiais para

uma tensão de confinamento representativa são satisfatórios.

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O critério de Drucker-Prager utiliza na sua formulação os invariantes 𝐼1 e 𝐽2. Esta formulação sugerida

por Drucker e Prager é considerada uma aproximação do critério de Mohr-Coulomb e pode ser

expressa por:

𝑓 = √𝐽2 − 𝛼 ∙ 𝐼1 − 𝑘

onde 𝛼 e 𝑘 são parâmetros positivos do material, 𝐼1 é o primeiro invariante do tensor das tensões e 𝐽2

é o segundo invariante do tensor das tensões deviatórico.

𝐼1 = 𝜎𝑥 + 𝜎𝑦 + 𝜎𝑧

√𝐽2 =√12[(𝜎𝑥 − 𝜎𝑦)

2+ (𝜎𝑦 − 𝜎𝑧)

2+ (𝜎𝑥 − 𝜎𝑧)

2 + 6(𝜏𝑥𝑦2 + 𝜏𝑦𝑧

2 + 𝜏𝑥𝑧2 )]

√3

com:

𝛼 =2 ∙ sin𝜙

√3 ∙ (3 − sin𝜙)

𝑘 =6 ∙ 𝑐 ∙ cos𝜙

√3 ∙ (3 − sin𝜙)

No espaço de tensões principais (𝜎1, 𝜎2, 𝜎3) , este critério é representado por um cone de eixo

coincidente com o eixo isotrópico, tal como mostra a Figura 54

Figura 54: Critério de cedência de Drucker-Prager. (Frutuoso da Silva, 2007)

Este critério sobrestima a ruptura em relação ao critério de Mohr-Coulomb, excepto em compressão

triaxial. Porém o critério de Drucker-Prager não apresenta problemas de singularidade, como o critério

de Mohr-Coulomb apresenta nos vértices do prisma hexagonal.

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Figura 55: Superfícies de cedência de Mohr-Coulomb e de Drucker-Prager. (Frutuoso da Silva,

2007)

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67

5 Barragem de Veiguinhas – Caso de Estudo

5.1 Descrição geral da barragem

A reserva de água de Montesinho situa-se a cerca de 7 km a norte da povoação de Soutelo, no distrito

de Bragança. A barragem tem 36,5 m de altura máxima e cerca de 310 m de desenvolvimento. A

construção da reserva de água de Montesinho destina-se ao reforço do abastecimento urbano de água

ao concelho de Bragança. O volume da albufeira é de cerca de 3,698 hm³, para o nível de pleno

armazenamento (NPA) à cota 1217,50 m. O nível de máxima cheia (NMC), situa-se à cota 1219,73 m,

e o nível mínimo de exploração (NmE), à cota 1197,00 m. A solução estrutural da reserva de água de

Montesinho é uma barragem de enrocamento com cortina a montante, constituída por uma laje de

betão armado. O aterro é constituído por enrocamentos graníticos, explorados em zonas no interior da

albufeira. As características mais relevantes da obra são as seguintes:

cota do coroamento : 1221,10 m

largura do coroamento: 7,00 m

comprimento do coroamento: 311,00 m

folga em relação ao NMC: 1,37 m

inclinação do taludes de montante e de jusante até à banqueta: 1V/1,5H

inclinação do talude de jusante da banqueta até ao coroamento: 1V/2H

O volume total de aterros é cerca de 174 000 m³. A Figura 56 refere-se à planta da barragem.O vale

onde se situa a barragem é assimétrico, embora junto ao talvegue as inclinações do maciço após o

saneamento, sejam similares. Assim, na margem esquerda, sensivelmente acima da cota 1200 m, o

encontro exibe uma inclinação de aproximadamente 1:6,5 (V:H). A cotas inferiores e em toda a margem

direita a inclinação é superior, sendo aproximadamente de 1:2,6 (V:H). O perfil transversal de maior

altura da barragem é apresentado na Figura 57.

Figura 56: Planta da barragem do reservatório de água do Montesinho , (Cenor, 2002 b)

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No que respeita à natureza da fundação, na zona da barragem e da albufeira ocorre um maciço

granítico. O granito é no local da barragem geralmente medianamente alterado (W3), em afloramentos

que constituem superfícies muito irregulares, ou muito alterado (W4), constituindo superfícies mais

regulares. Em profundidade, o granito apresenta-se pouco alterado a medianamente alterado (W2 a

W3). O granito decomposto (W5) aparece apenas ao longo de alguns alinhamentos de fraqueza do

maciço.

Figura 57: Perfil transversal de maior altura da barragem.

De acordo com a memória descritiva do projecto (Cenor, 2002 a), nos estudos geológico geotécnicos

“Os granitos de Montesinho apresentam uma alteração generalizada de origem hidrotermal, que se

revela por uma caulinização dos feldspatos e alteração das biotites, o que faz com que a rocha tenha

tonalidades esbranquiçadas e, por vezes, castanhas alaranjadas onde a biotite se encontra mais

alterada. Até às profundidades atingidas pelas sondagens o granito de Montesinho apresenta um grau

de meteorização mais ou menos pronunciado. O grau de caulinização dos feldspatos é variável e a

alteração das biotites é por vezes relevante. Esta meteorização é responsável pela redução muito

sensível da resistência mecânica da rocha.”

Os trabalhos de prospecção geológica efectuados visaram o reconhecimento das condições de

fundação da barragem e o estudo de locais para extracção de materiais de enrocamentos a utilizar nos

aterros. Foram realizadas diversas sondagens à rotação, colheita de amostras de fragmentos rochosos

e ensaios laboratoriais de caracterização física e mecânica sobre amostras seleccionadas em cada

uma das sondagens e sobre a amostra obtida por fragmentação de um bloco.

Em resultado dos trabalhos de prospecção e dos ensaios de laboratório foi decidido que os

enrocamentos seriam extraídos de uma zona com cerca de 1,5 ha, localizada a montante da barragem,

na vertente esquerda.

Foram ainda efectuados ensaios laboratoriais de caracterização física, no decorrer da obra, sobre os

materiais extraídos. Estes ensaios revelaram que a qualidade do granito de Montesinho é superior à

que tinha sido apontada, na fase de projecto

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69

5.2 Caracterização mecânica dos materiais da Barragem de Veiguinhas

A barragem de Veiguinhas apresenta um maciço de enrocamento zonado em linha com as indicações

de Cooke e Sherard, (1987). As prescrições de projecto (Cenor, 2002 b), definem as características

granulométricas dos materiais que constituem as diferentes zonas do maciço de enrocamento, tal como

mostra a Figura 58.

A zona A é constituída por um enrocamento de granulometria extensa com 40 ≤ 𝐷100 ≤ 60 𝑚𝑚,

3,2 ≤ 𝐷50 ≤ 12 𝑚𝑚 e 0%≤ % 𝑑𝑒 𝑓𝑖𝑛𝑜𝑠 ≤ 5%. O coeficiente de uniformidade 𝐶𝑢 é igual a 50. As

camadas são compactadas com espessura máxima de 0.40 m.

A zona B é constituída por um enrocamento com 150 ≤ 𝐷100 ≤ 300 𝑚𝑚, 20 ≤ 𝐷50 ≤ 60 𝑚𝑚 e

0%≤ % 𝑑𝑒 𝑓𝑖𝑛𝑜𝑠 ≤ 5% . O coeficiente de uniformidade 𝐶𝑢 é igual a 50. As camadas são

compactadas em cordão, com espessura máxima de 0.40 m.

A zona C é constituída por um enrocamento com 300 ≤ 𝐷100 ≤ 600 𝑚𝑚, 60 ≤ 𝐷50 ≤ 150 𝑚𝑚 e

0%≤ % 𝑑𝑒 𝑓𝑖𝑛𝑜𝑠 ≤ 5% . O coeficiente de uniformidade 𝐶𝑢 é igual a 50. As camadas são

compactadas em cordão, com espessura máxima de 0,80 m.

A zona D é constituída por um enrocamento com 500 ≤ 𝐷100 ≤ 800 𝑚𝑚, 100 ≤ 𝐷50 ≤ 250 𝑚𝑚

e 0%≤ % 𝑑𝑒 𝑓𝑖𝑛𝑜𝑠 ≤ 5%. O coeficiente de uniformidade 𝐶𝑢 é igual a 40. As camadas são

compactadas em cordão, com espessura máxima de 1,00 m.

A zona E, uma faixa estreita que constitui o paramento de jusante, é constituída por blocos de

enrocamento com dimensões compreendidas entre 50 e 800 mm a retirar em parte do

enrocamento tipo D durante o espalhamento.

Figura 58: Fusos granulométricos das diferentes zonas do maciço da Barragem de Veiguinhas,

(Cenor, 2002 b).

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70

A caracterização dos materiais da barragem teve por base os ensaios de compressão triaxial, os

ensaios de permeabilidade em câmara triaxial e análises granulométricas realizados no LNEC sobre

amostras de material com granulometria tipo C.

Os ensaios de laboratório realizados no LNEC, foram realizados em três fases distintas. Os primeiros

ensaios, para projecto, foram executados em amostras obtidas nos ensaios de campo e também em

amostras obtidas através da fracturação de um bloco rochoso superficial. Já durante, a fase de

construção da barragem foram realizadas mais duas fases de ensaios laboratoriais, em amostras

obtidas na pedreira de obra.

Uma vez que a primeira amostra foi obtida da fracturação de um bloco superficial, este material

apresentou, nos ensaios de caracterização física, valores de resistência inferiores aos verificados nos

ensaios posteriores. Contudo os resultados obtidos nos ensaios triaxiais são consonantes. Por

simplificação, designar-se-á o material dos ensaios de projecto por enrocamento de projecto (EP) e por

enrocamento 1 (E1) e enrocamento 2 (E2) correspondentes, respectivamente, à primeira e à segunda

fases de ensaios com o material da pedreira de obra.

5.2.1 Pesos Volúmicos

Amostra s’3

ϒd (kN/m3)

Início do ensaio

ϒd (kN/m3)

Final da consolidação

ϒd (kN/m3)

Final do ensaio

EP

100 19,63 19,96 19,24

200 19,76 20,14 19,73

400 19,29 19,97 20,04

E1

150 19,36 19,94 19,52

350 19,34 20,09 21,14

550 18,78 19,63 19,97

E2

170 19,55 19,89 20,55

370 20,27 20,66 20,57

570 20,10 20,59 20,69

Tabela 4: Variação do peso volúmico seco (ϒd) nas diversas fases de ensaios triaxiais.

Verifica-se que a variabilidade dos resultados obtidos, nas diferentes fases de ensaio, é pouco

significativa. Como seria de esperar, há uma tendência de aumento do peso volúmico com a tensão de

confinamento, apesar de logicamente existirem valores iniciais diferentes. Com base nestes resultados

e nos valores de tensão de confinamento característicos do corpo da barragem assumiu-se um valor

de peso volúmico para o material enrocamento do modelo de 20,5 kN/m3. O valor adoptado é mais

próximo dos resultados obtidos na última fase de ensaios, uma vez que, pelo observado em obra, a

amostra E2 é a que apresenta maior semelhança com o material usado em grande parte do aterro.

5.2.2 Ensaio de Compressão Triaxial

Os ensaios triaxiais, do tipo consolidado-drenado, foram realizados na câmara de 300 mm de diâmetro

(T30). No âmbito da construção da Barragem das Veiguinhas foram realizadas três fases de ensaios

triaxiais, das quais se apresentaram, por simplificação, os resultados mais representativos.

5.2.2.1 Módulo de Elasticidade

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71

A Figura 59 diz respeito às curvas tensão deformação do material E2, para tensões de confinamento

de 170, 370 e 570 kPa.

(a)

(b)

Figura 59: (a) Variação da tensão deviatórica em função da extensão axial. (b) Variação da

extensão volumétrica com a extensão axial.

O andamento das curvas indica nitidamente um aumento do módulo de deformabilidade inicial com o

aumento da tensão de confinamento. Este mesmo comportamento foi revelado nas restantes fases de

ensaios. A variação da extensão volumétrica com a extensão axial segue o andamento esperado,

excepto no provete para tensão de confinamento de 170 kPa, em que o curso é alterado a partir de

extensões axiais de 5%. Este facto está relacionado com a rotura da camisa de borracha que envolve

o provete, fenómeno que é frequente neste tipo de ensaios devido à angulosidade das partículas.

Com base nos nas curvas tensão deviatórica em função da extensão axial, para as diferentes tensões

de confinamento e para as diferentes fases de ensaio, foi obtido o valor do módulo de Young para o

valor de extensão axial de 0,2%.

0

400

800

1200

1600

2000

2400

0,0 1,0 2,0 3,0 4,0 5,0 6,0 7,0 8,0 9,0 10,0 11,0

s1-s

3 (

kP

a)

e1 (%)E2-170 E2-370

-3,5

-3,0

-2,5

-2,0

-1,5

-1,0

-0,5

0,0

0,5

1,0

0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11

Exte

nsão

vo

lum

étr

ica (

%)

e1 (%)E2-170 E2-370

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72

s3 E0.2% (MPa)

EP

100 103

200 145

400 34

E1

150 47

350 200

550 336

E2

170 126

370 132

570 241

Tabela 5: Resultados da fase de corte: variação do módulo de Young.

Nos materiais granulares, o valor do módulo de Young aumenta com a tensão de confinamento. Janbu

(1963) sugeriu a seguinte equação:

𝐸0.2% = 𝐾𝑝𝑎 (

𝜎3𝑝𝑎)𝑛

[28]

Figura 60: Regressão linear para obtenção da curva de variação do módulo de elasticidade inicial

com a tensão de confinamento.

Devido à impossibilidade de implementação de um modelo de elasticidade variável, foi necessário

definir um módulo de elasticidade inicial coerente com o estado de tensão a que a barragem está

sujeita. Deste modo, ajustou-se a transformada da equação de Jambu aos resultados obtidos dos

ensaios triaxiais, excluindo valores dispersos, como mostra a Figura 60.

Obtidos os parâmetros K e n, traçou-se a curva de variação do módulo de elasticidade inicial (Ei) com

a tensão de confinamento (s3), como ilustrado na Figura 61.

Sabendo que a zona central da barragem, onde ocorrem os maiores deslocamentos durante a fase

construtiva, apresenta valores de tensões de confinamento pouco superiores a de 200 kPa, assumiu-

se que o valor do módulo de elasticidade a adoptar nos cálculos seria de 160 MPa.

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73

Figura 61: Variação do módulo de elasticidade inicial com a tensão de confinamento, equação de

Janbu.

5.2.2.2 Resistência ao corte

A resistência ao corte dos materiais que constituem a Barragem de Veiguinhas foi também avaliada

através dos ensaios de compressão triaxial realizados no LNEC.

Todos os resultados obtidos demonstram que os estados de tensão, a que os materiais de enrocamento

estão sujeitos, são extremamente importantes na análise das características mecânicas dos mesmos,

tal como já foi referido por diversas vezes neste trabalho.

Refere-se a acentuada curvatura da envolvente dos estados de tensão de rotura dos materiais de

enrocamento. Em termos práticos, esta curvatura da envolvente dos estados de tensão de rotura

implica uma redução bastante significativa dos valores de ângulo de atrito do material enrocamento

com o aumento da tensão de confinamento.

Na Tabela 6 são apresentados os valores de ângulo de atrito para as diferentes tensões de confinamento

das três fases de ensaios. Com aumentos da tensão de confinamento na ordem dos 200 a 300 kPa

estão associadas variações no ângulo de atrito de 11,6 a 25,3º. Esta variação do ângulo de atrito é

apresentada em função do logaritmo da tensão de confinamento na Figura 62.

Salienta-se que o material E2 apresenta uma variabilidade significativamente menor, quando

comparado com os outros dois materiais ensaiados. Este facto poderá estar relacionado com as

melhores caracteristicas da amostra, uma vez que esta foi obtida numa fase em que a pedreira já se

encontrava a uma profundidade considerável.

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74

Amostra Valores de pico Log

(s'3)/Pa (º) (º)

s3' (kPa) s' (kPa) t (kPa)

EA-100 100,0 553 451 -0,01 54,7

54.4 19.8 EA-200 200,0 798 595 0,30 48,2

EA-400 400,0 1248 847 0,60 42,8

E1-150 150 750 601 0,87 53,2

57,2 25,3 E1-350 350 1095 745 1,03 42,9

E1-550 550 14 8 939 1,17 39,1

E2-170 170 654 481 0,22 47,4

50,0 11,6 E2-370 370 1174 802 0,56 43,1

E2-570 570 1678 1108 0,75 41,3

Tabela 6: Resultados da fase de corte: variação do ângulo de atrito.

Atendendo aos resultados obtidos nos ensaios considerou-se um valor de ângulo de atrito de 43,8º

correspondente a um parâmetro α do modelo Drucker Prager igual a 0,6.

Figura 62: Redução do ângulo de atrito com a tensão de confinamento: materiais EP e E2

Assumiu-se também que os materiais constituintes da barragem não apresentam coesão, assim sendo,

admitiu-se um valor de 0,1 para o parâmetro k, que depende do valor da coesão. Uma vez que para

k=0 o modelo apresentava problemas de convergência, optou-se por definir um valor de coesão muito

baixo, que não pusesse em causa a validade dos resultados, permitindo no entanto resolver os

problemas de cálculo numérico.

5.3 Caracterização hidráulica dos materiais da Barragem de Veiguinhas

5.3.1 Considerações prévias

Tal como referido em 4.3.4, o sucesso das análises de escoamentos em meios porosos depende em

grande medida da adequada caracterização da permeabilidade dos materiais, uma vez que as

equações que caracterizam o escoamento em meios porosos são função da condutividade hidráulica.

y = -19,844x + 54,44R² = 0,998

y = -11,698x + 49,914R² = 0,9953

35

40

45

50

55

60

-0,05 0,15 0,35 0,55 0,75 0,95

Ân

gulo

de

atr

ito

°

Log (s'3)/Pa

EP E2 Linear (EP) Linear (E2)

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75

Em 4.3.4, refere-se, ainda, que a condutividade hidráulica dos materiais porosos não é constante e

depende do grau de saturação. Esta característica foi tida em conta através da definição do coeficiente

de condutividade hidráulica a partir da equação [29]:

k =κ

𝜇𝑐× 𝜌𝑐 × 𝑔 [29]

em que κ é o resultado do produto entre o coeficiente de permeabilidade no estado saturado por um

factor que tem em conta o grau de saturação, a que se chamou factor de redução da permeabilidade

devido â não saturação (r).

5.3.2 Permeabilidade no estado saturado

Adoptaram-se para os coeficientes de permeabilidade no estado saturado dos materiais os valores

obtidos dos ensaios de permeabilidade, realizados em laboratório ou “in situ”, e valores estimados

através da fórmula de Kozeny, que tem em conta a granulometria dos materiais.

Para os materiais do aterro (C e D), o coeficiente de permeabilidade no estado saturado foi determinado

com base em ensaios de permeabilidade realizados em câmara triaxial. Uma vez que as amostras

foram sujeitas a compactação e, posteriormente, foram realizados ensaios de permeabilidade na

direcção perpendicular à direcção da compactação, o valor do coeficiente de permeabilidade obtido

corresponde à direcção vertical (kv). Para obter os coeficientes de permeabilidade horizontal (kh),

considerou-se, pelas razões expostas anteriormente, que são 10 vezes superior aos coeficientes de

permeabilidade vertical. Ressalva-se que, a avaliação destes resultados, tendo em conta as

características do material e a metodologia de ensaio, deve ser bastante cuidadosa.

Os materiais de fundação da barragem de Veiguinhas são constituídos por formações graníticas,

conhecidas por “Granitos de Montesinho” e designados na Carta Geológica de Portugal na escala 1:50

000 por 𝛾𝑚𝑔𝐼𝐼 . De acordo com os Estudos Geológico-Geotécnicos, os Granitos de Montesinho ocorrem

no local da barragem geralmente medianamente alterados (W3), em afloramentos que constituem

superfícies muito irregulares, ou muito alterado (W4) constituindo superfícies mais regulares. Em

profundidade, o granito apresenta-se pouco alterado a medianamente alterado (W2 a W3). O granito

decomposto (W5) aparece raramente, apenas ao longo de alguns alinhamentos de fraqueza do maciço.

A permeabilidade destes materiais foi determinada através de ensaios de absorção de água do tipo

Lugeon, realizados “in situ”.

Em relação aos materiais que constituem os materiais A e B, de suporte da cortina os valores dos

coeficientes de permeabilidade no estado saturado foram estimados pela fórmula de Kozeny [30]:

𝑘 = 𝐶𝑠 ∙1

𝜂 ∙ 𝑆02 ∙

𝑒3

(1 + 𝑒) [30]

onde o coeficiente de permeabilidade (em m/s), a superfície específica (em m2/m3), o factor de forma e

o índice de vazios são representados, respectivamente, por 𝑘, 𝑆0, 𝐶𝑠 e 𝑒.

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76

Na Tabela 7 indicam-se os valores dos coeficientes de permeabilidade no estado saturado adoptados

para os materiais da barragem em estudo e os métodos ou ensaios utilizados para a sua obtenção.

Material kh (m/s) kv (m/s) Ensaio / Método de cálculo

Fundação 5 x 10-8 5 x 10-8 Ensaio Lugeon

Fundação: solos residuais 2 x 10-6 2 x 10-6 Ensaio Lugeon

Maciço de enrocamento, zonas C e D 1 x 10-4 2 x 10-5 Ensaio de permeabilidade em câmara

triaxial

Maciço de enrocamento, zonas A e B 4 x 10-7 8 x 10-8 Formula de Kozeny

Cortina de injecções 1 x 10-7 1 x 10-7 Ensaio Lugeon (após injecções)

Cortina de betão armado 1 x 10-11 1 x 10-11 -

Tabela 7: Valor e método de obtenção dos parâmetros de permeabilidade dos materiais da

barragem

5.3.3 Grau de Saturação

A permeabilidade dos materiais depende da saturação, que por sua vez depende da pressão capilar

que no caso de materiais grosseiros é composta somente pela sucção total, sem a componente

osmótica característica das argilas. De uma forma geral, pode afirmar-se que a permeabilidade é maior

quando maior for o grau de saturação dos materiais, diminuindo rapidamente quando a saturação

destes diminui. Este decréscimo é mais acentuado para os materiais grosseiros e mais suave para os

materiais mais finos. Por sua vez, a saturação depende da sucção. Para ter em conta estes aspectos

do comportamento dos solos, admitiram-se as seguintes hipóteses:

- a variação do grau de saturação com a pressão capilar, 𝑝𝑐, pode ser aproximada por uma função

sigmóide: 𝑠we(𝑝𝑐; μ, 𝜑) =1

1+e

−(𝑝𝑐−𝜇)

𝜑

, em que e 𝜑 são parâmetros do modelo foram atribuídos

empiricamente de modo a que saturação máxima e mínima dos materiais ocorra para determinados

valores de sucção. Os valores da pressão capilar máxima e mínima foram definidos de acordo com as

características da barragem e com o nível de pressão a que o aterro pode ser sujeito no decurso do

enchiment (Tabela 8).

- a saturação apresenta um valor mínimo (sres) e máximo (smax), dependentes da granulometria dos

materiais (Tabela 8 e Figura 63), de acordo com a seguinte expressão: S = swe × (𝑠max−sres)+sres;

Material ID

Materiais da barragem

Pressão capilar para que ocorra a saturação

máxima (Pa)

Pressão capilar para que ocorra a saturação

mínima (Pa)

Parâmetros da função de saturação

(Pa)

𝝋 (Pa) sres smax

1 Zonas A e B -600000 600000 50 -100000 0,2 1,0

2 Zonas C e D -600000 600000 50 -50000 0,05 1,0

Tabela 8: Parâmetros da função de saturação

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77

Figura 63: Variação do grau de saturação (S) com a pressão capilar

- a variação do factor de redução de permeabilidade (r) dos materiais com o grau de saturação é dada

por uma função potência, com expoente ao cubo (r = s3) ou à sétima (r = s7), consoante se tratem de

materiais mais finos ou mais grosseiros, como se apresenta na Figura 64

Figura 64: Variação do factor de redução de permeabilidade (r) com o grau de saturação.

-8E+05 -6E+05 -4E+05 -2E+05 0E+00 2E+05 4E+05 6E+05 8E+05

0

0,2

0,4

0,6

0,8

1

1,2

Pressão Capilar (Pa)

Gra

u d

e S

atu

raçã

oZonas A e B

Zonas C e D

0 0,2 0,4 0,6 0,8 1 1,2

-0,2

0

0,2

0,4

0,6

0,8

1

1,2

Grau de Saturação

r

Zonas A e B

Zonas C e D

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79

6 Apresentação e análise dos resultados

No presente capítulo são apresentados e analisados os resultados das análises numéricas realizadas

para a Barragem de Veiguinhas do reservatório de água de Montesinho. Nestas análises, o

enrocamento foi modelado com o modelo elástico perfeitamente plástico de Drucker-Prager e a

fundação com o modelo linear elástico. Serão apresentados, inicialmente, os valores obtidos para as

análises tensão-deformação, seguidamente apresentar-se-ão os resultados do estudo de percolação.

Os resultados das análises tensão-deformação serão apresentados separadamente. Em primeiro lugar

serão apresentados os resultados obtidos para a fase de construção discriminadamente para os

modelos 2D e 3D. Seguidamente, serão apresentados os resultados da fase de primeiro enchimento

também para os dois tipos de modelação.

6.1 Fase de final de construção

A análise dos resultados correspondentes à fase de construção da Barragem de Veiguinhas tem os

seguintes objectivos:

apresentar os efeitos do processo construtivo nos deslocamentos do maciço de enrocamento;

Comparar os resultados das simulações tridimensionais e bidimensionais entre si e com os

valores obtidos em obra, até à data, através do sistema de observação;

Prever os deslocamentos e estado de tensão na fase de final de construção.

Perceber o efeito da geometria da fundação na deformabilidade do maciço de enrocamento;

Determinar o estado de tensão para a fase de primeiro enchimento

6.1.1 Estado de Tensão

As distribuições de tensões (𝜎𝑥𝑥, 𝜎𝑦𝑦, 𝜎𝑧𝑧), para a secção 0+256 m, são apresentadas na Figura 65, na

Figura 66 e Figura 67, respectivamente.

Figura 65: Estado de tensão na direcção longitudinal (𝜎𝑥𝑥), modelo 3D

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80

A secção é transversal ao alinhamento do coroamento da barragem e considera-se zero o encontro da

margem esquerda.

As representações indicadas mostram que os valores máximos de tensão ocorrem na zona central da

base da barragem, como seria de esperar, visto que a única solicitação actuante é o peso próprio.

Figura 66: Estado de tensão na direcção longitudinal (𝜎𝑥𝑥), modelo 3D

O cálculo tridimensional revela que os valores das tensões na barragem são, em geral, simétricos em

relação ao eixo longitudinal. Contudo nota-se um aumento nas tensões a jusante. Este facto pode ser

explicado pela geometria da fundação, mais profunda na zona de jusante, o que implica maior volume

de aterro.

Figura 67: Estado de tensão na direcção vertical (𝜎𝑧𝑧), modelo 3D

Como termo de comparação apresentam-se as distribuições de tensões da modelação bidimensional.

Ressalva-se desde já que, como referido anteriormente, a geometria da fundação neste modelo foi

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81

simplificada, assumindo-se uma cota constante. Tendo presente essa condicionante, são apresentadas

nas Figura 68 e Figura 69, respectivamente, as distribuições de tensões (𝜎𝑥𝑥, 𝜎𝑦𝑦).

Figura 68: Estado de tensão na direcção horizontal (𝜎𝑥𝑥), modelo 2D

A análise dos resultados obtidos nas duas modelações permite concluir que os valores de tensão no

modelo 2D são superiores aos da modelação 3D, mesmo na zona a jusante da barragem, onde existe

um aprofundamento da fundação, apenas considerado no modelo tridimensional. Esta diferença revela

a influência da geometria da fundação no estado de tensão da barragem e mostra que o tipo de

modelação tem influência na previsão do comportamento da barragem, devendo ser obtida por meio

de um modelo 3D de modo a alcançar maior segurança e economia nos projectos deste tipo de

barragem.

Figura 69: Estado de tensão na direcção vertical (𝜎𝑦𝑦), modelo 2D

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82

6.1.2 Deslocamentos na fase de construção

A deformabilidade do maciço de enrocamento representa, em geral, a maior condicionante do

desempenho das BECB. Desse modo, a avaliação dos deslocamentos ocorridos durante a fase

construtiva é extremamente importante para a concepção e adaptação dos projectos deste tipo de

barragens. Os deslocamentos obtidos para a Barragem de Veiguinhas através da modelação

tridimensional, realizada neste trabalho, são apresentados na Figura 70, na Figura 71 e na Figura 72.

Figura 70: Deslocamentos na direcção longitudinal, modelo 3D

A análise dos resultados obtidos permite concluir que os deslocamentos na direcção longitudinal da

barragem (DX), ocorridos na fase de construção, são maioritariamente direccionados para a zona

central da barragem. No entanto, na zona abaixo da banqueta são observados deslocamentos no

sentido do encontro da barragem. Este comportamento pode estar relacionado com a geometria da

fundação e só é detectável numa análise tridimensional.

Figura 71: Deslocamentos na direcção transversal, modelo 3D

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83

Os deslocamentos na direcção transversal da barragem (DY) são práticamente simétricos em relação

ao eixo e estão de acordo com o comportamento normal das estruturas de aterro, isto é, alargamento

da zona inferior do aterro e estreitamento na zona superior.

Em relação aos deslocamentos verticais, os mais significativos, os resultados obtidos revelam que os

deslocamentos máximos ocorrem ligeiramente abaixo da zona central da barragem. Este

comportamento era o esperado, pois trata-se de uma estrutura de aterro construída em camadas. O

valor máximo de deslocamento vertical obtido no modelo tridimensional é ligeiramente superior a 2 cm

e corresponde a uma percentagem inferior a 1% da altura da barragem. É notório também o efeito da

geometria da fundação nos deslocamentos verticais. Os valores máximos de deslocamentos verticais

estendem-se para jusante em função da cota de fundação. Este seria um facto a ter em consideração,

caso a dimensão da barragem fosse maior, uma vez que os deslocamentos diferenciais, mesmo na

zona de jusante, podem repercutir-se em deformabilidade excessiva na zona da cortina, como

aconteceu nos casos históricos assinalados em 2.3.2.

Tal como na análise das tensões, proceder-se-á a uma comparação entre os resultados obtidos no

modelo 3D e no modelo 2D para os valores dos deslocamentos. Assim sendo, a representação dos

valores de deslocamentos obtidos no modelo bidimensional é apresentada na Figura 73 e na Figura

74.

Figura 72: Deslocamentos verticais (DZ), modelo 3D

A deformabilidade apresentada no modelo bidimensional é, de um modo geral semelhante, à

apresentada nos resultados do modelo 3D. No entanto, a simetria dos deslocamentos, quer verticais,

quer horizontais, é muito mais pronunciada no modelo 2D, uma vez que este modelo não tem em conta

a geometria da fundação.

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84

Figura 73: Deslocamentos horizontais (DX), modelo 2D

A comparação dos valores máximos dos deslocamentos nos diferentes modelos, revela uma vez mais,

que os valores extraídos do modelo 2D são significativamente maiores do que os obtidos no modelo

3D.

Figura 74: Deslocamentos verticais (DY), modelo 2D

Os resultados obtidos através dos modelos constituem uma previsão do comportamento da barragem

na fase de final de construção. Contudo estes valores podem ser relacionados e validados tendo por

base os dados obtidos através dos equipamentos de observação disponíveis até à data da elaboração

desta tese.

A última leitura dos inclinómetros verticais foi efectuada quando o aterro se encontrava à cota de

1216,02 m, o que corresponde a cerca de 85 % da altura total da barragem. Os valores de

assentamentos registados nesta leitura foram comparados com os resultados obtidos nos modelos 2D

e 3D para a fase de final de construção, que constituem uma previsão do comportamento da barragem.

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85

Figura 75: Comparação entre os assentamentos registados no inclinómetro vertical central e a

previsão de assentamentos obtida nos modelos 2D e 3D para a mesma zona.

A Figura 75 apresenta comparativamente o andamento dos deslocamentos verticais com a cota do

aterro da barragem na zona do inclinómetro vertical central. A análise desta figura permite verificar que

os andamentos são muito semelhantes entre si e verifica-se novamente que os valores são maiores no

modelo 2D. Percebe-se também que os valores das medições no final da construção vão ser bastante

próximos dos resultados do modelo 3D. Ressalva-se que no modelo 3D são apresentados

assentamentos da fundação, a que corresponde o andamento aproximadamente vertical.

Por outro lado, verifica-se que existe uma ligeira discrepância entre o inicio das curvas de assentamento

para os três resultados. Esta variação está relacionada com o facto de o tubo inclinométrico estar

enterrado na fundação para permitir o seu encastramento e também pela irregularidade da fundação.

Na Figura 76 é apresentada a comparação entre os assentamentos observados em obra e as previsões

obtidas através do modelo 3D para os inclinómetros verticais mais próximos do encontro esquerdo (a)

e do encontro direito (b).

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86

(a)

(b)

Figura 76: Comparação entre os assentamentos registados nos inclinómetros verticais e a

previsão no modelo 3D na zona: (a) do encontro esquerdo; (b) do encontro direito.

Os assentamentos obtidos através do modelo 3D continuam a ser consistentes com os assentamentos

observados em obra quando o aterro se encontrava à cota 1216,02 m. Verifica-se que os resultados

do modelo 3D são maiores na zona do encontro esquerdo do que na zona do encontro direito, o que

pode ser explicado pelo facto de o encontro esquerdo ter uma inclinação bastante menor que o encontro

direito, e como tal a altura de aterro é maior na zona esquerda da barragem. Porém, as observações

mostram que os valores máximos de deslocamentos são semelhantes para as duas zonas. Esta

situação pode ser explicada pela inclinação muito pronunciada do encontro direito que constitui uma

singularidade da obra que coloca algumas dificuldades construtivas que poderão traduzir-se em

maiores valores de assentamentos. Na zona do encontro direito verifica-se novamente uma diferença

de cotas da fundação entre o modelo 3D e as observações de obra.

6.2 Fase de primeiro enchimento

A fase de primeiro enchimento é, sem dúvida, uma fase crítica no comportamento das BECB. A ela

está associado um aumento de carga, relativamente rápido, na zona de montante da barragem,

materializado pela pressão hidrostática da albufeira. Este carregamento induz o aumento das tensões

na zona de montante e também um acréscimo de deslocamentos, que depende não só das

características mecânicas do material, como também da geometria da fundação.

À data deste trabalho, a fase de primeiro enchimento da Barragem de Veiguinhas ainda não estava em

curso, sendo que a fase de construção do aterro estava próxima da conclusão. Deste modo, os modelos

elaborados para simular os efeitos do primeiro enchimento no comportamento da Barragem de

Veiguinhas, constituem uma previsão do comportamento da barragem. Assim sendo, esta análise tem

como objectivos:

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87

prever o efeito do enchimento da albufeira no comportamento do maciço da barragem;

prever os deslocamentos da cortina de betão armado, assumindo são os calculados para o

talude de montante.

6.2.1 Tensões após o primeiro enchimento

Os valores de tensões obtidos nos resultados do cálculo tridimensional são apresentados na Figura 77

e na Figura 78. Estas figuras permitem a visualização dos efeitos do primeiro enchimento até ao NPA.

A influência do primeiro enchimento é praticamente restringida à zona a montante do eixo da barragem,

sendo que na zona de jusante os aumentos de tensão são pouco significativos.

Figura 77: Estado de tensão na direcção transversal no final do primeiro enchimento (𝜎𝑦𝑦), modelo

3D

Na zona de montante, o nível de tensões sofre um aumento bastante considerável da fase de final de

construção para a fase de final de primeiro enchimento, Este aumento de tensão é mais notório, como

seria de esperar, na direcção transversal da barragem (𝜎𝑦𝑦).

Estas representações, quando comparadas com as suas homólogas na fase de final de construção,

revelam uma alteração no estado de tensão. Na fase de construção verificava-se uma ligeira assimetria,

com níveis de tensão maiores na zona de jusante, devido à geometria da fundação. Na fase final do

enchimento regista-se precisamente o contrário com aumento de tensões na zona de montante devido

ao carregamento hidrostático.

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88

Figura 78: Estado de tensão na direcção vertical no final do primeiro enchimento (𝜎𝑧𝑧), modelo 3D

Os resultados obtidos através do modelo bidimensional apresentam um comportamento semelhante

aos obtidos no modelo 3D. Este comportamento, caracterizado pelo aumento das tensões na zona de

montante, é representado na Figura 79

Figura 79: Estado de tensão horizontal na fase de final de primeiro enchimento (𝜎𝑥𝑥), modelo 2D

6.2.2 Deslocamentos após o primeiro enchimento

Os efeitos do primeiro enchimento da albufeira são ainda mais notórios nos valores de deslocamentos

obtidos. Oferecendo uma perspectiva geral do efeito do primeiro enchimento da albufeira a Figura 80:

Deslocamentos longitudinais (DX), no final do primeiro enchimento, modelo 3DFigura 80 mostra a

deformada da barragem, ampliada 100 vezes, após o primeiro enchimento e a magnitude dos

deslocamentos previstos. A Figura 81, a Figura 82 e a Figura 83 mostram, respectivamente, os valores

de deslocamentos DX, DY e DZ, no final da fase de enchimento, obtidos através do cálculo 3D.

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89

Figura 80: Deslocamentos longitudinais (DX), no final do primeiro enchimento, modelo 3D

Observe-se que os deslocamentos na direcção longitudinal, com a fase de enchimento, para além da

direcção para a zona central da barragem, tal como no final da fase construtiva, apresentam ainda uma

concentração de deslocamentos na zona central da cortina. O comportamento apresentado representa

o efeito de arco desenvolvido aquando do enchimento deste tipo de barragens.

Figura 81: Deslocamentos longitudinais (DX), no final do primeiro enchimento, modelo 3D

Na representação dos deslocamentos DY o efeito do enchimento da albufeira é muito representativo,

isto porque existe uma mudança na direcção dos deslocamentos entre o final de construção e a fase

final do enchimento.

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90

Figura 82: Deslocamentos na direcção transversal (DY), modelo 3D

No final da construção o maciço deslocava-se para fora do corpo da barragem quer na zona de

montante quer na zona de jusante. Contudo, o efeito do carregamento hidrostático faz com que, na

zona de montante, a direcção dos deslocamentos se altere, passando esta zona a deslocar-se para

jusante.

Figura 83: Deslocamentos verticais (DZ), modelo 3D

Regra geral, verifica-se que os deslocamentos verticais devidos ao primeiro enchimento da albufeira,

relativamente aos da fase de construção, são bastante mais reduzidos.

A Figura 84 mostra essa evidência para os deslocamentos verticais obtidos na zona central da

barragem, nos alinhamentos dos inclinómetros instalados em obra. Por outro lado, os deslocamentos

perpendiculares à cortina de betão armado, representados, para os alinhamentos dos inclinómetros

inclinados, na Figura 85, apresentam valores maiores, ainda que reduzidos em comparação com os

obtidos na fase de construção.

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91

(a)

(b)

(c)

Figura 84: Deslocamentos verticais provocados pelo enchimento na zona dos inclinómetros

verticais: (a) margem esquerda, secção 0+236; (b) zona central, secção 0+256; (c) margem direita,

secção 0+286

(a)

(b)

(c)

Figura 85: Deslocamentos perpendiculares à cortina, provocados pelo enchimento : (a) margem

esquerda secção 0+236; (b) zona central, secção 0+256; (c) margem direita, secção 0+286

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92

No modelo bidimensional os resultados obtidos para os deslocamentos na fase de enchimento da

albufeira são semelhantes aos da modelação tridimensional, apresentando, contudo, valores de

deslocamentos mais elevados. Na Figura 86 são apresentados os deslocamentos horizontais no final

do enchimento da albufeira e também os deslocamentos normais à cortina de betão, devidos

unicamente ao enchimento.

(a)

(b)

Figura 86: Deslocamentos obtidos no modelo 2D: (a) deslocamentos horizontais no final da fase de

enchimento; (b) deslocamentos normais à cortina, devidos ao enchimento.

6.3 Estudo de percolação

O estudo da percolação em barragens de enrocamento com cortina de betão apresenta grandes

desafios e constitui uma matéria muito complexa, visto que o elemento impermeável pode sofrer danos

e deste modo alterar por completo a previsão dos caudais percolados pelo corpo da barragem. A

quantificação dos caudais percolados é extremamente relevante, uma vez que a funcionalidade deste

tipo de estrutura pode ser comprometida com a ocorrência de fracturas no elemento impermeabilizante

ou por percolação excessiva pela fundação.

O objectivo essencial deste estudo consiste na previsão dos caudais que irão ser medidos na fase de

exploração da barragem. Isto é, a soma dos caudais percolados pela fundação e pelo maciço de

enrocamento, subtraídos dos caudais que nunca chegam a aflorar a superfície. Com este estudo

pretende-se também, de uma forma bastante simplificada, prever o efeito que hipotéticos defeitos na

cortina terão nos caudais percolados.

Visto que o software Code_Aster não permite a determinação directa de caudais que atravessam

determinada secção da barragem, os valores foram obtidos através da integração da magnitude dos

vectores de velocidade na secção. Na Figura 87 está representada a magnitude do vector velocidade.

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93

Os resultados obtidos mostram que a percolação no aterro da barragem é controlada pelos elementos

menos permeáveis - a cortina de betão armado e a cortina de injecções - obrigando, deste modo,

grande parte da água a circular pela fundação. É também visível que a percolação a jusante das

cortinas se processa maioritariamente pelas zonas mais permeáveis - o enrocamento e a zona

superficial da fundação, mais permeável.

Figura 87: Velocidade de percolação – magnitude.

Na Tabela 9 é apresentada a previsão dos caudais percolados pelas diferentes zonas da Barragem de

Veiguinhas tendo em conta diferentes condições da cortina de betão armado. Observe-se que a

previsão do caudal a medir no medidor de caudais a jusante da barragem, com a cortina a operar em

boas condições apresenta um valor plausível tendo em conta a altura e as características da barragem.

A inclusão de defeitos na cortina foi feita através da atribuição de valores de permeabilidade idênticos

aos do enrocamento, a elementos da cortina.

Os defeitos com aproximadamente 1,5 m foram introduzidos na zona inferior da cortina, onde é comum

haver problemas de fissuração das cortinas. Considerou-se a dimensão dos defeitos igual, ou seja o

segundo defeito é idêntico ao primeiro. Segundo Cruz et al., (2009) uma permeabilidade equivalente

de 10-4 representa uma área de fendas generalizada ou fissuras de 0,5 a 5 mm espassadas de 0,5 a 1

m, tal como referido em 4.3.4.

Os resultados obtidos nas simulações com defeitos na cortina, revelam a grande importância da cortina

impermeabilizante e da sua durabilidade. O caudal previsto é cerca de 12 vezes superior ao medido

quando a cortina não apresentava defeitos.

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94

Defeitos na

cortina

Caudal percolado

pela fundação

(l/s.m)

Caudal percolado

pelo aterro (l/s.m)

Caudal que passa

pela fundação

(l/s.m)

Caudal medido no

medidor de caudais

(l/s)

0 0,0105 0,0060 0,00055 1,59

1 0,0580 0,1357 0,00076 19,30

2 0,0553 0,1574 0,00062 21,20

Tabela 9: Caudais percolados na barragem.

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95

7 Considerações finais

7.1 Conclusões

Existem diversos factores que condicionam o desempenho das BECB. As deformações no maciço são,

normalmente, consequência de variações significativas da rigidez das diferentes zonas e dos efeitos

de uma geometria e condições de fundação irregulares ou variáveis. Nas barragens muito altas, o efeito

de arco produzido na zona da cortina devido à pressão hidrostática, pode pôr em causa o

funcionamento das barragens devido à rotura das juntas verticais.

As análises da deformabilidade de estruturas de enrocamento são bastante complexas, pois dependem

de diversos factores que condicionam as propriedades mecânicas do material. Entre os factores que

condicionam o comportamento reológico dos enrocamentos destacam-se: o estado de tensão inicial, a

trajectória de tensão, o estado de compacidade inicial, a origem mineral das partículas de enrocamento,

o tamanho e forma das partículas, o teor em água e a granulometria. A grande variabilidade no

comportamento dos materiais de enrocamento está relacionada com a influência destes factores, que

actuam em simultâneo. Assim sendo, a correcta definição das propriedades mecânicas dos materiais

de enrocamento depende em grande medida do programa de ensaios prescrito. Os equipamentos de

ensaio de grandes dimensões são essenciais na obtenção de propriedades mecânicas representativas

dos materiais de enrocamento.

As BECB apresentam uma tendência de aumento em altura nas últimas décadas, sendo que alguns

dos projectos são localizados em vales estreitos e de geometria complexa. Nestas situações deve ser

considerada uma análise tridimensional que possa representar os efeitos da irregularidade da

fundação, identificar a distribuição de tensões do maciço, e quantificar os esforços de compressão na

zona central da cortina.

As tensões desenvolvidas no maciço de enrocamento de uma BECB são diferentes para as diversas

zonas da barragem e variáveis com a construção e com o primeiro enchimento da albufeira. A zona de

montante da barragem, próxima da cortina de betão armado, apresenta uma inversão na direcção das

tensões principais durante a fase de primeiro enchimento. Nesta zona desenvolve-se um processo de

carga-descarga da tensão deviatórica, sempre acompanhado de um aumento do estado de tensão

(tensão isotrópica).

O modelo tridimensional da Barragem de Veiguinhas permite concluir que a geometria da fundação e

dos encontros é um factor condicionante do comportamento tensão-deformação do maciço de

enrocamento. No caso de estudo verifica-se um aumento de tensões e deslocamentos na zona a

jusante do eixo da barragem, onde a fundação é mais profunda.

Os deslocamentos máximos obtidos, quer no modelos tridimensional, quer no modelo bidimensional,

ocorrem ligeiramente abaixo da zona central do aterro.

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96

No modelo tridimensional observam-se deslocamentos na direcção longitudinal da barragem no sentido

dos encontros, na zona abaixo da banqueta de jusante e também em algumas zonas nos limites dos

encontros.

Os valores obtidos na modelação 2D são superiores aos obtidos no modelo 3D, quer para o nível de

tensões, quer para a grandeza dos deslocamentos.

Na previsão do comportamento da Barragem de Veiguinhas após a fase de primeiro enchimento,

concluiu-se que os efeitos do primeiro enchimento são pouco significativos na zona central da

barragem.

O caudal percolado pelo maciço de enrocamento e pela fundação depende essencialmente da

integridade da cortina de montante e da boa execução da cortina de injecções.

A ocorrência de fissuras na cortina de betão armado aumenta drasticamente o valor do caudal

percolado pelo corpo da barragem.

7.2 Desenvolvimentos Futuros

Sugerem-se os seguintes desenvolvimentos futuros:

Modelação dos materiais de enrocamento através de uma lei constitutiva elástica não linear ou

uma lei elastoplástica capaz de ter em conta os factores que condicionam o comportamento

destes materiais entre eles a elasticidade variável e o endurecimento;

Modelação da cortina de betão com elementos específicos e incluir o plinto na modelação;

Simulação do comportamento das juntas da barragem, recorrendo a elementos de junta;

Modelação do zonamento interno do corpo do enrocamento;

Aprofundamento do cálculo de percolação, avaliando o efeito da variação de permeabilidade

das diversas zonas da barragem;

Análise do comportamento sísmico da cortina tendo em conta os efeitos tridimensionais.

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