Estudo do perfil das torcedoras - Comunicon

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PPGCOM ESPM // SÃO PAULO // COMUNICON 2014 (8a10 de outubro 2014) Estudo do perfil de consumo das torcedoras do Sport Club do Recife 1 Andreza SALGUEIRO 2 Riklévio MELO 3 Rodrigo Stefani CORREA 4 Universidade Católica de Pernambuco, Recife, PE Resumo Este artigo aborda as noções de fragmentação e reconfiguração no modelo de comportamento de consumo que acontece no contexto do futebol brasileiro, onde a participação feminina, mais que um fenômeno crescente de participação social, requalifica a necessidade de compreender o consumo a partir de três noções centrais, conforme qualifica Rocha (2002): a estilização, a estetização e a moda. O resultado deste trabalho foi permeado por um trabalho de pesquisa de marketing, de caráter exploratório de campo (dados primários e secundários), com a intenção de qualificar o perfil de consumo das torcedoras do Sport Clube de Recife (Pernambuco), sobre as perspectivas teóricas dos estudos culturais e de consumo referenciadas pela visão de Stuart Hall (2002), Salomon (2005) e Lipovetsky (2005). Neste sentido, as mudanças sociais que apresentamos neste trabalho indicam uma nova figuração no cenário futebolístico, onde imperava a cultura masculina, mas que agora pode ser resignificada em função do aparecimento de outro fenômeno social: a inserção das torcedoras-consumidoras. Palavras-chave: pesquisa; marketing esportivo; consumo; mulheres; Sport Club do Recife. 1 Trabalho apresentado no GT 9- Comunicação, Discursos da Diferença e Biopolíticas do Consumo, do 4º Encontro de GTs -Comunicon, realizado nos dias 08, 09 e 10 de outubro de 2014. 2 Pós-graduanda em Comunicação e Marketing em Mídias Digitais na Estácio de Sá, e-mail: [email protected] 3 Pós-graduando em Marketing pela Faculdade de Ciências da Administração de Pernambuco, e-mail: [email protected] 4 Orientador do trabalho. Professor do Curso de Publicidade e Propaganda da Universidade Federal de Pernambuco, e-mail: [email protected]

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Este artigo aborda as noções de fragmentação e reconfiguração no modelo de comportamento de consumo que acontece no contexto do futebol brasileiro, onde a participação feminina, mais que um fenômeno crescente de participação social, requalifica a necessidade de compreender o consumo a partir de três noções centrais, conforme qualifica Rocha (2002): a estilização, a estetização e a moda. O resultado deste trabalho foi permeado por um trabalho de pesquisa de marketing, de caráter exploratório de campo (dados primários e secundários), com a intenção de qualificar o perfil de consumo das torcedoras do Sport Clube de Recife (Pernambuco), sobre as perspectivas teóricas dos estudos culturais e de consumo referenciadas pela visão de Stuart Hall (2002), Salomon (2005) e Lipovetsky (2005). Neste sentido, as mudanças sociais que apresentamos neste trabalho indicam uma nova figuração no cenário futebolístico, onde imperava a cultura masculina, mas que agora pode ser resignificada em função do aparecimento de outro fenômeno social: a inserção das torcedoras-consumidoras.

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PPGCOM ESPM // SÃO PAULO // COMUNICON 2014 (8a10 de outubro 2014)

Estudo do perfil de consumo das torcedoras do Sport Club do Recife1

Andreza SALGUEIRO2

Riklévio MELO3

Rodrigo Stefani CORREA4

Universidade Católica de Pernambuco, Recife, PE

Resumo

Este artigo aborda as noções de fragmentação e reconfiguração no modelo de

comportamento de consumo que acontece no contexto do futebol brasileiro, onde a

participação feminina, mais que um fenômeno crescente de participação social,

requalifica a necessidade de compreender o consumo a partir de três noções centrais,

conforme qualifica Rocha (2002): a estilização, a estetização e a moda. O resultado

deste trabalho foi permeado por um trabalho de pesquisa de marketing, de caráter

exploratório de campo (dados primários e secundários), com a intenção de qualificar o

perfil de consumo das torcedoras do Sport Clube de Recife (Pernambuco), sobre as

perspectivas teóricas dos estudos culturais e de consumo referenciadas pela visão de

Stuart Hall (2002), Salomon (2005) e Lipovetsky (2005). Neste sentido, as mudanças

sociais que apresentamos neste trabalho indicam uma nova figuração no cenário

futebolístico, onde imperava a cultura masculina, mas que agora pode ser

resignificada em função do aparecimento de outro fenômeno social: a inserção das

torcedoras-consumidoras.

Palavras-chave: pesquisa; marketing esportivo; consumo; mulheres; Sport Club do

Recife.

1Trabalho apresentado no GT 9- Comunicação, Discursos da Diferença e Biopolíticas do Consumo, do

4º Encontro de GTs -Comunicon, realizado nos dias 08, 09 e 10 de outubro de 2014. 2

Pós-graduanda em Comunicação e Marketing em Mídias Digitais na Estácio de Sá, e-mail:

[email protected] 3 Pós-graduando em Marketing pela Faculdade de Ciências da Administração de Pernambuco, e-mail:

[email protected] 4 Orientador do trabalho. Professor do Curso de Publicidade e Propaganda da Universidade Federal de

Pernambuco, e-mail: [email protected]

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INTRODUÇÃO

A incessante busca da mulher pelas condições igualitárias de ideias e prestígio

social conferido ao homem parece ser um índice contemporâneo que nos revelam

anseios por assuntos que até então eram distantes dos olhos de boa parte da sociedade.

Os aspectos da sociedade hipermoderna, como conceitua Gilles Lipovetsky (2004),

além de aumentar o campo de observação já alastrado pelas mudanças de direção no

comportamento social, apontam, sobretudo, para novas estruturas de reorganização

em profundidade que ocorrem nas relações de trocas simbólicas e culturais dos

indivíduos que habitam essas sociedades, vistas como democráticas avançadas.

O acréscimo da demanda feminina para um conjunto de campos simbólicos

antes direcionados exclusivamente para ao universo masculino, mostra muito mais

que uma luta de gênero; percebe-se a existência de novos padrões no que diz respeito

ao modelo consumo e a nova maneira como as mulheres são ou devem ser percebidas

pelas organizações, que por sua vez aumenta a representação feminina na dinâmica do

consumo de bens e serviços esportivos.

Portanto este paper apresenta em perspectiva, possíveis alterações no

comportamento de consumo feminino atrelado a cultura futebolística brasileira, que

revela uma relação culturológica de inserção social. Adentrando um pouco mais na

história brasileira, recorremos a Gilberto Freyre, que destaca a miscigenação dos

povos e suas raças, como um entre tantos elementos marcantes da paixão brasileira

pelo futebol. Essa adoração ultrapassou as barreiras do sexo e parece ter conquistado

as mulheres.5 Elas, por sua vez, veem desmonstrando interesse pelo esporte, mesmo

existindo restrições de diálogo convergentes aos gostos e hábitos, no sentido que

muitos clubes ainda não compreendem essas transformações que superam o modelo

clássico de simples telespectadora, avançado para uma nova posição ideológica, de

5Disponível em http://futebol-no-brasil.info/mos/view/Futebol_-_Paix%C3%A3o_Nacional/. Acesso

em: 20 mar. 2014

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torcedora assídua, atleta, consumidora e reprodutora de valores e novos conceitos

sobre os esportes.

1. O MERCADO ESPORTIVO

O crescimento das atividades de lazer relacionadas ao esporte tem

movimentado o cenário da indústria esportiva, que por sua vez atraiu os olhos dos

estudiosos de marketing para uma nova cultura que negócios que se estabelece. De

acordo com um estudo da indústria esportiva, destacado por Pitts e Stotlar (2002),

revelou que o Produto Interno Bruto dos Esportes (PIBE) totalizou 63,1 bilhões de

dólares em 1988. Atualmente, segundo Clarisse Setyon6, a indústria gera em torno de

US$ 1 trilhão por ano e possui um dos maiores percentuais de crescimento entre os

principais setores da economia. No Brasil, ainda segundo Setyon7, o movimento

gerado pela indústria do esporte gira na média de R$ 31 bilhões por ano. Segundo a

Pluri Consultoria Esportiva8, a participação dos esportes no PIB brasileiro representa

1,6% (R$ 67 bilhões), a participação do esportivo na economia deve crescer 22% nos

próximos cinco anos (2011 = 1,6% / 2016 = 1,9% do PIB).

Os principais fatores que influenciaram o crescimento e desenvolvimento

dessa indústria foram: aumento no número de novas e diferentes atividades

esportivas, de fitness e recreativas; aumento na oferta de esportes; aumento no

número e tipos de revistas esportivas e especializadas; aumento do tempo de lazer;

aumento da exposição de publicidades à mídia de massa; a explosão do fitness na

década de 70; aumento no número de instalações, eventos e participação no cenário

esportivo; aumento e expansão dos bens e serviços relacionados ao esporte para a

variedade de segmentos do mercado; aumento no número de e tipos de atividades

6 Professora do curso de especialização em Marketing Esportivo da Escola Superior de Propaganda e

Marketing (ESPM), sobre evolução econômica do modelo de negócios baseado no Esporte. Disponível:

http://www.amcham.com.br/gestao-empresarial/noticias/industria-do-esporte-movimenta-us-1-trilhao-

no-mundo. Acesso em: 13 jul. 2014 7 Ibidem

8Disponível em: http://www.pluriconsultoria.com.br/uploads/relatorios/PIB%20Esporte.pdf Acesso

em: 13 jul. 2014

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esportivas, de fitness e recreativas em nível profissional; a transição das instalações de

único propósito para instalações de multiuso; aumento do esporte para a diversidade

das populações; aumento do patrocínio e de fundos para esporte por parte da

comunidade empresarial geral; aumento dos endossos; aumento da educação

esportiva; aumento dos lucros; aumento da tecnologia em bens, serviços e

treinamento relacionados ao esporte; destaque do esporte com produto de consumo;

aumento do marketing e da orientação da indústria do esporte para o marketing;

aumento da competência na administração do esporte; a globalização. (PITTS E

STOTLAR, 2002).

Desta forma, o mercado esportivo brasileiro, mesmo com toda sua diversidade

ainda tem o futebol como protagonista deste setor. Segundo dados da pesquisa

realizada por Amir Somoggi9, apesar desse mercado se aproximar dos R$ 3 bilhões, o

crescimento é o menor desde 2008. Esse fato é muito intrigante e nos motiva a pensar

para outras direções, sobrepondo o modelo de negócio10

esportivo e enveredando

nosso campo de investigação para os fenômenos da cultura e da observação social

sobre estudo de gênero.

2. CONSUMO, ESPORTES E O FUTEBOL

A relação do brasileiro com os esportes parece estar passando por um processo

ainda que lento, mas de amadurecimento, muito provavelmente pelo incentivo das

novas mídias digitais e pelos avanços do modelo de transmissões e coberturas

esportiva praticadas pelas emissoras de TV, em especial, pelos canais especializados

em esportes. Alguns dados publicados pela PerformProgressive Sports Mídia em

parceria com as empresas Katar Media Sport e TV Sports Markets, a partir do

9 Almir Somoggi é especialista em Marketing e Gestão Esportiva e os dados de sua pesquisa estão

disponíveis na URL: http://esporte.uol.com.br/futebol/ultimas-noticias/2013/01/03/mercado-do-

futebol-se-aproxima-dos-r-3-bilhoes-no-brasil-mas-crescimento-e-menor-desde-2008.htm Acesso em:

13 jul. 2014 10

O futebol como negócio compreende 53% do PIB esportivo, que corresponde a R$ 36 bilhões,

segundo a Pluri - Consultoria Esportiva10

.

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Relatório Global de Consumo de Mídia Esportiva 201311

, no qual aponta que 80% da

população brasileira, que consome internet, são fãs de alguma modalidade esportiva.

Dos quais, 68% preferem o futebol, 43% vôlei, 31% a fórmula 1, 29% natação, 24%

ginástica e 22% basquete.

Outras fontes de pesquisa, como a ConsumerWatch Latam realizada pela

KantarWorldpanel12

, destacam que sete em dez consumidores seguem os esportes,

principalmente o futebol, ao menos três vezes por semana e 85% acompanham a Copa

do Mundo. O esporte em questão é o preferido tanto para os homens quanto para as

mulheres. Para eles, o futebol é seguido pelo boxe e automobilismo. Para elas, depois

do futebol vem o vôlei e a ginástica.

Ainda segundo a pesquisa13

, 56% dos consumidores brasileiros foram

classificados como torcedores “roxos” e fãs de esportes. Esse grupo corresponde aos

torcedores que acompanham seus times semanalmente nas mídias, sabem tudo que

está ocorrendo e o esporte se faz presente de alguma forma; 15% são atingidos por

grandes espetáculos que alteraram a sua rotina (Copa do Mundo, Jogos Olímpicos

etc.); os 29% restantes não têm interesse no assunto. No que diz respeito ao momento

de um jogo, 70% preferem assistir a partida acompanhados; 7% vai ao estádio

regularmente, 23% acompanha o jogo em um bar ou restaurante, 54% em casa.

Os dados apresentados além de marcar perspectivas distintas entre gêneros

masculino e feminino, também nos liga a outros dois aspectos do consumismo

moderno, assinalados por Campbell (2006): o lugar ocupado pela emoção e pelo

desejo e o individualismo irrestrito. Se o consumismo moderno está mais ligado ao

desejo que às necessidades e, portanto, mais relacionado à subjetividade que à

objetividade, ele abre espaço para que a cultura esportiva cresça de forma irrestrita

aqui no Brasil. Nesse propósito, os meios de comunicação exercem um papel

fundamental; e, no âmbito do consumo de produtos e serviços esportivos, a

11

Disponível em: http://www.knowthefan.com/reports/Acesso em: 13 jul. 2014 12

Disponível em: http://www.ibope.com.br/pt-br/conhecimento/artigospapers/Paginas/Um-grande-

show-dos-torcedores-e-um-grande-palco-para-as-marcas.aspx Acesso em: 13 jul. 2014 13

Ibidem

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publicidade se destaca como agente influenciador e modelador da cultura de

consumo.

3. A CULTURA DE CONSUMO NO CAMPO FEMININO

O futebol parece ter conquistado a preferência feminina, com base em dados

recentes, que apontam percentuais impressionantes para o setor, onde 72% das

brasileiras elegeram o futebol como uma grande paixão14

. De acordo com a pesquisa

realizada por Sophia Mind15

, as mulheres têm o hábito de acompanhar os jogos pela

TV, principalmente junto ao marido; a violência é o principal inibidor da presença no

estádio; TV e internet são os principais meios que elas buscam para se obter

informações sobre teu time; 69% consomem produtos relacionados ao futebol, desse

número 53% compram para consumo próprio; 65% reclamam que faltam produtos

esportivos destinados ao público feminino. Segundo Salomon, Michael R. (2005,

p.30)

Os consumidores usam objetos para participar de uma experiência

mútua e difundir suas identidades com o grupo. Por exemplo,

torcedores contentes podem gritar em uníssono e participar de uma

explosão de saudações quando um dos jogadores do seu time faz um

ponto. Essa dimensão da experiência compartilhada é diferente de

assistir ao jogo em casa sozinho.

O aumento da atuação feminina marca um fenômeno também observado por

Maria Eduarda Rocha (2002), que define algumas características da cultura de

consumo em três elementos centrais: a estilização, a estetização e a moda. A

estilização diz respeito ao uso crescentemente simbólico dos produtos como senhas de

distinção social. A estetização refere-se ao enorme volume de imagens que circundam

14

Disponível em: http://www.ibope.com/pt-br/noticias/Paginas/Futebol-e-a-maior-paixao-dos-

brasileiros.aspx Acesso em 13 jul.2014 15

Disponível em: http://www.sophiamind.com/wp-content/uploads/SophiaMind_Mulheres-e-

Futebol.pdf Acesso em 13 jul. 2014

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os produtos. E a moda é caracterizada pela frequente renovação dos produtos

dirigidos ao público feminino, o que permite a manifestação e variação das

representações que as consumidoras fazem de si mesmas por meio dos produtos e

serviços.

Esse novo comportamento feminino ganha notoriedade a partir do momento

que a torcedora individual se conecta a outras torcedoras gerando uma troca contínua

de informações, resultando num processo interacional simbólico que se constitui

como um novo modelo de organização. Em partes, esse comportamento social - das

torcedoras – passam a representar novas ideologias que penetram e também

interferem no campo sensorial do gênero masculino. As mulheres ao compartilhar as

arenas esportivas com os homens começam a inserir suas próprias ideias, que se

concretizam nas práticas sociais pela interação entre gêneros, consumo de

mercadorias e pelo compartilhamento de novos valores que devem ser absorvidos

pelas empresas que administram os negócios.

Nesse contexto, busca-se refletir sobre a pertinência de novos padrões

culturais de consumo, especialmente quando o objeto se restringe ao comportamento

feminino, mais especificamente, das torcedoras do Sport Clube de Recife. Para tanto,

os resultados da pesquisa buscaram qualificar os perfis de consumo das torcedoras do

Sport, na tentativa de detectar a presença de certos elementos modeladores que

acontecem no segmento esportivo, reconfiguradas nas mudanças sociais que

determinam uma nova identidade de consumidora.

Portanto, o problema central da pesquisa repercute no interesse de encontrar

algumas definições por padrões, no que diz respeito ao comportamento de consumo

feminino, para apontar quais elementos simbólicos estão presentes no interesse

comum de consumo das torcedoras rubro-negras? Cabe salientar ainda, que o

interesse pelo objeto da pesquisa não se limitou pela definição do escopo de produtos;

em verdade, busca-se interpretar os modos de sociabilidade relacionados às trocas

simbólicas das torcedoras do Sport. Para isso, nos coube seguir as recomendações de

Stuart Hall (2002) que orienta a observar esses fenômenos, a partir de suas

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representações - o indivíduo feminino – e como esse indivíduo se reconhece como

grupo, ao se juntar a uma grande massa, espelhando-se nos modelos de

comportamento social e individual que caracteriza uma torcida.

4.1 Os paradigmas da torcedora rubro-negra

Existe uma significativa participação do público feminino dentro dos estádios

de futebol, o que vem provocando mudanças nas estratégias de fidelização e

relacionamento por parte dos clubes de futebol, especialmente quando se trata de

planejamento de marketing. Segundo Salomon, Michael R. (2005):

A presença de mulheres em posições de autoridade é um fenômeno

bem recente. A evolução de uma nova classe gerencial de mulheres

tem forçado os profissionais de marketing a mudar suas tradicionais

suposições sobre mulheres quando se dirigem a esse mercado

consumidor em crescimento (p. 123).

Mesmo sabendo que o público masculino é superior ao feminino, seja dentro

ou fora do campo, a presença das mulheres torna-se significativa na medida em que

esse processo interacional reconfigura as atitudes sociais. O que pode ser justificado

devido a ações direcionadas ao Dia das mães nos clubes brasileiros16

, assim como

produtos específicos, a exemplo de Lingerie para o Dia dos Namorados17

, por canais

de comunicação segmentados, como Flunáticas18

e pesquisa. Segundo Ibope19

, no

Maximídia 2011, as mulheres já são maioria em alguns times brasileiros, como nas

16

Disponível em: http://www.maquinadoesporte.com.br/i/noticias/marketing/25/25156/Dia-das-Maes-

divide-marketing- de-clubes/index.php. Acesso em: 20 mar. 2014 17

Disponível em: : http://www.maquinadoesporte.com.br/i/noticias/marketing/25/25430/Vasco-lanca-

lingerie-para-Dia- dos-Namorados/index.php. Acesso em: 20 mar. 2014 18

Disponível em: http://www.flunaticas.com.br/. Acesso em: 20 mar. 2014 19

Disponível em: http://www.ibope.com.br/maximidia2011/apresentacao_exclusiva.pdf. Acesso em: 20

mar. 2014

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torcidas de Flamengo, Grêmio, Cruzeiro, Vitória, Náutico e, principalmente, na

torcida do Sport.

Sendo assim, torna-se relevante do ponto de vista do marketing e da

comunicação, entender como culturalmente o imaginário feminino se move aos

objetos e estímulos que a publicidade lança para o consumo?

A escolha pelo gênero feminino – torcedora do Sport - justifica-se pelas

possibilidades de compreensão de uma nova conduta de consumo que se espalha em

diversos âmbitos do comportamento social: o consumo de bens e serviços; da

participação nos eventos e jogos do clube; no processo afetivo com a Marca\Clube

que interfere na tomada de decisões. Considera-se ainda, que o universo feminino, por

ser um grupo que vem recebendo esforços mais cuidadosos dos gestores de

comunicação, possui uma importância dentro do universo futebolístico, atuando de

forma positiva em atitudes de promoção e engajamento para com outros

públicos\gêneros.

4.2 Objetivos da pesquisa

Preocupou-se em identificar e conhecer o universo da torcida feminina do

Sport Club Recife, destacando principalmente os fatores simbólicos que migraram

nesse sistema, dado a constatação de uma pesquisa, divulgada pelo Ibope no

Maximídia em 2011 20

(São Paulo).

Como impacto da pesquisa revelada pelo Ibope é inegável não relacionar ao

conceito de hipermodernidade, haja vista que existem grandes indícios de que, de

fato, vive-se em uma nova sociedade moderna, onde tudo é fluído e a solidez da

certeza só nos afasta, cada vez mais, de um horizonte repleto de novas constatações.

Tais constatações tangenciam os objetos específicos do que empreende essa

pesquisa, vistos na ótica de quatro grandes descobertas: compreensão dos principais

fatores culturais que alteram a percepção feminina, transformando-a de indivíduo a

20

Ibidem

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torcedora rubro-negra (ser social); definir alguns padrões de comportamento de

consumo sobre determinados aspectos sociais (mídia, objetos, eventos etc.) e;

decodificar os padrões de motivações de consumo, orientando-os por perfil de

torcedora; visão de grupo social - anseios e críticas, definições de objetos de consumo

e suas tendências (ideologia).

4.3 Procedimentos metodológicos

A carência de informações específicas a respeito do público em questão e seu

status de desconhecimento favoreceu a escolha pela pesquisa exploratória, que por

sua vez, se fez necessária quando se busca um entendimento sobre a natureza geral de

um problema, as possíveis hipóteses alternativas e as variáveis relevantes que

precisam ser consideradas (AAKER; KUMAR; DAY, 2004).

Como o objetivo proposto está ancorado na análise de um percentual da

população e não na sua generalidade, optou-se por um modelo de amostragem não

probabilística, que atendeu a essa lacuna. Em virtude das condições em que a pesquisa

foi aplicada, a amostragem por conveniência responde de maneira positiva as

necessidades prescritas, como Aaker, Kumar e Day (2004) apontam, se caracterizando

como uma opção a rápida e barata para obter informações.

Os trabalhos foram estruturados sobre um modelo de questionário, aplicado

por contato via web, com suporte da ferramenta de pesquisa SurveyMonkey21

e

contemplava 30 perguntas que envolviam aspectos relacionados a faixa etária, renda,

escolaridade e relação simbólica com o clube. Os dados coletados para análise e

criação dos perfis foram originados de fontes primárias, que correspondem a todas as

informações obtidas especialmente para determinada pesquisa. As fontes secundárias,

que se caracterizam por serem informações coletadas por pessoas ou agências para

21

Plataforma de questionários online, a SurveyMonkey Enterprise permite o pesquisador personalizar

sua ferramenta de coleta de dados, recendo desde feedback de clientes até sistematizando pesquisas de

produtos e comportamentos de consumo.

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outros propósitos que não a resolução do problema específico, foram responsáveis por

parte do embasamento da pesquisa e pelos dados de contextualização do objeto.

4.4 Análises descritivas dos resultados

As mulheres rubro-negras são jovens, possuem de 21 a 25 anos (26,7%) e 18 a

20 anos (20,9%), solteiras (70,1%), ganham de 01 a 03 salários mínimos (38,5%) e de

04 a 08 salários mínimos (20,3%), têm ensino superior incompleto (25,4%), ensino

médio (23,9%) e ensino superior (21%). Não possuem filhos (77,6%) e moram com

os pais e irmãos (65,3%); A influência familiar foi apontada com determinante na

escolha do time (53,9%). A história do clube apareceu com 18%; 67,2% não são

sócias. Quando sócias, pertencem às categorias Contribuinte e Patrimonial como

titular ou dependente. A dependência é superior à titularidade; A principal motivação

das sócias é comprar ingresso com desconto e utilizar as dependências do

clube/escolinhas (40,3%). 25,2% afirmam gostar do time e não se importam com os

jogos ou com as dependências/escolinhas; As não sócias alegam que o preço da

mensalidade é elevado (26,8%), fator que as mantém afastadas do clube. Além disso,

a falta de companhia para ir aos jogos foi apontada por 22%; Para obter informações

sobre o Sport, as mulheres recorrem primeiramente à internet (83,8%), seguida pela

TV (64%), jornal (40,1%) e rádio (32,1%); Em dias jogos, o rádio ganha a preferência

(39,1%). A TV permanece na segunda posição (22,5%), terceira o jornal (16,7%) e,

por último, a internet (9,4%); O site oficial e o Facebook são as fontes de notícias

mais acessadas pelas rubro-negras. Em seguida, aparecem os sites de notícias, Twitter

e blogs jornalísticos; 83,5% seguem o Sport no Facebook, enquanto 51,7% segue o

Sport no Twitter; As notícias em primeira mão/exclusivas e as notícias sobre o clube

são os principais interesses das torcedoras nas redes sociais; Em relação às compras,

50,7% afirmam comprar os produtos oficiais nas lojas do Sport (Embaixada da

Ilha/Espaço Sport); 49,3% costumam compra apenas um a dois produtos por ano.

Enquanto, 32,6% compram algum produto a cada três meses; A compra do produto

está relacionada ao consumo próprio (59,8%). Apenas 13,4% compram para dar de

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presente. O vestuário é o mais consumido (82,7%); No momento da compra,

contribuir com o Sport é um ponto levado em conta por 50,9%, contudo o produto

oficial é o que elas mais procuram (56,3%). Os novos modelos são motivadores de

compra para 28%; Em dias de jogos, a camisa do Sport (37,1%) e bandeira (52,1%)

são produtos indispensáveis. No dia a dia, elas preferem usar vestuário que remeta ao

Sport (26,1%) e acessórios (50,3%); 26,3% afirmaram assistir aos jogos na

arquibancada frontal e 24,2% nas sociais; Elas costumam frequentar os jogos com

amigos (31,8%), marido e/ou filhos (23,2%). Contudo, a presença em campo é muito

reduzida. 47,3% alegam assistir aos jogos em casa; As torcedoras costumam comprar

ingressos com antecedência no clube (40,4%). 28,2% compram ingressos em cima da

hora no clube. Apenas 6,4% compram pela internet A violência é o principal fator

inibidor da presença nos estádios (49,2%). O preço do ingresso segue com 35,6% e a

falta de conforto com 19,1%; A chegada na Ilha do Retiro com antecedência é bem-

vinda, pois elas gostam de aproveitar os momentos que antecedem as partidas -

encontro com amigos/música/bebida/etc. - (43,5%). 30,5% não se importam com os

rituais, gostam mesmo de assistir aos jogos; Os jogos são encarados como lazer

(48,2%) e elas acreditam que a cada jogo o Sport pode me surpreender tanto dentro

como fora de campo (39,3%).

ASPECTOS CONCLUSIVOS

Os resultados obtidos aguçam nosso olhar para uma perspectiva antropológica

concernente como complemento as ferramentas de marketing (objeto da pesquisa),

que auxiliam no desenvolvimento de percepção da cultura como um elemento

inerente a força do pensamento comunicacional e mais propícia ao que se desenvolve

no campo esportivo, dentro da agremiação.

O composto feminino como representação social coletiva deixa de maneira

muito evidente a cristalização de uma cultura de consumo diferente do gênero

masculino, especialmente porque adentra nesse contexto o fenômeno da estilização,

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que reporta o comportamento feminino em pertencimento às categorias de

contribuinte e patrimonial como titular ou dependente. A inserção nessas classes

confere distinção e prestígio e se configura como uma extensão das suas relações

sociais cotidianas, uma vez que se torna ponto de encontro e espaço afetivo de

interação.

Cabe ressaltar que os comportamentos das torcedoras definidos pela compra

regular de produtos para uso próprio demarcam o crescimento da cultura do consumo

para diversos produtos ligados a representação simbólica do clube, esses objetos

confirmam o efeito de estetização que qualifica determinadas atitudes na perspectiva

de serem percebidas ora como indivíduo (extra-evento), ora como grupo (no evento).

O curioso da pesquisa é que os produtos estão muito ligados ao uso cotidiano – extra-

jogo (no dia a dia) com nítida preferência para produtos ligados a vestuário e

acessórios, devendo incorporar elementos de estética.

No entanto, os dados obtidos com a pesquisa não nos deram margem para

julgar se a moda é uma variante do comportamento social feminino da torcedora do

esporte, para uma discussão mais precisa, seriam necessárias outras intervenções

metodológicas, de caráter etnográfico, para que se possa avançar, sobretudo, sobre

outros aspectos qualitativos dos quais o presente trabalho não deu conta avaliar,

mesmo sabendo que essa foi uma opção definida de forma consciente pelo

pesquisador.

Portanto, há de considerar que esta pesquisa é um estudo preliminar, de caráter

experimental, voltada para o gênero feminino, com extensão para a cultura do futebol,

que demarca um espaço privilegiado de manifestação cultural, favorecendo ainda; a

propagação de projeções simbólicas, onde as torcedoras parecem incorporar uma

modelo de conduta que supera o próprio hábito institucional das arenas esportivas,

dissipando o consumo dos produtos futebolísticos para além das fronteiras do futebol.

Page 14: Estudo do perfil das torcedoras - Comunicon

PPGCOM ESPM // SÃO PAULO // COMUNICON 2014 (8a10 de outubro 2014)

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