ESTUDO DE CASO: BIBLIOTECA CENTRAL / UFPB de caso... · passaram a ser reunidos em departamentos...
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ESTUDO DE CASO: BIBLIOTECA CENTRAL / UFPB
COSTA, CAROLINA. (1); FERREIRA, ANNA CRISTINA A. (2); VAN WOENSEL, FERNANDO C. (3);GOMES, RAISA FILGUEIRA S. (4); PEREIRA, LILIANE DA S.
(5); SILVA, MATHEUS MARANHÃO B. DA. (6)
CENTRO UNIVERSITÁRIO DE JOÃO PESSOA - UNIPE. Departamento de Arquitetura
BR 230, Km 22 - Água Fria. CEP 58053-000 João Pessoa-PB – Brasil Email institucional: [email protected]
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RESUMO
Como parte de uma pesquisa de maior abrangência que se propõe a registrar os edifícios das Bibliotecas dos Campi Universitários Federais, este artigo consiste no Estudo de Caso sobre o edifício da Biblioteca Central da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). O atual prédio que abriga a biblioteca consiste no segundo projeto destinado para esse fim – mas desde a sua construção que assumiu as atividades e as mantém até hoje. O projeto data de 1978, é de autoria de José Galbinski, arquiteto conhecido por outros projetos no campus da Universidade de Brasília (dentre eles, a também Biblioteca Central da UnB) e tem caráter indiscutivelmente brutalista. Devido às mudanças necessárias ao longo do tempo para atender aos requisitos de acessibilidade, para a manutenção das instalações prediais e para a adaptação dos ambientes ao acesso agora também informatizado, o prédio sofreu modificações. Estas reformas, entretanto, não provocaram a descaracterização do projeto, o que reforça seu valor arquitetônico e invoca a necessidade deste registro.
Palavras-chave: Universidade; Biblioteca; Brutalismo; Arquitetura Moderna.
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ISSN 1983-7518
O presente artigo faz parte de uma pesquisa ainda em fase inicial de desenvolvimento e que
se propõe a registrar os edifícios das Bibliotecas dos Campi Universitários Federais,
tomando-os como documentos importantes no conhecimento da arquitetura aplicada aos
edifícios educacionais no país. Os Campi Universitários tiveram papel relevante no
desenvolvimento das cidades, são referência de ensino onde se localizam e constituem
vetores das malhas urbanas nas quais foram implantados. Os edifícios das bibliotecas, por
sua vez, são parte inerente às instituições de ensino e, dentro do campus, a Biblioteca Central
possui localização estratégica e sua arquitetura termina por agregar papel de marco
referencial.
No Brasil, as universidades começaram a ser criadas a partir dos anos 1930. Até então, cada
curso (ou grupo de cursos) utilizava a estrutura de institutos e escolas existentes e espalhados
pelo tecido urbano das principais cidades. Essa configuração acadêmica sofreu uma
alteração fundamental a partir da década de 1960, especialmente com a reforma universitária
de 1967, quando as universidades receberam uma nova organização estrutural: os cursos
passaram a ser reunidos em departamentos que, por sua vez, se agrupavam em um modelo
espacial único – situado, em sua maioria, em locais afastados dos centros urbanos
estabelecidos.
Embora tenham ocorrido casos excepcionais de cursos que mantiveram as atividades de aula
nas instalações já utilizadas no tecido urbano e de localização consolidada, as atividades
administrativas e regimentares normalmente passaram a ser devidamente vinculadas a um
campus único, pois, o campus deveria constituir uma estrutura concentradora das funções
acadêmicas e de suas prerrogativas. Essa nova configuração espacial consolidou o novo
modelo de campus para as universidades brasileiras, que passou a ser adotado quase que
inteiramente em todos os estados da federação, favorecendo os interesses das estruturas
política e administrativa estabelecidas na época (PINTO e BUFFA, 2009). É importante lembrar
que, nesta época, o regime político ditatorial tinha como interesse primordial o controle por
sobre a população e, tanto a concentração das atividades de ensino superior num só local,
quanto a sua localização afastada dos grandes centros, proporcionava maior possibilidade de
investigação, monitoração e contenção de possíveis manifestações estudantis.
Uma forte característica dessa mudança das universidades consiste na reformulação do
caráter das atividades de educação superior: as universidades passam a tratar de maneira
indissociável as atividades de ensino, pesquisa e extensão. A valorização da pesquisa coloca
em maior evidência o papel das bibliotecas, inerente e indiscutivelmente essencial para a
instalação de centros de ensino de maior porte e pretensões mais ousadas; além disso, o
propósito agora pluridisciplinar reforça ainda mais a necessidade de bibliotecas centrais e
setoriais. Segundo MIRANDA (1998), o suporte financeiro para projeto e execução dos prédios
das bibliotecas (centrais e setoriais) das universidades federais nas décadas de 1970 e 1980
partiu de programas institucionais com financiamento de agências internacionais de
desenvolvimento, como o PREMESU (Programa de Expansão e Melhoramento das
Instalações do Ensino Superior) e o CEDATE (Centro de Desenvolvimento e Apoio Técnico à
Educação), com recursos advindos do Banco Mundial. Ainda de acordo com o autor, os
projetos para as bibliotecas contavam com equipes multidisciplinares – entretanto, como o
país ainda vivenciava um período de regime ditatorial, provavelmente não foi considerada a
participação discente ou da população. Juntamente com outras construções igualmente
significativas, como os edifícios administrativos e de vivência, o edifício da Biblioteca Central
compõe o núcleo central do campus.
O campus da Paraíba
Antes da implantação do Campus, as atividades da Universidade da Paraíba se
concentravam na capital João Pessoa. Fundada no final de 1955 através da reunião das
escolas de ensino superior já existentes no Estado, desde a sua criação já existia uma
orientação federal de adequação ao novo modelo de campus e se vislumbrava a criação
deste, a ser instalado de acordo com o Plano de Remodelação e Extensão da cidade de João
Pessoa elaborado por Nestor de Figueiredo em 1933.
Ainda na década de 1940 e durante a década de 1950, quando se cogitava a ideia de criação
da Universidade, houve várias indicações de localização para a instalação do campus – todas
atreladas aos limites previstos para urbanização e crescimento da cidade. Finalmente, em
1956 destacou-se o potencial da antiga fazenda São Rafael que, embora extrapolasse a área
urbana prevista, possuía condicionantes favoráveis: terreno de propriedade estadual ainda
desabitado, com dimensões amplas, topografia relativamente plana, um extenso bosque, e
localização que se situava entre dois pontos de avanço (a orla marítima a Leste e a zona Sul
do município), o que favorecia a criação de um novo vetor de expansão na direção sudeste da
cidade, que passou a ser objeto de intervenções posteriores. Em 1963, a construção do anel
rodoviário (conhecido como trevo da UFPB, que realiza a comunicação de uma artéria viária,
uma rodovia federal e o campus) e a implantação do Distrito Industrial vieram a corroborar
com a implantação do campus naquela parte da cidade (Pereira, 2008, p.137).
Ainda segundo Pereira, a doação do terreno inicial de 115,48 hectares ocorreu em 1958.
Apesar disso, apenas em dezembro de 1960 – com a criação de universidades federais e a
federalização de universidades estaduais e particulares – é que o campus da Universidade
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Federal da Paraíba (UFPB) foi criado. A construção ficou a cargo da equipe do Serviço de
Engenharia da Universidade, composta pelo diretor, engenheiro Guilherme da Cunha
Pedrosa, e pelos arquitetos Mário Di Láscio, Leonardo Stuckert e, posteriormente, Pedro
Dieb. Apenas no final de 1965 seria iniciada a concretização do campus, com a edificação da
Escola de Engenharia, projeto de Leonardo Stuckert, de 1963, que passou a funcionar em
1967. Em 1965, foram construídos o Instituto de Matemática, o Instituto de Física e o
Laboratório de Produtos Farmacêuticos, todos de autoria do escritório ETAU Arquitetos além
do Instituto de Química – de autoria de David Scott Ellinwood, arquiteto radicado nos Estados
Unidos – e, em 1966, o Hospital das Clínicas e o Instituto de Biologia, de autoria não
informada.
Essas primeiras edificações deram início ao processo de implantação do plano diretor do
Campus I da UFPB, que continha ainda todo o plano de acessibilidade, tanto interna, de
ligação entre as edificações, quanto externa, com a locação de seus acessos. Além de suas
instalações e acessos, o campus abriga em seu interior uma densa massa vegetal, resquício
da Mata Atlântica nativa da região, e toda a sua configuração espacial permeia essa
vegetação, que confere um clima ameno, áreas sombreadas e beleza natural ao conjunto dos
blocos.
A área do Campus I da UFPB na porção sudeste da cidade originou o bairro denominado
“Cidade universitária”, delimitado por dois bairros residenciais: o Castelo Branco a Leste,
fundado no final da década de 1960, e o Bairro dos Bancários ao Sul, fundado na década de
1980. Ambos surgem após a implantação do campus, demonstrando que a universidade vem
a cumprir sua função de elemento de expansão urbana. A consolidação como espaço
destinado ao ensino superior e pesquisa, e ao mesmo tempo como polarizador do
crescimento da cidade havia se iniciado, porém, fazia-se necessário ainda na primeira etapa
de construção do campus, uma biblioteca. Assim, no ano de 1968 foi realizado um concurso
para elaboração do projeto da Biblioteca Central do campus da Paraíba.
Primeira proposta para a biblioteca
Para a realização do novo edifício da biblioteca, foi instituído um concurso, do qual
participaram os arquitetos Leonardo Stuckert, Waldecy Pìnto e Carlos Alberto Correia Lima,
tendo como vencedor o projeto de autoria do carioca radicado em Pernambuco Acácio Gil
Borsói. Entretanto, ainda durante seu desenvolvimento, uma mudança na organização
espacial do campus fez com que o projeto sofresse alterações para adaptar-se ao
funcionamento da Reitoria, uso que permanece até os dias atuais.
O edifício onde até então funcionava a Reitoria da Universidade era um projeto de Leonardo
Stuckert elaborado em 1963, de cunho modernista e funcionalista, seguindo uma linha de
prismas regulares, planta livre com estrutura de concreto armado e modulação – mas estava
localizado no centro da capital, em frente ao Parque Solon de Lucena, bastante afastado das
demais instalações do campus e se encontrava em fase de conclusão quando se iniciava a
consolidação das obras do campus do outro lado da cidade no final do ano de 1965. De
acordo com Pereira (2008), ainda no final da década de 1960, estabeleceu-se que não apenas
as atividades de ensino e pesquisa deveriam funcionar dentro do território do campus, mas
também as funções administrativas.
A área ganha então um planejamento que envolve o registro e o plano de expansão das
construções e vias internas já existentes, juntamente com a instalação de funções que ainda
não haviam sido contempladas, como a criação de novos centros de ensino, de alojamentos
para os estudantes e também do Hospital Universitário, que anteriormente nem estava
previsto. Para tanto, a área do campus foi ampliada em 1967 com a doação de um terreno
adjacente à porção Oeste de 46,27 hectares, totalizando os atuais 161,75 hectares que
ocupa. Dessa forma, configurou-se uma situação transitória em que o projeto de Borsói foi
então adaptado à função de Reitoria, tendo que abrigar também outras funções temporárias –
inclusive a de Biblioteca –, como foi possível verificar nas plantas que fazem parte do acervo
da Divisão de Estudos e Projetos, da Prefeitura Universitária da UFPB (consulta feita em
2013). Essa coexistência de usos permaneceu por, no mínimo, dez anos.
A nova proposta para a Biblioteca Central
A partir do levantamento documental e análise das plantas pertencentes ao acervo da
Prefeitura Universitária da UFPB, foi possível determinar informações sobre a edificação,
como a cronologia de intervenções que sofreu ao longo de sua existência. As pranchas mais
antigas que tratam de um novo projeto para a Biblioteca Central da UFPB datam do ano de
1978, de autoria do arquiteto José Galbinski, gerado a partir de um convênio entre a UFPB e a
Universidade de Brasília (UnB), com colaboração local do arquiteto Armando Carvalho.
Galbinski é professor da UnB e um dos fundadores da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
(FAU) em Brasília. Anos antes da realização do projeto para a Biblioteca Central da UFPB, ele
participou da equipe de arquitetos que concebeu o edifício que abriga a Biblioteca Central da
UnB e o Restaurante Universitário na mesma instituição. A estrutura física do campus da UnB
começou a ser projetada pelo Centro de Planejamento Oscar Niemeyer (CEPLAN), porém na
década de 1970 ocorreu uma mudança no estilo arquitetônico dos prédios, principalmente
pela exploração do concreto armado, tomando-o como partido e expondo-o de forma
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expressiva e marcante, caracterizando o chamado estilo brutalista. O edifício da Biblioteca
Central da UnB inaugurou, juntamente com o do Restaurante Universitário (1974) e da
Reitoria (1975), esse novo panorama. A Biblioteca Central da UnB teve sua construção
iniciada aos 22 de setembro de 1970, sendo concluída em 1972 e inaugurada no ano seguinte
(Baldoni, s/d).
O projeto de Galbinski para o edifício da biblioteca da UFPB segue as mesmas diretrizes que
se verifica na da UnB e estava em sintonia com o que estava sendo produzido nos outros
centros do país, incorporando as prerrogativas brutalistas.
A Inspiração Brutalista
O brutalismo surge no campo arquitetônico em meados da década de 1950, com caráter
inovador, como alternativa à escola carioca e expressão amadurecida de uma primeira fase
de produção paulista. No início da década de 1960 há o reconhecimento do brutalismo
enquanto tendência por parte de certos autores e da maioria dos críticos, vivenciando uma
grande expansão nas décadas de 1960/1970, a ponto da proposta adquirir status de
vernacular moderno. No cenário político logo após a Segunda Guerra, a questão da
identidade nacional se deposita como tema de grande importância no contexto intelectual das
esquerdas.
Passado o momento de conceituação do processo de origem da escola brutalista de
arquitetura, partiu-se para a caracterização desta. Primeiramente enquanto partido podemos
destacar: a preferência pela solução monolítica ou em volume único abarcando as demais
atividades e funções do programa acatado; na existência de mais de um volume, ou corpo, há
uma nítida hierarquia entre o bloco principal e os demais, visivelmente subsidiários e anexos
ao primeiro – é importante lembrar que, independente do número de blocos, a volumetria se
apresenta essencialmente horizontalizada.
A relação com o entorno é evidenciada por contraste visual, concretizando a conexão com o
lugar essencialmente por meio da franqueza dos acessos. Quanto ao arranjo, revela a
preferência pela solução em caixa portante – ou seja: a adoção de uma planta genérica ou
livre, abrigada pela solução de teto homogêneo em grelha (uni ou bidirecional), comumente
sobreposto de maneira independente das estruturas inferiores. Há o emprego constante de
vazios verticalizados internamente, muitas vezes associados a jogos de níveis e meios-níveis,
em geral posicionados de maneira a valorizar visuais e trajetos cobertos voltados para as
áreas internas comuns.
Os ambientes são frequentemente organizados de maneira flexível, interconectada e não
compartimentada. Os elementos de circulação tem papel determinante: quando consistem em
circulação interna, determinam zoneamento e usos – e quando são externos, se realizam por
volumetria de destaque. A racionalização da distribuição espacial se desenvolve de modo a
concentrar as funções de serviço (horizontal e verticalmente), em núcleos compactos que
muitas vezes determinam a distribuição e o zoneamento funcional dos demais setores e
ambientes.
Quanto ao sistema construtivo, há o emprego quase exclusivo de estruturas de concreto
armado, muitas vezes protendido, fazendo o uso de lajes nervuradas, pórticos rígidos ou
articulados, pilares com desenho trabalhado analogamente às forças estáticas suportadas,
resultando em vãos livres e balanços amplos. Há o emprego frequente de fechamentos em
concreto armado fundido in loco, eventualmente aproveitado também em divisórias e paredes
internas; o emprego de estruturas em concreto realizadas in loco, embora comumente o
projeto preveja a probabilidade de sua pré-fabricação; e o emprego pouco comum, mas
habitual, de fechamentos em alvenaria de tijolos e/ou de blocos de concreto deixados
aparentes, em alguns casos, prescindindo da estrutura em concreto. Quando existem, os
volumes adjuntos são geralmente realizados em estrutura independente, exceto quando
internos ou abrigados sob o corpo principal.
Em relação à configuração plástica, o brutalismo explora a relação entre cheios e vazios
atribuindo predominância ao maciço, com raras aberturas, ou com aberturas resguardadas
por balanços de extensões das lajes, inclusive de cobertura, com ou sem o auxílio de panos
verticais pendentes. As cobertas, inclusive, são consideradas uma quinta fachada: é
recorrente a opção pela iluminação natural zenital complementar ou exclusiva, com a inclusão
de elementos complementares de caráter funcional e decorativo, como sheds, vigas-calha e
canhões de luz, todos realizados em concreto aparente. As aberturas de iluminação natural
laterais são quase sempre sombreadas por brises ou outros dispositivos (como as projeções
geralmente advindas da caixa portante e/ou de generosos balanços), compostos de maneira
ritmada. Com a predominância da cor natural do concreto, a iluminação natural resultante é
fraca e difusa nas bordas, em contraste paradoxal com os espaços centrais muitas vezes
iluminados naturalmente e com abundância graças às aberturas zenitais.
Como próprio do brutalismo, as cores presentes na edificação consistem nas cores próprias
dos materiais – bem como ocorre com as texturas, resultado do tratamento dado à superfície
do material, geralmente in natura. A adoção de qualquer pintura ou revestimento decorre da
necessidade funcional ou de preservação do material a agentes agressivos à sua integridade
e ocorre somente de forma pontual e discreta, aplicada diretamente sobre os materiais.
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Quanto aos aspectos simbólico-conceituais da obra brutalista, ressalta-se a ênfase na
austeridade e homogeneidade das soluções arquitetônicas: a austeridade que resulta do
próprio partido que enfatiza os sistemas construtivos da obra, na sua forma didática e na
clareza da solução estrutural; e a homogeneidade resultante da utilização de uma gama
limitada de materiais. Há também a intenção de que cada edifício seja percebido como
protótipo potencial (ou ao menos como uma solução que se presta a se tornar exemplar e, no
limite, repetível). Com isso, ressalta-se o caráter experimental de cada atividade arquitetônica,
tanto nas soluções técnico-construtivas quanto em relação ao programa de necessidades.
É importante destacar que qualquer um desses itens pode comparecer enquanto
características significativas de toda e qualquer arquitetura. Não são os itens e categorias
tomadas em si mesmas de forma separada que chegam a configurar a Arquitetura Brutalista,
e sim sua apresentação maciça, coordenada e coerente em um conjunto de obras num
determinado intervalo espaço-temporal.
A linguagem do arquiteto
Observando imagens dos projetos das bibliotecas da UFPB e da UnB, é possível identificar
semelhanças inegáveis, possivelmente provenientes da técnica e experiência do autor. Além
da referência imediata ao brutalismo através da utilização do concreto aparente e a
exploração de seus elementos estruturais como partido, ambos os edifícios apresentam os
materiais expostos com pouco ou nenhum revestimento, uma estrutura externa que sustenta
a coberta com a forte presença de elementos verticais que se contrapõem ao elemento
monolítico horizontal do edifício principal e se complementam com os brises verticais
determinando a composição das fachadas.
Imagem 01: Biblioteca Central da UFPB (A) e Biblioteca Central da UnB (B)
Fontes: Acervo próprio, tirada em 27/09/2013 (A) e http://en.academic.ru (B)
O esmero construtivo não foge do que a literatura identifica como associação à Escola
Brutalista, carregando influências típicas da arquitetura brasileira provenientes da escola
paulista e relação com a experiência de Brasília. Ao analisarmos o projeto do ponto de vista
plástico, internamente o que se sobressai é a pauta, a noção de espaço aberto, com áreas
distintas delimitadas pelo próprio mobiliário, salvo ambientes cujas atividades precisam ser
resguardadas. A configuração aberta de seu pavimento superior, um mezanino, gera um
salão de entrada com pé direito duplo e uma sensação de amplitude e monumentalidade. O
ritmo de suas esquadrias contribui, junto com sua localização isolada de outras edificações,
para o aproveitamento da iluminação e ventilação natural, fazendo com que, até os dias
atuais, jamais tenha havido a necessidade de climatização mecânica em suas áreas de
acervo.
Muito embora o edifício da biblioteca em si não represente um conjunto arrojado no que diz
respeito às tecnologias da época, ele se apresenta como uma estrutura pensada para
consolidar a grandiosidade da edificação, que se destaca como marco visual entre as
edificações da universidade. Essa importância é percebida quando comparada com as
demais edificações realizadas até então no campus universitário, que apesar dos
investimentos da época, transmitiam uma sensação de economia no programa em geral; os
blocos eram constituídos de edificações de pavimento térreo, isolados entre si, visando
minimizar os custos de construção com a eliminação de escadas e elevadores, por exemplo, e
a utilização de pouca área envidraçada em detrimento de elementos vazados, instalações
aparentes e revestimentos sem pintura.
Em ambas as bibliotecas encontramos um projeto com estrutura de concreto armado,
esquadrias de vidros e brises de cimento amianto detalhadamente projetados. No caso da
Biblioteca Central da UFPB, são utilizados pilares externos com sessão em cruz que apoiam a
coberta, grandes e elaborados beirais e pilares internos com sessão quadrada organizados
em uma estrutura que apresenta planta livre em grande parte de seu interior e abriga o acervo
em três pavimentos, permitindo uma flexibilidade no arranjo interno. Assim como na Biblioteca
da UnB, as vigas em concreto armado ficam à mostra e os brise-soleils apresentam extensões
diversas e distâncias variantes e ritmadas entre si que, em contraste com as esquadrias de
vidros escuros, formam um jogo de “cheios e vazios”. A coberta possui aberturas que deixam
entrever a luz ao mesmo tempo abrigando de intempéries, transmitindo uma paradoxal leveza
à pesada estrutura.
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Imagem 02: Detalhes do edifício da Biblioteca Central
Fonte: Acervo próprio, tiradas em 27/09/2013
Trajetória do Projeto
De acordo com as plantas pesquisadas no acervo da Prefeitura Universitária da UFPB, já na
época da implantação do edifício, em 1980, algumas adaptações tiveram de ser efetivadas,
pois no projeto original de 1978 não constava uma planta de locação da edificação; o edifício
se apresentava isolado, sem referências ao terreno, e o conjunto de pranchas continha as
plantas dos pavimentos, planta de coberta, cortes, fachadas e especificações de
detalhamento. As pranchas relativas ao projeto dos acessos encontradas haviam sido
elaboradas pela equipe local da própria Prefeitura Universitária, segundo identificação
constante nas legendas, e dentre os detalhamentos constavam a execução dos pisos em
lajotas de concreto pré-moldadas, que fariam as ligações da biblioteca com as edificações do
entorno imediato (Centro de vivência, Reitoria, Restaurante universitário, Capela
Universitária) através de patamares e rampas unindo os estacionamentos a Leste e Oeste, e o
miniparque do pau-brasil – área verde existente em frente à fachada Norte da Biblioteca. Essa
implantação segue as diretrizes do estudo da Consultec, de 1966 e Alcyr Meira em 1971 que
determinavam a horizontalidade e um zoneamento funcional do campus, voltados para o
baixo custo das construções e que iam de encontro com a verticalização das edificações no
sentido de preservar maiores quantidades de áreas verdes que se verificou na construção dos
campi de outras universidades brasileiras já a partir dos anos 1950.
Imagem 03: Campus atual da Universidade Federal da Paraíba, com o edifício da Biblioteca Central em
destaque (vermelho) ao centro, e acessos ao edifício projetados pela equipe local.
Fontes: Google Earth e acervo próprio, tiradas em 27/09/2013
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No ano de 1997 ocorreu a primeira adequação do prédio às necessidades de portadores de
necessidades especiais (PNE), com a implantação de rampas nos acessos aos
estacionamentos laterais e uma no acesso principal ao pavimento térreo da edificação, todas
na parte externa de acesso ao edifício. Desde o início, o projeto da edificação já previa
elevadores e não contava com desníveis em seus percursos internos, o que facilitou a
implantação da proposta, minimizando os custos com essas adequações, já que as
adaptações resumiram-se aos acessos externos (com a instalação de rampas) e aos ajustes
necessários nos banheiros. Curiosamente, o arquiteto Galbinski teria recebido elogios após
um congresso de portadores de necessidades especiais no final dos anos 1970 por ter
projetado o único edifício acessível do campus do Distrito Federal (o restaurante dos
estudantes da UnB, em Brasília, feito em parceria com Antônio Carlos Moraes de Castro),
mas confessou que nunca haviam pensado especificamente nessas questões na época da
elaboração do projeto (Arcoweb, 2010).
Ainda de acordo com os registros da Prefeitura Universitária, uma planta datada de 1998 foi
encontrada, porém consistia em uma obra de reparo e adequação da infraestrutura,
relacionada à digitalização da comunicação, com a instalação de redes de telefonia, fax e
cabeamento de dados, além de adaptações de espaços para o uso informatizado (com a
inclusão de mobiliário e o fechamento de alguns ambientes para o uso do ar-condicionado),
mas que não interferiram na estrutura ou acarretaram alterações substanciais na configuração
espacial da edificação.
Em 2012, a construção da rota de acessibilidade ligando o Hospital Universitário ao
Restaurante Universitário promoveu a mais recente modificação no entorno da edificação da
Biblioteca Central, que se encontra no entorno do caminho entre as duas outras citadas;
entretanto, na área adjacente a esta, tratou-se simplesmente da implantação de sinalização
tátil no piso para deficientes visuais, visto que outras alterações não se fizeram necessárias.
Algumas outras pequenas alterações que foram percebidas no levantamento de campo se
deram em decorrência da manutenção e melhoramento da edificação, mas de fato foram
obras pontuais que não agridem a percepção geral e a integridade da obra, a exemplo da
climatização de alguns ambientes, ocasionando a instalação de maquinário entre a edificação
e os brises verticais externos, sobretudo na fachada Sul; o fechamento dos espaços entre os
brises com uma grade metálica para evitar a entrada de animais de pequeno porte e as
tentativas de furto do acervo; a substituição dos vidros transparentes e escurecidos por
material opaco em algumas esquadrias das fachadas Leste e Oeste a fim de evitar a insolação
direta, além de alguns pequenos reparos na estrutura de concreto e modificações de layout
interno para adequação aos novos usos e necessidades surgidas com o crescimento e
diversificação das atividades do campus.
Considerações Finais
O projeto da Biblioteca Central, ao longo de suas mais de três décadas de existência, revela o
desempenho que as soluções e materiais utilizados em sua construção alcançaram. A
biblioteca consegue funcionar sem a utilização de climatização em sua área de acervo,
recepção e leitura. As poucas áreas climatizadas consistem em salas de leitura menores e
isoladas, e áreas de acesso mais restrito da edificação, como algumas áreas administrativas e
específicas, como a sala de acesso ao portal de periódicos da Capes. Os painéis das
fachadas permitem o aproveitamento da ventilação natural, mas com a necessidade de auxílio
mecânico nas áreas mais internas; o mesmo acontece com a iluminação, que é filtrada pelos
painéis externos e chega a boa parte da edificação – embora devido à especificidade do uso,
seja necessária a utilização de iluminação artificial durante todo o dia. O isolamento acústico
também é garantida pelos materiais utilizados e pela localização, bastante recuada em
relação à via de tráfego existente e bem próxima a massas vegetais. Um dos grandes
problemas enfrentados é a umidade relativa do ar, por estar inserida numa região de clima
desfavorável para essa variável. A mencionada proximidade a uma grande massa vegetal em
toda a extensão de sua fachada Sul, por um lado, ameniza a incidência solar, mas por outro,
favorece a incidência de cupim nas madeiras, o aparecimento de mofo e fungos e a
consequente deterioração dos documentos.
O edifício da Biblioteca Central não se diferencia apenas dos demais edifícios do campus,
mas também se distingue da produção arquitetônica da cidade – consistindo num exemplar de
características particulares à vista da população local. Percebe-se que mesmo passando por
reformas e adaptações ao longo do tempo para a continuidade de suas funções originais de
maneira adequada, o edifício conseguiu manter suas características principais, o que reforça
sua consideração como um documento importante da história da arquitetura moderna na
Paraíba. Além disso, apesar de ser notória a importância da edificação, que se encaixa em um
importante momento da história arquitetônica mundial recente da qual o Brasil é parte
integrante e atuante, não foram encontrados estudos mais aprofundados que abordassem o
edifício ou mesmo trabalhos de resgate de sua história, sendo toda sua memória resignada
aos arquivos da própria Universidade.
Este artigo, especificamente, tem como foco o registro histórico da importância do edifício da
Biblioteca Central como elemento para o conhecimento e compreensão da produção da
arquitetura moderna na cidade, e do entendimento de suas características peculiares. O
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estudo de caso ainda se encontra em andamento e a contemplação de outros aspectos do
edifício está prevista, para uma compreensão mais aprofundada e completa das decisões
projetuais que o determinam.
Referências
ARCOWEB. Brasília 50 anos. Série especial. Disponível em: <http://www.arcoweb.com.br/especiais/brasilia-50-anos-parte-2-de-5-serie-especial-30-06-2010.html> Acessado em: 06 Out. 2013.
AUGUSTINHO, Valci. Aclimatação ambiental dos prédios de bibliotecas centrais universitárias; especificações de construção seguidas após a Reforma. Brasília: UnB, 1987.
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