Estudantes protestam para exigir ação contra a violência

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12 | Vilas Magazine - Novembro 2011 CIDADE C erca de 700 estudantes interrom- peram o tráfego na Estrada do Coco em outubro para protestar contra a violência em Portão e apresentar uma lista de reivindicações à Câmara Municipal de Lauro de Freitas. O bairro sofre com a ação do tráfico de drogas, apontado como responsável pelos assassinatos registrados no mês passado. Os adolescentes eram quase todos alunos da Escola Estadual Kléber Pacheco de Oliveira. Também partici- param estudantes da Escola Municipal Pedro Paranhos. Bloqueando todas as pistas, a “cami- nhada da paz” percorreu cerca de quatro quilômetros pela Estrada do Coco e pela rua Santo Antônio até a Praça João Expresso. Os jovens pediam o fim da insegurança no bairro e cobravam ação da Câmara Municipal: “vereadores, cadê você, a voz do povo quer te ver” (sic). Ne- nhuma autoridade ou personagem político acompanhou o protesto. De acordo com o professor de história Tássio Revelat, um dos organizadores da caminhada, a escolha do Legislativo como alvo do protesto deve-se a que “são eles que devem fiscalizar”. Numa “situação- problema” proposta em sala de aula, os estudantes discutiram “o que a Câmara de Vereadores precisa fazer para melhorar a qualidade de vida dos moradores de Portão”. A lista de soluções, que será apre- sentada este mês aos vereadores, inclui o combate ao consumo de drogas, pro- gramas de reabilitação para dependentes químicos, policiamento do bairro “com po- liciais solidários, éticos e bem treinados” e o contato “mais direto dos vereadores com os moradores de Portão”. Os estudantes pedem também a “elaboração e fiscalização” de projetos de natureza sócio-educativa, com o resgate e valorização da história e da cultura de Lauro de Freitas. O próprio Tássio Revelat comanda uma dessas iniciativas com o grupo “Amantes do Conhecimento”. Sem patrocínio, ele cobra apoio da prefeitura. A lista de reivindicações inclui capacitação de jovens para o primeiro emprego, cria- ção de escolas “com estrutura adequada e professores bem preparados”, mais con- cursos públicos, a entrega do longamente aguardado terminal de ônibus de Portão e, por fim, “uma micareta mais segura e estruturada”. A festa, tradicional no bairro, é alvo de críticas dos moradores. CULTURA DE PAZ O objetivo da ação, sublinha o profes- sor, “é exigir dos nossos representantes mais projetos para a comunidade e uma maior fiscalização daqueles que já foram aprovados”. Para o presidente da Câmara Municipal de Lauro de Freitas Antônio Rosalvo (PSDB), esses projetos devem estar incluídos numa ação de mais larga escala, “que lhes confira a legitimidade e peso social indispensáveis para se alcan- çar resultados”. Em resposta às reivindicações e citando especificamente a manifestação da Kléber Pacheco, Antônio Rosalvo apresentou no mês passado projeto de lei para criar um “Conselho Parlamentar da Cultura de Paz” (Conpaz) no município. A iniciativa, de acordo com o vereador, segue uma proposta da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Estudantes protestam para

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Reportagem da Vilas Magazine de novembro/2011 sobre protesto de estudantes de Portão contra a violência

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12 | Vilas Magazine - Novembro 2011

CIDADE

Cerca de 700 estudantes interrom-peram o tráfego na Estrada do Coco em outubro para protestar contra a violência em Portão e

apresentar uma lista de reivindicações à Câmara Municipal de Lauro de Freitas. O bairro sofre com a ação do tráfico de drogas, apontado como responsável pelos assassinatos registrados no mês passado. Os adolescentes eram quase todos alunos da Escola Estadual Kléber Pacheco de Oliveira. Também partici-param estudantes da Escola Municipal Pedro Paranhos.

Bloqueando todas as pistas, a “cami-nhada da paz” percorreu cerca de quatro quilômetros pela Estrada do Coco e pela rua Santo Antônio até a Praça João Expresso. Os jovens pediam o fim da insegurança no bairro e cobravam ação da Câmara Municipal: “vereadores, cadê você, a voz do povo quer te ver” (sic). Ne-nhuma autoridade ou personagem político acompanhou o protesto.

De acordo com o professor de história Tássio Revelat, um dos organizadores da caminhada, a escolha do Legislativo como

alvo do protesto deve-se a que “são eles que devem fiscalizar”. Numa “situação-problema” proposta em sala de aula, os estudantes discutiram “o que a Câmara de Vereadores precisa fazer para melhorar a qualidade de vida dos moradores de Portão”.

A lista de soluções, que será apre-sentada este mês aos vereadores, inclui o combate ao consumo de drogas, pro-gramas de reabilitação para dependentes químicos, policiamento do bairro “com po-liciais solidários, éticos e bem treinados” e o contato “mais direto dos vereadores com os moradores de Portão”.

Os estudantes pedem também a “elaboração e fiscalização” de projetos de natureza sócio-educativa, com o resgate e valorização da história e da cultura de Lauro de Freitas. O próprio Tássio Revelat comanda uma dessas iniciativas com o grupo “Amantes do Conhecimento”. Sem patrocínio, ele cobra apoio da prefeitura. A lista de reivindicações inclui capacitação de jovens para o primeiro emprego, cria-ção de escolas “com estrutura adequada e professores bem preparados”, mais con-

cursos públicos, a entrega do longamente aguardado terminal de ônibus de Portão e, por fim, “uma micareta mais segura e estruturada”. A festa, tradicional no bairro, é alvo de críticas dos moradores.

CULTURA DE PAzO objetivo da ação, sublinha o profes-

sor, “é exigir dos nossos representantes mais projetos para a comunidade e uma maior fiscalização daqueles que já foram aprovados”. Para o presidente da Câmara Municipal de Lauro de Freitas Antônio Rosalvo (PSDB), esses projetos devem estar incluídos numa ação de mais larga escala, “que lhes confira a legitimidade e peso social indispensáveis para se alcan-çar resultados”.

Em resposta às reivindicações e citando especificamente a manifestação da Kléber Pacheco, Antônio Rosalvo apresentou no mês passado projeto de lei para criar um “Conselho Parlamentar da Cultura de Paz” (Conpaz) no município. A iniciativa, de acordo com o vereador, segue uma proposta da Organização das Nações Unidas para a Educação, a

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exigir ação contra a violência

estudantes pedem paz eprotestam em caminhada

pela estrada do Coco

Ciência e a Cultura (Unesco) que propôs um programa de ação para criar uma cultura de paz, em oposição à cultura de violência que “leva um adolescente a exibir uma arma de fogo na escola como símbolo de valor e de afirmação pessoal”. Outros cinco municípios do país já criaram conselhos de Cultura de Paz.

O Conpaz de Lauro de Freitas seria formado por 36 representantes de vá-rios segmentos da sociedade, incluindo associações de moradores e diversas entidades da sociedade civil organizada. Para a Unesco, uma Cultura de Paz é um

conjunto de valores, atitudes, tradições, comportamentos e estilos de vida basea-dos, entre outros preceitos, no respeito à vida, no fim da violência e na promoção e prática da não-violência por meio da educação, do diálogo e da cooperação.

O conceito de cultura da paz foi abor-dado em agosto durante palestra proferida em Itinga pela antropóloga Haydée Caru-so, pesquisadora da Universidade de Bra-sília (UnB) com trabalhados publicados na área de sociologia da segurança. Caruso veio a Lauro de Freitas a convite da equi-pe do Programa das Nações Unidas para

o Desenvolvimento (PNUD) que implanta na cidade o programa “segurança com ci-dadania”, iniciativa experimental conjunta de seis agências da ONU.

Caruso destacou o aspecto cultural do comportamento que leva à violência e contou a história de um garoto que fez falsa denuncia de si mesmo à polícia ape-nas para que uma viatura o procurasse no bairro. Naquele grupo social, explicou Caruso, ser bandido é um valor. “Isso é um comportamento aprendido”, disse. Da mesma forma, “a cultura da paz pode ser aprendida”.

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