ESTIMATIVA DA VAZÃO ECOLÓGICA NO TRECHO DE VAZÃO REDUZIDA DO APROVEITAMENTO HIDRELÉTRICO DE BELO...
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ABES – Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 1
IV-043 – ESTIMATIVA DA VAZÃO ECOLÓGICA NO TRECHO DE VAZÃO
REDUZIDA DO APROVEITAMENTO HIDRELÉTRICO DE BELO MONTE
Gabriel Cury Martins de Oliveira(1)
Engenheiro Ambiental graduado em Engenharia de Recursos Hídricos e do Meio Ambiente na Universidade
Federal Fluminense.
Mônica de Aquino Galeano Massera da Hora
D.Sc. Professora Adjunta – Universidade Federal Fluminense
Endereço(1)
: Av. Lucilis Nunes Monteiro, 72 casa 01 – Lagoa – Macaé – RJ – CEP: 27.925-000 – Brasil –
Tel: +55 (21) 8204-4347 – e-mail: [email protected]
RESUMO
A geração de energia de origem hidráulica é a principal fonte de energia elétrica brasileira, sendo de enorme
importância tanto para o desenvolvimento do país, quanto para a própria economia brasileira.
Sendo um grande projeto deste tipo, desde a década de 1970, o aproveitamento hidrelétrico de Belo Monte tem
sido elaborado e reformulado, pois envolve questões delicadas de preservação ambiental, terras indígenas e a
legislação brasileira, que levam à insatisfação de diferentes segmentos da sociedade. Estes, ao longo de todos
estes anos, vêm tentando impedir a sua realização, baseando-se nos grandes impactos que o empreendimento
poderá causar.
Este trabalho tem por objetivo calcular, através de diferentes metodologias, as vazões ecológicas do trecho de
vazão reduzida da usina, para análise da condição do estirão a partir da instalação do empreendimento.
PALAVRAS-CHAVE: Gestão de Recursos Hídricos, Aproveitamento Hidrelétrico, Trecho de Vazão
Reduzida,Vazão Ecológica.
INTRODUÇÃO
A bacia do rio Xingu está inserida na Região Hidrográfica I do território brasileiro, a região Amazônica,
situada na Região Norte do Brasil, que detém aproximadamente 40% do potencial hidrelétrico do país.
O rio Xingu é formado no estado do Mato Grosso pela união dos rios Culuene e Sete de Setembro,
percorrendo o sentido sul-norte, atravessando o estado do Pará até, aproximadamente 1900 km depois,
desaguar no rio Amazonas.
A bacia é dividida de acordo com os trechos alto, médio e baixo do rio Xingu. O aproveitamento hidrelétrico
de Belo Monte será instalado no município de Altamira, no estado do Pará, no trecho conhecido como Volta
Grande, onde há um declive de 85 metros ao longo de 160 km. É nesta volta que se pretende construir o
barramento para derivação, através de dois canais, de parte das águas do rio.
A usina do AHE Belo Monte operará a fio d’água, não havendo reservatório de acumulação, característica de
projetos que determina a necessidade da outorga de uso da água. Entretanto, a usina terá duas frentes de
geração, a casa de força principal e a secundária.
O trecho do rio Xingu que completa a volta entre a derivação e a casa de força principal, de comprimento
aproximado de 100 km, terá sua quantidade de água reduzida, sendo denominado Trecho de Vazão Reduzida
(TVR) conforme a Figura 1.
A casa de força principal (localizada no barramento do Sítio Belo Monte, coordenadas 03° 07’ 35” de Latitude
Sul e 51° 46’ 30” de Longitude Oeste), de potência instalada de 11 GW, operará através de derivações no rio
Xingu, para tanto, serão construídos dois canais através do alargamento dos igarapés Galhoso e di Maria, para
derivar a água aos diques, encurtando seu caminho até a cota mais baixa, ao final da Volta Grande. Ao final,
será alagada uma área equivalente a 130 km² no chamado Reservatório dos Canais.
No Reservatório do Xingu (localizado no barramento do Sítio Pimental, coordenadas 03° 26’ 15” de Latitude
Sul e 51° 56’ 50” de Longitude Oeste), que naturalmente possui 228 km², a área alagada aumentará para 386
km², somando 516 km² de áreas alagadas no total. Nele será instalada a casa de força complementar, de
potência instalada de 233 MW (0,233 GW).
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Figura 1: Esquematização demonstrativa da Volta Grande do rio Xingu
(Fonte: ELETROBRÁS, 2009)
METODOLOGIA
Os dados de vazão dos rios foram coletados no sistema HidroWeb da Agência Nacional de Águas. Os postos
são numerados de acordo com a Região Hidrográfica, bacia e Sub-bacia, de acordo com a ANA. Os postos
utilizados são numerados de 18408900 a 18960000, sendo o número 1 correspondente à bacia do rio
Amazonas, e o 8 subsequente aos rios Xingu, Iriri e Paru.
Foram encontrados 99 postos na Sub-bacia 18, e após avaliação dos dados de todos eles, com análise das
falhas, dos períodos de observação e da consistência dos dados, foram utilizados os dados de vazão de 11
postos neste trabalho.
Segundo ANA (apud HORA et al. (2011)), a vazão ecológica é aquela que “atende às exigências da biota
enfocada, seja mantendo as condições existentes antes da intervenção antrópica, seja para garantir condições
estabelecidas, que busquem mitigar os impactos dessa intervenção”. Pode ser também explicada como a vazão
mínima necessária à manutenção da vida aquática e dos ecossistemas marginais de um rio.
MÉTODO DE TENNANT
A estimativa da vazão ecológica em determinado ponto de um rio pode ser feita através de diversas
metodologias. Neste trabalho, serão utilizados os médodos de Tennant, da Curva de Permanência de Vazões,
da Área de Drenagem e da Vazão Residual.
Neste método, também chamado de Método de Montana (devido ao estado norte-americano de mesmo nome,
um dos locais onde a metodologia foi desenvolvida), a vazão ecológica é calculada a partir do valor da vazão
máxima de longo termo (QMLT) do local do aproveitamento. A vazão QMLT é calculada através da média
das medições – diárias, mensais ou anuais – de determinado posto, durante o período de observação analisado.
Neste trabalho foram utilizadas as vazões médias mensais.
O método consiste em calcular parcelas (%) da QMLT no período seco e chuvoso que resultam em vazões a
serem atribuídas à condição do rio analisado, conforme a Tabela 1.
Tabela 1: Vazões recomendadas pelo Método de Tennant
Condição do rio Vazão Recomendada (% da QMLT)
Período Seco Período Chuvoso
Excepcional 40 60
Excelente 30 50
Boa 20 40
Regular ou em degradação 10 30
Má ou mínima 10 10
(Fonte: TENNANT apud PAULO (2007))
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Neste trabalho, serão analisados três cenários, considerados como condição crítica, satisfatória e excelente.
Para tal, serão utilizados os valores de 10% da QMLT, valor abaixo do qual pode-se inferir uma situação
crítica para os organismos aquáticos, tanto no período seco quanto no chuvoso; 30% da QMLT, valor a partir
do qual pode-se inferir uma condição satisfatória de profudidade, largura e velocidade da água; e 60%,
situação considerada boa para a vida aquática.
MÉTODO DA ANÁLISE DA CURVA DE PERMANÊNCIA
Este método consiste em montar-se no Excel a série ordenada das vazões observadas. Ao ordená-las atribui-se
um número de ordem a cada uma delas, que dividido pelo total de amostras acrescido de um, retorna a
frequênca. A partir da frequência, calcula-se a porcentagem de ocorrência de cada uma das vazões registradas,
e anota-se o valor encontrado para a permanência desejada. No caso deste método, almeja-se a vazão de
referência Q95%.
MÉTODO DA ÁREA DE DRENAGEM
Este método utiliza-se da equação de regionalização para encontrar a vazão de referência desejada. A curva é
obtida a partir dos dados de vazão (Q) e da área de drenagem (A) do local amostrado. É construída a partir da
plotagem dos dados de todos os postos obtidos, as vazões de referência no eixo das abscissas e a área de
drenagem no eixo das ordenadas, para obtenção da fórmula (Equação 1) de caráter potencial
Q = a x Ab equação (1)
onde a e b são constantes.
Assim como no método da permanência das vazões, a vazão de referência utilizada é a Q95%.
MÉTODO DA VAZÃO RESIDUAL
De acordo com HORA et al. (2011), “o método é baseado no critério de outorga de diversos Estados.” Como
o estado do Pará, onde está situado o trecho do rio a ser instalado o AHE Belo Monte, não tem critério de
outorga, foi utilizado o valor praticado na Bahia, equivalente a 20% da vazão de referência Q90% para cada
usuário. Ou seja, a vazão ecológica é obtida da mesma forma do Método da Curva de Permanência, utilizando-
se 20% do valor da vazão com permanência de 90% no tempo.
RESULTADOS
Os valores de vazão ecológica encontrados pelo Método de Tennant são mostrados na Tabela 2, onde a QMLT
foi estimada pela série completa de vazões do posto 18901080, onde está localizado o AHE Belo Monte.
Tabela 2: Vazões ecológicas – Método de Tennant
Vazão (m³/s)
QMLT 7.933
Qeco,10% 793
Qeco,30% 2.380
Qeco,60% 4.760
Os outros valores encontram-se na Tabela 3, separados por método.
Tabela 3 - Vazões ecológicas calculadas pelos três métodos
Curva de
permanência
Área de
drenagem
Vazão
residual
Qeco (m³/s) 1.101 1.120 263
CONCLUSÕES
O Anexo III da declaração de outorga de direito de uso de recursos hídricos, emitida pela Agência Nacional de
Águas em sua Resolução Nº 48 de 2011, contém as vazões que devem ser mantidas no trecho de vazão
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reduzida do rio Xingu, contendo dois hidrogramas a serem alternados anualmente. Os valores encontram-se na
Tabela 4 abaixo.
Tabela1 4 - Valores de vazões médias a serem mantidas no TVR (em m³/s)
Hidrograma Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez
A 1.100 1.600 2.500 4.000 1.800 1.200 1.000 900 750 700 800 900
B 1.100 1.600 4.000 8.000 4.000 2.000 1.200 900 750 700 800 900
Comparando-se estes valores com aqueles encontrados pelas diferentes metodologias para as vazões
ecológicas, pode-se concluir que as vazões a serem mantidas no TVR são insuficientes para a manutenção da
vida aquática em determinados meses.
Levando-se em consideração os maiores valores encontrados (1.120 m³/s, pelo Método da Área de Drenagem;
e 1.101 m³/s, pelo Método da Curva de Permanência), observa-se que, para ambos os hidrogramas A e B, em
boa parte do ano, a vazão a ser mantida é inferior à ecológica (6 e 5 meses em cada método, respectivamente,
para ambos os hidrogramas A e B).
Até mesmo o valor encontrado pelo Método de Tennant (793 m³/s) para uma situação crítica do rio Xingu
(equivalente a 10% da vazão média de longo termo), também é superado ou praticamente igualado em alguns
meses (2 meses, em ambos os hidrogramas). Ainda no método de Tennant, a situação considerada satisfatória,
com 30% da MLT, só seria atendida em 2 meses no hidrograma A, e em 3 meses no hidrograma B. Já a
condição de excelência seria alcançada somente uma vez a cada dois anos, no mês de abril do hidrograma B.
Somente a vazão ecológica encontrada pelo Método da Vazão Residual (262 m³/s), relativamente baixa quando
comparada aos valores encontrados pelas outras metodologias, é mantida ao longo de todos os meses do ano,
nos dois hidrogramas.
Além disso, pode-se observar que a variação nos valores a serem mantidos no TVR estão equivalentes aos
meses chuvosos e secos do trecho do Baixo Xingu ilustrados na Tabela 4, demonstrando a priorização do
funcionamento do empreendimento ao invés da manutenção da vida aquática e da navegação no rio Xingu,
pois os valores arbitrados aos meses de seca (de agosto a dezembro) são aqueles inferiores às vazões
ecológicas supracitadas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. BRASIL, AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS. Resolução Nº48. Ministério do Meio Ambiente. Brasília, DF.
2011.
2. BRASIL, CONSELHO NACIONAL DE RECURSOS HÍDRICOS. Resolução Nº32. Ministério do Meio
Ambiente. Brasília, DF. 2003.
3. ELETROBRÁS. Avaliação Ambiental Integrada - Aproveitamentos Hidrelétricos da Bacia Hidrográfica do Rio
Xingu. Ministério de Minas e Energia. Brasília, DF. 2009.
4. ______. Sistema de Informações do Potencial Hidrelétrico Brasileiro. Ministério de Minas e Energia. Brasília,
DF. 2011.
5. HIDROWEB SISTEMA DE INFORMAÇÕES HIDROLÓGICAS [Internet]. [Acesso em 20 de julho de 2011]
Disponível em: http://hidroweb.ana.gov.br.
6. HORA, A. F.; HORA, M. A. G. M.; PEREIRA, R. A. S. Métodos para estimativa da vazão ecológica e sua
comparação com a defluência mínima nos aproveitamentos hidrelétricos localizados na sub-bacia superior do rio
Paraíba do Sul. XXVIII Seminário Nacional de Grandes Barragens. Rio de Janeiro, RJ. 2011.
7. NORTE ENGENHARIA S.A. UHE Belo Monte – Projeto Básico de Engenharia. 2010.
8. PAULO, R.G.F. Ferramentas para a Determinação de Vazões Ecológicas em Trechos de Vazão Reduzida:
Destaque para a Aplicação do Método do Perímetro Molhado no Caso de Capim Branco I. Dissertação de
mestrado. Programa de Pós-Graduação em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos. Universidade
Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, MG. 2007.