Escola e Curriculo
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A ESCOLA E O CURRÍCULO
ULBRA
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SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO ....................................... ......................................................4
1 O CURRÍCULO E A CONSTRUÇÃO DA ESCOLA ............. ..........................7
1.1 O CURRÍCULO E O SISTEMA DE ENSINO..............................................10
1.1.1 Currículo formal, informal e oculto...........................................................10
1.1.2 .................................................................................................................11
Currículo e ensino ............................................................................................11
1.2 CURRÍCULO E SISTEMA EDUCACIONAL ...............................................12
2 O QUE É O CURRÍCULO? HISTÓRIA E LINGUAGEM DO CURRÍCULO....................................................................................................14
3 A ESCOLA, A SOCIEDADE E O CURRÍCULO .............. .............................21
3.1 TEORIAS SOBRE O CURRÍCULO ............................................................21
3.1.1 O currículo como soma de exigências acadêmicas ................................22
3.1.2 O currículo como base de experiências ..................................................22
3.1.3 O legado tecnológico e eficientista no currículo ......................................23
3.1.4 O currículo como configurador da prática................................................23
4 A ORGANIZAÇÃO SOCIAL E A SELEÇÃO CULTURAL DO CURRÍCULO....................................................................................................27
5 O CURRÍCULO ESCOLAR, APRENDIZAGEM E ESCOLA ....... .................34
6 A ORGANIZAÇÃO DO CURRICULO: ASPECTOS POLÍTICOS... ..............41
7 O CURRÍCULO E A PRÁTICA DOCENTE.................. .................................47
8 A PRÁTICA CURRICULAR: O AGIR E A LINGUAGEM DO CURRICULO....................................................................................................53
8.1 AS TAREFAS ACADÊMICAS COMO MEDIADORAS DO ENSINO ..........53
8.1.1 Tarefas como matriz de socialização ......................................................54
9 A VIRADA DA TEORIA CURRICULAR: CURRÍCULO E CURRÍC ULOS....60
10 CURRICULO E DISCURSO CONTEMPORÂNEO .............. .......................66
10.1 O CURRÍCULO POR COMPETÊNCIAS..................................................66
3
10.2 O CURRÍCULO POR PROBLEMAS ........................................................68
10.3 O CURRÍCULO POR PROJETOS ...........................................................69
10.4 O CURRÍCULO POR TEMAS GERADORES E POR PROBLEMATIZAÇÃO......................................................................................70
10.5 O CURRÍCULO POR MÓDULOS DE APRENDIZAGEM.........................71
10.6 O CURRÍCULO EM REDE, HIPERTEXTUAL .........................................71
10.7 O CURRÍCULO POR CICLOS DE FORMAÇÃO......................................72
10.8 A SALA DE AULA NA CONTEMPORANEIDADE ....................................72
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APRESENTAÇÃO
O currículo tem sido um dos temas de pesquisa que atrai pesquisadores em
todo o mundo intelectual e educacional atualmente. O presente texto tem como
objetivo apresentar as ideias resultantes de diferentes pesquisas sobre o currículo e a
constituição da escola. Portanto, envolve um trabalho de coleta, organização e
compilação de dados de pesquisadores durante determinados períodos da história do
conhecimento educacional.
Os estudos sobre o currículo são antigos. Sabemos que as teorias sobre o
currículo começaram a ter maior importância a partir da história da democratização da
sociedade nos anos de 1970, cujos debates acabaram trazendo influências para as
escolas, para a comunidade acadêmica, para o discurso político, bem como para a
formação profissional. Dessa forma, o currículo passou a ser foco de interesse público
e influenciar políticas educacionais.
O currículo, através de seus determinantes, produz muitas representações nos
grupos sociais, na escola e em seus agentes – professores, gestores, alunos,
funcionários – e no contexto em que estamos inseridos. Ele é constituído pelas
práticas educativas, pelas ações dos professores e pelas interações estabelecidas
entre os professores, os alunos e os conteúdos.
O presente estudo divide-se em dez capítulos. No capítulo um aborda-se o
currículo e a construção da escola. Este capítulo apresenta a história e a evolução da
teoria do currículo, incluindo as ideias de organização, estrutura e aplicação do
currículo. O capítulo dois – intitulado O que é currículo? História e linguagem do
currículo – apresenta as definições do currículo, sua etimologia e a forma de sua
manifestação na sociedade. Nos capítulos três e quatro, discute-se como a escola e a
sociedade interferem na construção do currículo, incluindo como o currículo participa
da organização social e de que forma as políticas educacionais determinam a seleção
de conteúdos para a constituição de currículo. O capítulo cinco descreve as etapas de
construção do currículo escolar e a forma como interage para conduzir a
aprendizagem e para utilizar a estrutura que a escola proporciona.
No sexto capítulo, apresenta-se de que forma o currículo exerce seu poder e
determina posições e visões de mundo e, no sétimo, abordam-se todas as etapas de
planejamento e organização do pensamento do professor, a ação em relação ao
processo de aprendizagem e os conteúdos, os saberes necessários pelos professores
em favor do desenvolvimento cultural e da construção do conhecimento.
O oitavo capítulo debate a questão da prática curricular, apresentando-se as
formas de reunir teoria e prática dentro da ação dos agentes que compõem o currículo
5
de um curso, escola etc. O capítulo nove apresenta os debates que marcaram a
mudança de pensamento na áreas do currículo. No último capítulo são discutidas as
tendências contemporâneas sobre o currículo e as formas de pensar e de criar
inovações para uma educação mais justa e saudável.
No final de cada capítulo é apresentado o Ponto Final, que é uma retomada
das ideias fundamentais do texto, tendo em vista a escola como o espaço onde o
currículo se realiza. Também há uma atividade que envolve as funções analíticas e
reflexivas.
Esperamos que essa obra lhes proporcione uma boa leitura, bem como que
possa acrescentar novos conhecimentos aos que já possuem.
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Notas sobre o autor
Airton Pozo de Mattos é licenciado em Letras pela Pontifícia Universidade Católica do
Rio Grande do Sul – PUCRS (1983), Especialista em Linguística Aplicada pela
PUCRS (1990), Mestre em Educação pela PUCRS (1997) e Doutor em Educação
pela PUCRS (2005). É professor da graduação, especialização, mestrado e doutorado
da Universidade Luterana do Brasil.
1 O CURRÍCULO E A CONSTRUÇÃO DA ESCOLA
O século XX trouxe mudanças nas mais diversas áreas: política, economia,
segurança, educação e tecnologia. Essas mudanças – ou evoluções para alguns
especialistas e nem tanto para seus críticos – possibilitaram a criação de um novo
cenário para a educação, levando as pessoas a buscarem novas formas de
compreender o mundo e suas modificações.
A globalização e as mudanças por ela provocadas também atingiram a
educação e sua forma de atuar na sociedade – sua função, seus objetivos, sua
missão, os valores e princípios pelos quais a educação se constrói.
A escola, desde sua constituição, atendia as elites, funcionários importantes do
Estado. Atendia também a manutenção das ideologias dominantes, através da
transmissão de conhecimentos e comportamentos reconhecidos como de interesse de
quem mantinha o poder.
Com as mudanças nas estruturas das sociedades, com a industrialização e o
crescimento de uma nova classe de poder e das necessidades de pessoas para o
trabalho e melhor formação para poder atender a demanda, as escolas passaram a ter
a função de preparar pessoas para o mundo do trabalho. Passamos a ter duas
escolas: a das elites e a dos pobres.
A transformação da escola para uma escola de massas trouxe uma série de
problemas para o atendimento da demanda crescente. A escola era ineficiente e não
contribuía para o ajustamento das novas gerações e não preparava a mão-de-obra
para o mercado. Com as dificuldades, os governos iniciaram um processo de
reavaliação da escola, de sua estrutura e das suas relações com a sociedade. Nesse
processo de transformação, o currículo representou um dos temas mais debatidos.
Como o currículo pode ser definido? O que ele inclui? O que o distingue de
outros conceitos e sistemas com ele relacionados? Segundo Ribeiro1, o termo
currículo não possui um sentido único, pois existe uma diversidade de definições e de
conceitos em função das linhas de pesquisa e das percepções dos seus pensadores.
Esse autor esclarece que uma das acepções mais comuns é aquela que identifica o
currículo “com o elenco e sequência de matérias ou disciplinas propostas para todo o
sistema escolar, um ciclo de estudos, um nível de escolaridade ou um curso, visando a
graduação dos alunos nesse sistema, ciclo, nível ou curso”2. Nessa concepção, o
currículo confunde-se com “plano de estudos” – um conjunto estruturado de matérias
ou disciplinas de ensino, que se estabelece em um determinado tempo e espaço em
atenção às necessidades de aprendizagem dos alunos.
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Um outro conceito busca identificar o currículo com programas de ensino em
uma determinada área de estudo. O currículo, nesse caso, representa uma listagem,
esquema ou sumário de temas e tópicos por área disciplinar e, muitas vezes,
acompanha sugestões metodológicas de como tratar esses conteúdos programáticos.
Essas concepções levam-nos a destacar duas ideias independentes: uma de
organização curricular e outra de disciplinas (matérias), conteúdos programáticos e
respectivas observações didáticas.
Ribeiro ainda observa que as concepções mais correntes “tem em comum o
fato de caracterizarem o currículo mais pelos aspectos ‘exteriores’ ou visíveis do que
pelos elementos intrínsecos e ‘substantivos’ que o definem e conferem significado
àqueles”3.
A ideia de currículo como conjunto de matérias ou disciplinas de ensino se
caracteriza como “um modo de transmitir de geração em geração o conjunto
acumulado do saber humano, sistematicamente organizado e tradicionalmente
consagrado em matérias ou disciplinas fundamentais, [deixando claro que] o currículo
deve constituir-se inteiramente com o conhecimento que provém das disciplinas”4,
servindo como uma forma de introdução ao universo de conhecimentos acumulados
pela história da humanidade.
O autor apresenta outra forma de interpretar o mesmo conceito de currículo.
Para ele, o currículo também permite “representar um conjunto de diferentes modos de
pensar e investigar a realidade e experiência humana, privilegiando-se, assim, o
desenvolvimento de capacidades e processos intelectuais – significativamente
representados nessas disciplinas do saber”5.
Ademais, acerca dos conceitos de currículo, Ribeiro apresenta concepções de
diferentes autores, conforme é apresentado no Quadro 1, a seguir.
Quadro 1 – O currículo segundo diferentes autores
AUTORES CONCEPÇÕES DE CURRÍCULO
FOSHAY, 1969 Currículo é o conjunto de todas as experiências que o aluno adquire, sob a orientação da escola.
SAYLOR, 1966 Currículo engloba todas as experiências de aprendizagem proporcionadas pela escola.
PHENIX, 1958 Currículo é o modelo organizado do programa educacional da escola e descreve a matéria, o método e a ordem do ensino – o que, como e quando se ensina.
JOHNSON, 1977 Currículo é uma série estruturada de resultados de aprendizagem que se tem em vista. O currículo prescreve (ou pelo menos,
9
antecipa) os resultados do ensino; não prescreve os meios.
Fonte: Ribeiro, 1993.
Entre as definições apresentadas no Quadro 1, Ribeiro esclarece que as duas
primeiras “possuem um traço comum: conjunto de experiências educativas vividas
pelos alunos, sob a tutela da escola”6. Entretanto, a segunda se refere às experiências
educativas e de aprendizagem organizadas pela escola. A primeira e a segunda
definições, segundo o autor, apresentam uma estreita associação entre “experiências
de aprendizagem ou educativa” e “currículo”. O currículo, nesse caso, seria uma
“acumulação de experiências educativas ou o itinerário formativo do aluno durante a
sua passagem pela escola [e, ao mesmo tempo,] seria o conjunto variado de
mecanismos e meios que possibilitam, no tempo de vida escolar, diversas e
sucessivas experiências formativas”7.
Podemos depreender disso que o currículo é o conjunto de experiências
educativas oportunizadas pela escola, resultantes de intenções explícitas da própria
organização e de ingredientes da vida escolar. Para Ribeiro a terceira e quarta
definições apresentam ideias opostas às anteriores, pois o currículo aparece como
planejamento, organização do ensino-aprendizagem, conjunto organizado com
objetivos e sequência de ações para atingir os objetivos.
Então, podemos observar que as definições mais comuns de currículo tendem
a se relacionar com:
- lista de disciplinas de ensino;
- lista de conteúdos programáticos;
- sequência organizada de conteúdos de ensino;
- série de objetivos de ensino;
- manuais e matérias didáticos;
- métodos e processo de ensino;
- experiências, atividades vivenciadas na escola.
Entre os argumentos até aqui apresentados, devemos enfatizar que as
dimensões da concepção de currículo são o currículo como algo que se visa, como
intenção ou objetivo; e o currículo como algo que se experiencia, como interação e
processo em curso. A primeira perspectiva descreve o currículo como plano, algo
normativo; na segunda, ele é descrito como interação e experiência de aprendizagem.
Pode-se observar que as definições apresentam três pontos de vista atinentes ao
currículo:
- conjunto de objetivos ou resultados de aprendizagem a serem alcançados;
- disciplinas ou conteúdos a ensinar;
10
- experiências ou processo de aprendizagem.
Assim, se mantivermos esses três pontos de vista juntos, encontramos uma
única concepção: plano estruturado de ensino-aprendizagem, englobando a proposta
de objetivos, conteúdos e processos. A ideia de reunir os diferentes aspectos das
definições apresentadas também foi compartilhada por autores como Tanner e
Tanner, que definem o currículo como um
conjunto de experiências de aprendizagem planejadas, bem como de resultados de aprendizagem previamente definidos, formulando-se umas e outros mediante a reconstrução sistemática da experiência e conhecimento humanos, sob os auspícios da escola e em ordem ao desenvolvimento permanente do educando nas suas competências pessoais e sociais.8
O currículo como plano, programa estruturado, concretiza-se em um
documento – no plano de estudos ou programa escolar – ou “material” curricular,
objeto, material de estudo, plano ou programa de ensino-aprendizagem.
1.1 O CURRÍCULO E O SISTEMA DE ENSINO
O currículo estabelece relações com outras instâncias ou sistemas
interdependentes que conhecemos como sistema educacional. Nas relações de
fronteira com os outros participantes do sistema, emergem atividades, experiências e
atividades até então ocultas ou não conhecidas das comunidades educativas.
1.1.1 Currículo formal, informal e oculto
Na discussão sobre o currículo é muito comum surgir dicotomias como
curricular e extra-curricular, currículo formal e currículo informal, currículo manifesto e
currículo oculto, currículo implícito e currículo explícito.
Segundo Ribeiro, o currículo pode ser “um conjunto de experiências educativas
planejadas e organizadas pela escola, ou mesmo de experiências vividas pelos
educandos sob a orientação direta da escola”9. Nessa concepção algumas das
dicotomias citadas desaparecem, mas ela ainda inclui as experiências de
aprendizagem vivenciadas pelos alunos, as quais não emergiram diretamente dos
programas propostos pela escola. A isso chamamos de currículo oculto .
É necessário um destaque para essa dicotomia: currículo manifesto versus
currículo oculto. Antes disso, é importante lembrar que a diferença entre currículo
formal e informal, assim como entre experiências curriculares e extra-curriculares, está
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na grade-horária das matérias a que professores e alunos estão submetidos, bem
como nas atividades que não estão expressas nessa mesma grade.
Segundo Ribeiro, o conceito de currículo oculto pode ser visto sob dois pontos
de vista. No primeiro, o currículo aparece como um “conjunto de práticas educativas e
processos pedagógicos que veiculam aprendizagens diferentes das explicitamente
descritas pelos objetivos do programa”10. No segundo, o currículo oculto se refere “aos
efeitos educativos que a escola parece promover mas que não estão explícitos pelo
programa”11, isto é, à aquisição de valores, à socialização e à formação de atitudes e
procedimentos esperados pela sociedade. Ambos pontos de vista apresentam
resultados e processos do ensino escolar não explícitos, mas fazem parte do sistema
educacional como aprendizagens “colaterais”, que não estavam sendo enfatizadas no
currículo formal.
O currículo oculto, nesse sentido, representa uma emergência a partir do
currículo manifesto, uma vez que possibilita aprendizagens que não resultam do
conjunto formal e organizado pela instituição, mas a aprendizagens relacionadas a
valores, atitudes e visão de mundo. Jenkins citado por Ribeiro12, afirma que o currículo
oculto é “o amálgama de aprendizagens adaptativas que cada aluno tem de adquirir
para sobreviver culturalmente em um meio hostil”.
1.1.2 Currículo e ensino
As relações entre o currículo formal e a dinâmica do ensino em situações
formais nos levam a refletir sobre:
- a dimensão formal que identifica o currículo aprovado pelas entidades
responsáveis, formais do sistema educacional;
- a dimensão percebida que representa o que os professores realizam
partindo do que compreendem e interpretam do formal;
- a dimensão vivenciada que representa o que os alunos recebem, aprendem
a partir do que foi planejado;
- a dimensão observada (operacional), sob a perspectiva daqueles que
descrevem o ensino formal como ele acontece, independente da
perspectiva de professores, alunos e administração.
As distinções acima fazem-nos pensar nas diferentes interpretações sobre o
plano de ensino, suas mudanças, sua capacidade de operacionalização, deixando
clara a possibilidade das relações complexas entre o que o aluno aprende, o que o
professor ensina – ou pensa que ensina – e o que o currículo ou seu propositor tinha
em vista para essas relações.
12
1.2 CURRÍCULO E SISTEMA EDUCACIONAL
Na relação entre o currículo e o sistema educacional, Ribeiro esclarece que o
currículo pode ser considerado a partir das seguintes proposições: “[a] o currículo
constitui um dos subsistemas do sistema educativo; [b] o sistema educativo surge
como: ‘quadro de referência’ e ‘enquadramento’ necessário do currículo; [c] o currículo
representa a ‘substância’ do sistema educativo”13.
O sistema educacional constitui-se de um conjunto de estruturas, ações,
métodos e meios através dos quais o processo de formação se estabelece. O currículo
é parte desse sistema, mas com certeza deve ser o mais importante.
No que tange ao sistema escolar, de acordo com Ribeiro14 podemos mencionar
alguns componentes:
- o curricular e o pedagógico;
- os recursos humanos;
- os recursos físicos;
- a administração, a organização e a gestão escolar;
- o apoio e os complementos educativos.
Quanto ao segundo aspecto citado pelo autor, o sistema educacional constitui-
se no quadro de referência para a elaboração e concepção do currículo, programas,
pois ele apresenta em seu bojo a filosofia, epistemologia e finalidades da educação.
A última relação citada entre o currículo e o sistema educacional refere-se à
substância desse sistema ou, em outras palavras, o “currículo constitui a substância
do sistema escolar”, pois o sistema educacional pretende constituir o processo de
formação do cidadão.
Smith et al citado por Ribeiro15 lembra que
o currículo aparece como o conjunto e a sequência de experiências formativas possíveis, organizadas pelo sistema educativo com a finalidade de formar e desenvolver as crianças e jovens em processos coletivos de pensar e agir. Por outras palavras, o currículo identifica-se com a cultura que se pretende transmitir aos membros da comunidade em que o sistema educativo se insere, isto é, os saberes, aptidões, atitudes e valores que se julga serem importantes para a educação das gerações novas. Neste sentido, o currículo passa por ser o veículo de transmissão da experiência cultural da humanidade e de indução de crianças e jovens na cultura do grupo social a que pertencem (socialização).
Assim, de forma mais restrita, o currículo pretende responder a seguinte
questão: o que devemos ou podemos ensinar e o que deve ou deveria ser aprendido
13
na escola? Ribeiro16 acentua que “o currículo é um sistema organizado de elementos
composto de : enunciados das finalidades, objetivos visados, organização de
conteúdos, modelos, métodos e atividades de ensino-aprendizagem e, avaliação. do
processo”.
As relações que os sujeitos estabelecem com os objetos, resultando na
construção de elementos simbólicos, fazem emergir diferentes aprendizagens tanto
para os alunos quanto para professores e comunidade acadêmica. Por isso, a
compreensão da importância do currículo para a organização da escola.
PONTO FINAL
As sociedades são organizações construídas social e historicamente, portanto elas
determinam e são determinadas pelas relações que se estabelecem entre os seres
humanos em um determinado contexto e espaço. Portanto, representam uma
construção sociocultural e historicamente constituída. Sob essa perspectiva, o
currículo é um elemento estruturante das condições em que o indivíduo vai ter contato
com as diferentes formas de cultura e relacionamento. O currículo, assim, constitui-se
como uma forma de canalizar as vivências e experiências que podemos construir no
contato com o outro. O currículo também tem uma relação com os conhecimentos que
a sociedade desenvolveu e construiu ao longo do tempo. Sua operacionalização na
escola requer a elaboração de planos de ensino e a organização de conteúdos.
ATIVIDADES
Reflita sobre a escola que você estudou – ou em alguma escola próxima à sua casa
ou que você trabalha – e escreva acerca do papel do currículo na constituição da
escola.
2 O QUE É O CURRÍCULO? HISTÓRIA E LINGUAGEM DO CURR ÍCULO
Pode-se dizer que currículo é “a vida da escola”, incluindo todos os
movimentos no convívio escolar – as experiências e vivências que ocorrem dentro de
um ambiente educativo formal. Currículo é o que é percebido por nós, pelos alunos,
professores, gestores, funcionários, pais (ou seja, pela comunidade escolar), mas
também apresenta vários aspectos que não conseguimos perceber. Dessa forma, o
currículo quando se transforma em ações utiliza uma forma de expressar-se, por isso
utilizamos a expressão “linguagem do currículo”; isto é, a forma como ele se apresenta
na prática escolar. O currículo é tudo que é possível dentro do mundo possível da
educação.
Currículo é um termo proveniente do latim – curriculum (corrida, carreira) e
currere (correr) – e significa caminho, jornada, trajetória, percurso a seguir. Segundo
Pacheco1 o termo encerra, por isso, duas ideias principais: uma de sequência
ordenada; outra de noção de totalidade de estudos.
Há também a expressão latina cursus – que envolve a ideia de carreira, de
corrida, o que apresenta uma aproximação conceitual de curriculum (carreira).
Macedo2 comenta sobre a adoção dessas palavras ao longo da história. O termo
cursus, segundo ele, passou a ser utilizado a partir dos séculos XIV e XV. A palavra
curriculum é de uso mais tardio, de 1682, sendo usada com o sentido de cursinho; em
1824 também ganhou o sentido de curso de aperfeiçoamento ou de estudos
universitários. Só no século XX a expressão curriculum passou a ser usualmente
adotada no continente americano.
De acordo com Berticelli3, após a era industrial, conhecemos o sentido atual de
currículo, que se estruturou após a Segunda Guerra Mundial. Silva4 acresce que, a
partir disso, a palavra curriculum passou a ser usada como referência à organização
das experiências educacionais ou educativas.
Keimmis, citado por Macedo5, observa que o termo currículo se refere a um
“terreno prático, socialmente construído, historicamente formado, que não se reduz a
problemas de aplicação de saberes especializados desenvolvidos por outras
disciplinas, mas que possui um corpo disciplinar próprio”. Já Goodson6 afirma ser o
currículo “uma tradição inventada”, um artefato socioeducacional que se configura nas
ações de conceber ou selecionar ou produzir, organizar, institucionalizar, implementar
ou dinamizar saberes, conhecimentos, atividades, competências e valores, visando
uma “dada” formação, configurada por processos e construções constituídos na
relação com o conhecimento eleito como educativo. Portanto, o currículo é o produto
15
das relações e interações entre os componentes do sistema educacional, o qual se
estrutura a partir dos conhecimentos, valores, princípios filosóficos e epistemológicos.
Macedo7 observa que o currículo pode ser percebido como um documento em
que se expressa e se organiza a formação, os métodos, atividades, disciplinas (ou
matérias) que organizam os conhecimentos. Pode-se depreender daí que professores
constroem e dão forma ao currículo em cada momento que orientam as atividades na
escola. Por outro lado, o autor enfatiza que aspectos como trajetória e itinerário podem
engessar a formação, impedindo a criatividade, a transgressão das experiências,
necessários para gerar inovação. Em vista disso, ele propõe o currículo como
“itinerância e errância“, mostrando a necessidade de “se vivenciar também nas
experiências formativas as interações bifurcantes, os devaneios e as errâncias
criativas. [O que torna o currículo como] um complexo cultural tecido por relações
ideologicamente organizadas e orientadas, [ele] é uma prática que bifurca”8.
O currículo indica caminhos, travessias, que são constantemente
realimentadas, reorientadas, reestruturadas pela atividade e pela cena curricular, o
ambiente, o contexto, as finalidades. O currículo envolve, dessa forma, relações e
interações permeadas e constituídas e constituintes pelas relações de poder. Logo,
mais uma vez, currículo é cultura, política, é poder, é prática, é teoria. Currículo é uma
construção complexa.
Aos poucos, a definição de currículo vai possibilitando algumas visões que
tornam evidente a sua complexidade. O currículo também é definido como “plano de
estudos” – que fornece uma base de formação para todos os cidadãos. Essa ideia de
currículo manteve-se até o início do período moderno.
No século XX, segundo Pacheco, o currículo passa a surgir como um “círculo
coerente de saberes, estruturados didaticamente para sua transmissão e
aprendizagem” 9.
Para Goodson10, o currículo é “a maneira de organizar e controlar os ideários
da formação”. Nessa definição, a questão do controle e da ideologia dominante estão
presentes.
Bobbit11, seguindo a orientação americana da Administração científica de
Frederick Taylor, compreende o currículo como ações objetivas e planejadas e
estrategicamente executadas para obter eficiência e eficácia, seguindo uma
metodologia monitorada e avaliada. O currículo obteve um teor mecânico e
operacional. Essa ideia permanece forte ainda hoje, uma tentativa de harmonizar os
fatores econômicos e científicos.
Tyler12, discípulo de Bobbit, sugere um estudo mais específico no campo do
currículo, sugerindo uma linha própria de pesquisa e teorias.
16
Terigi, citado por Macedo13, afirma existir três enfoques relacionados à origem
do currículo:
- o currículo como ferramenta pedagógica de massificação da sociedade
industrial;
- o currículo como um plano estruturado de estudos;
- os conteúdos, matérias, disciplinas que se ensinam formalmente.
Pode-se observar que os enfoques acima nos permite compreender o currículo
como um conjunto de disciplinas que representam conteúdos do programa oficial da
escola, ou seja, um conjunto de matérias a serem ensinadas e uma estrutura
organizacional que possibilita a transmissão desses conteúdos. Nessa perspectiva, o
conhecimento é o mesmo, único e não questionável, pois era o resultado da atuação
do método científico e da cultura padrão.
Moreira14 afirma não haver consenso quanto ao significado de currículo. E isso
já foi possível constatarmos no que foi visto até aqui. As divergências nos levam a
compreender que currículo:
- é uma construção cultural, histórica e socialmente determinada; e
- refere-se a uma prática condicionadora de si mesmo e de sua teorização.
Para Moreira15 há dois aspectos que predominam nas definições:
conhecimento escolar e experiência de aprendizagem . No primeiro, o currículo é
representado pelo conhecimento tratado pedagogicamente e didaticamente pela
escola e, nesse caso, ele deve ser aprendido e aplicado pelo aluno. No segundo
aspecto, o foco está nas diferenças individuais e na preocupação com a atividade do
aluno. Dessa forma, o currículo passa a significar o conjunto de experiências a serem
vividas pelo estudante sob orientação da escola.
O currículo retoma a experiência do aluno e tem o sentido da totalidade das
experiências vivenciadas pelo aluno no ambiente escolar. Moreira observa que o
currículo “envolve a apresentação de conhecimentos e inclui um conjunto de
experiências de aprendizagem que visam favorecer a assimilação e a reconstrução
desses conhecimentos”16.
O mesmo autor escreve sobre a influência da psicologia comportamental, que
tem como foco o currículo e os elementos que participam de sua estrutura, sua
organização e inter-relações. O behaviorismo preocupa-se com os objetivos
curriculares voltados, com as regras de formulação de objetivos, com as relações
entre o currículo e a prática. Nota-se um novo movimento que enfatiza ora as ideias
prescritivas do currículo, ora o processo, a prática efetiva, o currículo formal, o
currículo real.
17
Leite esclarece que a concepção de currículo estava “associada ao conjunto
das disciplinas que faziam parte daquele nível de ensino e que se concretizavam pelos
conteúdos expressos nos manuais escolares”17. A autora observa, ainda, que “o
currículo limitava-se ao conjunto das matérias a ensinar e à estrutura organizativa
dessa transmissão”18, lembrando que o discurso da época era o da “transmissão de
saberes para a preparação para a vida futura (entendendo o futuro como igual ao
presente)”19. Naquela época, segundo a autora, prevalecia a ideia de conhecimento
único e universal, não questionado, padrão, como uma cultura aceita por todos.
Pinar, citado por Moreira20, identificou a presença de duas linhas de estudos no
campo do currículo: o grupo dos críticos e o grupo dos pós-críticos. O grupo dos
críticos, de acordo com Silva21 produz uma inversão nos fundamentos das ideias
tradicionais. Segundo ele, as concepções de currículo como artefato neutro, inocente e
desinteressado não são procedentes, não condizem com o que de fato a realidade
sustenta.
Macedo esclarece que, para os autores das teorias críticas “o interesse é
descrever as iniquidades sociais e as injustiças que excluem através dos atos de
currículo“22. O autor define atos de currículo como “todas as atividades que se
organizam e se envolvem visando uma determinada formação, operacionalizadas via
seleção, organização, formulação, implementação, institucionalização e avaliação de
saberes, atividades, valores, competências, mediado pelo processo ensinar/aprender
ou projeção”23. As teorias críticas, então, se preocupam em compreender “o que o
currículo faz com as pessoas e as instituições e não apenas como se faz o currículo”24.
A teoria crítica, para Macedo25, carrega um movimento que vincula as
concepções de currículo ao movimento capitalista, à cultura que se produz na escola e
representa o pensamento de pensadores como Apple, Giroux e Mc Laren, Gramsci,
Freire. A teoria crítica é uma oposição clara ao pensamento da cultura de massa e à
ideia de tecnicismo da sociedade moderna.
Giroux26 escreve sobre uma “pedagogia das possibilidades” e expressa a
necessidade de ver o currículo como “esfera pública e democrática”.
Os educadores que seguem as ideias de Dilthey, Husserl, Heidegger e
Merleau-Ponty apresentam a visão de currículo levando em consideração a
subjetividade e que o conhecimento é construído de forma intersubjetiva, através da
linguagem.
O objetivo desses pensadores, segundo Macedo, é “desreificar a burocracia e
as formas de relação estabelecidas pelos atos de currículo nas sociedades
capitalistas”27. O autor também observa que “os novos sociólogos da educação na
Inglaterra tentam articular as teorias sociointeracionista, etnometodologia e
18
dramaturgia social”28, influenciados por Schutz, Sarup, Woods, Keddie e Bernstein,
Michael Young, o último é o principal defensor da corrente.
Young29 enfatiza as relações entre currículo e poder. Além dessas relações,
esses autores vão pensar o currículo como uma construção social. Berger e
Luckmann30 escrevem sobre a ideia de “currículo oculto”, descrevendo os mecanismos
encobertos de poder que influenciam a construção das visões de mundo, de
sociedade, de homem e de educação pelos atos de currículo.
No Brasil, as questões da educação, segundo Macedo31, mantém a posição de
transferência de ideias e são sustentadas pelas teorias americanas. Essas teorias
trazem em seu núcleo o modelo funcionalista. As propostas marxistas só passaram a
ser discutidas na década de 1980. No Brasil, nesse período, havia duas correntes que
visavam difundir discursos e influenciar as práticas pedagógicas e curriculares: a
pedagogia histórico-crítica e a pedagogia do oprimido .
Portanto, a visão crítica, as questões do cotidiano das escolas e o processo de
ensino e aprendizagem, despertam uma nova leitura dos estudos sobre o currículo,
buscando a superação da perspectivas dominantes: funcionalistas, behavioristas,
reprodutivistas.
Macedo32, esclarece que nos anos 90, os estudos sobre o currículo sofreram
influências da sociologia, da antropologia e das relações de poder, produzindo
discursos políticos, éticos, culturais como resultado das contradições emergentes das
teorias dominantes e da realidade em construção.
Grundy, citado por Sacristán, esclarece que “o currículo não é um conceito mas
uma construção cultural. Isto é, não se trata de um conceito abstrato que tenha algum
tipo de existência fora e previamente à experiência humana. É, antes, um modo de
organizar uma série de práticas educativas”33.
Sacristán34 procura organizar as diferentes concepções e perspectivas sobre o
currículo baseando-se nos seguintes aspectos:
- o ponto de vista sobre a função social do currículo como ponte entre a
sociedade e a escola;
- o currículo envolve a ideia de projeto ou plano educativo, pretenso ou real,
composto de diferentes aspectos, experiências, conteúdos etc.;
- fala-se do currículo como a expressão formal e material do projeto que deve
apresentar, sob determinado formato – para os seus conteúdos, orientações,
sequências etc.;
- referem-se ao currículo os que o entendem como um campo prático.
Entendê-lo assim supõe a possibilidade de: 1) analisar os processos
instrutivos e a realidade da prática a partir de uma perspectiva que lhes dota
19
de conteúdos; 2) estudá-lo como território de intersecção de práticas
diversas que não se referem aos processos de tipo pedagógico, interações e
comunicações; 3) sustentar o discurso sobre a interação entre a teoria e a
prática em educação;
- também se referem a ele os que exercem atividades discursivas,
acadêmicas e de pesquisa sobre todos esses temas.
O autor lembra que o currículo tem fins sociais e culturais, pois é através da
instrumentalização prática do sistema educacional e social que se concretizam as
funções da escola e do currículo. O currículo é a forma de alcançar o conhecimento, é
uma prática cultura e social e, muitas vezes, institucional, pois une os subsistemas e
práticas diversas em atividades de ensino. A esse respeito, Sacristán esclarece que ”é
uma prática que se expressa em comportamentos práticos diversos. [...] É uma prática
na qual se estabelece o diálogo entre agentes sociais, elementos técnicos, alunos que
reagem frente a ele, professores que o modelam etc.” 35.
O currículo é uma invenção historicamente organizada de forma política, social
e educacional e, portanto, reflete os interesses da sociedade e os valores dominantes
em um processo social e educativo. Sob essa perspectiva, o currículo também é um
corte cultural de conhecimentos, de conteúdos a serem aprendidos. Conhecimentos
oriundos das mais diferentes áreas do saber. O currículo deve ser a ligação, a ponte
entre a prática escolar e o mundo do conhecimento e da cultura.
O currículo como práxis pressupõe ações em um processo que se dá em
certas condições reais, em um universo de trocas sociais e culturais em um
determinado tempo-espaço. Isto nos leva a entender que o currículo e sua construção
não podem ser isolados das condições de sua própria construção. No caso de um
currículo escolar, as condições são: estruturais, políticas, administrativas, materiais e
educacionais que modelam o fazer pedagógico e cultural.
Assim, o currículo constitui-se em um complexo processo social, inserindo-se
em múltiplas práticas pedagógicas, que se originam em diferentes campos – tais como
administrativo, político, de meios e técnicas, de conhecimento produzido, avaliação – e
funcionam como subsistemas interdependentes que geram diferentes contextos: de
aula, pessoal, social, histórico, político etc.
Sacristán36 aponta oito subsistemas que nos auxiliam na análise do currículo:
- o subsistema político-administrativo;
- o subsistema de participação e controle;
- o subsistema educacional;
- o subsistema de produção de meios;
- o subsistema de criação cultural e científica;
20
- o subsistema técnico-pedagógico;
- o subsistema de inovação;
- o subsistema prático-pedagógico.
Os subsistemas estabelecem relações de determinação recíproca entre si.
Essas inter-relações constituem o sistema curricular. Para Sacristán37, então, o sentido
do currículo se efetiva através dos resultados desses contextos e se demonstra nas
práticas múltiplas e multiformes.
Sacristán38 sintetiza as ideias sobre o currículo como
um artefato que tem função socializadora, (...) com conteúdos das mais diferentes ordens: política, administrativa, pedagógica, filosófica etc.; (...) o currículo é um ponto fundamental na melhora da qualidade do ensino, na mudança das condições da prática, no aperfeiçoamento dos professores.
PONTO FINAL
O currículo também passou por um processo de desenvolvimento, que envolveu
momentos de estabilidade e instabilidade, assim como de reconstruções, além de uma
linguagem própria. O histórico da evolução nos ajuda a compreender de que forma a
sociedade, suas mudanças, interferem na estrutura curricular da escola ou não, ou
seja, independe da implementação das mudanças, sabemos que os movimentos
dentro da sociedade entre seus integrantes geram transformações de maior ou menor
profundidade. O fato é que não podemos pensar o currículo sem pensar na construção
social do ser humano, das identidades e das culturas. O estudo do currículo pode ser
feito com base na evolução do pensamento, assim como dos sistemas e subsistemas
que se formaram a partir das transformações sociais.
ATIVIDADE
Entreviste entre três a cinco professores, pedagogos, diretor ou vice-diretor de uma
escola e procure saber a opinião deles sobre o significado e a importância do
currículo. Busque saber, também, como o professor utiliza e se beneficia do currículo.
Se preferir, elabore previamente um roteiro de entrevista baseando-se no conteúdo
desse capítulo para elaborar as questões.
3 A ESCOLA, A SOCIEDADE E O CURRÍCULO
O currículo é uma escolha cultural, um projeto cujo conteúdo inclui a cultura
que permeia a educação. Nessa concepção ampla, podemos relembrar que o currículo
é um projeto cultural, social, política e administrativamente determinado, que se efetiva
em uma atividade escolar ou acadêmica e se torna realidade dentro do contexto e das
condições da comunidade e da sociedade.
Em primeiro lugar, a aprendizagem nas instituições acadêmicas se organiza de
acordo com o projeto cultural e, portanto, o currículo depende da escolha de
conteúdos. Esse projeto cultural (ou pedagógico ou social) se realiza em determinados
contextos ou condições políticas, administrativas e institucionais. Essas condições
estão condicionadas pela realidade, que por sua vez está estruturada sobre ideias,
valores e visões de mundo.
Logo, podemos pensar em três grandes operadores da cultura curricular: a
seleção da cultura, ou seja o que selecionamos e como organizamos o conjunto de
conhecimentos que consideramos necessários para a formação do cidadão; as
condições institucionais, isto é, a política curricular, a estrutura do sistema educacional
e a organização escolar; e as concepções curriculares ensejadas pelas opções
políticas, psicológicas, epistemológicas, assim como pelos valores sociais e modelos
educativos. Esses paradigmas são determinantes do currículo como “cultura”, ou seja,
a partir desses elementos, selecionamos os conteúdos, os códigos e as estratégias de
ensino e o resultado da aprendizagem.
3.1 TEORIAS SOBRE O CURRÍCULO
As teorias sobre o currículo, embora tenham como meta apresentar uma teoria
única e homogênea, não respeitam um consenso, consideradas as dificuldades para
se abarcar toda a complexidade relacionada ao currículo, assim como em discutir os
problemas práticos atinentes ao tema.
Assim, os teóricos acabam descrevendo especificidades sobre o currículo. Por
exemplo, o currículo centrado na gestão racional, radical-crítica, existencial,
acadêmica ou reacionária, deliberativa. Há também uma classificação que assinala as
perspectivas ou ideologias: acadêmica, eficiência social. Também, segundo
Sacristán1, a literatura cita enfoques como o humanístico, reconstrucionista social,
teológico e acadêmico.
22
Com base nisso, Sacristán2 definiu algumas perspectivas teóricas e práticas
em vista de facilitar a compreensão do currículo. São elas: o currículo como soma de
exigências acadêmicas, o currículo como base de experiências, o legado tecnológico e
eficientista no currículo, o currículo como configurador da prática (a ponte entre a
teoria e a ação). Veremos tais perspectivas a seguir.
3.1.1 O currículo como soma de exigências acadêmicas
Nessa perspectiva, o currículo é analisado sob o ponto de vista dos conteúdos
organizados em disciplinas. Nela se valoriza a tradição acadêmica no campo
educacional, bem como os saberes especializados em disciplinas ou em áreas do
saber. O currículo, então, concretiza-se pela listagem de conteúdos a serem
trabalhados ou cumpridos em um período letivo.
As construções institucionais de pressão acadêmica como a organização dos
professores, a administração acadêmica, a gestão científica acabam por impor esse
modelo, embora tenhamos clareza que essa não é a melhor maneira de ensinar e de
aprender.
3.1.2 O currículo como base de experiências
O interesse pelas experiências e vivências dos alunos tem relação com o
movimento pela renovação da escola. O movimento da Escola Nova questionava a
teoria curricular centrada em matérias, disciplinas, sugerindo um pluralismo de formas
para organizá-lo, buscando também novas concepções segundo princípios
democráticos.
Sacristán3 assinala que,
partindo do pressuposto de que os aspectos intelectuais, físicos, emocionais e sociais são importantes no desenvolvimento e na vida do indivíduo, levando em conta, além disso, que terão de ser objeto de tratamentos coerentes para que se consigam finalidades tão diversas, ter-se-á que ponderar, como consequência inevitável, os aspectos metodológicos do ensino, já que destes depende a consecução de muitas dessas finalidades e não de conteúdos estritos do ensino.
A função do currículo, sob essa perspectiva, é atender as necessidades
emocionais, cognitivas e sociais, proporcionando um conjunto de experiências
planejadas sob a orientação da escola e do professor. Enfatiza-se então a visão da
escola como uma instituição socializadora e de formação humana, cumprindo ainda o
papel de prover a capacitação para o trabalho. Ou seja, um projeto global de
23
educação, pois além dos conteúdos, o currículo abarca as experiências do estudante
em atividades escolares planejadas e operacionalizadas em contextos formais de
educação.
3.1.3 O legado tecnológico e eficientista no currículo
Essa perspectiva fundamenta-se na administração, na organização, na
burocracia e no controle escolar imposto como padrão na escola. Trata-se de um
modelo de currículo cuja preocupação é a formação do cidadão para a vida,
atendendo as demandas do mercado e tendo como ideal a obtenção de resultados e
da eficiência.
Callahan e Kliebard, citados por Sacristán4, assinalam que ”a gestão científica
é para a burocracia o que o taylorismo foi para a produção industrial em série,
querendo estabelecer os princípios de eficácia, controle, previsão, racionalidade e
economia na adequação de meios e fins, como elementos-chave da prática, o que fez
surgir toda uma tradição de pensar o currículo”.
Tyler5 assevera que o currículo é composto pelas experiências de
aprendizagens planejadas, organizadas e operacionalizadas pela escola com a
intenção de alcançar os objetivos educativos estabelecidos pelo projeto pedagógico. O
currículo, nesse sentido, é um conjunto de objetivos de aprendizagem condicionados e
determinados que oportunizam experiências de aprendizagem adequadas ao contexto
escolar e social.
3.1.4 O currículo como configurador da prática
Essa linha de pensamento centra a sua ação na dialética entre teoria e prática.
Enfatiza a prática curricular como resultado das oposições, contradições, gerando uma
prática teorizada, uma prática modelar, uma reflexão crítica. A prática surge como um
novo discurso em didática, buscando compreender o fenômeno ensino e
aprendizagem, separando-os; ou seja, conteúdos separados de métodos,
administração das ações técnicas, escola e sociedade. A teoria serve como
instrumento de análise da prática e, ao mesmo tempo, para apoiar a reflexão crítica da
teoria e da prática constituída nessa dialética. Essas condições são essenciais para a
autonomia, tão ausente nas teorias curriculares.
A crítica tem apontado para a dificuldade de inovações na educação e,
portanto, à dificuldade dos professores serem criativos – no sentido de desenvolverem
metodologias inovadoras que levem os alunos à autonomia, à emancipação e à
24
reflexão crítica –, pois eles convivem com estruturas de escola controladoras e
centralizadoras.
Grundy, citado por Sacristán6, assinala que, para o currículo cumprir a sua
função emancipadora, o jovem precisa ser visto como práxis, apoiada em uma
reflexão, uma interação entre o refletir e o atuar. A práxis acontece em um mundo real
em condições concretas, através de interações entre os agentes, o contexto, as
condições de ensino e de aprendizagem. Logo, pode-se entender que o conteúdo do
currículo é um processo social, pois ao aprender os alunos se tornam participantes,
construtores de seu próprio saber.
A prática ocorre em uma situação social complexa. Cada participante do
processo – os agentes – age sob a orientação de uma certa ordem de ações ou
regras. O currículo é um artefato histórico, social, político, pedagógico e prático. Dessa
forma, precisamos compreender o caráter duplo do currículo: teórico e prático. Pode-
se depreender daí que ele é um fenômeno social e educativo, é a ponte entre esses
dois mundos.
Essa concepção busca focar o currículo como um fenômeno que está
ocorrendo, isto é, busca descrever e compreender o processo, seu desdobramento na
prática.
É fundamental compreender que o currículo não deve estabelecer regras
gerais, generalizações sobre o que deveria ser feito, mas adotar uma perspectiva
prática e teórica. Essa relação social e cultural modela a própria prática concreta, a
qual também é afetada por ela. Agora podemos compreender a complexidade e a
circularidade das relações entre teoria, prática, currículo, construção social, cultural,
histórica e crítica, ensino e aprendizagem. Compreender as relações do currículo com
o mundo externo e interno é um dos objetivos dessa teoria curricular.
O currículo também pode ser classificado em dois grandes grupos, conforme
orienta Paixão et al7: o que aceita o currículo como um plano; e o que considera o
currículo como um processo.
Segundo os autores, a primeira categoria considera as propostas tradicionais e
as propostas tecnicistas, enfatizando sempre o plano, o ambiente, o conteúdo e as
regras da organização escolar.
O segundo grupo abriga as concepções do currículo de forma dialética,
dialógica, ou seja, um processo em que todos os envolvidos tem participação e são
agentes do processo: alunos, professores etc. Nesse sentido, podemos encontrar a
participação do aluno na construção de seu conhecimento, na organização do
ambiente, oportunizando situações capazes de provocar a cognição, a emoção e a
construção social do conhecimento. Também há lugar para a práxis, para a relação
25
entre a teoria e a prática através de uma ponte de aproximação entre as
compreensões teóricas e as práticas educativas.
Em geral, nas perspectivas apresentadas, o currículo tem como função
preparar um cidadão consciente, que domina um conjunto de conhecimentos
fundamentais para a sua formação social e profissional – em vista de seu ingresso no
mercado de trabalho. Essa formação ocorre através de atividades planejadas e
organizadas dentro de um espaço formal de educação, com supervisão ou
acompanhamento de professores, cuja atuação respeita normas e regras.
Essas perspectivas tem, ainda, um caráter epistemológico, o que nos ajuda a
compreender o mundo em que vivemos. Internalizar o conhecimento nos possibilita
assumir novas maneiras de nos relacionar com o saber.
Podemos, então, compreender porque a definição de currículo é tão complexa,
uma vez que, ao se buscar defini-lo, depara-se com complicadores sociais, políticos,
históricos, administrativos etc., criando-se alternativas de se ter um currículo como
forma de manutenção ou de manipulação de posicionamentos políticos e sociais.
Outros aspectos que fazem parte da organização curricular têm valores determinantes,
e muitas vezes, não nos interessamos por questões do currículo, da manutenção do
pensamento e da formação do corpus geral relacionado à educação e ao
desenvolvimento da sociedade.
Esses pontos de vista nos colocam na condição de problematizadores de
ideias relativas ao currículo. Talvez seja interessante pensar o currículo como o fez
Ferraço8 ao conceituá-lo como “redes coletivas de fazeres e saberes dos sujeitos que
praticam o cotidiano”. Sob esse prisma, vários são os currículos e as formações
possíveis de se realizar, pois os conhecimentos se processam através das redes de
saberes e fazeres na sala de aula, na prática. Dessa etapa, surge a ideia do currículo
praticado.
Carvalho9 esclarece que o currículo pode ser entendido “a partir dos processos
e produtos em circulação nas práticas discursivas engendradas no trato da questão da
diferença na prática escolar curricular”. O currículo pode assumir, segundo a autora, a
forma de concebido e vivido. Entende-se o concebido, aqui, como currículo formal. No
nível do vivido indica o que efetivamente se manifesta, a concretização do concebido .
PONTO FINAL
O currículo pode ser compreendido de diferentes maneiras ou sob diferentes
perspectivas teóricas. Nesse capítulo exploramos o currículo enquanto um aparato
exigido pela tradição acadêmica, como um recurso que valoriza e proporciona que os
alunos aprendam pela experiência, como um instrumento que pode assegurar a
26
eficiência nos resultados buscados pela escola, e como uma ferramenta que privilegia
a prática e não apenas a teoria. Também é possível compreender o currículo enquanto
um plano (formal, técnico, menos aberto à participação) e enquanto um processo
(prático, dinâmico, mais aberto à participação). Essas perspectivas permitem-nos
vislumbrar aspectos que tornam o currículo um fenômeno significativamente complexo.
ATIVIDADE
Compare os currículos de mesmos níveis de educação em dois países diferentes.
Faça algumas observações sobre os currículos e suas características e semelhanças.
4 A ORGANIZAÇÃO SOCIAL E A SELEÇÃO CULTURAL DO CUR RÍCULO
O currículo reflete o projeto educativo, considerados diversos aspectos a ele
implícitos – a cultura, o desenvolvimento pessoal e social, os conteúdos organizados
em disciplinas ou matérias.
A teoria moderna do currículo tem, cada vez mais, gerado uma sobrecarga
curricular ao sugerir ou estabelecer novos conteúdos necessários à formação dos
alunos. Torna-se preciso, por exemplo, que a escola inclua em seu escopo curricular
noções sobre higiene pessoal, educação sexual, educação para o trânsito, educação
ambiental, consumo de drogas etc. No entanto, a escola já sente dificuldades para
prover suficientemente uma formação baseada nos conteúdos tradicionais, dificuldade
essa que se amplia quando ela assume o compromisso de prover os alunos com
novos saberes.
A necessidade de dar conta de todas as áreas do saber é uma preocupação da
escola na medida em que não se consegue estabelecer um núcleo básico de
conhecimento e de cultura para todos. Muitas áreas são importantes e escolhidas para
formar esse grupo de conhecimentos necessários para a formação dos alunos.
Sacristán1, nesse aspecto, sugere as seguintes áreas: artes e ofícios, meio ambiente,
habilidades e raciocínio matemático, estudos sociais, cívicos e culturais, educação
para a saúde, conhecimento científico e tecnológico, comunicação, pensamento moral
e mundo do trabalho. Essa seleção baseia-se, segundo o autor, na busca de
”elementos básicos para iniciar os estudantes no conhecimento e acesso aos modos e
formas de conhecimentos e experiência humana, aprendizagens necessárias para a
participação em uma sociedade democrática”2.
Essa é apenas uma das opções de seleção. O conflito de interesses no sentido
de selecionar a melhor base de conhecimentos para a sociedade, leva a compor um
universo muito extenso de conteúdos, além de não parecer neutra a escolha desses
conteúdos. O currículo determina a todos os alunos que alcancem níveis que somente
um número pequeno de alunos pode atingir – ou, em outros termos, a distribuição da
cultura e do conhecimento não ocorre de forma homogênea na população.
Assim, a cultura de um currículo obrigatório e comum para todos não é justa e
adequada no sentido de oferecer oportunidades iguais a desiguais. No currículo
tradicional, o princípio de seleção foi dirigido à cultura da classe média e alta, o que
tem causado o fracasso dos alunos das classes menos favorecidas.
A tarefa de selecionar os conteúdos que devem constituir o currículo da
população não parece ser fácil, uma vez que não há consenso a respeito do que é
básico ou fundamental para os alunos de um determinado grupo social, pois não
28
estamos levando em conta as diferenças individuais entre os alunos, grupos,
comunidades e sociedades. Sacristán3 assevera que ”em caso de oportunidades
desiguais, o currículo deve se tornar, pelo menos, um elemento de compensação, já
que não poderá sê-lo de total igualdade”.
É fundamental salientar o que escreve Cornall, citado por Sacristán4:
Há grupos de alunos de baixo rendimento que encontram pouca satisfação no trabalho atual nos últimos anos da educação obrigatória, e devemos aceitar o objetivo de melhorar sua moral e seu rendimento. Mas não é evidente que a solução consista em dar relevo a sua singularidade e segregá-la, conta todos os princípios não-seletivos, numa categoria especial, em lugar de nos perguntarmos que mudanças devemos fazer, em enfoques, em método, em material, com o fim de lhes ajudar a gozar dos benefícios de um currículo comum bem pensado que tenha por objeto satisfazer as necessidades que têm em comum com todos seus contemporâneos e com seus futuros concidadãos.
Sacristán5 observa que “esse é o sentido da educação compreensiva, na qual
se realiza um currículo básico igual para todos, fazendo esforços na formação do
professorado, adaptação metodológica e na organização escolar, para que todos os
alunos possam obter um mínimo de rendimento”.
Portanto, parece que o currículo deveria proporcionar alternativas para lidar
com as diversidades que se refletem em cada realidade social e cultural. As
diversidades podem ser tratadas de diversas formas, tais como: oportunizar currículos
diferenciados; ofertar disciplinas opcionais; moldar o conteúdo interno; criar atividades
compensatórias na entrada do aluno; propor novas metodologias; ofertar caminhos
curriculares diferenciados. Além disso, temos que enfrentar a demanda do mercado de
trabalho, que não leva em consideração as diferenças e exige uma formação geral e
profissional mais flexível.
O currículo para todos, com núcleo comum, precisa ser ressignificado, levando
em consideração os diferentes sentidos da cultura, do conhecimento dos grupos
sociais e suas possibilidades culturais e determinantes históricos. Não é possível
formar para o mercado de trabalho e para a ascensão dentro da estrutura educacional,
sem cair nas duas escolas: para pobres e para ricos.
O aumento de conteúdos no currículo – como, por exemplo, educação sexual e
educação para o trânsito – não representa uma solução para a questão da
diversidade, pois esses acréscimos acabam trazendo resultados negativos pensando-
se nos resultados alcançados na educação como um todo. Nesse aspecto, Sacristán6
afirma que “ampliar conteúdos curriculares, sem uma mudança qualitativa [...] para os
professores e para os alunos, assim como nos procedimentos de transmissão, sem
29
uma atitude diferente frente aos mesmos, agravará os defeitos atribuídos à educação
tradicional”.
Entretanto, esses pontos de vista não têm auxiliado a reduzir o efeito da
tendência de ampliar os conteúdos no ensino, em detrimento de um currículo que
pretende ser socializador. Esse movimento tem como base uma visão eficientista,
capitalista, que busca melhorar resultados em uma fase de intenso tecnicismo
educacional, o que alguns tem chamado de back to basics, ou seja, retornar as
alternativas eficientes do modelo neoliberal.
As instituições educacionais têm dificuldades de assimilar mudanças no
currículo, pois precisam fazer muitas mudanças em sua estrutura. Para tanto, elas
acabam fazendo algumas adaptações no currículo vigente para acomodar as
mudanças propostas pela sociedade – através de atividades extras, atividades fora da
escola, projetos, feiras, atividades de visita etc. –, mas todas essas alternativas
acabam não trazendo a mudança de qualidade necessária para que o currículo possa
ser transformado com base na diversidade. Outro fator não compreendido dessa
inadequação do currículo às mudanças é que elas continuam ocorrendo dissociadas
da aprendizagem experiencial dos alunos.
A instituição educacional também não utiliza o potencial que as novas
tecnologias podem representar no currículo como agente cultural. Esse papel das
tecnologias pode ser ampliado e articulado nas atividades e tarefas realizadas na
escola, fazendo com que os alunos possam usufruir de metodologias diferenciadas
que facilitem a aprendizagem.
A escola encontra dificuldades em definir e escolher os conteúdos curriculares
mais adequados no que diz respeito aos problemas sociais de seu entorno. Isso
aumenta a pressão sobre a escola e sobre a comunidade escolar – professores,
alunos, pais, funcionários etc. –, ocasionando uma escola paralela, que atua fora das
aulas formais, com horários diferenciados, envolvendo conflitos entre metodologias.
Sacristán7 assevera que a
mudança dos currículos para a educação [...] deveria considerar essa situação cultural em nossa sociedade, aproveitar decididamente todos os meios de que hoje se dispõe. [Além disso], a melhora da qualidade do ensino deve partir dessas novas realidades culturais.
Escolas que se localizam em regiões socialmente desprivilegiadas tendem
também à estarem desatualizadas e curricularmente inadequadas, em detrimento de
seus alunos. Por sua vez, os alunos dessas escolas normalmente não valorizam a
cultura e o conhecimento, são desmotivados, sem interesse e abandonam e
representam um número significativo nas estatísticas de evasão escolar. Para os
30
alunos de classes mais abastadas, ao contrário, há mais interesse pela aprendizagem,
assim como maior participação em cursos, projetos etc.
Ao mesmo tempo em que todos os aspectos até aqui apresentados
demonstram a necessidade de efetuar mudanças no currículo e na escola, a
sociedade continua a enfatizar a classificação e a validação acadêmica para o
mercado de trabalho, através do currículo de formação geral e formação profissional.
Com isso, podemos entender que o modelo de transmissão de saberes acaba sendo
reforçado, gerando o currículo oculto, o que coloca em questão os papéis
desempenhados pela escola e pelo sistema formal de educação.
Sacristán8, nesse aspecto, afirma que “a escola, numa sociedade de mudança
rápida e frente a uma cultura sem abrangência, tem que se centrar cada vez mais nas
aprendizagens essenciais e básicas, com métodos atrativos para favorecer as bases
de uma educação permanente, mas sem renunciar a ser um instrumento cultural”.
O currículo é, em última análise a cultura contextualizada, selecionada,
organizada em um formato pedagógico. O currículo, então, possui um formato como
resultado dos objetivos, dos meios, das tecnologias envolvidas para sua expressão.
Portanto, todo currículo apresenta uma ordem, métodos, meios de transmissão. Ele
também é um código, uma linguagem, uma mensagem. O currículo fala, expressa seu
desejo, sua intenção, é ativo e realiza-se em um contexto, tem sentido e opera
sentidos também.
De acordo com King e Brownell, citados por Sacristán9, o currículo envolve a
seleção de conteúdos ou conhecimentos, e há diferentes dimensões do conhecimento:
a) Um campo de conhecimento é uma comunidade de especialistas e professores que compartilham uma parcela do saber ou um determinado discurso intelectual com a preocupação de realizar contribuições para o mesmo; b) Uma área de conhecimento é expressão de uma certa capacidade de criação humana, dentro de um determinado território especializado ou em facetas fronteiriças entre vários deles, cuja dinâmica se mantém, seguindo certos princípios metodológicos, mas que também se alimenta de impulsos imaginativos, súbitos e oportunos; c) Uma disciplina ou campo especializado de conhecimento é um domínio, um território, mais ou menos delimitado, com fronteiras permeáveis, com uma certa visão especializada e, em muitos casos, egocêntrica, sobre a realidade, com um determinado prestígio entre outros domínios, com conflitos internos e interterritoriais também, com uma determinada capacidade de desenvolvimento num determinado momento histórico etc.; d) Um campo de conhecimento é uma acumulação de tradição, tem uma história [...]; e) Um âmbito de saber está composto por uma determinada estrutura conceitual, formado por ideias básicas, hipóteses, conceitos, princípios, generalizações aceitas como válidas no momento de seu desenvolvimento [...]; f) Uma área de saber é uma forma de indagar, tem uma estrutura sintática. O campo é composto de uma série de conceitos básicos ligados por relações entre eles [...]; g) Os campos de saber supõem linguagens e sistemas
31
de símbolos especializados, que criam mundos de significações próprias, em diferentes graus segundo as disciplinas de que tratem, com facilitação consequente da comunicação precisa que esses códigos permitem e com a dificuldade de aproximar o conhecimento aos que não possuem [...]; h) As diferentes esferas do saber constituem uma herança ou acumulação de informação e contribuições diversas materializadas em tipos diversos de suportes, que representam as fontes essenciais para a continuidade do próprio campo [...]; i) Uma disciplina é, inclusive, um ambiente afetivo que não se esgota na experiência intelectual. Expressa valores, formas de conceber os problemas humanos e sociais, um tipo de beleza; tem ou poderia despertar certo dinamismo emocional, possui também uma dimensão estética. Esse componente é inerente à criação do saber e deveria ser considerado nas experiências para seu ensino, cultivando atitudes etc.
O desenvolvimento do saber em geral e o de cada campo especializado impõe
mudanças profundas nos modelos de conhecimento, ou paradigmas científicos e de
criação, mudanças no conceito de conhecimento, no entendimento do que é saber e
sua utilidade.
Avaliar a relatividade da verdade do conhecimento, ou seja, ter a perspectiva
de que o conhecimento modifica constantemente e que não há conhecimento eterno
que não possa ser reinventado, torna necessário fazer com que o currículo seja
continuamente revisado quanto à seleção de conhecimentos que o compõem. Essa
revisão, essa mudança, obriga o professor a modificar suas aulas para que o
conhecimento tenha sentido, valor, significado para os alunos.
O currículo pode se constituir em formatos diferentes, sendo organizado, por
exemplo, em cadeiras, disciplinas, matérias, áreas de conhecimento, módulos.
Bernstein (1980) defende a ideia de currículo coleção ou de componentes justapostos,
mosaico e currículo integrado, em que os conteúdos são relacionados. O autor ainda
observa que, no formato coleção, os professores tem menos influência e poder sobre
os conteúdos. Já no integrado, o professor tem mais possibilidades de interferência e
mudança.
Os currículos por áreas do saber ou de conhecimento tendem a possibilitar o
ensino mais “interdisciplinar”, mas demanda maior participação dos professores e da
escola. Uma outra forma de conhecimento nesse formato são os projetos curriculares,
integração de componentes em um projeto mais amplo.
A especialização de professores e o currículo por cadeira, disciplinas ou
mosaico tem caracterizado os currículos escolares. Esse currículo, uma vez
implantado, acaba gerando uma série de condições e contextos que o enraíza: seu
código, sua expressão em práticas escolares. Por isso a mudança é lenta e muito
difícil de ocorrer, pois demandam alterações em projetos pedagógicos, estilos
32
pedagógicos dos professores, na administração escolar. E exige uma política de
integração e comunicação entre os participantes do processo educativo.
Sacristán10 apresenta a ordenação do currículo por ciclos. Para o autor, um
ciclo consiste em “uma unidade que engloba vários cursos, que permite uma
organização do conteúdo com um tempo mais dilatado para sua superação,
avaliação”. Para Sacristán, o ciclo oportuniza maior flexibilidade ao professor de se
adequar às necessidades de aprendizagem dos alunos, à diversidade e a mudança.
O currículo enquanto código, comunica, expressa através de sua linguagem,
determinados princípios sobre a educação, o desenvolvimento humano, a
aprendizagem, o ensino e a metodologia. Portanto, a seleção de conteúdos é
realizada tendo em mente as chances de aprendizagem dos alunos, os interesses, os
desejos de saber desses alunos, seus estilos de aprendizagem. O currículo também
expressa a melhor forma de organizar esses conteúdo, dando-lhes sentido, criando
contextos. Ele define, ainda, os meios pelos quais o ensino terá sucesso, respeitando
os princípios pedagógicos, psicológicos, epistemológicos. O processo de ensino e
aprendizagem deve ter um lócus, a definição de onde vai ocorrer, bem como um
formato de monitoramento. Nesse sentido, concordamos com Sacristán11 quando
afirma que “currículo é um projeto cultural elaborado sob chaves pedagógicas”. As
chaves pedagógicas são os caminhos da renovação do ensino e da aprendizagem.
A teoria curricular tem enfatizado a necessidade de o professor ter maior
capacidade de definição quanto à concepção do currículo e possa, a partir dos
conhecimentos e competências selecionados, moldar sua prática, estabelecendo a
ponte entre teoria e prática, transformando-se em agente do processo de construção
do saber, cultural e historicamente situado.
PONTO FINAL
O currículo reflete o conhecimento da humanidade em um determinado contexto e
tempo. Portanto, ele é uma soma de contribuições, descobertas e estudos. Neste
capítulo abordamos diferentes aspectos relativos à seleção dos conteúdos que
compõem o currículo. Constatamos que é comum a inclusão de novos temas em vista
de questões sociais ou de determinantes regionais e culturais, mas isso muitas vezes
implica em uma menor atenção da escola aos temas que compõem o núcleo comum
do currículo. Por outro lado, não deve ser descartada a diversidade cultural. Há
diferentes culturas, e o currículo escolar deveria retratar ou representar o local, o
regional e o universal ao mesmo tempo. Observamos também a complexidade da
construção social do currículo e de que forma ele contribui para interpretar as
atividades de um grupo social. Tudo isso evidencia a importância da participação dos
33
professores no processo de seleção dos conteúdos, assim como para facilitarem a
aprendizagem destes conteúdos.
ATIVIDADE
1) Elabore um mapa conceitual com as ideias fundamentais do capítulo.
2) Lembre-se de uma escola que você conheceu ou estudou e procure descrever
como era e funcionava o currículo dessa escola.
5 O CURRÍCULO ESCOLAR, APRENDIZAGEM E ESCOLA
O currículo é uma construção cultural, histórica, social que a escola torna real
através de suas práticas diárias. Essas práticas modelam princípios a partir das
dimensões da experiência, dos ambientes de aprendizagem criados e dos processos
educativos proporcionados. As práticas estabelecem interações com os participantes e
com o ambiente, gerando o contexto de aprendizagem e a consolidação do currículo
enquanto prática.
O presente estudo tem demonstrado que o currículo é o que ocorre nas salas
de aulas, nas experiências que os alunos adquirem na escola, constituindo o que se
conhece como a prática pedagógica. A complexidade do ato educativo demanda
transformações junto à comunidade acadêmica, aos processos burocráticos e
administrativos, bem como professores, conteúdos e ao mercado de trabalho. Todas
as relações entre esses elementos geram novas ações estruturantes do sistema.
O currículo exerce um papel fundamental enquanto um elemento determinante
e determinado pelas relações que ocorrem nas salas de aula, bem como nas
experiências vividas pelos alunos dentro do espaço escolar. As políticas ou princípios
educacionais estabelecidos pela instituição educacional, assim como o fazer do
professor e o fazer do aluno, constituem o currículo. Segundo Sacristán1, esses
elementos sofrem a regulação específica da legislação ou dos órgãos fiscalizadores,
do pessoal administrativo ou de gestão, dos meios didáticos, do espaço físico, do
horário, do tempo, da distribuição das turmas, do número de alunos por sala de aula,
do controle, da disciplina ou indisciplina, que são fatores interferentes e determinantes
mais próximos ou imediatos que o processo educativo sofre.
Essas forças determinantes do currículo e de seus constituintes podem ser
motivadoras de uma visão mais ecológica da construção do saber dentro do contexto
formal escolar. Os atos de educação são dependentes de ações internas dos
componentes últimos do processo: professor e aluno. Mas todos os elementos do
sistema também dependem de constituintes estruturantes externos, que ocorrem
antes, durante e depois dos atos, podendo ainda ser simultâneos ao processo. Por
isso a complexidade de se estabelecer um currículo para uma comunidade e
generalizá-lo.
Os teóricos do currículo, tais como Lundgren, citado por Sacristán2, referem-se
aos sistemas condicionadores dos processos educativos que são: o currículo, o
sistema administrativo, as regulações legais. Esses três sistemas, para o autor, são
determinados pela estrutura econômica, social, cultural e política de onde se
enquadram. Os três condicionantes estabelecem as metas, as regras para que os
35
processos educacionais ocorram. Sacristán3, buscando interpretar essa abordagem de
Lundgren, elaborou a Figura 5.1, apresentada a seguir.
Figura 5.1 - Sistemas condicionadores dos processos educativos
Fonte: Sacristán, 1998, p. 91.
Pode-se concluir que as aprendizagens proporcionadas pela constituição do
currículo são determinadas pelas relações apresentadas na Figura 5.1, não
oferecendo liberdade para professores e alunos construírem seus currículos
livremente. Ao mesmo tempo, esse mesmo sistema condicionador também estabelece
certa liberdade para trabalhar e criar dentro dessas condições. Portanto, o contexto
em que ocorrem as aprendizagens é um fator determinante para as atividades
curriculares.
O currículo, como projeto cultural, ocorre em um ambiente ou contexto que é
modelador ou “mediatizador” das atividades simbólicas de aprendizagem. Esse
mesmo contexto, somado às atividades mediadoras, deve representar um fator de
motivação para que o currículo possa ser colocado em prática: ação motivada.
O contexto, o ambiente escolar resultantes das relações e interações entre os
diferentes sistemas que se tornam presentes no currículo, geram novas relações de
ESTRUTURA
CURRI SISTEMA ADMINISTR
SISTEMA
METAS
CAMPOS DE REGRAS
PROCESSO EDUCATIVOPROCESSO EDUCATIVOPROCESSO EDUCATIVOPROCESSO EDUCATIVO
Dirigem Dirigem Dirigem Dirigem RestringemRestringemRestringemRestringem Regulam Regulam Regulam Regulam
36
aprendizagens que não esperávamos: o currículo oculto. Ele é fonte de inumeráveis
aprendizagens para o aluno, originadas pelas vivências, experiências e pelas inter-
relações entre teoria e prática.
Portanto, a criação e o desenvolvimento de ambientes de aprendizagem, ricos
e motivadores, leva à construção de uma rede de interações fundamentais para que
nossos sensores cognitivos e afetivos possam iniciar o processo de internalização e
construção das aprendizagens. Esses ambientes são os mediadores do processo de
aprendizagem, fundamental para que ela ocorra.
Os ambientes mediatizadores são os elementos que fornecem uma leitura
ecológica da aprendizagem, que leva em consideração as condições psicológicas,
sociais e culturais que afetam a vida subjetiva e escolar, bem como os elementos
externos do ambiente constituinte da educação já citados anteriormente.
Apple4, no que se refere ao ambiente educacional, procura distinguir seis
elementos básicos:
- a estrutura física da escola, ou a arquitetura;
- os materiais e tecnologias;
- os sistemas simbólicos e de informação;
- as habilidades dos professores;
- os estudantes e outros componentes auxiliares;
- os gestores e a relação de poder.
Autores como Schubert5, ampliando os aspectos anteriores, citam as
dimensões do ambiente escolar:
- física;
- material;
- interpessoal;
- institucional;
- psicossocial.
Independente das categorias elencadas pela teoria curricular – como currículo,
escola, estrutura administrativa, professores, conteúdos –, pode-se compreender que
os ambientes e os formatos de aprendizagem dependem da forma como esses
componentes atuam no planejamento e na organização das etapas do ato educativo.
As ações e os fluxos resultantes do contexto levam à aprendizagem e ao
monitoramento desse processo. O monitoramento ou a avaliação é uma das etapas
fundamentais do processo educativo, pois as aprendizagens formais são atividades
avaliadas, controladas.
Esses processos educativos nos possibilitam intuir os currículos escolares
modificados, assim como implicam em uma mudança no conceito e conteúdo da
37
competência docente, sua formação cultural e pedagógica. Mudanças no currículo
demandam uma dinâmica social nova, um novo professor. Essas competências
requerem também uma formação aberta do professor. Um currículo diferenciado
obriga o professor a se desenvolver e criar novas metodologias e saberes,
modificando a relação professor-aluno que atualmente é muito diferente.
Por outro lado, o professor, na sociedade em que vivemos, heterogênea e
pluralista, tem dificuldades de se modificar, pois as condições ambientais e contextuais
são determinantes. Nessas condições, ele sente uma contradição entre manter sua
prática dentro do modelo curricular dominante ou tentar a mudança para um currículo
mais rico e criativo. Os professores, orientando-se segundo o modelo curricular
vigente, favorecem o crescimento acadêmico dos alunos para que possam atingir os
estudos superiores, seguindo a lógica das disciplinas e do modelo por coleção.
A transformação das relações pedagógicas, resultantes das combinações dos
elementos acima expostos, incluindo o ambiente educativo de forma ampla, faz com
que as relações de poder sejam, de certa forma, ampliadas entre: professores, alunos,
gestores, currículo, administração etc.
O currículo é um artefato que se constitui no processo de modelação,
implantação e operacionalização da cultura e determinadas práticas pedagógicas.
Dessa forma, podemos antever que o currículo gera fenômenos internos e externos de
relações e interações que se entrecruzam entre práticas deferentes com subsistemas
políticos, administrativos, didáticos, metodológicos e de controle ou avaliativos. Esses
subsistemas atuam sobre os componentes do currículo de forma dialógica e em
diferentes situações e momentos: seleção de conteúdos, atividades pedagógicas,
práticas pedagógicas e avaliação.
Nessas relações, pode-se ver que os participantes do ato educativo devem ser
considerados agentes. O currículo, portanto, é um artefato que em sua volta produz
um universo novo de interdependência e relações, constituindo-se em um “sistema
curricular”. Nesse sistema, as decisões não ocorrem de forma reta, linear ou
determinada, válidas para todas as relações. Trata-se de um sistema determinante e
determinado ao mesmo tempo, que gera uma área de convergência em certos
momentos e de divergência em outros.
Sacristán enfatiza que a constituição curricular respeita uma dinâmica assim
descrita:
Podemos considerar que o currículo que se realiza por meio de uma prática pedagógica é o resultado de uma série de influências convergentes e sucessivas, coerentes ou contraditórias, adquirindo, dessa forma, a característica de ser um objeto estático, mas como a expressão de um equilíbrio entre múltiplos compromissos. E mais
38
uma vez esta condição é crucial tanto para compreender a prática escolar vigente como para tratar de mudá-la.6
O mesmo autor também observa que: a visão do currículo e sua constituição
exige um tipo de intervenção ativa discutida explicitamente em um processo de
deliberação aberto envolvendo: professores, alunos, pais, forças sociais, grupos de
criadores, intelectuais, evitando a mera reprodução de decisões e modelações implícitas,
históricas.7
O currículo, já escrevemos em outro momento, adota diferentes significados,
pois é dependente de enfoques paradigmáticos diferenciados e utilizados em
momentos diferentes das teorias curriculares que explicam o desenvolvimento
curricular.
Teóricos como Brophy, citado por Sacristán, procuram descrever o processo de
desenvolvimento do currículo e as etapas ou fases nele envolvidas. Para ele, “o
currículo se transforma, modifica ou se reduz a um currículo oficial, a partir das
transformações que o professor introduz pessoalmente, o que realmente os alunos
aprendem“8. Em seguida, Sacristán distingue seis fases ou níveis no processo de
desenvolvimento do currículo:
[1] O currículo prescrito: o sistema educativo estabelece algum tipo de orientação do que deve ser o conteúdo e sua obrigatoriedade; [2] O currículo apresentado aos professores: o currículo apresentado aos professores em geral apresenta traduções ou interpretações do currículo prescrito, uma vez que são muito gerais suas orientações e o nível de formação dos professores e as condições de trabalho não permitem que façam a modelação do currículo; [3] O currículo moldado pelos professores: o professor é um agente ativo na concretização dos conteúdos e significados construídos pelo currículo a partir de sua cultura, de sua formação profissional. O professor é um tradutor e interpretador das políticas curriculares oferecidas pela instituição; [4] O currículo em ação: é o que ocorre nas tarefas acadêmicas, ação pedagógica, orientada pelos esquemas teóricos e práticos do professor; [5] O currículo realizado: são os efeitos da prática, isto é: efeitos cognitivos, afetivos, social, moral etc. Esses efeitos além de atingirem a formação do aluno também afetam os professores, a comunidade escolar; [6] O currículo avaliado: são os controles, o monitoramento, impõe critérios para o ensino do professor e para aprendizagem dos alunos.9
O modelo a seguir (Figura 5.2) procura representar a explicação das etapas
apresentadas por Sacristán, lembrando que não se trata de uma norma, mas uma
tentativa de descrever e explicar uma interpretação da teoria curricular.
Figura 5.2 – Currículos praticados
39
Fonte: Sacristán, 1998, p. 105.
O currículo, enquanto um construto teórico-prático, precisa fornecer uma
concepção de sua organização social, cultural e histórica. O currículo, portanto, deve
deixar claro o contexto em que está inserido, as condições em que seu
desenvolvimento e implementação vão ocorrer. Os elementos que participam dessas
relações compõem o sistema curricular e seus subsistemas, tendo implicações na
ordenação e coordenação do sistema e das ações educativas, no ensino e na
aprendizagem, na construção da instituição educacional e no fortalecimento do papel
social e cultural que ela exerce.
PONTO FINAL
O currículo, como apresentamos até aqui, é um artefato construído, criado,
desenvolvido para caracterizar as possíveis relações existentes entre o conhecimento,
o sujeito, os valores, o poder e a comunidade escolar. Tal relacionamento se dá
através das relações, interações, trocas que se estabelecem entre esses agentes, o
CURRICULO
CURRICULO
CURRICULO MODELADO CURRICULO MODELADO CURRICULO MODELADO CURRICULO MODELADO
ENSINO
Currículo realizado: efeitos Currículo realizado: efeitos Currículo realizado: efeitos Currículo realizado: efeitos
complexos, explícitoscomplexos, explícitoscomplexos, explícitoscomplexos, explícitos----ocultos, ocultos, ocultos, ocultos,
CURRÍCULO
Con
dici
onam
ent
Cam
po e
conô
mic
o .p
olíti
co, s
ocia
l ,
Cam
po e
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mic
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olíti
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l ,
Cam
po e
conô
mic
o .p
olíti
co, s
ocia
l ,
40
contexto e o objetivo final da construção. As interações desenvolvidas são resultantes
das oportunidades ou situações desenvolvidas pelos professores e os contextos .
Essas interações são determinadas por uma série de elementos que constituem o
conjunto ou o contexto – a cena educacional: as políticas, as direções, o espaço físico,
os profissionais da educação, os alunos e as tarefas propostas. As relações que
ocorrem entre esses elementos nos permitem pensar em currículos que são
constituídos e constituintes ao mesmo tempo do contexto educacional: o currículo
prescrito, o currículo percebido pelo professores, o currículo executado, o currículo
esperado e o currículo como prática social.
ATIVIDADE
Redija um texto sobre os tipos e formatos de currículos, descrevendo como a
aprendizagem ocorre em cada formato.
41
6 A ORGANIZAÇÃO DO CURRICULO: ASPECTOS POLÍTICOS
A escola estabelece seus princípios e valores a partir da forma como leva a
seus alunos suas propostas de ação e atuação junto à sociedade. Para tanto, ele se
utiliza de uma sequência de conhecimentos ou conteúdos que devem levar os alunos
a aprender e transformar seu mundo. A essa organização de conteúdos e
aprendizagens que deve acontecer na escola, chamamos de currículo.
O currículo prescrito é aquele que é determinado pelas políticas educacionais
ou políticas curriculares estabelecidas pelos governos. Conhecidos como parâmetros,
são estabelecidos de forma hierárquica, ou seja, do poder central para a escolas que
precisam selecionar e ordenar os conteúdos que devem constituir o currículo do
sistema oficial de educação de uma comunidade, de um grupo, de uma escola,
estabelecendo as relações de poder e influência que o currículo tem sobre os agentes
educativos: professores, alunos e comunidade educacional.
O currículo determinado pelo sistema dominante, a direção, o governo, através
de suas políticas, para os professores e para o sistema educativo, envolve os
conteúdos e orientações relacionadas a como organizar o saber acumulado através do
tempo, bem como os códigos que expressam esse saber em unidades de
conhecimento para internalização dos alunos nos sistema educacionais.
No geral, a política curricular não se estabelece e não se impõe como uma
norma explícita. Muitas vezes apresenta-se estabelecendo parâmetros gerais,
conteúdos mínimos para atender as demandas de aprendizagem de uma determinada
comunidade de aprendizagem. Outras vezes, apresenta sugestões desconexas,
difusas, dispersas em um conjunto de normas, sem ter um caráter coercitivo,
cumprindo o papel de indicar intenções e desejos curriculares.
Mas é clara a intenção da política de melhoria da qualidade da educação, ou
seja, o desejo de que ocorra a melhoria da educação, mas, ao mesmo tempo, busca-
se um modelo padrão para essa melhora, desconsiderando os aspectos culturais das
comunidades em que se inserem. Portanto, há uma falta de clareza do modelo político
voltado ao currículo e suas implicações na construção do conhecimento dentro de uma
escola.
A política curricular determinada por uma instituição poder ter um formato, ou
representar um modelo que contribui para dar uma forma ou estrutura ao conjunto de
conhecimentos necessários para o currículo se estabelecer. Para tanto, é necessário
conhecer alguns elementos que intervêm nessa estrutura:
- as formas de estabelecer uma determinada organização e ordem do
conhecimento no sistema educativo;
42
- os processos de tomada e execução das decisões nas instituições,
descentralizadas;
- os processos de monitoramento e controle que asseguram acompanhar o
cumprimento dos objetivos;
- os mecanismos explícitos e implícitos adotados para exercer o controle
sobre a prática pedagógico presente no currículo;
- as possibilidades de inovação do currículo através da ação dos professores
e da interação destes com os alunos e a comunidade escolar;
- as estratégias que possibilitam mediatizar as instâncias de poder que agem
sobre o currículo.
Pode-se inferir que a instância inicial, apresentada até agora, é a político-
administrativa, pois ela estabelece a ordem em que os conteúdos devem ser
apresentados à comunidade em função de suas propriedades sociais e da prática
pedagógica necessária para torná-la um objeto de conhecimento a ser construído pela
comunidade escolar.
A escolaridade obrigatória, determinada pelas diretrizes curriculares de uma
sociedade, busca um denominador comum, uma homogeneização das estruturas
educacionais ou componentes curriculares para os alunos, ou seja, a busca de um
currículo básico geral para todos.
A ideia de um currículo mínimo comum está relacionada com a intenção de
uma escola comum, igual para todos. Nesse currículo são previstos os conhecimentos
estabelecidos como verdades universais e válidos para todos os ciclos da educação.
Argumenta-se que o currículo mínimo e comum também é necessário por facilitar a
adaptação dos alunos nos casos de transferência escolar. E ele se torna ainda mais
necessário se considerarmos que nossas sociedades registram diferenças culturais,
sociais e políticas, assim como desigualdades socioeconômicas.
O currículo comum determinado pelas políticas educacionais propõe uma
educação homogênea para todas as escolas e comunidades escolares. A existência
de um currículo mínimo válido para todos tem como princípio que a cultura é igual para
todos.
Para Sacristán10 a ideia de um currículo prescrito é:
a definição de [currículos] mínimos para o ensino obrigatório não é, pois, um problema puramente técnico ou de regulação burocrática do currículo, mas sim adquire uma profunda significação cultural e social, expressando uma importante opção política(...). Neste aspecto a política curricular se converte num elemento da política educativa e cultural (...)para a comunidade. Na decisão de que cultura se define como mínima e obrigatória está se expressando o tipo de normatização cultural que a escola propõe aos indivíduos, os
43
padrões pelos quais todos serão, de alguma forma, avaliados e medidos, expressando depois para a sociedade o valor que alcançaram nesse processo de normalização cultural.
A regulação ou intervenção ou modelação do currículo ocorre de diferentes
formas e variados aspectos: conteúdos, códigos, meios, progresso da escolaridade,
tempo de aprendizagem, oferta, material didático, mobiliário, avaliação etc.
Dessa forma, ordenar a prática curricular supõe condicionar o ensino. A
administração do sistema educacional tem sempre a intenção de regular e controlar o
sistema curricular como uma política de formação, ligando os meios técnicos e
pedagógicos para a construção de um conhecimento considerado verdadeiro e
aprovado segundo os interesses do mundo do trabalho. Há a intenção de estabelecer
o controle do processo pedagógico através de atividades e tarefas desenvolvidas para
esse fim.
Sacristán11 afirma que:
a ordenação e a prescrição de um determinado currículo por parte da administração educativa é uma forma de propor o referencial para realizar um controle sobre a qualidade do sistema educativo. O controle pode ser exercido por meio da regulação administrativa que ordena como deve ser a prática escolar, ainda que seja sob a forma de sugestões, avaliando essa prática do currículo através da inspeção ou por meio de uma avaliação externa dos alunos como fonte de informação.
As formas de estabelecer o controle do desenvolvimento curricular, segundo
Sacristán12, podem ser
a) [...] através das relações burocráticas entre o agente que controla e o professor ou escolas controladas, e supervisionando, através da inspeção, a qualidade da prática do próprio processo educativo; b) avaliação ou controle centrado nos produtos ou rendimento que os alunos obtêm que, para ter valor de contraste e comparação entre as escolas, grupos de alunos etc., deve ser realizado desde fora, não sendo válidas as avaliações que os professores realizam.
Segundo o autor, o primeiro modelo procura atuar nas condições do ensino, já
o segundo nos produtos da aprendizagem. O primeiro modelo busca homogeneizar os
conteúdos de ensino, o processo de ensino e de aprendizagem através da regulação
dos materiais didáticos. Tenta controlar e definir todos os elementos que constituem a
prática, exceto a prática dos professores. Já o segundo exerce controle sobre os
produtos pela avaliação dos sistemas educacionais de forma externa, sujeitando o
processo pedagógico ao tipo de conhecimento e padrão de rendimento estabelecido
externamente.
44
Outra forma de controle são os meios didáticos, que são resultado das
diretrizes curriculares e dos conteúdos mínimos. Essa intervenção se dá através da
produção de materiais didáticos, pois os conteúdos se tornam realidade cognitiva,
afetiva, cultural e social através dos meios que os professores e os alunos usam para
a construção do saber. Uma vez definido o conteúdo a ser ensinado, o processo
pedagógico a ser adotado, bem como as formas de avaliação e controle do processo
de ensino-aprendizagem, o currículo e a escola estarão cumprindo a sua função
socializadora.
O controle do material a ser utilizado na prática pedagógica – o livro didático
escolhido – como referência para o “saber” do professor e do “fazer” do aluno,
demonstra como é possível manter uma unidade do currículo entre os alunos e suas
aprendizagens. Com isso, deseja-se superar o problema da falta de tempo dos
professores para elaborar e preparar os conteúdos estabelecidos pelo currículo ou
repensar a estrutura do mesmo, partindo da necessidade cultural da comunidade. Na
realidade, a carga horária dos professores e a carga de trabalho semanal fazem com
que eles tenham dificuldade de pensar o currículo regionalmente e globalmente,
aceitando as imposições do modelo centralizador do currículo – ou seja, currículos
iguais para realidades sociais e culturais diferentes.
A forma final de um currículo, dependendo da maior ou menor interferência dos
subsistemas educacionais, será resultado da intervenção das políticas sobre a
organização educacional das escolas, bem como uma consequência da prática
pedagógica, dos conteúdos, do material didático e das metodologias. A estrutura do
currículo descreve as funções que devem ser exercidas na comunidade educacional.
O poder do currículo se manifesta então na sua constante intervenção
burocrática e tecnocrática no ensino, diminuindo como consequência a autonomia ou
liberdade do professor como agente do currículo. Essas intervenções diretas
caracterizam uma cultura curricular que produz alguns efeitos na cultura educacional
de uma sociedade.
O currículo, nesse formato, acaba influenciado definitivamente na escolha dos
conteúdos, nas aprendizagens, no modelo de competências, habilidades e atitudes
que ele considera básico, de acordo com a demanda da sociedade.
Macedo13, ao analisar o currículo escolar e o mundo do trabalho, defende que a
ideia de reunir formação escolar e mercado de trabalho não privilegia a nossa época.
A escola, segundo a autora, tem que preparar os alunos para um mundo cada vez
mais informatizado e tecnológico. Trata-se, segundo Macedo, da “migração da
racionalidade científico-tecnológica para o espaço escolar, reduzindo-o à sua
dimensão mercantil”. A escola, porém, tem resistido a esse mandamento do mercado.
45
Macedo14 acentua que a formação profissional mudou em relação ao formato
clássico de organização curricular. Para a autora, “os conteúdos do trabalho não
podem mais ser apreendidos pela experiência, exigindo [...] que os currículos
escolares privilegiam uma formação geral sólida que garanta maior flexibilidade e
elasticidade ao homem”. A autora também afirma que
as habilitações hoje existentes parecem não dar conta da nova dinâmica do processo produtivo, precisando ser remodeladas com o privilégio de uma abordagem mais generalista do conhecimento. parece-nos que o discurso do mercado solicita da escola currículos pouco específicos, que desenvolvam principalmente comportamentos requeridos em relação ao trabalho e às correspondentes virtudes gerais necessárias ao trabalho. A formação específica seria garantida pelas próprias empresas, que atuariam nas brechas abertas pelas disfuncionalidades das escolas e universidades.15
E conclui observando que a “nossa tradição de ensino humanista facilmente
nos faz aceitar que a formação profissional fique a cargo das empresas”16. No entanto,
a autora reflete sobre a necessidade de a escola repensar sua posição.
O poder do currículo pode ser observado também na dificuldade de apresentar
soluções metodológicas e pedagógicas para operacionalizar as escolhas dos
conteúdos no processo educativo.
A máquina burocrática, isto é, a forma como a escola passa a agir , tendo como
base a ideia de administração científica ou gestão por resultados, assume o poder de
execução das propostas educacionais ou das políticas que possibilitam reunir teoria e
prática em um modelo pedagógico adequado. O efeito dessa burocracia é desastroso,
pois desestimular o professor descaracteriza a sua profissão, inibe a criatividade e cria
barreiras para uma educação “melhor”, pois se reduz a uma relação individualista,
hierárquica entre o professor e a burocracia que diz ser sua orientação a adequada
para aquelas crianças, classe, turma e comunidade. O professor torna-se uma
ferramenta de transmissão de conteúdos e de formas de pensar, repetindo a mesma
relação unidirecional com os alunos, pais e sociedade em geral. Por outro lado, o
manual de orientações está estabelecido pela maquinaria burocrática: o poder sobre o
currículo transforma-se em poder do currículo.
Outro aspecto resultante dessa forma curricular é o processo de avaliação e de
monitoramento dos resultados do currículo, pois o processo administrativo, seguindo o
modelo do cientificismo, ou administração científica, busca ter o controle sobre todas
as ações educativas.
Outra forma de garantir os resultados da adoção do currículo prescrito é a
seleção e indicação de material didático que seguem as diretrizes curriculares
estabelecidas pelas políticas gerais.
46
A atuação determinante do currículo cumpre alguns objetivos, segundo
Sacristán17, que são: ”ordenar o sistema, controlar o currículo, determinar conteúdos e
métodos para os professores e regular as condições de obtenção e validação de
títulos”.
Pode-se inferir que o currículo como um artefato ou objeto produzido pela
sociedade, é orientado politicamente ao estabelecer um padrão para a formação dos
alunos e para o desempenho dos professores, utilizando-se de meios técnicos e
específicos para transmitir os saberes verdadeiros e universais acumulados pela
humanidade com o objetivo de formar cidadãos para suprir a demanda do mundo do
trabalho.
PONTO FINAL
O currículo é o espaço em que forças se estabelecem na interação entre o
conhecimento (ou o conteúdo) e os sistemas determinantes: as políticas estabelecidas
pelo poder dominante, a forma como os sujeitos têm seus direitos e diferenças
respeitadas e garantidas. No âmbito das políticas educacionais é possível definir,
escolher e determinar quais os conteúdos são importantes para determinada
comunidade escolar. A definição dos conteúdos tem como objetivo criar uma linha
única universal de pensamento e de conhecimento, ou uma homogeneização do
conhecimento, da sociedade, da cultura e do sujeito.
ATIVIDADE
Reflita e elabore um texto dissertativo sobre como o currículo determina as
aprendizagens do sujeito em uma escola.
7 O CURRÍCULO E A PRÁTICA DOCENTE
O currículo se concretiza na ação pedagógica, nos ambientes escolares
organizados para que sejam oportunizadas as situações de aprendizagem. Portanto, o
professor é um agente ativo no processo educativo. Vimos anteriormente que o
currículo orienta as ações do professor, do aluno e da comunidade escolar e, ao ser
interpretado, traduzido pelos participantes, também influencia o currículo.
O professor tem o papel de mediador nos processos de ensino no que tange à
aprendizagem a que os alunos são submetidos. Dessa forma o professor é um ator,
um agente, um modelador dos conteúdos que são selecionados e distribuídos nos
ambientes desenvolvidos e criados para sua expressão. Essa ação mediadora não
ocorre sobre os conteúdos, sobre o currículo, mas através do acompanhamento dos
alunos nas aulas, nas relações que os alunos estabelecem entre os conteúdos, entre
eles mesmos e os professores.
A ação do professor é, de certa forma, condicionada por subsistemas, mas ao
mesmo tempo ele condiciona outras etapas dos subsistemas. Portanto, a ação do
professor é condicionada. O professor não decide sua ação de forma neutra, ela
acontece em um local, envolve uma realidade e uma estrutura educacional que, por
sua vez, estabelece normas, regras, políticas, além da tradição que se transmite de
geração a geração.
De outro lado, os professores já encontram os alunos, as turmas, as salas de
aulas prontas, regidas pela administração escolar que respeita um sistema e políticas
mais amplas. O sistema organiza a educação em níveis de competência,
conhecimento, habilidade. Esse mesmo sistema organiza os meios para que o
professor possa transmitir os conteúdos aos alunos. Os alunos têm um horário e um
espaço pronto para que o ato educativo ocorra. A estrutura determinada pelo sistema,
aos poucos, passa a ser absorvida e considerada normal pelos professores, pelos
alunos, pela comunidade: é a sociedade da repetição. Esse processo leva o professor
a perder a autonomia e não reconhecer mais seu papel profissional, pois ele tornou-se
um operário executando tarefas.
O trabalho docente apresenta características específicas e, muitas vezes,
únicas ao tratar com situações e sujeitos que são únicos. Por isso a educação,
enquanto um campo de estudos, não é sustentada por teorias ou técnicas gerais.
No que diz respeito à atividade docente, Sacristán1 esclarece que:
A atividade do professor não se define na realidade, prioritária nem fundamentalmente, a partir de uma cultura pedagógica de base científica, seja qual for a acepção ou paradigma do qual se parta na
48
hora de definir um modelo de comportamento docente, mas surge de demandas sociais, institucionais e curriculares prioritariamente, prévias a qualquer proposição, às quais depois se modela e racionaliza e ataca inclusive a partir de argumentações pedagógicas. Daí a perpétua insatisfação entre as demandas de um modelo e as da situação prática dada.
O professor vive situações indeterminadas, incertas, conflitivas no sentido de
que não há uma única forma de lidar com as situações educacionais criadas em
ambientes educacionais.
Sacristán2 expressa o seu pensamento do seguinte modo no que se refere à
possibilidade de ações inovadoras na ação do professor:
A interação entre os significados e usos práticos do professor (condicionados por sua formação e experiência, que são as que guiam a percepção da realidade), as condições da prática na qual exerce e as novas ideias configuram um campo-problema do qual surgem soluções ou ações do professor que são resultantes ou compromissos a favor de um extremo ou outro desse triângulo – é o triângulo de forças da práxis pedagógica.
Para Tanner e Tanner, citados por Sacristán3, o papel do professor pode ser
caracterizado por três níveis: de imitação-manutenção, de mediador e criativo-gerador.
No nível de imitação-manutenção, o professor segue livros-texto ou manuais didáticos
como padrão. Já no nível de mediador, ele busca utilizar os materiais adequados aos
currículos e as inovações possíveis de se realizar. Enfim, no nível criativo-gerador ele
pensa sobre o que realiza, buscando sempre soluções. Para tanto, também utiliza o
diagnóstico como uma ferramenta para desenvolver soluções adequadas às situações
de aprendizagem.
O professor possui uma formação constituída de conhecimentos filosóficos,
epistemológicos, didáticos e práticos. Essa formação é o que sustenta o seu estilo de
orientação nas tarefas em sala de aula. Seu estilo de prática pedagógica implicará nos
formatos de avaliar o processo de ensino e de aprendizagem, bem como no controle
dos alunos em sala de aula. Segundo Sacristán4, o conjunto de competências e
saberes que compõem a formação docente, em geral, leva-nos a crer que os
professores orientam-se pela epistemologia cientificista – que diz respeito aos
conteúdos consagrados pelo método científico e são aceitos pela sociedade –, pois se
valoriza a objetividade da estrutura interna do conhecimento.
O professor, em geral, recebe formação pedagógica, isto é, a sua formação
inclui um conjunto de conhecimentos da área pedagógica, com o objetivo de lhe
subsidiar no desempenho da função docente.
49
Sacristán5, citando Shulman, lista os conhecimentos necessários para a
profissionalização do docente:
Conhecimento do conteúdo; conhecimento pedagógico geral que se refere a princípios amplos e estratégias para governar a classe; conhecimento do currículo como tal, especialmente dos materiais e programas; conteúdo pedagógico que presta ao professor sua peculiar forma de entender os problemas de sua atividade profissional; conhecimentos dos alunos e de suas características; conhecimento do contexto educativo; conhecimento dos fins educativos, valores e seu significado filosófico e histórico.
As atividades docentes que o professor realiza resultam dos saberes e
competências que obteve em sua formação, incluindo a dimensão científica e cultural
nela implícita. O professor, desse modo, utiliza o conteúdo curricular a partir de suas
concepções epistemológicas, bem como da sua prática pedagógica.
As concepções epistemológicas dos professores estão relacionadas com a
cultura geral exterior e interior, isto é com sua formação pessoal e com a formação
formal nos bancos universitários , com a pedagogia, com os modelos educativos
determinados histórica e culturalmente.
Sacristán6 também nos permite compreender que ao professor cabe refletir
sobre o conhecimento e suas implicações. Em relação ao conhecimento, o autor
chama a atenção à necessidade do professor saber
como se ordena, que papel se conceber para sua relação com a experiência do que aprende, qual é sua transcendência social e sua relação com a vida cotidiana, qual é sua origem, como se valida, como evolui, a ponderação de seus componentes, como se comprova sua posse. Esses são aspectos cruciais sobre os quais se interrogar num modelo de ensino para analisar sua especificidade. O professor não tem muitas oportunidades de tratar essas dimensões epistemológicas dos métodos didáticos e nos currículos, nem são, com frequência, sequer discutidas no transcurso de sua formação. Suas posições a respeito, ainda que sejam implícitas, costumam ser adquiridas e assimiladas por osmose, e não é fácil que possa expressá-la de forma vertebral e coerente.
Por conseguinte, Sacristán7 cita Shulman ao se referir à concepção do
professor sobre o currículo . Ele esclarece que:
Os paradigmas contemporâneos que dominam a pesquisa pedagógica, a partir dos quais se deduz uma seleção de variáveis relevantes para entender os fatos pedagógicos e uma projeção mais ou menos direta para a prática, esqueceram o próprio conteúdo cultural que se transmite no ensino. Para esse autor, a separação entre conhecimento e pedagogia na pesquisa e no pensamento pedagógico é uma tradição relativamente recente na história deste último, com uma forte implicação na formação do professorado e na deficiente compreensão do que é o ensino em si mesmo. Fala-se da
50
motivação dos alunos, de processos cognitivos de aprendizagem, de manejo da aula, de ambientes escolares, de condutas docentes relacionadas ao bom rendimento dos alunos, de processo de planejamento, de como avaliar o aluno, mas silencia-se sobre o papel do professor na modelação do conhecimento, e sobre o próprio conhecimento, dando-o, portanto, como algo não-discutível, como o inexorável corpus que constitui o currículo que os professores têm que desenvolver e os alunos aprender.
Essas reflexões nos encaminhariam ao estudo das relações entre o currículo
demandado – que representa a necessidade de formação para que o indivíduo possa
se colocar no mundo do trabalho – e o outro currículo – aquele que os sujeitos que
vivem a aprendizagem pensam ser o necessário para sua formação humana. Também
remetem ao conhecimento como algo universal, verdadeiro, objetivo e à subjetividade
dos sujeitos envolvidos no processo de aprendizagem; à seleção de conteúdos, à
ordem dos mesmos e à integração das disciplinas.
O conhecimento é uma das bases da estrutura curricular e da atividade dos
professores. Mas, segundo Sacristán8, o conhecimento tem algumas características
fundamentais para o currículo, que são:
o conhecimento é publico; o conhecimento é um produto composto por fatos, teorias que formam um todo organizado; o conhecimento é algo certo, verdadeiro que deve ser assimilado pelos alunos ou algo problemático, incerto, inseguro, provisório; o currículo deve ser universal; a cultura deve fomentar no aluno um conjunto de valores, normas, definições sociais, gerando a consciência.
Sacristán9, citando Gimeno e Perez, distingue os fatores que podem
influenciar o currículo, bem como a concepção e a prática pedagógica dos
professores:
[1] Utilidade dos conteúdos para entender problemas vitais e sociais; [2] Cultura do currículo como uma cultura comum para todos os alunos, independente de suas peculiaridades sociais,linguísticas, etc.; [3] Cultura comum para todos os alunos, à margem de suas singularidades pessoais, sexo, etc.; [4] A obrigatoriedade para que passem a ser parte da formação comum aspectos como a religião, por exemplo, que são crenças e opções ideológicas; [5] A unificação ou diferenciação entre a cultura acadêmica e a dirigida para a atividade manual num mesmo currículo para todos os alunos; [6] A inclusão de problemas conflitivos e poéticos nos conteúdos de ensino; [7] A compatibilidade-incompatibilidade a priori de certos conteúdos com o interesse dos alunos; [8] O valor da experiência pessoal anterior do aluno e do processo de descobrir aprendendo certos conteúdos curriculares, frente ao valor absoluto do conteúdo ordenado logicamente e sem relação com a experiência vital; [9] A consideração do conhecimento como algo objetivo e verdadeiro frente a posições relativistas, históricas e construtivistas; [10] Valor pedagógico do aprofundamento de uma parcela para alcançar o
51
conhecimento em profundidade, frente ao domínio geral mais superficial; [11] Valor educativo de praticar os métodos de pesquisa próprios de diferentes áreas ou disciplinas; [12] Ordenação do conteúdo em torno de unidades mais ou menos integradoras de diversos tipos de conhecimento e habilidades, frente a opções de ordenação por cadeiras ou conteúdos separados uns dos outros; [13] Sequência de desenvolvimento determinada de antemão, inclusive a apresentada pelos livros-texto, frente à opção de esquemas ad hoc; [14] Capacidade e divisão de competências e responsabilidades nas decisões sobre os conteúdos: pais, alunos, professores etc.; [15] Consideração de partes optativas nas diversas áreas para alguns alunos; [16] A existência de fontes variadas e válidas de informação para adquirir as aprendizagens consideradas importantes; [17] Concepção de áreas ou disciplinas como lugar de expressão de opções diversas por parte dos professores.
Essas perspectivas auxiliam o professor a definir sua linha de ação, uma vez
que lhe subsidiam a tomar decisões sobre os conteúdos, formas de apresentação,
estratégias de ensino, experiências, vivências, monitoramento do processo de
aprendizagem e construção cultural do conhecimento. A formação do professor,
sobretudo a cultural, bem como as interações que ele realiza com seus alunos no
espaço educacional, possibilitam a mediação, intersubjetividade e internalização dos
conteúdos sociais e culturais em um determinado momento na mediação do professor.
Até aqui, enfatizamos o papel ativo do professor como mediador do processo
de construção da subjetividade do sujeito, isto é, a etapa em que ele responde as
demandas sociais, psicológicas e biológicas e da subjetivação do conhecimento, da
aprendizagem propriamente dita.
O papel de mediador do processo educativo do professor na operacionalização
do currículo, fundamenta-se nos seguintes fatores, segundo Sacristán10:
[1] Na eficácia da conquista de certas metas dos currículos, é preciso considerar que boa parte dos seus objetivos gerais deve ser abordada conjuntamente por todos os professores nas diversas etapas educativas ou através de diferentes áreas ou disciplinas curriculares; [2] No ponto de vista dos professores, a consideração social de sua profissionalização é básica por múltiplas razões. O professor que atua individualmente não tem controle sobre certas variáveis de organização escolar, que são competências da coletividade ou de órgãos de direção, das quais depende o exercício de certa metodologia ou um estilo educativo. [3] Se o centro escolar se relacionar com a comunidade na qual está inserido, dentro de uma determinada filosofia educativa e sociopolítica, atendendo a sua cultura, aproveitando seus cursos e projetando-se nela, essas exigências pedem um plano particular do currículo que escapa às competências individuais dos professores, reclamando-se uma coordenação para elaboração de um projeto educativo de centro que os leve em conta.
52
A visão clássica de currículo, que atende uma perspectiva dirigista, tem
enfatizado a relação vertical do professor com as orientações da gestão que indicavam
as ações, ou seja, o respeito à hierarquização da escola – diretor-coordenador-
professor-aluno –, o comportamento adequado e a seleção de conteúdos e de meios
para transmitir o conhecimento acumulado pela tradição e considerado como
verdadeiro e completo.
PONTO FINAL
O currículo se concretiza, se realiza e se completa na prática docente, na sala de aula,
no espaço de aprendizagem, assim como na interação que ocorre entre o professor, o
conteúdo e o aprendiz em um determinado espaço-tempo. As condições
desenvolvidas pelo professor dentro do ambiente escolar são de fundamental
importância para que ele possa implementar sua prática pedagógica. Além das
condições para que o processo ensino e aprendizagem ocorra, o professor deve criar
atividades ou tarefas pelas quais, através da mediação e dos meios simbólicos, possa
operacionalizar a internalização dos conteúdos. Portanto, o professor, enquanto
agente desse processo, deve proporcionar diferentes formas de compreensão e
consolidação da aprendizagem dos conteúdos prescritos. A forma como o professor
realiza as tarefas, as atividades e a mediação pode ser um ato de conservação do
modelo dominante ou pode favorecer a reflexão ou mudança desse modelo. O
currículo, dessa forma, pode representar um campo de lutas em torno de possíveis
interpretações e significados.
ATIVIDADE
Segundo a sua interpretação, o que significa “o currículo se realiza na ação
pedagógica”?
8 A PRÁTICA CURRICULAR: O AGIR E A LINGUAGEM DO CUR RICULO
O currículo se concretiza e realiza na prática, nas situações reais, na forma
como se estrutura e organiza a cultura da comunidade.
O currículo em ação e na ação é o objetivo posto em prática, a intenção
transformada em ação motivada. O currículo se mediatiza como ponte entre a teoria e
a prática. A estrutura do currículo na prática envolve as políticas educacionais, as
razões epistemológicas, os parâmetros da administração escolar, as metodologias, os
meios e as condições ambientais ou físicas.
A prática pedagógica se estabelece em atenção a objetivos e metas traçados
no âmbito do currículo prescrito, assim como pela interação dos professores com os
alunos, pelo ambiente e pelas interferências externas. O ensino não ocorre somente
pela interação entre professores e alunos em vista da aprendizagem dos conteúdos
curriculares, mas envolve fatores ambientais e culturais. A educação escolar se dá em
um contexto, envolve pessoas e a construção social dos agentes em uma situação
ecológica. Uma aula, então, constitui-se em um subsistema ou micro-sistema
educacional definido por espaços, tempos, atividades, papéis, objetivos, ambiente etc.
As tarefas acadêmicas são ações realizadas pelos alunos sob mediação do
professor, cuja intenção é a realização das interações entre as atividades, o aluno, o
professor e o conteúdo, constituindo a prática pedagógica que se expressa em:
- um micro-ambiente favorável à realização das tarefas;
- uma metodologia que desencadeará certos efeitos da intenção;
- mediação através de atividades e ferramentas simbólicas;
- estilos em que os professores e alunos expressão essa aprendizagem;
- interações didáticas, que são formas de o currículo estabelecer a ponte entre
teoria e prática;
- atividades socializadoras, quando uma tarefa guarda um significado pessoal
e social complexo por seu conteúdo, pelas relações sociais que fomenta.
8.1 AS TAREFAS ACADÊMICAS COMO MEDIADORAS DO ENSINO
As tarefas acadêmicas modelam o ambiente e o processo de aprendizagem de
forma que podemos compreender a maneira como o currículo utiliza de sua
capacidade criadora para gerar o condicionamento.
Para Sacristán1, a tarefa é o “elemento intermediário entre as possibilidades
teóricas que o currículo prescreve e os seus efeitos reais”.
54
8.1.1 Tarefas como matriz de socialização
Em função de sua influência na interação entre os alunos e professores e na
construção social e cultural do conhecimento, as tarefas acadêmicas envolvem
processos cognitivos e afetivos. As tarefas acadêmicas mais frequentes são:
- Tarefas de memória;
- Tarefas de procedimentos;
- Tarefas de compreensão;
- Tarefas de opinião;
- Tarefas de descoberta.
Partindo disso, Segundo Sacristán2 a tarefa acadêmica é ”todo um ambiente,
fonte de aprendizagens múltiplas: intelectuais, afetivas, sociais; é um recurso
organizador da conduta dos alunos nos ambientes escolares”.
A tarefa orienta o aluno de como deve se envolver para aprender, como seguir
uma orientação para realizar o trabalho, a forma de fazê-lo para obter melhor
rendimento. A tarefa auxilia no momento de estabelecer uma conduta adequada para
agir em determinados contextos já vivenciados, experienciados e adaptados ao
contexto em que o fenômeno ocorre.
Sacristán3 (1998, p. 230) procura sintetizar a importância das atividades
pedagógicas no processo de construção social do conhecimento e expressa o
pensamento da seguinte forma:
o meio educativo ou contexto do ensino supõe uma série de ambientes concêntricos, aninhados uns dentro de outros, com interferências e ocultamentos recíprocos no modo de desenvolver as tarefas, segundo a organização da escola e de acordo com as conexões da vida acadêmica com o ambiente exterior.
O ponto de vista de Sacristán pode ser visualizado conforme o modelo
expresso a seguir:
55
Figura 8.1 O currículo e suas mediações na escola
Fonte: Sacristán, 1998, p. 231.
A organização escolar possui uma estrutura já estabelecida, isto é, a priori ela
se coloca como um todo. A interação entre os sistemas que compõe a organização, a
organização pedagógica e as tarefas propostas, baseadas no currículo oficial tornam
difícil uma mudança na escola e nas ações dos agentes do processo educativo. A
estrutura das tarefas também acaba determinando o ambiente escolar, as
experiências dos alunos.
Portanto, podemos concluir que as tarefas acadêmicas modelam a prática
esperada, seguindo os parâmetros curriculares. Diante disso, os professores precisam
pensar suas possibilidades de intervenção, ou autonomia, mantendo seu planejamento
de atividades de acordo com o currículo proposto pela sociedade. Ensinar passa a ter
a função de planejar ambientes de aprendizagem para os alunos, com vistas a atingir
os resultados previstos no currículo.
As tarefas tornam-se elementos fundamentais na estruturação e determinação
do comportamento profissional dos professores, que deve ser de orientar os alunos
(no cumprimento das tarefas), manter a disciplina, controlar a conduta dos alunos de
acordo com os princípios do mercado, colaborar com os alunos para a socialização
dos mesmos em uma determinada cultura, transmitir conhecimentos acumulados pela
EXTERIOR
CENTRO
AULA
CURRIC
Tarefas do
Tarefas o aluno
56
sociedade. Essa rotinização simplifica as atividades dos participantes do processo
educativo, tornam os fenômenos previsíveis e sem inovação.
As tarefas tornam-se ferramentas fundamentais para os professores, pois elas
permitem dirigir, guiar, controlar o grupo de alunos, que muitas vezes são numerosos
e permanecem por um período longo de tempo. Essas tarefas são implementadas
através de esquemas, imagens mentais de ação, mapas cognitivos que representam a
prática. São consideradas também como meios didáticos que possibilitam que o
professor organize e viabilize a sua prática que orientem o seu próprio pensamento ou
paradigma profissional – suas concepções epistemológicas, pedagógicas e culturais.
O fazer do professor, ou seu saber-fazer constitui-se de muitas relações que
não dependem somente de sua vontade, mas dependem das interações com os
subsistemas didático, pedagógico, burocrático e cultural. Assim, o professor expressa
suas competências profissionais mais pela forma como enfrenta situações diferentes,
não esperados pelo professor em sala de aula do que pelo domínio de conhecimento
especializado que possui.
O professor, por um lado, tem que interagir com o contexto escolar; isto é, os
meio didáticos, os espaços, os horários, o currículo, as regras e controles
estabelecidos pelas instituições e políticas externas. De outro, o professor
desempenha as suas atribuições apoiando-se em sua formação, conhecimentos,
modelos de ação, capacidade de aceitar decisões.
Dessas duas dimensões que permeiam a função docente, surgem as situações
práticas, as demandas da comunidade ou situações dramáticas em que o professor
precisa agir, tomar decisões e organizar a sua ação. Para tanto, ele se utiliza dos
modelos mentais que construiu, vivenciou, estudou, aprendeu, assim como de suas
crenças. Mas em alguns momentos torna-se necessário inovar, mudar, transformar. E
é aí que se encontra o dilema do professor: como ele pode inovar se a sua autonomia
se encontra condicionada a diferentes fatores?
Sacristán4 afirma que “o desafio não está em encontrar um esquema universal
sobre como os professores devem planejar, mas sim em ressaltar quais são os
problemas que haverão de abordar nessa função de planejamento [...]”.
As tarefas acadêmicas são efetivamente elementos fundamentais no
planejamento do professor, pois elas estruturam a ação, representam o esqueleto da
prática. Sobre isso, Sacristán5 esclareceu que ”os planos ou programações – fase pré-
ativa do ensino – têm continuidade na prática, à medida que a estrutura de tarefas ou
atividades previstas se mantenha estável desde o planejamento até a realização ou
fase interativa do ensino”.
57
Segundo Shavelson e Stern6, pesquisas realizadas explicitam a tarefa
acadêmica como um construto que se constitui de conteúdo, materiais, atividades
instrucionais, atividades de alunos e professores, objetivos gerais e do contexto
sociocultural.
Entendemos que o currículo, através de seu formato didático-pedagógico, é um
mediador entre a teoria e a prática. As tarefas didático-pedagógicas propostas pelo
professor, seguindo os determinantes e condicionantes do currículo, estabiliza a sua
prática, racionaliza o exercício. Nesse contexto, Sacristán7 esclarece que
as tarefas cumprem as funções de serem mediadoras da aprendizagem real dos alunos e serem elementos estruturadores da prática e da profissionalização dos professores. As tarefas são, além disso, o veículo entre os pressupostos teóricos e a ação, não apenas no sentido teoria-prática, como também no sentido inverso, da prática para a teoria.
Sacristán8 também apresenta alguns elementos importantes para o
planejamento da ação docente:
- Considerar quais aspectos do currículo as tarefas acadêmicas a serem
preparadas devem atender.
- Selecionar os recursos necessários: laboratórios, bibliotecas, livros-texto,
cadernos de trabalho, objetos diversos etc.
- Ponderar os tipos de intercâmbio pessoal que se realizarão para organizar a
tarefa: trabalho individual supervisionado pelo professor, tarefa plenamente
autônoma, trabalho entre vários alunos etc.
- Organizar a classe para que tudo isso seja possível: disposição do espaço e
dos móveis, espaço de trabalho, horário etc.
- Apenas de forma implícita o professor intui que de um tipo de tarefa
acadêmica se deduz um processo educativo que ele considera aceitável.
Essas sugestões refletem as concepções que os professores têm sobre o
conhecer e o saber-fazer pedagógico, sua epistemologia, psicologia, filosofia e
pedagogia. Elas também partem do conjunto de crenças e saberes que o professor
domina.
Clark e Peterson, citados por Sacristán9, afirmam que “os esquemas teóricos
dos professores ou seu pensamento pedagógico se condensam, em boa medida, em
torno do que acontece na prática da aula”. Por conseguinte, Smyth citado por
Sacristán10, afirma que a “prática se estabiliza e se constrói com base em tradições
históricas e pressões sociais. Os professores como analistas da ação educativa
devem comprometer-se em sua reconstrução”. Logo, o professor precisa, também,
modificar a prática, inovar. A inovação implica em mudar a prática já presente em uma
58
nova forma de agir. É importante que o professor possa estar pronto para sua
formação constante.
A formação de professores deve se constituir de um saber-fazer prático, em
desenvolver modelos ou esquemas de atividades didáticas. O professor deve ser
criativo e elaborar novas tarefas não é suficiente. O professor criativo é aquele que
busca os fundamentos das tarefas que realiza. Portanto, para a formação de
professores é construir a fundamentação de seus saberes práticos. A formação
docente deve se ocupar também de oportunizar aos professores momentos para
desenvolver a sua capacidade de análise, questionamento das condições curriculares,
sociais, políticas, econômicas e culturais que o cercam, estabelecendo alternativas
para as demandas da sociedade.
As tarefas ou atividades são de fundamental importância para os professores
em sua formação. Quando observamos professores em ação, podemos perceber que
por trás das tarefas há pressupostos filosóficos, psicológicos e didáticos – tal como
teorias educacionais, epistemológicas, modelos educativos etc. –, as quais
fundamentam as suas decisões.
As tarefas acadêmicas compreendem os fazeres dos professores, dos alunos,
os materiais mediadores do aprender, os processos de internalização dos conteúdos,
as condições para que os processos possam acontecer. As tarefas levam consigo um
significado para o currículo, um sentido para os professores e alunos, uma proposta
política, um modelo pedagógico. E elas também condicionam a comunicação entre os
subsistemas que fazem parte do processo pedagógico. Nesse sentido, são úteis aos
professores para conduzir e instruir os fazeres dos alunos, mas também para controlar
a conduta dos agentes participantes.
PONTO FINAL
As atividades dos professores são importantes para que o currículo possa se
estabelecer, assim como para implementar as mudanças pretendidas por seu
intermédio. Dessa forma, podemos dizer que o currículo traz em si uma
intencionalidade, esperando-se que ele alcance objetivos determinados. Para tanto, o
professor define as suas intenções planejando a sua função docente segundo as
determinações curriculares, disposições, princípios, assim como de acordo com o
espaço e tempo previstos para que ela possa ocorrer. Esse planejamento parte do
pretendido, do intencional e, através da sequência de conteúdos e tarefas, mediadas
pelo trabalho do professor, possibilita atingir as mudanças pretendidas através do
currículo.
59
ATIVIDADE
Justifique, com suas palavras, a importância que as tarefas acadêmicas representam
para a prática docente e para a aprendizagem dos alunos.
9 A VIRADA DA TEORIA CURRICULAR: CURRÍCULO E CURRÍC ULOS
A concepção de currículo tem se orientado pelo paradigma conhecido como
clássico, tradicional, racional e acadêmico. Nesse paradigma, o papel da escola e,
portanto, dos professores, é o de transmitir saberes e preparar os alunos para o futuro.
A organização curricular é centrada em um conjunto de disciplinas em uma orientação
de justaposição das mesmas. O conhecimento é neutro e tem valor universal,
acumulado através do desenvolvimento científico ao longo de gerações e precisa ser
transmitido para as próximas gerações pelas instituições educativas. A escola é o
espaço que os sujeitos buscam para se apropriarem dos saberes. A escola oferece
igualdade de oportunidades e de acesso. Os alunos aprendem os conteúdos
curriculares, que são determinados pelas políticas educacionais, através de atividades
planejadas e operacionalizadas pelos professores em espaços e tempos
determinados.
Retomando a discussão iniciada no capítulo 2, vamos rever alguns aspectos
das teorias curriculares clássicas, especialmente referindo-nos à presença de dois
grupos cuja preocupação, segundo Moreira1, foi repensar as questões curriculares: o
grupo dos críticos e dos pós-críticos.
Macedo2 aponta a base das teorias críticas do currículo segundo a visão
marxista, em que se analisa a organização social das sociedades capitalistas. A
educação surge, então, como um elemento resultante da forma como a sociedade foi
concebida no contexto capitalista.
Os teóricos críticos não reconheciam as visões clássicas e tecnicistas do
currículo. Liderados por Michael Apple3 e Henry Giroux4, esses teóricos questionaram
a visão de currículo tradicional e buscaram novos olhares. O questionamento que
guiou os dois autores foi: o que é que o currículo faz com as pessoas? Faz com que a
crítica postule uma nova concepção de currículo. Os teóricos críticos defendem que o
currículo, da forma como foi pensado, reproduz a sociedade, sua estrutura e dinâmica,
pois enfatiza uma hierarquização de conteúdos, classes e culturas.
Macedo5 considera que a homogeneização pretendida através do currículo
intenciona gerar benefícios para grupos dominantes. Com essa ideia, os críticos
promovem uma mudança curricular para uma forma de práxis social, com o objetivo de
mostrar as diferenças sociais; e promovem uma ação intelectual competente, com o
objetivo de transformar a visão hegemônica capitalista ocidental.
61
Os curriculistas críticos enfatizam a necessidade de enfrentar a visão de que
determinados conhecimentos ou conteúdos são mais importantes do que outros,
assim como de compreender as razões para tal.
Giroux, segundo Macedo6, traz sua contribuição para o campo curricular ao
defender a necessidade de uma política cultural. Ele também protagoniza uma visão
de campo curricular como práticas curriculares através da análise histórica, política e
ética. De acordo com Macedo7, Giroux busca fundamentos nas noções de libertação e
ação cultural de Paulo Freire e relaciona a pedagogia e o currículo à cultura, gerando
uma política cultural. Dessa forma, surge a emergência da teoria curricular como um
campo de disputa de significados. Os professores, nessa visão, atuam como
“intelectuais transformadores”, emancipadores. A partir da crítica que fazem à
sociedade capitalista e suas ideologias, Giroux e Apple buscam pautar sua visão em
uma nova teoria curricular, que leve em consideração as justiças curriculares.
Os pós-críticos propõem construir além da crítica, ou seja, criar novas
alternativas para a teoria curricular. Nesse contexto, Pinar citado por Moreira8 observa
que o propósito da investigação no campo de currículo é buscar uma visão de
revelação original para mundos não conhecidos, o estudo da experiência educacional
subjetiva. Por fim, o autor menciona a transgressão como um instrumento pedagógico.
Na perspectiva pós-crítica, segundo Macedo9, encontra-se o pensamento
multiculturalista em suas diferentes linhas. Em geral, os teóricos pós-críticos
sustentam-se na cultura como campo de estudos, nas práticas curriculares para
compreenderem as relações e para possibilitar a construção de significados. Para o
autor, “a perspectiva crítica do multiculturalismo cultiva duas vertentes: uma
concepção denominada de pós-estruturalista e outra materialista”10. Na visão pós-
estruturalista, “o fundante é a análise da diferença enquanto expressão do ser-no-
mundo, do ser-com-o-outro. Neste sentido, a diferença é sempre uma relação”11. O
discurso produz a realidade cultural. Na perspectiva multicultural materialista,
Macedo12 esclarece que “as relações econômico-estruturais são vistas como
mediadores da produção da diferença e da desigualdade social e, por consequência,
das relações culturais”.
Os multiculturalistas críticos defendem que é preciso compreender que o
currículo, através da seleção de conteúdos, das atividades e valores, legitima
determinadas visões de mundo e de cultura. É sempre uma escolha que tenciona
outras possibilidades.
O pós-modernismo é um conjunto de perspectivas que abrange os campos
estético, político e epistemológico no início do século XX, o qual questiona os
princípios iluministas presentes no discurso do currículo. Para Macedo, o pós-
62
modernismo levanta dúvidas sobre as promessas da teoria crítica e inaugura uma
pedagogia pós-crítica.
Silva13, nesse contexto, observa que:
parece haver uma incompatibilidade entre o currículo existente e o pós-moderno. O currículo existente é a própria encarnação das características modernas. Ele é linear, sequencial, estático. Sua epistemologia é realista e objetivista. Ele é disciplinar e segmentado. O currículo existente está baseado numa separação rígida entre ‘alta’ cultura e ‘baixa‘ cultura, entre conhecimento científico e conhecimento cotidiano. Ele segue fielmente o script das grandes narrativas da ciência, do trabalho capitalista e do Estado-nação. No centro do currículo existente está o sujeito racional, centrado e autônomo da modernidade.
O pós-modernismo procura realizar uma mudança que tem como meta um
conjunto de condições sociais que podem refazer os mapas social, cultural e
geográfico do mundo, gerando novas formas de crítica cultural. Os objetos de análise
e estudo são: identidade, linguagem, objetos culturais, currículo, subjetividades. A
visão de currículo renovada envolve o currículo formal, o currículo em ação, o currículo
oculto. Segundo Moreira14, o currículo surge então como um campo de lutas e conflitos
em torno de símbolos e significados.
Para os pós-estruturalistas, o fundamental é compreender que o significado é
“socialmente construído”, precisa ser desvelado e não temos certeza de sua
interpretação. O significado não está dado, precisa ser culturalmente construído e
constituído, tornando-se dinâmico na ação, ele é causa e causador do processo.
Macedo15 observa que “transversalizando as teorias pós-críticas, vislumbramos
os estudos culturais”, que envolve grupos de pesquisas dispersas sobre as questões
de gênero, etnicidade, consumismo, moda, identidades sexuais, museus, turismo,
literatura etc. Os seguidores mais clássico desse campo de pesquisa, de acordo com
Macedo16, defendem um estatuto “antidisiciplina”, ou seja, recusam divisões
disciplinares e especializações. A cultura é considerada um campo autônomo da vida
social, um campo de produção de significados. Há lutas para a imposição de seus
significados à sociedade mais ampla. Para os pesquisadores dos estudos culturais, o
currículo é ”um artefato inventado e seus conteúdos são produtos de uma construção
social, implicando aí relações de poder para legitimar e afirmar cosmovisões”17.
A teoria crítica se estruturou a partir da crítica realizada contra as posições
modernas de uma sociedade e um futuro melhor. Entretanto, embora a teoria crítica
não tenha superado o próprio momento moderno através de sua linguagem, ela possui
um discurso muito poderoso no que se refere ao currículo e sua transformação. Em
63
vez de abandoná-las por considerá-las ultrapassadas, precisam ser relidas tendo-se
em mente as novas teorias e desenvolvimentos culturais.
As orientações pós-modernas e pós-estruturalistas cultivam dualidades entre o
velho e o novo, dificultando tanto a consciência das continuidades quanto das
descontinuidades no interior das categorias “moderno” e “pós-moderno”.
O modelo disciplinar, universal e neutro é ainda uma das linhas mais fortes no
pensamento curricular tradicional. A busca da totalidade. A busca de uma perspectiva
que não tenha como base uma expectativa totalizante, levou alguns pensadores a
construírem uma perspectiva rizomática, a qual defende que a realidade é
multifacetada, cujas múltiplas facetas encontram-se interconectadas. Para Gallo18, “a
imagem do rizoma implica um currículo como sistema aberto e múltiplo, isto é, não um
currículo, mas muitos currículos”. Essa imagem nos leva a perder os parâmetros
normais da repetição, pois não há controle ou hierarquia. A proposta é aventurar-se, é
correr riscos. O aprender é uma vivência, é com a circulação dos saberes que
fazemos rizomas.
Outra tendência nos estudos curriculares é a nova biologia, a luta pela
ressignificação do humano nas ações e concepções, representada por Maturana e
Varela19. A partir do conceito de autopoiese (auto-organização), os autores citados
forjam o conceito de currículo. É importante ter em mente que o currículo, na sua
construção, não é resultado de experiências externas ao espaço educativo
unicamente. O currículo é um espaço vivo de construção de conhecimentos, de
pensamentos, das experiências dos sujeitos, das interações sociais, históricas,
culturais e biológicas. Nessa conjunção de movimentos, ideias e ações, ocorre a
articulação da cognição, corpo e mente. A mediação dessa concepção é a enaction
(termo criado por Varela, com o sentido de percepção, desejo e ação). Para
compreender melhor essas articulações, devemos pensar que o currículo de formato
autopoiético é aquele que se autoproduz.
Para Maturana e Varela20, os currículos são dotados de “clausura operacional”,
isto é, sempre que algo interfira ou gere mudanças, o currículo produz outras
mudanças em seu interior. Dessa forma, o currículo é vida, é um artefato que
congrega internamente conhecimento de formas biossocioculturais de como os
sujeitos se organizam. A partir dessa construção de saber, esse conhecimento
existente altera, influencia através de acoplamentos estruturais e experienciais –
interações que geram novas interações e novas compreensões.
Há também a perspectiva dos atos de currículo, que tem como base a própria
ação do currículo, ou seja, o currículo se fazendo através das histórias de vida, das
64
histórias das práticas, do bioquestionamento. A esse respeito, Macedo21 esclarece
que:
Articular histórias de práticas, histórias de vida, cruzar existências, para daí emergir um currículo eivado de pautas vitais, é uma das saídas, consideramos, para a superação dos currículos concebidos e implementados predominantemente por formas modelizadas, lógica fundante dos abstracionismos curriculares, tão recorrentes entre nós!
Outra forma de pensar o currículo é a proposta curricular multirreferencial, que
tem como fundamento as referências, as múltiplas justiças em termos socioculturais e
curriculares. Segundo Macedo22, Jacques Ardoino estuda os processos de
diferenciação/identidade como produções culturais, entendendo que descontinuidade,
heterogeinidade, turbulência de escalas, vazios criativos e conflitos fazem parte de um
mesmo processo. Para ele, o currículo multirreferencial não gera uma zona mista, ele
constitui um questionamento mútuo e contínuo de cada uma das disciplinas que o
compõem.
Macedo23 esclarece que “trabalhar os saberes como referências constituídas
na dialógica da diferenciação, na referencialização/desreferencialização, sem
nenhuma pretensão unificante, nos permite pleitear de forma muito mais fecunda e
coerente a intercriticidade nos âmbitos dos atos de currículo”.
A proposta multirreferencial propõe uma formação pedagógica ética e
comprometida com a dignidade humana, acolhendo tudo que o mundo procura não
considerar ou esconder: as diferenças, as heterogeneidades, a pluralidade. A forma
não fechada, entreaberta da perspectiva de Ardoino como uma intercrítica é um fator
relevante nesta abordagem.
Macedo24 enfatiza a importância de uma proposta multirreferencial e intercrítica
como inovação política e pedagógica. Segundo o autor, a ideia de intercrítica surge
com Henri Atlan quando expressa sua preocupação com as várias racionalidades,
assim como de não se buscar a verdade única. A intercrítica seria uma crítica
alternativa, pois o real não é verdadeiro, ele simplesmente é. A construção dos valores
ocorre de forma gradual, através das lutas, dos sentidos constituídos, do diálogo, da
existência com o outro.
PONTO FINAL
A concepção de currículo tradicional, ou seja, uma sequência de conteúdos
previamente selecionadas pelas políticas educacionais e complementadas no âmbito
das instituições escolares, passou a ser questionada nos anos 80. Nesse período,
65
começamos a observar que o currículo mínimo, homogeneizador e universal, não
vinha dando conta das diferenças culturais existentes dentro da sociedade e da
escola. Portanto, era necessário repensar o currículo enquanto uma listagem de
conteúdos, passando-se a considerar a diversidade, as diferentes manifestações da
cultura. Essa preocupação foi, aos poucos, tornando-se objeto de interesse dos
estudiosos e, consequentemente, passou a existir uma reflexão mais intensa em torno
do currículo, cultura, identidade e subjetividade. Além disso, ao longo da evolução
conceitual bem como da práxis do currículo, constituíram-se diversas linhas de
pensamento que exerceram influência sobre ele, tal como as contribuições dos
críticos, pós-críticos, modernos e pós-modernos, estruturalistas e pós-estruturalistas e
outras formas de nomeação. O objetivo desses teóricos era repensar o currículo e,
dessa forma, repensar a sociedade, a sua constituição, direitos, valores e moral.
ATIVIDADE
Faça uma reflexão sobre a ideia da virada nas teorias curriculares. O que significa
virada de currículo para currículos?
10 CURRICULO E DISCURSO CONTEMPORÂNEO
O currículo, ao longo do tempo, tem sido uma das questões de maior interesse
na educação, pois é através de sua organização e estrutura que podemos auxiliar na
transformação da sociedade.
As crescentes demandas relacionadas à educação de qualidade, a persistência
do fracasso escolar, a crise do sistema educativo, as críticas dos teóricos sobre os
currículos que geram disfunções e desigualdades, as pretensões de que o currículo
possa atender antigas demandas não correspondidas, o desinteresse dos jovens à
escola, a falta de conexão com o mercado profissional, a necessidade de maior
cuidado com as crianças, de desempenhar ou simplesmente querer melhorar o nível
cultural da população ou a necessária formação dos cidadãos, configuram, segundo
Sacristán, Esteve e Rué1, o repertório das insatisfações mais comuns relativas à
educação, assim como justificam a necessidade de se empreenderem reformas
educativas.
Para Rué2, ”o mudo atual, a sociedade, a informação gerada, as tecnologias e
a produção tornaram-se muito mais complexas do que jamais foram, e a formação das
pessoas tornou-se um valor muito mais central”. Da mesma forma, declara o autor, “os
espaços de formação transformaram-se também em espaços muito mais complexos”.
10.1 O CURRÍCULO POR COMPETÊNCIAS
No século XX, devido às pressões do mercado, começam a surgir propostas do
meio empresarial para que o sistema educacional responda às demandas de mercado.
Surge, nesse momento, a pedagogia das competências. O novo modelo de produção,
segundo Guimarães3, coloca em discussão a questão da qualificação e das
competências requeridas no mercado de trabalho. O autor esclarece que a noção de
competência encontra-se integrada à reforma educacional brasileira promovida pela
Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei nº 9.394, de 20 de dezembro
de 1996* –, em que se define que a educação escolar nos diversos níveis de ensino
tem a finalidade de desenvolver, nos educandos, conhecimentos e habilidades, para
torná-los aptos ao exercício da cidadania e à inserção no mundo do trabalho.
* A Lei nº 9.394/1996 pode ser consultada na íntegra em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm>.
67
A ideia de competência passou a fazer parte da educação profissional com a
função de preparar o estudante com conhecimentos, habilidades e atitudes
necessárias para o mercado de trabalho. Nessa concepção, o aprendiz é o sujeito que
aprende, constrói, pergunta, infere. Perrenoud4 observa que as competências “são
formadas por habilidades, conhecimentos e atitudes” e que o sujeito precisa “saber
mobilizar recursos com o objetivo de ativar os esquemas complexos” (p. 36).
A mudança de paradigma na educação propõe a formação de um profissional
preparado para assumir as responsabilidades requeridas nos processos de produção,
tal como a capacidade para a resolução de problemas, apresentar uma postura flexível
para negociações, assim como ter habilidades empreendedoras. Nessa linha de
pensamento, a educação por competências tem como meta uma nova organização
curricular e de aprendizagem.
Lê Boterf (1995) enfatiza que a competência tem sua base em três elementos:
as pessoas (sua biografia), a formação educacional e a experiência profissional. O
autor esclarece também que a competência aparece sempre associada a expressões
como: saber agir, mobilizar recursos, integrar saberes múltiplos e complexos, saber
aprender, saber engajar-se, ser sujeito.
Nesses primeiros estágios da proposta de competências, a perspectiva é
tecnicista, com objetivos de formação delimitados pelas necessidades profissionais. As
ideias de competência, habilidades e atitudes são confundidas e muitas vezes,
utilizadas de forma intercambiável. As competências, em um primeiro momento,
apresentavam o currículo como uma espécie de reedição do tecnicismo.
O currículo por competências apresenta uma crítica à fragmentação do
conhecimento e à disciplinarização do currículo clássico, propondo uma forma de
interação e interligação dos saberes que estimule o estudante no enfrentamento dos
desafios de aprender a atuar no mercado de trabalho.
Macedo5 lembra que “as competências apontam para a atualização das
aprendizagens em contexto, isto é, conhecimentos, habilidades e valores são
transformados em saberes em uso,(...) estando, esses conhecimentos sujeitos às
ressignificações a partir do mundo não-acadêmico da atividade humana”. O autor
sugere ressignificar o currículo por competências a partir da visão crítica das teorias
curriculares.
Para Macedo6, as competências são conceituadas como “um conjunto de
saberes e habilidades que os aprendentes incorporam por meio da formação e da
experiência, conjugados à capacidade de integrá-los, utilizá-los, transferi-los em
diferentes situações”. O autor interpreta essa concepção como uma pedagogia ativa e
construcionista que envolve o saber teórico (formal) e prático (técnico e metodológico),
68
isto é, os saberes em uso. Baseando-se nisso, Macedo7 aponta alguns aspectos
positivos do currículo por competências:
- valorização da transposição didática;
- globalização dos saberes;
- aprendizagem para e pelas situações e cenários de trabalho;
- envolvimento dos alunos em projetos de trabalho;
- avaliação formativa e processual;
- pedagogia por problemas e estratégias para solucioná-los;
- o foco do sistema educativo deve ser a aprendizagem dos alunos;
- avaliação centrada nas evidências de desempenho demonstrado em
situações mais próximas possíveis daquelas que os alunos poderão enfrentar
na realidade.
10.2 O CURRÍCULO POR PROBLEMAS
O currículo por problemas é uma proposta cujo foco é o aprendizado do aluno
em situações reais de ação. A estratégia utilizada é analisar os problemas propostos,
levando os alunos a estudarem determinados conteúdos a partir da reflexão e
comparação com problemas concretos. A atitude de proatividade do aluno em busca
das soluções estimula a busca pelo conhecimento. A organização do trabalho inicia-se
com a preparação de um conjunto de situações que são necessárias para a formação
e capacitação do aluno. Esse elenco de situações constituirá os temas de estudo. Os
temas serão transformados em problemas e discutidos em grupo para que se possa
explorá-los de maneira cognitiva, social e pedagógica.
A construção do problema se dá a partir de uma descrição do colocado ao
grupo para análise e estudo. É fundamental que seja descrito de forma concisa e mais
concreta possível. Para tanto, importa não selecionar muitos itens para a
aprendizagem e garantir que os mesmos possam ser compreendidos a partir dos
conhecimentos prévios dos alunos. Enfim, os alunos também devem ser estimulados e
orientados para leituras e estudos independentes.
Macedo8 sugere a seguinte metodologia de trabalho com o currículo por
problemas:
a) leitura do problema;
b) identificação e esclarecimentos dos termos desconhecidos;
c) identificação dos problemas propostos pela descrição do fenômeno;
d) formulação das hipóteses explicativas para os problemas identificados;
69
e) resumo das hipóteses ou questões formuladas;
f) formulação de objetivos de aprendizado;
g) estudo individual dos assuntos levantados nos objetivos de aprendizado;
h) retorno ao grupo de apoio para discussão do problema frente aos novos
conhecimentos adquiridos na fase de estudo anterior.
Há várias formas de avaliar o processo de aprendizagem dentro dessa
proposta: avaliação por módulos, avaliação progressiva dos conhecimentos dos
alunos etc.
A aprendizagem por problema apresenta possibilidades de aprofundamento de
temas específicos bem como das abordagens necessárias para o desenvolvimento de
competências. Outra questão fundamental é a interação, integração e articulação do
problema, que são elementos essenciais para possibilitar a compreensão e o processo
efetivo de solução – a interação teoria-prática. Há claramente uma prática da ação
refletida ou uma prática reflexiva na construção do conhecimento.
10.3 O CURRÍCULO POR PROJETOS
A proposta segundo essa concepção é construir um cenário de integração de
conhecimento no processo educacional através de uma aprendizagem relevante, com
múltiplas interações do aluno com o meio, com outros indivíduos e com o objeto de
estudo. Portanto, pretende-se integrar e contextualizar os conteúdos e as realidades.
As etapas do projeto em termos gerais são: hipótese inicial, levantamento das
necessidades, transformação das informações coletadas em base de conhecimento,
análise do material coletado, ressignificação das hipóteses a partir de novas ideias,
análise, apresentação e avaliação.
A primeira parte do projeto depende da escolha do tema – as percepções ou
intuições em busca do que se pretende ou o que se deseja saber. A sequência do
projeto nos conduz ao levantamento das possíveis interpretações que foram
observadas e transformadas em hipóteses de trabalho. O levantamento e o debate
sobre o tema escolhido nos encaminham para a coleta de dados, bem como para a
análise da realidade face aos dados coletados.
Por conseguinte, os dados coletados, as reflexões e as análises nos levam a
substituir a hipótese inicial por uma ou mais de uma que possibilitem reinterpretar o
tema escolhido – a nova hipótese, tecida a partir dos conhecimentos novos atingidos
pela pesquisa. Essa etapa termina com a análise e a preparação para a apresentação.
A apresentação é o tema recriado e pronto para ser avaliado.
70
Há várias formas de avaliação, mas o projeto deve ser avaliado a partir do
desempenho de todos os participantes em todas as etapas do processo – ou seja,
trata-se de uma avaliação formativa, processual e qualitativa.
10.4 O CURRÍCULO POR TEMAS GERADORES E POR
PROBLEMATIZAÇÃO
Os temas geradores se baseiam no pensamento de Paulo Freire e visam
articular a ação pedagógica com a realidade sociocultural. Os temas motivam
trabalhos em cooperação que têm o objetivo de construir o conhecimento de forma
coletiva e socialmente partilhado. Essa concepção curricular também objetiva superar
a fragmentação dos saberes e a justaposição de conteúdos comuns nas instituições
educacionais.
Nessa linha de pensamento, a problematização da realidade e dos
conhecimentos dos participantes do processo educacional constitui uma etapa
fundamental no currículo por temas geradores. A problematização e a reflexão
constante demonstram a importância do agir reflexivo para a transformação da
sociedade. Macedo9 lembra que ӎ aqui que o planejamento da atividade curricular
deve incluir um processo pedagógico multi-referencial, pois múltiplas fontes de
informação são apresentadas, vindas de dentro e de fora da instituição formadora”.
O tema gerador pode emergir do coletivo social dos alunos, dos professores,
da comunidade escolar, da sociedade em geral. O tema não pode ser engessado e
nem se transformar em uma prisão, isto é, não pode ser uma forma de levar os alunos
a aceitarem o conteúdo como verdadeiro e não conseguir apresentar elementos para a
crítica. O tema deve alimentar a curiosidade, valorizar o conhecimento dos
participantes. Por outro lado, não deve impor modelos, ideias.
O currículo com esse formato contempla a contextualização dos temas, assim
como deve estimular a capacidade crítica, de articular temas, saberes e atitudes com a
finalidade de gerar novos saberes, mais adequados à realidade e de gerar justiça
dentro de uma sociedade com muitas injustiças sociais.
A avaliação deve ocorrer a partir da análise e do registro sistemático do
trabalho realizado por todos os alunos no processo de construções temáticas, bem
como nas reconstruções dos conhecimentos sobre os temas. Segundo Kramer10, é
sugerido também o processo de auto-avaliação.
71
10.5 O CURRÍCULO POR MÓDULOS DE APRENDIZAGEM
A modularização do currículo é outra alternativa que possibilita superar os
currículos lineares, de justaposição de conteúdos. Macedo11 interpreta as ideias de
Young sobre a modularização, observando que ela possibilita trabalhar com as
“vivências de aprendizagens relacionais, articuladas com temas transversais de modo
a se dinamizar num movimento espiral”. Para Young, segundo Macedo12, o
conhecimento por si só não é tão importante, mas saber aplicar esse conhecimento
em situações reais, levando em consideração os limiares dos conhecimentos para a
formação de habilidades, é um dos objetivos da modularização.
Nesse contexto, é necessário pensar na modularização como uma nova
organização do currículo, capaz de conectar módulos e resultados adequados às
necessidades e desejos dos alunos e do sistema educativo como um todo. A conexão
se realiza como um processo social, uma prática social com outros alunos socialmente
envolvidos.
10.6 O CURRÍCULO EM REDE, HIPERTEXTUAL
Com o desenvolvimento rápido das tecnologias da informação e as mudanças
nas relações de trabalho, as políticas educacionais passaram a incluir essas
tecnologias na educação e no currículo.
O currículo em rede enfatiza a comunicação interativa em que os fazeres e os
saberes superam as tradicionais relações burocráticas e compartimentadas.
Professores e alunos tornam-se autores e co-autores de reflexões abertas e
contextualizadas pelas suas especificidades e diferenças.
A rede busca captar, distribuir, canalizar, criar, recriar, comunicar, religar os
conteúdos, conhecimentos, saberes, teorias e práticas. A rede inaugura a
comunicação múltipla, plural, instantânea, multivocal, cria muitos textos dentro de
textos. Essa proposta curricular compreende que os cenários educativos são plurais,
diferentes, pois os seres humanos são diferentes. A ideia fundamental é respeitar as
características de nossos alunos, das escolas, dos níveis de formação e cultura dos
alunos e grupos sociais.
72
10.7 O CURRÍCULO POR CICLOS DE FORMAÇÃO
O ciclo de formação é uma proposta que valoriza a formação global do
educando. De acordo com Lima13, é uma adequação da organização escolar às
características biológicas e culturais que envolvem o desenvolvimento do estudante.
Esse formato de currículo é contrário ao modelo clássico padronizado e homogêneo
do conhecimento e da aprendizagem.
A avaliação nessa concepção considera as trilhas desempenhadas por cada
aprendente nos ciclos em que se encontra. A avaliação é formativa, sistêmica,
articulada ao aprender e às condições de cada um. Essa concepção procura articular
aprendizagem, conteúdo escolar, vivências e subjetividades dos alunos e seu
desenvolvimento biológico, social e psicológico.
10.8 A SALA DE AULA NA CONTEMPORANEIDADE
Uma aula se constitui em um pequeno sistema-mundo de alta complexidade,
em que ocorrem múltiplas construções e desconstruções através das relações e
interações mantidas entre os agentes – professores e alunos, alunos e alunos, alunos
e objetos de aprendizagem etc. É na qualidade emergente dessas interações que o
processo de formação e constituição do sujeito ocorre.
É necessário pensar a sala de aula como uma comunidade discente de
aprendizagem, formação, capacitação e transformação. A aula envolve um contexto
vivo, é geradora de vivências, de aprendizagens, de descobertas, de emancipação, de
diferenças. São muitas semânticas, sintaxes e morfologias buscando se constituir em
um discurso. É o local da diversidade: os professores são diferentes, os alunos são
diferentes, possuem diferentes hábitos, culturas, níveis sociais, crenças religiosas,
seus futuros e passados são diferentes, assim como seus pontos de vista. A
homogeneização não parece ser algo fácil de acontecer.
Aprendemos a partir das diferenças (individuais, sociais, culturais, psicológicas,
biológicas etc.). Essas diferenças são ferramentas para que o mediador – o professor
– possa articular os conteúdos e saberes necessários à formação dos alunos.
PONTO FINAL
As diferenças de gênero, etnia, classes, religião, cultura etc., que se fazem presentes
na escola, possibilitam novas formas de compreender e produzir o currículo. Nesse
capítulo foram apresentados oito enfoques orientados pelo currículo escolar, os quais
envolvem recursos didáticos e pedagógicos diferenciados e permitem explorar de
73
forma mais completa aspectos nem sempre previstos no currículo tradicional, como a
dimensão reflexiva, analítica e crítica da realidade, a valorização dos saberes e
experiências do aluno, do diálogo, de sua autonomia etc. Fundamentalmente, tais
enfoques colocam-se como alternativas ao alcance das instituições e dos professores,
ou seja, são possibilidades de ultrapassar os limites impostos pelo caráter
homogeneizante do currículo.
ATIVIDADE
Cite as diferentes abordagens de currículo que os autores discutem na
contemporaneidade.
74
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CAPÍTULO 1 1 RIBEIRO, 1993. 2 RIBEIRO, 1993, p. 11. 3 RIBEIRO, 1993, p. 12. 4 RIBEIRO, 1993, p. 12-13. 5 RIBEIRO, 1993, p. 13. 6 RIBEIRO, 1993, p. 13. 7 RIBEIRO, 1993, p. 14. 8 TANNER; TANNER, 1975, p. 75. 9 RIBEIRO, 1993, p. 18. 10 RIBEIRO, 1993. 11 RIBEIRO, 1993. 12 RIBEIRO, 1993, p. 21. 13 RIBEIRO, 1993, p. 27. 14 RIBEIRO, 1993. 15 RIBEIRO, 1993, p. 36. 16 RIBEIRO, 1993, p. 39. CAPÍTULO 2 1 PACHECO, 1996, p. 16. 2 MACEDO, 2007, p. 22. 3 BERTICELLI, 1999. 4 SILVA, 1999. 5 MACEDO, 2007, p. 24. 6 GOODSON, 1999. 7 MACEDO, 2007. 8 MACEDO, 2007, p. 26. 9 PACHECO, 1996, p. 26. 10 GOODSON, 1999, p. 38. 11 BOBBIT, 1918. 12 TYLER, 1973. 13 MACEDO, 2007. 14 MOREIRA, 1997a, p. 12. 15 MOREIRA, 1997a, p. 12. 16 MOREIRA, 1997a, p. 12. 17 LEITE, 2002, p. 57. 18 LEITE, 2002, p. 57. 19 LEITE, 2002, p. 58. 20 MOREIRA, 2002, p. 24. 21 SILVA, 1999. 22 MACEDO, 2007, p. 38. 23 MACEDO, 2007, p. 38. 24 MACEDO, 2007, p. 38. 25 MACEDO, 2007. 26 GIROUX, 1986. 27 MACEDO, 2007, p. 39. 28 MACEDO, 2007, p. 40. 29 YOUNG, 2000. 30 BERGER; LUCKMANN, 1983. 31 MACEDO, 2007. 32 MACEDO, 2007. 33 SACRISTÁN, 1998, p. 5. 34 SACRISTÁN, 1998, p. 14.
78
35 SACRISTÁN, 1998, p. 16. 36 SACRISTÁN, 1998, p. 26. 37 SACRISTÁN, 1998. 38 SACRISTÁN, 1998, p. 32. CAPÍTULO 3 1 SACRISTÁN, 1998. 2 SACRISTÁN, 1998. 3 SACRISTÁN, 1998, p. 41. 4 SACRISTÁN, 1998, p. 45. 5 TYLER, 1973. 6 SACRISTÁN, 1998. 7 PAIXÃO ET AL, 2008. 8 FERRAÇO, 2005, p. 18. 9 CARVALHO, 2005, p. 94. CAPÍTULO 4 1 SACRISTÁN, 1998, p. 60. 2 SACRISTÁN, 1998, p. 60. 3 SACRISTÁN, 1998, p. 63. 4 SACRISTÁN, 1998, p. 63. 5 SACRISTÁN, 1998, p. 63. 6 SACRISTÁN, 1998, p. 67. 7 SACRISTÁN, 1998, p. 73. 8 SACRISTÁN, 1998, p. 75. 9 SACRISTÁN, 1998, p. 69. 10 SACRISTÁN, 1998, p. 81. 11 SACRISTÁN, 1998, p. 84. CAPÍTULO 5 1 SACRISTÁN, 1998. 2 SACRISTÁN, 1998. 3 SACRISTÁN, 1998. 4 APPLE, 1973. 5 SCHUBERT, 1986. 6 SACRISTÁN, 1998, p. 102. 7 SACRISTÁN, 1998, p. 102. 8 SACRISTÁN, 1998, p. 104. 9 SACRISTÁN, 1998, p. 105. CAPÍTULO 6 10 SACRISTÁN, 1998, p. 112. 11 SACRISTÁN, 1998, p. 118. 12 SACRISTÁN, 1998, p. 119. 13 MACEDO, 1997. 14 MACEDO, 1997, p. 42. 15 MACEDO, 1997, p. 42. 16 MACEDO, 1997, p. 42. 17 SACRISTÁN, 1998, p. 144. CAPÍTULO 7 1 SACRISTÁN, 1998, p. 171. 2 SACRISTÁN, 1998, p. 178.
79
3 SACRISTÁN, 1998. 4 SACRISTÁN, 1998. 5 SACRISTÁN, 1998. 6 SACRISTÁN, 1998, p. 188. 7 SACRISTÁN, 1998, p. 188. 8 SACRISTÁN, 1998, p. 187. 9 SACRISTÁN, 1998, p. 183. 10 SACRISTÁN, 1998, p. 197. 1 SACRISTÁN, 1998, p. 221. 2 SACRISTÁN, 1998, p. 225. 3 SACRISTÁN, 1998, p. 230. 4 SACRISTÁN, 1998, p. 250. 5 SACRISTÁN, 1998, p. 252. 6 SHAVELSON; STERN, 1983. 7 SACRISTÁN, 1998, p. 264. 8 SACRISTÁN, 1998. 9 SACRISTÁN, 1998, p. 267. 10 SACRISTÁN, 1998, p. 270. CAPÍTULO 9 1 MOREIRA, 2002. 2 MACEDO, 2007. 3 APPLE, 1973. 4 GIROUX, 1986. 5 MACEDO, 2007. 6 MACEDO, 2007. 7 MACEDO, 2007. 8 MOREIRA, 2002. 9 MACEDO, 2007. 10 MACEDO, 2007, p. 61. 11 MACEDO, 2007, p. 61. 12 MACEDO, 2007, p. 62. 13 SILVA, 1999, p. 115. 14 MOREIRA, 1997. 15 MACEDO, 2007, p. 67. 16 MACEDO, 2007, p. 69. 17 MACEDO, 2007, p. 69. 18 GALLO, 2004, p. 46. 19 MATURANA; VARELA, 2001. 20 MATURANA; VARELA, 2001. 21 MACEDO, 2007, p. 80. 22 MACEDO, 2007. 23 MACEDO, 2007, p. 82. 24 MACEDO, 2007. CAPÍTULO 10 1 SACRISTÁN, 2007; ESTEVE, 2004; RUÉ, 2003. 2 RUÉ, 2003, p. 109. 3 GUIMARÃES, 2007. 4 PERRENOUD, 2000. 5 MACEDO, 2007, p. 92. 6 MACEDO, 2007, p. 93. 7 MACEDO, 2007, p. 94. 8 MACEDO, 2007. 9 MACEDO, 2007, p. 103.
80
10 KRAMER,1989. 11 MACEDO, 2007, p. 105. 12 MACEDO, 2007. 13 LIMA, 2002.