Esacto ediçao 17

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Último acto de cidadania

A quem nos guiou

Até sempre!

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Sumário

Partido Republicano

5 de Outubro

Símbolos

Do Gov. Provisório ao fim da I República

Do 26 de Maio de 1926 à as-censão de Salazar

A crónica de uma morte anunciada?

O que é a República? Uma construção politica (preten-samente) refundadora?

Mulheres na República

João Mascarenhas na pri-meira pessoa

República à portuguesa: a educação

Um projecto por cumprir

Monarquia vs. República: crónica de quem não crê

Porque sobrevivem as mo-narquias europeias?

Para ler e para ver

Visitando a memória da Re-pública

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Basílio Teles

Défice de 21 milhõesde cruzados

78% dos portugueses

analfabetos

A in

capa

cida

de d

e de

senv

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rritó

rios

ultr

amar

inos

Ultimato Inglês

Pobreza

Corrupção

política

Desvalorização da moeda

A perda do Brasil.

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A República

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A República

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Em 1876, Afonso Costa, juntamente com José Relvas,

Leonardo Coimbra e outros elementos igualmente influentes, formaram o Partido Republicano Português (P.R.P). Este partido criticava severamente as instituições monárquicas, influenciava a opinião pública e visava derrubar a Monarquia, apresentando a República como regime alternativo.Com a crise do Ultimato, o povo deixara de confiar no seu monarca, já que este cedera à chantagem britânica. Também a Igreja enfrentava uma crise, dado que não conseguia sustentar as suas convicções teológicas e apresentava, tal como o regime, gastos excessivos. O Partido Republicano aproveitou esta conjuntura para iniciar uma campanha propagandística alicerçada num anticlericalismo radical (que viria a ser posto em prática durante o Governo Provisório com a Lei da Separação da

Igreja e do Estado) e num patriotismo fervoroso, elevando, por exemplo, Camões, ao seu expoente máximo, uma vez que se comemorava o tricentenário da sua morte.Outras organizações contribuiram para a queda do regime monarquico em co-laboração com o pardido Repúblicano:

A Carbonária Portuguesa, estabelecida em 1822, foi uma associação secreta, muitas vezes paralela à Maçonaria,opositora do clericalismo e defensora da liberdade e perfectabilidade humana, direccionada para a assistência ao mais desfavorecidos e

para a educação popular. Teve um papel importante na operacionalização de revoltas que precederam e sucederam o 5 de Outubro, cujo sucesso muito se deveu à sua organização interna.

Tal como a Carbonária, a Maçonaria também é uma sociedade secreta. É, no entanto, ideologicamente mais estruturada. Assenta na inspiração de uma sociedade fraterna e laica (em que a religião e a política actuam em separado).

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Na noite de 4 para 5 de Outubro de 1910, eclodiu em Lisboa um mo-

vimento revolucionário que culminou com a proclamação da República em Portugal. O chefe da revolução era o al-mirante Reis, e nela estavam envolvi-dos os militares da Marinha e do Exército, apoiados pela Carbonária, Maçonaria e pelo Partido Republicano Português. Em breve, outras camadas

da população lisboeta aderiram, pres-tando auxílio aos revoltosos e negando-se, fiéis, à monarquia. Na reunião pre-parativa à revolução, ficou deliberado que os primeiros locais a atacar seriam: O Palácio das Necessidades, onde se encontrava o rei, D. Manuel II, que de-via ser preso, e o Quartel da Guarda Militar no Largo do Carmo. Visto que as tropas do Rei não estavam dispostas

a prestar resistência aos revolucionári-os, a proclamação da República não en-controu oposição. Assim, pelas 9 horas da manhã do dia 4 de Outubro, Paiva Couceiro, chefe da força monárquica, assinou a acta da rendição. Às onze horas de 5 de Outubro de 1910, José Relvas, na varanda da Câmara Munici-pal de Lisboa, proclamou a República.

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Os símbolos, em qualquer regime, cultivam-se e difundem-se, de modo a consolidar os valores que se pretendem fazer valer. Ora, o regime repu-

blicano não foi excepção.A bandeira foi o primeiro símbolo a ser mudado. Cinco dias depois de ter to-mado posse, a 15 de Outubro, o governo provisório formou uma comissão pa-ra a elaboração de uma bandeira, chefiada pelo artista Columbano Bordalo Pinheiro. O grupo apresentou uma proposta (a 1ª à direita), que acabou por in-cluir elementos de outras propostas, já que qualquer cidadão pôde apresentar a sua.Também o Hino nacional foi substituído. O “Hino da Carta” deu lugar ao “A Portuguesa”, escrito por Henrique Lopes de Mendonça e musicado por Alfre-do Keil.Na mesma linha de ruptura, a moeda da monarquia deposta, os reis, deu lugar à moeda republicana, o escudo.

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A seguir ao entusiasmo do derrube da instituição monárquica, como se conso-lidou o regime republicano? As primei-ras décadas oscilaram entre a instabilidade e as medidas repressivas.

O governo provisório procurava me-didas para contrariar a decadência

do país. Teófilo Braga, Presidente, propôs várias reformas. As principais mudanças verificaram-se no domínio da educação e do trabalho. O ensino primário tornou-se obrigatório e gratuito, criaram-se Universidades, publicaram-se leis de protecção dos tra-balhadores, que adquiriram, por exemlo, o direito à greve. Noutras áreas, registou-se a aprovação definitiva da "Lei do Divórcio", publica-ção das "Leis da Imprensa", associadas à liberdade de expressão e implementa-ção da "Lei da Separação da Igreja e do Estado". Todas estas leis estavam reuni-das na "Constituição Política da Repú-blica Portuguesa", um dos principais marcos do Governo Provisório.

ra funções em Abril de 1917, decide-se pela entrada de Portugal na guerra, por-que, dizia, isso representaria um reco-nhecimento internacional da jovem República.

Embora Portugal continuasse a envi-ar militares para combater lado a

lado com os Aliados, havia quem se opusesse. Sidónio Pais era um deles, de tal modo que em Dezembro de 1917 instaurou uma nova ditadura. A 14 de Dezembro do ano seguinte, quando che-gava à estação do Rossio, foi alvejado a tiro e acabou por falecer.

A Europa reerguia-se da guerra. Portugal, da guerra e de uma dita-

dura. Foi nesta situação - desvaloriza-ção da moeda, inflação, problemas económicos e sociais - que António Jo-sé de Almeida subiu à Presidência da República, cargo que ocupou durante quatro anos, até 1923. Seguiu-lhe Ma-nuel Teixeira Gomes, eleito em Agosto de 1923. Mergulhado na anarquia total e incapaz de sair dela, o Parlamento ele-geu, novamente, Bernardino Machado como Presidente. Foi o último. Com ele acabou a 1ª República.

Dissolvido o Governo Provisório, é eleito o 1º Presidente da Repú-

blica, Manuel de Arriaga. A tarefa prin-cipal era concretizar tudo o que tinha sido planeado durante o ano de 1911. Em finais de 1912, essa ambição esta-va longe de se cumprir devido à insta-bilidade política que se vivia, com governos a caírem, frequentemente, poucos dias depois de se terem forma-do. Perante esta situação, Manuel de Arriaga incumbe Afonso Costa de che-fiar um governo, que durou quase um ano, seguindo-se o governo de Bernar-dino Machado que durou até Janeiro de 1915.

A instabilidade mantinha-se, e Ma-nuel de Arriaga teve de intervir

novamente, nomeando para chefe de governo Pimenta de Castro, que instau-rou uma ditadura, rapidamente depos-ta.

Enquanto os governos caíam, a cri-se económica e financeira perdura-

va e as greves multiplicavam-se (entre 1910 e 1925 registaram-se 520 gre-ves), a guerra estalava na Europa. A questão que dividia a classe política era, agora, a participação portuguesa na guerra, ao lado da outrora inimiga Inglaterra. Afonso Costa, que reassumi-

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Sem nunca pôr em causa a fidelida-de à República, o general Gomes

da Costa, a partir de Braga, e o coman-dante Mendes Cabeçadas, em Lisboa, iniciaram uma revolta, no dia 26 de Maio de 1926, que impôs em Portugal o regime de Ditadura Militar. Embora se fale de Ditadura e República em si-multâneo, não há contradições: o movi-mento militar desencadeado pelas Forças Armadas quis apenas correspon-der à vontade do povo de pôr termo ao caos parlamentar reinante durante a I República, mantendo as estruturas vi-gentes. O objectivo principal era rege-nerar a vida política nacional.Gomes da Costa e Mendes Cabeçadas eram militares, não políticos. Assim sendo, foram afastados, em Junho e Ju-lho do mesmo ano, para darem lugar ao general Óscar Carmona. Mudaram

as figuras do regime, mas os proble-mas mantinham-se. Não obstante, algu-mas camadas da população, descontentes com o novo regime, insur-giam-se contra o poder vigente. Face a isto, Óscar Carmona, em 1928, toma duas posições cruciais: candidata-se à Presidência e nomeia o professor da Universidade de Coimbra Doutor Antó-nio de Oliveira Salazar, para ministro da Finanças. Se com a vitória nas elei-ções para a Presidência (por sufrágio universal utilizado pela 1ª vez na elei-ção de Sidónio Pais), Carmona estabili-zou o regime, com a nomeação de Salazar conferiu ao governo a serieda-de por que o povo ansiava.Ora, foi com essa seriedade, imprescin-dível para a regulação do sistema finan-ceiro verificada, que Salazar assumiu a chefia do governo em 1932. Nesse

mesmo, ordena a preparação de uma nova constituição, aprovada no ano se-guinte em referendo (plebiscito). Com esta aprovação e com a gradual desmili-tarização dos cargos de chefia em ór-gãos estatais, o espectro da Ditadura começou a desvanecer-se. Todavia, o descontentamento aumentava, muito por causa de decretos-lei como este, de 13 de Maio de 1935, onde se declara que os opositores ao regime são os que “tenham revelado ou revelem espírito de oposição aos princípios fundamen-tais da Constituição Política ou não dêem garantias de cooperar na realiza-ção dos fins superiores do Estado”. Estava consolidado o Estado Novo. As políticas repressivas e a resistência a es-tas manter-se-iam por muito mais tem-po, demasiado tempo, até 25 de Abril de 1974.

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A 13 de Fevereiro de 1919, a revolta monárquica do Por-to conheceu o seu fim, após um mês de resistência.

Muito menos tempo resistiu a revolta monárquica em Lis-boa. Ambas a vitórias republicanas se deveram ao espírito de união que grassava entre o povo, fiel à República. Foi es-te mesmo povo que a 5 de Outubro de 1910 havia saído à rua e hasteado a bandeira republicana por todo o país. Fê-lo porque a monarquia estava a ser insuficiente na aplicação de medidas para a melhoria da qualidade de vida.Todavia, os nove anos que se seguiram à implantação da re-pública não foram suficientes para alcançar a utopia que o regime republicano representava: as condições de vida e tra-balho teimavam em não melhorar, I Guerra Mundial ceifara milhares de vidas, a crise económica e financeira persistia, etc. É certo que o ambiente não era o mais propício à união, no entanto o povo continuava a acreditar nos ideais republi-canos. O povo estava descontente, mas acreditava no regi-me.Paralelamente, o 25 de Abril de 1974 representou a mesma luta popular contra um regime que negligenciava os direitos fundamentais da república que preconizava. O povo estava descontente, mas acreditava numa alternativa.Hoje? Para além de descontente, o povo está descrente. Eis a tese.Dizemo-lo porque somos povo. E circulando entre ele diari-amente, ouvimos as suas preocupações e revoltas. Ouça-mos, então: “É tudo a mesma cambada!”; “Querem é tacho,

é o que é!”; “Corruptos!”; “Ladrões!”; “Mentirosos”. Pare-ce-nos, caro leitor, que já percebeu onde queremos chegar, muito mais se também ouve a voz do povo (“quem mais or-dena”?).Faça connosco uma reflexão, amigo leitor, e desengane-se. É nosso propósito seguir a voz do povo no percurso da Re-pública após o Estado Novo, ou de 74 à actualidade. De Spí-nola a Cavaco. Do MFA (Movimento Forças Armadas) a Sócrates.A voz do povo é a voz da sabedoria, pelo menos da sabedo-ria popular. Como pensa o povo? Que visão nos deu, a nós, que já nascemos depois da consolidação da democracia, so-bre os presidentes. Fomos perguntar aos mais velhos, claro, ao nosso “povo” (sabendo que a visão será sempre limitada).Spínola: escolhido pelo Conselho da Revolução, tendo parti-cipado na guerra em África, nunca conciliou os espíritos contraditórios do processo revolucionário; mais conserva-dor do que o conselho que o nomeara, acabou abdicando, deixando a ideia de que a extrema esquerda avançava sem controlo; e o povo anda em reboliço.Costa Gomes: é o presidente que tenta a pacificação do regi-me, o controlo da euforia pós revolução (a contragosto de al-guns, claro), chamavam-lhe “a rolha”, por muitas vezes não mostrar com clareza a sua posição perante as facções extre-mistas e tentar, sempre, a conciliação.Ramalho Eanes: militar, jovem (eleito com 35 anos), sem o dom da palavra do “animal político”, era visto como demasi-

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V ivemos numa república, mas focamo-nos no conceito de Democracia. Não estamos mental-mente conscientes da nossa condição de Repu-blicanos na sua plenitude. Simplesmente

hasteamos a bandeira da democracia e esquecemos o resto.Qual a raiz de tal realidade? Suspeitamos que tal se deva ao 25 de Abril de 1974 que nos inculcou o conceito de de-mocracia tão profundamente que nos obliterou autentica-mente o conceito de República, ao ponto de nos lembrarmos dele apenas no feriado paradigmático de 5 de Outubro.

A sua raiz etimológica remonta ao século VI a.C., ao ano de 509, na cidade de Roma, quando uma revolta das clas-ses privilegiadas sobe ao poder, instituindo uma res publi-ca, literalmente “coisa pública”, expressão ainda hoje usada para designar a Administração pública e as suas fun-ções diárias que uma vivência em sociedade proporciona. Mesmo aquando da instituição jurídica de um Principado (popularmente designado no contexto romano como “Impé-rio”) a referência e norteamento da vida política em Roma não deixou de se orientar pela devoção e lealdade devida por qualquer romano que se prezasse à Res Publica. Ade-mais, Augusto, o primeiro imperador romano, era, na reali-dade jurídica romana, um princeps, com um poder legislativo semelhante ao dos seus colegas das magistratu-ras e tendo sempre em mente a referência jurídica e política da Res Publica. Com o subsequente degenerar das estrutu-ras do Império, o termo permaneceu, mas desta vez já esva-ziado de conteúdo ideológico, ao ponto de um autor medieval como John Salisbury o equiparar às monarquias da época e, já na Época Moderna, Jean Bodin e NicolauContudo, não há dúvida de que o seu impacte foi forte, mais que não seja pelo enorme substrato de romanidade inerente à nossa civilização contemporânea. Daí reencon-trarmos o conceito revivificado no século XVIII, com os fi-lósofos iluministas, que, porém, lhe atribuem características díspares da sua acepção original. Verifica-se, no dizer de Filipe C. da Silva, uma clara evolução do

mesmo, ordena a preparação de uma nova constituição, aprovada no ano se-guinte em referendo (plebiscito). Com esta aprovação e com a gradual desmili-tarização dos cargos de chefia em ór-gãos estatais, o espectro da Ditadura começou a desvanecer-se. Todavia, o descontentamento aumentava, muito por causa de decretos-lei como este, de 13 de Maio de 1935, onde se declara que os opositores ao regime são os que “tenham revelado ou revelem espírito de oposição aos princípios fundamen-tais da Constituição Política ou não dêem garantias de cooperar na realiza-ção dos fins superiores do Estado”. Estava consolidado o Estado Novo. As políticas repressivas e a resistência a es-tas manter-se-iam por muito mais tem-po, demasiado tempo, até 25 de Abril de 1974.

ado recto, monossilábico; foi, no entanto, a primeira figura de referência acima dos jogos extremistas dos partidos à di-reita e à esquerda (acompanhado da sua mulher, a primeira com alguma acção visível); o processo revolucionário acal-mava, o presidente era figura simbólica, tanto que, mais tar-de, deu corpo a um partido que pretendia renovar o sistema partidário (o PRD).Mário Soares: foi o presidente feliz, acompanhado pela go-vernação cavaquista (com muitos fundos da ajuda económi-ca da então CEE), o presidente do sorriso bonacheirão (ironias à parte), talvez o primeiro presidente do povo, po-vo, o que inaugurou as presidências abertas, numa aproxi-mação simbólica às gentes e às terras para além da capital.Jorge Sampaio: na era pós cavaquismo, consolidou essa aproximação e iniciou a empatia com os espíritos superio-res, envolveu todos naquela ideia de renovação intelectual dos “Estados Gerais”, no acreditar que valia a pena intervir, de novo.Cavaco Silva: não há moeda que não mostre a outra face e Cavaco volta a representar o simbolismo popular da força próxima da figura tutelar (fala-se dele ao jeito de Salazar; será que o povo precisa dessa força contra a democracia e a liberdade?)A escolha popular (entre jogos de poder que delimitam as escolhas partidárias) garante a mobilização do povo para vo-tar e dar “a cadeira” a outro. No regime republicano, a voz do povo garante a rotatividade dos representantes no poder, já que o povo escolhe, através do processo eleitoral (quando a voz do povo é “quem mais ordena”).Fomos ver como se tem declarado a voz do povo nestes anos mais recentes (aqueles em que nós, jovens, somos mo-bilizados para aprender a participar no voto). Que ensina-mento nos deixa o povo para a geração do futuro, que somos nós? Consultámos as taxas de abstenção nas eleições mais recentes:Presidenciais, 2006: 37,99%. Autárquicas, 2009: 40,99%. Legislativas, 2009: 40,26%. Europeias, 2009: 56,99%.Que conclusões tirar? Os dados saltam à vista, os números não mentem: as pessoas dizem mal do regime e já nem es-tão preocupadas em renová-lo através do voto. Num tempo em que o governo da Europa governa sobre o governo do país, numa acção política cada vez mais global, aqueles que votam são cada vez menos, não chegam nem a metade dos eleitores. Ignorância sobre o valor do regime mais importan-te? Proximidade apenas aos políticos locais? Vota uma eli-te? Votam os fiéis partidários? Um crescendo do descrédito do regime, entre o povo? Talvez, porque também já ouvi-mos dizer, entre um povo mais esclarecido (ou mais retóri-co), que a partidocracia é uma forma que não a da democracia e que o povo sabe compreender que “está tudo nas mãos deles”, que não adianta ter voz pelo voto, que “eles fazem o que querem”. Para onde caminhamos então? Para uma morte anunciada? Para o fim da República, reto-mando a Monarquia?Queremos crer que a nossa geração arranjará modo de ter uma atitude nova, ou uma energia renovada, em nome da es-perança num futuro que se quer nosso, de uma cidadania consciente.

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sentido de República: a construção aristocrática, elitista e restrita, tornar-se-á, inicialmente no plano teórico, uma construção pluralista, orientada no sentido dos interesses do povo, através do estabelecimento do denominado Con-trato Social originariamente proposto por Rosseau, por meio do princípio da separação dos poderes e sempre assen-te nos pilares ideológicos da Revolução Francesa: Igualda-de, Fraternidade e Liberdade. Tornar-se-á, pois, um conceito indissociável posteriormente do conceito de demo-cracia, ainda mais antigo do que o de Res Publica, remon-tando aos antigos Gregos.Veremos ainda a República consolidar-se, com sobressaltos políticos mais ou menos sérios em França (na primeira me-tade do século XIX), e nos Estados Unidos da América, pa-ra citar os mais paradigmáticos. Outros países europeus, nomeadamente a Inglaterra, a Dinamarca e a Suécia, perma-neceriam Monarquias Constitucionais até aos dias de hoje, não obstante o enorme diferencial institucional existente en-tre ambas as fórmulas. Actualmente uma monarquia apre-senta um carácter que, segundo alguns autores contemporâneos, é meramente honorífico, sem quaisquer funções concretas de poder. E, não tenhamos ilusões, estas alterações do status político monárquico é claramente fruto de uma certa “republicanização”, não obstante o escamotea-mento consecutivo deste facto em detrimento do indubita-velmente determinante fenómeno da Democracia.

Portugal é o país que mais nos interessa, por ser um interes-santíssimo campo de observação em torno do qual podere-mos problematizar alguns aspectos da própria construção republicana per si.Uma rápida contextualização: a tradição republicana em Portugal remonta ao último quartel do séc. XIX, com a Questão Coimbrã e as Conferências do Casino, eventos nos quais pontificaram os mais ilustres intelectuais portugueses oitocentistas, entre eles Eça de Queirós, Ramalho Ortigão, Antero de Quental e Teófilo de Braga, este último viria a ocupar interinamente o cargo de Presidente da República até à primeira eleição do primeiro Presidente efectivo, Ma-nuel de Arriaga, também ele interveniente nas famosas Conferências.As ideias republicanas conheceriam um incremento já no ocaso do século, particularmente com o Ultimatum inglês e a problemática do Mapa Cor-de-Rosa, apresentado na Con-ferência de Berlim. Ademais, estas tendências republicanas sairiam reforçadas pela formação do Partido Republicano e pela primeira tentativa, em 1891, de tomar o poder. Apesar de fraca, a Monarquia prevaleceria até Outubro de 1910. Apresentávamos (e ainda apresentamos), paradoxalmente à tradição republicana, uma vigência monárquica no poder de cerca de oitocentos anos, um período de tempo braudeli-

anamente definido como super-estrutura, pelo que o concei-to de um território sob outra autoridade que não a real era ainda algo difícil de apreender na sua totalidade. De outra forma não se explica a resistência tenaz de alguns segmen-tos da população portuguesa à republicanização, corporiza-dos em correntes ideológicas como o Integralismo Lusitano, que fez sentir a sua acção na Primeira República, ou ainda, em 1919, com a proclamação da efémera Monarquia do Norte. Não obstante, a monarquia caiu, vergada sob o peso do seu descrédito crescente, dando lugar a uma estrutura re-publicana.

Alguns aspectos concretos da realidade política: os autores do 5 de Outubro de 1910 não eram somente republicanos, mas englobavam igualmente anarquistas e socialistas, todos eles com diferentes projectos políticos para o país. Reside aqui, aliás, o gérmen das futuras perturbações ideológicas, em que a Primeira República foi pródiga. No entanto, um fio de unidade ligava as três concepções: pretendiam refun-dar ideologicamente um país. Não à medida do tentado ulte-riormente com o Secretariado da Propaganda Nacional com a formação do homem “estado-novista”. Mas antes um pro-jecto que permitisse a refundação (assim é o termo de auto-res oitocentistas finisseculares como Basílio Teles) de uma Nação e, mais fundamentalmente, da Ideia-Nação subjacen-te ao imaginário colectivo do povo português. A república não era, pois, limitada ao seu espectro político imediato, an-tes propunha uma radical concepção ideológica que preten-dia romper com Ideia-Nação outrora forjada pelo nacionalismo romântico de Herculano e Garrett e pela pró-pria vivência monárquica multissecular. Eduardo Lourenço percepcionou impecavelmente este aspecto no seu Labirinto da Saudade, um projecto ambicioso.Mas, olhando retrospectivamente, terá tido sucesso? Prova-velmente, não o que os autores da revolução originalmente idealizaram. Demasiadas vicissitudes, como o fracasso da Primeira República, a Ditadura Militar, o Salazarismo e a própria conjuntura externa do pós-guerra não o permitiram. Contudo, não há dúvida de que houve uma mudança. Hoje em dia a Ideia-República, apesar de fortemente obscurecida pela Ideia-Democracia, já se implantou definitivamente no nosso imaginário. Existem movimentos distintamente mo-nárquicos, mas nenhum se aventura a tomar o poder. Os tempos são outros, objectariam alguns. Sem dúvida que o são.

Mas, então, que peso têm, afinal de contas, essas organiza-ções no panorama político português? De que forma influen-ciam a nossa conjuntura e as decisões que moldam a nossa realidade? Praticamente, de nenhuma forma verdadeiramen-

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te determinante. O Partido Popular Monárquico, inclusive, coliga-se com outros partidos vincadamente republicanos para se fazer ouvir na Assembleia da República. Estamos to-dos condicionados administrativa, política e mentalmente, a um sistema distintamente republicano, de feição democráti-ca, não obstante a nossa subsidariedade relativamente ao Es-tado Novo. Pode até não se ter conseguido atingir uma concepção mental inovadora, como pretendiam os ideólo-gos originais da Revolução, mas não há dúvida de que o pa-radigma republicano vingou.

Vingou e parece que vingará futuramente, pelo que acima se verifica da impossibilidade prática de uma restau-ração monárquica. E colocamos deliberadamente um valor dúbio no verbo “parecer” porquanto a situação actual do país por demais instável se tornar politicamente imprevisí-vel. Quem sabe não reentraremos novamente numa Ditadu-ra, como recentemente sugeriu uma destacada política nossa.

Esta premissa remete-nos para a última problemática em análise: a possibilidade de coincidência da República com a Ditadura. O Preâmbulo da Constituição da República Portu-guesa de 1976 estabelece que não coincidem, à semelhança do que pensa Mário Soares, que considera terem existido so-mente duas repúblicas em Portugal: a Primeira (1910-1926) e a Segunda (1976 até à hoje) -- visão de personalidades oriundas da intensa luta contra o Estado repressivo de Sala-zar e Caetano. Contudo, historiadores e juristas, como Fer-nando Rosas e Jorge Miranda, têm uma visão contrária, considerando adequada a designação de Terceira República para período em que vivemos. Qual destas concepções será a correcta?Sendo, em última análise, herdeiros de uma tradição ilumi-nista e racionalista que remonta aos filósofos franceses já ci-tados neste ensaio, e que postulava precisamente uma República sedeada no poder do povo e num Contrato Soci-al, não entraríamos em contradição com este espírito se equiparássemos ambas as realidades? No entanto, fá-lo-ía-mos, se apenas levássemos em conta o “governo das elites” (antitético do conceito iluminista) que os nossos ideólogos preconizaram nos seus escritos como projecto político para o país? Qual das duas posições apresentadas tem mais senti-do na lógica do nosso país?Não o sabemos, por certo. Mas sabemos que, independente-mente da nossa grave situação contemporânea, os frutos de cem anos de República já se fizeram sentir, de uma manei-ra, ou de outra.

*Faculdade de Letras, Universidade de Lisboa ( Membro do esacto em 2008)

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Essa é uma questão que merece uma re-flexão um pouco anterior: com as Con-ferências de Berlim, a conflitualidade europeia centra-se na disputa de territó-rios africanos. É nesta altura que surge o Ultimato Inglês e com ele, a resigna-ção, a incapacidade e a incompetência do regime monárquico português face à imposição britânica. Ora, esta apatia cri-ou uma enorme onde de simpatia junto do Partido Republicano porque foi ele quem tomou a defesa da honra ultraja-da de Portugal; por outro lado, a crise económica e financeira era sentida pela população em geral ao mesmo tempo que a Casa Real se endividava cada vez mais de modo a alimentar os seus gas-tos sumptuosos; o caso de “corrupção dos tabacos” também veio desacreditar ainda mais o regime. Houve uma con-vergência de circunstâncias, que em História se designa por condicionalis-mo histórico, que contribuíu para a que-da da Monarquia Portuguesa, permitindo que o Partido Republicano, por oposição, representasse a defesa do patriotismo, o combate à corrupção, uma nova ordem económica, etc. Em suma, uma via regeneradora, de espe-rança.

O Partido Republicano teve de travar

várias lutas políticas para se afirmar, nomeadamente com os Anarquistas, os Socialistas e até mesmo os Monárqui-cos. O que aconteceu foi que os Repu-blicanos aceitaram liderar o descontentamento popular, apontando caminhos e contestando ferozmente a governação monárquica. Não quer di-zer que, do ponto de vista ideológico, fossem os mais consistentes, muito mais o eram os Socialistas, por exem-plo, mas naquele período conseguiu ir ao encontro da voz do povo, empunhan-do a bandeira do patriotismo. Construí-ram uma campanha de propaganda apropriando-se de efemérides como o centenário da morte do Marquês de Pombal ou o tricentenário da morte de Camões, elevando-os ao maior grau de patriotismo. Esta campanha foi de tal modo agressiva que os historiadores de-signam o período de 1890 a 1900 como os “anos da propaganda”.

Sim, de facto. O que é diferente é a uti-lização de figuras históricas que perten-ceram à Monarquia por parte dos republicanos. Foi criada, por exemplo, a ideia de que Camões foi o maior repu-blicano, quando toda a gente sabe que "Os Lusíadas" exaltam o espírito mo-nárquico, ou, na mesma linha, a associ-ação do Marquês de Pombal, ministro de D. José I, ao republicanismo.

Para além de extremamente patriotas, os republicanos eram africanistas/colo-nialistas e, sobretudo, democráticos. Os republicanos defendiam um cidadão no-vo, com direito à opinião sobre os seus governantes.

Sim, mas nunca deixou de existir súbdi-tos em vez de cidadãos. Porque a ques-tão que distingue os dois regimes é esta: quem governa tem de ser eleito pe-los cidadãos que têm o direito de questi-onar os seus governantes, numa espécie de pacto, e isso nunca será possível em Monarquia porque a última palavra é, inquestionavelmente, do Rei.

Primeiro definiu-se uma política coloni-al coerente. Em segundo lugar, e talvez seja o principal contributo, definiu-se um conjunto de medidas educativas que tinham como objectivo alterar as vergonhosas taxas de analfabetismo. Por fim, aplicaram-se um conjunto de novas medidas que tentaram por fim aos grupos monopolistas, “filhos” do re-gime monárquico, e tornar a economia mais dinâmica e virada para o exterior. Esta questão é importantíssima para jus-tificar a entrada de Portugal na I Guerra Mundial.

Se começámos perguntando “Podemos começar a entrevista?”, rapidamente percebemos que devíamos ter perguntado: “Pode-mos iniciar a conversa?”. A tarde foi pequena para abordar todos os pontos de um tema tão complexo, como é o da Implanta-ção e evolução da República em Portugal.

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A intenção do novo regime era de mu-dar. Foi uma questão de imagem de marca. É o que acontece quando as em-presas mudam de direcção: das primei-ras medidas que se tomam é mudar o logótipo. O regime queria associar à bandeira os seus valores. Chegou a existir o “Dia da Bandeira”, no qual as famílias faziam a sua bandeira e saiam para a rua para concorrer entre si. Hou-ve de tal forma uma exaltação da ban-deira, que quaisquer actos que fossem considerados desrespeitosos eram puni-dos com grande severidade.

Convém separar cronologicamente dois momentos: há um período de dita-dura militar que vai desde 1926 até 1933 e a partir desta última data, com a aprovação da nova Constituição, inicia-se um período, supostamente, Constitu-cional, em que se define o Estado No-vo cujo rosto máximo é Salazar, que emergiu, sobretudo em 30. Até mesmo a ditadura militar, que surgiu para apa-ziguar o caos social em que se vivia, tem origem nos fundamentos republica-nos, porque os militares eram republi-canos. Se assim é, o próprio regime de Salazar foi uma república, sim.

[sobre as monarquias vigentes]"as pessoas deviam esclarecer-se sobre o “poder daqueles que sem poder” as estão a governar."

É outro regime. Há finalmente a imple-mentação de uma Democracia moder-na em Portugal. A Constituição de 75 acabou com o retrocesso do Estado No-vo. Basta pensar que depois da candi-datura do general Humberto Delgado, em 58, a própria Constituição acabou com o sufrágio universal, para dar lu-gar a eleições levadas a cabo por um Colégio Eleitoral onde não havia repre-sentação popular. Antes de 58, e mes-mo depois, todas as eleições efectuadas foram adulteradas: os mor-tos e os analfabetos votavam, as absten-ções contavam a favor, etc. Com o 25 de Abril e a nova Constituição foram legitimadas a soberania e as liberdades

fundamentais do povo.

Há sempre o pecado original, ou seja, nunca há uma legitimação, por parte dos cidadãos, de quem governa, porque basta ser filho de alguém para o fazer. E isso, a meu ver, não está correcto.

Pois, mas as pessoas deviam esclarecer-se sobre o “poder daqueles que sem po-der” as estão a governar. É o pecado ori-

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ginal que já referi. Por que é que é ile-gítimo governar através da comunica-ção social ou das grandes empresas? Porque não é reconhecido pelo voto, o único acto que é uma garantia. Obvia-mente que depois é preciso aprofundar o conceito, o tal pacto, mas a garantia essencial está assegurada.

Porque um conjunto de gerações foi privada do ensino da História Contem-porânea portuguesa, muito por culpa da censura férrea do Estado Novo. Foi

nessa medida que a Câmara Municipal de Lisboa decidiu criar um espaço que colmatasse esse desconhecimento.

Conferências, exposições e debates, sempre com o desejo de aumentar o es-pólio e o conhecimento.

É um bom acervo, muito devido ao jor-nalista Carlos Ferrão, um jornalista re-publicano bastante dedicado. Mas, obviamente, nunca é suficiente. Temos tentado adquirir toda a literatura que tem saído sobre este período da Histó-ria Portuguesa, de 1890, sensivelmen-te, até hoje. Somente depois do 25 de

Abril é que as Universidades começa-ram a ter cursos de História Contempo-rânea, porque durante o Estado Novo e a 1ª Republica não existiam. Assim sendo, o maior número de obras tem saído nos últimos 20 anos. Os livros que oferecemos ao público tratam de temas muito variados: desporto, políti-ca, economia, sociologia, etc.

A República respira o ar que os tem-pos lhe permitem. O que eu acho é que não podemos encontrar, em termos de sistemas políticos, um que seja ideal para o exercício da cidadania.

Mas toda a gente vive de utopias. Sem utopias a vida não é possível, embora saibamos que seja difícil.

acredito na Democracia e na Liberda-de. Quero ser um homem-livre, portan-to preciso da Democracia e da Liberdade para respirar.

Formalmente era uma República. Co-mo jurista, tenho de acreditar na Cons-tituição e se a Constituição me afirma que Portugal, naquela altura, era uma República tenho de acreditar. No entan-to, não há comparação possível entre a República do Estado Novo e a que co-meçou com o 25 de Abril.

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[Sou republicano porque…] "acredito na Democracia e na Liberdade. Quero ser um ho-mem-livre, portanto preciso da Democracia e da Liberdade pa-ra respirar"

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Nos finais do século XIX, quando se deu a eclosão dos ideais

republicanos, as mulheres, desde sempre inferiorizadas, iniciaram um movimento feminista. Vistas como mães e donas de casa, muitas lutaram para se livrarem deste “rótulo”. Esta corajosa revolta surgiu entre a pequena elite feminina que reivindicava os seus direitos em função das suas reais capacidades. Várias mulheres desempenharam papéis de extrema importância nesta luta política, social e cultural.Vários nomes se destacaram no lento processo de emancipação feminina.

Uma das figuras mais importantes foi Carolina Ângelo, a primeira mulher a votar em Portugal. Na 1ª República o direito ao voto era reconhecido aos cidadãos portugueses com mais de 21 anos, chefes de família e que soubessem ler e escrever. Contudo, não se especificava que os cidadãos teriam de pertencer ao sexo masculino, mas era a prática. Carolina Ângelo aproveitou esta “falha” da lei a seu favor, pois reunia todos os atributos necessários para que pudesse votar. A lei foi reescrita um ano mais tarde, com intuito de restringir o direito ao voto por parte

das mulheres, o que evidenciava a discriminação que ainda persistia, mesmo depois da implementação da República.A professora republicana Maria Veleda, pioneira na defesa da educação das crianças e das mulheres, afirmava que o ideal feminista só podia triunfar com a vitória da República. Contudo, após a alteração legislativa relativamente ao direito ao voto, Maria Veleda desistiu das suas convicções republicanas.A taxa de analfabetismo das mulheres, em 1911, atingia os 81%, pois não podiam aceder ao ensino superior, limitando-se a estudar em casa. A primeira mulher a leccionar numa Universidade foi Carolina Michaëlis. Outra das figuras que contribuiu para a alteração da mentalidade sobre as mulheres foi Adelaide Cabete.

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Precursora na reivindicação dos direitos das mulheres, presidiu ao Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas e reivindicou o direito a um mês de descanso antes do parto. Conseguiu conjugar a vida de família com as duas profissões que exercia: professora e obstetra. Também Ana de Castro Osório desempenhou um papel importante na luta pela igualdade dos direitos da mulher. Fundou, em 1909, a Liga Republicana das Mulheres Portuguesas e, após a instauração da República, participou na elaboração da Lei do Divórcio.

Como se vê a República representou, não só um combate entre monárquicos e republicanos, mas também entre republicanos e republicanas, na figura destas e de tantas outras mulheres.Cem anos depois, alguns desses direitos de igualdade e paridade continuam por cumprir. O que se fez para sanar a desigualdade? Impor quotas nas organizações políticas para a entrada de mulheres quando aqui o bom senso devia Imperar. Caso para dizer: mudam-se os tempos, mas mudar-se-ão as vontades?

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[Sou republicano porque…] "acredito na Democracia e na Liberdade. Quero ser um ho-mem-livre, portanto preciso da Democracia e da Liberdade pa-ra respirar"

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A ndar na escola é bom, li-berta o espírito, em senti-do literal. Imagine-se a criança a aprender a ler as

primeiras palavras, a poder contar, so-mar, a decifrar o mundo, … é o fascínio da descoberta de um universo novo.Mesmo que a canção a lembrar tempos antigos nos faça hesitar entre a fisga e a lição do mestre escola, mesmo que mui-tos meninos o tenham feito, essa metáfo-ra encaixa na mesma mundividência do poeta que diz “Ai que prazer ter um li-vro para ler e não o fazer…”, na distin-ção entre o desejo do momento, a satisfação do prazer do momento e o atingir de um valor mais alto pela educa-ção. Não há que hesitar: a escolarização faz bem à saúde e desenvolve o melhor do ser humano, o pensamento, a inteli-gência.

A 1ª República de Portugal clamou pa-ra si essa função: levar a escola a todos os meninos, ou trazer todos os meninos à escola, por direito: ter escolarização é um direito universal, porque a educa-ção torna os homens livres (pensado-res, desenvolvidos nas suas capacidades, interventivos).Muito pertinente é a ideia de, já no iní-cio do século os pensadores da educa-ção proclamarem por decreto a universalidade da educação para meni-nos dos 4 aos 7 anos, como factor de desenvolvimento “integral, físico, mo-ral e intelectual”, para preparação da es-cola primária.A educação e a instrução tinham o va-lor da libertação: “Vai à escola, ela te levará mais longe!”. A escola e os pro-

fessores tinham o valor do seu efeito nos meninos-homens: eram respeitados socialmente como vectores dessa liber-tação, reveladores de mundos e de so-nhos, de construção de um mundo melhor, de promoção da evolução. O senhor professor era uma autoridade na terra, autoridade intelectual, pois então, se outra lhe não coubesse.O Estado novo fez o que fez, os índi-ces de analfabetização continuaram ele-vados. Mesmo assim, ou por isso, os escolarizados eram considerados: ter a 4ª classe garantia entrada em empregos melhores; ter o 7º ano (final de ciclo do liceu) era quase ser doutor.Hoje, a escola ainda não atingiu os ide-ais da 1ª República de há 100 anos atrás (a educação pré-escolar ainda não atinge 100% das crianças). E porquê (…será a questão eterna em Portugal)?À medida que se alarga a escolaridade obrigatória tem-se mais meninos-jo-vens nas escolas, mas teremos mais es-colarização? Teremos mais amor pela escola como vector de mudança do mundo? Como factor de criação de ho-mens livres (na acepção do início do sé-culo)?Mais do que “escola para todos” assisti-mos a “todos na escola”, com as proble-máticas que isso implica. Porém, as

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escolas mantêm muitas das estruturas de um tempo que já não o é, nem nas pessoas, nem nas vivências, nem tão pouco nas questões que elas tragam pa-ra dentro da escola.Ao mesmo tempo, assistimos ao publi-camente tão criticado “facilitismo” da aferição que o sistema faz de si próprio na examinação do Ensino Básico. Pela parte de pais e da sociedade, a escola hoje já não é o valor mais alto, outras formas há de conseguir atingir suces-so(s), sem escolarização no sentido mais formal.Os professores têm, hoje, a imagem pú-blica diminuída por múltiplos factores e são muitas vezes vexados como inte-lectualmente inferiores, incapazes de produzir a tal mudança.Os jovens-meninos reclamam – do es-forço da aprendizagem, da atenção ao professor, da exigência dos programas, das regras da sala de aula, do estudo na escola, do estudo em casa, promovendo a cultura do fácil, do óbvio, do confortá-vel no sofá.É certo que hoje há múltiplos instru-mentos de aprendizagem(ns) para lá do que a escola oferece: computadores pes-soais, CDRoms, Internet, filmes, via-gens, tudo fácil à distância de um clic, descarregado no colo de quem quer

avançar rapidamente. Escola, aulas, professores, é “seca”, o marasmo reina à volta destes jovens.É certo também que as escolas, em al-guns aspectos, conservam um ambien-te ainda mais próximo do início do século do que das vivências da moder-nidade dos jovens: a sala de quadro e carteiras dispostas no mesmo alinha-mento de 1900, em fila, professor à es-querda dos alunos, à frente, o quadro de giz (finalmente em mudança?). Os materiais mudaram, o paradigma é o mesmo. Mudará? E os curicula e as pol´ticas demográficas?Serviria este ambiente as necessidades do início do século XX? Talvez. Não serve, por certo, as necessidades funci-onais da escola de hoje. O professor

“magister” ditando de cátedra servia nesse tempo? Talvez. E os objectivos mudam Não serve, hoje, por certo. A escola deve adaptar-se aos tempos, di-zem as vozes do tempo…De facto, a escola deve encontrar, de novo, o seu valor maior em termos so-ciais: os pais-sociedade precisam recu-perar a função da escola (para além de lugar-de-tomar-conta-de-meninos-en-quanto-os-pais-trabalham-muito-para-manter-a-vida-que-têm e o futuro a que aspiram), no sentido de mais-valia da tal libertação, de construção do tal “ho-mem novo” (por desenvolvimento inte-lectual, por conhecimento do mundo e por desejo de mudar o mundo à sua vol-ta).E a escola precisa de responder a esse desafio com desenvolvimento curricu-lar e professores e outros técnicos mul-tidiscilinares, com formação à altura da utopia, com equipamentos e salas ade-quadas à vivência dos tempos actuais, com jovens entusiasmados pelo valor maior que a escola realiza para si.Para que o paradigma de “todos na es-cola” (ocupando meninos para não an-darem na rua) se aproxime do ideal de “escola para todos” da 1ª República – a educação fará os homens livres e me-lhores cidadãos.

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O republicanismo capta as suas fontes de inspiração na doutrina filosófica e política liberal e no racionalismo iluminista. Em consonância com o liberalismo, o programa

político republicano procurará atribuir ao Estado a função de salvaguardar as liberdades e direitos naturais dos indivíduos (nomeadamente, a liberdade de consciência, os direitos à livre expressão e à propriedade privada), sendo os governantes eleitos em sufrágio universal pelo povo. O vincado anti-clericalismo das principais figuras históricas do movimento republicano português assenta, entre outras razões, na ideia tão característica dos velhos liberais ingleses (por exemplo, John Locke, na Carta sobre a tolerância), segundo a qual o Estado não deve nem pode interferir na esfera privada dos estilos de vida adoptados pelos indivíduos (costumes, opções políticas, credo religioso), desde que essas opções não prejudiquem o bem comum e os direitos naturais dos outros. Assim, o republicanismo instituiu o Estado laico, a-confessional, retirando o ensino da tutela da Igreja. Apostou fortemente na criação de um ensino público e universal, pois encarava-o como um factor decisivo de progresso material, político e moral. De acordo com as crenças iluministas e positivistas, pensavam os republicanos que a democratização do ensino, do conhecimento (em particular, o conhecimento cientifico) dotaria o país de bons técnicos e cidadãos esclarecidos, politicamente activos. Também o conhecimento da experiência histórica da democracia americana (com uma separação de poderes razoavelmente conseguida e um funcionamento eficaz dos órgãos políticos representativos) e dos exemplos, mais próximos, de algumas monarquias constitucionais europeias (nas quais já se manifestava um esvaziamento parcial do poder régio), constituíram um impulso encorajador para as reformas ambicionadas pelos republicanos.É necessário dizer que, tendo em conta o breve período temporal de vigência do regime republicano, boa parte do seu programa político não passou de um plano de intenções. Cem anos depois, que juízo fazer da herança republicana? Que sementes frutificaram? Que outras sementes permanecem possibilidades adiadas?!

Eis o meu ponto de vista: O Estado é definitivamente laico, ninguém é prejudicado por abraçar este ou aquele credo, embora a igreja católica continue a usufruir de privilégios negados a outras confissões religiosas. Vivemos numa democracia parlamentarista, em que homens e mulheres podem almejar o desempenho dos mais altos cargos dirigentes e elegem livremente os seus representantes (contudo, a mesma democracia é açambarcada pelos principais partidos, que entre si distribuem boa parte dos recursos sociais). Por outro lado, há uma separação entre o poder político e o poder judicial que, no entanto, é frequentemente violada ao sabor dos interesses de circunstância dos governos. A liberdade de expressão, um bem arduamente conquistado, não adquire uma maior amplitude porque os meios de comunicação são condicionados, em maior ou menor grau, pelo poder económico e político. Quanto à educação, não tem sido uma aposta prioritária e consistente daqueles que governaram o país no último século. Evoco apenas alguns dos males de que enferma: o ensino centrado na aprendizagem (memorização) de inúmeros conteúdos, com muito pouco espaço para o pensamento pessoal e criador; a ausência de uma coordenação interdisciplinar dos conteúdos curriculares, em tudo oposta ao actual paradigma de investigação científica; um nível mínimo de exigência em nome de um falso conceito de democraticidade (“Todos os alunos têm direito ao sucesso educativo”). Para terminar, o tumor da corrupção, que os republicanos ansiavam extirpar, continua pujante e a irradiar metástases. Porquê?! O poder político é refém dos grandes interesses económicos e não existe uma preparação técnica e ética dos políticos que os habilite para o desempenho dos cargos públicos (olhamos para a história política do país e contamos pelos dedos os governantes que tiveram o sentido do Bem comum e uma ideia estratégica para o país!). Mas aqui o povo não se pode furtar às suas responsabilidades: tem de exigir mais de si, participar activamente nos diversos grupos de pertença que o compõem (escolas, associações, autarquias, etc.), organizar movimentos reivindicativos de um modo inteligente e consistente e querer algo mais do que o prazer e o consumo.

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U m dia destes entrou-me pela secretaria um dos mais talentosos e prometedores alunos desta

escola com um convite: “Sr. Fernando, importa-se de escrever um artigo para o nosso jornal? A sua opinião sobre a República e a Monarquia ”. Fiquei estarrecido! Para ser sincero, nem sequer ouvi o tema, mas o título de Sr. deixou-me tão tristemente cônscio da inflexível passagem do tempo (algo que nem a minha indisfarçável calvície tinha até agora conseguido)! Passado aquele estremecimento inicial pensei: “Mas este miúdo escreve tão melhor que eu… eu sou só um pobre funcionário de contabilidade que, escrever escrever, só em requisições oficiais, obras primas de intelectos burocratas com mais ócio que sinapses” (que, afirmo já aflorando o tema, sempre existiram quer na monarquia quer na república). Procurando desesperadamente uma desculpa, para não escrever um desinteressante role de patacoadas, fui adiando, até que uma professora, daquelas pessoas com uns olhos a quem não se consegue dizer não, perguntou “Então o artigo para os meus meninos?”. Pronto! Não havia escapatória. Lá fui eu, um romântico de meia-idade (não no sentido que gostam de atribuir ao romantismo por culpa de senhores como Sthendal ou Balzac), que não me ajoelharei nunca a um homem, e que guardo fundadas reservas a qualquer sistema de governo humano, sentar-me em frente ao computador, num intervalo para almoço, onde por norma a mente se liberta das presas do

trabalho de secretariado (uma espécie de fordismo e taylorismo de caneta na mão), escrever qualquer coisita que não me envergonhasse muito sobre a monarquia e a república. Lá vai então e que seja o que Deus (não o rei nem o presidente) quiser:Monarquia? Um homem como eu, que por descendência tem o direito de me fazer vergar a espinha? Como diz Jostein Gardner no livro "O Mistèrio do Jogo das Paciências", “a vida é uma lotaria em que só se vêm os bilhetes vencedores”. Ora como por definição não há mais vencedor que o vencedor, não tenho rei! República? É mais atraente. Ideários que contenham lemas de liberdade, cidadania e outros que tais, são sempre atraentes, mas mostrem lá um que tenha resultado, um só, em que todos riam, comam e trabalhem. Não fiquem já os adolescentes, que porventura tiverem a paciência de me lerem, que faço a apologia da anarquia (a de Bakunine, não a dos grafites e outras pseudo urban cultures), tão preciosa aos contestatários compelidos pelos seus tenros anos, e que mais não é que outro disparate. Lembro, a terminar e correndo o perigo de cavar ainda mais o fosso entre quem escreve e quem lê, as palavras de um patriarca do cânon bíblico: “Não é do homem terreno o dirigir o seu passo”. Então o quê? Nem monarquia nem república….? Pode ser que me façam outro convite (mas duvido).

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Dez é o número de países que ainda vivem sob um regime monárqui-

co na Europa: Espanha, Bélgica, Dina-marca, Liechtenstein, Luxemburgo, Mónaco, Noruega, Holanda, Reino Uni-do e Suécia.Portugal deixou este regime há cerca de 100 anos. As causas são conhecidas, po-rém, a questão não é saber o porquê de abolir a monarquia, mas o porquê de mantê-la.

Eles falam por si. Segundo a Casa Real de Espanha, a Monarquia custa a cada cidadão espanhol cerca de 19 cêntimos, enquanto que para portugueses, a Repú-blica custa à volta de 2 euros e pouco a cada cidadão.Em 1910, o Orçamento de Estado era qualquer coisa como 501 000 escudos, o equivalente a 2.498,98 Euros, e paga-va os encargos com a família, os salári-os de cerca de 250 pessoas da Corte, as visitas de estado e a manutenção dos

Palácios da Ajuda, das Necessidades, de Belém, do Palácio da Vila em Sintra e do Palácio Real de Mafra.Esse valor seria, hoje, à volta de 10.528.177,09 Euros. Mas a verdade é que, segundo fontes governamentais, este orçamento chega aos 17.464.000,00 Euros, para encargos com o Presidente, despesas com os seus assessores e restante pessoal da ca-sa civil, visitas de estado e a manuten-ção do palácio de Belém.

Tradicionalmente, os herdeiros ao tro-no casavam ao seu nível. Contudo, por exemplo Felipe de Espanha é casado com uma plebeia, agora unida ao her-deiro do trono espanhol. A herdeira do trono sueco casou agora com o seu per-sonal trainer. E o povo aplaude. Poderá isto ser significativo no que to-ca a manter uma relação de confiança com o povo, ou será uma cedência das Famílias Reais aos tempos modernos?

Como consegue um país conciliar um

rei ou rainha com um Primeiro-minis-tro? Em Inglaterra, a Rainha Isabel II está no trono desde 1952, enquanto o seu povo elege um primeiro-ministro periodicamente. Porque decidiu Portugal ter uma repú-blica? Sentir-se-á o povo mais livre ao escolher os seus governantes? Se sim, então, porque é que outros países ainda não adoptaram este sistema? Que razão terão aqueles 10 países para ainda vive-rem sob um regime monárquico?Os tempos mudaram, e estes regimes tornaram-se menos absolutistas. Em tempos, havia cortes, mas essas ainda deixavam a última decisão aos reis. Os monarcas recentes, do século XX, viram que tinham de dar mais liberdade ao seu povo, ou acabariam como o nos-so D. Carlos. Até o Duque de Bragança chegou a essa conclusão: ser rei não é sinónimo de ser absolutista. Por isso se abriram estas ‘excepções’: os reis abdi-cam um pouco do seu poder, deixam ou-tros governar, representam o seu país, e

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Mataram o Sidónio

Fantasia Lusitana

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Bute daí, Zé! 5 de Outubro e a I República A minha primeira República

A Corte do Norte

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Visita

No dia 4 de Maio de 2010 o Clube de Jornalismo, acompanhado pe-

las professoras Edina Guerra e Mª de Jesus Pinto, visitou, no seu último dia, a exposição “A Guarda e a República” que assinala o 99º aniversário da Guar-da Nacional Republicana, no Quartel do Carmo, em Lisboa.

Contíguo ao Convento do Carmo, cria-do por D. Nuno Álvares Pereira nos fi-nais do séc. XIV, este quartel conserva a memória de acontecimentos marcan-tes da História Contemporânea portu-guesa.Com a disponibilização da Constitui-ção Política de 1911, a exposição evo-

ca a Implementação da República, acontecimento indispensável para a for-mação da Guarda. Contudo, o aconteci-mento que está umbilicalmente ligado a este espaço é o 25 de Abril, já que foi aqui que foi negociado e transmitido o poder em 74.