Era uma vez...

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| literatura | 42 POR JUNIOR BELLÉ ERA UMA VEZ... A DENSIDADE DA LITERATURA INFANTIL BEBENDO DA FONTE DE CLÁSSICOS AUTORES COMO MAURICE SENDAK, SHEL SILVERSTEIN E THEODOR SEUSS GEISEL, ESCRITORES ENCARAM O DESAFIO, E A NECESSIDADE, DE TOCAR EM TEMAS SENSÍVEIS E, AO MESMO TEMPO, GARANTIR QUE O CAMINHO E A AVENTURA NÃO FIQUEM APENAS NO FAZ DE CONTA POR JUNIOR BELLÉ

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P O R J U N I O R B E L L É

ERA UMA VEZ...A DENSIDADE DA LITERATURA INFANTIL

BEBENDO DA FONTE DE CLÁSSICOS AUTORES COMO MAURICE SENDAK, SHEL SILVERSTEIN E THEODOR SEUSS GEISEL, ESCRITORES ENCARAM O DESAFIO, E A NECESSIDADE, DE TOCAR EM TEMAS SENSÍVEIS E, AO MESMO TEMPO, GARANTIR QUE O CAMINHO E A AVENTURA NÃO FIQUEM APENAS NO FAZ DE CONTA P O R J U N I O R B E L L É

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Mas para a escritora e pós-doutora Ieda de Oliveira, os temas dolorosos sempre estiveram presentes na literatura infantil. “Há coisa mais dura que comer a carne da avó e beber seu sangue? Chapeuzinho Vermelho, que ainda nem chapéu tinha e muito menos vermelho, nas Histórias que os camponeses contam, de Robert Darnton. Vingança, ódio, amor, inveja, violência, medo e todos os sentimentos humanos são combustíveis da literatura. Em princípio, não há limite temático. O que pode haver são limitações do contrato de comunicação da literatura de cada época.” Segundo Ieda, há também um contrato que rege a relação adulto-criança, “que é diferente do que subjaz à relação entre dois adultos”, o que faz da literatura infantil algo incrivelmente desa�ador. A�nal, a margem de manobra para a produção do texto é muito mais estrei-ta: “O autor de literatura infantil tem como leitor uma criança com um universo menor que o seu, com limitações de léxico, de sintaxe e de visão de mundo, e isso faz com que ele necessite produzir seu texto dentro de uma linha de desa�o enorme”.

Esse desafio, segundo Rodrigo Lacerda, vencedor do Jabuti de 2009 com o romance juvenil O fazedor de velhos, “é, antes de tudo, não esquecer que eles são pessoas como nós, com os mesmos dilemas existenciais que nós, e de certa forma com dilemas ainda piores, pois enquanto nós adultos já recebemos algumas resposta da vida, a deles ainda está totalmente em aberto, o que é muito mais angustiante”. Para o escritor, não há uma “evolução” no gênero, pois isso pressuporia que algo pior �cou melhor, “e não sei se a literatura juvenil do passado era pior que a de hoje”. Mas Lacerda pontua que as mudanças sociais po-dem, sim, repercutir na assimilação das obras, ou em torná-las preco-cemente ultrapassadas, ainda que haja temas eternamente universais: “Talvez a literatura juvenil para meninas tenha envelhecido um pouco pior, pois o papel social da mulher mudou muito mais. Então, uma Condessa de Ségur, ou uma M. Delly talvez soem meio antiquadas. Mesmo assim, quando vejo a virgindade sendo um tema tão central em uma série tão popular entre os jovens de hoje quanto a Crepúsculo, penso que talvez nem isso tenha mudado tanto”. c

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Abaixo, desenho de A parte que falta encontra o Grande O, de Shel Silverstein, sequência mais introspectiva de A parte que falta; no alto, imagem de A máquina do poeta, de Nelson Cruz. Na página ao lado, ilustração de O gato da cartola, outro grande sucesso de Theodor Seuss Geisel

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