Entrevista sobre preconceito

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Para falar sobre o preconceito, tema desta reportagem, tivemos a oportunidade de entrevistar José Aparecida de Araújo, de 51 anos. Nasceu em São Bernardo do Campo, onde ainda é residente e mora no bairro Cooperativa. Atualmente, trabalha como chefe de segurança do Colégio Petrópolis, onde foi carinhosamente apelidado de “Mão”. É casado, tem um filho de 27 anos e a cerca de 20 anos, foi vítima de preconceito racial. Mão trabalhava em uma casa de câmbio e lá conheceu um colega de trabalho pelo qual acabou criando uma grande afinidade. A amizade deles ia além do expediente, assim como descreve: “ ele ia em casa, almoçava, passeávamos juntos eu e ele, minha esposa e a esposa dele...”. Porém, um dia, seu amigo contou-lhe que não gostava de negros, deixando-o confuso: “eu fiquei sem entender, achei que era brincadeira, mas ele disse: não, estou falando sério. ”. A partir desse momento, concordou que só trataria de assuntos profissionais com seu amigo e o episódio encerrou-se. Portanto, quando perguntado o que sentiu naquele momento, José descreve que ficou muito magoado e como estava de “cabeça quente” pensou em até fazer uma “besteira”. Mas claro, refletiu sobre o assunto, pensou também em seu filho, muito novo na época, e percebeu que aquela não era a melhor maneira de se resolver a situação. Afinal, “que exemplo estaria dando para o meu filho se tivesse agido daquela maneira? ”, diz Mão. Este foi o único episódio discriminativo de grande evidência em sua vida. Seu filho nunca sofreu algo parecido, mas já o preparou para se algo do tipo ocorrer: “ensinei que não pode partir para a violência, não é assim que se resolve”. Existe uma grande diferença entre o preconceito e o pré-conceito. O segundo, é uma primeira análise de algo ou alguém logo no primeiro contato. Esta primeira impressão, caso for ruim, pode ser facilmente superada pelo convívio e conhecimento. Porém, o preconceito, em linhas gerais, não dá espaço para esta mudança de conceito, resultando na própria história entre o Mão e seu amigo, e em tantos outros casos de discriminação e violência. O preconceito no Brasil, mais especificamente contra negros, surge da marginalização destes na sociedade atual. É fato que, na nossa realidade, a maioria pobre é negra. Segundo uma pesquisa realizada pelo IBGE em 2013, os negros ganham apenas 57,4% do salário da população branca. Além disso, em representações na mídia, quando não

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Para falar sobre o preconceito, tema desta reportagem, tivemos a oportunidade de entrevistar Jos Aparecida de Arajo, de 51 anos. Nasceu em So Bernardo do Campo, onde ainda residente e mora no bairro Cooperativa. Atualmente, trabalha como chefe de segurana do Colgio Petrpolis, onde foi carinhosamente apelidado de Mo. casado, tem um filho de 27 anos e a cerca de 20 anos, foi vtima de preconceito racial. Mo trabalhava em uma casa de cmbio e l conheceu um colega de trabalho pelo qual acabou criando uma grande afinidade. A amizade deles ia alm do expediente, assim como descreve: ele ia em casa, almoava, passevamos juntos eu e ele, minha esposa e a esposa dele.... Porm, um dia, seu amigo contou-lhe que no gostava de negros, deixando-o confuso: eu fiquei sem entender, achei que era brincadeira, mas ele disse: no, estou falando srio. . A partir desse momento, concordou que s trataria de assuntos profissionais com seu amigo e o episdio encerrou-se. Portanto, quando perguntado o que sentiu naquele momento, Jos descreve que ficou muito magoado e como estava de cabea quente pensou em at fazer uma besteira. Mas claro, refletiu sobre o assunto, pensou tambm em seu filho, muito novo na poca, e percebeu que aquela no era a melhor maneira de se resolver a situao. Afinal, que exemplo estaria dando para o meu filho se tivesse agido daquela maneira? , diz Mo. Este foi o nico episdio discriminativo de grande evidncia em sua vida. Seu filho nunca sofreu algo parecido, mas j o preparou para se algo do tipo ocorrer: ensinei que no pode partir para a violncia, no assim que se resolve. Existe uma grande diferena entre o preconceito e o pr-conceito. O segundo, uma primeira anlise de algo ou algum logo no primeiro contato. Esta primeira impresso, caso for ruim, pode ser facilmente superada pelo convvio e conhecimento. Porm, o preconceito, em linhas gerais, no d espao para esta mudana de conceito, resultando na prpria histria entre o Mo e seu amigo, e em tantos outros casos de discriminao e violncia. O preconceito no Brasil, mais especificamente contra negros, surge da marginalizao destes na sociedade atual. fato que, na nossa realidade, a maioria pobre negra. Segundo uma pesquisa realizada pelo IBGE em 2013, os negros ganham apenas 57,4% do salrio da populao branca. Alm disso, em representaes na mdia, quando no vemos o negro como marginal, vemos como um jogador de futebol ou artista. Em linhas gerais, este um dos pontos que faz surgir o preconceito. Est previsto no Art. 1 da lei nm. 7.716/89 que sero punidos os crimes resultantes de discriminao ou preconceito de raa, cor, etnia, religio ou procedncia nacional. As punies envolvem, inclusive, a recluso do condenado. Contudo, o preconceito tnico ou racial ainda faz parte do cotidiano da sociedade brasileira na medida em que, na maioria das vezes, ele ignorado e no resulta em mudana de postura ou mesmo a punio. necessrio aproximar a populao negra da branca tanto socialmente, quanto economicamente. Em relao s medidas econmicas, preciso que o governo d condies para que o negro tenha as mesmas oportunidades que o branco e a sociedade, por sua vez, deve destruir o arqutipo do negro na esfera pblica e mdia para que se reverta o preconceito enraizado na nossa sociedade. Havendo esta mobilizao conjunta de governo e sociedade, casos como o de nosso amigo Mo podem deixar de ocorrer com frequncia em um futuro prximo.