Entrevista joão greno

7
Entrevista João Greno 1 - Qual o modelo pedagógico que segue enquanto professor online e porquê? Na verdade não tenho um modelo pedagógico pessoal. Tenho antes um estilo de comunicação com os meus alunos e tento adaptar a minha mensagem aos contextos. Assim, tanto utilizo uma estratégia de desenvolvimento de aprendizagens baseada no construtivismo e em actividades colaborativas, pela proposição de construção de conteúdos gerados pelos estudantes, como sugiro, para os mesmos alunos, que utilizem tutoriais estritamente behavioristas para a aprendizagem de organização de espaços do tipo wordpress ou mindomo. As razões para esta abordagem tem a ver com a percepção pessoal que todos aprendemos de forma diferente, mas que aprendemos melhor determinados constructos fazendo e colaborando com outros, enquanto que noutras situações, uma aprendizagem mais funcional é mais eficaz e nos faz atingir os nossos objectivos mais rapidamente, sem prejuízo da qualidade. O modelopedagógico é assim determinado pelas características dos projectos formativos que desenho, promovo, ou em que sou envolvido. 2 - O elearning, por definição, está associado à utilização das Tecnologias de Informação e Comunicação. Como definiria o papel de cada uma destas vertentes - Tecnologias, Informação e Comunicação - no processo de ensino e aprendizagem? Há alguma mais preponderante que as outras Esta é uma trilogia que não partilho, a não ser que consideremos informação o conteúdo, e à comunicação toda a abordagem pedagógica que lhe está associada. Na verdade adopto uma trilogia em que os conteúdos (informação), o modelo tutorial e a tecnologia formam um bloco de interdependências. Retiro um pequeno texto de um livro meu Lagarto, J. (2009). Ensino a distância em elearning. Lisboa: UCP Editora (para a licenciatura em Lingua Gestual Portuguesa)

description

 

Transcript of Entrevista joão greno

Entrevista João Greno

1 - Qual o modelo pedagógico que segue enquanto professor online e porquê?

Na verdade não tenho um modelo pedagógico pessoal. Tenho antes um estilo de comunicação com os meus alunos e tento adaptar a minha mensagem aos contextos.

Assim, tanto utilizo uma estratégia de desenvolvimento de aprendizagens baseada no construtivismo e em actividades colaborativas, pela proposição de construção de conteúdos gerados pelos estudantes, como sugiro, para os mesmos alunos, que utilizem tutoriais estritamente behavioristas para a aprendizagem de organização de espaços do tipo wordpress ou mindomo.

As razões para esta abordagem tem a ver com a percepção pessoal que todos aprendemos de forma diferente, mas que aprendemos melhor determinados constructos fazendo e colaborando com outros, enquanto que noutras situações, uma aprendizagem mais funcional é mais eficaz e nos faz atingir os nossos objectivos mais rapidamente, sem prejuízo da qualidade.

O modelopedagógico é assim determinado pelas características dos projectos formativos que desenho, promovo, ou em que sou envolvido.

2 - O elearning, por definição, está associado à utilização das Tecnologias de Informação e Comunicação. Como definiria o papel de cada uma destas vertentes - Tecnologias, Informação e Comunicação - no processo de ensino e aprendizagem? Há alguma mais preponderante que as outras

Esta é uma trilogia que não partilho, a não ser que consideremos informação o conteúdo, e à comunicação toda a abordagem pedagógica que lhe está associada.

Na verdade adopto uma trilogia em que os conteúdos (informação), o modelo tutorial e a tecnologia formam um bloco de interdependências. Retiro um pequeno texto de um livro meu

Lagarto, J. (2009). Ensino a distância em elearning. Lisboa: UCP Editora (para a licenciatura em Lingua Gestual Portuguesa)

“Conceber um projecto em elearning pode não ser uma tarefa fácil. Podemos dizer que a solução para encontrar, nem certo contexto, um melhor modelo de formação, passa pela análise global de três componentes que são determinantes nestes regimes:

o modelo pedagógico - tipo de tutoria

a tecnologia a adoptar

a estruturação dos conteúdos

Associado a estas componentes, na altura do desenho do projecto formativo, há também que regular a frequência das sessões presenciais. Esta frequência, bem como o tipo de objectivos dessas sessões, deve ser estabelecida desde o início do planeamento.

Podemos imaginar, na técnica de concepção, que a aprendizagem se consegue pelo contributo e somatório das componentes referidas.

Se representarmos a aprendizagem por um círculo, veremos o peso de cada uma das componentes.

Podemos considerar que a aprendizagem se faz com a conjugação equilibrada dessas três componentes.

Em muitos contextos este equilíbrio pode não existir dado que uma das

componentes pode ser preponderante sobre as outras.

Imaginemos um contexto em que, por razões diversas, não há possibilidade de criar conteúdos interactivos nem muito apelativos. Então, estrategicamente, podemos fazer com que a tarefa de transmissão da informação passe pelo tutor e pelo trabalho colectivo dos formandos em actividades colaborativas.

Aumenta-se assim o peso da tutoria relativamente às outras duas componentes.

Em termos gráficos, e considerando que a área total se mantêm (temos de conseguir o mesmo nível de aprendizagens), a área da tutoria aumenta, diminuindo a referente ao conteúdo.

O papel do tutor assume uma grande importância, o que naturalmente vai implicar maior tempo de ocupação nas tarefas de

conteúdo

tecnologia

tutoria

conteúdo

tecnologia

tutoria

conteúdos; 30

tecnologia; 20

tutoria ; 10

apoio aos formandos. Em termos práticos o custo de tutoria aumentará nos orçamentos dos projectos.

Ao contrário, podemos investir fortemente na concepção de conteúdos, tornando-os mais interactivos, multimédia, completos, predictores de dúvidas dos formandos, que a intervenção tutorial pode assumir valores residuais, eventualmente até anular-se.

O conteúdo fica bastante mais auto-suportado, permitindo que o curso possa ser bastante autónomo face a recursos humanos de tutoria.

A possibilidade de disseminação livre é assim maior dada a pouca necessidade de suportes tutoriais.

De qualquer modo, esta menor (ou quase nula) necessidade de tutoria não implica que o curso em si tenha garantia de sucesso quando utilizado em contextos diferentes do inicial.

Assumimos aqui que a tecnologia se mantêm com peso idêntico em ambas as situações anteriores, o que na verdade é o que acontece na maior parte das situações.

Uma adequada conjugação das componentes em jogo, aliada à escolha criteriosa dos momentos presenciais poderá levar a situações de efectivo sucesso dos cursos em regime de elearning.

3 - Desde que o conceito de Web 2.0 surgiu têm havido várias discussões acerca do tema e o próprio conceito tem sofrido evoluções. Fala-se já em Web 3.0 ou Web semântica. De que forma a Web 2.0 tem interferido na mudança dos modelos pedagógicos em elearning? Ou são unicamente uma forma diferente de continuar práticas já existentes, sem qualquer influência para a mudança dos paradigmas?

Ao poder utilizar as múltiplas ferramentas da web 2.0 um projecto de elearning pode verdadeiramente descentrar o processo de aprendizagem do professor e focá-lo no aprendente. Mas para que isso aconteça é necessário que o modelo pedagógico preconizado em cada contexto opte pelo modelo de aprendizagem que mais se lhe adequa. Se o modelo de aprendizagem for de características construtivistas e colaborativas, existem ferramentas na Web 2.0 que auxiliam o processo de aprendizagem. No entanto, se o modelo adoptado for do tipo behaviourista, também existem na Web 2.0 ferramentas que facilitam a aprendizagem. Assim, quem tem de tecer essa partitura de comunicação entre o aprendente e a organização ensinante será um “instructional designer” com fortes competências em psicologia da aprendizagem, em comunicação multimédia e em desenho de projectos de elearning.

Na verdade as ferramentas TIC são neutras face às teorias da aprendizagem. Podem e devem é ser colocadas ao serviço dos diferentes modelos que existem e, que em cada caso, podem servir determinado contexto.

4 - Afirmou recentemente (num webinar patrocinado pela CRIE/DGIDC) que as estratégias instrucionistas também são necessárias. Isso não é, de alguma forma, contrário ao desenvolvimento das comunidades de prática e de aprendizagem, que também defende? Quer explicitar melhor este raciocínio?

É perfeitamente possível e adequado que em cada contexto formativo se identifiquem as melhores estratégias de aprendizagem para que o processo formativo tenha sucesso. Cada contexto formativo tem de contar com múltiplas variáveis, das quais podemos referir algumas: perfil dos formandos, hábitos de estudo, acesso a equipamentos de leitura de conteúdos, tipo de regime de ensino a postular – individual ou de grupo; tipo de conteúdo da formação; duração previsível da formação; idade dos estudantes; tipo de formação a desenvolver (iniciação, aprofundamento, reciclagem, etc), orçamento disponívbel, entre outras.

Assim, só depois de pesar estas variáveis o gestor/conceptor do projecto de elearning pode postular o modelo de aprendizagem que vai privilegiar no desenvolvimento da formação e na concepção do “dispositivo de formação”. E aí, o mais adequado tanto pode ser algo construtivista individualizado, algo muito comportamentalista, ou pelo contrário, algo em que a perspectiva de aprendizagem se apoie em actividades de cariz fortemente colaborativo. Não há efectivamente um modelo em elearning mas tantos quantos os contextos com que nos deparamos. Importa é saber, para determinado público, tendo em conta as suas características, qual o melhor desenho de formação a desenvolver.

No entanto, e sempre que o contexto é favorável, parece-me adequado que as aprendizagens se suportem em práticas colaborativas, fomentando a partilha e a criação de comunidades aprendentes. A aprendizagem em grupo, com práticas de partilha, é claramente mais enriquecedora para todos os membros que participam na sua construção e manutenção.

5 - Muitas instituições de Ensino Superior estão, gradualmente, a desenvolver cursos na modalidade de elarning, a par com os cursos presenciais tradicionais. Na sua perspetiva, é apenas uma estratégia de marketing de forma a acompanhar as tendências atuais ou, na realidade, as Universidades já perceberam que o futuro da educação passa necessariamente cada vez mais pelo elearning? Estão as Universidades efetivamente preparadas para a mudança?

Na verdade suspeito que apenas ainda pequenas franjas das IES estão despertas para a necessidade do uso do elearning. Bolonha não foi percebido na maioria das nossas instituições. Não se devia tratar apenas de emagrecer currículos mas sim de implementar sistemas de aprendizagem (incluindo dispositivos tutoriais) fortemente

apoiados em TIC e no elearning. Se isso não se fizer a verdadeira implementação do processo de Bolonha será impossível.

E, tanto quanto me apercebo, muito poucas Universidades fazem uma aposta global no elearning. Esta aposta tem de ser forte, pedagogicamente orientada e estrategicamente desenvolvida para que possa dar frutos e não criar anti-corpos. Mudar paradigmas de estar no processo de ensino aprendizagem não é algo fácil nem que se faça sem um grande esforço de todos os actores envolvidos. E conto nestes actores com os próprios estudantes, em grande número pouco habituados a trabalho autónomo e à auto-regulação da sua aprendizagem.

Mas de um modo global as organizações pressentem que o futuro passa pela utilização das tecnologias nos espaços de aprendizagem. Muitas vezes existe também alguma confusão entre elearning e ensino a distância, o que cria algum desconforto ao nível das entidades decisoras.

Na verdade, os nossos alunos são hoje nativos digitais e não os poderemos continuar a ensinar com tecnologias do Sec XIX. A própria internacionalização das IES obriga a troca constantes de informação, à flexibilização da disponibilização dos conteúdos, das horas de atendimento, dos processos de avaliação.

Pode a tecnologia, em determinado momento histórico, ser aproveitada como arma de marketing, mas em pouco tempo as organizações terão de ser pensadas como ambientes de aprendizagem tecnologicamente enriquecidos, implicando nisso todos os actores envolvidos.

6 - O elearning tem ganho cada vez maior importância nos contextos formais e informais de aprendizagem, seja numa forma totalmente online, seja em regime blended, sendo mesmo apontado como fundamental na aprendizagem ao longo da vida. Como projeta o futuro do elearning, tendo em conta o desenvolvimento tecnológico e as transformações sociais e económicas decorrentes da evolução da sociedade?

O futuro do elearning é algo que me parece bem previsivel. Pouco a pouco as estratégias de ensino vão mudando os seus paradigmas e dispõem já hoje de um leque variado de opções. Compete claramente ao professor gerir esse manancial de oportunidades e criar ambientes propícios de aprendizagem para os seus alunos. Estudos de caso, trabalhos de projecto, webquests, pesquisa orientada, conteúdos gerados pelos utilizadores (UGC)1 são apenas exemplos de formas de propiciar aprendizagens em ambientes controlados, tecnologicamente enriquecidos e geridos pelo professor. Será aqui que o elearning tem sentido, sendo aliás incontornável como antes sugeria.

Mas existirão muitas formas de elearning e muitas opções para quem quer aprender. E utilizando a perspectiva de Rosenberg no seu livro “Beyond elearning”, o elearning servirá desde os modelos mais formais de educação e formação até aos limites extremos da auto aprendizagem ao serviço do lazer de cada cidadão. É a enorme

1 User generated contents

versatilidade dos sistemas de elearning, que será o paradigma da aprendizagem do futuro…mesmo que não se lhe chame elearning.