Ensino de História, Um Campo de Pesquisa - Reflexões Sobre Os Livros Didáticos

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  • 7/25/2019 Ensino de Histria, Um Campo de Pesquisa - Reflexes Sobre Os Livros Didticos

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    Ensino de Histria, um campo

    de pesquisa: reflexessobre os livros didticos

    Andr Mendes Salles*

    Resumo:O Ensino de Histria hoje se constitui como umfrutfero espao de discusses e investidas acadmicas. Com as

    renovaes terico-metodolgicas que se intensificaram, sobre-tudo na dcada de 1980, o livro didtico se tornou objeto e fontede pesquisa para os historiadores mais sensveis a tais renovaes.Entendemos o ensino de Histria e as questes a ele relacionadascomo fazendo parte constitutiva da prpria reflexo do histo-riador. Assim sendo, este artigo pretende discutir as diretrizes etendncias nas produes sobre os livros didticos nas ltimasdcadas. Intenciona-se tambm discutir algumas das funesdo livro didtico, pretendendo estabelecer possveis definies do

    que seja este objeto cultural.Palavras-chave:Ensino de Histria, Livro didtico, Historiografia.

    Abstract:The teaching of History today consists of a fruitfularea of discussion and academic research. With renovations inmethodological theory becoming especially intense during the1980`s, textbooks became historical objects and sources forhistorical research. The teaching of History and related questionsare understood to be a reflection of the historian himself. Becauseof this, this article aims to discuss the direction and tendenciesin research and publications on textbook in the last few decades.

    * Graduado em Histria pela Universidade Federal de Pernambuco. Mestrando em

    Histria pela Universidade Federal da Paraba. Bolsista CAPES. E-mail: [email protected]

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    In addition, this article will elaborate the function of textbooks,and define their role as cultural objects.

    Keywords:Teaching of History, Textbook, Historiography.

    O Ensino de Histria hoje se constitui como um frutferoespao de discusses e investidas acadmicas e dispe de umagama de trabalhos dos mais diversificados. A grande maioriadesses foi desenvolvida nos Programas de Ps-Graduao emEducao (PPGE); comparativamente, pouco se produziu acercadesse campo de pesquisa nos Programas de Ps-Graduao emHistria (PPGH). Contudo, esse panorama, felizmente, vem semodificando, pois alguns PPGHs j possuem linhas de pesquisaespecficas sobre Ensino de Histria, a exemplo da UniversidadeFederal da Paraba UFPB, pioneira nesse campo, e da Univer-sidade Estadual de Londrina UEL. Apesar dessa mudana dementalidade, quer dizer, apesar de considerar o Ensino de Hist-ria como um objeto de pesquisa no s da rea educacional, mastambm como objeto de pesquisa prprio do historiador, esseprocesso se desenrola ainda de maneira muito tmida. A esserespeito, diz uma importante pesquisadora da rea:

    Historicamente, as Universidades no Brasil pouco se voltaram para aquesto do Ensino. Na pesquisa histrica e sobre o ensino de Histria,no foi diferente. O ensino de Histria foi visto, at a dcada de 1960,como rea de formao, no como objeto de pesquisa (OLIVEIRA,2003, p. 38).

    O Ensino de Histria uma face da Histria como conhe-cimento, a Histria em situao de ensino, diz Marcos Silva(SILVA, 2007, p.275). Assim, o autor refora nossa perspectivae nos convida, ns historiadores, a reaver o campo de pesquisaEnsino de Histria prpria Histria. Assim:

    [...] embora o Ensino de Histria seja uma face da Histria comoconhecimento, esta ltima se cindiu e deixou de ver com clareza aqueladimenso como parte de seu ser. Cabe-nos, ento, ajudar a Histria

    no fugir de si, a se reaver integralmente, a recuperar aquele vis comosua expresso legtima (SILVA, 2007, p. 275).

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    Talvez tal estado de coisas possa ser explicado na senil concep-o hierrquica entre os cursos de Licenciatura e Bacharelado em

    Histria, donde aos bacharis delegada toda a responsabilidadena produo do conhecimento cientfico, restando aos licenciados,a pouco nobre funo de reproduzir tais conhecimentos, queforam elaborados por outros e em outros locais desconhecidosdos mesmos.

    Desde modo, Ilka Mesquita e Ernesta Zamboni, em insti-gante artigo, afirmam:

    Nesse sentido, voltamos o olhar para o modelo de formao do profes-sor de Histria que foi estruturado nas dcadas de 1960 e 1970 e quepermaneceu na dcada de 1980, na qual predominava a concepode cursos de licenciatura baseados na transmisso de conhecimentoshistricos e em tcnicas pedaggicas trabalhadas pelas didticas e noestgio supervisionado. Nesse modelo, o saber-fazer prtico submetidohierarquicamente ao como fazer da cincia, pois o professor formadorensinava o futuro professor a trabalhar com as ferramentas mais usuais:livro, quadro e giz. Isso significa que o professor formado nesse mode-lo deveria apenas ater-se a determinadas tcnicas que promovessem

    o repasse mecnico do conhecimento produzido pelos doutos, aquelesinvestigadores que detm e produzem o conhecimento cientfico (MES-QUITA; ZAMBONI, 2008, p. 133).

    Ainda ao que concerne a tal concepo hierrquica edicotmica da formao do historiador, que persiste aos dias atuais,

    Mesquita e Zamboni afirmam que as mudanas educacionais,consolidadas nos anos 1990 e no incio do sculo XXI, continuamapresentando velhos problemas, como as dicotomias licenciatura/

    bacharelado, ensino/pesquisa, teoria/prtica (2008, p. 134).A prpria Associao Nacional de Histria ANPUH,antes Associao Nacional de Professores Universitrios de Hist-ria, j traz, no bojo de sua trajetria, a polmica discusso entrepesquisa/ensino, o que pode ser constatado na modificao donome da entidade, devido insero de professores do EnsinoBsico e de alunos de ps-graduao como scios.

    Essa incluso gerou acirradas contendas, fato que pode ser

    claramente observado na entrevista da professora Da Ribeiro

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    Fenelon s pesquisadoras Mesquita e Zamboni (2008), ao falarsobre as reaes a esse projeto de mudana, o qual tem a prpria

    entrevistada como uma das autoras:Mas o que era a reao? Era muito pelo lado de que a associao erauma associao cientfica, de conhecimentos, de produo e apresentaode trabalhos. Era uma coisa dos historiadores. Fazia-se muito essadiferena. E o professor ainda estava numa fase em que no produzia,que no era um pesquisador. Houve uma reao tambm grande aproposta. A professora Ceclia Westphalen, que uma das primeiraspresidentes da associao, rasgou o estatuto e falou que a gente ia destruira ANPUH (MESQUITA; ZAMBONI, 2008, p. 139).

    O relato da professora Fenelon refora nossa ideia da fortehierarquizao da pesquisa em detrimento do ensino, como se esteno passasse de uma simplria reproduo de conhecimentos. evi-dente que tal celeuma tambm possui imbricaes polticas, como porexemplo, a luta contra os Estudos Sociais implantado pelo Governo

    Militar, mas que, no momento, no nos interessa aprofundar. lgico tambm que a reao a tal projeto, por parte de

    alguns scios da entidade, tivesse uma preocupao de manutenodestatus quo. Assim, como forma de preservao de um espao depesquisa que no fosse abalado por professores do Ensino Bsicoe/ou alunos de ps-graduao, foi criada uma nova instituio, aento Sociedade Brasileira de Pesquisa Histrica.

    Devemos destacar que, h muito, caiu por terra a velhaideia de que eram somente os alunos formados no bachareladoquem realizavam cursos de ps-graduaostrito senso. Alm disso,

    defendemos, assim como as pesquisadoras Mesquita e Zambo-ni, que a docncia, o ensino e a reflexo sobre a formao deprofessores de histria fazem parte do ofcio do historiador.(2008, p. 159).

    Ainda nessa perspectiva, e seguindo a trilha traada pelaspesquisadoras Costa e Oliveira, percebemos que:

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    Essa mudana no enfoque [da rea educacional PPGE para ahistrica PPGH. Grifo meu] foi proporcionada tambm pelo aumentosignificativo do nmero de trabalhos sobre ensino de Histria. Trabalhos,antes espordicos e centrados na pedagogia, tornam-se cada vez maispresentes nas reflexes de licenciados e bacharis em Histria pensandoa sua prpria rea e o seu ensino (COSTA; OLIVEIRA, 2007, p. 155).

    Com isso, no estamos querendo deslegitimar ou mesmotransferir as pesquisas dos PPGEs para os PPGHs. Ao contrrio,reconhecemos a vital importncia que os Programas de Ps-Graduao em Educao exerceram (at mesmo como formade resistncia dos pesquisadores do Ensino de Histria) e aindaexercem (e tomara que assim continue).

    Entendemos o Ensino de Histria como uma instnciada cincia da Histria. No se escreve Histria sem pensar nosusos que dela fazemos, e um desses usos , justamente, o ensino.(RSEN, 2006). Assim, preciso que os Programas de Ps-Graduao em Histria recuperem a rea Ensino de Histriacomo parte constitutiva da prpria disciplina, ou, como diz

    Marcos Silva (2007), que tomem o Ensino de Histria como reade conhecimento da prpria Histria.Nessa perspectiva, entendemos que a Histria, enquanto

    disciplina escolar, merece um espao maior dentre as produesacadmicas, sobretudo nos Programas de Ps-Graduao emHistria. Interessa-nos, aqui, discutir alguns dos rumos que aspesquisas sobre os livros didticos assumiram.

    As pesquisas sobre o livro didtico

    Ao ser questionado sobre qual o livro didtico dentre umagama de livros diversos, talvez soubssemos identificar com faci-lidade, mas, se questionado sobre o que, de fato, faz de um livro,didtico, talvez encontrssemos um pouco mais de dificuldade.

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    Como, enfim, caracterizar um livro didtico e como os pesqui-sadores que se debruam sobre tal estudo o concebem?1

    Circe Bittencourt, ao tratar a questo, afirma:A familiaridade com o uso do livro didtico faz que seja fcil identific-loe estabelecer distines entre ele e os demais livros. Entretanto, trata-sede objeto cultural de difcil definio, por ser obra bastante complexa,que se caracteriza pela interferncia de vrios sujeitos em sua produo,circulao e consumo. Possui ou pode assumir funes diferentes, dependendodas condies, do lugar e do momento em que produzido e utilizadonas diferentes situaes escolares. um objeto de mltiplas facetas,e para sua elaborao e uso existem muitas interferncias (BITTEN-

    COURT, 2004, p. 301).

    Tentando encontrar uma definio para os livros didticos,Choppin diz o seguinte:

    Se hoje consideramos o livro didtico como um objeto banal, um objetoto familiar que parece intil definir, o historiador que se interessa pelaevoluo dos livros escolares ou das edies escolares se depara,logo de incio, com um problema de definio. A natureza da literaturaescolar complexa porque ela se situa no cruzamento de trs gnerosque participam, cada um em seu prprio meio, do processo educativo:de incio, a literatura religiosa de onde se origina a literatura escolar, daqual so exemplos, no Ocidente cristo, os livros escolares laicos porperguntas e respostas, que retomam o mtodo e a estrutura familiar aoscatecismos; em seguida, a literatura didtica, tcnica ou profissional quese apossou progressivamente da instituio escolar, em pocas variadas entre os anos 1760 e 1830, na Europa -, de acordo com o lugar e o tipode ensino; enfim, a literatura de lazer, tanto a de carter moral quantoa de recreao ou de vulgarizao, que inicialmente se manteve separada

    do universo escolar, mas qual os livros didticos mais recentes e em

    1 Bittencourt destaca que, em sala de aula, os materiais didticos utilizados no serestringem aos livros escolares. Ela apresenta dois tipos de materiais didticos.O primeiro tipo so ossuportes informativos, ou seja, aqueles que tm previamenteestabelecida uma finalidade didtica. Podemos citar como exemplo os prprios manuaisdidticos e paradidticos, assim como apostilas, CD-ROMs, atlas e etc. O segundotipo so denominados pela autora comodocumentos, ou seja, aqueles materiais que emsua produo no se teve, como finalidade, uma preocupao didtica, mas passam aser utilizados como tal por professores, que realizam o processo de didatizao desses

    materiais. Como exemplo, citamos filmes, minissries televisivas, msicas, literaturae etc (BITTENCOURT, 2004, p. 296-297).

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    vrios pases incorporaram seu dinamismo e caractersticas essenciais.Essas categorias, sem se exclurem, freqentemente se interpenetram[...] (CHOPPIN, 2004, p. 552).

    Essa extensa citao serve para que pensemos acerca dacomplexidade da constituio dos livros escolares, ainda maisporque tais textos, alm de estarem no entrecruzamento dos trsgneros acima citados, tambm esto no cruzamento da cultura,pedagogia, produo editorial e sociedade.2

    Ainda na busca de um conceito de livro didtico, nos repor-tamos a Oliveira (2009), que afirma no ser suficiente a definio

    que os dicionrios de Lngua Portuguesa oferecem. Assim, maisdo que um conjunto de folhas impressas e reunidas em volumeencadernado ou brochado com fins de instruir (LAROUSSE,1992, apudOliveira, 2009, p. 13), o livro didtico tem comouma de suas principais caractersticas a materializao da disci-plina escolar.

    Uma segunda caracterstica destacada por Oliveira (2009) o suporte do livro didtico, o papel. Alm disso, esse material

    difere dos textos eletrnicos, pois escrito de forma lineare seqencial. Composto por autores e editores, possui unidadetemtica, finito e o relacionamento entre as suas unidades mediado por sumrio e ndices (ao contrrio dos hiper-textos)(OLIVEIRA, 2009, p. 14).

    O planejamento e a organizao em situaes didticasso, segundo Oliveira (2009), a ltima caracterstica que faz deum livro, didtico. Assim, comungamos da mesma opinio do

    professor Itamar Oliveira, que afirma:Livro didtico , portanto, um artefato impresso em papel, que veiculaimagens e textos em formato linear e seqencial, planejado, organizadoe produzido especificamente para uso em situaes didticas, envolvendopredominantemente alunos e professores, e que tem a funo de trans-mitir saberes circunscritos a uma disciplina escolar. Essa a imagemque fao quando penso em livro didtico (OLIVEIRA, 2009, p. 14).

    2 Choppin (2004), baseando-se em Chris Stray, chega a defender tal ideia.

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    Destarte, Oliveira ressalta pelo menos seis funes quepodem exercer os livros escolares, quais sejam: reproduzir ideo-

    logia; difundir o currculo oficial; condensar princpios e fatosdas cincias de referncia; guiar o processo de ensino; guiar oprocesso de aprendizagem; possibilitar formao continuada(OLIVEIRA, 2009, p. 14).

    Tendo em vista essa complexa natureza dos livros escolares esuas mltiplas facetas, recorremos a Chopin (2004), que tambmreala a multiplicidade de suas funes, destacando quatro essenciais:

    Funo curricular, cuja anlise que se faz do livro didtico

    aquela que o coloca como depositrio de contedos escolares,ou seja, como um suporte bsico e sistematizador privilegiadodos contedos elencados pelas propostas curriculares (BITTEN-COURT, 2008, p. 72). Nesse sentido, os manuais didticostornam-se um instrumento fundamental na prpria constituiodos saberes escolares (BITTENCOURT, 2004, p. 302).

    Contudo, devemos levar em conta, como nos alerta DcioGatti Jr. (2004), que as relaes entre os rgos pblicos respons-

    veis pela educao e as editoras didticas so mais complexas do queimaginamos e representam uma via de influncias de mo dupla. Issoquer dizer que no s as polticas pblicas educacionais influenciamas editoras no que concerne ao contedo dos livros didticos, mastambm estas influenciam as autoridades pblicas no momento de seelaborar o currculo (GATTI Jr., 2004, p. 22-23). Nessa perspectiva,provavelmente nenhum material escolar sofreu tanto as influnciasdas leis de mercado quanto esse. Fundamentalmente porque as pol-ticas do livro escolar mantiveram conectados os interesses estataisaos privados (CORRA, 2000, p. 22).

    Funo instrumental, que apresenta o livro didtico comosuporte de mtodos e tcnicas de aprendizagem. Nessa anlise,o livro escolar avaliado como um instrumento pedaggico,uma vez que produz tcnicas de aprendizagem como exerccios,questionrios, leituras complementares e sugestes de trabalhoem equipe e/ou individual (CHOPPIN, 2004; BITTENCOURT,2004; 2008a; 2008b).

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    Funo ideolgica ou cultural, que privilegia o livro did-tico como sendo um veculo portador de sistemas de valores e

    ideologias, carregadas das concepes, das ideias, dos conceitos edos preconceitos de uma determinada poca: aquela em que foiescrito (CHOPPIN, 2004; BITTENCOURT, 2004, 2008;2008). Nesse sentido, o livro didtico ultrapassa a questomeramente pedaggica, apresentando implicaes polticas,econmicas, ideolgicas e tericas (CAIMI, 1999, p. 28). Afinalde contas, como nos alerta Caimi (1999, p. 43)

    O autor de livros didticos, assim como o historiador, faz opes entrediferentes temas, periodizaes, fontes, mtodos, etc., os quais socondicionados pela poca em que vivem, pelo seu lugar social, pela sua

    viso de mundo. No h, pois, absoluta neutralidade e objetividade;ainda que se esforcem para evitar a parcialidade, no h como se desven-cilhar totalmente desses condicionamentos.3

    Deste modo, entendemos o livro didtico como um produtoproduzido por grupos sociais que, intencionalmente ou no,perpassam sua forma de pensar e agir, portanto, suas identidades

    culturais e tradies. Nesse sentido, preciso conceb-lo numacomplexa teia de relaes e de representaes (BITTENCOURT,2008b, p. 14), donde se misturam interesses pblicos e privados.

    Assim, o material didtico aparentemente simples de se identi-ficar, torna-se de difcil definio (ibidem, p. 14).

    Choppin ainda destaca uma quarta funo: a documental,segundo a qual o livro didtico forneceria um conjunto de docu-mentos, textuais ou icnicos, cuja observao ou confrontao

    podem vir a desenvolver o esprito crtico do aluno (CHOPPIN,2004, p. 553).

    O livro didtico pode ser caracterizado, ainda, enquantoproduto mercadolgico, uma vez que est inscrito em uma lgicamercantil de produo e circulao, obedecendo, deste modo, stcnicas de fabricao e comercializao, inerentes ao processo demercantilizao. Tal perspectiva vem ganhando espao em produ-es acadmicas, ainda mais porque o livro escolar representa,3 Acerca do lugar-social referido por Caimi (1999), ver: Certeau (1982).

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    desde algum tempo, um importante ramo para as editoras, e ,hoje, indubitavelmente, a atividade mais rentvel do setor edi-

    torial brasileiro, cujo maior comprador o Estado. Deste modo,como produto mercadolgico, o livro didtico sofre influnciasdo mercado editorial, que como demonstram pesquisas recentes,tem um papel preponderante no resultado final do livro.4

    Como pudemos perceber, o livro didtico possui vriasfacetas, e deve ser entendido - ou entendido por ns -, portanto,como um objeto cultural, cujas possibilidades so plurais.

    Realizar um estudo sobre o estado da arte da pesquisa

    sobre o livro didtico seria invivel e exaustivo para a pesquisaque nos propomos. Essa, portanto, no a nossa inteno,interessando-nos to somente discutir algumas das diretrizes etendncias acerca das produes didticas das ltimas dcadas.

    Choppin (2004) enfatiza que as pesquisas histricas acercados manuais e edies escolares apresentam mltiplas formas pos-sveis de abordagens. No entanto, destaca duas categorias prin-cipais de anlise.

    A primeira se refere quelas pesquisas que concebem olivro didtico como um documento histrico. So pesquisas queprivilegiam as anlises dos contedos dos textos escolares emdetrimento do livro como produto fabricado. Assim:

    a histria que o pesquisador escreve no , na verdade, a dos livrosdidticos: a histria de um tema, de uma noo, de um personagem,de uma disciplina, ou de como a literatura escolar foi apresentada pormeio de uma mdia particular (CHOPPIN, 2004, p. 554).

    A segunda categoria de anlise refere-se quelas que negli-genciam os contedos contidos nesses manuais didticos, tratando-oscomo produtos fabricados. Tais apreciaes dirigem a atenodiretamente ao livro didtico, como suas formas de produo, edito-rao, distribuio, em detrimento dos seus contedos. No Brasil,podemos destacar como principais exemplos as obras de Kazumi

    Munakata (1997) e Dcio Gatti Jr. (2004; 2005).

    4 Sobre o livro didtico enquanto produto mercadolgico, ver: Cassiano (2003; 2004a;2004b; 2007); Gatti Jr. (2004); Munakata (1997).

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    Devemos destacar que as anlises que privilegiam a funoideolgica do livro didtico vm sendo bastante criticadas. Tal fato

    talvez se explique devido realizao, nas dcadas de 1970 e1980, de uma verdadeira caa s bruxas nos livros didticos,em que se flagrava ideologia em cada frase, palavra ou vrgula(MUNAKATA, 2004, p. 10).

    Muitas dessas obras que seguiram a perspectiva ideolgicase assentaram em dois pilares excludentes entre si: as primeiras

    viam nos livros didticos o grande vilo do ensino brasileiro,imputando-lhes todas as mazelas. As segundas concebiam os livros

    escolares como panacia universal, na expresso utilizada pelaprofessora Fonseca (2003, p. 52).Uma e outra, a nosso ver, trazem srias problemticas

    que merecem uma melhor reflexo. A primeira porque defendea extino ou a no utilizao dos livros escolares, e a segundapor acreditar que seja possvel existir um livro didtico ideal,uma obra capaz de solucionar todos os problemas do ensino, umsubstituto do trabalho do professor (BITTENCOURT, 2004,

    p. 300. Grifo da autora).Em artigo bastante conhecido, Munakata (2003) apontaque, nas dcadas de 1970 e 1980, fez sucesso um gnero literrioque poderia ser denominado as belas mentiras. Assim sendo:

    Uma srie de pesquisas acadmicas dedicaram-se a flagrar nos livros did-ticos e paradidticos brasileiros a presena insidiosa da mentira, da manipu-lao, do preconceito, da mistificao, da legitimao da dominao e daexplorao burguesas em suma, da ideologia. Os ttulos e os subttulos

    de algumas dessas pesquisas j indicavam-lhes a inteno:verso fabricada,histria mal contada, belas mentiras(MUNAKATA, 2003, p. 271).

    As belas mentiras: a ideologia subjacente aos textos didticos,livro de Deir Nosella, foi publicado no final da dcada de 1970.

    Analisando as obras didticas do ano de 1977 da rede de ensinodo Esprito Santo, da 1 a 4 srie, a autora tinha como objetivoapontar os textos escolares como um instrumento da classe domi-nante. Tais livros, segundo a autora, escamoteavam os conflitosde classe com a funo de mascarar um mundo real, contraditrio

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    e injusto, de acordo com os interesses da classe hegemnica(NOSELLA, 1981, p. 177,apudGALZERANI, p. 107, 1997).

    Nesse sentido, consideramos os questionamentos de Galzerani,ao realizar um estudo das produes sobre os livros didticosdesse perodo, fundamentais:

    No conteriam [os livros escolares] tambm outros elementos rela-ciona-dos a outras vises da sociedade, absorvidos e apresentados pelo autor daobra, at mesmo para garantir sua aceitao por uma parcela mais amplada populao? Em outras palavras, at que ponto o contedo do livrodidtico constitui apenas uma mscara que impede o conhecimento da

    vida social? Ou ser que sua linguagem contraditria e ambgua no sesconderia, como tambm expressaria, os conflitos da prpria sociedade?Em nossa opinio, a autora [Nosella] apresenta uma viso unidimensionalda ideologia do livro didtico (GALZERANI, 1997, p. 107).

    Outra obra, destacada por Munakata (1997), e que faz partedo rol as belas mentiras, aIdeologia no livro didtico, de Ana LciaFaria (1996), para quem o livro se resumiria praticamente emser um veculo portador de uma ideologia: a ideologia burguesa.

    O objetivo principal de Faria foi tentar perceber a categoriaconceitual trabalho nos livros didticos das sries inicias do EnsinoFundamental (2, 3 e 4 sries). Alm da anlise dos livros didticos(num total de 35 didticos e 6 editoras dos livros mais vendidosde 1977), entrevistou crianas vinculadas s sries dos livros anali-sados. A tnica das entrevistas foi apreender como essas crianas,que foram, segundo critrios da autora, segregadas em origensburguesa e proletria, concebiam o trabalho.

    Faria (1996, p. 70) afirma que dependendo do referencialterico que se adote, o livro didtico, como uma das manifes-taes da ideologia da classe dominante, pode ser consideradomentiroso, arcaico, falso etc.. No entanto, a autora acreditaque o livro didtico reproduz a ideologia da classe dominante,mostrando a viso idealista da burguesia. Nesse caso, afirma que aaparente falsidade justamente a viso idealista burguesa queno apreende a base material e transmite seus interesses de classe

    como interesses universais (1996, p. 70).

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    Ainda nesta mesma perspectiva, Faria (1996, p. 70-71)afirma que:

    A contradio realidade-discurso encontrada no livro didtico prpriada ideologia burguesa, uma influncia antidialtica sobre o pensamento,o discurso no ilusrio, o que ilusrio considerar a produointelectual desligada da base material, com vida prpria.

    Tal corrente de pensamento trazia, muitas vezes de maneiraexplcita, a ideologia como uma elaborao realizada conscien-temente pela classe detentora do poder no intuito de dissimularas contradies sociais existentes, apresentando um mundohomogneo e sem conflitos.5

    Ademais, concordamos que estas posturas dicotmicas dosocial trazem em seu bojo, por detrs de um discurso aparentementerevolucionrio, um mal disfarado autoritarismo, que arrogapara si a racionalidade do real, a verdade absoluta e inquestionvel(GALZERANI, 1997, p. 109. Grifos da autora). E ainda, alm detudo, tais concepes no consideram professores e alunos, usurios

    privilegiados dos textos escolares, como seres que questionam etransgridem aquilo que se apresenta inscrito como verdade inques-tionvel, apresentando-os como tbulas rasas.

    Na verdade, a outra Histria (a no oficial), defendidapor alguns desses autores,6no seria menos ideolgica, pois sepensarmos nessa lgica dualista, a outra Histria, aquela da classe

    5 Interessante estudo acerca da ideologia pode ser encontrado em Chau (1980; 2006).6 Ver, por exemplo: Munhoz, 1986.7 Interessante artigo intitulado Ensino, Ideologia, conhecimento, escrito por Marcos Silva

    (1986), utilizando-se de uma excelente metfora, o cemitrio dos vivos, critica a perspectivaideolgico-reprodutivista da escola de uma maneira geral e do ensino de Histria emparticular. Silva (1986) afirma que o conceito da ideologia se mantm freqentemente no

    vocabulrio das Cincias Humanas sob o signo da negatividade (p. 15). Outro artigo, bemmais recente, escrito pela professora Rosa Godoy Silveira (2006), tece suas ideias na mesmametfora doscemitriose chega concluso de quea paz dos cemitrios educativos/escolares(ou seja, a Histria vista como um dado acabado e inquestionvel) faz gerar conflitos,pois no valoriza a pluralidade de pensamentos e esvazia toda e qualquer possibilidadede debate e discusso, silenciando, assim, as vozes dissonantes da Histria. Deste modo,defende um ensino de Histria no com tal ou qual ideologia ou verso, mas comoconflito de ideias, que possibilite ao aluno ter uma dimenso/leitura crtica do mundo.

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    dominada, representaria a ideologia dessa classe, s se inverteriao lado da moeda.7

    Nessa rpida apreciao dessas produes, denominadaspor Munakata de as belas mentiras, percebemos uma viso/avaliao quase que esquizofrnica do livro didtico, donde defato se flagrava ideologia em cada frase, palavra ou vrgula(MUNAKATA, 2004, p. 10). Contudo, precisamos ponder-lasremetendo-as ao perodo em que foram produzidas, sob o riscode incorrermos no mais temvel erro do historiador: o anacro-nismo. Nesse sentido,

    Livro didtico (e paradidtico) era compreensivelmente objeto desuspeio, do mesmo modo que era suspeita e no sem razo todaa organizao escolar consolidada pela ditadura. [...] Por isso, no sur-preende que os livros didticos de Histria e Estudos Sociais tivessemsido alvo preferencial do gneroAs Belas Mentiras(MUNAKATA, 2003,p. 271. Grifo do autor).

    A dcada de 1990, contudo, trouxe novas problemticasaos pesquisadores do livro didtico. As anlises que focalizavam

    a escola e os manuais escolares como sendo aparelhos de repro-duo da ideologia dominante, assim como apregoou um dosgrandes influenciadores dessa corrente de pensamento, Althusser(1974), foram logo entrando em descrdito. Nesse momento dahistoriografia ocidental, percebemos a grande influncia das ideiasde Chartier (1990; 1999a; 1999b; 2001). As prticas e as repre-sentaes comearam a fazer parte das reflexes dos pesquisadoresbrasileiros, sobretudo no que diz respeito s prticas de leitura

    e escrita, consideradas pelo autor como criadoras e inventivas.Bittencourt, sensvel a essas mudanas historiogrficas, traz,

    em sua tese de doutorado,Livro didtico e conhecimento histrico: umaHistria do saber escolar, reflexes sobre as formas de utilizaodos livros didticos, compreendendo que cada leitor se apropriado texto lido a sua maneira, de acordo com suas expectativas,experincias e repertrio terico. Apesar disso, no abandona aquesto da ideologia nos manuais escolares, pelo contrrio, refora

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    essa categoria de anlise, sem, contudo incorrer caa s bruxasdo perodo anterior.

    A tese da professora Bittencourt foi transformada em livropela Editora Autntica em 2008 e se intitulaLivro Didtico e SaberEscolar (1810-1910). A obra prefaciada por Alain Chopin,um dos mais importantes pesquisadores franceses sobre o livrodidtico. Chopin (2008), acerca do trabalho desenvolvido porBittencourt, chega a afirmar, no referido prefcio, que este umdos raros trabalhos de sntese jamais realizados no mundo sobre aHistria do livro escolar e, com certeza, um dos mais completos e

    bem sucedidos (p. 10). E termina seu texto afirmando: o livroque o leitor tem em mos , simplesmente, o ato fundador dapesquisa sobre o manual escolar no Brasil (p. 12).

    De fato, a tese da referida autora, defendida no ano de1993, marcaria, indelevelmente, a historiografia sobre os manuaisescolares brasileiros. Seria um divisor de guas em relao spesquisas anteriores: aquelas realizadas, mormente, em fins de1970 e em toda a extenso da dcada de 1980, que valorizavam,

    sobretudo, questes ideolgicas, erros conceituais e preconceitosde toda ordem veiculados nos textos escolares.A professora Bittencourt apresenta, como proposta de seu

    texto, analisar os manuais didticos de forma ampla. No so-mente pela vastido de seu recorte temporal, que correspondeaos anos de 1810 a 1910, mas tambm devido s suas anlisesabarcarem desde a vinculao dos livros escolares no que se refere aopoder institudo, onde a ingerncia do Estado seja ele imperial

    ou republicano se fez sentir, at na prpria forma de utilizaodeste livro por alunos e professores. Nesse sentido, percebemosuma renovao em suas reflexes, tendo em vista o seu Ptria,

    civilizao e trabalho(1990),8que via no Estado o grande repre-sentante da classe dominante, levando-nos a crer a escola comoaparelho de reproduo da ideologia burguesa.

    8 Essa publicao oriunda de sua Dissertao de Mestrado, defendida em 1988, juntoao Programa de Ps-Graduao em Histria Social da Universidade de So Paulo.

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    Entrevista a editores e autores, assim como a usurios delivros didticos, sejam eles professores, alunos ou antigos alunos,

    para apreender suas concepes e leituras sobre os textos escolares,so cada vez mais utilizadas nas pesquisas sobre manuais didticos.Assim, delineia-se um fecundo espao de dilogos, em que se vislum-bram no s aquilo que est inscrito no livro, mas tambm asleituras que seus usurios os do, ou seja, as formas de recepo.

    No comeo da dcada de 1980, podamos contar nos dedosos textos sobre livro didtico no Brasil (OLIVEIRAet al, 1984,p. 19). Contudo, atualmente, com a expanso dos programas de ps-

    graduao em Educao e em Histria, j dispomos de uma gamade importantes trabalhos acerca dos livros didticos em geral e deHistria, em particular, que vo desde sua editorao at sua utili-zao em sala de aula, abordando questes ideolgicas, mercantis,pedaggicas, poltico-curriculares e etc. Enfim, o panorama daspesquisas dos livros didticos no Brasil altamente frutfero.9

    Assim como afirma Oliveira (2008, p. 29):

    Hoje, diferentes abordagens cortam, atravessam, tangenciam, decom-pem a histria ensinada sob diversos pontos de vista e referenciaistericos e pe nossa disposio um conjunto de concluses bastantehbridas embora, plenamente justificveis, posto que a escrita da histriamuda por conta das prprias mudanas dos historiadores, do tempo, dosmtodos e dos instrumentos da prpria cincia da Histria.

    Alm do mais, lembraramos que Carr (1982), no comeoda dcada de 1960, em suas conferncias na Universidade de Cam-bridge, j preconizava, em excelente metfora, o historiador como

    um figurante caminhando com dificuldade no meio da procissoe no como uma guia observando a cena de um penhasco solitrioou como um VIP no palanque (CARR, 1982, p. 71). Nesse sentido,o historiador, alm de um ser humano individual, um fenmenosocial, tanto o produto, como o porta-voz consciente ou incons-

    9 Uma interessante pesquisa acerca das memrias de antigos usurios de livros didticos,destacando-se as caractersticas materiais e simblicas desses livros, pode ser encon-

    trada em Fernandes, 2004. Em Helenice Rocha (2009) encontramos um estudo dasformas de recepo dos usurios de livros escolares. Ver tambm: Munakata (2007).

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    ciente da sociedade a qual pertence (ibidem, p. 71). Suas obras,portanto, muitas vezes, dizem mais sobre a sociedade da poca

    em que foram produzidas do que propriamente do perodo emque o historiador se props em analisar.Destarte, as produes dos historiadores so duplamente

    histricas; uma porque o pesquisador, ao delimitar um perodo deanlise, trata de uma sociedade especfica num perodo histricodeterminado. Outra porque a sua prpria produo histrica, ouseja, temporal, pois se liga diretamente poca de sua produo.

    Assim, novamente voltando metfora da procisso:

    medida que a procisso serpenteia, desviando-se ora para a direitae ora para a esquerda, algumas vezes dobrando-se sobre si mesma,as posies relativas das diferentes partes da procisso esto constan-temente mudando, de maneira que pode perfeitamente fazer sentidocoerente dizer, por exemplo, que ns estamos mais prximos hoje daIdade Mdia do que nossos bisavs estavam h cem anos atrs [...](CARR, 1982, p. 71).

    Ento, ns interrogamos o passado ou os vestgios que

    dele podemos apreender atravs de inquietudes que se vinculamao momento histrico em que vivemos. Talvez a partir da enten-damos os diferentes posicionamentos que se sucederam relativosao livro didtico.

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