Enigmas de um crime

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André Luiz de Souza Sampaio, Alexandre Ferreira, Daniel Neri Brandão, Fabiano Bernardino do Nascimento, Fábio Luciano de Sousa Nascimento, Flávio Santos de Sena, alunos da UNICAP, do 2º período do Bacharelado em Filosofia, trabalho apresentado para Oficina de Retórica, em 2012.2, sob orientação da Profª Eleonoura. ANÁLISE RETÓRICA DO FILME ENIGMAS DE UM CRIME 1. Ficha técnica Título original: The Oxford Murders Título em português: Enigmas de um Crime Gênero: Policial/Suspense Duração: 108min Ano de Lançamento: 2008 Direção: Álex de la Iglesia Roteiro: Jorge Guerricaechevarría, Álex De La Iglesia, Guillermo Martinez Baseado em livro de mesmo título de Guillermo Martinez. Elenco: Elijah Wood (Martin) John Hurt (Arthur Seldom) Leonor Watling (Lorna) Origem: Espanha, Reino Unido, França Idioma: Inglês 2. Sinopse Uma série de assassinatos assombra Oxford ultimamente, e a esperança dos moradores da região está com dois homens: Arthur Seldom (John Hurt), um prestigiado professor de lógica, e Martin (Elijah Wood), um jovem estudante que acabara de chegar à universidade na expectativa de estudar com o professor. Ao que tudo indica, os crimes estão ligados por códigos, estranhos símbolos e números matemáticos. Professor e estudante juntam suas habilidades para desvendar o mistério e montar esse difícil quebra-cabeças. Na medida em que Martin chega perto da verdade, aumenta a sensação de insegurança e incompreensão com o mundo ao seu redor. 3. A filosofia de Wittgenstein No longa-metragem Enigmas de um crime, assistimos, na primeira cena, ao discurso do professor Artur Seldom sobre Wittgenstein: - “Aquele homem não estava louco! Trabalhava com balas voando à sua volta, pois não podia esperar! O conteúdo daquele caderno era muito importante para ser escrito depois... Ele tinha que fazer aquilo que sua mente mandava. Não podia deixar para um segundo depois... - O que era tão importante para ele arriscar a vida? O que ele escrevia que o impedia de levantar-se e correr, como qualquer outro faria? O Tractatus Logico-Filosophicus. O trabalho filosófico mais influente do século XX. O soldado se chamava Ludwig Wittgenstein. O homem que pôs limites em nossos pensamentos. O enigma que ele

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Análise retórica do filme

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André Luiz de Souza Sampaio, Alexandre Ferreira, Daniel Neri Brandão, Fabiano

Bernardino do Nascimento, Fábio Luciano de Sousa Nascimento, Flávio Santos de

Sena, alunos da UNICAP, do 2º período do Bacharelado em Filosofia, trabalho

apresentado para Oficina de Retórica, em 2012.2, sob orientação da Profª Eleonoura.

ANÁLISE RETÓRICA DO FILME ENIGMAS DE UM CRIME

1. Ficha técnica

Título original: The Oxford Murders

Título em português: Enigmas de um Crime

Gênero: Policial/Suspense

Duração: 108min

Ano de Lançamento: 2008

Direção: Álex de la Iglesia

Roteiro: Jorge Guerricaechevarría, Álex De La Iglesia, Guillermo Martinez

Baseado em livro de mesmo título de Guillermo Martinez.

Elenco: Elijah Wood (Martin)

John Hurt (Arthur Seldom)

Leonor Watling (Lorna)

Origem: Espanha, Reino Unido, França

Idioma: Inglês

2. Sinopse

Uma série de assassinatos assombra Oxford ultimamente, e a esperança dos

moradores da região está com dois homens: Arthur Seldom (John Hurt), um prestigiado

professor de lógica, e Martin (Elijah Wood), um jovem estudante que acabara de chegar

à universidade na expectativa de estudar com o professor. Ao que tudo indica, os crimes

estão ligados por códigos, estranhos símbolos e números matemáticos. Professor e

estudante juntam suas habilidades para desvendar o mistério e montar esse difícil

quebra-cabeças. Na medida em que Martin chega perto da verdade, aumenta a sensação

de insegurança e incompreensão com o mundo ao seu redor.

3. A filosofia de Wittgenstein

No longa-metragem Enigmas de um crime, assistimos, na primeira cena, ao

discurso do professor Artur Seldom sobre Wittgenstein:

- “Aquele homem não estava louco! Trabalhava com balas voando à sua volta, pois não

podia esperar! O conteúdo daquele caderno era muito importante para ser escrito

depois... Ele tinha que fazer aquilo que sua mente mandava. Não podia deixar para um

segundo depois...

- O que era tão importante para ele arriscar a vida? O que ele escrevia que o impedia

de levantar-se e correr, como qualquer outro faria? O Tractatus Logico-Filosophicus.

O trabalho filosófico mais influente do século XX. O soldado se chamava Ludwig

Wittgenstein. O homem que pôs limites em nossos pensamentos. O enigma que ele

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tentava decifrar era o seguinte: “Podemos saber a verdade?”. Todos os grandes

pensadores da história procuram uma única certeza, algo que ninguém pudesse refutar,

como 2 + 2 são 4.

- Para achar a esta verdade, Wittgenstein usou, na verdade, lógica matemática. Que

meio melhor para obtermos uma certeza de uma linguagem imutável, livre das paixões

do homem? Ele ameaçou lentamente, usando equação após equação, com um método

impecável, até chegar a uma conclusão aterrorizante: não existe tal verdade fora da

matemática! Não há modo de achar uma única verdade absoluta, um argumento

irrefutável que ajude a responder as questões da humanidade!

- A filosofia, portanto, está morta! Pois sobre aquilo que não se pode falar, então, nós

devemos nos calar”.

Ludwig Wittgenstein, filósofo austríaco, naturalizado britânico, foi um dos

principais atores da virada linguística na filosofia do século XX. Suas principais

contribuições foram feitas nos campos da lógica, filosofia da linguagem, filosofia da

matemática e filosofia da mente.

Com a eclosão da Primeira Guerra Mundial, Wittgenstein alista-se como

voluntário no exército austro-húngaro. Serve primeiro em um navio e depois numa

oficina de artilharia. Recebe várias condecorações por bravura. Durante a guerra,

manteve anotações de cunho filosófico e religioso, além de anotações pessoais. Nesses

cadernos atribui ao seu trabalho de lógica um significado ético e religioso, o que mais

tarde seria a base do Tractatus Logico-Philosophicus.

A revolução na lógica matemática oferecia a possibilidade da criação de uma

ciência dos significados. A lógica prometia aliar a razão ao significado de frases e

textos. A ideia era reduzir essas disciplinas aos seus átomos lógicos para, em seguida,

mostrar como as partes se conectavam umas às outras, em uma linguagem ideal, a fim

de compor todos os possíveis significados. No Tratactus, Wittgenstein tenta explicar

como a linguagem consegue representar o mundo. Segundo o autor e seus admiradores,

sua obra deveria marcar o fim da filosofia.

O livro começa indo diretamente ao assunto: O MUNDO CONSISTE DE

FATOS, o que significa que o mundo “é a totalidade de fatos, não de coisas”. Fatos são

afirmações verdadeiras sobre coisas. Uma cadeira é uma coisa; a afirmação “a cadeira é

vermelha” é (ou pode ser) um fato. O “mundo” como o conhecemos é simplesmente a

reunião de fatos conhecidos, o que acontece, e não de coisas distintas daquilo que

podemos dizer sobre elas. É a linguagem que constrói nosso senso de mundo, nosso

meio e nossas experiências. O que não podemos dizer não podemos conhecer; “SOBRE

O QUE NÃO CONSEGUIMOS FALAR, DEVEMOS CALAR”.

Mais tarde, em “Investigações Filosóficas”, o autor oferece um novo ponto de

vista: o significado das palavras não depende daquilo a que elas se referem, mas de

como elas são usadas. A linguagem é um tipo de jogo, um conjunto de “peças” ou

“equipamentos” (palavras) que são usadas de acordo com um conjunto de regras

(convenções linguísticas). Como no Tractatus, o mundo é construído a partir de

proposições, ou proposições potenciais, mas agora a ênfase recai menos no que as

afirmações “significam” (denotam) do que em como elas se desenvolvem dentro de um

contexto e um conjunto de regras.

Segue-se disso que o conhecimento não consiste em descobrir (ou inventar)

alguma "realidade" que corresponda ao que falamos, mas sim em estudar o modo como

a fala funciona. Assim sendo, a linguagem comum é o sujeito apropriado da filosofia.

Problemas filosóficos tradicionais, relativos a conceitos tais como "ser" e "verdade", são

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meramente confusões que surgem a partir do jargão filosófico e a tentativa equivocada

de descobrir a "realidade" que ele supostamente "representa".

Na última cena do filme, o estudante Martin contesta a afirmação de

Wittgenstein, dizendo: ”Os números também mentem. A verdade não é matemática

como eu acreditava ser. É absurda, confusa, aleatória, desordenada e muito

desagradável”. O professor Seldom vira o jogo, afirmando que apenas uma coisa

escapou ao estudante, o culpado real, que seria o próprio Martin, “a borboleta que bate

as asas e provoca um furacão do outro lado do mundo”.

4. Análise do primeiro trecho do filme (tempo 00:01:01,161 – 00:03:21,896)

“- O que é isso?

- É um homem!

- Ele está morto?

- Não, senhor.

- Está escrevendo.

- Repita!

- Está escrevendo, senhor.

- Escrevendo em um caderno.

- Aquele homem não estava louco. Trabalhava com balas voando à sua volta... pois não

podia esperar. O conteúdo do caderno era muito importante para escrever depois. Ele

tinha de fazer isso quando sua mente mandava. Não podia deixar para um segundo

depois.

O que era tão importante para ele arriscar a vida? O que ele escrevia, que o impedia... de

se levantar e correr, como qualquer outro faria? O "Tractatus Logico-Philosophicus". O

trabalho filosófico mais influente do séc. 20. O soldado se chamava Ludwig

Wittgenstein... o homem que pôs limites em nossos pensamentos. O enigma que ele

tentava decifrar era o seguinte... "Podemos saber a verdade?"

Todos os grandes pensadores da história... procuraram uma única certeza... algo que não

se pudesse refutar... como "dois mais dois são quatro". Para achar essa verdade...

Wittgenstein usou a lógica matemática. Que meio melhor de obter uma certeza... que

uma linguagem imutável, livre das paixões do homem? Ele avançou lentamente, usando

equação após equação... com um método impecável... até chegar a uma conclusão

aterrorizante. Não há tal verdade fora da matemática. Não há modo de achar uma única

verdade absoluta... um argumento irrefutável que ajude a responder... às questões da

humanidade. A filosofia, portanto, está morta... pois "sobre aquilo de que não se pode

falar... então deve-se calar".”

4.1. Gênero do discurso

Neste primeiro discurso do filme, verifica-se a presença do gênero epidítico ou

demonstrativo. Nesse trecho, o professor X apresenta, de certa forma, um elogio ao falar

sobre uma personalidade já morta cujo pensamento continua sendo estudado: o filósofo

Ludowig Wittgenstein. Vejamos neste excerto:

“– Aquele homem não estava louco. Trabalhava com balas voando à sua volta... pois

não podia esperar. O conteúdo do caderno era muito importante para escrever depois.

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Ele tinha de fazer isso quando sua mente mandava. Não podia deixar para um segundo

depois.”

O gênero demonstrativo diz respeito ao presente, ainda que extraia argumentos,

neste caso, do passado, haja vista que à obra do filósofo alemão tratada no discurso se

faz referência na filosofia do presente. Vejamos:

“– O que era tão importante para ele arriscar a vida? O que ele escrevia, que o impedia...

de se levantar e correr, como qualquer outro faria? O "Tractatus Logico-Philosophicus".

O trabalho filosófico mais influente do século XX.”

O valor que se atribui ao objeto do discurso é aquilo que se constitui de nobre

nos trabalhos teóricos de Wittgenstein, recorrendo-se a argumentos relativos a fatos de

conhecimento do público (trata-se de um público acadêmico) – recorre-se, assim, a

argumentos de amplificação.

“– Todos os grandes pensadores da história... procuraram uma única certeza... algo que

não se pudesse refutar... como "dois mais dois são quatro". Para achar essa verdade...

Wittgenstein usou a lógica matemática. Que meio melhor de obter uma certeza... que

uma linguagem imutável, livre das paixões do homem? Ele avançou lentamente, usando

equação após equação... com um método impecável...”

5. Análise do segundo trecho do filme (tempo 01:37:05,052 – 01:43:38,101)

“- Você já tinha vindo aqui?

- Nunca tive chance.

- Seria uma pena deixar o país sem ver este lugar. - Esta é a maior coleção de

falsificações do mundo. Nem Michelangelo distinguiria este Davi do original dele. A

Coluna de Trajano, que acreditamos estar em Roma. Mas temos certeza de que esta é

uma cópia comum de gesso. Eu me sinto bem aqui, ninguém tenta me enganar. Na

verdade, este é o lugar... que contém mais verdade no planeta todo. Temos uma verdade

absoluta. Tudo é falso. Fora destas paredes, ninguém tem certeza de nada.

- Correu um grande risco me dando um papel em branco.

- Isso era importante. Tinha que convencer você de que sabia qual era o símbolo.

- Naquele momento, não tinha certeza nenhuma.

- Eu sabia que você não ia me decepcionar, Martin. Seu orgulho não ia deixá-lo abrir o

papel... até ter uma solução sua. E isso, devo dizer, ia demorar um pouco.

Não havia assassino serial. Era uma invenção, como Petersen disse.

- Mas não foi invenção do motorista. Foi sua. Inventou uma série de crimes para

esconder o único crime real.

- A morte da Sra. Eagleton. Beth a matou, como a polícia suspeitava desde o começo.

Beth odiava a vida dela. Não aguentava mais a mãe e a matou. Foi quando ela me

mandou um bilhete pedindo ajuda. Eu não podia encará-la. Foi minha culpa o pai dela

morrer no acidente há 30 anos. Eu não podia decepcioná-la de novo. Nós nos

encontramos na porta.

- Você tinha ido se livrar da evidência... mas eu estava lá, no caminho, e isso estragou

tudo. Você teve que criar um novo plano na minha frente... momentos antes de a polícia

chegar. Você leu a palavra "círculo" em alemão nas palavras cruzadas. Isso lhe deu a

ideia. Uma série com possibilidades infinitas... mas precisava de uma segunda morte...

para convencer a polícia de que Beth não era a assassina. Sem saber, eu ajudei você. Eu

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lhe dei a ideia de como fazer sem perceber. Um assassino imperceptível. Que só mata

pessoas que estão à beira da morte. Só teve que esperar a chance e espetar o corpo com

a seringa. Foi quando mandou a segunda mensagem. O peixe.

Você ainda não sabia aonde tudo iria chegar. As possibilidades de continuar a série

ainda eram infinitas. Você teve que esperar outra chance aparecer. Isso poderia levar

semanas, meses. Você não tinha pressa. Deveria ter um plano diferente para a terceira

morte... mas o tocador de triângulo surgiu como um presente dos deuses... e você tinha a

sua solução.

- No começo, eu a rejeitei. Muita gente, muito complicado.

- Não minta, não poderia desperdiçar uma chance assim. E mais, tinha um triângulo.

Tudo adquiriu significado. Lindo. Foi como se os pitagóricos estivessem ao seu lado.

Foi perfeito, mas o mais importante... foi totalmente inofensivo. Até o louco aparecer.

- Qualquer ato nosso pode ter consequências inesperadas. Era o que você mais temia.

Quem ia saber que o pobre diabo ia ler o artigo no jornal? Ele procurava uma solução

para o problema da filha... enquanto todo dia levava para a escola... aquelas crianças

saudáveis... com pulmões perfeitos e cérebros danificados. Por que elas mereciam viver

e não a filha dele? Matemáticos não são os únicos que conhecem os gregos, professor.

Você lhe deu a solução quando publicou a série. Ele também queria esconder o crime.

Só tinha que dar um telefonema, e deu.

- Então... acha que sou o assassino?

- Não, você não matou ninguém... mas é culpado de provocar a morte daquelas crianças

inocentes. É culpado de arrogância... de usar todos nós como peças de um jogo.

- Quem você pensa que é? Espero que meu fracasso tenha servido, ao menos... para lhe

ensinar alguma coisa.

- Sim, uma coisa. Uma coisa bem dolorosa. Os números também mentem. A verdade

não é matemática, como eu acreditava antes. É absurda, confusa, aleatória, desordenada

e muito desagradável.

- Eu fico feliz por concordarmos em alguma coisa, meu amigo.

- Só uma coisa lhe escapou. O culpado real. O que disparou essa série de crimes.

- Quem?

- Você, Martin.

- Não me faça rir.

- Se não acredita, fale com Beth. Ela estava apaixonada por você. Ou não sabia disso?

Ela lembrava suas palavras exatas. "Você tem que tentar". "Você tem que tentar",

repetindo na cabeça dela, martelando. "Você deve ser livre como eu." Foi o que ela

entendeu... e o que ela fez.

Pôs um fim no que a impedia de ser livre... a própria mãe. A borboleta que bate as

asas... e causa um furacão do outro lado do mundo. Parece familiar? Você é essa

borboleta, Martin.”

5.1. Gêneros do discurso

No segundo discurso, é predominante o gênero demonstrativo, em que uma das

personagens, com argumentação de amplificação, tece um louvor ou elogio ao ambiente

em que se encontra e censura o fato de que além daquelas paredes tudo é falso:

“- Seria uma pena deixar o país sem ver este lugar. - Esta é a maior coleção de

falsificações do mundo. Nem Michelangelo distinguiria este Davi do original dele. A

Coluna de Trajano, que acreditamos estar em Roma. Mas temos certeza de que esta é

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uma cópia comum de gesso. Eu me sinto bem aqui, ninguém tenta me enganar. Na

verdade, este é o lugar... que contém mais verdade no planeta todo. Temos uma verdade

absoluta. Tudo é falso. Fora destas paredes, ninguém tem certeza de nada.”

Há, também, presença do gênero forense, que consiste na acusação e defesa que

ambas as personagens apresentam uma sobre a outra, na tentativa de verificar e atribuir

a responsabilidade pelos fatos ocorridos no passado, dizendo respeito ao justo e ao

injusto:

“- Não havia assassino serial. Era uma invenção, como Petersen disse.

- Mas não foi invenção do motorista. Foi sua. Inventou uma série de crimes para

esconder o único crime real. (...) Você tinha ido se livrar da evidência... mas eu estava

lá, no caminho, e isso estragou tudo. Você teve que criar um novo plano na minha

frente... momentos antes de a polícia chegar.

(...)

- Então... acha que sou o assassino?

- Não, você não matou ninguém... mas é culpado de provocar a morte daquelas crianças

inocentes. É culpado de arrogância... de usar todos nós como peças de um jogo.

(...)

- Só uma coisa lhe escapou. O culpado real. O que disparou essa série de crimes.

- Quem?

- Você, Martin.”

5.2. Provas

Provas não técnicas

O argumento do presente discurso baseia-se no testemunho do estudante ao descobrir

que o enigma dos assassinatos foram criações do Professor, para defender o responsável

do crime.

“- Não havia assassino serial. Era uma invenção, como Petersen disse.

- Mas não foi invenção do motorista. Foi sua. Inventou uma série de crimes para

esconder o único crime real.

- A morte da Sra. Eagleton. Beth a matou, como a polícia suspeitava desde o começo.

Beth odiava a vida dela. Não aguentava mais a mãe e a matou. Foi quando ela lhe

mandou um bilhete pedindo ajuda.”

Provas técnicas

Também se constata o uso de provas técnicas ou artísticas, pois se valem de meios de

persuasão criados pelo orador, através da emoção despertada por ele no ouvinte, e dos

meios derivados de argumentos verdadeiros ou prováveis. Verificamos isso quando o

professor procura convencer o jovem Martin de que este é o verdadeiro culpado pela

série de crimes.

Professor a Martin:

“- Se não acredita, fale com Beth. Ela estava apaixonada por você. Ou não sabia disso?

Ela lembrava suas palavras exatas. "Você tem que tentar". "Você tem que tentar",

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repetindo na cabeça dela, martelando. "Você deve ser livre como eu." Foi o que ela

entendeu... e o que ela fez. Pôs um fim no que a impedia de ser livre... a própria mãe.”

6. Falácias

Falácia ad hominem ofensivo: em vez de atacar uma afirmação, o argumento

ataca a pessoa que o proferiu.

“- Então... acha que sou o assassino?

- Não, você não matou ninguém... mas é culpado de provocar a morte daquelas

crianças inocentes. É culpado de arrogância... de usar todos nós como peças de

um jogo. (...)”

Falácia ad hominem ofensivo:

“- Eu sabia que você não ia me decepcionar, Martin. Seu orgulho não ia deixá-lo

abrir o papel... até ter uma solução sua. E isso, devo dizer, ia demorar um

pouco.”

7. Figuras de linguagem nos dois trechos do filme

As figuras de retórica ou de linguagem são recursos linguísticos utilizados

especialmente a serviço da persuasão. Podemos dividi-las em quatro tipos: figuras de

som, figuras de palavras, figuras de pensamentos e construção.

Paradoxo: reúne ideias contraditórias numa mesma frase. É uma verdade

enunciada com aparência de mentira.

“Na verdade, este é o lugar... Que contém mais verdade no planeta todo. Temos uma

verdade absoluta. Tudo é falso.”

Metáfora: a metáfora é uma comparação abreviada, em que o conectivo não

está expresso, mas subentendido. Daí a ideia de transporte do sentido próprio

para o sentido figurado.

“Você é essa borboleta, Martin?”

“quem ia saber que o pobre diabo ia ler o artigo no jornal? Ele procurava uma solução

para o problema da filha.”

Hipálage: ocorre hipálage quando há inversão da posição do adjetivo: uma

qualidade que pertence a um objeto é atribuída a outro, na mesma frase.

“Os números também mentem.”

“A filosofia, portanto, está morta.”

“Ela lembrava suas palavras exatas. "você tem que tentar". "você tem que tentar",

repetindo na cabeça dela, martelando.”

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Paronomásia: ocorre paronomásia quando há reprodução de sons semelhantes

em palavras de significados diferentes.

“Sobre aquilo de que não se pode falar... Então, deve-se calar".

Antítese: ocorre antítese quando há aproximação de palavras ou expressões de

sentidos opostos.

“Sobre aquilo de que não se pode falar... Então, deve-se calar".

Comparação: ocorre comparação quando se estabelece aproximação entre dois

elementos que se identificam ligados por conectivos comparativos explícitos -

feito, assim como, tal, como, tal qual, tal como, qual, que nem - e alguns verbos

- parecer, assemelhar-se e outros.

“... O tocador de triângulo surgiu como um presente dos deuses...”

“... Foi como se os pitagóricos estivessem ao seu lado.”

Ironia: ocorre ironia quando, pelo contexto, pela entonação, pela contradição de

termos, sugere-se o contrário do que as palavras ou orações parecem exprimir. A

intenção é depreciativa ou sarcástica.

“Não minta, não poderia desperdiçar uma chance assim. E mais, tinha um triângulo.

Tudo adquiriu significado. Lindo!”

Metonímia: ocorre metonímia quando há substituição de uma palavra por outra,

havendo entre ambas algum grau de semelhança, relação, proximidade de

sentido ou implicação mútua.

“Seu orgulho não ia deixá-lo abrir o papel...”

Hipérbole: ocorre hipérbole quando há exagero de uma idéia, a fim de

proporcionar uma imagem emocionante e de impacto.

“Esta é a maior coleção de falsificações do mundo. Nem Michelangelo distinguiria

este Davi do original dele.”

“Ele tinha de fazer isso quando sua mente mandava. Não podia deixar para um

segundo depois.”

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Referências:

Texto: Ludwig Wittgenstein,

disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Ludwig_Wittgenstein

Texto: Introdução ao pensamento de Wittgenstein, disponível em http://www.cfh.ufsc.br/~mafkfil/scruton.htm

The Oxford Murders,

disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/The_Oxford_Murders

Ficha técnica e sinopse, disponíveis em http://www.filmesdecinema.com.br/filme-

enigmas-de-um-crime-7147/

DA SILVA, Eleonoura Enoque. Tópicos em Teoria Da Argumentação - Texto em

elaboração: para uso exclusivo em sala de aula. Recife-PE: Universidade Católica de

Pernambuco, 2012.