Energia nuclear do mundo
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Energia nuclear do mundo
Origens e desenvolvimento
A fissão nuclear provocada artificialmente teve seu nascimento pouco antes da
eclosão da segunda guerra mundial. Mostrou que seria possível controlar e
transformar as incríveis energias do núcleo atômico em potentes armas
nucleares.
Esse passou a ser o objetivo de cientistas e militares das grandes potências, no
final da década de 1930. As intensas pesquisas realizadas foram "coroadas"
em 1942, quando um grupo de cientistas da Universidade de Chicago
construiu o primeiro reator de fissão controlada do mundo. Foi o início da
chamada "era atômica".
Desde as suas origens, a indústria nuclear teve um estreito vínculo com
interesses bélicos e militares. E por isso, em todo o mundo, sempre esteve
envolta por um clima de grande sigilo. O reator de Chicago, por exemplo,
serviu como protótipo para a construção das bombas atômicas que, três anos
depois, em agosto de 1945, seriam lançadas em duas cidades japonesas,
Hiroxima e Nagasaki.
Os resultados do bombardeio foram catastróficos e assustadores: até o final de
dezembro de 1945, haviam morrido em Hiroxima aproximadamente 140 mil
pessoas (40% da população) e 74 mil em Nagasaki (26% da população).
Os primeiros reatores nucleares construídos no mundo, nos Estados Unidos,
França, Reino Unido e União Soviética, destinavam-se a fins bélicos: obter
plutônio a partir da fissão do urânio, para a construção de armas nucleares.
A utilização da energia nuclear para obtenção de energia elétrica só surgiu
algum tempo depois. Em 1956, no Reino Unido, foi inaugurado o primeiro
reator para produção de energia elétrica em escala industrial, em Windscale,
Inglaterra.
A indústria nuclear, desde então, teve um desenvolvimento assombroso. Mas,
se por um lado passou a ser "vendida" como a grande esperança do século
para as soluções energéticas do planeta, também gerou grandes problemas e
oposições.
Crise e situação atual
Em 31 de dezembro de 1995 havia no mundo 430 reatores nucleares
comerciais. Somavam uma capacidade de 340 gigawatts (340 bilhões de
watts), representando 17% da energia elétrica consumida no planeta. Sem
dúvida, um número muito grande para uma fonte de energia que foi
descoberta há apenas cinqüenta anos. Contudo, esse número é inferior às
estimativas feitas em outras épocas, e indica que hoje essa fonte de energia
está em crise.
Nas décadas de 1960 e 1970, vários incidentes com reatores nucleares levaram
a muitas críticas, receios e oposições ao seu uso. O caso da usina de Three
Mile Island, nos Estados Unidos, em 1979, veio acentuar essa crise. Desde
então a produção mundial de reatores nucleares vem desacelerando
visivelmente. A partir de meados da década de 1970, o número de usinas
canceladas foi maior que o de usinas construídas. Só nos Estados Unidos,
entre 1975 e 1983, 87 centrais nucleares foram canceladas.
Com o acidente de Tchernóbil, essa tendência aumentou ainda mais. Além da
queda no número de encomendas, muitos reatores foram desativados.
Ao longo das últimas décadas, o alto custo das usinas mostrou que, além do
risco de acidentes e do problema do lixo atômico, a energia nuclear não
apresentava vantagens econômicas. Muito ao contrário, demonstrou ser
altamente dispendiosa, além de estar associada à proliferação das bombas
atômicas.
Diante dessa soma de problemas, o otimismo da década de 1950 desapareceu.
A indústria nuclear enfrenta, hoje em dia, uma grande crise de confiabilidade
na maior parte do mundo. O acidente de Tchernóbil sem dúvida representa um
marco nessa crise. Foi, possivelmente, o golpe mais profundo no "sonho
nuclear".
No entanto, o uso da energia nuclear ainda está em debate. Há quem o defenda
ferrenhamente, e os seus "vendedores" procuram resistir à crise. Mas também
cresce a oposição e a resistência nos mais diferentes níveis.
Muitos países vêm assumindo uma posição de "moratória": aceitar os reatores
que já existem e não construir novos. Com isso, em alguns anos, o uso da
energia nuclear para geração de eletricidade estaria abandonado, pois os atuais
reatores não seriam substituídos. Estados Unidos, Alemanha e Itália são
alguns dos países próximos dessa posição. Na Suécia, Áustria e nos Países
Baixos essa medida já foi adotada.
Alguns acidentes nucleares no mundo
1957 - Winsdcale, Inglaterra. Superaquecimento em um reator de produção de
plutônio seguido de incêndio, provocou grande emissão de radioatividade na
Inglaterra e no norte da Europa.
1958 - Kyshtym, União Soviética. Acidente de graves proporções, que não foi
admitido por muitos anos pelos russos. Explosão em depósito de rejeitos
radioativos causou centenas de mortos.
1961 - Idaho, Estados Unidos. Acidente em reator de urânio enriquecido
usado para fins militares destruiu praticamente 20% das barras de
combustível.
1979 - Three Mile Island, Estados Unidos. Uma série de falhas e erros
operacionais converteram um defeito de funcionamento normal na usina em
um grave acidente. Calcula-se que o reator esteve muito próximo de se fundir
completamente.
1986 - Tchernóbil, União Soviética. O mais grave de todos os acidentes
nucleares até hoje.
Fontes alternativas
Uma questão cada vez mais presente, especialmente se o mundo abrir mão da
energia nuclear, é:
"Que fontes podem fornecer a enorme demanda energética do planeta?"
A resposta a essa questão não é simples e não existe uma única solução; as
alternativas são muitas.
As fontes convencionais de energia, como os combustíveis fósseis - petróleo,
carvão mineral e gás natural - usados nas usinas termelétricas, têm contribuído
com a maior parcela de recursos energéticos no mundo, cerca de 80%.
Entretanto, essas fontes têm reservas limitadas, não são renováveis e lançam
na atmosfera gases tóxicos e poluentes, causando danos ao ambiente e
podendo provocar sérios problemas no futuro.
Contudo, existem inúmeros recursos naturais no mundo capazes de gerar
energia elétrica, como a luz solar, o vento, as quedas d'água, as marés e as
ondas oceânicas, os vapores provenientes da terra e a biomassa, entre outros.
Para que a humanidade possa usufruir desses recursos, é preciso pesquisar e
desenvolver novas tecnologias e adequar a escolha a cada país ou região, de
acordo com suas particularidades: fontes e recursos disponíveis,
características topográficas, geológicas, climáticas, condições econômicas,
entre outras.
Além disso, o problema não se limita apenas à produção de mais energia, mas
também exige mudanças nos padrões de consumo da população, para uma
maior economia e racionalização de seu uso.
É de se questionar se não seria o caso e o momento de transferir pelo menos
parte das consideráveis somas de dinheiro empregadas na energia nuclear para
pesquisa de novas fontes alternativas, materiais, tecnologias e maior eficiência
energética.
No mínimo, isso reduziria o enorme preço que a humanidade paga pelos
riscos da energia nuclear. E esse mínimo pode representar muito para as
futuras gerações.
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Fontes de energia
Fontes convencionais não-renováveis
* Combustíveis fósseis - petróleo, carvão mineral, gás natural.
Uso para geração de energia elétrica: usinas termoelétricas
Problemas: fonte não-renovável, reservas limitadas, produção de poluentes
na atmosfera (monóxido de carbono, óxidos de enxofre e nitrogênio) que
causam danos ambientais e climáticos (chuva ácida, efeito estufa), problemas
ambientais na extração, purificação e transporte.
Fontes naturais renováveis
* Solar - captação termossolar: uso da luz solar concentrada para aquecimento
de caldeiras, gerando vapor.
- geração fotovoltaica: conversão direta da luz solar em eletricidade, através
de células fotovoltaicas.
* Eólica - aproveitamento da energia dos ventos, através de cata-ventos.
* Geotérmica - jatos naturais de água quente ou vapor proveniente de grandes
profundidades da terra (gêiseres); podem ser usados para geração de energia
termoelétrica.
* Hidráulica - usinas hidrelétricas: aproveitamento da energia de quedas
d'água represadas.
- cata-água: aproveitamento da correnteza natural de rios, sem construção de
barragens.
* Marés - aproveitamento dos desníveis de água provocados pelas marés, com
construção de barragens e instalações geradoras de eletricidade.
* Gradiente térmico dos oceanos - geração de energia a partir das diferenças
de temperatura entre a superfície e o fundo do mar.
* Ondas - aproveitamento da energia de movimento das ondas.
* Correntes oceânicas - uso da energia de movimento de massas de água
dentro dos oceanos.
* Biomassa - uso de materiais constituídos de substâncias de origem orgânica
(animais, vegetais, microrganismos): lenha; plantas cultivadas (cana-de-
açúcar, beterraba, dendê, mandioca, aguapé, sorgo); óleos vegetais; carvão
vegetal; álcool etílico, resíduos agrícolas, pecuários e urbanos (biogás).
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Energia nuclear no Brasil
O Brasil não escapa do que se passa no resto do mundo, guardadas as suas
particularidades. Já na década de 1950 havia interesse, por parte de cientistas,
de se desenvolver tecnologia na área nuclear.
Os Estados Unidos, constatando o inevitável crescimento do setor nuclear em
vários países, decidiram deixar de ter o monopólio dessa tecnologia e
passaram a difundi-la, "orientando" os países menos desenvolvidos e criando
um mercado para vender os produtos nucleares produzidos pelas indústrias
americanas. Era o programa denominado Átomos para a Paz.
Foi no âmbito desse programa que, ainda na década de 1950, foram instalados
os dois primeiros reatores nucleares no Brasil: um em São Paulo e outro em
Belo Horizonte. Esses reatores destinavam-se à pesquisa e produção de
radioisótopos para uso na medicina e na indústria.
Em 1968, no governo Costa e Silva, foi decidida a compra de um reator de
potência, com vistas à geração de eletricidade. Não por acaso foi escolhido um
reator da empresa Westinghouse, americana.
Tratava-se, contudo, de um pacote tecnológico fechado, uma compra do tipo
"chaves na mão". O reator foi adquirido pronto e acabado. Era um reator do
tipo PWR (reator de água pressurizada), de 627mW de potência elétrica. O
combustível, urânio enriquecido, uma vez usado deveria ser devolvido para
reprocessamento. Batizado de Angra 1, o reator teve sua construção iniciada
em 1971.
A grande crítica à aquisição do reator de Angra 1, especialmente por parte da
comunidade científica brasileira, era a política imediatista adotada, de total
dependência externa, tanto do combustível como de know-how científico e
tecnológico. A participação de cientistas e da indústria nacional era
praticamente nula nesse programa.
Mais tarde, por interesses políticos e militares, o programa nuclear brasileiro
sofreu algumas mudanças. A vantagem que a Argentina levava na área
nuclear, pois desde o início desenvolvera seus próprios reatores, pesou nas
preocupações dos militares brasileiros, que decidiram investir num programa
nuclear de grandes proporções.
Assim, em 1975, foi assinado um tratado com a República Federal da
Alemanha, o chamado "Acordo Nuclear Brasil-Alemanha". Esse acordo
previa a implantação de oito usinas nucleares, com transferência de tecnologia
nuclear para o Brasil, incluindo o enriquecimento do urânio, com uma
perspectiva de maior autonomia do país nesse setor.
A primeira conseqüência prática do acordo foi a compra de dois reatores da
empresa alemã KWU, Angra 2 e Angra 3.
Apesar de uma pequena abertura em relação à política totalmente dependente
que vigorava até então, após algum tempo o acordo com a Alemanha também
revelou-se inviável, gerando para o Brasil mais problemas do que soluções.
A transferência de tecnologia foi mínima e o método de enriquecimento do
urânio empregado (jatos centrífugos), sem comprovação industrial, tem
apresentado inúmeros problemas operacionais e um custo altíssimo.
Vale lembrar que todas as medidas adotadas pelo Exército e pelo governo
brasileiros ao longo desses anos foram feitas à revelia da sociedade, sem levar
em conta a opinião da comunidade científica e da população.
A situação atual
As previsões iniciais para Angra 1 eram que ficasse pronta em 1977, a um
custo de cinco milhões de dólares. Contudo, devido a uma série de
dificuldades administrativas e a vários incidentes, inclusive um incêndio no
canteiro de obras, a usina só entrou em operação comercial em 1985, sete anos
depois do previsto e muito acima do orçamento inicial. Segundo dados oficiais
de Furnas Centrais Elétricas, os custos de Angra 1 foram de 1,5 bilhão de
dólares e, segundo o Tribunal de Contas da União, de 3,9 bilhões.
Mas nem por isso a situação de Angra 1 se normalizou. Incidentes continuam
ocorrendo e os custos vêm superando todas as estimativas. Além disso, desde
1981 foi detectado um sério erro no projeto da Westinghouse do gerador de
vapor. Devido a estes e outros problemas, Angra 1 já foi paralisada mais de
vinte vezes, além de operar com baixo fator de produção de eletricidade.
Quanto ao Acordo Nuclear Brasil-Alemanha, apenas dois dos oito reatores
previstos estão em construção - Angra 2 e Angra 3 - e com bastante atraso.
Assim como no caso de Angra 1, os problemas vêm sendo muitos. A
construção de Angra 2 ficou paralisada por quase dez anos, devido em parte à
falta de verbas, a uma menor demanda de eletricidade, e a inúmeros
movimentos de oposição. Atualmente, cerca de 70% da construção está
concluída, e anuncia-se para este ano uma questionável retomada das obras.
Segundo Furnas, já foram gastos em Angra 2 cinco bilhões de dólares e a
estimativa é de se gastar mais 1,5 bilhão. Segundo dados do técnico
independente Ildo Luís Sauer, do Instituto de Energia Elétrica da
Universidade de São Paulo, a obra completa de Angra 2 já consumiu cerca de
dez bilhões de dólares e deverá atingir os doze 12 bilhões em 1998.
O que se verifica, de fato, é que o programa nuclear brasileiro está "em ponto
morto". O próprio governo reconhece hoje o que sempre negara
enfaticamente: pelo menos nas próximas duas décadas a energia nuclear no
Brasil não é competitiva com a hidrelétrica.
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* O potencial hidrelétrico brasileiro, estimado em 213 gW, é capaz de atender
ao crescimento da demanda de energia elétrica do país por cerca de vinte anos.
* O preço por quilowatt instalado da hidreletricidade é pouco superior a mil
dólares, enquanto o custo da energia nuclear, apesar de ter sido orçado em 400
dólares por quilowatt, já ultrapassou 4.000 dólares, com base em Angra 2.
* A energia hidrelétrica gera um número de empregos bem maior que a
nuclear: calcula-se em 4.500 empregos por bilhão de dólares investido, no
caso da hidrelétrica, e 1.800 para a nuclear.
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O Brasil necessita de energia nuclear?
Além de todos os problemas envolvidos no uso da energia atômica, no caso
brasileiro somam-se outras questões, como as dificuldades operacionais, o
baixo aproveitamento energético de Angra e uma perigosa desconsideração
pelo lixo atômico. Não há nada previsto na constituição brasileira para
regulamentar esse problema e Furnas se exime das responsabilidades.
Deve-se ainda considerar que o Brasil tem um enorme potencial de energia
hidrelétrica, talvez o maior do mundo, devido à sua imensa rede fluvial. Além
de ser limpa, não-poluente e renovável, essa fonte de energia apresenta uma
série de vantagens em relação à nuclear: é segura e mais barata, gera mais
empregos e tem tecnologia nacional.
E não apenas isso. Dadas as características do Brasil, de dimensões
continentais e com graves problemas sociais e econômicos, muitas outras
alternativas podem ser desenvolvidas em escalas menores para atender a um
consumo localizado, como é o caso da energia solar, eólica, e da biomassa.
Uma produção descentralizada de energia a partir de fontes alternativas, que
aproveite os recursos locais, possibilita soluções mais adequadas e custos
globais menores. Nas regiões mais pobres e isoladas, onde os sistemas
convencionais têm difícil acesso, essas soluções podem contribuir para a
melhoria da qualidade de vida das populações.
Finalmente, uma solução a curto prazo é o investimento em medidas e
tecnologias que visem mais eficiência e conservação da energia. Economizar e
racionalizar o uso é um excelente caminho para reduzir a demanda e os custos.
Esses são apenas alguns indícios e caminhos que respondem a nossa pergunta
inicial: o Brasil tem inúmeros recursos energéticos disponíveis e pode adotar
medidas que dispensem totalmente a energia nuclear.
Tchernóbil 1986-1996. Rio de Janeiro, Greenpeace, 1996, pp. 33-40.