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1 MARIA DO CARMO CLEMENTINO LIBÓRIO FEITOSA ENDEREÇAMENTOS DO PASSADO E NOSTALGIA NOS EDITORIAIS DE MODA DA VOGUE Orientador: Prof. Dr. Thiago Soares João Pessoa 2013

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MARIA DO CARMO CLEMENTINO LIBÓRIO FEITOSA

ENDEREÇAMENTOS DO PASSADO E NOSTALGIA NOS EDITORIAIS DE MODA DA

VOGUE

Orientador: Prof. Dr. Thiago Soares

João Pessoa

2013

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MARIA DO CARMO CLEMENTINO LIBÓRIO FEITOSA

ENDEREÇAMENTOS DO PASSADO E NOSTALGIA NOS EDITORIAIS DE MODA DA

VOGUE

Trabalho de conclusão de curso apresentado como

requisito parcial para obtenção do grau de bacharel

em Comunicação Social, Habilitação em Jornalismo

pela Universidade Federal da Paraíba.

Orientador: Thiago Soares

João Pessoa

2013

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Resumo

Este trabalho tem como objetivo analisar os modos de endereçamento das fotografias de

moda revista Vogue Brasil. O estudo será realizado a partir dos editoriais de uma das revistas. A

moda possui um papel extremamente importante na sociedade e no comportamento de cada

indivíduo. Além de ditar tendências, a moda cria estilos de vida. A fotografia de moda ratifica

esse poder de persuasão e tem sido utilizada para, cada vez mais, dissipar a moda. Assim,

pretende-se analisar o endereçamento da revista para seus leitores, baseado nos operadores de

análise de Gomes (2007).

Palavras-chave: Fotografia - Jornalismo - Moda – Modo de endereçamento - Revista Vogue.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................... 6

CAPÍTULO I – VOGUE ............................................................................................................. 7

1.1 O império Vogue .................................................................................................................. 7

1.2 A sociedade brasileira também quer ver e ser vista .................................................. 12

CAPÍTULO II – FOTOGRAFIA DE MODA ......................................................................... 16

2.1 A fotografia conta história ........................................................................................... 17

CAPÍTULO III - MODO DE ENDEREÇAMENTO ............................................................. 21

3.1 Os operadores de análise dos modos de endereçamento ............................................ 25

3.2 O público de Vogue ........................................................................................................ 26

CAPÍTULO IV - EDITORIAIS DA VOGUE BRASIL COMO OBJETO DE ESTUDO ... 28

4.1 Análise dos editoriais ..................................................................................................... 30

CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................... 47

REFERÊNCIAS ......................................................................................................................... 49

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1. Vogue Brasil nº 414, páginas 156 e 157................................................................ 30

Figura 2. Vogue Brasil nº 414, página 167 ........................................................................... 31

Figura 3. Vogue Brasil nº 414, página 166 ........................................................................... 32

Figura 4. Vogue Brasil nº 414, página 159 ........................................................................... 33

Figura 5. Vogue Brasil nº 414, página 161 ........................................................................... 34

Figura 6. Vogue Brasil nº 414, páginas 168 e 169 ................................................................ 35

Figura 7. Vogue Brasil nº 414, páginas 164 e 165 ............................................................... 35

Figura 8. Vogue Brasil nº 414, páginas 170 e 171................................................................ 36

Figura 9. Vogue Brasil nº 414, página 179 .......................................................................... 37

Figura 10. Vogue Brasil nº 414, página 173 ......................................................................... 38

Figura 11. Vogue Brasil nº 414, página 172 ......................................................................... 38

Figura 12. Vogue Brasil nº 414, página 176 ......................................................................... 39

Figura 13. Vogue Brasil nº 414, página 189 ......................................................................... 40

Figura 14. Vogue Brasil nº 414, página 193 ......................................................................... 41

Figura 15. Vogue Brasil nº 414, página 193 .......................................................................... 42

Figura 16. Vogue Brasil nº 414, páginas 198 e 199 .............................................................. 43

Figura 17. Vogue Brasil nº 414, página 203 .......................................................................... 44

Figura 18. Vogue Brasil nº 414, página 203 .......................................................................... 45

Figura 19. Vogue Brasil nº 414, página 202 .......................................................................... 46

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INTRODUÇÃO

A moda é uma forma de expressão indireta que está ao alcance do homem, pois muito

pode ser dito por uma roupa. A autoimagem tem um papel de extrema importância na história do

homem, assim, a busca por novas formas de se vestir, expressar e se diferenciar passou a ser

motivo de interesse de muitos.

Nesse contexto, as revistas segmentadas para a moda começaram a surgir. A Vogue,

criada em 1892, surge com o objetivo de mostrar e propagar a moda e o estilo de vida de pessoas

mais ricas utilizando artifícios como textos leves, propagandas e imagens bem produzidas.

No Brasil, a Vogue surgiu em 1975 com o mesmo propósito daquela que foi criada em

1892: veicular o estilo de vida do high society e as tendências mundiais da moda. Hoje o

periódico é referência para profissionais e entusiastas da moda.

O presente trabalho propõe-se a estudar e analisar os modos de endereçamentos dos

editoriais de moda da revista Vogue Brasil, vendo as fotografias como produto de um meio de

comunicação que tem linguagem própria.

A relevância do projeto de pesquisa se deve ao fato da fotografia de moda, tema central

deste trabalho, possuir uma grande influência no público da revista, criando e modificando

comportamentos, além de ter papel documental das mudanças estéticas do homem.

A partir dessa concepção, utilizando autores que dão suporte com as suas teorias, o

primeiro capítulo deste trabalho trata da construção da revista Vogue como um dos mais

tradicionais periódicos de moda do mundo, abordando sua chegada e adequação ao público

brasileiro. A importância da fotografia de moda, advento que cresceu juntamente com as revista,

servindo como documento historiográfico é abordada no segundo capítulo. Já no terceiro e quarto

capítulos deste trabalhos, trataremos do modo de endereçamento, estabelecendo parâmetros e

analisando os editoriais de moda da Vogue Brasil.

Por fim a análise dos editoriais responderá a pergunta-chave deste trabalho: qual o

endereçamento das fotografias de moda da Vogue Brasil?

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CAPÍTULO I – VOGUE

No presente capítulo apresento conceitos que possibilitam compreender melhor o objeto de

estudo desta monografia.

1.1 O império Vogue

A moda como conhecemos hoje, com seu ciclo cíclico de metamorfoses incessantes, seus

movimentos bruscos e particularidades, tem suas raízes no século XIV. Baseando-se em Gilles

Lipovetsky é possível afirmar que o processo de distinção social através do vestuário existia, na

época, “como forma de repreensão e imposição de força pelo soberano ou pelo conquistador,

assim o traje dos mongóis tornou-se regra na Índia conquistada por eles” (LIPOVETSKY, 1989,

p. 25).

Ainda como instrumento de distinção de classes, segundo Lipovetsky (1989, p.200), “a

moda reproduz segregação social e cultural, participa da mitologia moderna mascarando uma

igualdade que não pode ser encontrada”, sendo uma regulação social a base de inconstância, de

sedução.

A sociedade passou a dar mais valor à moda, numa “sede de imagens e de espetáculos, o

gosto pela autonomia, o culto do corpo, a embriaguez das sensações e do novo” (LIPOVETSKY,

1989, p. 201), e, em virtude do luxo na economia, a indústria editorial ocupou seu espaço,

ganhando visibilidade.

A Vogue surgiu se diferenciando de outras publicações, quando, em 1982, Arthur Baldwin

Turnure, uma pessoa com passe livre na alta sociedade de Nova Iorque, lançou a gazeta semanal.

Direcionado para a elite nova iorquina, a primeira capa do folhetim foi estampada por

uma ilustração de A. B. Wenzel, abaixo de um título coroado por duas mulheres de porte elegante

ladeando-o. Angeletti e Oliva relatam que a Vogue já nasceu em berços de uma publicação nobre

e refinada: “foi uma publicação de, para, e sobre a aristocracia de Nova Iorque, uma classe que

sobrevive aos trancos e barrancos” (2006, p. 2).

A princípio, a revista, que apelava para as mulheres e senhores da alta sociedade, dirigia-

se ao público leitor indicando o que era apropriado vestir em cada ocasião, retratando e

repassando as tradições. Reproduzindo os interesses e o estilo de vida do público-alvo, a primeira

edição da gazeta continha muitos artigos de moda para homens e mulheres, críticas de literatura,

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teatro, música e arte, além de artigos de etiqueta, entre eles alguns que, em palavras, ministravam

uma aula sobre como se comportar em um evento social. A revista era o espaço no qual se

precipitavam algumas mudanças culturais e onde a sociedade se via e era vista.

“Vogue é uma revista semanal novo de moda e dedicado ao

lado cerimonial da vida. É um diferente de qualquer

periódico existente. Sua ilustração são imagens de sociedade

de NY e são estritamente exato em cada detalhe do modo

predominante no vestir para mulheres e homens.” (HILL,

2005, p. 8)

A publicação sentiu novos ares de crescimento quando Condé Montrose Nast, advogado e

publicitário com anos de experiência em jornalismo de revista, comprou e editou-a, em 1909,

visando estender o poder da Vogue e torná-la umas das mais famosas revistas de estilo e cultura

do mundo.

A Vogue se firmava nos Estados Unidos como um ícone de impacto no jornalismo e na

cultura geral, e, em 1913, Condé Nast justificou em artigo veiculado no jornal Merchants’ and

Manufacturers’ o porquê do sucesso.

...uma publicação dirigida a um segmento, não é nada mais

que uma publicação que procura caminhar somente onde há

características em comum que marcam aquela categoria.

Essas características podem ser quase nada: a religião, um

bairro, negócios, ou outro interesse comum. Quando eu digo

que a publicação segmentada deve parecer com uma dessas

categorias para sua circulação, eu estou estabelecendo que, a

partir desse fato, o editor, os anunciantes e o responsável

pela circulação da revista devem conspirar para não somente

conquistar todos os leitores deste seguimento ao qual a

revista é dedicada, mas rigorosamente excluir todos os

outros. (ANGELETTI; OLIVA, 2006, p. 19)

A confirmação do sucesso da revista segmentada para o público das camadas mais altas

da sociedade veio com o início da publicação da Vogue na Inglaterra, em 1916. Já em 1920 os

negócios foram expandidos para a França, veiculando trabalhos de profissionais vindos de

escolas de arte europeias.

A concorrência motivou a Vogue a inovar e se firmar ainda mais com a identidade

normativa de elegância. Entre as inovações, o uso de editoriais fotográficos seguindo as capas da

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revista, que tiveram suas modelos vestidas com peças famosas da alta-costura, sob os pincéis e

câmeras dos mais renomados artistas contemporâneos. Assim, as capas da Vogue tornaram-se

notáveis refletindo os movimentos artísticos de cada década do século XX.

No início, como uma crônica da sociedade e com o advento da fotografia de moda,

Vogue retratava as próprias socialites adornadas e presas por suas joias e espartilhos, trajando

exuberantes vestidos de Schiaparelli, Balenciaga e Chanel, por exemplo.

Em 1937, a revista marcou sua história quando fotografou a plebéia Wallis Simpson que,

duas vezes divorciada, foi o motivo da abdicação do monarca britânico, Duque de Windsor. O

fotógrafo John Rawlings registrou Wallis Simpson na capa da Vogue, que, desde então, voltou

suas lentes e editoriais de moda para as celebridades. Segundo Angeletti e Oliva, “como resultado

da sugestão de que personalidades de Hollywood e figuras da sociedade poderiam ser veículos

mais visíveis e efetivos dos editoriais de moda, a Vogue aumentou seu foco na alta sociedade de

Nova Iorque e nas estrelas do cinema” (2006, p.110).

Vogue tem grande referência de moda e estilo no mundo, e, todos os meses a revista

nasce com o foco voltado pra seu objeto, a própria moda. Não apenas a moda como vestimenta,

mas sim como comportamento e estilo de vida.

Para que uma edição exista, as grandes marcas e estilistas têm destaque em suas

reportagens e editoriais, ocupando espaço simultaneamente a personalidades do cinema, artes,

gastronomia, literatura, etc.

“Vogue reflete as mudanças na sociedade e na moda,

englobando cultura popular, arte política, esporte, design.

Somos todos influenciados pelo que vemos e pela época que

vivenciamos. Para mim, coordenar uma edição de Vogue é

como coordenar e receber convidados para um grande

jantar. Eu sempre tento convidar algumas pessoas influentes

que não necessariamente se conheçam e que venham de

mundos diferentes. Você precisa de um extraordinário

fotógrafo, como Irving Penn, Annie Leibovitz ou Mario

Testino, um grande escritor da qualidade de Julia Reed, Joan

J. Buck ou John Powers, que podem discutir de política a

cinema. Acrescente uma bela e inteligente mulher como

Nicole Kidman ou Uma Thurman e um fabuloso especialista

em gastronomia como Jeffrey Steingarten. Quando você

introduz todos eles, neste mix, a conversa se transforma em

algo apaixonante, interessante, divertido, provocativo,

inesperado. A vida é tudo isto e Vogue deve ser assim

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também.” (WINTOUR apud ANGELETTI; OLIVA, 2006,

p. 250).¹

Desde a sua criação no final do século XIX até o presente, Vogue tem servido como um registro

fotográfico e literário das vidas de seus leitores: a elite liberal da década de 20, as donas de casa

idealizadas da década de 50, as mulheres no mercado de trabalho dos anos 70, e hoje mostrando a

mulher mista que conquistou o mundo.

A evolução do estilo da Vogue ficou a cargo do tempo e dos editores que passaram por

ela. Hoje, a revista está presente em dez países com publicação própria (Estados Unidos,

Inglaterra, França, Itália, Alemanha, Espanha, Japão, Taiwan, Rússia e México), e com a

publicação licenciada – com revistas editadas sob as regras da Editora Codé Nast Internacional,

principalmente quanto à nomenclatura das seções, número de páginas e projeto gráfico, em outros

onze paízes (Austrália, Brasil, Coréia, China, Grécia, Holanda, Índia, Portugal, Turquia,

Tailândia e Ucrânia).

Anna Wintour, editora da Vogue América desde 1988, é tida como umas das

personalidades mais influentes em termos de moda mundial. A atual editora foi responsável por

ventos de mudança na linha editorial da revista, que andava abalada pelo lançamento da

concorrente de mercado Elle em 1986.

Acostumado aos elegantes close-ups nas modelos cheias de maquiagem e grandes jóias,

o mundo sentiu a diferença, quando, em novembro de 1988, a modelo israelense Michaela Bercu,

estampou a capa da Vogue usando uma jaqueta de alta-costura Christian Lacroix, junto a um

jeans Guess.

“Na verdade, isso só serviu para reforçar a idéia de usar a

grandeza arrogante da alta costura e, divertidamente, jogá-la

de cabeça na vida real, e ver o que acontecia. (...) Este

quebrou todas as regras. Michaela não estava olhando para

você, e pior, ela tinha os olhos quase fechados. Seu cabelo

estava soprando em seu rosto. Eu apenas olhei para aquela

foto e senti os ventos da mudança. E você não pode pedir

mais do que isso de uma imagem de capa.” (WINTOUR,

2012).

__________________

¹ Anna Wintour é a atual editora-chefe da edição norte-americana da revista Vogue.

11

O fato abriu horizontes para a revista, ampliando os desejos do público, mostrando novas

formas de elegância e o mais importante: aproximando as classes de massa ao mostrar peças mais

acessíveis junto da alta-costura.

A revista funciona hoje como uma espécie de termômetro cultural, mostrando e

antecipando o que há de melhor e mais novo na moda, na cultura e na arte. Democrática, além de

reportagens sobre moda, estilo, arte, cultura, política, Vogue apresenta imagens da alta moda, ao

mesmo tempo em que apóia novos talentos.

Vogue é ao mesmo tempo testemunha do mundo da moda e

sua protagonista. Nós mostramos o que vemos, mas também

ajudamos a criar o que vemos. Realizar a cobertura dos

lançamentos das coleções e as tendências de moda é muito

importante, mas o que nós fazemos fora da revista é crucial:

apoiamos os novos talentos através da CFDA – Vogue

Fashion Fund no trabalho no Costume Institute of the

Metropolitan Museum of Art, ouvindo os varejistas,

disponibilizando espaços de divulgação para seus negócios e

para os designers, constituindo toda uma relação em vários

níveis desta indústria. Tudo isso nos faz muito mais que

uma revista. Nós somos uma força real na moda. Para mim,

esta parte vital da vida da revista é quase tão importante

quanto o que nós publicamos, porque dá apoio para a moda

de uma maneira que ninguém faz. (WINTOUR apud

ANGELETTI; OLIVA, 2006, p. 251).

Os editoriais de moda mostram o must have - aquilo que marcará estações e vestirá

muitas mulheres pelo mundo, e são uma referência por causa da forma como são produzidos. A

escolha dos melhores fotógrafos para clicar a modelo que vestirá a roupa certa, faz parte do

cuidado estético daqueles que fazem a Vogue.

A influência da equipe editorial de uma publicação do porte da Vogue é enorme. A

exibição, em 2006, do longa-metragem O Diabo Veste Prada (dirigido por David Frankel)

contribuiu para o aumento da curiosidade mundial em relação a Wintour, que foi caricaturada

como uma severa editora no filme. Os faróis se voltaram para uma publicação que tem acesso a

todo o mundo da moda, sendo pioneira em mostrar as principais tendências das passarelas e das

ruas.

No longa-metragem há um momento em que a personagem que representa Anna

Wintour, vivida pela atriz Meryl Streep, exemplifica de forma simples e grosseira o que acontece

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com as criações e o consumo de moda, iniciando nas passarelas de alta-costura, passando pela

Vogue e chegando às mãos do consumidor.

A geração Wintour na Vogue coroou modelos ao status de celebridades, como parte da

cultura da época. Rostos de sucesso, como os de Linda Evangelista, Christy Turlington, Cindy

Crawford, Claudia Schiffer, eram vistos na estampando comerciais, lançando marcas próprias de

cosméticos e lingerie, e até em vídeos de ginástica. Hoje os editoriais de moda da revista

englobam top models, atrizes e celebridades de diversos ramos, chegando a veicular uma capa

com a atual primeira dama americana, Michelle Obama, em março de 2009.

1.2 A sociedade brasileira também quer ver e ser vista

Segundo a historiadora Luca (2008, p. 105), o primeiro periódico para o público feminino

de circulação nacional foi a “Revista Feminina” (1914 - 1936), pertencente a Empresa Feminina

Brasileira, uma indústria de produtos femininos, a revista foi fundada por Virgilina de Souza

Salles, mulher de família tradicional paulista. A revista se dirigia às mulheres de todo país e

tratava de assuntos como literatura, casamento e estética.

A revista O Cruzeiro de 1928 marcou o jornalismo brasileiro quando passou a ser

considerada a maior revista ilustrada brasileira, perdendo seu caráter literário. A publicação

contava com muitos anúncios coloridos, vários deles ocupavam o espaço de páginas inteiras.

A indústria têxtil crescia no Brasil e, simultaneamente, surgiam revistas de moda como a

Manequim (1959) e Claudia (1961) buscando atingir o público feminino de formas diferentes; a

primeira trazia moldes prontos para copiar, já a segunda se dirigia às donas de casa, tratando de

família e filhos.

Na segunda metade do século XX, o modelo moderno de imprensa foi aclamado no

Brasil, e, em 1975, o jornalismo segmentado, voltado para o estilo de vida chegou ao país através

da Vogue. Originalmente lançada pela Editora Três (dirigida por Luís Carta, Domingo Alzugaray

e Fabrizio Fasano), em 1976, a Vogue passou a ser publicada pela Carta Editorial. Luís Carta, ao

editar a revista, propôs algo novo, algo preocupado com a estética, qualidade, design e

fotografias, mesmo que a publicação tratasse de assuntos femininos.

Sob olhares receosos de investidores temendo que a revista não tivesse anunciantes

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interessados com o luxo da classe mais alta, a Vogue abriu caminhos não divulgados na imprensa,

até então, conquistando não só os profissionais da moda, que dava seus pequenos passos, como

os leitores que buscavam design diferenciado.

“O desafio de todos era aprender o olhar Vogue, totalmente

inédito no Brasil. Nessa busca, fui duas vezes a Nova

Iorque, para estagiar na Vogue americana. Mas quem ajudou

muito a construir esse olhar foi Rudi Crespi, braço direito de

Luís Carta e alma da revista nos primeiros anos. Ele dava o

tom que precisávamos. Era alto, bem-vestido, cheio de pose.

Homem do jet set, convivia com Jackie O. E Lee Radziwill,

Truman Capote, Peggy Guggenheim, Mick Jagger,

Valentino. Vivia entre Paris, Nova Iorque, Milão e Londres.

Bronzeava-se no mediterrâneo. Sua mulher, Consuelo, era

das mais elegantes da América.” (BAENDERECK, 2010, p.

208)

Segundo Angeletti e Oliva (2006), a Vogue América tem três áreas editorias-visuais: a

frente da revista entremeada com propagandas; o centro, onde fica a maior parte das matérias e

não tem propagandas entremeadas; e a parte de trás da revista, que também tem anúncios de

publicidade, junto às fotografias de moda.

Assim, seguindo a linha editorial da matriz, a Vogue Brasil uniu ícones brasileiros de

sucesso, moda e beleza, tornando-se uma referência da profissionalização da moda no País. A

publicação teve sucesso se direcionando para as classes mais altas, formadoras de opinião, com

interesses pelas novidades artísticas, sendo uma fuga do espaço doméstico que era dado à moda

para mulheres.

Para Condé Nast, Vogue focava, clicava e divulgava o estilo de vida da sociedade,

mostrando o padrão desejável, provando que o que todos (ricos e pobres) gostavam era de ver a

vida privada, o mundo dos muito ricos. Essa definição foi outro fator que deu popularidade à

Vogue Brasil, primeira revista que veiculou personalidades da alta sociedade brasileira,

mostrando como viviam, para onde iam nas férias, seus pertences pessoais etc.

Luís Carta comandou a editoria da revista até 1986 quando partiu para Madrid,

convidado pela editora Condé Nast para organizar o lançamento e dirigir a Vogue Espanha.

Andrea e Patricia Carta seguraram a revista até 2010, juntando o olhar Vogue aprendido em casa

ao faro jornalístico, fazendo a revista se consolidar no mercado, inclusive em períodos de crise.

Segundo Patrícia Carta (2008, p. 35): “o que a gente visa é transmitir um estilo de vida,

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até porque o luxo engloba tudo o que é bom e tem qualidade, podendo estar presente até em um

prato de arroz e feijão bem-feito. Indicamos o que o mundo oferece de melhor para elevar a

qualidade de vida das pessoas.”

A atual editora-chefe da revista, Daniela Falcão assumiu a responsabilidade sobre um

veículo que fala para as mulheres brasileiras contemporâneas, numa era digital onde a informação

é captada instantaneamente.

Vogue era uma plataforma para curtir todo o lado mais

hedonista, das coisas maravilhosas da vida. (...) O que ela

tem de relevante é a qualidade das imagens. A Vogue é uma

revista à prova de erros. Ela não pode ter um texto

toscamente escrito e nem imagens de baixa qualidade.

(...)Temos várias plataformas online, mas é na revista que

está nossa interpretação das principais tendências de um

jeito que interessa à brasileira e à leitora de Vogue.

(FALCÃO, DANIELA, 2013)

A Vogue Brasil está sempre esforçada em reafirmar aspectos vanguardistas, como se

identifica na sua linha editorial, desde a relevância do universo que envolve a cultura

contemporânea, na apresentação de tendências de moda em imagens e textos, até a escolha de

suas seções, entrevistados, artista, personalidades, modelos e anunciantes. A respeito das leitoras,

Daniela Falcão afirma que procura enriquecer a vida destas sem delimitá-las em estereótipos.

“Em tese, a Vogue é voltada para o público de classe A,

então penso que a mulher da Vogue pode tudo. Não tenho

limitação financeira. Isso diferencia a Vogue de outras

revistas femininas e de moda. Eu não me preocupo em ser

acessível e a grande sacada é que você não precisa comprar

aquilo. Eu mostro o que tem de bacana, mas não

necessariamente caro. A mulher da Vogue vai da coxinha ao

caviar. Não tem coisa mais deliciosa do que uma boa

coxinha de frango. Ela faz parte do universo Vogue como o

caviar mais raro, que pipoca na boca. A revista é uma

delícia de fazer e ler, pela liberdade.” (FALCÃO,

DANIELA, 2013).

Em quase 38 anos de história, belas e poderosas passaram pelas capas de Vogue, novidades foram

ditadas em forma de mandamentos, a cultura e tudo que era mais novo nos cenários nacionais e

internacionais foram veiculados, a moda brasileira teve uma história contada em suas páginas que

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filtravam tudo que possivelmente seria objeto de desejo do leitor.

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CAPÍTULO II - FOTOGRAFIA DE MODA

Escrever sobre a fotografia de moda é passar por uma carência de bibliografia, mas por

uma riqueza de imagens que recriam um mundo e fabricam sonhos. A história e o

desenvolvimento da fotografia de moda estão estritamente ligado aos periódicos que circulavam,

e desde a criação deste advento ambos caminharam juntos retratando história, do século XX até

os dias de hoje. Aqui focaremos na fotografia da revista Vogue.

A moda era retratada em revistas específicas, até início do século XX, por ilustrações

feitas por desenhistas preocupados com a reprodução perfeita do código indumentário da época,

retratando simbolicamente a elegância ideal para Vogue, que foi pioneira no uso da fotografia de

moda.

A viabilidade do uso da fotografia em Vogue elevou a revista a outro patamar: a socialite

que era fotografada em sua casa, usando suntuosas roupas e chapéus, foi substituída, em geral por

atrizes, que seriam capazes de representar na foto, ou moças de beleza marcante, colocadas em

um espaço ornamentado, agora buscando expressão para as fotografias. Segundo Angeletti e

Oliva (2006, p.56) era veiculado em Vogue o que as mulheres esperavam ver em uma fotografia

de moda: um espelho de si, de suas fantasias, de como ela quer ser vista por outros, do que a

roupa que ela pode usar e como ela pode usá-los.

O ano era 1913, e o Barão Adolph de Meyer revolucionou ao fotografar uma jovem

herdeira em um vestido branco com adornos pretos, confrontado a câmera com a mão no quadril

e um olhar altivo. A imagem alterou o conceito de fotografia da revista Vogue desde sua

veiculação e, como conta Angeletti e Oliva (2006, p.56), se tornou um certificado de elegância

para uma aristocrata de Newport ou uma estrela da Broadway ter um retrato assinado por De

Meyer, na Vogue. O Barão deu para as mulheres toda a aura de elegância chique dos ingleses,

charme eslavo e estilistas franceses.

O sucesso de Meyer marcou a história da Vogue e fortaleceu a imagem da leitora ideal

para a revista: elegante, refinada, altiva, mas sobretudo mulher. Porém a efemeridade da moda e o

desejo pelo novo trazem a necessidade de repaginação das fotografias, que devem manter status

de novidade se adequando às mudanças da sociedade em sua volta.

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Ao longo dos anos é possível notar a evolução da fotografia de moda e da criatividade

crescente em suas produções. Assim, na medida em que os movimentos artísticos e culturais vão

surgindo, a utilização da fotografia, influenciada pelo molde da mulher Vogue, como forma de

expressão visível fez a história da revista.

2.1 A fotografia conta história

Como uma forma de comunicação universal, permitindo mostrar, observar e conhecer,

além de refletir sendo um testemunho do que acontece, a fotografia se tornou um documento

social. Como um fragmento visual, a fotografia vem informando sobre a realidade do homem,

com o passar do tempo.

“Cada sociedade tem seu regime de verdade, sua “política

geral” da verdade: isto é, os tipos de discursos que ela aceita

e faz funcionar como verdadeiros; os mecanismos e

instâncias que possibilitam distinguir entre afirmações

verdadeiras e falsas, o meio pelo qual cada valor é

sancionado” (FOUCAULT, 1984, p. 73)

Contudo, assim como qualquer notícia, a fotografia terá interpretações daqueles que a

manipularem, manifestando a personalidade do autor, ratificando, assim, a ideia de que as

imagens fotográficas são um antigo e poderoso instrumento de veiculação de ideias, manipulando

opiniões públicas. O que faz de fotografias um testemunho fiel é o ajuste da realidade no clique.

Como em um texto, a objetividade em uma foto também é utópica, contudo a

manipulação emitindo características pessoais não desvaloriza a importância documental de uma

fotografia de moda, que tem dois lados: o lado documental e o construído. Sendo um documento

que capta um frame de realidade manipulado em planos de montagem e estética localizada no

tempo e espaço em que o registro se realizou, a fotografia não diminui o valor de fonte histórica.

Barthes (1984) fala da fotografia como sendo o objeto que sempre se encontra no gesto

da designação, o gesto que aponta com o dedo e indica o que se deve ver: o seu referente, o ponto

fotográfico. Para ele a fotografia pertence à classe dos objetos que se distinguem pela dualidade,

daquilo que se pode conceber e, do que se pode perceber.

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Para analisar uma imagem, trabalha-se com detalhes que representam o imaginário da

sociedade. Um tipo de análise da imagem é a semiótica, considerando a foto como signo. Temos

assim dois planos: o que a imagem mostra e expressa, e seu conteúdo que é o que ela significa, o

significado (material da foto) e o significante (a realidade a qual ela faz referência).

Assim, a fotografia tem significados não explícitos, bem como significantes bem

trabalhados que são previamente calculados por seus autores. Para entender a imagem é

importante desmontar toda a construção feita, levando em conta a realidade em que ela se

encontra, a realidade que ela quer documentar, bem como a finalidade para a qual estas foram

produzidas. Como um objeto, a foto é feita esteticamente para tocar o público.

O fotojornalismo de moda sugere para seu público novos modos de vestir, em sintonia

com as estações do ano, de acordo com o que cada grupo social deseja mostrar para outras

pessoas. Assim, as imagens que registram e disseminam o surgimento de novos padrões de

elegância nas passarelas, nas mídias e nas ruas, são enfim um documentário.

Afora a efemeridade da moda e a necessidade de mostrar o novo, as fotografias fashion

sofrem variações devido a particularidade da linha editorial de cada revista, bem como a

influência determinante dos profissionais com poder de decisão no que diz respeito à produção

das imagens relacionadas diretamente com o conceito do periódico. É de acordo com esse

conceito que a imagem editorial é construída, e foi assim que, ao longo dos anos, se fortaleceu a

ideia da mulher Vogue.

O mercado editorial na área da moda é vasto, de modo que a fotografia pode ser vista em

milhares de revistas em todo o mundo. Tal mercado produz revistas para os mais diversos tipos

de públicos, por isso essas são cada vez mais segmentadas. Voltando para a Vogue, a fotografia

de editorial de moda, é o cargo chefe de liberdade de todo o fotógrafo. Este é o tipo de imagem

que almeja construir, na medida em que ela dá maior liberdade de uso expressivo, uso de

equipamento, de cenografia e abre o diálogo estético. A função do editorial é veicular tendência

de moda, dialogar com o desejo da leitora dentro do espaço mais onírico da revista.

O vínculo do editorial com o real é o tema da edição do periódico, os objetos a serem

usados são os produtos dos anunciantes. No geral, a função desta fotografia de moda é formar

opinião, trabalhar antecipadamente formando o novo gosto, induzindo padrões de cultura e

19

imagem. A fotografia dos editoriais é a imagem da moda, é nela que está o poder de criar a nova

gíria da linguagem do corpo.

Os jornais e revistas de moda contemporâneos utilizam essa linguagem como poderoso

meio de comunicação, que age de maneira determinante nas emoções humanas. São protagonistas

da construção de uma realidade partilhada no cotidiano dos consumidores, estes, por sua vez,

estão à deriva do que está em moda na temporada.

...nas páginas dos exemplares escreve-se a própria história

da indústria gráfica, dos prelos simples às velozes rotativas

até a impressão eletrônica. O mesmo poderia ser dito em

relação ao percurso das imagens, que se insinua de forma

tímida nos traços dos caricaturistas e desenhistas, e chega a

açambarcar o espaço da escrita com a fotografia e o

fotojornalismo. Páginas amarelecidas que também trazem as

marcas do processo de trabalho que juntou máquinas, tintas,

papel, texto e iconografia, fruto da paciente ordenação do

paginador e da composição manual e caprichosa de cada

linha do texto pelo tipógrafo, assando pelos ágeis

operadores das linotipos e, agora, pelos meios digitais.

(JOFFILY, 1991, p.78)

A fotografia comunica a última moda aos nossos olhos, e assim a moda e suas mudanças

embalam ditames do que é esteticamente belo, revelando seu potencial simbólico. Os elementos

visuais implícitos na imagem fotográfica, manipulados por profissionais competentes, têm poder

de persuasão e controle do público consumidor. Nas palavras de Neiva Jr (1994, p.71): “A

imagem publicitária constrói, com requinte de artificialidade, a figuração da cena que será

apresentada sedutoramente ao consumidor como condição de felicidade.” Nas revistas, o

conteúdo não é apenas o texto que se lê, mas tudo aquilo que nele se insere e dele se deduz.

Deve-se considerar o contexto e o meio em que estas imagens vão aparecer. Por isso, as

imagens devem ser pensadas e adequadas a partir de informações corretas, do ponto de vista do

mercado e do produto e das motivações mais íntimas que movem o consumidor em potencial. O

conjunto da imagem é que sugere algo: embora exista um produto dentro da imagem, a sua

ambientação é que vai sugerir, persuadir e demonstrar, provocando atenção, desejo, ação,

satisfação.

20

As imagens da Vogue Brasil são o que mais caracterizam

sua linha editorial de uma moda conceitual. Afinal, em

revistas de moda o que prevalece são as imagens, a moda se

vê para se sentir e interpretar: uma mesma roupa

interpretada de diferentes maneiras pode traduzir um outro

estilo. (JOFFILY, 1991, p 107)

A imprensa de moda sempre teve a preocupação de ser um veículo que sintonizasse o

texto informativo à comunicação das imagens. Assim, desde seu surgimento, me 1975, a Vogue

Brasil, como sua matriz, apresentou um conteúdo de estilo de vida, sociedade, celebridades,

beleza, simultaneamente aos fatores que inspiram glamour, sempre baseado nos preceitos do que

está em voga na moda, tudo registrado em fotografias de boa qualidade.

21

CAPÍTULO III - MODO DE ENDEREÇAMENTO

Com o seu desenvolvimento junto às revistas, no século XX, a fotografia de moda não

costuma ser o objeto de análise em pesquisas, sendo vista em planos gerais, não como um

produto cultural.

Partindo do ponto que o fotojornalismo de moda ao desenvolver uma formação cultural

particular é um construtor social, bem como é uma instituição social ao tornar público a

informação prevista em coleções, por exemplo, vamos estuda-lo como produto das revistas de

moda. Josenildo Guerra expressa bem o caminho de uma informação que será retratada em um

editorial fashion, sendo a notícia a fotografia em si:

Levado a cabo pelo jornalista, no qual ele parte de um

problema ou fato inicial que será objeto de apuração,

desenvolve ações com vistas a ‘solucioná-lo’, até chegar a

um entendimento final a ser expresso na forma de notícia

(GUERRA apud GOMES, 2003, p.164).

Do fato inicial ao produto final há um grande percurso que, ainda segundo Guerra, passa

pela natureza do fazer, pelo como fazer e sobre às circunstâncias do fazer jornalismo.

A natureza do fazer define o próprio conceito de jornalismo

numa determinada sociedade e o configura como uma

instituição social. O como fazer diz respeito à perícia, à

competência para efetivação do processo de produção da

notícia. As circunstâncias do fazer se referem às condições

empíricas nas quais o jornalismo se realiza e diz respeito aos

constrangimentos econômicos, políticos, técnicos, sociais,

ou, como diz o autor, se referem às esferas de convivência

que tornam o jornalismo também um fazer possível.

(GOMES, 2007, p. 7).

Pensando com o nosso objeto de estudo, a edição Nº 414, de fevereiro de 2013 da

Revista Vogue, as considerações da jornalista Ruth Joffily aumentaram nossa compreensão de

como a linha editorial de uma revista de moda é definida de forma a atender o seu público-alvo.

Segundo Joffily (1991, p.70), a linha editorial de uma revista passa a influir “desde a definição da

pauta (o que o público quer ver na revista, o que ele aceitaria, o que o surpreenderia) até a

22

composição de cada matéria.” E surge a partir do “horizonte de expectativa” de seu público-alvo

– por isso faz-se necessária uma definição prévia do tipo de público a ser visado pela revista.

Sendo a fotografia de moda um produto jornalístico de revistas fashion, tratemo-la não

como um produto imparcial, mas sim como um fruto do meio em que ela aparece, sendo uma

dinâmica da comunicação junto a moda e ao novo.

Um gênero é uma forma cultural que apresenta a realidade

social em uma perspectiva própria e, ao fazer isso, implica

formas específicas de percepção e usos sociais do conteúdo.

Assim, o gênero estabelece um modo de comunicação ou,

mais especificamente, uma situação comunicativa, entre o

emissor e o destinatário” (JENSEN, 2005, p.10).

Jensen propõe que a definição da notícia como um discurso leve em conta três aspectos,

a posição, o assunto adequado e o modo de composição formal. A posição de quem fará a

fotografia terá a ver com o modo que o assunto adequado será abordado, bem como os objetivos

a serem alcançados com a retórica do público, sendo assim definido o modo de composição

formal da foto.

O valor do editorial de moda está em manter o público atualizado em relação aos

lançamentos e tendências. Está em realizar a crítica, buscando critérios estéticos. Estéticos, pelo

lado criativo e artístico da criação de moda. Pragmáticos, porque a roupa é para ser usada no

cotidiano. Está em acompanhar, pelo prisma da moda, a flutuação dos comportamentos, a

mudança nas correntes socioculturais, adequando a moda à realidade da leitora.

Analisar o contexto em que a fotografia de moda da Vogue se insere deve significar, no

esforço mesmo de verificar como a revista apela, faz referência a, e convoca seu contexto.

Devemos perguntar porque é possível a veiculação de uma revista endereçada à classe alta, que é

minoria no Brasil, considerando a história cultural da revista, analisando como os editoriais de

moda configuram a comunicação que atualiza seu público dentro da efemeridade da moda.

Para a realização do editorial de moda, profissionais são mobilizados para trabalhar em

equipe. A pauta, decidida previamente, determinará a linha de pensamento e produtos que serão

abordados em cada fotografia. É em função da linha editorial da revista que são exploradas as

ousadias e propostos estilos, sugerindo, de maneira ampla, opções para o seu público. O centro da

atenção será a leitora. Para ela, em seu favor, devem estar dirigidas as matérias – para informá-la.

23

O editorial de moda poderia não apenas apresentar o que há

à disposição no mercado mas também realizar a "crítica",

apontar as ligações da moda num sentido mais amplo com a

atualidade sociocultural, avaliar as propostas dos estilistas,

funcionar até mesmo, em alguma medida, como uma defesa

do consumidor, auxiliando a leitora a adequar a moda ao seu

tipo físico e estilo de vida. (JOFFILY, 1991, p. 86-87)

Joffily divide as matérias de moda em três tipos: tendência – referente ao que vai ser

usado na estação seguinte –, serviço – que informam como as leitoras devem fazer para levar as

tendências à prática cotidiana – e comportamento – matérias que inserem a moda na atualidade,

incluindo mudanças de hábito de consumo. Segundo Joffily, é como se a matéria de tendência

fosse a indicação geral que precisa ser concretizada a partir de cada realidade individual

(JOFFILY, 1991, p. 96).

O editorial de moda se encaixa como um informador de tendências, uma vitrine que

expõe as peças mais cobiçadas da estação para as leitoras de Vogue. Cada editorial traz uma

intenção e estilo, muitas vezes se combinando, conforme o público que a revista deseja atingir.

Segundo Joffily, a partir da definição editorial – criada de acordo com o público idealizado pela

revista, o texto será desenvolvido pela redação de forma a acompanhar o “clima” da reportagem

(legendas e fotos) e a oferecer o contexto da “coisa”.

Os ensaios são grandes produções. Há produções em que a

ficção está mais evidente, não se vê a roupa em destaque,

sente-se mais o clima, a densidade das cores, por exemplo.

Nas fotos estão implícitos um padrão de vida, um tipo de

comportamento, um desejo (de romantismo, de sucesso

material, etc) (JOFFILY, 1991, p. 106).

O modo endereçamento da fotografia de moda na Vogue dirá como o periódico se

relaciona com seu público, a partir da construção de um estilo, permitindo que compreendamos

como as questões ideológicas, de valores e sociais que abarcam a moda serão atualizadas na

revista. Segundo Gomes (2007), modo de endereçamento é aquilo que é característico das formas

e práticas comunicativas específicas de um programa, é o que diz respeito ao modo como um

programa específico tenta estabelecer uma forma particular de relação com sua audiência.

24

São fatores relacionados ao modo de endereçamento o

contexto textual, que inclui as convenções de gênero e a

estrutura sintagmática, o contexto social, que diz da

presença/ausência do produtor do texto, da composição da

audiência, de fatores institucionais e econômicos, e os

constrangimentos tecnológicos, que se referem às

características de cada meio”. (GOMES, 2007, p. 21)

O modo de endereçamento depende das características de cada meio, tanto no que se

refere ao suporte quanto às formas culturais adquiridas por cada meio em sociedades particulares.

As diretrizes tomadas serão o que distingue o produto dos demais, levando em conta a imagem e

estilo do público-alvo, bem como as especificidades da revista.

Quem quer que produza uma notícia deverá ter em conta

não apenas uma orientação em relação ao acontecimento,

mas também uma orientação em relação ao receptor. Esta

orientação para o receptor é o modo de endereçamento e é

ele, em boa medida, que provê grande parte do apelo de um

programa para os telespectadores. (GOMES, 2007, p. 20)

Adaptaremos os conceitos e marcadores de modo de endereçamento, criados a partir do

de Itânia Gomes em telejornalismo, para analisar as fotografias de moda e ver como a Vogue se

relaciona com sua audiência a partir da construção de um estilo, que o identifica e que o

diferencia dos demais.

“Uma produção de moda é um documentário – mesmo

quando se constitui numa matéria de serviço. É uma ficção.

No momento em que se busca compor os elementos como se

veem na vida real, estrita e cegamente, o que se consegue

são fotos sem atrativos, secas, rígidas, obviamente

caricaturais. Cada produção deve buscar sua própria

identidade e não tornar-se válida porque se parece com o

real. A produção de moda, como toda ficção, busca

expressar alguma coisa, dentro de uma economia de

recursos ou elementos utilizados que devem ser coerentes

entre si, que devem dialogar entre si na mesma língua”.

(JOFFILY, 1991, p. 105).

25

3.1 Os operadores de análise dos modos de endereçamento

A descrição de elementos semióticos e recursos de linguagem não foram suficientes para

compreender as estratégias da configuração de modo de endereçamento. Nesse sentido, Itânia

Gomes desenvolveu operadores de análise que favorecem a articulação dos elementos semióticos

aos elementos discursivos, sociais, ideológicos, culturais e propriamente comunicacionais,

permitindo que análise chegue ao modo de endereçamento de um veículo de comunicação. São

eles: mediador, contexto comunicativo, o pacto sobre o papel do jornalismo e a organização

temática.

1. O mediador: as revistas contam com toda a equipe que está por traz do produto final.

Contudo, para compreender o modo de endereçamento, é fundamental analisar quem é o editor da

revista e como este se posiciona para o público. Além disso, o modo de endereçamento também

diz respeito à forma com que os colaboradores e o resto da equipe se porta em relação ao público.

Segundo Itânia (2007), a performance do mediador é um aspecto central do modos de

endereçamento.

2. O contexto comunicativo: a imagem exige contextualização. Esse contexto compreende

tanto emissor da informação, quanto receptor e mais as circunstâncias em que o processo

comunicativo se dá. Os modos como os emissores se apresentam, como representam seus

receptores e como situam uns e outros em uma situação comunicativa concreta.

3. O pacto sobre o papel do jornalismo: define o que o público anseia ver na revista a qual

deve usar as premissas do jornalismo para, cada vez mais, aumentar sua credibilidade perante o

leitor.

4. Organização temática: é o agrupamento de notícias, imagens e editoriais segundo a aposta

no interesse do leitor. É o operador mais importante na análise do modo de endereçamento.

26

3.2 O público de Vogue

Em visita a redação de Vogue Brasil, investigamos sobre o processo de produção dos

editoriais de moda que fecham as edições de cada revista. Durante a reunião de pauta, dá-se

início ao processo da publicação: são determinadas as matérias de texto, os assuntos e as fotos.

Na hora de montar a produção de moda de uma revista tem-se de saber compor os

elementos com uma identidade própria, e não torná-la valida porque se parece com o real. Como

toda ficção, ela busca expressar alguma coisa, dentro de diversos recursos que devem ser

coerentes entre si, que devem dialogar na mesma língua.

As conclusões de Joffily (1991) sobre jornalismo de moda auxiliaram a compreensão de

como a linha editorial de uma revista de moda e suas fotografias são definidas de uma forma que

atenda todas as formas de perfis de suas leitoras. Segundo Joffily (1991, p.70), a linha editorial de

uma revista passa a influir “desde a definição da pauta (o que o público quer ver na revista, o que

ele aceitaria, o que o surpreenderia) até a composição de cada matéria”. E surge a partir do

“horizonte de expectativa” de seu público-alvo – por isso faz-se necessária uma definição prévia

do tipo de público a ser visado pela revista.

A primeira pergunta é “para quem eu estou escrevendo?” Se

você conhece o leitor, fica mais fácil. É como escrever uma

carta: é difícil começar quando não se sabe para quem

escreve. Texto de revista, já dissemos, tem endereço certo.

Conhecendo o leitor, sabe-se exatamente o tom com que se

dirigir a ele. É preciso escrever na língua do leitor ou, como

diria o jornalista Eugênio Bucci, em “leitorês” (SCALZO

apud RODRIGUES, MARIANA, 2012, p. 15).

Dados sobre o “perfil do leitor” da Vogue foram cedidos pela redação. Verificamos que

dentre os leitores do periódico: 81% dos leitores são mulheres; 67% têm de 17-35 anos; 18% têm

de 36 a 45 anos; 31% é dono de empresa ou vive de renda (não trabalha); na composição de

renda: 24% - pró-labore e participação nos lucros da empresa; 2% ganha mais de 45 mil

reais/mês.

27

Sobre o “estilo de vida do público leitor”: 65% dos leitores colecionam seus exemplares;

pelo menos 49% vai ao cabeleireiro, ao spa, faz ginástica/musculação ou massagem

semanalmente; 59% viaja ao exterior pelo menos 2 vezes ao ano; 31% possuem carros

importados e trocam em média a cada 2 anos; 34% definiram o carro como próximo objetivo de

desejo (BMW); 22% definiram casa de veraneio como próximo objetivo de desejo (Milão); 17%

definiram viagem como próximo objetivo de desejo.

Vimos que o público da Vogue Brasil recorta-se em pessoas de 18 a 45 anos, das classes

A e B, cultas, atualizadas e viajadas. São homens e mulheres que gostam de conhecer e comprar a

última imagem em tendência, clientes de marcas que compram objetos ícones de desejo,

exclusivos e de status. Um público formador de opinião, capaz de reconhecer os melhores

profissionais colaboradores nas páginas da revista, além de anúncios de grandes marcas,

nacionais e internacionais. Ainda há os profissionais ligados ao mundo da moda, modelos,

fotógrafos, estilistas, produtores e até os próprios jornalistas.

A eficácia desse sistema de comunicação está em não perder de vista o seu público; pelo

contrário, ser sempre a resposta das suas aspirações, estar à frente do indivíduo descobrindo o que

ele procura, antes que ele mesmo se dê conta. A moda não se renova ao sabor do acaso – seu

sucesso é determinado pela busca constante de novas linguagens que se adaptem às incessantes

transformações por que passa o homem contemporâneo. Nos editoriais de moda ficam evidentes

estas transformações e a renovação com base no passado.

28

CAPÍTULO IV - EDITORIAIS DA VOGUE BRASIL COMO OBJETO DE ESTUDO

O corpus da nossa pesquisa, a Vogue nº 414, lançada em fevereiro de 2013, será

analisado, principalmente sob os operadores de análise desenvolvidos por Itânia Gomes (2007)

apresentados anteriormente.

Na carta da editora Daniela Falcão para as leitoras, percebemos imediatamente os

aspectos expostos, de que a Vogue é uma revista de jornalismo segmentado, que visa atender,

com seu jornalismo e fotojornalismo de moda, determinadas categorias.

“E não tive sossego. Das locações às modelos, Anna e

Giampaolo queriam o top do top. Mas a gente é expert em

conseguir o impossível e, menos de dois meses depois da

reunião com ambos, uma equipe gigante desembarcava em

Salvador para fazer história.” (FALCÃO, 2013, p. 23).

A revista estudada representa tanto a inter-relação entre os profissionais de moda, quanto

entre os leitores. O discurso mostrado faz parte de um contexto maior, um contexto político e

social, formando um sistema de comunicação próprio no país, movimentando novas formas

culturais, identidades de indivíduos e configurando relacionamentos através da moda. Segundo

Lipovetsky (1989, p. 176), “a moda traz consigo a primeira manifestação de uma relação social

que representa tanto um tempo novo e legítimo, quanto uma paixão pelo ‘moderno’ e a novidade

como um valor mundano.”

De acordo com o linguista Bonini (2003), o editorial de moda é um gênero jornalístico

dos meios impressos. Composto por fotografias que demonstram combinações de roupas ou

mesmo corpos nus, em cenários dos mais variados tipos, apontando possibilidades de “bem

vestir”, do corpo a se ter ou de um conceito específico.

A principal função dos editoriais de moda é a sua tradução e valorização da proposta

editorial da publicação. Uma vez que os mais variados desfiles podem ser vistos através da

internet, bem como críticas e outras opiniões, não seria essencial a compra de uma revista para

que as leitoras se mantivessem atualizadas. Contudo, o poder da fotografia de moda, junto às

29

campanhas publicitárias estampadas em diversas páginas da revista, abrem um mundo diante dos

olhos da leitora, possibilitando diversas experiências que não abarcam somente a roupa, mas sim

um estilo de vida.

Os estudos permitiram que reconhecêssemos a revista Vogue Brasil como uma revista

moderna, pois, ao estar diretamente relacionada com a Vogue americana, é uma vitrine para as

últimas novidades, com excelência na qualidade e na apresentação de suas informações em

qualquer tipo de mídia, bem como de seus colaboradores que retratam um lifestyle repleto de

glamour para o público-alvo ‘formador de opinião’, com poder aquisitivo de médio alto a alto.

Ao mesmo tempo em que a convergência tecnológica

implica uma reorganização do processo de produção

jornalística, com consequências sobre o que costumamos

chamar de cultura jornalística, as tecnologias digitais têm

favorecido, senão o surgimento, a consolidação do

jornalismo de tipo cidadão, com a proliferação dos recursos

de interatividade, dos blogs, chats, do jornalismo open

source e de sites de disponibilização de vídeos que tendem a

reconfigurar os valores jornalísticos e a relação entre

jornalismo e público (GOMES, 2007, p. 27)

Nas quatro capas da edição analisada, quatro top models diferentes - Izabel Goulart

(Brasil), Magdalena Frackowiak (Polônia), Bette Franke (Holanda) e Mirte Maas (Holanda),

posam para as lentes do fotógrafo Giampaolo Sgura, sob o styling (direção de estilo das fotos) de

Anna Dello Russo. O primeiro, italiano formado em arquitetura, vem se destacando no meio

fashion ao retratar sua paixão pelas cidades sincronizada a beleza das mulheres que posam para

suas lentes. Já Anna Dello Russo, editora da edição japonesa de Vogue e uma das personalidades

mais clicadas no street style (estilo de rua) das semanas de moda mais conceituadas, é

considerada uma força impulsionadora da moda contemporânea por ser uma vitrine viva desta.

O resultado foi a mistura de nacionalidades que, em época de carnaval, foi publicada,

retratando um conceito diferente de mulher no território baiano. A mistura, chamada pela editora

da Vogue Brasil, Daniela Falcão, de “Bahia à italiana”, produziu os editoriais que fecham a parte

final da Vogue Brasil do mês de fevereiro, e que serão analisados por esta pesquisa.

30

4.1 Análise dos editoriais

4.1.1 Carmen Miranda Reloaded

Figura 1. Vogue Brasil nº 414, páginas 156 e 157

O primeiro editorial da Vogue Brasil 414, o Carmen Miranda Reloaded, traz a top model

holandesa Mirte Maas, de 21 anos – uma das recordistas de desfiles na temporada do verão 2013

internacional, fotografada por Giampaolo Sgura, sob o styling de Anna Dello Russo.

A proposta do primeiro editorial desta edição é clara desde seu subtítulo: “Sem medo de

se fazer notar, ela desfila pelas ladeiras do pelourinho com as melhores estampas da temporada e

aposta na saia midi como peça-chave do nosso inverno tropical. Nesse âmbito, o estilo dos

principais mediadores desta edição é logo perceptível: a arquitetura e o maximalismo.

31

As fotografias retratam uma explosão de cores, mistura de raças, e a postura

descontraída da modelo, mas sem perder a classe, ao andar pelas ruas do Pelourinho, na Bahia, e

ao posar com peças de grandes marcas brasileiras e internacionais, em situações cotidianas.

Figura 2. Vogue Brasil nº 414, página 167.

Giampaolo Sgura, o fotágrafo do editorial, é arquiteto e tem paixão pelas formas e cores

das suas locações. Em Carmen Miranda reloaded, a mulher Vogue fotografada divide o espaço

com a arquitetura do Pelourinho baiano.

O título do editorial nos remete a um dos ícones culturais do século XX, Carmen

Miranda (1909 – 1955), conhecida como a “Pequena Notável”. Seu legado artístico continua

como um ímã a atrair a atenção nos quatro cantos do planeta. Sua influência cultural rompeu

32

barreiras, enfrentou desafios e superou preconceitos; seus turbantes e balangandãs ganharam o

mundo e sua atitude ajudou a mudar o comportamento de muitas pessoas.

A Vogue Brasil nº 414, aproveitou o mês do carnaval que coincide com o mês de

aniversário desse ícone fashion e, no exemplar de fevereiro, o editorial Carmen Miranda

reloaded usa as ruas de Salvador para fazer uma homenagem à cantora brasileira, dançarina e

estrela da Broadway, marcando sua influência duradoura sobre a moda dos anos 40 e 50 até hoje.

Carmen Miranda é ícone da cultura popular e do exagero estético, assim, para comandar o

styling do editorial que leva o nome da cantora, a revista trabalhou com Anna Dello Russo que é

conhecida por seu maximalismo diário, e que foi a responsável pela transformação da modelo

Mirte Maas em uma Carmen Miranda moderna, nos padrões da revista.

Para mostrar as tendências das passarelas e das ruas, os mediadores da Vogue Brasil,

usaram um endereçamento nostálgico ao reproduzir a moda de hoje com ares do legado de

Carmen Miranda.

Figura 3. Vogue Brasil nº 414, página 166.

33

Em uma mistura de estampas, cores, arranjos de cabeça e acessórios muito com estilo

irreverente, com peças das temporadas de verão internacional e nacional, Carmen Miranda

reloaded temos uma mulher Vogue atual sob o prisma da artista de ontem.

Figura 4. Vogue Brasil nº 414, página 159.

34

Figura 5. Vogue Brasil nº 414, página 161.

Misturando etnias e culturas, as baianas que participaram do editorial não escaparam do

olhar maximalista de Anna Dello Russo, nem do conceito Vogue. Também com acessórios e

roupas de estilistas famosos, elas posaram ao lado da modelo Mirte Maas que caminhava pelos

ladrilhos do Pelourinho, com uma postura grandiosa que nos remete à “Pequena Notável” do

século passado.

35

Figura 6. Vogue Brasil nº 414, páginas 168 e 169.

Figura 7. Vogue Brasil nº 414, páginas 164 e 165.

36

4.1.2 Cheia de Graça

Figura 8. Vogue Brasil nº 414, páginas 170 e 171.

O segundo editorial da revista, o Cheia de Graça, mostra para a leitora Vogue o luxo dos

longos que fizeram sucesso nas passarelas. Ainda sob a sintonia da dupla italiana Giampaolo e

Dello Russo, o editorial sai das ruas e segue para os tons sóbrios das igrejas barrocas de Salvador,

dando adeus ao misto de estampas ao valorizar a sobriedade e rigidez de longos monocromáticos

selecionados, por Anna Dello Russo para a revista.

A modelo Izabel Goulart foi a única brasileira que, nesta edição, trabalhou com

Giampaolo Sgura e Anna Dello Russo. A proposta foi descontruir a imagem internacional de

ícone sexy que a modelo possui. Com postura e roupas sóbrias, Izabel representou, com

elegância, outra vertente da mulher Vogue, que, ao contrário do que foi mostrado no primeiro

editorial, prefere a cartela monocromática à explosão de estampas que circulam pelas ruas.

37

Figura 9. Vogue Brasil nº 414, página 179.

O barroco das igrejas de Salvador que serviram de locação para o editorial nos levando

para os período entre os séculos XVI e XVII, época do apogeu do movimento artístico europeu

que influenciou as artes plásticas, música, literatura, arquitetura e que influencia a moda.

Assim, sempre com chapéu de freira, acessórios religiosos e com um ar barroco, as

fotografias vêm, segundo o contexto comunicativo de Gomes (2007), ratificando para as leitoras

Vogue as tendências religiosas e barroca tão divulgadas nas ruas, e que foram vistas nas

passarelas de Dolce & Gabanna, no outono/inverno de 2013, por exemplo.

Com uma qualidade fina, detecta-se na imagem contrastes entre a roupa da modelo e as

tradições religiosas. A imponência das igrejas barrocas é refletida na imagem passada por Izabel

Goulart, bem como nos acessórios escolhidos para acompanhar seus vestidos crus e bem

38

recortados; o luxo e a riqueza de detalhes também são acompanhadas pelos acessórios, e assim

são mostradas as facetas da mulher Vogue.

Figura 10. Vogue Brasil nº 414, página 173. Figura 11. Vogue Brasil nº 414, página 172.

O luxo dos vestidos longos contrastam com a rigidez dos hábitos religiosos e, se apoiando

em simbolismos e contrastes, o Cheia de Graça revela uma mulher que com toda sobriedade não

perde as mudanças da moda, que vai e volta se inspirando no passado.

39

Figura 12. Vogue Brasil nº 414, página 176.

40

4.1.3 Nova Era

Figura 13. Vogue Brasil nº 414, página 189.

O editorial Nova era foi realizado em estúdio, valorizando assim, as peças que a modelos

Anmari Botha está vestindo, bem como o seu movimento corporal. Usando só roupas da

conceituada marca francesa Dior, misturadas com a sensualidade do verão brasileiro, o editorial

conta com a interação da modelo com homens descamisados.

41

Figura 14. Vogue Brasil nº 414, página 193.

A proposta do editorial é dada através do styling que selecionou apenas peças da Dior

em todas as fotos. O título também dá dicas do que vem a seguir: a nova era da Maison que agora

conta com um novo diretor criativo, o belga Raf Simons. Com a ideia de trazer de volta para o

futuro peças clássicas da Dior, que foi fundada em 1947, Raf vem reinterpretando e fazendo

leituras atuais de preciosidades da Maison.

A Dior, um dos pilares culturais francês, apostou em Simons para o rejuvenescimento do

estilo da marca, mas foi no passado que o estilista buscou a essência do presente, num

movimento chamado por ele de “nostalgia do futuro.” (Vogue Brasil 414, página 197).

42

Cortes, modelagem, bordados e silhuetas são relembrados, mostrando que a moda

também faz uso do passado para construir o futuro. Um exemplo é a combinação de saia floral

com suéter preto que figurou no verão da alta-costura de 1947 e que ganhou uma releitura de

Simons, como retrata o editorial da Vogue Brasil na figura 15 de nossa pesquisa.

Figura 15. Vogue Brasil nº 414, página 193.

43

Em cliques precisos, com iluminação que nos lembra pinturas antigas, o editorial Nova

era se endereça para os leitores brasileiros, trazendo para realidade tropical de nosso país as

novidades de uma das mais consagradas marcas mundiais, novidades estas que tem um quê de

passado.

4.1.4 Diva à Italiana

Figura 16. Vogue Brasil nº 414, páginas 198 e 199.

Fechando a edição de fevereiro de 2013, o editorial Diva à italiana traz a modelo

brasileira interpretando a atriz italiana Monica Vitti. Dito isso o editorial se passa como um filme

do qual o ator brasileiro Rômulo Arantes também faz parte. A modelo não interage com a

câmera, dando assim mais semelhança de personagem de um filme.

As fotos em preto e branco, intercaladas com outras coloridas em tons de suavidade

vintage, nos levam até a década de 60, época na qual Monica Vitti se destacou ao participar de

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filmes dirigidos por Michelangelo Antonioni, cineasta italiano realizador de Blowup (1966),

longa-metragem de grande sucesso.

Figura 17. Vogue Brasil nº 414, página 203.

Monica Vitti é uma atriz italiana que, além de se destacar no cinema, ficou conhecida

por ter um senso de estilo clássico e impecável que tem inspirado muitas mulheres até hoje. A

beleza elegante de Monica Vitti serve de conceito desde os anos 60 e inspirou o Diva à italiana,

com cinturas marcadas, estampas de bolinhas e listras.

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O fotógrafo Giampaolo Sgura montou a fotografia com itens que remetiam à época de

Monica, como carros e arquitetura; já a stylist Yasmine Sterea deu uma cara atual ao clássico que

consolidou o estilo da atriz italiana.

Figura 18. Vogue Brasil nº 414, página 203.

Em um editorial cheio de expressões, listras, poás e cintura marcada é endereçado ao

leitor, lembrando do estilo da atriz Monica Vitti e ratificando a ideia de que a moda vai e vem,

mas o clássico nunca sai de moda.

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Figura 19. Vogue Brasil nº 414, página 202.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A proposta do presente trabalho era analisar o endereçamento dos editoriais de moda da

revista Vogue Brasil. Isto só foi possível através do estudo do periódico e da sua linha editorial,

afora o estudo dos signos das fotografias que fizeram parte dele.

Durante todo o trabalho foi possível reunir informações sobre os principais assuntos

tratados neste estudo. Constatou-se que a Vogue já nasceu direcionado para um público de classe

alta e que, com o advento da fotografia de moda, histórias foram contadas para as leitoras e para

o mundo.

A moda foi tratada em diversos ângulos. Mostrou-se sua importância a nível histórico,

diferenciando cada momento, na vida antiga e na sociedade contemporânea. Como se pôde

constatar, a moda também é um tipo de discurso, com seus termos, suas ideologias e

diferenciações. Como uma publicação licenciada da Editora Condé Nast Internacional, percebe-

se na Vogue Brasil a influência das raízes da Vogue América, como uma extensão dos costumes

do público seleto, que migra entre as classes A e B.

Ao estudar e analisar os editorias de moda da edição nº 414 de Vogue Brasil que fizeram

parte do corpus desta pesquisa, foi possível identificar o endereçamento das fotografias de moda

do periódico. Determinamos que a moda é cíclica, podendo-se constatar, nos editoriais da edição

414, um endereçamento do passado para, com nostalgia, se expressar tendências atuais. Esse

endereçamento do passado dos editoriais de moda da revista Vogue Brasil é o gancho com a

realidade que dá o diferencial das fotografias de moda em relação às fotografias de desfiles e

street style.

O resultado desse endereçamento são fotografias produzidas com o aparato técnico e

pessoal necessário para informar as leitoras Vogue sobre as tendências, fazendo com que as

fotografias de moda tenham valor documental, usando a nostalgia do futuro. Com uma identidade

própria, conteúdos e discursos coerentes, a edição dialogou em uma mesma língua ao dar uma

organização temática ao seu conteúdo, no caso a nostalgia para mostrar as tendências. Assim, a

revista endereçou, em vários estilos de editoriais de moda, a essência da mulher Vogue, aquela

que estampa as páginas do periódico desde 1982.

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Ao final do percurso de análise do modo de endereçamento das fotografias da Vogue

Brasil que trazem vários tipos de mulher, a discussão sobre a interpretação deste endereçamento

por parte das leitoras surge como tópico que merece aprofundamento em um trabalho futuro.

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