Enc94 - ipni.netFILE/Encarte-104.pdf · Title: Enc94 Author: EVANDRO Subject: Enc94 Created Date:...

12
ENCARTE DO INFORMA˙ÕES AGRONÔMICAS N” 104 DEZEMBRO/2003 1 Keith Helyar 2 1 Palestra apresentada no 4 o Simpósio sobre Rotaçªo Soja/Milho no Plantio Direto, em Piracicaba-SP, julho/2003. 2 Wagga Wagga Agricultural Institute, NSW Agriculture, PMB, Wagga Wagga, NSW, 2650, AustrÆlia. Telefone: 61-2-6938-1854, e-mail: [email protected] INTRODU˙ˆO O objetivo a curto prazo do manejo da acidez do solo Ø lidar com o pH da superfície do solo de modo a interromper a acumulaçªo de quantidades de Al, Mn e H + capazes de causar significativas perdas econômicas na produçªo de plantas ou de animais. A longo prazo, o assunto Ø mais amplo. É preciso responder: o sistema de manejo estÆ favorecendo o desenvolvimento e a manutençªo de um solo fØrtil ou estÆ causando a acidificaçªo progressiva do perfil do solo e a perda da fertilidade? A reduçªo no pH do solo estÆ associada com a perda da alcalinidade ou da capacidade de neutralizaçªo de Æcidos, perda das reservas de nutrien- tes minerais e menor capacidade de troca de cÆtions e, conseqüentemente, com menor habilidade em reter cÆtions arrastados pela lixiviaçªo. Num sistema solo-planta ideal, teores alto ou ótimo de nutrientes seriam mantidos em todas as profundidades na zona radicular, e o pH em valores nos quais seriam evitados problemas de pH baixo (toxidez de Al, Mn e H + ) ou de pH alto (deficiŒncia de Zn, Cu, B, Fe e P e toxidez de bicarbonato). Em geral, esses problemas sªo evita- dos com pH Ca (pH em uma proporçªo de 1:5 de solo:soluçªo 0,01 M CaCl 2 ) 1 na faixa de 5,0 a 7,0. AlØm disso, se o nível de fertilidade Ø baixo, o sistema ideal deve ter a capacidade de acumular nutrientes que sªo adicionados por fertilizantes ou chuvas ou que sªo mobilizados por intemperismo Æcido dos minerais do solo. Esses nutrientes podem ser armazenados no pool de nutrientes que participam do ciclo biológico (matØria orgânica, íons trocÆveis, minerais fracamente solœveis). A absorçªo de nutrientes pelas plantas serve para contra- balançar a lixiviaçªo de nutrientes abaixo da zona radicular. Os sistemas vegetais usam, portanto, a energia acu- mulada atravØs da fotossíntese para contrabalançar a lixiviaçªo de nutrientes e para criar um pool de nutrientes retidos na matØria orgânica do solo. A mesma energia, porØm, comanda os ciclos do C e do N orgânicos, que podem ser a fonte da adiçªo líquida de H + ao solo se alguns compostos, especialmente nitratos e ânions orgânicos, sªo perdidos nas ciclagens. Nos œltimos 20 anos vem sendo desenvolvida uma melhor compreensªo sobre as fontes do balanço positivo de H + aos solos atravØs dos ciclos bioló- gicos do C e do N e do Æcido carbônico formado quando CO 2(g) reage com Ægua, conforme as reaçıes CO 2 + H 2 O Û H 2 CO 3 Û H + + HCO 3 - (HELYAR e PORTER, 1989; VERBURG et al., 2003). O balanço de H + Ø zero em ciclos fechados, mas a acumulaçªo, a de- pleçªo ou o transporte para dentro ou para fora de um sistema das formas do elemento participante do ciclo atravØs de reaçıes que con- somem ou produzem H + levam ao balanço positivo ou negativo de H + . Os saldos positivos de H + resultantes dos ciclos do C, do N e do Æcido carbônico-CO 2(g) nªo se acumulam significa- tivamente no solo (VLAMIS, 1953), porque o H + Ø consumido em reaçıes de dissoluçªo de minerais ou Ø adsorvido na forma covalente em sítios CTC dependentes do pH na matØria orgânica, minerais de argila ou óxidos de ferro, alumínio e manganŒs. Esses processos de acidificaçªo (intemperismo Æcido) liberam cÆtions e ânions nutrientes para a soluçªo. Um sistema eficiente incorpora os íons liberados no ciclo biológico, mas em um sistema ineficiente, os íons podem ser perdidos por lixiviaçªo, deste modo diminuindo a fertilidade do solo. A relaçªo desses processos de ciclagem com o desen- volvimento de solos fØrteis e infØrteis Ø tratada com mais detalhes por Helyar (2001). A compreensªo quantitativa dos ciclos orgânicos do C e do N, do ciclo do Æcido carbônico e dos processos de trans- porte associados a estes ciclos (como, por exemplo, a lixi- MANEJO DA ACIDEZ DO SOLO A CURTO E A LONGO PRAZOS 1 INFORMA˙ÕES AGRONÔMICAS N” 104 DEZEMBRO/2003 ENCARTE TÉCNICO O balanço positivo de H + nos ecossistemas agrícola e florestal origina-se do Æcido carbônico em pH > 6,0 e de Æcidos produzidos pelos ciclos de C e N a qualquer pH de solo. 1 Esta medida de pH dÆ resultado quase idŒntico ao utilizado no Brasil, de 2,5 solo:1 soluçªo CaCl 2 0,01M.

Transcript of Enc94 - ipni.netFILE/Encarte-104.pdf · Title: Enc94 Author: EVANDRO Subject: Enc94 Created Date:...

Page 1: Enc94 - ipni.netFILE/Encarte-104.pdf · Title: Enc94 Author: EVANDRO Subject: Enc94 Created Date: 191040114115203

ENCARTE DO INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 104 � DEZEMBRO/2003 1

Keith Helyar2

1 Palestra apresentada no 4o Simpósio sobre Rotação Soja/Milho no Plantio Direto, em Piracicaba-SP, julho/2003.2 Wagga Wagga Agricultural Institute, NSW Agriculture, PMB, Wagga Wagga, NSW, 2650, Austrália. Telefone: 61-2-6938-1854, e-mail:

[email protected]

INTRODUÇÃO

Oobjetivo a curto prazo do manejo da acidezdo solo é lidar com o pH da superfície do solode modo a interromper a acumulação de

quantidades de Al, Mn e H+ capazes de causar significativasperdas econômicas na produção de plantas ou de animais. Alongo prazo, o assunto é mais amplo. É preciso responder: osistema de manejo está favorecendo o desenvolvimento e amanutenção de um solo fértil ou estácausando a acidificação progressiva doperfil do solo e a perda da fertilidade?

A redução no pH do solo estáassociada com a perda da alcalinidadeou da capacidade de neutralização deácidos, perda das reservas de nutrien-tes minerais e menor capacidade detroca de cátions e, conseqüentemente,com menor habilidade em reter cátionsarrastados pela lixiviação. Num sistema solo-planta ideal,teores alto ou ótimo de nutrientes seriam mantidos em todasas profundidades na zona radicular, e o pH em valores nosquais seriam evitados problemas de pH baixo (toxidez de Al,Mn e H+) ou de pH alto (deficiência de Zn, Cu, B, Fe e P etoxidez de bicarbonato). Em geral, esses problemas são evita-dos com pH

Ca (pH em uma proporção de 1:5 de solo:solução

0,01 M CaCl2)1 na faixa de 5,0 a 7,0. Além disso, se o nível de

fertilidade é baixo, o sistema ideal deve ter a capacidade deacumular nutrientes que são adicionados por fertilizantes ouchuvas ou que são mobilizados por intemperismo ácido dosminerais do solo. Esses nutrientes podem ser armazenadosno pool de nutrientes que participam do ciclo biológico (matériaorgânica, íons trocáveis, minerais fracamente solúveis). Aabsorção de nutrientes pelas plantas serve para contra-balançar a lixiviação de nutrientes abaixo da zona radicular.

Os sistemas vegetais usam, portanto, a energia acu-mulada através da fotossíntese para contrabalançar a lixiviaçãode nutrientes e para criar um pool de nutrientes retidos namatéria orgânica do solo. A mesma energia, porém, comandaos ciclos do C e do N orgânicos, que podem ser a fonte daadição líquida de H+ ao solo se alguns compostos, especialmentenitratos e ânions orgânicos, são perdidos nas ciclagens.

Nos últimos 20 anos vem sendo desenvolvida umamelhor compreensão sobre as fontes do balanço positivo de

H+ aos solos através dos ciclos bioló-gicos do C e do N e do ácido carbônicoformado quando CO

2(g) reage com

água, conforme as reações CO2 + H

2O

Û H2CO

3 Û H+ + HCO

3- (HELYAR

e PORTER, 1989; VERBURG et al.,2003). O balanço de H+ é zero em ciclosfechados, mas a acumulação, a de-pleção ou o transporte para dentro oupara fora de um sistema das formas

do elemento participante do ciclo através de reações que con-somem ou produzem H+ levam ao balanço positivo ou negativode H+. Os saldos positivos de H+ resultantes dos ciclos do C,do N e do ácido carbônico-CO

2(g) não se acumulam significa-

tivamente no solo (VLAMIS, 1953), porque o H+ é consumidoem reações de dissolução de minerais ou é adsorvido na formacovalente em sítios CTC dependentes do pH na matériaorgânica, minerais de argila ou óxidos de ferro, alumínio emanganês. Esses processos de acidificação (intemperismoácido) liberam cátions e ânions nutrientes para a solução.Um sistema eficiente incorpora os íons liberados no ciclobiológico, mas em um sistema ineficiente, os íons podem serperdidos por lixiviação, deste modo diminuindo a fertilidadedo solo. A relação desses processos de ciclagem com o desen-volvimento de solos férteis e inférteis é tratada com maisdetalhes por Helyar (2001).

A compreensão quantitativa dos ciclos orgânicos do Ce do N, do ciclo do ácido carbônico e dos processos de trans-porte associados a estes ciclos (como, por exemplo, a lixi-

MANEJO DA ACIDEZ DO SOLOA CURTO E A LONGO PRAZOS1

INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 104 � DEZEMBRO/2003

ENCARTE TÉCNICO

O balanço positivo de H+ nos

ecossistemas agrícola e florestalorigina-se do ácido carbônico em

pH > 6,0 e de ácidos produzidospelos ciclos de C e N a qualquer

pH de solo.

1 Esta medida de pH dá resultado quase idêntico ao utilizado noBrasil, de 2,5 solo:1 solução CaCl

2 0,01M.

Page 2: Enc94 - ipni.netFILE/Encarte-104.pdf · Title: Enc94 Author: EVANDRO Subject: Enc94 Created Date: 191040114115203

ENCARTE DO INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 104 � DEZEMBRO/2003 2

viação, a absorção e o transporte pelas plantas dos nutrientesaté a superfície do solo) está agora em um estádio que permitesimular o efeito das taxas de adição de ácido e de álcali nafertilidade do solo ao longo do seu perfil. O presente trabalhodescreve os processos-chave e examina os efeitos de dife-rentes manejos de solo e de sistemas de produção agrícolas eflorestais sobre o pH e a fertilidade do solo.

PRINCIPAIS FONTES DE ÁCIDO E REAÇÕESDE INTEMPERISMO RESPONSÁVEIS PORCONSUMIR H+

1. Fontes de H+

As fontes de ácido já foram discutidas em detalhes empublicações anteriores (HELYAR e PORTER, 1989; VER-BURG et al., 2003). Em resumo, a mineralização e a nitrifi-cação de N da matéria orgânica (e também dos fertilizantesnitrogenados amoniacais) resultam na produção de ácido nítricono ciclo do N (Figura 1) e a produção de ácidos orgânicos emplantas e em microrganismos (como, por exemplo, no ciclo doácido tricarboxílico durante o metabolismo dos carboidratos) éa principal fonte de H+ no ciclo do C orgânico. Também ocorremprocessos alcalinos nesses ciclos (como a redução de nitratosem plantas, a oxidação microbiana de ânions orgânicos emsolos ou a oxidação de ânions orgânicos pela queima dematéria orgânica), de tal modo que os ciclos fechados sãoneutros com relação à adição de H+. Já a adição líquidade ácido pode ocorrer se os produtos das reações ácidas foremremovidos (ou acumulados) antes que ocorram as reaçõesde balanceamento alcalinas. As principais reações, que nãoas de simples dissociação-associação, são dadas a seguir:

CICLO DO NITROGÊNIO

Amonificação

R-NH2 + H+ ® NH4

+ + R (1)

Nitrificação

NH4+ + 2O2 ® NO3

- + H2O + 2H+ (2)

Amonificação + Nitrificação

R-NH2 ® NO3- + H2O + R + H+ (3)

Redução do nitrato a proteína e desnitrificação

� Redução de nitrato (plantas e microrganismos)

NO3- + R(COOH) + 4H

2 ® NH

30 + 3H

2O + RCOO- (4)

� Desnitrificação

+ 4H2

+ H2

2NO3

- + 2H+ N2O N

2(5)

- 5H2O - H

2O

CICLO DO CARBONO

Síntese de ácidos orgânicos (ciclo de ácido tricar-boxílico):

(CH2O)

n + ¾ O

2 ® (CH

2O)

n-1 COOH + ½ H

2O (6)

Oxidação de ânions orgânicos:

CH3(CH2)(x-2)COO- + K+ + (1½ x - 1)O2 ® K+ + OH- +

xCO2(g) + (x - 1)H2O (7)

sendo x o número de átomos de carbono na molécula do ânionorgânico.

Figura 1. Representação dos processos de acidificação do solo. Os processos assinalados como �permanente� significam que a acidificação poreles causada é permanente.

lixiviação de N-NO3-

(permanente)

nitrificação produzN-NO3

- mineralização da M.O.produz N-NH4

+

remoção doproduto

(permanente)

leguminosas e trevofixam N

erosão da superfície dosolo contendo M.O.

(permanente)

adubonitrogenadoamoniacal

adubonitrogenadoacidificante

(permanente)

amônio é oxidadoa N-NO3

-

plantas absorvem N-NO3-

N = nitrogênioN-NO3

- = N-nitratoN-NH4

+ = N-amônioM.O. = matéria orgânica

Page 3: Enc94 - ipni.netFILE/Encarte-104.pdf · Title: Enc94 Author: EVANDRO Subject: Enc94 Created Date: 191040114115203

ENCARTE DO INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 104 � DEZEMBRO/2003 3

é dissociado significativamente. O aumento de ácido carbô-nico ocorre pela reação da água com o CO2(g) proveniente doar do solo em resposta à redução das concentrações de bicar-bonato e carbonato da solução do solo causada pela lixiviaçãocom água contendo baixo teor de carbonatos (como, porexemplo, a água de chuva em equilíbrio com CO2(g) atmosfé-rico e com pH normalmente próximo de 6,0). As reaçõesrelevantes são:

CO2(g ar do solo)

+ H2O Û H

2CO

3(9)

H2CO

3 Û

HCO

3- + H+

HCO3- Û CO3

2- + H+ (10)

O equilíbrio entre essas reações depende do pH dosolo e da pressão parcial do CO

2(g) no ar do solo. Além disso,

a última varia bastante, desde CO2(g)

atmosférico até mais de 100 vezes apressão atmosférica parcial, dependen-do principalmente da intensidade darespiração microbiana mais a respiraçãoradicular no solo. A remoção de íonsbicarbonato e carbonato por eluvianterelativamente diluído resulta em adiçãolíquida de H+ ao solo proporcionalmente

à remoção líquida de íons carbonato. A quantidade de H+

adicionada devido à eluviação, de acordo com a variação depH do solo, é mostrada na Figura 2.

Observe que acima de pHCa

7,4 não há adição de H+.Isto ocorre porque acima desse pH presume-se que CaCO

3

esteja presente, de tal modo que em pHCa

> 7,4 as reações 11e 12 mostradas abaixo se equilibram umas às outras. A elu-viação estimula tanto a dissolução de CaCO

3 como a reação

do CO2(g)

com a água. O álcali proveniente da dissolução deCaCO

3 e da hidratação do íon carbonato equilibra o ácido

gerado pela dissociação de ácido carbônico. Assim, o equilíbrioentre CO

2(g) do ar do solo e CaCO

3 da fase sólida mantém o

pH constante.

CaCO3 Û CO32- + Ca2+ (11)

CO32- + H2O

Û HCO3- + OH-

CO2(g)

+ H2O Û

HCO

3- + H+ (12)

2. Reações de intemperismo ácido

O H+ de qualquer fonte não se acumula significativa-mente no solo. O H+ adsorvido nas argilas como íon trocávelas altera pela dissolução em espaços de tempo muito curtos(de segundos a minutos) em argilas Al (VLAMIS, 1953).Assim, o H+ não se acumula no solo em uma quantidadesignificativa. O H+ reage com os minerais do solo ou éadsorvido na forma covalente em sítios de troca de cátionsdependentes do pH na matéria orgânica do solo, minerais deargila ou óxidos de alumínio, ferro e manganês. Abaixo sãomostradas reações que ocorrem normalmente.

Dissociação/associação de ácidos orgânicos:

(CH2O)

n COOH Û (CH

2O)

n COO- + H+ (8)

Esses processos são quantitativamente relacionadoscom a quantidade de C e de N ciclados biologicamente. Assim,em geral, sua importância como fontes de ácido varia com opH do solo similarmente ao efeito do pH do solo sobre a taxade crescimento da planta. Esta generalização, no entanto, nãoé verdadeira para valores muito baixos de pH onde a taxa denitrificação (ciclo do N) cai muito mais rapidamente que a dedesenvolvimento das plantas (ciclo do C), embora os organis-mos responsáveis pela nitrificação (BRAMLEY e WHITE,1989) e as plantas variem na tolerância a solos ácidos. Alémdisso, em sistemas agrícolas, as taxas de adição de H+ sãoaltas quando os ânions dos ácidos adicionados são removidosdo sistema (como, por exemplo, por lixiviação de nitrato ouremoção de ânions orgânicos em pro-dutos) ou acumulados no sistema (porexemplo, aumentos na matéria orgânicado solo em pastagens produtivas ouaumentos na biomassa de uma floresta).As taxas normais de adição de ácidoatravés dos ciclos do C e do N estãoem torno de 2 a 5 kmol de H+ ha-1 ano-1

(equivalentes a 100 a 250 kg de CaCO3

ha-1 ano-1). Em casos extremos, com alto uso de fertilizantesnitrogenados, as taxas de adição de ácido podem atingir20 kmol de H+ ha-1 ano-1 ou o equivalente a 1.000 kg deCaCO3 ha-1 ano-1 (HELYAR e PORTER, 1989; HELYAR etal., 1990). Convém notar que a acidificação dos solospelos fertilizantes nitrogenados está relacionada com aproporção do N aplicado que é perdido por lixiviaçãoapós a nitrificação (Tabela 1). Assim, os valores dosíndices de acidez devem ser revistos para adequá-losaos conhecimentos modernos dos processos de acidifi-cação do solo.

A adição líquida de ácido carbônico ao solo pode sersignificativa entre o pH no qual CaCO3 está saturado (próximode pHCa 7,4) e pHCa 5,5, abaixo do qual o ácido carbônico não

Adição líquida de H+

proveniente de CO2(g)

com pHCa

entre 5,5 e 7,4}

As reações se equilibramacima de pH

Ca 7,4}

Fertilizantes

Tabela 1. Índice de acidez de alguns fertilizantes e da FBN emfunção da lixiviação do N-NO3

-.

kg CaCO3/kg N

lixiviação de N-NO3 (%)

0 100

Sulfato de amônio 3,4 7,6

Fixação biológica de N 0 3,4

NH3(g)

, Aqua amônia 0 3,4

Nitrato de amônio 0 3,4

Uréia 0 3,4

Nitratos de Na, Ca e K - 3,4 0

DAP 1,7 5,9

MAP 3,4 7,6

As diferentes reações ácidas deintemperismo consomem H+ em

diferentes valores de pHdependendo da solubilidade dosminerais presente nestes pHs.

Page 4: Enc94 - ipni.netFILE/Encarte-104.pdf · Title: Enc94 Author: EVANDRO Subject: Enc94 Created Date: 191040114115203

ENCARTE DO INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 104 � DEZEMBRO/2003 4

(1) Exemplos de intemperismo ácido de mineraisdo solo:

· Carbonato de cálcio

CaCO3 + 2H+ Û Ca2+ + CO2(g) + H2O (13)

· Illita

K0,6

Mg0,25

Al2,3

Si3,5

O10

(OH)2 + 8H+ + 2H

2O Û 0,6K+ +

0,25Mg2+ + 2,3Al3+ + 3,5H4SiO40 (14)

· Caulinita

Al2Si

2O

5(OH)

4 + 6H+ Û 2Al3+ + 2H

4SiO

4 + H

2O (15)

· Hidróxido de alumínio

Al(OH)3 + 3H+ Û Al3+ + 3H

2O (16)

(2) Adsorção específica de H+ em sítios de CTCdependentes do pH:

· Matéria orgânica

RCOO-K+(tr) + H+ Û RCOOH + K+

(sol) (17)

· Minerais de argila e arestas dos cristais de óxidos dealumínio, ferro e manganês

(> Fe) (> Fe)

> Al O-K+(tr)

+ H+ Û > Al - OH + K+(sol)

(> Mn) (> Mn) (18)

Outras reações de intemperis-mo, além daquelas dos minerais deargilas e carbonatos, também ocorremem solos nos quais esses minerais es-tão presentes. Elas podem ser impor-tantes para tamponar o pH do solo emvalores abaixo do pH no qual os car-bonatos se dissolvem e acima do pHno qual as argilas de aluminossilicatossecundárias se dissolvem. Exemplosde minerais que são mais facilmenteintemperizados do que os minerais deargilas secundárias são:

� a hornblenda:[Ca3Na2(Mg,Fe)8(Al,Fe)4 Si14O44

(OH)4],

� a augita:[CaO.2(Mg,Fe)O(Al, Fe)2 O3. 3SiO2]e

� a olivina:(2FeO.SiO2; 2MgO.SiO2).

Esses e outros minerais maisbásicos ocorrem em maiores concen-trações em materiais parentais bási-cos do que em ácidos (FITZPATRICK,

1980) e são mais solúveis do que os minerais de argilassecundárias (LINDSAY, 1979; BARMAN et al., 1992).

INTERAÇÕES ENTRE pH, TAXAS DEADIÇÃO DE H+, LIXIVIAÇÃO E REAÇÕESDE INTEMPERIZAÇÃO ÁCIDA

As interações entre lixiviação, taxas de adição de H+,consumo de H+ nas reações de intemperização ácida e pHatual do solo determinam o modo como o pH do solo e acomposição do solo mudam ao longo do tempo.

1. O poder tampão do pH

A soma de todas as reações com ganho de H+ resultanuma curva tampão normal, com assíntotas nos extremos maisbaixos e mais altos e uma inclinação aproximadamente linearentre as assíntotas, que descreve o tamponamento caracterís-tico do solo quanto ao pH (MAGDOFF e BARTLETT, 1985).Esta curva pode ser definida no laboratório. As reaçõesenvolvidas no estabelecimento da curva (Equações 13 a 18)são razoavelmente bem compreendidas (CONYERS et al.,2000). A curva geralmente tem uma assíntota em pH baixo,entre 3,5 e 4,0, no qual os minerais de alumínio tamponamfortemente o pH do solo (Equações 14 a 16). A assíntota empH alto ocorre em pH

Ca 7,4, no qual o carbonato de cálcio

Figura 2. Efeitos do pH e da lixiviação sobre a adição de ácido carbônico em diferentes pressõesparciais de CO

2(g) no ar do solo (� - � = 1 x, = 5 x, = 10 x e = 25 x a pressão

atmosférica CO2(g)

de 0,0003 atm) e sobre as taxas de remoção de íons Al + H+ (��) dascamadas do solo comparadas com as taxas de adição de H+ proveniente dos ciclos do Corgânico e do N orgânico (- - - -) para um sistema de cultura/pasto com 550 mm dechuva.

Page 5: Enc94 - ipni.netFILE/Encarte-104.pdf · Title: Enc94 Author: EVANDRO Subject: Enc94 Created Date: 191040114115203

ENCARTE DO INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 104 � DEZEMBRO/2003 5

tampona o pH fortemente (Equações 11 e 12). Na faixa depH entre 3,5 e 7,4 também ocorre a reação de H+ com sítiospH dependentes da CTC (Equações 17 e 18).

A CTC varia quase linearmente para um dado solocom a mudança de pH. A tendência linear reflete a dissociaçãoe a associação de muitos grupos de ácidos fracos na matériaorgânica e nos minerais com valores de pK (o pH no qualmetade do H está dissociada e metade permanece ligada deforma covalente) distribuídos ao longo de toda a variação depH. As irregularidades na tendência linear têm probabilidadede representar a dominância de um grupo específico de ácidosfracos naquele pH, ou a ausência de grupos de ácidos fracoscom valores de pK no pH no qual alinearidade é perturbada. A taxa realde mudança da CTC com o pH (a incli-nação da relação linear) varia entresolos de acordo com a densidade ou aconcentração dos sítios de carga de-pendentes do pH no solo. As principaisvariáveis com respeito a isso são a ma-téria orgânica do solo, as concentraçõesde argila e de óxidos de alumínio e ferrono solo e, conseqüentemente, o númerode sítios nos quais as Equações 17 e18, respectivamente, operam.

A curva tampão de pH é umaexpressão estática do modo como as reações com H+ variamatravés da escala de pH. O modo como duas reações quecontrolam as assíntotas do pH da curva tampão interagemcom a lixiviação em diferentes valores de pH do solo émostrado na Figura 2. As reações são a dissolução de mineraisde aluminossilicato e óxidos de alumínio (Equações 14 a 16)e a reação de CO2(g) com água para produzir ácido carbônicoe seus produtos de dissociação (Equações 9 e 10). Os dadossão para os 10 cm superficiais de um solo do tipo Kandosol(ISBELL, 1996; Alfisol na taxonomia norte-americana) emWagga Wagga (Austrália), onde a precipitação pluviométricaanual é de 550 mm, em média, dos quais 210 mm descemabaixo da camada de 10 cm de profundidade a cada ano.

O modelo utilizado para produzir as curvas (HELYAR,2002) é aplicado a um sistema de pastagem dominado pelagramínea perene Phalaris aquatica, o trevo subterrâneo(Trifolium subterraneum) e o azevém anual (Lolium rigidum).São mostradas estimativas do total de Al3+ e H+ removidosda camada do solo pelo eluviante que passa à camada de10 cm e o total transportado de OH-, HCO

3- e CO

32-. Esses

cálculos levam em consideração o volume de lixiviado, asolubilidade de vários minerais e o nível de equilíbrio mantidoentre as superfícies dos minerais e a solução eluviante. Afaixa de pH (3,5 a 7,5) engloba o pH da maioria dos solosusados para a agricultura e a silvicultura. Acima de pH

Ca de

cerca de 7,4, o CaCO3 interage com adições de H+ e OH-

(Equações 11 e 12) para tamponar o pH entre 7,4 e 8,2, depen-dendo da força iônica da solução, da concentração de Ca2+

na solução e da concentração de CO2(g)

no ar do solo.

As taxas de adição líquida de ácido proveniente dosciclos do C e do N neste sistema agrícola têm valor médio de3 kmol H+ ha-1 ano-1 (Figura 2). Antes de discutir os processosde lixiviação e de adição de ácido é preciso considerar ainteração entre a dissolução de minerais e a solução lixiviada.

2. Reestabelecimento do equilíbrio químico du-rante e entre fluxos de lixiviação

O efeito da lixiviação sobre o intemperismo é afetadose as concentrações de equilíbrio dos íons são mantidas ounão na solução do solo durante a lixiviação. O modelo utilizaum fator de diluição que leva em consideração a proporção

do volume total de solução do solo quenão restabelece completamente o equi-líbrio com os minerais do solo e com oCO2(g) do ar do solo, entre as alíquotasseqüenciais de lixiviação. A taxa de dis-solução de diferentes minerais duranteo restabelecimento de uma soluçãosaturada próximo da superfície do mi-neral depende de fatores tais como:taxa de difusão de íons para fora dasuperfície do mineral, propriedades deadsorção dos íons envolvidos e quan-tidade de mineral, sua área de super-fície e a uniformidade de distribuiçãodo mineral no solo. O tempo necessário

para atingir o equilíbrio em um solo úmido é provavelmentede dias, mais do que de segundos ou de minutos (como ocorrepara H+), mas não de semanas ou de meses (BARMAN etal., 1992; GRINSVEN et al., 1992).

O tamponamento da concentração de cátions na soluçãoatravés da troca de cátions é muito rápido, de tal modo que asconcentrações de equilíbrio serão aproximadas, mas nãoalcançadas, em um período de tempo muito curto. Esta taxade equilíbrio provavelmente é muito lenta para manter oequilíbrio entre a maior parte da solução do solo e as superfíciesdo mineral durante a lixiviação e, portanto, para um dado fluxode lixiviação, a concentração dos íons removidos será maiorna primeira alíquota de solução do solo deslocada do que emalíquotas subseqüentes. No entanto, se decorrerem algunsdias antes que ocorra o próximo fluxo de lixiviação, a soluçãodo solo provavelmente terá restabelecido o equilíbrio com assuperfícies do mineral (desde que haja uma distribuiçãorazoavelmente homogênea dos minerais no solo), maximizandodeste modo o efeito da lixiviação sobre a taxa de intemperismono início do próximo fluxo de lixiviação. Portanto, em áreascom altas precipitações pluviométricas o fator de diluição épara ser menor do que nos locais onde os fluxos de lixiviaçãosão menores e separados por longos períodos sem lixiviação.

Os dados na Figura 2 são para taxa média de 210 mmde lixiviado por ano em 10 cm, com pressão parcial de CO

2(g)

a 5, 10 e 25x as pressões atmosféricas parciais (0,0003 atm),e presumindo-se que, na média, os produtos dos íons para osvários equilíbrios na solução lixiviada foram mantidos na

As quantidades de H+ adicionadasaos ecossistemas variam

principalmente com a taxa delixiviação e o pH do solo (ácidocarbônico), com a exportação ouacumulação de ânions orgânicos(ácidos do ciclo do C orgânico) e

com a quantidade de nitratoperdida por lixiviação e por erosão

superficial.

Page 6: Enc94 - ipni.netFILE/Encarte-104.pdf · Title: Enc94 Author: EVANDRO Subject: Enc94 Created Date: 191040114115203

ENCARTE DO INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 104 � DEZEMBRO/2003 6

metade das concentrações saturadas (isto é, um fator dediluição de 0,5). O fator de diluição de 0,5 pode ser muitopequeno para os cátions trocáveis e o valor para o equilíbriode CO2(g) precisa de mais pesquisas. A pressão parcial doCO2(g) do ar do solo aumenta com a profundidade, inversa-mente ao que ocorre com a pressão parcial de O2(g), quediminui (GLINSKI e STEPNIEWSKI, 1984), de tal modoque é normalmente máxima na base da zona radicular. Aspressões parciais de CO2(g) de 100 vezes o CO2(g) atmosférico(0,03 atm) foram estabelecidas para o nível inferior da zonaradicular no modelo aqui mostrado. Um gradiente com aprofundidade foi sobreposto à pressão parcial de CO2(g)

máxima que reduziu a concentração a valores relativos de0,02, 0,25, 0,8 e 1,0 a 1, 15, 50 e > 70 cm de profundidade,respectivamente.

3. Lixiviação em pHCa

> 6,0

Entre pHCa

6,0 e 7,4 as taxas de adição de ácidoproveniente dos ciclos do C e do N sãoda mesma ordem da taxa de adição doácido carbônico ao solo após a lixiviaçãopor 210 mm de eluviante pobre em íonscarbonato (como, por exemplo, a águade chuva). Neste caso, a perda líquidade íons carbonato e de íons hidroxila éigual ao H+ adicionado à medida que asolução do solo se reequilibra com oCO

2(g) do ar do solo (Equações 9 e 10).

Assim, neste intervalo de pH, as taxastotais de adição de ácido podem ser altasporque a adição de H+ proveniente dociclo do ácido carbônico se acrescentaao H+ obtido a partir dos ciclos do C e do N orgânicos.

Observe que a taxa de adição do ácido carbônico éaltamente afetada pela concentração de CO2(g) no ar do soloe, conseqüentemente, com a respiração microbiana e radicu-lar do solo. Uma segunda característica a ser observada éque, embora a perda de OH-, HCO3

- e CO32- da camada

superficial deixe esta camada mais ácida, a adição dessesíons à camada abaixo representa um acréscimo alcalino.Portanto, a concentração de CO2(g) no ar do solo tambémdetermina a taxa na qual o álcali é transportado no lixiviadopara a camada de solo imediatamente abaixo. Conseqüen-temente, esses íons são importantes contribuintes nesteintervalo de pH para melhorar a acidez subsuperficial dossolos. Assim, fica claro que o pH e o CO2(g) afetam as taxasde transporte dos efeitos de álcali e de ácido para as camadasinferiores.

A mensagem prática é que a manutenção do pHem valor igual ou acima de 6,0 e a manutenção de umalto nível de atividade biológica na superfície do solosão necessárias para melhorar, aos poucos, os subsolosácidos (isto é, alcançar o transporte de álcali para ascamadas inferiores de cerca de 2 a 3 kmol OH- ha-1 ano-1,equivalente a 100-150 kg CaCO3 ha-1 ano-1). Isto envolveo uso de calcário, ou de corretivos equivalentes, para neutralizar

as adições de ácido à superfície do solo provenientes dos ciclosdo C e do N e do ácido carbônico, além da manutenção deatividade biológica alta o suficiente para sustentar as taxas delixiviação de OH-, HCO3

- e CO32- para neutralizar os solos

ácidos em subsuperfície e qualquer adição líquida de ácido nascamadas mais inferiores do perfil do solo.

4. Lixiviação em pHCa < 5,0

O resultado da dissolução de aluminossilicatos ou deóxidos de alumínio é alcalino e não ácido, porque é consumidoH+ no processo de dissolução (Equações 14 a 16). Então, sea dissolução for estimulada somente pela lixiviação dos íonsdissolvidos na superfície dos minerais, o pH subiria paravalores próximos de pH

Ca 5,0 a 6,0, com baixas taxas de

intemperismo de minerais de alumínio. Já com adição líquidade H+ proveniente dos ciclos do C e do N orgânicos, o sistemase equilibrará em valores de pH

Ca abaixo de 5,0, onde a taxa

de lixiviação dos íons Al mais H+ é igual à taxa de adição deH+

proveniente dos ciclos do C e do N.

Em muitos casos, as taxas líqui-das de adição de ácido proveniente dosciclos do C e do N (2 a 5 kmol ha-1

ano-1, Figura 2) são semelhantes àstaxas de perda dos íons Al mais H+ emvalores de pH próximos de 4,0 e 4,25(isto é, o efeito alcalino do intempe-rismo dos minerais de alumínio é igualà taxa de adição de H+, como mostradona intersecção das curvas na Figura 2).Portanto, a dissolução de minerais dealumínio tampona as taxas normais deadição de ácido proveniente dos ciclos

do C e do N neste intervalo de pH. Os dados obtidos atravésde um experimento de longa duração com rotação de culturasno solo do tipo Kandosol utilizado na Figura 3 propiciam umbom exemplo de tal processo de equilíbrio.

Neste experimento, os diferentes tratamentos de rota-ção foram caracterizados por diferentes taxas de adição deácido. Estas diferentes taxas resultaram de diferentes produ-tividades das plantas, diferentes condições de teores de N nosolo e de fornecimento de N (fixação de N por leguminosasou fertilizante nitrogenado) e diferentes proporções entre cul-turas ou pastagens leguminosas e culturas não-leguminosas.As taxas de acidificação semelhantes em todos os tratamentosao longo dos 10 primeiros anos parecem ter ocorrido devidoao efeito dominante da adição de ácido proveniente do ciclodo N orgânico. O local inicialmente apresentava alto teor deN (0,15%), com uma história anterior de 17 anos de pasta-gem de trevo subterrâneo consorciado com gramínea anual(HEENAN et al., 1994).

A mensagem prática é que espécies tolerantespodem ser usadas para obter produtividades próximasdos limites do potencial de produtividade impostos porfatores não manejáveis como clima e profundidade dosolo. Porém, a lixiviação líquida de íons Al e H+ emprofundidade no perfil do solo leva à adição líquida de

O manejo do pH do perfil do soloenvolve o gerenciamento das

interações entre as taxas de adiçãode H+, as reações de

intemperismo, pH do solo e osprocessos de transporte (lixiviação,erosão laminar, absorção e excreção

de nutrientes pelas plantas emdiferentes profundidades).

Page 7: Enc94 - ipni.netFILE/Encarte-104.pdf · Title: Enc94 Author: EVANDRO Subject: Enc94 Created Date: 191040114115203

ENCARTE DO INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 104 � DEZEMBRO/2003 7

ácido às camadas mais profundas do solo se elas esta-vam inicialmente em um pH mais alto do que o da super-fície do solo (reverso das Equações 14 a 16). Portanto, autilização da combinação de tolerância da planta ao Alda solução, para manter a produção da planta, e a dis-solução de aluminossilicatos e óxidos de alumínio, paramanter o pH do solo, resulta em acidificação do subsoloa longo prazo.

Um atributo positivo da tolerância ao Al é que elapermite grandes e rentáveis taxas de crescimento da plantaem perfis de solo com camadas altamente ácidas em sub-superfície durante o período necessário para o transportelíquido de OH-, HCO3

- e CO32- provenientes das camadas

superficiais que receberam calagem para neutralizar a acidezem subsuperfície e no subsolo. Para sistemas de produçãonos quais o custo da calagem proíbe seu uso, devem ser feitostodos os esforços para reduzir a adição líquida de ácido pro-veniente dos ciclos do C e do N orgânicos, de tal modo que ataxa de transporte de ácido ao longo do perfil seja minimizada.

5. Lixiviação entre pHCa 5,0 e 6,0

As taxas de lixiviação de íons Al e H+ e de íons OH-,HCO

3- e CO

32- são muito baixas neste intervalo de pH

Ca entre

5,0 e 6,0 (Figura 2); portanto, tanto a dissolução de alumi-nossilicatos e de óxidos de alumínio como a adição de ácidocarbônico são pequenas. É um intervalo de pH caracterizadopor uma baixa taxa de intemperismo. Nestes valores de pHas concentrações de Al em solução não afetam o crescimentodas plantas, mesmo as altamente sensíveis à toxidez de alu-mínio. O intemperismo ou a dissolução de aluminossilicatos ede óxidos de alumínio neste intervalo de pH

Ca são conduzidos

por adições líquidas de H+ através da ciclagem biológica deC e de N; portanto, a dissolução líquida desses minerais podeser praticamente interrompida pela aplicação de calagemsuficiente para reduzir as adições líquidas de H+ a zero.

A mensagem prática éque deve ser aplicada calagemsuficiente para neutralizar aadição de ácido à zona radicularproveniente dos ciclos do C edo N, de tal modo que o pH doperfil do solo permaneça entre5,0 e 6,0. Este intervalo de pHé ótimo tanto para permitir ocultivo de uma ampla gama deespécies de plantas quanto paraminimizar a intemperização lí-quida dos minerais do solo.

6. pH e adição de ácidosatravés da ciclagem biológicado C e do N

Os ecossistemas natu-rais são caracterizados pelo usoeficiente do N, com restrita lixi-

viação de nitrato e mínima adição líquida de ácido nociclo do N orgânico (supondo que o N seja adicionadoaos sistemas naturais pela fixação biológica de N2(g)).Os sistemas naturais são também caracterizados pelaremoção limitada de matéria orgânica contendo ânionsorgânicos, de modo que a adição de ácido relacionadacom ela é mínima. Portanto, em sistemas naturais, a principalfonte de adição de ácido proveniente da ciclagem orgânicade C e de N está relacionada com a acumulação de ânionsorgânicos na biomassa, na matéria orgânica do solo e naserapilheira. Uma vez que esses pools tenham atingido o pontode equilíbrio (steady-state) em um dado ecossistema, a adiçãode ácido proveniente da ciclagem orgânica do C e do N ficaentão limitada a valores pequenos, proporcionais à perda deânions orgânicos e de nitrato do sistema. Os sistemas na-turais, portanto, usam ácidos provenientes dos ciclos do C edo N para acumular um pool de nutrientes que são cicladosno sistema biológico (entre a biomassa e a matéria orgânicado solo), minimizando as adições posteriores de ácido. Damaior ou menor capacidade de reciclar nutrientes resultarána formação de subsolo ácido ou alcalino, respectivamente,nos ecossistemas naturais com muito pouca ou nenhumaadição de ácido (Figuras 4 e 5).

Nos ecossistemas agrícolas, porém, ocorrem ta-xas mais elevadas de adição de ácidos provenientesdos ciclos do C e do N orgânicos devido às maiores deperdas de nitrato por lixiviação e por erosão laminar ede remoção de ânions orgânicos em produtos e restosde produtos (Tabela 2). As taxas normais de adição emsistemas agrícolas, como mencionado anteriormente,são de 2 a 5 kmol de H+ ha-1 ano-1, equivalentes a 100 a250 kg de CaCO3 ha-1 ano-1. Em situações extremas, jáchegaram a ser medidas taxas de até 20 kmol ha-1 ano-1,equivalentes a 1.000 kg de CaCO3 ha-1 ano-1, associadas comaltas taxas de fertilizantes nitrogenados, especialmente fer-tilizantes amoniacais (Equação 2) (HELYAR et al., 1990).

Figura 3. pH da camada de 0-10 cm de um solo do tipo Kandosol com quatro tratamentos [� trigocontínuo, cultivo convencional, queima dos restos culturais, fertilizante nitrogenado 0( ) ou 100 kg N ha-1 ano-1 ( ); - - - ( ) trigo/trevo pastejado, cultivo convencional; ( ) trigo/lupinus, cultivo convencional, queima dos restos culturais] (HEENAN et al., 1994).

Page 8: Enc94 - ipni.netFILE/Encarte-104.pdf · Title: Enc94 Author: EVANDRO Subject: Enc94 Created Date: 191040114115203

ENCARTE DO INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 104 � DEZEMBRO/2003 8

A taxa de adição deácido proveniente dos ciclos doC e do N é afetada pelo pHatravés do efeito deste sobreas taxas de nitrificação e sobrea produtividade da planta, ab-sorção de nitrato e quantidadede ânions orgânicos removidanos produtos e restos de pro-dutos. Em geral, tanto as taxasde nitrificação (BRAMLEY eWHITE, 1989) quanto as ta-xas de crescimento da planta(SUMNER, 2001) são restritasà medida que o pH cai abaixode 5,0 e as concentrações deH+, Al e Mn na solução do solotornam-se tóxicas (Figura 6).

Em valores de pHmaiores que 7,5, o crescimentoda planta e os processos mi-crobianos também são fre-qüentemente inibidos (ROB-SON e ABBOTT, 1989). Noentanto, tanto as plantas comoos microrganismos desenvol-veram espécies e cepas quetoleram extremos de acidez ealcalinidade, havendo, portan-to, um amplo intervalo de pH(4,5 a 7,5) no qual podemocorrer altas taxas de cres-cimento de plantas e de pro-cessos microbiológicos, talcomo a nitrificação. Espéciese cepas tolerantes substituemorganismos menos tolerantesà medida que os extremos dointervalo de pH são alcança-dos. Desse modo, uma curva

Figura 5. As florestas de eucalipto seriam responsáveis pela ocorrência geral de solos de camada duplana Austrália com excesso de adição ácida à superfície e excesso de alcalinidade no subsolo?

Tabela 2. Necessidade de calcário para neutralização da acidezcausada pela remoção do produto colhido (SLATTERY etal., 1991).

Necessidade de calcário(kg ton-1 de M.S. de produto)

Milho e trigo 9Soja 20Silagem de milho 40Feno de capim 25Feno de trevo 40Feno de alfafa 70Carne 17

Produto

conceitual, baseada na adição líquida de 3 kmol de H+ ha-1

ano-1 na variação ótima de pH, está incluída na Figura 2 parailustrar o modo como a adição líquida de ácido provenientedos ciclos do C e do N normalmente variam com o pH. Ataxa de 3 kmol de H+ ha-1 ano-1 é equivalente à remoção de2,5, 30 ou 7,5 t ha-1 ano-1, respectivamente de feno de alfafa,grãos de trigo ou grãos de lupinus contendo ânions orgânicosem concentrações de cerca de 1.500, 100 e 400 mmol deânions orgânicos kg-1, respectivamente (PIERRE e BAN-WART, 1973; SLATTERY et al., 1991). Por outro lado, ataxa de adição de ácido de 3 kmol H+ ha-1 ano-1 é equivalenteà perda do sistema por lixiviação de 42 kg de N na forma denitrato ha-1 ano-1.

Figura 4. Efeito do tipo de vegetação no desenvolvimento da acidez no perfil do solo, em ecossistemasnaturais.

Vegetação de Eucalyptuscom baixa capacidade dereciclar nutrientes e álcalis

Pastagens ou árvores comalta capacidade de reciclar

nutrientes e álcalis

Subsolo

LIXIVIAÇÃO

� restaura o balanço

RESULTADO

� Solo solódico, comsuperfície ácida esubsolo muito argiloso

� agrava o problema

Adiçãoalcalinalíquida

Lixiviação

Adiçãoácida

líquida

Adiçãoácida

líquida

Lixiviação

Adiçãoalcalinalíquida

Camadasuperficial

� Solo bem estruturadoe sem camada ácidasuperficial

Page 9: Enc94 - ipni.netFILE/Encarte-104.pdf · Title: Enc94 Author: EVANDRO Subject: Enc94 Created Date: 191040114115203

ENCARTE DO INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 104 � DEZEMBRO/2003 9

MANEJO DO pH DO PERFIL DO SOLO EMSISTEMAS AGRÍCOLAS E FLORESTAIS

Na natureza, as plantas usam energia fornecida pelafixação de C através da fotossíntese para acumular um poolde nutrientes que são ciclados entre as plantas e os micror-ganismos, a matéria orgânica do solo, os nutrientes em formasinorgânicas rapidamente disponíveis (íons em solução ouadsorvidos em formas rapidamente trocáveis na matériaorgânica ou na superfície dos minerais do solo) e os nutrientesem formas minerais que podem se dissolver rápido o suficiente(minerais fracamente solúveis) para participar significativa-mente no ciclo biológico.

Os ácidos produzidos nos ciclos do C e do N, como jáobservado, são usados durante períodos de acumulação debiomassa, matéria orgânica do solo e serapilheira, paramobilizar nutrientes provenientes dos minerais para incorpo-ração no pool de nutrientes envolvidos no ciclo biológico.Portanto, as fontes de ácido adicionais ao ácido carbônicosão usadas parcimoniosamente pela natureza para acumularum pool de nutrientes disponíveis que é proporcional àcapacidade do ecossistema de acumular biomassa e matériaorgânica no solo (controlada principalmente pela disponibili-dade de umidade, temperatura e luz). Uma vez acidificado avalores de pHCa entre 5,0 e 6,0, os acréscimos inevitáveis deácido através da adição de ácido carbônico durante a lixiviaçãosão baixos e os minerais mais instáveis já terão sido perdidospor intemperismo. A intemperização posterior provocada pelalixiviação é lenta, pois os minerais restantes são muito fraca-mente solúveis neste intervalo de pH (Figura 2). Além disso,se ocorrer uma incomum adição de ácido (como, por exemplo,após uma perda excepcional de nitrato por lixiviação), o pHdo solo tenderá a se reverter para o intervalo de pH entre 5,0e 6,0, pois a lixiviação remove os produtos de dissolução dealuminossilicatos e óxidos, fazendo com que as Equações 14a 16 ocorram para a direita, consumindo H+ no processo.

Assim, em ecossistemas naturais, as cama-das de solo com baixas adições de ácidosprovenientes dos ciclos do C e do N e umataxa positiva de lixiviação, apresentam umatendência de que o pH �centralize-se� nointervalo entre 5,0 e 6,0 ao longo do tempo.Isto ocorre porque a lixiviação dos ânionsdo ácido carbônico reduz o pH se este esti-ver acima de 6,0, e a dissolução de mineraisde alumínio, para restabelecer o equilíbrioapós a lixiviação, aumenta o pH se este estáabaixo de 5,0.

Se a taxa de lixiviação for bastantebaixa para que ocorra acumulação líquidade OH-, HCO3

- e CO32- em uma camada, o

pH aumentará devido à remoção dos gases(volatilização de CO2(g) através da ocorrên-cia das Equações 9 e 10 para a esquerda).Se o produto de solubilidade de CaCO3 for

atingido, este composto precipitará (Equação 11). Daí a relaçãoentre profundidade das camadas secundárias de carbonatonos solos e precipitação anual (ARKLEY, 1963), com forma-ção de carbonatos na camada onde há acumulação de íonsalcalinos (OH-, HCO3

- e CO32-), à medida que a lixiviação se

aproxima de zero.

Os sistemas florestais e agrícolas diferem dosecossistemas naturais principalmente porque ocorremmais oportunidades para a remoção dos produtos (Ta-bela 2) e lixiviação de nitrato. As perdas de nutrientese de alcalinidade podem ser particularmente grandes,refletindo a adição de ácido através dos ciclos do C edo N. Com a adição contínua de ácido proveniente des-sas fontes, valores de pH estáveis (steady state) abaixode 5,0 serão estabelecidos, refletindo o balanço entreos processos de dissolução mineral e adição de ácido.

O modelo delineado por Helyar (2002) distribui os efeitosdos processos alcalinos e ácidos através do perfil do solo. Eleusa entradas tais como crescimento da planta e teor denutriente, remoção de produto, retorno nos resíduos, perda denitrato por lixiviação e erosão laminar e adição de N ao sistemana forma de fertilizantes e através da fixação de N2(g) porleguminosas. As reações ácidas e alcalinas nos ciclos do C edo N orgânicos, a absorção de cátions e ânions e a excreçãode H+ e OH- e seus equivalentes (como, por exemplo, HCO3

-)são levados em consideração. A lixiviação de íons para ascamadas inferiores do perfil do solo e o sistema de reaçõesCO2(g)/H2CO3/CaCO3 também estão no modelo. O modelopermite prever as conseqüências a longo e a curto prazos dasdiferentes práticas de manejo no pH do perfil do solo.

De forma ideal, o objetivo é manter o pHCa detodo o perfil acima de 5,0, de modo que nenhumacamada na zona radicular seja suficientemente ácidapara reduzir o crescimento das raízes. O modelo foi apli-cado em sistemas agrícolas estudados em detalhes. Ele produzresultados que apresentam padrão semelhante aos padrões

Figura 6. Limites da tolerância da planta ao alumínio.

Page 10: Enc94 - ipni.netFILE/Encarte-104.pdf · Title: Enc94 Author: EVANDRO Subject: Enc94 Created Date: 191040114115203

ENCARTE DO INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 104 � DEZEMBRO/2003 10

medidos, mas que podem ser deslocados no espaço ou notempo. Por exemplo, um dado sistema de manejo podeproduzir uma camada de ácido no perfil, a 25 cm, no modelo,mas de fato a 15 cm. Esses efeitos refletem a simplicidadedas funções usadas (como, por exemplo, todos os processossão distribuídos no modelo usando funções exponenciaissimples; RUSSEL e MOORE, 1968) e a dificuldade de espe-cificar sua distribuição média real em um dado ecossistema.No entanto, são expressões válidas dos efeitos das diferençasem manejos dos ecossistemas. As aplicações do modelo aecossistemas específicos mostram que o pH do perfil do soloé sensível ao manejo. Os principais efeitos realçados até omomento são descritos a seguir.

1. Adições líquidas de ácido proveniente dosciclos do C e do N causam solos ácidos em profundidade

Quando o pH do solo estiver abaixo de 5,5, a adição deácido carbônico é desprezível; então, a adição líquida de ácidoproveniente dos ciclos do C e do N orgânicos é a principalfonte de ácido. Com isto presume-se que a adição de ácidoproveniente do ciclo do enxofre também é desprezível, umapresunção que não é válida em alguns sistemas (como, porexemplo, locais do solo com sulfato ácido ou onde S elementaré usado como fertilizante).

O modelo mostra que ecossistemas agrícolas e flo-restais com remoção significativa de ânions orgânicos nosprodutos, adição de fertilizantes com base de amônio (NH

4)

ou perda de nitrato por lixiviação ou erosão laminar even-tualmente desenvolverão perfis altamente ácidos em pro-fundidades.

A taxa na qual a acidez se desenvolve dependeda taxa de adição de H+, da capacidade tampão de pHdo solo e da taxa de lixiviação. Os primeiros 1 cm a 2 cmsuperficiais geralmente recebem adição líquida de álcaliproveniente da dominância da oxidação de resíduos deplantas. Porém, as camadas de solo logo abaixo, atécerca de 30 cm, geralmente recebem adição líquida deácido devido à dominância dos processos ácidos (danitrificação, da volatilização de NH

3(g) a partir de NH

4+

e excreção de H+ pelas raízes) sobre os processos alca-linos nesta zona. O efeito da adição contínua de excesso deácido nesta zona resulta no decréscimo de pH em direção aoequilíbrio na intersecção das curvas para ácido adicionadoproveniente dos ciclos do C e do N com a taxa de lixiviaçãode íons Al + H+ (Figura 2). As demais adições de ácido sãotransportadas para as camadas inferiores através da lixiviaçãodos íons Al e H+.

A mensagem prática é que a formação de perfisde solo ácidos em profundidade em sistemas agrícolaspode ser interrompida pela aplicação de calcário, ououtros corretivos, para neutralizar as adições de ácido.O uso de espécies tolerantes a alumínio ao invés docalcário aumenta a acidificação do perfil, e a perda denutrientes (provenientes da maior intemperização) ereduz as opções de diversificação. A tolerância é empre-

gada em ecossistemas naturais para lidar com um fator deestresse existente. Em sistemas agrícolas, nos quais os lu-cros da aplicação de calagem são positivos, o calcário podeser aplicado para evitar a acidificação do solo e preservar afertilidade do solo, a produtividade e a diversificação deopções. Em tais sistemas, o papel da tolerância é sustentaraltas produções durante o longo período necessário paramelhorar a acidez subsuperficial através da manutenção dopHCa na camada arável no intervalo entre 5,0 e 6,0.

2. Taxas mínimas de intemperização ocorrem nointervalo de pH

Ca entre 5,0 e 6,0

Neste intervalo de pH, as concentrações de íons (Al +H+), ácido silícico (H

4SiO

4) e (OH- + HCO-3 + CO

3-2) em

solução estão nas faixas de 10-5,2 a -4,5, 10-3,5 a -3,3 e 10-5,1 a -4,0

molar, respectivamente. Assim, o transporte desses íons por100 mm de eluviante ano-1 está nas faixas de 0,030 a 0,007,0,50 a 0,32 e 0,008 a 0,104 (kmol + ou � ha-1 ano-1),respectivamente para pH entre 5,0 e 6,0. Para o ácido silícico,essas taxas de lixiviação são cerca de um décimo, e para osíons ácidos e alcalinos são duas ordens de magnitude maisbaixas que as das taxas de adição de ácido a sistemasagrícolas dos ciclos do C e do N. As taxas de lixiviação doácido silícico são baseadas em solos contendo minerais deargila de três camadas. Em solos com dominância decaulinita-óxido de alumínio, as concentrações de ácido silícicosão cerca de 10 vezes mais baixas novamente. O balançode Si no solo também é afetado pelas taxas de retorno de Sià superfície do solo nos resíduos de planta. No sistema depastagem estudado em experimentos de calagem em WaggaWagga (Austrália), as taxas de retorno de Si à superfícieem resíduos de planta são iguais ou pouco maiores que ataxa de lixiviação a 10 cm.

Esses números realçam o valor da manutenção dopHCa do solo neste intervalo de 5,0 a 6,0 para minimi-zar as taxas de intemperização causadas por lixiviação.

3. Lixiviação de nitrato dentro da zona radicularleva ao desenvolvimento de camadas ácidas em sub-superfície

Mesmo onde há pouca ou nenhuma adição líquida deácido, a lixiviação de nitrato dentro da zona radicular podelevar ao desenvolvimento de uma camada ácida localizadaentre 5 cm e 30 cm de profundidade, porque o efeito ácido danitrificação nos primeiros 10-15 cm superficiais é separadodos efeitos alcalinos da desnitrificação e da absorção de nitratona zona radicular mais abaixo (efeito alcalino da absorção denitrato pelas raízes em que um excesso de absorção de ânionsleva à excreção de OH- ou HCO3

- pelas raízes).Na prática, esse balanço de processos significa que a

quantidade de calcário necessária para interromper o desen-volvimento de uma camada em subsuperfície com pH

Ca < 5,0

é maior do que a quantidade de ácido adicionada a partir dosciclos do C e do N. A Tabela 3 mostra os resultados de ummodelo utilizando três padrões diferentes de absorção denitrato pelas plantas: a) absorção de nitrato pelas plantas em

Page 11: Enc94 - ipni.netFILE/Encarte-104.pdf · Title: Enc94 Author: EVANDRO Subject: Enc94 Created Date: 191040114115203

ENCARTE DO INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 104 � DEZEMBRO/2003 11

profundidade igual a da nitrificação; b) a absorção de nitratose estendendo em profundidade maior do que o sistemaradicular, resultando em alguma lixiviação abaixo do sistemaradicular; e c) a absorção de nitrato ocorrendo em profun-didades de cerca da metade entre esses dois extremos an-teriores.

A primeira característica dos resultados é que o pontode pH mais baixo no perfil do solo sobe da parte inferior dazona radicular (120-150 cm) para a camada a 25-35 cm, àmedida que a profundidade de lixiviação de nitrato aumenta.A segunda é que a maior lixiviação de nitrato aumenta tantoa quantidade de ácido adicionada através dos ciclos de C ede N como também a quantidade de calcário necessáriapara prevenir que se desenvolva uma camada com pH < 5,0(Tabela 3).

Por último, a absorção de nitrato pelas plantas na zonade nitrificação, ou não muito abaixo dela (colunas 2 e 4 daTabela 3), produz um perfil de pH do solo com o valor maisbaixo de pH, na base da zona radicular. Isto pode ser vantajoso,especialmente para espécies que são capazes de tolerartoxicidades de Al e Mn, porque esta é a zona mais próximado material parental e, portanto, é uma zona na qual osnutrientes podem ser mobilizados para incorporação no ciclobiológico de modo a aumentar a fertilidade do solo ou reporperdas de nutrientes.

4. A capacidade da planta de contrabalançar alixiviação dos nutrientes afeta o perfil do pH

As plantas que retornam para a superfície do soloresíduos com baixos teores de ânions orgânicos e cátionsassociados têm capacidade proporcionalmente mais baixa decontrabalançar a lixiviação de nutrientes e álcalis emprofundidade no perfil do solo. O efeito pode ser visto nosnúmeros entre parênteses na coluna 3 da Tabela 3 para apastagem de alfafa com 150 cmol kg-1 de ânions orgânicoskg-1 de resíduos, com os valores adjacentes para a pastagemde grama perene com trevo forrageiro com 60 cmol kg-1 deânions orgânicos kg-1 de resíduos de pastagem.

A alfafa, planta com capacidade relativamente alta decontrabalançar a lixiviação, tem o pH mais baixo no perfil dosolo em profundidade maior que a da mistura grama perene/trevo forrageiro para a quase mesma necessidade de calcáriopara atingir um pH mínimo de 5,0. A taxa absoluta de adiçãode ácido proveniente dos ciclos do C e do N é maior para osistema da alfafa devido às maiores taxas de remoção deânions orgânicos nos resíduos dos produtos (remoção deesterco dos locais de abrigo de animais).

CONCLUSÕES

O manejo do perfil de pH do solo para interromper odesenvolvimento de acidez em qualquer camada dentro dazona radicular das plantas requer a compreensão dos efeitosdos ácidos e dos álcalis e sua distribuição no tempo e noespaço. Algumas diretrizes principais de manejo que integramesses processos são:

� Plantas que absorvem altas concentrações de cátionsnão-N em relação aos ânions e, portanto, contêm altasconcentrações de ânions orgânicos, têm maior capacidadede contrabalançar a lixiviação de cátions e alcalinidade, destemodo reduzindo a acidificação dos solos superficiais;

� As taxas de intemperização devido à lixiviação sãominimizadas no intervalo de pHCa entre 5,0 e 6,0; portanto,este é um intervalo de pH desejável para a sustentabilidadeda fertilidade do solo a longo prazo;

� Os ecossistemas agrícolas e florestais são carac-terizados por remoção de produtos e, em níveis variados, pelalixiviação de nitrato. Esses processos significam que é neces-sária a aplicação de compostos alcalinos (calcário) paraequilibrar a adição líquida de H+ proveniente dos ciclos do Ce do N;

� São necessárias quantidades de calcário que exce-dam o balanço de H+ em alguns sistemas para interromper odesenvolvimento de uma camada de solo com pH < 5,0 em

Tabela 3. Simulação de equilíbrio de pH do perfil do solo para área pastejada de grama perene com trevo forrageiro com 650 mm deprecipitação pluviométrica anual presumindo-se diferentes quantidades de lixiviação de nitrato abaixo da zona de nitrificaçãoantes da absorção de nitrato pelas plantas.

b. Mais profunda do queo sistema radicular*

Nitrato lixiviado abaixo da zona radicular (kg ha-1) 0 5 (5) 0,1Ácido adicionado proveniente dos ciclos do C e do N orgânicose do CO

2(g) (kg CaCO

3 equivalentes ha-1 ano-1) 71 89 (179) 70

Calcário necessário para pH mínimo de 5,0 (kg ha-1 ano-1) 83 229 (225) 92Profundidade na qual ocorre pH mínimo (cm) 120-150 15-25 (70-90) 120-150

pH 0-10 cm 7,3 7,4 (7,4) 7,315-25 cm 7,1 5,0 (7,1) 7,070-90 cm 6,9 6,9 (5,0) 6,990-120 cm 6,3 6,8 (5,4) 6,2120-150 cm 5,0 6,8 (6,0) 5,0

* Os números entre parênteses são para pastagem de alfafa com resíduos altos em ânions orgânicos (150 cmol kg-1) devolvidos para a superfície comparadacom a mistura de grama perene/trevo forrageiro com 60 cmol kg-1.

Perfil de absorção de nitrato a. Mesma da nitrificação c. Metade entre a. e b.

Page 12: Enc94 - ipni.netFILE/Encarte-104.pdf · Title: Enc94 Author: EVANDRO Subject: Enc94 Created Date: 191040114115203

ENCARTE DO INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 104 � DEZEMBRO/2003 12

profundidade. Esses sistemas normalmente são aqueles nosquais ocorre a lixiviação de nitrato abaixo da zona de nitrifi-cação antes da absorção, e/ou sistemas dominados por plantascom capacidade limitada de retornar cátions e alcalinidadepara a superfície do solo;

� Taxas significativas de adição de H+ aos solosproveniente da dissociação de ácido carbônico ocorrem empHCa > 6,0. A lixiviação do solo com água de chuva causaintemperização ácida dos minerais do solo que se dissolvemneste intervalo de pH, mesmo que a adição de H+ provenientedos ciclos do C e do N orgânicos não seja significativa.

Por último, mas não menos importante, é preciso queas tabelas com os índices de acidez dos fertilizantes sejamrevistas para adequá-las ao conhecimento moderno dosprocessos de acidificação no manejo da fertilidade do solo.

REFERÊNCIAS

ARKLEY, T. Calculation of carbonate and water movementin soil from climatic data. Soil Science, v. 95, p. 239-248,1963.

BARMAN, A.K.; VARADACHARI, C.; GHOSH, H.Weathering of silicate minerals by organic acids. I. Nature ofcation solubilisation. Geoderma, v. 53, p. 45-63, 1992.

BRAMLEY, R.G.V.; WHITE, R.E. The effect of pH, liming,moisture and temperature on the activity of nitrifiers in a soilunder pasture. Australian Journal of Soil Research, v. 27,p. 711-24, 1989.

CONYERS, M.K.; HELYAR, K.R.; POILE G.J. pHbuffering: the chemical response of acidic soils to added alkali.Soil Science, v. 165, p. 560-566, 2000.

FITZPATRICK, E.A. Soils: their formation classificationand distribution. London: Longman Group, 1980.

GLINSKI, J.; STEPNIEWSKI, W. Soil aeration and itsrole for plants. Boca Raton: CRC Press, 1984.

GRINSVEN, H.J.M. van; RIEMSDIKJ, W.H. van; OTJES,R.; BREEMEN, N. van. Rates of aluminium dissolution inacid sandy soils observed in column experiments. Journal ofEnvironmental Quality, v. 21, p. 439-477, 1992.

HEENAN, D.P.; TAYLOR, A.C.; CULLIS, B.R.; LILL,W.J. Long term effects of rotation, tillage and stubble ma-nagement on wheat production in southern NSW. Aus-tralian Journal of Agricultural Research, v. 45, p. 93-117, 1994.

HELYAR, K.R. Soil acidification and nutrient cycling in relationto sustainable management of agricultural and forestryecosystems. In: FARINA, M.; VILLIERS, M. de; BAR-NARD, R.; WALTERS, M. (Ed.) Integrated management

and use of acid soils for sustainable production. Kwa-Zulu-Natal: National Department of Agriculture, 2002. p. 224-251.

HELYAR, K.R.; CREGAN, P.D.; GODYN, D.L. Soil acidityin New South Wales � current pH values and estimates ofacidification rates. Australian Journal of Soil Research,v. 28, p. 523-537, 1990.

HELYAR, K.R.; PORTER, W.M. Soil acidification, itsmeasurement and the processes involved. In: ROBSON, A.D.(Ed.). Soil acidity and plant growth. Sydney: Academic Press,1989. p. 61-101.

ISBELL, R.F. The Australian soil classification. Mel-bourne: CSIRO, 1996.

LINDSAY, W.L. Chemical equilibria in soils. New York:John Wiley and Sons, 1979.

MAGDOFF, F.R.; BARTLET, R.J. Soil pH bufferingrevisited. Journal of the Soil Science Society of America,v. 49, p. 145-148, 1985.

PIERRE, W.H.; BANWART, W.L. Excess-base and excess-base/nitrogen ratio of various crop species and parts of plants.Agronomy Journal, v. 65, p. 91-96, 1973.

ROBSON, A.D.; ABBOTT, L.K. The effect of soil acidity onmicrobial activity in soils. In: ROBSON, A.D. (Ed.). Soil acidityand plant growth. Sydney: Academic Press, 1989. p. 139-165.

RUSSELL, J.S.; MOORE, A.W. Comparison of differentdepth weightings in the numerical analysis of anisotrophic soilprofile data. In: INTERNATIONAL CONGRESS OF SOILSCIENCE, 9., Transactions... v. 4, p. 205-213, 1968.

SLATTERY, W.J.; RIDLEY, A.M.; WINDSOR, S.M. Ashalkalinity of animal and plant products. Australian Journalof Experimental Agriculture, v. 31, p. 321-324, 1991.

SUMNER, M.E. Global extent, development and economicimpact of acid soils. In: FARINA, M.; VILLIERS, M. de;BARNARD, R.; WALTERS, M. (Ed.) Integrated mana-gement and use of acid soils for sustainable produc-tion. Pretoria: National Department of Agriculture, 2001.p. 3-32.

VERBURG, K.; BRASCHKAT, J.; HOCHMAN, Z.;HELYAR, K. R. Modelling acidification processes inagricultural systems. In: RENGEL, Z. (Ed.). Handbook ofsoil acidity. New York: Marcel Dekker, 2003. p. 135-187.

VLAMIS, V. Acid soil infertility as related to soil solution andsolid phase effects. Soil Science, v. 75, p. 383-394, 1953.