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EMPREENDORISMO INSTITUCIONAL: O CASO DE JOAQUIM MURTINHO
Larissa R. V. de Arruda1 Maria Teresa Miceli Kerbauy2
RESUMO: Joaquim Murtinho (1848-1911) foi ministro da fazenda no governo Campos Sales, quando sanou as finanças da República, foi também senador e empresário. Controlou a política do seu estado natal, o Mato Grosso, durante os anos de 1892 até sua morte. Consideramos Joaquim um empreendedor individual porque ele implanta as alterações economicas do país, políticas em seu estado e institucionaliza o campo da medicina homeopática. O empreendedor individual influencia e altera as instituições, utiliza seus elementos recombina de formas incomuns em momentos oportunos, a fim de produzir mudanças. O presente trabalho pretende analisar a figura de Joaquim como empresário institucional, detendo-se primeiramente no conceito, assim como na teoria Neoinstitucional. PALAVRAS-CHAVE: Empresário Institucional, Neoinstitucionalismo, Joaquim Murtinho INTRODUÇÃO
A República Velha (1889-1930) foi marcada por um período de instabilidades,
especialmente em seus anos iniciais, que foram o auge da trajetória de Joaquim
Murtinho, proeminente político mato-grossense. Por várias vezes Murtinho tentou se
inserir na política durante o Império, mas era preterido, quando conseguiu se eleger
senador foi proclamada a República. Nesse novo regime foi eleito senador na primeira
eleição realizada em 1890, tendo sido reeleito por mais duas vezes. As disputas dos
primeiros anos entre civis e militares em torno do poder, abrem brechas para Joaquim
Murtinho mobilizar o seu grupo para dominar politicamente no estado do Mato Grosso,
enquanto no Rio de Janeiro consegue indicação para o Ministério da Viação, durante o
governo do vice-presidente Manuel Vitorino (1896-1897) e para o ministério da
Fazenda no governo de Campos Sales (1898-1902).
1 Mestranda em Ciência Política na UFSCar. Bolsista Fapesp. E-mail: Larissa.vaccari@hotmail.
com Bacharel em Sociologia e Política –FESPSP. 2 Professora da Unesp Araraquara. E-mail: [email protected]. Doutora em Ciências
Sociais – PUC.
Consideramos Joaquim Murtinho um empreendedor institucional porque ele
imprimiu mudanças tanto econômicas em nível nacional, como políticas em seu estado
natal, o Mato Grosso, como também institucionaliza o campo da medicina
homeopática e foi um médico renomado. O conceito de empresário institucional nasce
no seio da teoria Neoinstitucionalista nos anos 1980, com objetivo de sanar dois
problemas dessa teoria: o da mudança e da ação individual. O Neoinstitucionalismo
ganha espaço a partir da década de 1970, e possui três vertentes teóricas que dão
ênfase ao papel das instituições moldando e restringindo comportamentos, em um
determinismo das instituições que pouco espaço deixa para a ação individual ou para
mudança institucional.
Assim, pretendemos analisar como Joaquim Murtinho foi um empresário
institucional, partindo do conceito de empresário institucional, que só se torna
compreensível ao considera-lo inserido na teoria Neoinstitucional, já que o conceito
carrega uma crítica a essa teoria. O trabalho se compõe de mais quatro partes, na
primeira abordamos o Neoinstitucionalismo, sua formação e as suas vertentes. Na
segunda parte analisamos o conceito de empresário institucional, considerando as
abordagens e utilização de alguns autores, em seguida estabelecemos algumas
considerações sobre o papel de Joaquim Murtinho como empresário institucional, e
finalmente apresentamos as conclusões finais.
A TEORIA NEOINSTITUCIONAL
A Teoria Neoinstitucional tem como referencial o antigo Institucionalismo e o
Comportamentalsimo. Até os anos 1940 o Institucionalismo é dominante na Ciência
Política, sua tradição remonta à análise das constituições atenienses feita por
Aristóteles. O viés institucional também foi utilizado por Locke, Montesquieu, pelos
Federalistas, por Tocqueville – quando ele ressalta as instituições sociais como
explicação da bem sucedida Democracia americana. Durante o século XX a Economia
política endossa seu peso, a Sociologia também faz uso através dos trabalhos de
Durkheim. (PERES, 2008)
Na Ciência Política o Institucionalismo concentrou-se na análise das
constituições, estabelecendo modelos prescritivos do “desenho institucional” em uma
ótica normativa do que deveria ser a política, não se concentravam nos fatos
concretos e objetivos. Contudo, essa abordagem perdeu eficácia explicativa, ainda nos
anos 1930, o governo americano desvalorizou essa abordagem, pois ela não explicava
os fenômenos daquele momento, tais como o nazismo, fascismo. Assim, os estudos
de Ciência Política após a Segunda Guerra Mundial passam a focar-se na dinâmica
mais concreta da política, usando técnicas mais avançadas de análise estatística e o
método comparativo. (PERES, 2008)
O Comportamentalismo advém da crítica ao Institucionalismo e do
behaviorismo da Psicologia de Watson. Watson altera a perspectiva da Psicologia,
antes se concentrava nos fenômenos mentais passa, a partir de então, observar
empiricamente o comportamento. Nas Ciências Sociais a vertente Comportamentalista
influencia a Sociologia de Durkheim e a Antropologia de Malinowiski, já a Ciência
Política se posiciona criticamente contra o Institucionalismo, propõe uma análise
empiricamente orientada e rigor conceitual; além de utilizar de forma pluralista as
metodologias das outras ciências, dessa perspectiva a Ciência Política foi considerada
uma ciência do comportamento. (PERES, 2008)
O Comportamentalismo fez grandes inovações metodológicas, tendo grande
preocupação com objetividade e com generalização. Defendia que somente era
possível uma Ciência Política que tivesse orientação empírica, de modo que os
cientistas políticos devem tratar somente de fenômenos observáveis, sem qualquer
especulação dedutiva. A pesquisa deveria utilizar dados quantitativos ou quantificados,
ser orientada e dirigida por teoria conceitualmente rigorosa, com análise pautada na
neutralidade axiológica, devendo ter caráter analítico e não somente descritivo.
Recomendava, também, abordagem multidisciplinar, máximo rigor metodológico e
uma lógica de inferência indutiva. O Comportamentalismo tem seu auge nos anos
1950. (PERES, 2008)
Por sua vez o Neoinstitucionalismo contém a crítica ao Comportamentalismo.
Sua maior crítica era que a Ciência Política havia sido engolida pelo
Comportamentalismo. Contrapunha-se ao axioma comportamentalista de que a
Ciência Política não poderia ser uma ciência capaz de estabelecer leis, mas também
criticava também o antigo Institucionalismo. A reação Neoinstitucionalista começa nos
anos 1960 e ganha peso durante os anos 1970, e tem uma dupla rejeição: à ausência
de cientificidade do antigo Institucionalismo e à ausência do contexto institucional do
Comportamentalismo.
As principais críticas feitas pelo Neoinstitucionalismo voltavam-se para a falta
de potencial analítico da Ciência Política, causado pela ausência do contexto
institucional. Peres (2008) destaca que Dahl defendeu que o Comportamentalismo
tinha insuficiência analítica, pois se baseia na ação dos indivíduos desconsiderando as
instituições políticas. Portanto, o comportamento seria apenas uma das dimensões do
fenômeno político. Afastaram-se, ao menos relaxam, da premissa radical da
neutralidade axiológica. Criticavam o ecletismo e a multidisciplinaridade defendendo
que essa posição acarretava em falta de especificidade da Ciência Política. Também
criticaram o excesso de rigor teórico, que anularia a criatividade do pesquisador.
O Neoinstitucionalismo herda do antigo Institucionalismo a centralidade nas
instituições, defende que as instituições importam e moldam ou condicionam o
comportamento humano, seja o constrangendo ou restringindo este comportamento.
Herdam do Comportamentalismo o rigor metodológico e a orientação empírica da
pesquisa.
No Brasil a constituição da Ciência Política se dá em pleno diálogo com esse
debate que ocorre nos Estados Unidos. Tanto Lamounier como Lessa (2011)
destacam que já existia no país um pensamento político que datava do século XIX e
que foi importante para a constituição da disciplina. Ainda segundo o Lessa o
Pensamento Político Brasileiro constitui-se de intelectuais isolados que praticaram o
Ensaísmo histórico-sociológico. O Ensaísmo abordava temas de natureza política
utilizando narrativas Históricas, Sociológicas, Literárias, Filosóficas e Econômicas, foi
predominante até os anos 60 no país, predominando entre os anos 1930 aos anos
1960 a Escola Paulista de Sociologia e o Instituto Superior de Estudos Brasileiros –
ISEB. (FORJAS, 1997).
Em meados da década 1970 a Ciência Política firma-se enquanto disciplina,
com cientistas integrados aos temas e padrões norte-americanos, defendendo a
autonomização da política em relação a outras disciplinas. Contribuiu para este
processo a formação dos departamentos de Ciência Política e das agências de
fomento á pesquisa; em 1960 foi criado o departamento da disciplina na UFMG e em
1969 o da IUPERJ. Assim, Lessa (2011) acentua que antes de 1964 a política no
Brasil era percebida como efeito de dinâmicas sociais e históricas amplas, no pós-
1964 ela passa entender a autonomia dos fenômenos políticos e institucionais. Muitos
cientistas políticos brasileiros vão estudar nos Estados Unidos como: Fabio Wanderley
Reis, Wanderley Guilherme dos Santos e José Murilo de Carvalho (FORJAS, 1997). A
autora destaca que houve sim incorporações da Ciência Política norte-america,
entretanto também foi feito críticas por parte desses autores e também pela própria
USP, que manteve os vínculos com a Filosofia, História e Sociologia, além dos
estudos sobre o Pensamento Político Brasileiro.
Voltando ao NeoInstitucionalismo, cabe ainda discutir as questões principais
acerca da teoria. Hall e Taylor (2003) defendem que o Neoinstiucionalismo não é uma
corrente unificada, analisando o Neoinstiucionalismo dos anos 80 e 90 eles afirmam
que existem três métodos de análise que aparecem a partir do dos anos 80. As três
vertentes dessa teoria são: o Neoinstiucionalismo Sociológico, o da Escolha Racional
e o Histórico.
O Institucionalismo da Escolha Racional afirma que o contexto institucional
explica a conduta dos atores políticos racionais. As regras do jogo condicionam a ação
dos atores. (PERISSSINOTTO, 2008) Segundo Peres (2008) as instituições interagem
com preferências já dadas e restringem as decisões. Essa abordagem focaliza nas
regras do jogo, já a cultura, as crenças, os valores, a economia são consideradas
elementos exógenos. Segundo Hall e Taylor (2003) esse enfoque é feito segundo
quatro propriedades:1) Atores compartilham preferencias e gostos, se comportam de
uma forma que possam maximizar suas satisfações, utilizando estratégias e cálculos.
2) Na vida política é eminente o dilema da ação coletiva, que se refere a tensão entre
o individual e o coletivo, o indivíduo ao tentar maximizar a satisfação de suas
preferencias acaba produzindo consequências sub-ótimas para a coletividade. Então
“... a ausência de arranjos institucionais impede cada ator de adotar uma linha de ação
que seria preferível no plano coletivo.” (Hall e Taylor,2003, p.205) Sem as instituições
os indivíduos são impedidos de agir no plano coletivo. 3) Enfatizam o papel das
inteirações estratégicas na determinação das instituições políticas, sendo as
instituições fundamentais para determinar o cálculo estratégico, que é influenciado
pelas expectativas do ator em relação ao comportamento dos outros atores, as
instituições estruturam essa interação. 4) O processo de criação das instituições se dá
devido a um acordo voluntário entre os indivíduos, elas se mantém porque oferecem
mais benefícios aos atores do que as formas institucionais concorrentes.
De acordo com Césaris (2009) o Neoinstiucionalismo Histórico surge para se
contrapor ao da Escolha Racional. A escola tenta “... recombinar certos elementos do
funcionalismo, do pluralismo e neomarxismo sob uma agenda de pesquisa histórica
neo-weberiana e neo-toquevilliana.” (CÉSARIS, 2009.p.63) Consideram que as
instituições são procedimentos, protocolos e normas, e podem afetar o comportamento
de duas maneiras: 1) através do cálculo estratégico, que daria quando os atores
examinam as opções e selecionam a que dá maior beneficio. Assim as instituições
afetam o comportamento, pois oferecem aos atores certeza do comportamento dos
demais atores. 2) A segunda maneira se contrapõe à primeira, considera que nunca o
comportamento é inteiramente estratégico, ele é também moldado pela cultura. As
instituições fornecem modelos morais e cognitivos que modelam a ação.
Segundo Hall e Taylor (2003) essa escola é mais complexa que a da Escolha
Racional, os institucionalistas históricos consideram o papel das instituições na vida
política, mas raramente afirmam que são os únicos fatores, levam em conta a relação
entre instituições e as ideias ou crenças.
O Neoinstiucionalismo Sociológico considera que as instituições moldam a
preferência dos atores. Os neoinstitucionalistas sociológicos definem de maneira mais
global o que são instituições, elas não são somente entendidas como regras,
procedimentos ou normas, são também símbolos, esquemas cognitivos e modelos
morais. De modo que esta noção de instituições rompe a dicotomia instituição e
cultura, a cultura passa a ser vista como uma instituição. Os indivíduos são
constrangidos pela socialização a desempenhar papéis específicos internalizando as
normas. Portanto, as instituições influenciam o comportamento determinando o que
deve ser feito e quais as possibilidades de ação em um determinado contexto. As
instituições influenciam o cálculo estratégico e as preferências, como a identidade ou a
imagem que um indivíduo tem de si mesmo.
Hall e Taylor (2003) fazem uma comparação das três vertentes, acreditam que
o Neoinstiucionalismo Histórico tem uma concepção mais ampla da relação entre
instituições e comportamento, entretanto dedicou-se menos que a outras na
compreensão precisa de como as instituições afetam o comportamento. Já o
Neoinstiucionalismo da Escolha Racional fez uma relação entre instituições e
comportamento de forma precisa, com formulações de conceitos, gerando uma teoria
sistemática, e desenvolvendo os componentes instrumentais – gestão da incerteza,
importância dos fluxos de informação, a interação estratégica – o que segundo os
autores constitui um grande avanço. Entretanto, apresentam uma imagem muito
simplista das motivações humanas, tem necessidade de especificar as preferências e
objetivos dos atores, de modo que reservam pouco espaço para intencionalidade
humana na determinação das situações políticas. Enquanto que os teóricos do
Neoinstiucionalismo Sociológico explicam melhor a intencionalidade humana, definem
como as instituições influenciam as preferências ou identidades dos atores, mas não
aborda com mesmo afinco a questão de como a criação ou a reforma institucional
envolvem conflitos de poder.
“Em certos, casos, os neo-institucionalistas sociológicos parece privilegiar de
tal modo os processos macro-sociológicos que os atores em jogo parecem
desvanecer-se ao longe, tornando o resultado semelhante a uma ação sem atores.”
(Hall e Taylor, 2003, p.218) Os autores, ainda, acham surpreendente a maneira como
as três escolas não se comunicam entre si, elas ficaram refinando suas teorias durante
o tempo sem um diálogo; eles sugerem que deve existir um intercâmbio entre elas,
pois cada uma revela aspectos importantes do comportamento humano.
O CONCEITO de Empresário Institucional
Antes de adentrar no conceito de empresário institucional faz-se necessário
caracterizar o empreendedorismo, diferenciando o empreendedor do capitalista.
Conforme Martes (2010) a larga utilização do conceito de empreendedorismo gerou
uma frouxidão conceitual acarretando no risco de perda de consistência, sendo
necessário retornar aos clássicos para reconstruir o conceito de empreendedorismo. A
autora utiliza a obra de Weber (2004) para ressaltar que o empreendedorismo só é
possível no capitalismo moderno. O empreendedor seria um tipo especial de
capitalista, ele reinveste e faz crescer sua empresa, não trabalha somente para
usufruir de sua riqueza, mas para maximizá-la. O mero capitalista tem objetivo apenas
de lucrar e explorar. Martes também utiliza a diferenciação feita por Schumpeter, muito
baseada na de Weber, segundo a qual administrar e adaptar não é empreender. O
capitalista sempre se adapta as mudanças, o empreendedor inova causando rupturas.
A inovação precisa ser grande devido a resistência que as instituições tem
perante a ação individual. Uma das principais características do empreendedor é que
ele é um agente que vê o mundo de outra forma, ele foge do padrão, vence
resistências e impõe novos padrões. Se pensarmos nessa perspectiva de ação
individual e compararmos com as considerações apontadas na seção anterior,
podemos notar que o Neoinstiucionalismo atribui pouco espaço para a ação individual.
As instituições coagem, constrangem a ação individual, mas o contrário – a ação
individual interferindo nas instituições – é pouco considerado. O conceito de
empreendorismo individual carrega essa crítica e tenta mostrar que o indivíduo
também influencia as instituições.
O sociólogo norte- americano Paul DiMaggio (1988) formula o conceito de
empreendedor institucional na década de 80 dentro da teoria Neoinstitucional
organizacional. Tentando responder a pergunta de como nascem novas instituições,
mostra como os agentes criam instituições ou se apoderam delas, eles tem interesse
em determinados arranjos e para fazê-los mobilizam recursos para criar ou
transformar instituições. O conceito é importante porque resolve o problema do
Neoinstitucionalismo quanto à possibilidade de mudança, diz respeito também ao
papel da ação individual, caracterizando-a como independente e proativa. A inspiração
para termo vem da teoria schumpeteriana, descrevendo o empreendedor como um
fator importante da econômica como já foi citato. O empreendedor institucional pode
ser tanto uma organização como um indivíduo, entretanto na bibliografia são escassos
estudos sobre indivíduos como empresários individuais. (MENDONÇA,2010) (
AVRICHIR e CHUEKE, 2011)
“Os empreendedores institucionais podem ser definidos como atores que
possuem interesses em determinados campos emergentes e são capazes de mobilizar
recursos suficientes para criar uma nova instituição ou transformar uma já existente.”
(DIMAGGIO, 1988 apud AVRICHIR e CHUEKE,2011). Eles têm habilidade de
construir campos ou reproduzi-los, através da capacidade de mobilizar as outras
pessoas e formar uma coalizão política. São forças importantes para o
desenvolvimento econômico, trabalham na constituição das instituições de mercado.
( AVRICHIR e CHUEKE, 2011).
Avrichir e Chueke (2011) ressaltam que a bibliografia sobre o tema analisa
quais as condições que organização/indivíduos teriam maior probabilidade de se
engajar em processos de mudança, a posição social é um fator chave para o
empreendedorismo, também contam interesse em empreender mudanças e possuir
recursos suficientes para alterar a proposta dominante. Pessoas ou organizações com
elevada posição social tendem a investir na manutenção do status quo, enquanto que
organizações/indivíduos que ocupam posições menos centrais pouco tem a perder
com mudanças e são menos privilegiados com os arranjos existentes. Dessa forma, é
mais provável que a mudança parta de organizações que não ocupam posição central
no campo e de indivíduos que não tenham elevado status social. Entendemos campo
como:
Em termos analíticos, um campo pode ser definido como uma rede ou uma configuração de relações objetivas entre posições. Essas posições são definidas objetivamente em sua existência e nas determinações que elas impõem aos seus ocupantes, agentes ou instituições, por sua situação {situs} atual e potencial na estrutura da distribuição das diferentes espécies de poder (ou de capital) cuja posse comanda o acesso aos lucros específicos que estão em jogo no campo e, ao mesmo tempo, por suas relações objetivas com as outras posições (dominação, subordinação, homologia, etc). (BOURDIEU, 1992, p. 60).
Os autores também analisam um estudo sobre empreendedorismo institucional
feito pelos chineses Li, Feng e Jiang (2006 apud AVRICHIR e CHUEKE,2011). Os
chineses constroem conceitos para elucidar como os empresários institucionais atuam,
assinalam que o empreendedor institucional é uma pessoa inovadora que desconstrói
e ou cria Instituições. Ele tem habilidades para lidar com agentes governamentais e
com a opinião pública. Segundo os chineses há quatro abordagens utilizadas pelos
empresários institucionais:
1)Advocacia aberta: defesa pública de mudança de leis ou regulamentos,
através de declarações na mídia, fóruns, etc.
2)Persuasão privada: argumentação privada junto aos tomadores de decisão.
3)Pleitear exceção: defender que sua ideia é um caso especial e deve ser
tratada como um caso de exceção as regras.
4)Investimento ex ante com justificativa ex post: o empreendedor começa seu
negócio desviando-se dos regulamentos, depois quando alcança o sucesso, gerando
empregos e benefícios sociais, justifica sua ação anterior e tenta persuadir o governo
a mudar regulamentos e regras para legitimar o seu comportamento. (Li, Feng e Jiang,
2006 apud Avrichir e Chueke , 2011).
O trabalho de Leca, Battilana e Boxenbaum (2008) analisa as publicações
sobre os empresários institucionais desde 1988, elas perceberam que houve
crescente aumento na utilização do conceito. As autoras ao sistematizarem a análise
sobre o empreendedorismo institucional procuram demonstrar a explicação dada por
esses estudos de como os atores se tornam empreendedores institucionais apesar da
coerção das instituições. Alguns autores levantaram que os empresários institucionais
tiveram condições favoráveis, dadas por conjunturas de crises, convulsões sociais,
rupturas, descontinuidades que perturbam o consenso socialmente construído,
contribuindo para a introdução de novas ideias. Outros estudos descreveram as
características do campo que o empresário institucional se insere para entender quais
campos são mais propícios a mudança, a heterogeneidade e a institucionalização
facilitariam a ação do empreendedorismo institucional, várias ordens institucionais ou
alternativas contribuiriam para a inovação. Quanto mais heterogêneos forem os
arranjos institucionais mais provável existir incompatibilidade e contradições,
considerados propícios para gerar mudanças.
Dorado (2005 apud LECA, BATTIANA e BOXNBAUM, 2008)
desenvolveu uma tipologia que leva em conta o grau de heterogeneidade e o grau de
institucionalização, na tentativa de determinar a extensão na qual os campos são
susceptíveis de oferecer oportunidades para a ação, isto é, para o empreendedorismo
institucional. Os campos organizacionais podem adotar uma das três formas
dominantes: 1) Campos altamente institucionalizados ou isolados da potencial
influência de outros campos e, consequentemente, de novas ideias, apresentam uma
"oportunidade opaca", o que significa que as suas características não preveem
qualquer possibilidade de ação. 2) O campo de “oportunidade transparente” oferecem
uma série de oportunidades para a ação, são caracterizados pela co-existência de
arranjos institucionais heterogêneas e um nível substancial de institucionalização. 3) O
campo de “oportunidade nebuloso” caracterizado pela institucionalização mínima e por
muitos modelos heterogêneos de práticas, pode oferecer oportunidades para a ação,
mas elas são difíceis de entender porque os agentes têm de lidar com um ambiente
altamente imprevisível.
Campo de
"oportunidade opaca"
Campo de
“oportunidade transparente”
Campo de
“oportunidade nebuloso”
Altamente
institucionalizado
Substancial nível de
institucionalização
Baixa
institucionalização
Isolado da influência
de outros campos
Arranjos institucionais
heterogêneos
Modelos heterogêneos
de práticas
Não prevê
possibilidade de ação
uma série de
oportunidades para a ação
Oferecem
oportunidades para ação
difíceis de ser entendidas.
Fonte: (Dorado , 2005 apud LECA, BATTIANA e BOXNBAUM, 2008)
Leca, Battilana e Boxenbaum (2008) também apontam que a posição social do
empreendedor institucional no campo é relevante, assim como foi analisado no
trabalho de grau de Avrichir e Chueke (2011). A posição social desses atores é a
chave que pode gerar impacto na percepção dos demais atores sociais, sendo assim,
atores a margem do campo organizacional seriam mais propensos a agir como
empresário institucional, entretanto encontram-se empreendedores institucionais no
centro do campo. Alguns estudos também ressaltam a importância das qualidades
individuais dos empreendedores institucionais. Os empreendedores institucionais
seriam pessoas socialmente habilidosas, no sentido de que suas ações incorporam
uma identidade coletiva, atendendo ao interesse de determinado grupo, ou seja, as
habilidades sociais os distinguem. Os empresários institucionais de sucesso tendem a
ser atores com altos níveis de capital social³3.
De modo que atores no centro do campo teriam ao seu favor a autoridade
formal, um recurso útil para os empreendedores institucionais. Autoridade formal
refere-se a um ator legitimamente reconhecido com o direito de tomar decisões
(Phillips et al, 2000:. 33). A autoridade do Estado (DiMaggio e Powell, 1983) e a
autoridade conferida pela posição oficial são autoridades formais, tal autoridade pode
ajudar os empreendedores institucionais a promover o reconhecimento de seu
discurso por outros atores.
Crouch (2005) se apropria do conceito para criticar o Neoinstitucionalismo e
enfatizar a ação individual na mudança. Considera que o NeoInstitucionalismo cai em
3 Entendido como “ … aspectos estruturais que facilitam o acesso a certos recursos (Coleman, 1988)”,
ou ainda “ … são os recursos mobilizados por um indivíduo em uma rede de relações em auxílio as
suas próprias necessidades.” (FIALHO, 2008, p.73)
um determinismo das instituições, assim os indivíduos mais parecem estar em uma
gaiola de ferro onde nada podem fazer. Contra o determinismo Neoinstitucional
Crouch pretendeu em seu livro fornecer uma base teórica para analisar como os
atores sociais inovadores fazem algo semelhante para as instituições, ou seja, como o
indivíduo também altera as instituições. Tais atores sociais Crouch chama de
empresários institucionais, pois sua atuação através das instituições ocorrem da
mesma maneira que um empresário comum agiria diante de uma oportunidade de
negócio. Eles procuram constantemente maneiras de fazer coisas que até então foram
impossíveis, utilizam elementos das instituições recombinando com formas incomuns
em momentos oportunos, a fim de produzir mudanças. Crouch quer se apropriar do
que considera um avanço realizado pela teoria - a natureza restrita da ação humana
pelas instituições - mas desenvolver uma teoria que impossibilite a ação individual
assim como a mudança institucional.
JOAQUIM MURTINHO UM EMPRESÁRIO INSTITUCIONAL
Joaquim Murtinho nasceu em Cuiabá, Mato Grosso, filho do médico José
Antônio Murtinho. Aos treze anos foi estudar no Rio de Janeiro e nunca retornou a sua
terra natal. Formou-se em medicina - grande defensor da medicina homeopática - foi
professor e catedrático da Escola Politécnica do Rio de Janeiro. Tentou se candidatar
por três vezes a deputado geral primeiro pelo Partido Conservador e as demais pelo
Liberal, mas foi preterido todas às vezes, quando consegue se eleger senador é
proclamada a República e não chega a assumir o cargo. Em 1890 elege-se senador
por Mato Grosso e finalmente assume o cargo, que exerceu por mais duas vezes. Foi
ministro por duas vezes, assumiu a pasta da Indústria, Viação e Obras públicas
durante o governo do vice-presidente Manuel Vitorino (1896-1897), e foi ministro da
Fazenda de Campos Sales (1898-1902). Além de médico, professor e político foi
também um empresário, no Mato Grosso detinha maior parte das ações da
Companhia Mate Laranjeira, que atuava na extração da erva mate e exportava para
Paraguai, Argentina e Europa. No Rio de Janeiro foi dono da Companhia Ferro Carril
Carioca, concessionária dos serviços de bondes. Teve participação assídua na criação
do Banco Rio e Mato Grosso.
Os Murtinho foram uma oligarquia liderada por Joaquim Murtinho, que
conseguiu inúmeros benefícios para seus familiares e para os negócios da família.
Seu pai José Antônio Murtinho já havia assumido interinamente o governo de Mato
Grosso no Império, seu irmão Manuel Murtinho também havia assumido o governo
estadual no Império e foi presidente do Mato Grosso em 1892 a 1895, além de ter sido
ministro do Supremo Tribunal Federal. O irmão mais velho de Joaquim, José Antônio
Murtinho foi senador, e seu outro irmão Francisco Murtinho foi presidente do Banco
Rio e Mato Grosso.
Defendemos que Joaquim foi um empresário institucional por ter causado três
rupturas: 1) institucionalização da medicina homeopática em detrimento da medicina
alopática, 2) as finanças foram equilibradas, consolidou a economia da República, 3)
alterou o domínio oligárquico no Mato Grosso, os Murtinho tiveram predomínio a partir
de 1892 até a morte de Joaquim.
1)No que se refere à medicina homeopática Joaquim foi curado pela
homeopatia enquanto cursava Engenharia, decide, então, cursar medicina. Desde
1865 estava matriculado em Engenharia na Escola Central no Rio de Janeiro, e em
1867 entrou em contato com as obras de Samuel Hahnemann, fundador da
homeopatia em 1779, matricula-se na Faculdade de Medicina. Formou-se em Ciências
Físicas e Naturais em 1870, dois anos depois começou a lecionar na Escola Central.
Em 1873 obteve o título de doutor em medicina defendendo a tese de orientação
homeopática, começou a clinicar no consultório de Duque – Estrada, um dos primeiros
médicos homeopatas do país. Foi nomeado Catedrático da cadeira de Zoologia em
1875 na Escola Politécnica (antiga Escola Central). Em 1882 teve parecer negativo da
Congregação da Faculdade de Medicina sobre a incorporação de duas cadeiras de
medicina homeopática na faculdade, é uma grande decepção. (FARIA, 1993)
(TARDELLI,2005)
Joaquim Murtinho contesta o parecer negativo sobre a incorporação da cadeira
de medicina homeopática no Jornal do Comércio, causando polêmica aberta com o
Imperador. A homeopática tinha chegado no Brasil antes de 1840, quando existiam
dois médicos homeopatas no Brasil, Duque-Estrada e o francês Emilio Germon, nesse
ano chega ao país outro médico homeopata, Bento Mure. Em 12 de janeiro de 1845
funda-se a Escola Homeopática do Brasil, mas disputas internas originam a divisão
desta em duas instituições: Instituto Hahnemanniano do Brasil e a Congregação
Médico-Homeopática Fluminense, enfraquecidas desaparecem. Em 1880 o Instituto
Hahnemanniano do Brasil é refundado, sendo Murtinho um dos fundadores e sócios
efetivos da instituição. O instituto encarrega Murtinho de divulgar na imprensa três
artigos por mês em jornal de grande circulação. O teor da matéria era a defesa da
homeopatia em detrimento da alopatia, argumentando que “a homeopatia é a medicina
experimental, a alopatia é a medicina das hipóteses.” (Joaquim Murtinho, 1880 apud
FARIA, 1993) Utilizando esses artigos divulga a homeopatia consolidando-a, e
tornando-se assim um médico famoso.
“À semelhança da luz, a verdade procura irradiar-se.” Com essas palavras, Murtinho iniciou o primeiro artigo da série que projetaria seu nome na Corte e em Mato Grosso, sua Província natal, e lhe abriria o caminho para a realização profissional como um dos médicos de maior nomeada de sua época. (FARIA, 1993,P.91)
A médica homeopata Tardelli (2005) tratando da história da homeopatia no
Brasil, afirma que o período de 1882 a 1900 foi um período de resistência, atribuindo
essa resistência exclusivamente a Joaquim Murtinho, pois foi ele que travou polêmicas
em jornais defendendo a homeopatia. O período de 1900 a 1930 foi o período áureo
da homeopatia no Brasil. Em 1904 foi criada a cadeira para ensino da homeopatia na
Faculdade de Medicina no Rio de Janeiro. Nesse mesmo ano Murtinho é eleito
presidente do Instituto Hahnemanniano do Brasil. Ainda segundo Tardelli também
contribuiram para a queda da alopatia, defendida por Oswaldo Cruz, a revolta da
Vacina (1904) e o apoio dos militares para a homeopatia.
Joaquim Murtinho foi um dos renomados médicos de seu tempo, entre seus
clientes estavam presidentes, senadores, deputados etc. Foi médico do Visconde de
Ouro Preto – a tal tratamento o Jornal do Comércio atribui a inclusão do nome de
Murtinho na lista tríplice do Senado Imperial, quando mais tarde foi eleito senador,
entretanto Murtinho alega que se nome já estava na lista antes do inicio do tratamento
(FARIA, 1993,p.189) – Deodoro da Fonseca, Benjamim Constant, Prudente de
Moraes, Campos Sales, presidentes de estado, a alta oficialidade do Exército e da
Armada, grandes empresários, industriais, comerciantes. Podemos concluir que o
prestígio que teve como médico, somado as considerações de Tardelli (2005) sobre o
momento auge da homeopatia, que Joaquim Murtinho atuou de modo fundamental na
institucionalização da medicina homeopática no Brasil, de desprestigiada ela passou a
ganhar parcela significativa da preferência dos pacientes.
Podemos notar que Joaquim se utilizou da estratégia de advocacia aberta
nesse caso. Conforme Li, Feng e Jiang (2006) formularam, Joaquim Murtinho utiliza a
impressa para defesa pública da mudança de leis e regulamentos, lutava pela cadeira
de medicina homeopática na Faculdade de Medina, assim como pelos privilégios que
o Imperador dava aos alopatas. Escreve no Jornal do Comércio defendendo a
homeopatia e acusa o Imperador de privilegiar a alopatia, os homeopatas “viajavam
por conta própria e não tinham acesso a ordenados, empregos, títulos,
condecorações, brasões.” (FARIA, 1993,p.96) Joaquim alcança seu objetivo de
divulgar a homeopatia, foi um médico de prestigio em seu tempo, viveu o auge da
homeopatia. Faria insinua que o médico graças às polêmicas causadas no jornal
aumentou significativamente sua clientela, ficou conhecido e enriqueceu, prova disso
seria que data dessa época a compra de seu palacete em Santa Teresa, no Rio de
Janeiro, em 1886. Dessa forma, Murtinho tinha habilidade para utilizar a imprensa
fazendo a defesa da criação de um campo em construção, o da medicina
homeopática.
2)Joaquim Murtinho defendeu também o liberalismo econômico e o
conservadorismo monetário. Desde o final do Império havia uma debate entre os
metalistas e os papelistas, os primeiros defendiam que a política monetária deveria ser
contracionista, reduzindo a moeda e o crédito. Os papelistas, ao contrário, defendiam
que a economia precisava de liquidez e crédito, deveria existir expansão da moeda e
do crédito. Os papelistas não tinham base teórica, sua defesa era feita de forma
intuitiva, foram presas fáceis para os metalistas que utilizavam David Hume e David
Ricardo, cujo argumento era favorável a implementação do padrão–ouro. Os
papelistas Barão de Mauá, Rui Barbosa e Vieira Souto encontraram dificuldades com
a predominância do padrão-ouro porque a República Velha foi o apogeu do
conservadorismo monetário. Atualmente são considerados pioneiros e causam grande
admiração, dentre os metalistas podemos citar Rodrigues Alves, Joaquim Murtinho e
Leopoldo Bulhões. (FRANCO, 2011)
Segundo Debes (1977) a escolha de Murtinho para o ministério da Fazenda
decorre da identificação liberal com o presidente Campos Sales. Desde quando
Rodrigues Alves estava na pasta, durante o governo de Prudente de Moraes, já
haviam negociações com os ingleses para obtenção de empréstimos na Inglaterra, em
1898 “ o país estava pronto para um esforço consolidado de ajustamento das finanças
públicas” (FRANCO, 2011, p.18); Campos Sales e Murtinho vão a Londres discutir os
detalhes do Funding Loan, que reestruturou a dívida pública através de empréstimos,
para isso o governo brasileiro deveria cumprir severas medidas de saneamento fiscal
e financeiro. O governo em três anos “saldaria seus compromisso relativos a juros dos
empréstimos federias anteriores ao funding com títulos de um novo empréstimo –
fuding loan - ... a emissão poderia se elevar a 10 milhões de libras.” (FRANCO, 1990,
p.27). Murtinho executa o plano com rigor, a receita foi aumentada através dos
impostos sobre consumo e direitos alfandegários. Houve contenção de despesas e
deflação profunda devido a grande retirada da moeda de circulação, em 1898 ocorre
redução de 6%, em 1903 são retirados 13% da moeda em circulação. (FRANCO,
1990) Segundo Carone (1970) o Funding Loan representa a interferência do
capitalismo estrangeiro nas finanças brasileiras, sendo também a contenção monetária
favorável aos importadores e ao capitalismo estrangeiro. O governo Campos Salles é
bastante impopular, os preços dos produtos populares foram encarecidos, contudo
Joaquim Murtinho implementou a política econômica mesmo sofrendo forte oposição,
portanto ele institucionaliza o equilíbrio financeiro brasileiro.
3)No âmbito local Murtinho também imprime mudanças no seu estado natal,
através de suas alianças retira do poder qualquer oligarquia que possa fazer sombra –
retira do cenário político Generoso Ponce em 1899 e Antônio Paes de Barros em 1906
- e comanda a política de 1892 até 1911. Para isso Murtinho por inúmeras vezes
utilizou a estratégia de empreendedores individuais de persuasão privada e de pleitear
exceção, conforme já foi citado consiste argumentação privada junto aos tomadores
de decisão, e também na tentativa de argumentar que o seu caso é digno da exceção
a regra. Joaquim Murtinho conseguiu inúmeros benefícios assim: 1“Sua estratégia
política privilegiava doutrinar, influenciar e formar opinião daqueles que detinham o
poder e o controle sobre a economia do mundo real, e estes, por sua vez, reagiam
pressionando os parlamentares.” (FARIA, 1993,p.235) Do contato com políticos
consegue intervir no seu estado, beneficiar seus parentes e suas empresas. Consegue
com Deodoro da Fonseca a demissão em 1890 do presidente do Mato Grosso,
Antônio Maria Coelho, e também consegue concessões privilegiadas de estradas de
ferro para seus dois irmãos. (FARIA, 1993).
Em 1899 consegue que Campos Sales contrarie a “Política dos Governadores”,
criada por este presidente. De acordo com as regras da “Política dos Governadores” o
presidente deveria apoiar a maioria política formada nos estados Nesse ano, no
estado do Mato Grosso a maioria concentrava-se em torno de Generoso Ponce.
Para livrar-se de seu opositor político Murtinho consegue a exceção a regra:
para Mato Grosso a Política de Campos Sales não foi adotada. Realizada a eleição no
estado vence o candidato de Ponce. Murtinho mobiliza um chefe local, que utilizando-
se da luta armada anula as eleições, tudo ocorre com apoio do presidente da
República. Portanto, no período de 1892 a 1911 só se elegeram presidente do estado
os nomes que antes foram aprovados por Murtinho, assim como os candidatos para o
Senado e Câmara Federal do Mato Grosso (PONCE FILHO, 1952). Indica também
nomeação de juízes no estado (LINS, 2010), apoia grupos armados para a
manutenção de seu poder, o que causa conflitos armados nos anos de 1892, 1899 e
1906. Dessa última Disputa Oligárquica decorre o assassinado do presidente do Mato
Grosso Antônio Paes de Barros.
Entretanto, ao contrário da obra de Faria (1993) não acreditamos que os
acontecimentos de Mato Grosso se devam única e exclusivamente a vontade de
Joaquim Murtinho. Em 1892 Ponce e Murtinho unem-se contra os militares do estado
– lembrando que Joaquim nunca se envolvera pessoalmente nas disputas, ao
contrário de Generoso Ponce que lutou em 1892 e 1906 – alcançando a vitória.
Posteriormente lutam pelo poder e separam-se em 1899. A recomposição ocorre em
1906, quando Ponce e Murtinho unem-se para tirar do poder o então governador
Antônio Paes de Barros, assassinado nessa ocasião. Esse assassinato liga-se mais a
Ponce do que a Murtinho, segundo Carone (1969) Ponce foi o mandante. Defendemos
que, no caso do Mato Grosso, existiu uma correlação de forças: Generoso Ponce não
poderia dominar o estado sem Murtinho, pois este com preponderância federal através
de seus contatos conseguiu formas de desfazer a composição estadual; e Murtinho
também precisava de alguém que executasse seus interesses, pois Ponce gozava de
grande prestígio e em torno de si aglutinavam-se as lideranças locais. Assim, nem
Murtinho era o único mandão político no estado e nem Ponce. Quando eles cindem
em 1906 tiveram que aprender a dividir o poder no estado, não sem tensões, mas eles
aprenderam até 1911, quando os dois morrem.
Na dissertação de mestrado em andamento nossa análise considera que havia
um equilíbrio, mesmo que tenso, entre as oligarquias Ponce e Murtinho. A
predominância foi dos Murtinho – tanto que seu domínio não é interrompido por 19
anos, ao contrário de Ponce que se compondo com Murtinho predomina no estado por
7 anos, passa mais 7 na dissidência e volta a compor-se com Murtinho, passando para
a situação por mais 5 anos. Os Murtinho tinham predominância política, mas
necessitavam de alguém no estado para executar o seu domínio, esse indivíduo
exercia um domínio conjunto. Um dependia do outro, o oligarca Ponce necessitava de
aliança com a esfera federal, porque no Rio de Janeiro se desfazia muitas coisas da
política de Mato Grosso. E Joaquim Murtinho precisava de Ponce, pois com ele
estavam todos os chefes locais, não tendo sido frutífero afastar-se de Ponce. Em 1906
ambos aprenderam que precisam um do outro se quisessem ter poder em Mato
Grosso.
De acordo com a literatura apresentada os empresários institucionais através
de uma conjuntura favorável empreendem a mudança. Considerando se houve para
Murtinho uma conjuntura favorável podemos notar que as instabilidades dos anos
iniciais da República contribuem para empreender a mudança no que se refere ao
âmbito local de seu estado.
Quanto a sua posição no campo, ele não estava no centro se considerarmos o
1)âmbito local e o da 2)medicina, mas estava no centro do campo da 3) economia
nacional. 1) Âmbito local - Murtinho tentou se inserir na política por diversas vezes,
consegue em 1890 no Senado, o que o coloca no cenário nacional e lhe dá prestigio
em seu estado, mas ainda não assegura o predomínio na política local, que vai
acontecer somente em 1892 quando apoia Generoso Ponce utilizando-se de milícia
colocar no governo seu irmão Manuel Murtinho. 2) Na medicina também não estava no
centro, pois o prestígio e apoio governamental estavam com a medicina alopática,
Murtinho enquanto ator ocupava posição menos central no campo, corroborando com
a literatura, e empreendeu a mudança colocando a medicina homeopática em questão
e ganhando prestígio e riqueza. 3) No âmbito da economia nacional Murtinho estava
no centro, mas alguns atores defendem segundo mostra Leca, Battilana e Boxenbaum
(2008) que empresários institucionais podem estar no centro do campo, o que lhes
acrescentaria autoridade formal, considerada um recurso útil para os empreendedores
institucionais, pois ajuda promover o reconhecimento de seu discurso por outros
atores.
É perceptível o capital social de Murtinho, ele transitava entre os círculos de
decisão influenciando tais decisões, construiu campos mobilizando as outras pessoas
e formando coalização política.
Quanto as condições do campo – que se referem ao nível de
institucionalização do campo e práticas institucionais heterogêneas, propiciando
mudanças - de acordo com a conceituação de Dorado. (2005 apud Leca, Battilana e
Boxenbaum, 2008) Dos três campos apresentados na seção anterior consideramos
que em dois campos Murtinho teve “oportunidade transparente” para mudança, e um
“oportunidade nebulosa”.
Fonte: Dorado. (2005 apud Leca, Battilana e Boxenbaum, 2008)
1)No âmbito da economia federal existia uma “oportunidade transparente” para
mudança, pois havia alguma institucionalização e os arranjos institucionais eram
heterogêneos. Como já haviam passados 9 anos desde que o novo regime se
instaurara, de modo que o governo de Prudente de Moraes, mesmo que tenha
enfrentado diversas instabilidades, já existe em curso o processo de
institucionalização da República essa frase está solta, Cardoso (2006, p.51)
argumenta que a aliança entre os republicanos históricos com os jacobinos militares
produziu um sentimento de respeito a lei, os militares não aceitariam infringir a
Constituição para derrubar o presidente. O autor denomina de “crença na ordem
republicana” torna possível a transição de Floriano para Prudente de Moraes. Assim,
Campo de Ação Tipo de oportunidade
1) Economia brasileira Oportunidade transparente
2) Medicina Homeopática Oportunidade transparente
3)Política do Mato Grosso Oportunidade nebulosa
em um árduo processo para institucionalização do novo regime, Campos Sales e
Joaquim assumem com já alguma institucionalização, e então a completam, quando
deixam o governo o Estado está política e economicamente consolidado, no sentido
de como a República Velha é conhecida historicamente: pela “Política dos
Governadores”, pela “Política do Café com Leite”, pelo pacto das Oligarquias e pelo
Coronelismo. Portanto, com uma “oportunidade transparente” foi possível o equilíbrio
financeiro do país.
2) Na medicina também já havia alguma institucionalização das práticas, pois
antes de 1840 já existiam médicos homeopatas no país, que divulgavam a
homeopatia. Murtinho começa seus trabalhos em defesa da homeopatia em 1880.
Consideramos que existiam arranjos heterogêneos, conforme Faria (1993) e Tardelli
(2005) existiam correntes em disputa dentro da homeopatia. Assim, com a
“oportunidade transparente” a medicina homeopática ganhou credibilidade.
3)No que se refere ao Mato Grosso acreditamos existir um campo de
“oportunidade nebulosa”, isso explica como a mudança se realizou através da
violência da milícia de Ponce, com apoio de Murtinho. Entre os anos de 1889 a 1892
havia baixa institucionalização da República, foram realizados pleitos que são
anulados, elucidando a disputa local entre militares e as oligarquias, reflexo do
contexto de disputa nacional.
Nossa hipótese de que Joaquim Murtinho foi um empreendedor institucional
necessitava de uma análise com ênfase na sua importância em todos os campos em
que colaborou. Os estudos que foram feitos sobre Murtinho partem da motivação de
exaltá-lo ou criticá-lo. Seu principal biografo, Corrêa Filho (1951), partiu da admiração
por seu conterrâneo escreveu uma obra para exaltar os seus feitos. O outro estudo
sobre Joaquim foi feito por Faria (1993) sua motivação inicial foi contestar a imagem
de Joaquim Murtinho como um grande estadista, o autor se posiciona contra o
liberalismo de Murtinho, combatendo arduamente. Faria apresenta grande
conhecimento sobre Joaquim Murtinho, mas sua análise é unilateral, sem nenhum
afastamento do personagem.
CONCLUSÃO
O nascimento, influências, críticas e debates da Teoria Neinstitucional foram
recuperados tendo em vista que o conceito mobilizado continha intrínseca relação com
a teoria que está inserida, pois o conceito de empreendedor institucional é uma crítica
a teoria Neoinstitucional. Como foi exemplificado cada um dos Neoinstitucionalismos
desenvolvem-se baseados no postulado de que as instituições moldam, constrangem
o comportamento dos indivíduos. O conceito de empresário institucional procura
resolver o problema do determinismo das instituições que engessam a ação individual
e também elucida como ocorrem mudanças em um contexto institucional. O
empresário institucional é a organização ou o individuo que de uma forma incomum e
inovadora utiliza as instituições criando rupturas e assim novos campos, nos quais tem
interesses.
Joaquim Murtinho foi um empresário institucional por ser responsável por
rupturas que criou novos campos – novo equilíbrio financeiro nacional, nova política
hegemonia no Mato Grosso, ascensão da medicina homeopática. Ressaltando que
contribuíram para mudança institucional também outros fatores, na economia é
importante a participação de Rodrigues Alves e de Campos Salles; no Mato Grosso
existia um equilíbrio mesmo que conflituoso com a oligarquia Ponce; na medicina o
apoio dos militares e a Revolta da Vacina. Cumprindo aqui delimitar o papel de
Murtinho como executor da política econômica que sanou as finanças brasileiras,
política que tinha coerência com as ideias liberais de Murtinho e Campos Salles, assim
como o seu papel de defensor da medicina homeopática, que conforme foi descrito
obteve grande notoriedade como médico, além de ser o único mandão político a
predominar na política de seu estado natal por 19 anos ininterruptos, ao contrário de
Ponce.
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