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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA CENTRO DE CIENCIAS DA SAÚDE – DEPARTAMENTO DE MORFOLOGIA Profa.Dra. Ivana Beatrice Mânica da Cruz

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EMBRIOLOGIA HUMANA: FUNDAMENTOS

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1. MECANISMOS, CONCEITOS E PROCESSOS FUNDAMENTAIS PARA A EMBRIOGÊNESE

1.1 Mecanismos Biológicos do Desenvolvimento Humano

O desenvolvimento de animais multicelulares, incluindo o ser humano, possui duas funções

básicas: diferenciação e reprodução. Assim, cada espécie multicelular possui uma “programação ontogenética” estabelecida nos cromossomos da primeira célula que formará o embrião que contem a informação dos fenômenos que levarão a formação de um novo organismo. Hoje sabemos que estes fenômenos não são determinados se e somente se pela genética do individuo! A maior parte dos mesmos é coordenada pela interação entre fatores genético-ambientais. Ou seja, o ambiente interage com a programação ontogenética. Apesar de cada sistema corporal ter um padrão específico de desenvolvimento, existem processos morfogenéticos que são similares e relativamente simples que ocorrem, principalmente ao longo da embriogênese. Como é o material genético (DNA) que comanda a morfogênese antes de revisarmos os principais processos associados ao desenvolvimento vamos comentar alguns aspectos gerais associados a regulação dos genes.

3.2 Regulação da Expressão Gênica e Desenvolvimento Você aprendeu que todas as células que possuem núcleo, contêm no seu interior cópia do

material genético (DNA) associado a proteínas (histônicas e não-histônicas) que está estruturalmente organizado sob a forma de cromossomos. Assim, se possuímos 46 cromossomos isto significa dizer que temos 46 moléculas de DNA associadas a proteínas. Veja bem, se todas as célula possuem, praticamente, o mesmo material genético como estas células fazem para se diferenciar nos diversos tipos celulares existentes no nosso organismo (cerca de 216 tipos de células)? Como estas células conseguem se organizar em tecidos e em formas tridimensionais denominadas órgãos que possuem estruturas e funções específicas? Esta diversidade morfológica vai ocorrer uma vez que nem todas as células do organismo possuem os mesmos genes ativos expressando suas proteínas (ou seja, produzindo moléculas de mRNA (RNA mensageiro) que são usadas para sintetizar proteínas no reticulo endoplasmático rugoso). Sendo assim, a regulação da expressão gênica é o processo chave para o desenvolvimento do organismo.

Com base nesta premissa podemos fazer algumas afirmativas gerais associadas ao fenômeno

da regulação gênica:

(1) Muitos processos biológicos são comuns a todas as células e, portanto a síntese de proteínas é similar em todas as células.

(2) Algumas proteínas são abundantes somente em tipos especializados de células não sendo detectadas em outras células. Por exemplo, a hemoglobina só é produzida pelos eritroblastos e, portanto só é expressa nos glóbulos vermelhos.

(3) Estudos sobre a expressão gênica dos eucariotos sugerem que em uma célula humana típica em qualquer momento do seu ciclo celular ela expressa aproximadamente de 10 a 20 mil genes dos seus 30 mil genes. Quando comparamos a expressão de RNAs entre duas células diferentes podemos observar esta variação na expressão gênica.

(4) O processo de controle da expressão gênica não ocorre somente através do controle da transcrição do RNA. Existem controles chamados “pós-transcricionais”, ou seja, que irão regular se ocorrerá ou não a síntese de uma proteína (regulando a taxa da degradação do mRNA que é uma molécula altamente sensível a enzimas chamadas RNAses ou mesmo

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regulando a formação das estruturas terciárias e quaternária das proteínas que as tornam funcionais).

(5) A regulação da expressão dos genes pode ser alterada como resposta a influencia do ambiente. Ou seja, uma célula pode estar programada para expressar determinado conjunto de genes e esta expressão serem alterada pelo efeito de algum fator ambiental, como por exemplo, a desnutrição (de macro ou micronutrientes), a desidratação, por temperaturas extremas (muito altas ou muito baixas). Alterações genéticas (tanto no DNA quanto nos cromossomos) podem levar as mudanças na expressão dos genes. No caso da embriogênese a alteração na expressão dos genes é muito dramática porque podem ocasionar as chamadas mal-formações (tanto de origem ambiental quanto de origem genética) que serão estudadas posteriormente.

1.3 Principais tipos de Regulação da Expressão Gênica A Figura 1.1 apresenta um esquema geral dos principais tipos de regulação da expressão dos

genes dos eucariotos que são abaixo brevemente comentados. A Figura 1.2 apresenta um esquema geral do gene eucariótico e as principais etapas da produção do RNA (transcrição) até a síntese de proteínas.

Controle transcricional: quando a regulação da expressão de um determinado gene é feito via controle da quantidade de moléculas de RNA produzidas. O controle transcricional pode ser temporário ou mesmo relativamente permanente. Geralmente hormônios, fatores de transcrição, substâncias parácrinas ou mesmo a localização física da célula em um dado local do corpo ou a ação de um determinado fator ambiental agem na regulação da transcrição de um dado gene. Estes fatores podem interromper a expressão do gene (ou seja, a transcrição do RNA é interrompida) ou também podem induzir ou mesmo acelerar ou desacelerar a sua expressão. Uma vez que o fator regulatório não esteja mais presente, a célula volta ao estado original de expressão daquele gene. Ou seja, a regulação transcricional é temporária. Um gene importante para o desenvolvimento inicial do embrião humano é o oct-4. Este gene é um fator de transcrição que se une a uma sequência específica de pares de base no DNA (ATTTGCAT) que está presente em muitos outros genes. Este gene fica ativo no inicio da embriogênese quando as células embrionárias ainda estão em um estado bastante indiferenciado. O gene oct-4 é o primeiro gene cuja expressão é necessária para a determinação da linhagem de células que formarão o embrião que é diferente da linhagem que formará a placenta. O gene oct-4 também se mantem ativo em células não bastante indiferenciadas. Assim, na medida em que as linhagens celulares vão sendo desenvolvidas o gene oct-4 vai diminuindo ou mesmo cessando sua atividade nestas células. se expressa em todas as células embrionárias iniciais (chamadas de blastômeros). Uma vez que quando o zigoto ativa a sua programação genética ele precisa já da proteína OCT-4 os mRNAs iniciais deste gene já estão presentes no óvulo (são oriundos da mãe).

Controle Pós-transcricional: além do controle da quantidade de transcritos produzida por um gene existem outros tipos de regulação da expressão do gene que ocorrem após a transcrição do RNA deste gene. Estes controles pós-transcricionais podem ser agrupados nas seguintes categorias: (1) controle do processamento do mRNA (mecanismo de splicing). O mRNA formado a partir do DNA é conhecido inicialmente como RNA heterogêneo uma vez que tem sequencias que serão extirpadas no momento em que o transcrito passar do núcleo para o citoplasma pelo mecanismo de splicing. Assim, pode ocorrer a produção de um transcrito de RNA heterogêneo e o mesmo não sair do núcleo formando o mRNA maduro; (2) pela seleção dos RNAs que serão traduzidos no reticulo endoplasmático rugoso em proteínas; (3) pela desestabilização seletiva de determinadas moléculas de mRNAs através da degradação por enzimas RNAses; (5) pelo controle da atividade das proteínas através da ativação, desativação, degradação ou compartimentalização seletiva logo após a sua síntese.

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Figura 1.1 Esquema geral mostrando os principais tipos de regulação dos genes eucariotos que estão associadas à embriogênese.

Figura 1.2 Estrutura geral do gene eucariótico. Existe no inicio uma seqüência de bases nitrogenadas que não irá ser molde para a molécula de RNA que é conhecida como região promotora. É nesta região promotora que moléculas regulatórias como hormônios, fatores de transcrição, grupos metila, etc. se ligam e regulam a transcrição dos genes. Logo a seguir existe um códon de iniciação que marca o local a partir do qual o transcrito será produzido. Ao longo da seqüência de bases nitrogenadas que ocorre após o códon de iniciação existem segmentos que darão origem ao mRNA maduro (transcrito) que são denominados exons e segmentos que serão retirados da molécula de RNA (RNA heterogêneo) antes da

DNA

Controle

Transcricional

Permanente e

Temporário

Transcrito

PrimárioControle do

Processamento

(Splicing)

Núcleo Citoplasma

mRNA

Controle do

transporte

Controle da

degradação

mRNA

Inativo/ativo

mRNA

Controle

da tradução

PROTEÍNA

Controle

da atividade

da proteína

Proteína

Ativa/Inativa

1

23

4

5

6

Regulação Gênica de Eucariotos

DNA

Controle

Transcricional

Permanente e

Temporário

Transcrito

PrimárioControle do

Processamento

(Splicing)

Núcleo Citoplasma

mRNA

Controle do

transporte

Controle da

degradação

mRNA

Inativo/ativo

mRNA

Controle

da tradução

PROTEÍNA

Controle

da atividade

da proteína

Proteína

Ativa/Inativa

1

23

4

5

6

Regulação Gênica de Eucariotos

Região

PromotoraCódon

Iniciação

Códon

FinalizaçãoExon 1 Intron 1 Exon 2 Intron 2 Exon 3Região

PromotoraCódon

Iniciação

Códon

FinalizaçãoExon 1 Intron 1 Exon 2 Intron 2 Exon 3

htRNA

Transcrição

Splicing

(Processamento)

mRNA maduro

Proteína

Tradução

NÚCLEO

CITOPLASMA

Região

PromotoraCódon

Iniciação

Códon

FinalizaçãoExon 1 Intron 1 Exon 2 Intron 2 Exon 3Região

PromotoraCódon

Iniciação

Códon

FinalizaçãoExon 1 Intron 1 Exon 2 Intron 2 Exon 3

htRNA

Transcrição

Splicing

(Processamento)

mRNA maduro

Proteína

Tradução

NÚCLEO

CITOPLASMA

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1.4 Silenciamento de genes

Muitos genes só devem funcionar em períodos determinados do desenvolvimento e em outros devem ser desligados, ou seja, “silenciados”! A inativação dos genes ocorre através de processos bioquímicos que serão posteriormente comentados. A seguir serão descritos alguns padrões de silenciamento de genes relacionados a embriogênese. Inativação do cromossomo X: uma vez que as fêmeas dos mamíferos, incluindo as mulheres apresentam dois cromossomos X logo no inicio da embriogênese um dos cromossomos X é inativado. Deste modo, os genes deste cromossomo são silenciados e apenas um cromossomo X se mantem funcional na célula. O que pode ocorrer é que o cromossomo X herdado da mãe permaneça ativo em uma dada linhagem celular enquanto que o cromossomo X herdado do pai é o que permanece ativo em outra linhagem celular. Assim, apesar as mulheres são funcionalmente hemizigóticas para o cromossomo X porque mesmo possuindo este cromossomo duplicado um deles não funcionará. A inativação do cromossomo X ocorre na fase inicial do desenvolvimento quando o embrião ainda tem menos de 100 células. Como esta inativação ocorre? Quando as células entram em mitose a cromatina se condensa fortemente formando os cromossomos que são estruturalmente compostos por DNA e proteínas. No momento em que a mitose é finalizada ao invés dos dois cromossomos X se descondensarem para permitir que seus genes fiquem ativos apenas um cromossomo sexual sofre este processo. O outro permanece condensado podendo ser observado nas células que estão na interfase via microscopia ótica como uma área condensada fortemente corada denominada corpúsculo de Baar ou cromatina sexual. Entretanto, a inativação do cromossomo X não é total. Aproximadamente 25% dos genes do cromossomo X (~ 16 genes) que está condensado escapam a inativação e continuam se expressando. A maioria destes genes está localizada no braço curto do cromossomo X. Doze genes que permanecem ativos são homólogos a genes presentes no cromossomo Y. Outros genes têm inativação variável, às vezes estão inativos em alguns indivíduos e outras vezes estão ativos. O processo que leva a inativação do cromossomo X está relacionado ao gene XIST localizado no cromossomo X. O produto do gene XIST codifica um RNA maduro que é encontrado somente no cromossomo X inativado (no ativo não encontramos a proteína X). O gene XIST, portanto determina o padrão de inativação e inicia o silenciamento dos genes do cromossomo X. Entretanto, para que o processo seja mantido os genes precisarão sofrer outros processos bioquímicos como é o caso da metilação que será posteriormente comentada. No processo de formação dos gametas femininos (oogênese) será preciso que o cromossomo X inativo seja novamente reativado. O processo de reativação do cromossomo X ocorre pela ação da enzima 5-azacitina que irá inibir o processo de metilação. Também ocorrerá diminuição da expressão do gene XIST. Metilação gênica: muitos genes que também estão presentes nos cromossomos autossômicos que funcionam em determinados momentos da vida não podem funcionar em outros sob pena de alterarem as funções corporais. Para tanto, estes genes precisam ser desligados. Padrões chamados de metilação e acetilação constituem bons exemplos deste tipo de regulação gênica. Em termos moleculares a metilação consiste em uma modificação na molécula do DNA pela sua ligação com um composto químico metila (grupamento CH3). O grupo metila liga-se especificamente a base nitrogenada citosina que geralmente precede uma guanina (grupos CpG). Esta ligação é mediada por enzimas denominadas DNA metiltransferases. Regiões promotoras são ricas em dinucleotídeos CG e uma vez que ocorre a ligação com o grupo metila o gene não responde mais a estímulos internos e externos e, portanto, não transcreve mais moléculas de RNA. Assim, dizemos que ele foi desligado. Os genes metilados podem ser desmetilados pela ação das enzimas desmetilases. Pode também ocorrer desmetilação passiva no qual acontece sem ação enzimática. A metilação do DNA ocorre quase que exclusivamente em CpG de células que já estão diferenciadas. A metilação do DNA controla várias funções do genoma que são essenciais na embriogênese normal. A Figura 1.3 mostra um esquema que indica que os padrões de metilação são bastante altos na vida adulta. Entretanto, logo após a formação a fecudação quando o genoma do zigoto é ativado as taxas de metilação caem na medida em que as células se dividem porque os genes que estavam desligados precisam ser expressos a fim de garantir o rápido crescimento do embrião bem como a sua implantação no útero materno. Entretanto, logo depois, quando as células

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embrionárias ainda não começaram a se diferenciar as taxas de metilação do genoma voltam a aumentar indicando “desligamento de novo dos genes”.

Figura 1.3 Padrão de metilação do genoma ao longo do desenvolvimento humano. Como pode ser visto logo após a fecundação os genes desligados voltam a serem ativados via desmetilação. Ainda quando o embrião não passa de um pequeno aglomerado de células (fase de blástula) os padrões de metilação voltam a aumentar. Portanto, existem genes que funcionam só no período muito inicial da embriogênese.

Entretanto, a ligação da metila com a citosina torna este local do DNA mais suscetível a mutações. Caso a citosina seja, por exemplo, substituída por uma timina a célula que herdar este DNA não irá metilar esta região. A consequência é que este gene pode voltar a ser ativado. Este processo está correlacionado a doenças com destaque ao câncer. Muitos tipos de câncer estão associados ao que chamamos de hipometilação do DNA. Atualmente uma quantidade robusta de estudos tem demonstrado a importância clinica na alteração destes padrões de metilação tanto para o desenvolvimento embrionário que podem levar, não só a mal-formações, mas também ao aumento de riscos de doenças na idade adulta ou na velhice do individuo afetado. A associação entre metilação, nutrição, desenvolvimento embrionário e doenças neuropsiquiátricas, câncer e cardiovasculares no adulto e idoso serão posteriormente comentadas.

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Figura 1.4 Esquema geral (modificado de Aguilera e colaboradores, 2010) que sugere influência ambiental materna nos padrões de metilação relacionados a doenças prevalentes em idosos.

A ação de moléculas sobre o DNA como é o caso da metilação é conhecida como epigenética. O termo epigenética surgiu na metade do século XX após estudos que correlacionaram às bases genéticas e embriológicas. Atualmente a epigenética é definida como o estudo das modificações do DNA e das histonas que são herdáveis e não alteram a sequência de bases do DNA. Além da metilação, o material genético pode sofrer outros processos epigenéticos como a acetilação e a fosforilação. Padrões de metilação são fortemente influenciados pelo ambiente já que os grupos metilas são obtidos, principalmente a partir de alimentos ricos em folato como é o caso dos vegetais verdes escuros (brócolis, couve, rúcula, espinafre, etc.). Estados desnutricionais podem alterar os padrões de metilação embrionária que aumentam a suscetibilidade dos indivíduos a doenças crônicas como as cardiovasculares (principalmente por elevar o risco de obesidade e hipertensão ainda na adolescência) e problemas comportamentais e psiquiátricos como a esquizofrenia. A associação entre estado nutricional do feto ao nascer (avaliada pelo peso corporal e o peso da placenta) com maior risco de doenças crônicas foi estabelecida pelo pesquisador Dr. Barker, pesquisador inglês em 1989. Esta associação foi posteriormente descrita em estudos realizados em outros países. Alguns acharam resultados similares e outros não. Portanto, para alguns a teoria de Barker é controversa já que existem diversos fatores que podem influenciar o peso corporal do feto. Mas em geral as pesquisas experimentais e epidemiológicas apoiam tal ideia que ficou conhecida como “hipótese de Barker”, “imprinting fetal” ou mesmo “síndrome metabólica fetal”. A base biológica que explicaria esta maior suscetibilidade a doenças no feto que tem menos de 2.400 kg ao nascer estaria apoiada em alterações no padrão de metilação embrionária e também na ocorrência de um menor número de células do sistema cardiovascular na criança de baixo peso. A Figura 1.4 mostra um esquema modificado da revisão feita pelos pesquisadores espanhóis Aguilera e colaboradores (2010). O esquema foi organizado a partir de um grande número de evidências experimentais e epidemiológicas que indica que os padrões de metilação podem ser alterados por fatores ambientais aumentando assim a desaceleração do envelhecimento ou, o risco de doenças crônicas e a aceleração do envelhecimento biológico.

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Figura 1.4 Esquema geral da Hipótese de Barker mostrando o efeito da desnutrição no metabolismo fetal que aumenta a suscetibilidade de doenças cardiometabólicas e cardiovasculares no adulto e idoso. Imprinting genômico: antigamente pensávamos que a herança genética mendeliana funcionava para a totalidade dos nossos genes com padrões de dominância, recessividade e codominância que são bem estabelecidos. Entretanto, em alguns casos se observa que apenas um dos alelos de um dado gene (ou o alelo materno ou o alelo paterno) irá ser normalmente expresso. Ou seja, o alelo herdado de um dos progenitores irá se comportar de forma distinta do alelo herdado pelo outro progenitor. Esse fenômeno denomina-se imprinting genômico. O imprinting poderá ser responsável pelo fato de algumas doenças ocorrerem quando o gene responsável é herdado da mãe e outras quando o alelo é herdado do pai. Este fenômeno foi descoberto no inicio dos anos 80 a partir de resultados obtidos em experimentos com rato. Na década de 90 foram descobertos os primeiros genes imprintados e hoje já foram identificados mais de 20 genes humanos que sofrem imprinting genômico. Os pesquisadores estimam que deva existir entre 100 a 500 genes “imprintados”. Um exemplo de gene imprintado é o fator de crescimento similar a insulina (IGF-2) localizado no cromossomo 11. Este gene está imprimintado no cromossomo de origem materna e deste modo é ativo apenas no cromossomo paterno. Ou seja, herdamos o gene tanto da mãe quanto do pai, mas apenas o gene presente no cromossomo herdado pelo pai estará ativo. Caso, ocorra algum problema genético com o alelo do pai, isto poderá desencadear em alterações no individuo. Em camundongos, quando o gene IGF-2 é herdado do pai o tamanho corporal dos animais é normal. Entretanto, se ele herdar o alelo da mãe os camundongos terão fenótipo anão. Sabe-se que os genes imprintados estão geralmente relacionados ao crescimento embrionário e também ao desenvolvimento comportamental. Portanto, o imprinting está associado a algumas síndromes como a síndrome de Prader-Willi e a Síndrome de Algelman. A síndrome de Prader-Willi ocorre pela perda da função de genes localizados no cromossomo 15 e se caracteriza por obesidade, mãos e pés pequenos, baixa estatura, hipogonadismo e retardo mental. Em mais ou menos 70% dos casos ocorre deleção da região 15q11-q13 do cromossomo paterno. Nesta situação o gene que deveria ser expresso pelo pai, pois o alelo materno está inativo pelo imprinting não existe. Como não existe, o individuo fica ser a produção dos genes que

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existe nesta região e por isto desenvolve as características da síndrome. Geralmente a inativação do alelo ou materno ou paterno (conforme o gene) se dará via metilação ainda na gametogênese. Outro exemplo de imprinting genomico é da condição chamada mola hidatiforme. Esta se caracteriza pelo desenvolvimento excessivo dos tecidos que irão originar a placenta do embrião. Isto pode ocorrer como resultado da fecundação do óvulo por dois espermatozoides ou pela duplicação do prónucleo masculino em um óvulo que tenha perdido o prónucleo feminino (óvulo vazio)

1.4 Conceitos Fundamentais Associados à Embriogênese Ao estudarmos embriologia existem alguns conceitos que precisam ser considerados incluindo os descritos a seguir: Determinação: na denomina-se determinação o estado que uma célula ou um grupo de células adquire no seu desenvolvimento cito-morfogenético. Portanto, a determinação ocorre antes que as modificações morfo-funcionais sejam visíveis. Geralmente este estado de determinação é irreversível. Modulação: processos pelo qual as células adquirem características que podem ser revertidas e que podem até mesmo desaparecer depois de um tempo. Estes processos dependem de fatores regulatórios e é genericamente conhecido como modulação. Morfógenos: tanto na determinação quanto na modulação as moléculas que induzem modificações nas células são conhecidas como morfógenos. Potencialidade evolutiva: uma célula pode dar origem a mais que um tipo diferente de células. Este processo é denominado potencialidade evolutiva celular. Quanto maior o número diferente de células que uma dada célula possui maior a sua potencialidade evolutiva. Aquelas células embrionárias iniciais que tem capacidade de dar origem a todas as células do corpo do embrião são conhecidas como células totipotentes. Todas as células que dão origem a um maior ou menor número de células diferentes são conhecidas como células-troncos. O embrião possui uma grande quantidade de células-tronco (células embrionárias). Entretanto indivíduos adultos também possuem células-troncos com propriedades regenerativas. Este é o caso das células-tronco que regeram constantemente nossos epitélios, nossos ossos, pelos, etc. Indução: os órgãos são estruturas tridimensionais, complexas, compostas por diversos tipos de tecidos. A organização precisa de um órgão, é portanto fundamental para a manutenção das suas funções. A coordenação na constucao dos órgãos é regulada por grupos de células que interagem entre si. Esta interação próxima é denominada indução. Portanto, existem células ou tecidos indutores e células ou tecidos induzidos. A capacidade de células ou tecidos responderem a um sinal indutivo específico é denominada competição. Na formação dos órgãos ocorre uma cascata de indução em que ocorrem muitas interações celulares que se induzem de modo recíproco. 1.5 Processos Fundamentais na Morfogênese A embriogênese ocorre através de fenômenos complexos e interativos relacionados principalmente a cinco processos biológicos: divisão celular (mitoses), interações bioquímicas (relacionada à regulação dos genes que possibilita as células se diferenciarem e realizarem funções específicas), movimento celular que permite com que linhagens celulares se movam no organismo que está em formação, adesão celular, processo que fixa as linhagens celulares em determinados locais do embrião a fim de formar órgãos e sistemas estáveis e funcionais e mecanismos de morte celular programada (apoptose) que irá ser um processo chave na escultura dos órgãos que estão sendo formados. O detalhamento destes processos foi descrito no capitulo 1 que versou sobre as bases da biologia celular e do desenvolvimento.

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1.6 Formação dos Tecidos, Órgãos e Sistemas Corporais

A formação dos tecidos, órgãos e sistemas corporais é um evento complexo e altamente organizado. Como os estudos têm permitido identificar os principais passos desta formação é possível organizar os principais eventos e etapas nos chamados “mapas de destino celular”. No caso, cada espécie possui o seu mapa. Aqui estudaremos especificamente o mapa do destino celular do ser humano.

O mapa do destino celular sempre começa no momento da fecundação e da produção das primeiras células embrionárias e vai em direção da formação dos tecidos, órgãos e sistemas corporais. Assim, no mapa celular uma célula embrionária primitiva é uma célula totipotente (tem potencial para diferenciar-se em qualquer tipo de célula) e à medida que o desenvolvimento a avança torna-se pluripotente (pode diferenciar-se em um grupo de tecidos específicos, por exemplo, uma célula mesenquial pode diferenciar-se em músculo, em osso, em cartilagem etc. e finalmente torna-se uma célula determinada ou específica (uma célula com um padrão morfo-funcional específico como, por exemplo, um hepatócito, uma célula epitelial, uma célula muscular, etc). A partir de pesquisas que acompanham a transformação de linhagens celulares totipotentes em determinadas, puderam ser construídos os mapas do destino celular. O mapa do destino celular de um organismo geralmente parte de uma estrutura inicial (o ovo ou as estruturas inicias do embrião) e informa o que cada parte irá ser no organismo formado.

A Figura 1.3 apresenta a primeira etapa do mapa do destino celular do ser humano que consiste na formação dos principais tipos de tecidos corporais. A partir da formação dos tecidos corporais os órgãos, que são estruturas tridimensionais, são formados, bem como, os sistemas corporais representados por vários órgãos que trabalham para a execução de determinadas funções.

Aqui é muito importante salientar que todos os órgãos são formados em maior ou menor grau por quatro tipos de tecidos e/ou células: tecido conjuntivo, tecido epitelial, tecido nervoso e tecido muscular além de outros tecidos específicos.

Porque estes tecidos são importantes? Porque o tecido epitelial geralmente vai participar da delimitação física do órgão, recobrindo-o e também através das glândulas a ele associada. O tecido nervoso é de fundamental importância porque integra a informação que provem deste órgão para o resto do organismo e do organismo para o órgão. O tecido conjuntivo geralmente compõe as células que preenchem o órgão junto com células especializadas deste órgão. Adicionalmente o tecido conjuntivo pode delimitar órgãos realizando a função de nutrição e suporte. O tecido muscular vai contribuir regulando a mobilidade do órgão entre outras funções. Muitos profissionais consideram que existem cinco tecidos fundamentais uma vez que incluem o sangue como um tecido fundamental para o funcionamento e manutenção dos órgãos corporais. Entretanto, o tanto o tecido muscular quanto o tecido sangüíneo são considerados tecidos conjuntivos especializados.

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Figura 1.3 Mapa do destino celular do ser humano. Nesta primeira etapa é mostrada a origem dos

principais tipos de tecidos do organismo. No caso, a endoderme também origina tecido similar ao tecido epitelial que, entretanto recobrirá a parte interna do trato digestivo e tecidos envolvidos na formação de glândulas do sistema digestório.

Zigoto (ovo fertilizado pelo espermatozóide)

Placentas e

Anexos

Embrionários

Massa Celular InternaTrofoblasto

03 Camadas Embrionárias

Ectoderme

Tecido Nervoso

Tecido Epitelial

Mesoderme

Tecidos Conjuntivo

Cartilaginoso Ósseo Muscular Sangue

Endoderme

Conjuntivo

MAPA DO DESTINO CELULAR - I. Formação dos Tecidos

Zigoto (ovo fertilizado pelo espermatozóide)

Placentas e

Anexos

Embrionários

Massa Celular InternaTrofoblasto

03 Camadas Embrionárias

Ectoderme

Tecido Nervoso

Tecido Epitelial

Mesoderme

Tecidos Conjuntivo

Cartilaginoso Ósseo Muscular Sangue

Endoderme

Conjuntivo

MAPA DO DESTINO CELULAR - I. Formação dos Tecidos

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2. SISTEMAS REPRODUTIVOS, CICLOS REPRODUTIVOS E GAMETOGÊNESE

A primeira etapa do ciclo biológico é a formação dos gametas que irão produzir um novo embrião via fecundação e embriogênese. Para estudarmos estes processos (gametogênese, fecundação e embriogênese) é necessário revisarmos aspectos anatômicos e funcionais dos órgãos que compõe o sistema reprodutivo feminino e masculino.

2.2 Sistema Reprodutivo Feminino

As principais estruturas do sistema reprodutivo feminino que estão envolvidas com a fecundação e desenvolvimento embrionário são: os ovários, tubas uterinas, útero e vagina. A Figura 2.1 apresenta um esquema geral do sistema reprodutivo destacando aspectos histológicos.

A vagina é um órgão muscular que praticamente não possui inervações sensoriais nas suas paredes. Dizemos que é uma cavidade virtual uma vez que seu tamanho se adapta a cópula e ao nascimento da criança. Seus aspectos fisiológicos são muito importantes para a dinâmica da fecundação como será posteriormente comentado.

O útero é o órgão no qual o óvulo fertilizado se implanta e se desenvolve durante a gravidez. É histologicamente composto por três camadas teciduais. Um tecido conjuntivo fino no seu exterior que delimita o órgão. O miométrio que é uma camada muscular lisa espessa importante principalmente para as contrações que ocorrem na hora do parto. O endométrio que é a camada mais interna constituída por um epitélio com glândulas e um tecido conjuntivo subjacente. As glândulas mergulham seus túbulos no tecido conjuntivo onde liberam seus produtos. A espessura e as características fisiológicas do endométrio são variáveis ao longo do ciclo menstrual. A descamação do endométrio que leva a ruptura de capilares sangüíneos deste tecido é conhecida como menstruação.

Ligadas ao útero se encontram as tubas uterinas. Estas estruturas medem de 20 a 25 cm e têm um diâmetro semelhante ao de um canudinho de bebidas. Histologicamente as tubas são formadas por duas camadas de tecido muscular liso, sendo uma longitudinal e a outra transversal. Um tecido epitelial ciliado recobre a parte interna das tubas. Esta disposição é importante para os movimentos contráteis e ciliares que empurram o muco e o embrião em direção ao útero. Patologias que levam a imobilidade ciliar estão associadas à infertilidade feminina. A abertura final e dilatada das tubas denomina-se fímbrias. As fimbrias que possuem um aspecto de franjas estão fixadas próximas ao ovário por um tecido conjuntivo. Esta proximidade garante que o óvulo liberado pelo ovário será sugado para o interior da tuba.

Os ovários são os órgãos responsáveis pela formação dos gametas e produção de hormônios relacionados a manutenção das características sexuais secundárias da mulher. Histologicamente os ovários estão divididos na parte medular (mais interna) e cortical. Na medula ovariana encontra-se uma grande concentração de capilares sanguíneos enquanto na parte cortical encontram-se as células que darão origem aos gametas femininos e as células do estroma que produzem hormônios. Histologicamente o ovário é revestido por um epitélio cúbico simples apoiado em um tecido conjuntivo denso (túnica albugínea). O estroma também é um tipo de tecido conjuntivo. A Figura 2.2 apresenta um esquema geral dos tipos de células e período do desenvolvimento das mesmas que é observado no ovário.

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Figura 2.1 Sistema reprodutivo feminino.

Figura 2.2 Aspectos histológicos das células corticais do ovário.

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2.3 Sistema Reprodutivo Masculino

O sistema reprodutor masculino é caracterizado por um conjunto de túbulos com padrões histo-fisiológicos diferenciados que possuem diferentes funções e glândulas. A Figura 2.3 apresenta um esquema geral deste sistema. A genitália externa é formada pelo pênis e o escroto que contém os testículos.

Os testículos são envolvidos por uma camada grossa de tecido conjuntivo denso (túnica albugínea) que emite prolongamentos para o interior do órgão formando septos. Estes septos dividem o testículo em lóbulos. Em cada lóbulo existem de 1 a 4 túbulos seminíferos que estão imersos em um tecido conjuntivo frouxo que possui grande quantidade de vasos sanguíneos, inervações, sistema linfático e células especiais denominadas células intersticiais ou de Leydig. Estas células secretam os hormônios esteróides masculinos.

Os túbulos seminíferos são as estruturas responsáveis pela produção dos espermatozóides (gametas masculinos). Estes túbulos são compostos por dois tipos celulares. As células germinativas em diferentes estágios do desenvolvimento e as células de Sertoli. As células de Sertoli são ligadas umas as outras por junções de oclusão que cria uma barreira entre o sangue e o testículo e assim o movimento de moléculas grandes entre estes compartimentos. Estas estruturas funcionam como um mecanismo de defesa contra a invasão de microorganismos nos testículos. Além disto, estas células auxiliam na nutrição, suporte das células germinativas e na regulação do desenvolvimento dos espermatozóides. Produzem e secretam hormônios como a inibina e a ativina, fatores de crescimento e proteínas ligantes a andrógenos.

As células germinativas (espermatócitos primários, secundários, espermátides, etc.) estão dispostas na parede do túbulo seminífero de tal modo que as células mais jovens estão próximas a parede do túbulo e as espermátides e espermatozóides ao lúmen do túbulo. Esta estrutura permite que os espermatozóides produzidos sejam liberados na luz do túbulo e transportados para uma rede testicular conhecida como túbulos retos. Destes túbulos os espermatozóides que ainda não possuem capacidade de se movimentar sozinhos são empurrados pelo muco em direção ao epidídimo.

O epidídimo é um túbulo único altamente enrolado formado por um epitélio colunar pseudo-estratificado cujas células possuem estéreo-cilios. Sua principal função é o armazenamento dos espermatozóides onde estes gametas também completam a sua maturação cerca de 12 dias após sua chegada nesta estrutura. O epidídimo desemboca em um outro túbulo denominado túbulo deferente que faz a ligação do testículo com as estruturas do sistema reprodutivo masculino que estão no interior da cavidade abdominal e que se liga a uretra por onde é liberado o esperma.

O esperma ou sêmen é um composto que contém espermatozóide e produtos de glândulas que fazem parte do sistema reprodutivo do homem. Associadas aos ductos deferentes que partem cada um de um testículo encontramos as vesículas seminais. As vesículas seminais são responsáveis pela produção de 70% do volume do ejaculado. O inicio do canal uretral é envolvido por uma glândula conhecida como próstata. A próstata na realidade é um conjunto de 30-50 glândulas formadas por epitélio cubóide ou colunar pseudo-estratificado. O seu produto glandular tem como principal função elevar o pH vaginal o que leva ao aumento da motilidade dos espermatozóides. Geralmente a vagina possui um muco que determina um pH mais acidificado com o objetivo de criar uma barreira química contra a invasão de microorganismos. Entretanto, esta acidez também prejudicaria a sobrevivência e função dos espermatozóides por este motivo o pH vaginal deve ser neutralizado.

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Figura 2.3 Sistema Reprodutivo Masculino.

No inicio da uretra que penetra no pênis encontramos as glândulas bulborretais (glândula de

Cowper). Estas glândulas têm como função a secreção de um muco lubrificante. Histologicamente as glândulas bulborretais são revestidas por epitélio cúbico simples. As vesículas seminais e a próstata também produzem enzimas que liquefazem a condensação do sêmen na vagina. Em geral todas as glândulas participam na nutrição dos espermatozóides produzindo compostos como a frutose e a vitamina C (vesículas seminais) o ácido cítrico (próstata). Um componente importante no sêmen é o zinco. Ainda que a sua função seja desconhecida níveis baixos de zinco estão associados a infertilidade masculina.

2.4 Formação dos gametas: a meiose

A reprodução sexual foi um elemento fundamental para a geração da diversidade orgânica que

podemos observar no planeta. Se pensarmos de modo global, tal fenômeno é relativamente simples: a reprodução sexual nada mais é que combinação de duas células oriundas, na grande maioria das vezes, de dois indivíduos de uma mesma espécie. Dado que, não é qualquer tipo de célula que consegue “combinar-se com outra”, chamamos estas células com “potencial combinatório” de gametas. A produção de gametas é altamente complexa. Isto por que, este fenômeno envolve uma série de mecanismos bioquímicos e morfo-citológicos, que uma vez desencadeados permitem a “construção de

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uma estrutura celular diferenciada, que irá conter apenas metade do número cromossômico de uma dada espécie. Dizemos então que cada gameta é haplóide (n). No sexo feminino o gameta é genericamente chamado “óvulo ou ovo”. No caso, cabe dizer que a denominação é estritamente dependente da língua que estamos falando. Na língua Inglesa o estágio de óvulo e ovo é denominado igualmente: egg dependendo se o gameta fundiu-se ou não com o gameta masculino, enquanto na Língua Portuguesa, a célula gamética no estágio que antecede a fusão é denominada de “óvulo”, e no estágio após a fusão com o gameta masculino, tal célula é denominada “ovo ou zigoto”. O primeiro evento que leva a formação gamética (ou seja, a situação de haploidia), sem dúvida, é a ocorrência de uma divisão celular diferenciada, genericamente denominada meiose. Na realidade, a meiose possui três grandes funções que estão diretamente associadas à reprodução sexual e a diversidade gerada por tal fenômeno: 1) reduz o número de cromossomos das células gaméticas, o que permitirá que a mesma se funda com

outro gameta, formando uma célula totipotente, capaz de originar um novo organismo tridimensional a partir de uma única célula (do ovo);

2) O produto final da meiose sempre será quatro células haplóides (n), ainda que no sexo feminino

apenas uma seja funcional (óvulo), enquanto no sexo masculino as quatro são funcionais (espermatozóides);

3) Durante a meiose, podem ocorrer eventos genéticos que levam a troca de segmentos dos

cromossomos homólogos, aumentando com isto a variabilidade dos organismos, portanto a terceira e importante função da meiose é gerar diversidade genética através da recombinação (eventos denominados de permuta ou crossing-over). Estes eventos de recombinação podem ser visualizados em nível de microscopia ótica, por que produzem ligações entre cromossomos homólogos em regiões específicas. Tais ligações são denominadas de “quiasma (singular) ou quiasmata (plural)”.

4) A divisão celular meiótica, ao contrário da mitose, envolve a ocorrência de duas divisões celulares

seqüenciais, que são denominadas de meiose I e meiose II. A Figura 2.4 mostra de modo esquemático as principais etapas da meiose.

2.5 Gametogênese

O desenvolvimento de um organismo multicelular é usualmente iniciado com a fecundação (fertilização) do óvulo pelo espermatozóide. O espermatozóide e o óvulo possuem diferentes papeis para que um novo organismo possa ser gerado. O espermatozóide deve “procurar” o óvulo para poder se fundir com ele e “entregar” a sua parte do conteúdo genético. Esta parte irá então juntar-se a outra metade do óvulo. Por outro lado, o óvulo terá que Ter a capacidade de “responder ao espermatozóide” quando o mesmo o contatar, ignorando o contato de espermatozóides que não seja da sua espécie. Como espermatozóide e óvulo possuem metade do número de cromossomos de uma dada espécie, dizemos que os mesmos são células haplóides (n). Com a fertilização a célula formada retorna ao estado diplóide (2n).

Os gametas são derivados de células germinativas primordiais. Estas células são produzidas pelas

gônadas masculina e feminina, testículos e ovários, respectivamente. A formação de uma linhagem germinativa depende da presença do chamado germoplasma. O germoplasma é um componente citoplasmático diferente que torna as células gaméticas diferentes das células somáticas.

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Quando a linhagem primordial de células germinativas é estabelecida na gônada, as células-tronco desta linhagem dividem-se por mitose para produzir os gametas requeridos para que o organismo se reproduza. Nas gônadas tais linhagens podem estar associadas a outros tipos celulares que auxiliam na nutrição, suporte e proteção das células germinativas. Em geral, as células que dão suporte as células das gônadas são denominadas células foliculares. Podemos reconhecer três fases gerais no processo de formação gamética que serão estudadas com maior profundidade posteriormente:

1ª) Fase proliferativa: durante esta fase as células germinativas são denominadas gônias

(espermatogônia no sexo masculino e oogônia no feminino). Estas células agem como um “tronco celular” que se divide por mitose e garante matéria-prima para a formação gamética. A divisão das células da gônia pode ser incompleta. Se isto ocorre, as células-filhas permanecem comunicadas umas com as outras, por pontes intercelulares. Divisões incompletas sucessivas legam a formação de um grande conjunto de células interconectadas. Esta comunicação intercelular pode servir para sincronizar o desenvolvimento das células associadas.

2ª) Fase de produção dos gametas (gametogênese propriamente dita): Quando o organismo atinge

a maturidade ele adquire a habilidade de tornar os seus gametas funcionais através da meiose. O produto final desta fase será a formação do gameta masculino e feminino. As fases de produção gamética, bem como a sua associação como processo meiótico pode ser visualizada na Figura 2.5.

3ª) Fase de diferenciação gamética: o gameta depois de formado pode passar por processos morfo-funcionais que o tornam apto a fecundar. Esta fase acontece de modo típico na produção do gameta masculino. Isto porque a célula gamética formada terá que se transformar em um espermatozóide funcional. Denominamos este processo de espermiogênese.

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Figura 2.4 Esquema geral da meiose.

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Figura 2.5 Principais etapas da gametogênese masculina e feminina.

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2.6 Espermatogênese No homem, a meiose precede a diferenciação da célula sexual. Dentro dos testículos células precursoras dos gametas irão se dividir por mitose. Tais células são as espermatogônias. Nos vertebrados as espermatogônias são encontradas ao redor da região que dá para a luz de cada túbulo seminífero. Uma espermatogônia cresce e sofre a primeira divisão meiótica transformando-se em espermatócito primário. Esta célula apesar de ser considerada 2n possui seu conjunto cromossômico inteiro duplicado 9 (duplicação das cromátides). Assim, se for um gameta da espécie humana ele possui neste momento 92 cromossomos. Entretanto, cada dois conjuntos de 46 cromossômicos estão unidos por um mesmo centrômero. Por este motivo, é considerado por muitos autores como uma célula 2n. A divisão meiótica continua formando espermatócitos secundários. Cada um dos quais também é 2n. A partir do espermatócito secundário a segunda divisão meiótica completa-se. Dos dois espermatócitos secundários formados, cada um dá origem a duas espermátides com metade do número de cromossomos (n). No final do processo cada espermatogônia diplóide acaba gerando quatro espermátides haplóides. A formação de quatro células haplóides a partir de uma única gônia é importante, porque em geral, machos precisam produzir milhões de espermatozóides simultaneamente para ter potencial de fecundar um óvulo. Muitas espermatogônias podem estar unidas por pontes intercelulares. Quando ocorre a formação das espermátides, estas pontes são perdidas e junto com ela uma parte do conteúdo citoplasmático que não será necessária para a formação do espermatozóide. 2.6.1 Espermiogênese A primeira vez que um espermatozóide foi observado e descrito foi no ano de 1678 por Anton van Leeuwenhoek, um microscopista holândes. Em um primeiro momento, ele pensou que aquela estrutura móvel era uma espécie de parasita que vivia nos testículos dos machos, e portanto, nada tinham haver com a reprodução. Desta concepção que surgiu o nome “espermatozóide ou espermatozoa”, ou seja animais que vivem no esperma. Foi somente em 1824 que Prevost e Dumas descobriram que os espermatozóides ao contrário de serem parasitas eram as células que potencialmente fecundavam o óvulo (células reprodutivas).

Em 1840, von Kollinker descreveu pela primeira vez a formação dos espermatozóides a partir das células testiculares. Apesar da sua grande descoberta, Kollinger ainda pensava que o espermatozóide tinha função somente de “excitar o desenvolvimento embrionário do óvulo” sem que houvesse contato entre os dois gametas. Propôs então que o espermatozóide funcionaria como um magneto. Somente em 1876 se comprovou experimentalmente que o espermatozóide fundia-se com o óvulo para formar um novo ser. Vejamos como uma espermátide transforma-se nesta célula capaz de fundir-se com outra e orientar o desenvolvimento de um organismo.

Todas as estruturas presentes em um espermatozóide maduro são provenientes da transformação de organelas citoplasmáticas presentes no espermatócito. Cada uma destas estruturas terá uma função bem definida a fim de que o gameta possa ter capacidade de fecundar.

Para estudarmos a espermiogênese, acompanhe a Figura 2.6 que descreve as principais partes do espermatozóide e suas respectivas funções. A Figura foi estruturada a partir do esquema apresentado em Gilbert (1994).

Cada espermatózoide é formado por quatro regiões morfologicas definidas: cabeça, pescoço, peça intermediária e flagelo. Na cabeça existe o núcleo onde fica o material genético haplóide. Na região frontal do núcleo observa-se uma outra estrutura denominada acrossomo ou vesícula acrossômica. Esta estrutura é originada a partir do complexo de Golgi. Ela possui uma forma parecida a de um saco que contém enzimas capazes de digerir açucares e proteínas complexas que estão presentes nos envoltórios do óvulo. Segundo autores como Gilbert (1994) podemos considerar o acrossomo como um lissosomo modificado. Em muitas espécies que vivem em ambiente marinho, as

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enzimas presentes no acrossomo podem também servir para o reconhecimento entre os gametas da mesma espécie.

O pescoço faz a ligação entre a cabeça e a peça intermediária. Nesta encontra-se uma grande quantidade de mitocôndrias dispostas ao redor da região inicial do flagelo. A função das mesmas é fornecer energia sob a forma de ATP para que o gameta possa se locomover em direção ao óvulo. Denominamos o conjunto destas mitocôndrias presentes na peça intermediária, de bateria mitocondrial.

Existe uma grande diversidade de espermatozóides na natureza. Entretanto, naqueles grupos animais mais complexos, este costuma ser dotado de uma estrutura propulsora formada por um flagelo. O flagelo como estrutura locomotora origina-se a partir do centríolo que permite o formação de microtúbulos. Os microtúbulos formam a parte motora do flagelo que é denominada axonema. Também no flagelo encontramos uma proteína denominada dineína. A dineína tem como função a hidrólise da adenosina trifosfato (ATP) produzida pelas mitocôndrias. Ela transforma a energia química do ATP em energia mecânica que impulsiona o espermatozóide. Na espécie humana, existem alguns homens que possuem uma deficiência genética denominada Síndrome Tríade de Kartagener. Estes indivíduos não sintetizam dineína e seus espermatozóides não conseguem se locomover. Portanto, estes indivíduos são estéreis.

Figura 2.6 Padrão cito-morfológico do espermatozóide e principais aspectos da espermiogênese

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2.7 Oogênese De modo geral a oogênese é um pouco mais complicada do que a espermatogênese. Isto porque na natureza o óvulo ou ovo produzido apresenta variações importantes e que interferem no desenvolvimento inicial do embrião. Portanto, para estudarmos os mecanismos de oogênese teremos primeiro que considerar os tipos de ovos que existem no Reino Animal. 2.7.1 Características gerais do gameta feminino Os óvulos são classificados em função da quantidade de substâncias nutritiva que eles armazenam. Denominamos o conteúdo nutricional presente no óvulo de vitelo. Existem quatro tipos básicos de óvulos segundo a quantidade e distribuição de vitelo dentro dele. O tipo de ovo irá determinar principalmente como irá acontecer as primeiras divisões celulares do organismo (clivagem) entre outras coisas. No caso, o ser humano possui um ovo do tipo oligolécito que tem pouca quantidade de citoplasma.

De uma forma geral a oogênese mais complexa ocorre em mamíferos, incluindo o homem. A seguir comentaremos os principais aspectos relacionados com a oogênese. A oogônia prolifera-se também por divisão mitótica no ovário assim como ocorre com a espermatogônia. Elas também entram em um período de crescimento tornando-se oócitos primários (que sofrem a primeira divisão meiótica). No ser humano (nos mamíferos em geral) a formação dos oócitos primários é restrita a vida embrionária da mulher. Deste modo, todos os óvulos produzidos pela mulher ou outras fêmeas de mamíferos derivam de oócitos primários que se desenvolveram quando as mesmas eram embriões, e, portanto já se encontravam nos seus ovários quando as mesmas nasceram. O oócito primário completa a primeira divisão meiótica e torna-se um oócito secundário, liberando o primeiro corpúsculo polar. O primeiro corpusculo polar como tem pouco citoplasma, degenera e morre. Potencialmente, quando o oócito secundário termina a divisão meiótica torna-se um óvulo maduro, liberando o segundo corpúsculo polar. Como o segundo corpúsculo polar também morre o número de óvulos produzidos a partir de uma oogônia é um! “Dizemos que potencialmente o oócito secundário dá origem ao óvulo porque na realidade no processo denominado “ovulação” a estrutura expulsa do ovário não é um óvulo maduro, mas ainda é um oócito secundário. Portanto, mulheres só ovulam, caso sejam fecundadas. É bom lembrar que o ovócito secundário já é considerado uma célula haplóide mas contem ainda os cromossomos (material genético) duplicados (tétrades).

Nos seres humanos (em cordados, especialmente em mamíferos) o ocócito primário é envolto por células ovarianas denominadas “células foliculares”. As células foliculares e o oócito produzem microvilosiddades semelhantes a dedos que se interdigitam. O espaço ocupado pelas microvilosidades formada pelas células foliculares e pelo oócito é denominado zona radiata. Estas células terão a função de nutrir o ovócito quando o mesmo for ovulado (ou seja, quando ele deixa o ovário).

Ao longo da oogênese no ovário, com o passar do tempo os espaços entre as células foliculares começam a se encher de líquido formando uma cavidade denominada Antro. As células foliculares formam um estrato epitelial estratificado denominado estrato granuloso. Ao redor do estrato granuloso existe uma camada e tecido conectivo conhecido como teca. A expulsão do ovócito secundário (ovulação) ocorre quando o antro rompe e atira longe o oócito que é sugado pelas tubas uterinas (trompas de Fallopio). A camada de células foliculares que permanece ao redor do ovócito é denominada de corona radiata. O local do folículo rompido que fica vazio após a expulsão do ovócito torna-se uma estrutura denominada corpo lúteo. Caso não haja fecundação, esta estrutura degenera.

2.7.2 Envoltórios e citoplasma do óvulo

Envolvendo o citoplasma do óvulo existe a membrana plasmática. Esta membrana regula o fluxo de determinados íons durante a fecundação e tem a capacidade de se fundir com a membrana do espermatozóide da espécie durante a fecundação. Envolvendo a membrana plasmática no lado de fora do óvulo, existe o envoltório vitelínico. Este é formado por glicoproteínas e é essencial para o reconhecimento do espermatozóide da espécie, principalmente em animais de fecundação externa. Em

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mamíferos, que são animais basicamente de fecundação interna, o envoltório vitelínico é mais fino e denominado zona pelúcida. Esta camada acelular é de grande relevância para a reprodução já que possui diversas funções entre as quais podemos citar: (1) atua como barreira que em geral, permite que apenas espermatozoides da mesma espécie a atravessem; (2) inicia a reação que irá desencadear a fecundação propriamente dita do espermatozoide com o óvulo (reação acrossômica); (3) após a fecundação sofre modificações bioquímicas que impedem a entrada de outros espermatozoides para dentro do óvulo; (4) durante as primeiras etapas da embriogênese funciona como um filtro poroso que pemite a entrada de algumas substâncias provenientes das tubas uterinas e impede a entrada de outras substâncias;(5) serve como barreira imunológica entre os tecidos da maternos e embrionários impedindo que a mãe reconheça o filho como um corpo estranho e o destrua; (6) impede que as células embrionárias inicias que estão sendo produzidas se dissociem e se espalhem; (7) facilita a diferenciação das primeiras camadas celulares que formarão o embrião. Rodeando esta zona encontra-se as células do cúmulos ou corona radiata formada por células foliculares ovarianas.

A região do citoplasma mais próxima a membrana plasmática é denominada cortéx. Durante a fecundação estas moléculas irão formar microfilamentos necessários para o início da divisão celular. Existe também nesta região grânulos corticais que contém enzimas digestivas, mucopolissacarídeos e proteína hialina. Estas substâncias costumam impedir a poliespermia que será abordada no próximo capítulo que trata sobre fecundação. Os grânulos corticaias são estruturas membranosas formadas pelo aparelho de Golgi. Em camundongos existem cerca de 4 mil grânulos corticais enquanto no ouriço existe 15 mil grânulos corticais.

2.7.3 Controle hormonal da ovulação

Em muitas espécies, incluindo o ser humano, a ovulação está associada a um controle hormonal que pode responder a variações ambientais como temperatura, umidade, estado nutricional etc. Este controle é importante por que para muitas espécies que vivem em ambientes cuja a variação de fatores abióticos e bióticos é instável, ele servirá para sinalizar se a mesma deve ou não se reproduzir existindo maior ou menor chance dos embriões gerados chegarem a maturidade. Neste livro estudaremos com maior profundidade a regulação hormonal da ovulação na mulher, nos capítulos que tratarem sobre desenvolvimento embrionário humano. Muito provavelmente em livros textos e disciplinas que versam sobre zoologia e ecologia, você irá encontrar vários exemplos de regulação diferenciada da reprodução segundo as condições ambientais.

A seguir comentaremos os principais aspectos relacionados com a oogênese. A oogônia prolifera-se também por divisão mitótica no ovário assim como ocorre com a espermatogônia. Elas também entram em um período de crescimento tornando-se oócitos primários (que sofrem a primeira divisão meiótica). No ser humano (nos mamíferos em geral) a formação dos oócitos primários é restrita a vida embrionária da mulher. Deste modo, todos os óvulos produzidos pela mulher ou outras fêmeas de mamíferos derivam de oócitos primários que se desenvolveram quando as mesmas eram embriões, e portanto já encontravam-se nos seus ovários quando as mesmas nasceram. O oócito primário completa a primeira divisão meiótica e torna-se um oócito secundário, liberando o primeiro corpúsculo polar. O primeiro corpusculo polar como tem pouco citoplasma, degenera e morre. Potencialmente, quando o oócito secundário termina a divisão meiótica torna-se um óvulo maduro, liberando o segundo corpúsculo polar. Como o segundo corpúsculo polar também morre o número de óvulos produzidos a partir de uma oogônia é um! “Dizemos que potencialmente o oócito secundário dá origem ao óvulo porque na realidade no processo denominado “ovulação” a estrutura expulsa do ovário não é um óvulo maduro, mas ainda é um oócito secundário. Portanto, mulheres só ovulam, caso sejam fecundadas.

Nos seres humanos (em cordados, especialmente em mamíferos) o ocócito primário é envolto por células ovarianas denominadas “células foliculares”. As células foliculares e o oócito produzem microvilosiddades semelhantes a dedos que se interdigitam. O espaço ocupado pelas microvilosidades formada pelas células foliculares e pelo oócito é denominado zona radiata. Estas células terão a função de nutrir o ovócito quando o mesmo for ovulado (ou seja quando ele deixa o ovário).

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Ao longo da oogênese no ovário, com o passar do tempo os espaços entre as células foliculares começam a se encher de líquido formando uma cavidade denominada Antro. As células foliculares formam um estrato epitelial estratificado denomidado estrato granuloso. Ao redor do estrato granuloso existe uma camada e tecido conectivo conhecido como teca. A expulsão do ovócito secundário (ovulação) ocorre quando o antro rompe e atira longe o oócito que é sugado pelas tubas uterinas (trompas de Fallopio). A camada de células foliculares que permanece ao redor do ovócito é denominada de corona radiata. O local do folículo rompido que fica vazio após a expulsão do ovócito torna-se uma estrutura denominada corpo lúteo. Caso não haja fecundação, esta estrutura degenera.

2.7.4 Envoltórios e citoplasma do óvulo

O citoplasma do óvulo é envolvido pela membrana plasmática assim como ocorre em todas as células corporais. Além da estrutura e propriedades comuns a todas as membranas plasmáticas a membrana do óvulo regula o fluxo de determinados íons durante a fecundação e tem a capacidade de se fundir com a membrana do espermatozóide da espécie durante a fecundação. Envolvendo a membrana plasmática no lado de fora do óvulo, existe o envoltório vitelínico. Este é formado por glicoproteínas e é essencial para o reconhecimento do espermatozóide da espécie, sendo denominado zona pelúcida. Rodeando esta zona encontram-se as células que formam a corona radiata.

Durante a fecundação estas moléculas irão formar microfilamentos necessários para o início da divisão celular. Existem também nesta região grânulos corticais que contém enzimas digestivas, mucopolissacarídeos e proteína hialina. Estas substâncias costumam impedir a poliespermia. 2.7.5 Ciclos femininos e controle hormonal

Um esquema geral dos dois ciclos femininos: ovariano e uterino é apresentado na Figura 2.7

2.7.5.1 Ciclo ovariano A ovulação está associada a um controle hormonal que pode responder a variações ambientais

como temperatura, umidade, estado nutricional, etc. A mulher possui dois ciclos concomitantes: o ciclo uterino e o ovariano. Os dois ciclos estão sob controle dos seguintes hormônios:

- Hormônio liberador de gonadotrofinas (GnRH) que é produzido pelo hipotálamo - Hormônio luteinizante (FH) e folículo estimulante (FSH) produzidos pela adenohipófise. - Estrogênio, progesterona e inibina que são produzidos pelo ovário. Os ciclos duram aproximadamente 28 dias e se padronizou o seu inicio a partir do primeiro dia

de menstruação da mulher. Os ciclos estão divididos em fases. No ciclo ovariano as principais fases são: (1) Fase folicular – ocorre crescimento dos folículos secundários. Nesta fase ocorre

aumento gradativo de estrogênio com um pico hormonal que antecede a fase da ovulação.

(2) Fase da ovulação – ocorre a liberação do ovocito secundário a partir do ovário. Nesta fase ocorre um aumento intenso dos hormônios LH e FSH bem como da inibina.

(3) Fase lútea – as células foliculares do ovócito liberado que permaneceram no ovário

começam a secretar hormônios. Uma vez que elas aumentam de tamanho e passam a conter grande quantidade de gordura passam a ser conhecidas como corpo lúteo. Caso não haja fecundação,como anteriormente comentado, o corpo lúteo degenera aproximadamente 28 dias após o inicio do ciclo. O local onde estava o corpo lúteo é observável e conhecido como corpo albicans (corpo branco). Os níveis de progesterona aumentam muito nesta fase. Este hormônio tem um papel importante no preparo do organismo feminino para o desenvolvimento embrionário.

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2.7.5.2 O ciclo menstrual ou uterino O ciclo uterino também possui três fases. A primeira é a fase menstrual (menstruação) caracterizada pela descamação do endométrio com perda de sangue. Esta fase dura aproximadamente 3-5 dias e finaliza em torno do sétimo dia. A seguir inicia a fase proliferativa onde o endométrio volta a crescer Em torno do 14º dia (coincidente a ovulação) o endométrio está histo-fisiologicamente pronto para receber o embrião caso houver fecundação. A terceira fase é denominada fase secretora em que as glândulas endometriais, sob a influência da progesterona, continuam aumentando o seu enrolamento e continuam o seu preparo para a gestação. As células endometriais depositam lipídios e glicogênio no seu citoplasma. Estes depósitos vão fornecer nutrientes para o desenvolvimento embrionário inicial caso haja fecundação. A progesterona também torna o muco produzido pelo colo uterino, mais espesso para que não entrem microrganismos e espermatozóides no interior do útero protegendo assim o embrião em formação. A progesterona possui um efeito termogênico que aumenta a temperatura corporal da mulher na hora de acordar de 34ºC para 36ºC. Esta informação é comumente utilizada para se descobrir se a mulher está tendo ciclos ovulatórios ou anovulatórios.

Figura 2.7 Esquema geral dos dois ciclos femininos (ovariano e uterino). Estes ciclos são hormonalmente regulados.

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3. FECUNDAÇÃO E PRIMEIRA SEMANA DO DESENVOLVIMENTO EMBRIONÁRIO

3.1 Fecundação

A embriogênese inicia a partir do momento da fecundação do óvulo pelo espermatozóide. A fecundação também é um evento complexo e ainda muito estudado. A partir as evidências científicas levantadas, os seguintes eventos podem ser observados na grande maioria dos mamíferos e no ser humano (Figura 3.1).

1) Capacitação 2) Reação acrossômica 3) Fusão com a membrana plasmática 4) Reação de zona (acontecimentos pós-fusão da membrana) 5) Finalização da meiose 6) Fusão dos prónúcleos masculino e feminino

A seguir passaremos a comentar aspectos relacionados a cada um destes eventos:

3.1.1 Capacitação Ao contrário do que possa ser pensado, o trato reprodutivo da fêmea, em especial a vagina, tem um papel muito dinâmico no processo de fecundação. Isto porque os espermatozóides quando são recém-ejaculados dentro deste órgão, ainda não são capazes de fecundar o óvulo (ovócito). Para que eles se tornem potencialmente espermatozóides fecundadores, eles irão ter que passar por um processo denominado de capacitação. Como foi visto no sistema reprodutivo masculino, os espematozóides são banhados por substâncias nutritivas e protetoras (anti-corpos) produzidas por glândulas acessórias. Muitas destas substâncias formam um complexo de glicoproteínas que envolve os espermatozóides e impede-o de fecundar. O fenômeno de capacitação é o da “degradação destas moléculas” tornando-o espermatozóide apto à fecundar. Os mecanismos moleculares deste processo ainda não são bem conhecidos. Entretanto, podemos mimetizar a capacitação in vitro, utilizando solução salina. No ser humano, o fenômeno de capacitação ocorre em 6-7 horas após o espermatozóide estar no trato feminino. Durante o período de capacitação o espermatozóide está movendo-se em direção as tubas uterinas atraído pelo óvulo. Além dos movimentos flagelares, os espermatozóides são auxiliados por ondas de contração muscular da vagina, causadas em parte pela excitação sexual e pela estimulação a movimentação feita por prostaglandinas, uma substância que está presente no esperma.

3.1.2 Reação acrossômica

A ação de milhões de espermatozóides (capacitados) juntos circundando a corona radiata, acaba facilitando a passagem dos gametas através desta primeira camada de célula que envolve o ovócito. É importante salientar que se os espermatozóides não estiverem capacitados eles ficam presos na matriz da corona radiata, além do que a “ação conjunta” dos espermatozóides neste processo é fundamental. Portanto, ao contrário do que possa ser pensado, o espermatozóide não tem um comportamento “competitivo” em relação a outro espermatozóide, mas sim um “comportamento cooperativo”. Caso houvesse uma competição para ver que iria fecundar antes o óvulo, certamente as espécies teriam evoluído para a produção de um ou poucos “super-espermatozóides”. Não é o caso, sabe-se que, a baixa concentração de espermatozóides no sêmen, ao contrário de favorecer, prejudica e pode inclusive levar a infertilidade masculina. Uma das enzimas envolvidas na reação acrossômica é a é a hialuronidase que auxilia a desencadear o processo. Esta enzima é uma lisina liberada pelo acrossomo que dissolve mucopolissacarídeos e o ácido hialuronico presentes na corona radiata. Assim que um espermatozóide liga-se a zona pelúcida (que é similar ao envoltório vitelínico em espécies de fecundação externa), ocorre a

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reação acrossômica. A reação acrossômica pode ser dividida segundo Gilbert (1994) em duas fases: 1ª Fase - Ligação primária do espermatozóide à zona pelúcida: a reação acrossômica ocorre quando, estimulado pela zona pelúcida, a região anterior da cabeça do espermatozóide funde-se ao acrossomo, e as enzimas localizadas nesta estrutura são liberadas.

Figura 3.1 Principais fases da fecundação.

3.1.3 Fusão da membrana plasmática do espermatozóide com a do óvulo Após a reação acrossômica, ocorre a fusão da membrana plasmática dos dois gametas. A fusão é um processo dinâmico mediado por proteínas fusogênicas presentes no espermatozóide. A divisão celular acontecerá, entretanto o tamanho das células formadas serão menores do que a primeira célula. Deste modo o embrião em formação permanece com o mesmo tamanho original durante a clivagem.

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Quando o embrião contém cerca de 8-16 células ele é denominado mórula por possuir uma estrutura semelhante a uma amora. Logo após este período ocorre o fenômeno da compactação. A compactação ocorre porque os blastômeros mais externos se aderem uns ao outros através de junções comunicantes entre as células que aumenta a sua interação para que ocorram trocas de compostos bioquímicos relacionados a diferenciação. 3.1.4 Reação de zona Logo após a fusão das duas membranas, um processo citoplasmático é desencadeado como modo de impedir a poliespermia Em mamíferos, a reação de zona não produz uma membrana de fecundação, mas o efeito é o mesmo. No caso de mamíferos, incluindo o ser humano, o bloqueio a poliespermia é rápido e ocorre do seguinte modo: a membrana sofre despolarização e grânulos corticais presentes no córtex do óvulo são ejetados para o espaço previtelínico (espaço entre a membrana plasmática e a zona pelúcida). Este processo (reação de zona), acaba inativando os receptores espermáticos presentes na zona pelúcida, impedindo a entrada de outros espermatozóides. Têm sido proposto que esta inativação ocorre porque os grânulos corticais contém uma enzima que “corta um açúcar presente na região terminal da proteína ZP3 impedindo que a mesma ligue-se a outros espermatozóides.

3.1.5 Ativação do óvulo e finalização da meiose A despolarização da membrana envolve liberação de íons de Ca 2+ armazenados em organelas como o retículo endoplasmático que estão presentes dentro do citoplasma do óvulo. A liberação destes íons ativa o metabolismo do óvulo. O pH do citoplasma aumenta, o consumo de oxigênio também e a síntese de proteínas também aumenta e a segunda divisão meiótica é finalizada, havendo liberação do segundo corpúsculo polar.. A fusão total do espermatozóide com o óvulo não ocorre até que todos os componentes do espermatozóide, exceto sua membrana plasmática não penetre dentro do óvulo. Em mamíferos todo este processo ocorre em cerca de 12 horas. Após a fecundação e ativação do zigoto uma série de eventos será desencadeada a fim de transformar uma única célula em um corpo tridimensional com cerca de 216 tipos de células que compõe tecidos, órgãos e sistemas. Os principais eventos relacionados à embriologia são comentados a seguir:

3.2 Principais eventos da 1ª Semana de Desenvolvimento Embrionária

Este período é também chamado de período da CLIVAGEM. Isto porque irá acontecer uma intensa divisão mitótica. Entretanto, em comparação com outras espécies de animais a clivagem nos seres humanos é relativamente lenta. Esta fase do desenvolvimento embrionário ocorrerá enquanto o embrião se move da tuba em direção ao útero materno.

5.2.1 Principais características da clivagem e formação do blastocisto

Acompanhe o texto através das Figuras 3.2 e 3.3 que apresentam de modo sintético as principais transformações que ocorrem nesta fase. As células que são formadas a partir da mitose são denominadas blastômeros. No embrião humano os blastômeros não têm o mesmo tamanho (existem blastômeros maiores e outros menores) isto porque a quantidade de citoplasma não é dividida igualmente. Alguns blastômeros se dividem longitudinalmente e outros transversalmente. Com base nestas características a clivagem de mamíferos e do ser humano é denominada clivagem holoblástica rotacional.

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Formação do blastocisto: aproximadamente quatro dias após a fecundação blastômeros começam a secretar líquido formando uma cavidade interna no embrião conhecido como blastocele. Se não tiver acontecido a compactação não ocorrerá a formação da blastocele e portanto o embrião se tornará inviável. O embrião neste estágio é denominado blastocisto. Neste estágio reconhecemos dois tipos células: o trofoblasto – células externas que circundam e delimitam o embrião; e a massa celular interna- agrupamento de células que fica concentrado em uma das extremidades do blastocisto. A extremidade que contém estas células passa a ser conhecida como pólo animal e a que contém a blastocele é denominada de pólo vegetal. Destino das duas camadas celulares (formação do disco bilaminar): o trofoblasto irá participar da formação de estruturas anexas ao embrião que são vitais para a sua sobrevivência como a placenta e o saco coriônico onde o embrião permanecerá ao longo do seu desenvolvimento. A massa celular interna irá dar origem às estruturas embrionárias (embrião propriamente dito) e também a estruturas anexas importantes no desenvolvimento. A formação do disco bilaminar (blastocisto) representa o primeiro processo de citodiferenciação do embrião. Experimentos têm demonstrado que a posição dos blastômeros é fundamental na formação do trofoblasto e massa celular interna. Ou seja, quando uma célula mais externa é colocada na parte mais interna e vice-versa a célula que formaria trofoblasto acaba formando a massa celular interna sendo o contrário também verdadeiro. Durante todo o período da ovulação, fecundação e clivagem que ocorre ao longo do transporte do embrião da tuba uterina em direção ao útero à zona pelúcida será mantida. Esta estrutura só será degradada por ocasião da chegada do embrião ao útero da mãe.

3.2.2 Implantação do Embrião no Endométrio Uterino Outro evento de máxima importância que ocorrerá no final da primeira semana (6-7 dias após a fecundação) é o início da implantação do embrião no útero materno. Um comentário interessante de ser feito é que a Organização Mundial de Saúde considera que a gravidez propriamente dita começa a partir do momento que a implantação é finalizada. - A dissolução da zona pelúcida indica que o embrião está apto a se implantar no útero materno. As principais características da implantação serão comentadas a seguir:

- Estágio 1: Fase de adesão: para que a implantação ocorra o endométrio precisa estar devidamente preparado e receptivo. A receptividade endometrial a implantação é modulada pela ação de hormônios estradiol (uma forma ativa do estrogênio) e a progesterona. Existem também outras substâncias que

serão vitais para o processo de implantação como a interleucina 1 beta (IL-1), fator de ativação de

plaquetas (PAF), fator de crescimento insulínico (IGF), fator de necrose tumoral (TNF). Estes fatores participam de um processo denominado “sinalização celular” que é a comunicação química entre o embrião e o endométrio uterino a fim de que ocorra a implantação. Além destes compostos a implantação acontecerá pela presença de moléculas denominadas integrinas. Estas são moléculas de adesão celular (ou seja, induzem a adesão de células específicas em um dado local, no caso a adesão do embrião ao endométrio). As integrinas estão presentes tanto na membrana celular das células do embrião quanto na membrana celular das células endometriais. Deste modo, as integrinas ligam-se entre si por meio de glicoproteínas. Existem vários tipos de integrinas produzidas pelo corpo humano. Anatomicamente o embrião se implantará no endométrio através do seu pólo animal. Esta observação sugere que apesar das células do trofoblastos serem cito-anatomicamente idênticas pode ser que funcionalmente as mesmas sejam diferenciadas existindo produção de moléculas que fazem com que as células do trofoblasto localizadas acima da massa celular interna sejam as responsáveis pela implantação. (Figura 3.4)

- Estágio 2: Fase de penetração do embrião – nesta fase as células do trofoblastos passam a ser denominadas de sinciciotrofoblasto e citototrofoblasto. As células do sinciciotrofoblasto serão aquelas localizadas acima da massa celular interna e que se aderiram ao endométrio. As demais células

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trofoblásticas que delimitam o restante do embrião são denominadas de citotrofoblasto. As células do sinciciotrofoblasto começam a se dividir rapidamente e formam uma massa polinucleada sem membrana celular que as separem. Esta massa produz substâncias, principalmente enzimas que degradam a matriz celular que une as células do endométrio. Nestes espaços as células do sinciciotrofoblastos penetram o endométrio. Assim dizemos que o sinciciotrofoblasto inicial é um tecido altamente invasivo. A produção de moléculas como a interleucina-2 impede que a mãe reconheça o embrião como um elemento estranho ao corpo (antígeno) atacando e destruindo através do seu sistema imune. Ou seja, impede que ocorra uma reação imunológica contra o embrião. Os tecidos maternos erodidos servirão para nutrir o embrião nesta fase.

Figura 3.2 Síntese dos principais momentos da clivagem que ocorre na primeira semana de vida embrionária até a formação do disco bilaminar conhecido como blastocisto. Figura 3.3 Blastocisto.

Fusão dosPró-Núcleos

Feminino e

Masculino

Zigoto imediatamentese divide em duas

células.

uma delas se dividirá

longitudinalmente e

outra Transversalmente

Fecundação

Zona

Pelúcida

Mórula

CompactaçãoBlástula

Trofoblasto

Massa Celular Interna

Blastocele

Fusão dosPró-Núcleos

Feminino e

Masculino

Fusão dosPró-Núcleos

Feminino e

Masculino

Zigoto imediatamentese divide em duas

células.

uma delas se dividirá

longitudinalmente e

outra Transversalmente

Zigoto imediatamentese divide em duas

células.

uma delas se dividirá

longitudinalmente e

outra Transversalmente

Fecundação

Zona

Pelúcida

FecundaçãoFecundação

Zona

Pelúcida

Mórula

Compactação

Mórula

CompactaçãoBlástula

Trofoblasto

Massa Celular Interna

Blastocele

Blástula

Trofoblasto

Massa Celular Interna

Blastocele

BLASTOCISTO

Massa Celular Interna

Trofoblasto

POLO

ANIMAL

POLO

VEGETAL

Blastocele

BLASTOCISTO

Massa Celular Interna

Trofoblasto

POLO

ANIMAL

POLO

VEGETAL

Blastocele

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Figura 3.4 Primeiro estágio da implantação embrionária caracterizado pela adesão das células do embrião as células do endométrio. Este processo é mediado por diversas moléculas destacando-se o papel das integrinas que estão presentes tanto nas células embrionárias quanto maternas e que se ligam entre si.

-Trofinas

-Integrinas

Implantação

-Trofinas

-Integrinas

Implantação

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4. SEGUNDA SEMANA DE DESENVOLVIMENTO E FORMAÇÃO DOS ANEXOS EMBRIONÁRIOS

4.1 Aspectos gerais

A segunda semana do desenvolvimento embrionário marca o final da implantação embrionária e a formação das principais cavidades embrionárias que serão importantes para a morfogênese e manutenção do embrião no útero materno. Adicionalmente, neste período ocorre o inicio da formação dos anexos embrionários: saco gestacional, placenta e cordão umbilical.

É a partir da segunda semana embrionário que os destinos das células e tecidos começam a ser moldados. A Figura 4.1 apresenta um mapa geral dos aspectos da embriogênese relacionados não só a 2ª semana, mas também a 3ª semana da embriogênese.

Já a Figura 4.2 apresenta sinteticamente a formação inicial destas estruturas que ocorre na 2ª semana do desenvolvimento embrionário. Como pode ser visto o trofoblasto irá formar o sinciciotrofoblasto e o citotrofoblasto que estão relacionados a formação da placenta e saco gestacional. A massa celular interna se dividirá em duas camadas: o epiblasto e o hipoblasto. Estas camadas estarão inicialmente relacionadas a formação de cavidades embrionárias que ocorre na segunda semana do desenvolvimento embrionário. Posteriormente também participarão da formação do embrião.

A cavidade interna (blastocele) passa a ser conhecida como saco vitelinico primitivo.

As cavidades formadas neste período são: (1) cavidade amniótica que produzirá o espaço necessário para formação do tubo neural do embrião e de outras estruturas; (2) saco vitelínico secundário que dará origem a cavidade gastrointestinal do organismo e (3) a cavidade que dará origem ao saco gestacional (córion) onde o embrião permanecerá até nascer.

4.1 Destino embrionário do trofoblasto

No final da primeira semana embrionária temos um blastocisto com uma massa celular interna e uma única camada de célula circundante denominada trofoblasto. Logo no inicio da segunda semana, o trofoblasto se divide em dois tecidos diferenciados: o sinciciotrofoboblasto e o citotrofoblasto. O sinciciotrofoblasto estará relacionado a formação da placenta do embrião e o citotrofoblasto com a formação do saco gestacional onde o embrião fica alojado ao longo do seu desenvolvimento.

4.1.2 O sinciciotrofoblasto e a formação da placenta

O sinciciotrofoblasto é composto pelas células do trofoblasto que se localizam acima da massa celular interna. Estas células produzem moléculas que têm a capacidade de erodir o tecido endometrial materno. Além disto tais células possuem uma alta taxa mitótica que produz células que invadem o endométrio. Assim as células do sinciotrofoblasto são responsáveis pela formação da parte fetal da placenta.

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Figura 4.1 Esquema geral dos destinos embrionários da 1ª a 3ª semana de desenvolvimento embrionário

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Antes de comentarmos os aspectos embriológicos deste processo vamos falar um pouco da importância da placenta no desenvolvimento. O embrião, para se desenvolver precisara de um suporte nutricional e de trocas de gases, compostos e resíduos com o organismo da mãe. Estas funções vão ser desempenhadas basicamente por um órgão temporário denominado placenta. A placenta é constituída de dois componentes: uma porção fetal formada por tecidos do embrião (saco coriônico) e outra materna formada pelo endométrio. Essa característica faz com que a placenta seja um órgão fetomaterno. Assim sabemos que este órgão possui as seguintes funções: proteção, nutrição, respiração, excreção e produção de hormônios. Após o parto a placenta é logo expelida do útero.

A placenta é constitui a reserva fetal de energia sob a forma de glicogênio até o 3º mês de vida intrauterina. A partir deste período o feto já desenvolveu um fígado funcional que passa a realizar esta função.

A parte materna da placenta também é chamada decídua que é considerada camada funcional do endométrio onde está sendo desenvolvido o embrião. Caso não ocorra fecundação, como já foi anteriormente comentado o endométrio da mulher descama. Ao contrário uma vez que haja a fecundação a ação de hormônios (principalmente progesterona) fará com que ocorram alterações histo-funcionais importantes no endométrio que são conhecidas como reação da decídua.

Inicialmente, as células endometriais que possuem grande reserva de glicogênio e lipídios irão ser responsáveis pela nutrição do feto. Elas também vão regular até onde ocorrerá a invasão do tecido embrionário (sinciciotrofoblasto) para o interior do útero.

Principais regiões da decídua (endométrio gravítico)

1ª) Decídua basal – é aquela que fica bem na frente do embrião implantado e que dará origem a parte materna da placenta.

2ª) Decídua capsular- é aquela região do endométrio que fica na parte oposta (pólo vegetativo) do embrião e que cicatriza e fecha o embrião dentro do endométrio.

3ª ) Decídua parietal- é o restante do endométrio que envolve o embrião.

Em uma gravidez precoce estas três regiões podem ser reconhecidas através de um exame de ultra-sonografia.

A formação da placenta ocorre em dois períodos bem definidos: o primeiro é o período pré-viloso que acontece entre o 6º e 13º dia de desenvolvimento embrionário. Ou seja, ocorre na segunda semana de desenvolvimento embrionário. O segundo período, o período viloso começa a se desenvolver a partir da 3ª semana de desenvolvimento embrionário e vai até o término da gestação.

Período Pré-viloso

Os principais eventos deste período são sintetizados a seguir:

- Como dizemos anteriormente, logo após a implantação do blastocisto o trofoblasto se diferencia em duas camadas: citotrofoblasto (que delimita o embrião) e sinciciotrofoblasto que se localiza acima da massa celular interna do embrião (pólo animal) e que irá invadir o tecido endometrial

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- As células do sinciciotrofoblasto começam a se multiplicar com uma rapidez enorme a ponto de não realizarem mais citocinese (separação das células filhas em células individuais) apenas realizando cariocinese (divisão dos núcleos).

- Esta divisão muito rápida produz uma massa citoplasmática multinucleada que a medida que avança vai degradando a matriz extracelular do endométrio e matando algumas células. A degradação destas estruturas servirá como produção de nutrientes para o embrião que está em pleno desenvolvimento. Esta estrutura é conhecida como sincício.

- Entre o 9º e o 13º dia começam a surgir lacunas (espaços sem massa citoplasmática) dentro do sincício que são separadas por membranas (trabéculas). Ao mesmo tempo que estas lacunas surgem o sincício começa a erodir (destruir) os capilares sanguíneos presentes no endométrio.

- Entre o 11º e 12º dia a erosão destes vasos faz com que o sangue da mãe entre para o meio das lacunas que foram formadas no sincício. Estas lacunas são chamadas de lacunas trofoblásticas.

- Este processo vai continuar até a 4ª semana quando o embrião já começa a produzir sangue e as trocas entre o sangue materno e fetal começam a acontecer.

Período Viloso

Estas lacunas formam vilosidades terciárias que são a estrutura principal da placenta. Quando uma mulher grávida não tem um ciclo menstrual regular o que torna difícil estimar a idade do feto, através de exame de ultra-sonografia pode ser medido o saco gestacional (córion ou saco coriônico) para avaliar a idade do embrião. Quando o embrião tem cerca de 31 dias este saco mede de 2-3mm.

A placenta vai aumentado de tamanho na medida em que ocorre o crescimento do feto. Quando completamente desenvolvida cobre 15 a 30% da decídua. A Figura 4.1 mostra o aspecto geral da formação da placenta e sua relação com o embrião humano.

Figura 4.2 Esquema geral do desenvolvimento humano sob o ponto de vista dos anexos embrionários: placenta, cordão umbilical e saco gestacional. Fonte da figura:

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Funções da Placenta e Clínica Relacionada

A placenta é um órgão altamente permeável o que significa que poucas moléculas ela não deixa passar da mãe para o feto e do feto para a mãe. Por exemplo, ela impede a passagem de toxinas e alguns hormônios. Alguns comentários adicionais sobre a função placentária e respectivos problemas clínicos associados a estas funções devem ser feitos:

Metabolismo placentário: a placenta irá nutrir o embrião/feto desde praticamente o inicio da gestação. A nutrição ocorre pela capacidade das células placentárias em sintetizarem grande quantidade de glicogênio, colesterol e ácidos graxos. A placenta irá transportar estes compostos principalmente através de difusão facilitada, transporte ativo e pinocitose.

Defeito na placenta que permite a passagem de hemáceas denomina-se eritroblastose. Alguns microorganismos conseguem através a placenta como é o caso do Trepanema pallidum que causa sífilis.

Secreção endócrina (hormonal) da placenta: o sinciciotrofoblasto (parte fetal) é a parte da placenta que produz hormônios a partir de moléculas precursoras que vieram da mãe.

Os hormônios placentários são: gonadotrofina coriônica humana, lactogênio placentário humano, tirotrofina coriônica humana, adrenocortitrofina coriônica humana, e os hormônios esteróides estrógeno e progesterona. A gonadotrofina coriônica tem como principal função manter o corpo lúteo ativo após a implantação embrionária. Já a progesterona tem como função, a partir do terceiro mês de gravidez impedir as contrações uterinas que poderiam levar a expulsão do feto do útero.

Principais patologias da placenta

Relacionadas a implantação embrionária: a implantação do embrião geralmente ocorre no terço superior do útero. Quando a implantação ocorre próxima do colo uterino temos uma condição conhecida como placenta prévia que pode levar a quadros hemorrágicos durante o parto. Placenta prévia é a principal causa de hemorragia no terceiro trimestre da gravidez. Outra condição clinica relacionada a implantação é conhecida como placenta acreta (condição rara) que ocorre quando as células do sinciciotrofoblasto invadem o miométrio (camada muscular) do útero. No momento do parto também o desprendimento da placenta pode levar a um quadro hemorrágico grave. Ambas situações inspiram cuidado e ainda podem ser causa de morte no parto.

Relacionadas a distúrbios da circulação sanguínea: uma condição chamada infarto placentário pode atingir quase toda a placenta causada pelo deslocamento da placenta. O infarto placentário interrompe o suprimento sanguíneo materno impedindo as trocas com o feto.

Corangiomas: tumor benigno que ocorre na parte fetal da placenta e pode causar problemas ao feto durante o trabalho de parto.

Placentites: problemas causados por agentes infecciosos como por exemplo pela rubéola (vírus) que provoca lesões placentárias acompanhadas muitas vezes de anormalidades no feto. A doença parasitária mais importante da placenta é a toxoplasmose que leva a inflamações crônicas das vilosidades coriônicas. A toxoplasmose é assintomática nos seres humanos (hospedeiro intermediário) e afeta felinos (gatos).

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4.2 Formação das cavidades embrionárias

A partir da formação do sinciciotrofoblasto que é o tecido localizado acima da massa celular interna que invade o endométrio, e o citotrofoblasto que delimita o embrião, a massa celular interna se diferencia em duas camadas: o epiblasto e o hipoblasto. A cavidade interna (blastocele) passa a ser conhecida como saco vitelinico primitivo.

4.2.1 Formação da cavidade aminótica

O epiblasto é formado pelas células que estão localizadas próximas ao sinciciotrofoblasto. O epiblasto formado passa a secretar um liquido que forma uma cavidade chamada cavidade amniótica. Esta cavidade tem como principal objetivo garantir espaço para formação posterior do tubo neural que dará origem ao sistema nervoso do embrião e e outras estruturas que ocorrerá durante a terceira semana embrionária.

4.2.2. Formação da cavidade coriônica (que forma o saco gestacional ou córion)

A outra camada formada a partir da massa celular interna, o hipoblasto é a que esta em contato com a blastocele. Células oriundas desta camada começam a se dividir e a crescer formando uma nova camada multicelular adjacente ao citotrofoblasto. Esta camada é conhecida como membrana de Heuser. Nesta fase, a cavidade formada pelo citotrofoblasto e a membrana de Heuser é conhecida como saco vitelínico primititivo.

Logo a seguir células laterais do epiblasto começam a se dividir intensamente formando uma nova camada múltipla de células que fica entre o citotrofoblasto e a membrana de Heuser. Estas nova camada é conhecida como mesoderma extra-embrionário. Assim que ela é formada, começa um evento contrário no qual uma parte das células do mesoderma extra-embrionário entram em apoptose e morrem. Apenas as células que estão adjacentes ao hipoblasto e adjacentes ao citotrofoblasto é que permanecem vivas. As células intermediárias que morreram dão origem a uma cavidade com liquido chamada celoma extra-embrionário.

Assim, o citotrofoblasto e as células do mesoderma extra-embrionário darão origem ao saco gestacional onde o embrião irá se desenvolver. Cabe comentar que o saco gestacional também é formado por células do endométrio materno já que o embrião está se desenvolvendo no interior do útero.

4.2.3 Outras estruturas formadas

O saco vitelínico primário diminui de tamanho e forma uma estrutura denominada saco vitelínico secundário.

Um espessamento celular é observado em uma das regiões laterais do hipoblasto formando a placa pré-cordal que marca o local da futura boca do embrião.

As células do mesoderma extraembrionário que não morreram e que estão localizadas acima da cavidade amniótica formam o pedúnculo de ligação que posteriormente dá origem ao cordão umbilical.

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5. TERCEIRA SEMANA DE DESENVOLVIMENTO

A terceira semana de desenvolvimento embrionário é conhecida como a fase da gastrulação e envolve a ocorrência dos seguintes fenômenos: (1) formação da linha primitiva; (2) formação das três camadas germinativas (ectoderme, mesoderme e endoderme) – fase conhecida como gastrulação; (3) formação da notocorda; (4) formação do tubo neural (neurulação); (5) formação da crista neural; (6) formação do alantóide; (7) destino embrionário do mesoderma e dos somitos.Podemos dizer que a terceira semana embrionária é dramática e vital para o desenvolvimento. Ela é marcada pelos seguintes eventos.

A Figura 7.1 apresenta um esquema geral das principais figuras formadas durante a terceira semana de desenvolvimento embrionário.

5.1 Formação da linha primitiva

Como foi comentado anteriormente a cavidade amniótica serve para dar espaço para que uma série de eventos ocorram nas duas camadas originadas da massa celular interna: o epiblasto e o hipoblasto. É importante comentar que no final da segunda semana de desenvolvimento embrionário em uma das extremidades o hipoblasto forma uma estrutura chamada placa pré-cordal que dará origem a boca do embrião. Exatamente na região central da camada de células que forma o epiblasto começa ocorrer um espessamento de células conhecido como linha primitiva.

A linha primitiva começa a crescer, primeiro em direção a placa pré-cordal (que passa a se chamar membrana bucofaríngea) e depois, um pouco mais lentamente, em direção a região que irá formar a membrana cloacal. A linha primitiva identifica o eixo anteroposterior do embrião e o seu lado direito-esquerdo e é fundamental para a formação posterior do tubo neural.

5.2 Formação das três camadas germinativas

Neste momento começa a formação das chamadas “camadas germinativas” que são o ectoderma, mesoderma e endoderma. No caso, o ectoderma será formado a partir das células do epiblasto.

O endoderma se origina das células do hipoblasto. Ambas camadas, na realidade já estão já estão presentes no embrião desde a segunda semana do desenvolvimento embrionário. Assim o mesoderma é a ultima camada embrionária a ser formada. Esta se forma a partir de células do epiblasto que se soltam (delaminação), se dispõe na região intermediária entre o epiblasto e o hipoblasto e ali se multiplicam.

O ectoderma irá dar origem ao sistema nervoso central, a epiderme e a outras estruturais sensoriais como a retina.

O mesoderma irá dar origem às células ósseas, musculares, cartilaginosas, ao tecido conjuntivo, rins, e gônadas. O endoderma dará origem à camada interna (revestimento) dos intestinos, órgãos gastrointestinais anexos, ao pulmão, fígado e ao pâncreas.

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5.3 Formação da notocorda

Mais ou menos na região central da linha primitiva ocorre a formação de um pequeno amontoado de células conhecido como nó-primitivo. As células do nó primitivo começam a migrar pra dentro do mesoderma embrionário formando uma estrutura conhecida como sulco neural. Paralelo a formação do suco neural células da endoderme (antigo hipoblasto) também começam a migrar para dentro do mesoderma embrionário.

A migração destas células faz com que ocorra uma espécie de dobramento de células da endoderme no interior da camada mesodérmica que da origem a uma estrutura em forma de um bastão celular condensado que se desenvolve inicialmente em direção a placa pré-cordal e depois em direção a membrana clocal.

Este bastão celular se desprende da camada endodérmica formando a notocorda. A notocorda é uma estrutura temporária nos mamíferos e no homem que serve: (1) como mecanismo inicial de sustentação do embrião; (2) como indutora da diferenciação dos somitos que irão originar diversas estruturas corporais; (2) como indutora da neurulação (induz a formação tubo neural do embrião).

5.4 Neurulação (formação do tubo neural)

A partir da formação do sulco neural ocorre as células que migram para dentro da camada mesodérmica se aprofundam e formam a chamada placa neural. Esta placa acaba se dobrando totalmente e se desprendendo da camada ectodérmica formando uma estrutura conhecida como tubo neural. Este tubo, inicialmente é aberto nas suas extremidades conhecidas como neurósporo anterior (localizada onde se originará a cabeça) e neurósporo anterior (localizada onde finalizará a formação da medula espinhal). Posteriormente, os neurósporos se fecham (em torno do se fecham (em torno do 21-22º dia) para que a efetiva formação do sistema nervoso central possa ocorrer.

5.5 Formação da crista neural

Quando ocorre o dobramento da placa neural, algumas células se soltam (delaminam) e ficam entre o tubo neural que está sendo formado e a camada do ectoderma que dará origem a epiderme. Estas células constituem a crista neural (caracterizada por uma massa achatada de células). A crista neural produz um conjunto muito grande de estruturas do embrião e por isto é muitas vezes denominada de quarta camada germinativa. A crista neural dá origem aos gânglios sensitivos dos nervos espinhais e cranianos (V, VII, XI e X). Outras células da crista neural migram em várias direções e se dispersam pelo mesênquima. As cristas neurais também formam as abinhas dos nervos periféricos (células de Schwann), as meninges, células pigmentadas, da medula da adrenal entre outras. 5.6 Formação do alantóide

Esta estrutura é um pequeno divertículo em forma de uma salsicha que aparece ao redor do 16º dia. Esta estrutura se origina por evaginação de células do saco vitelínico que penetram no pedículo do embrião. O alantóide está relacionado a formação da células sangüíneas que formam o sangue do embrião. O sangue do embrião começa a ser efetivamente produzido a partir da quinta semana de desenvolvimento embrionário. Mais tarde ao longo da embriogênese as células sangüíneas passam a ser produzidas no fígado, baço, medula óssea e linfonodos. Adicionalmente, são formados vasos sangüíneos

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no alantóide que se tornam as artérias e veia umbilicais. O alantóide também está relacionado com o desenvolvimento da bexiga urinária.

5.7 Destino embrionário do mesoderma e dos somitos

A notocorda formada divide a camada mesodérmica no meio sendo possível reconhecer, a partir daí, três regiões mesodérmicas que darão origem a diferentes estruturas do embrião.

Mesoderma paraxial: é o mesoderma que está mais próximo a notocorda. Este mesoderma da

origem a blocos de tecido conjuntivo que formam estruturas em forma de cubos chamadas somitos. Os somitos são estruturas que dão origem ao esqueleto axial (ossos do crânio, coluna vertebral, costelas e esterno), aos músculos associados e a derme. Os somitos formam-se aos pares estando localizados de ambos os lados do tubo neural. Um total de 42-44 somitos são formados. Uma cavidade em forma de fenda, denominada miocele aparece em cada somito e depois logo desaparece. Como os somitos são proeminentes e visíveis eles são utilizados como marcadores para a determinação da idade do embrião.

Mesoderma intermediário: este mesoderma está localizado logo após o mesoderma paraxial e

é o precursor da formação do sistema urogenital. Neste mesoderma também encontramos a chamada área cardiogênica que dará origem ao coração do embrião. A partir do sangue e dos vasos sanguíneos formados no alantoide aparecem espaços que são forrados por endotélio derivado das células mesenquimais. Estes vasos primitivos se unem e passam a constituir o sistema cardiovascular primitivo. No final da terceira semana existe um par de tubos endocárdicos (coração primitivo) ligados aos vasos sangüíneos e as membranas extra-embrionárias.

Mesoderma lateral: as células mesodérmicas que ficam do lado das extremidades do embrião

são conhecidas como mesoderma lateral. Este mesoderma dará origem: ao celoma intra-embrionário (cavidade no interior do embrião) que por sua vez, originára as três principais cavidades corporais: (1) cavidade pericárdica, (2) cavidades pleurais e (3) cavidade peritoneal.

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6. DESENVOLVIMENTO DA 4ª A 8ª SEMANA EMBRIONÁRIA

A 3ª semana de desenvolvimento embrionário é considerada critica já que contato com agentes teratógenos pode provocar anomalias congênitas e até mesmo levar a morte do embrião. Este período também irá influenciar os processos ontogenéticos que ocorrem entre a 4ª e a 8ª semana embrionárias. Os principais processos de diferenciação que ocorrerão neste período são comentados a seguir:

6.1 Quarta semana embrionária: - O dobramento do embrião no plano médio o que o torna uma estrutura que inicialmente era achatada em uma forma cilíndrica. Na parte mediana está o tubo neural e nas suas laterais os somitos. Que continuam a se formar neste período. - O embrião triplica o seu tamanho - O dobramento do plano médio produz as seguintes estruturas: pregas cefálicas, prega caudal; - As regiões cefálica e caudal se curvam ventralmente e o embrião fica com uma forma de C - Os primórdios do coração que começaram a se desenvolver na terceira semana bem como a membrana orofarígea, com o dobramento embrionário deslocam-se para a superfície ventral do embrião - Parte do saco vitelínico é incorporada ao embrião para formar o intestino anterior, primórdio da faringe e esôfago - O dobramento da prega caudal que ocorre um pouco mais tarde que a cefálica faz com que parte do saco vitelínico forme o intestino posterior - Depois que ocorre o dobramento o pedúnculo embrionário que dá origem ao cordão umbilical fica preso a superfície ventral do embrião. - São formadas pregas laterais também que ao longo do dobramento fazem com que parte do saco vitelínico origine os primórdios do intestino delgado. - As pregas cefálicas dão origem a estruturas denominadas arcos que irão formar regiões importantes da cabeça e pescoço. 6.2 Quinta semana embrionária: - Desenvolvimento dos brotos dos membros superiores que têm a forma de remo e dos brotos inferiores que tem a forma de nadadeira. - O inicio da formação dos dedos - Crescimento rápido da cabeça, com desenvolvimento mais acelerado do encéfalo em relação as demais partes corporais. 6.3 Sexta-sétima embrionária - Continuação do desenvolvimento dos membros superiores como o cotovelo e das grandes placas das mãos -O ouvido começa a se desenvolver a partir de saliências auriculares em torno da fenda faríngea - O olho também passa a ser evidente por causa da formação do pigmento da retina 6.4 Sétima semana embrionária: - Os futuros dedos ficam claramente definidos - Inicio da ossificação dos ossos dos membros superiores

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6.5 Oitava semana embrionária: - Alongamento e separação completa dos dedos - Primeiros movimentos voluntários dos membros - Região do pescoço torna-se bem definida e pálpebras mais evidentes - Cauda desaparece - Embrião apresenta as características humanas 6.6 Período fetal

A partir da nona semana começa o chamado período fetal sendo que a maior parte do desenvolvimento dos órgãos corporais já foi determinada e passa a ocorrer.

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7. DIFERENCIAÇÃO EMBRIONÁRIA DOS SEXOS

7.1 Diferenciação dos sexos

Assim que ocorre a fecundação o sexo genético do indivíduo é estabelecido através da presença de dois cromossomos XX (mulheres) ou um cromossomo X e outro Y (homens). Entretanto, o processo de diferenciação sexual é classicamente dividido em quatro fases: (1) a determinação do sexo cromossômico, que é estabelecida na fertilização; (2) a diferenciação das gônadas em testículos ou em ovários; (3) a diferenciação dos genitais internos e externos masculinos ou femininos a partir de estruturas indiferenciadas presentes no embrião, que é dependente da presença ou ausência de testículos; e (4) a diferenciação sexual secundária, que é a resposta de vários tecidos aos hormônios produzidos pelas gônadas para completar o fenótipo sexual.

Assim, podemos dizer que o sistema genital é composto por três partes morfo-funcionais. A primeira parte inclui os órgãos sexuais primários (testículos e ovários) se origina de células

primordiais indiferenciadas que estão presentes no endoderma do saco vitelínico em uma região próxima ao alantoide.

A segunda parte inclui o sistema genital tubular que não mulher é composto pelas tubas uteinas, útero, colo do útero (cérvix) e parte anterior da vagina e que na mulher é composto pelos ductos deferentes, eferentes e ductos seminíferos. O sistema tubular é derivado de ductos embrionários conhecidos como ducto de Müller (ducto paramesonéfrico) e ducto de Wolff (ducto mesonéfrico).

A terceira parte inclui a genitália externa que na mulher é formada pela vulva, vestíbulo, vagina

posterior, glândulas vestibulares maiores (Bartholin) e clitóris e no homem é formado pelo pênis e a bolsa escrotal. A genitália externa deriva do seio urogenital, pregas urogenitais e tubérculo genital tanto nos homens quanto nas mulheres.

Como ocorre a diferenciação destas estruturas será a seguir comentado: No mesoderma intermediário ocorre a formação do trato urogenital inferior interno a partir da

diferenciação de dois conjuntos de ductos, os ductos de Wolff e ductos de Müller, os quais estão presentes precocemente em ambos os sexos. Como já foi comentado anteriormente, nas mulheres os ductos de Muller irão originar as tubas uterinas, o útero e a parte superior da vagina, enquanto os ductos de Wolff persistem na forma vestigial.

Nos homens os ductos de Wolff irão originar o epidídimo, os vasos deferentes, a vesícula seminal o ducto ejaculatório ocorrendo regressão dos ductos de Muller. No caso, o desenvolvimento dos ductos de Müller e de Wolff é dependente do controle hormonal.

Nos homens, a presença de uma glicoproteína secretada pelas células de Sertoli denominada hormônio antimülleriano (AMH ou MIF - Fator de inibição Mülleriano), é fundamental para a regressão dos ductos de Müller na 6ª semana da embriogênese. Já, a testosterona, secretada pelos testículos a partir da 8º semana vai estimular a diferenciação dos ductos de Wolff.

Portanto, um passo essencial na diferenciação do sexo é a manutenção dos ductos de Müller no sexo feminino e a sua regressão no sexo masculino. Na ausência de qualquer hormônio (anti-mülleriano e testosterona), o caminho natural da diferenciação é a formação da genitália interna feminina, ou seja, a manutenção dos ductos de Müller.

Entre a 4ª e a 6ª semana de vida intra-uterina algumas células originadas no endoderma dão origem as células germinativas que irão posteriormente ou formar as oôgonias ou formar as espermatogônias, conforme o sexo do embrião. Enquanto estas células começam a se diferenciar ocorre a formação de pequenas protuberâncias celulares, denominadas de crista genital. Estas células se localizam no ducto de Wolff (também denominado ducto mesonéfrico) e se diferenciam na 5ª semana embrionária. Em torno da 4º a 6º semana, as células germinativas migram para este local.

Uma série de eventos moleculares regula estas diferentes etapas da diferenciação sexual incluindo: proliferação das células germinativas, migração das células germinativas para um local no

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embrião conhecido como crista urogenital, formação ou dos ovários ou dos testículos e conforme o sexo genético.

Entretanto, o sexo fenotípico, ou seja, a diferenciação sexual não irá ocorrer no embrião até que se inicie a 7ª semana de desenvolvimento embrionário. Até lá existe um período chamado de período indiferenciado. Os primórdios das gônadas sexuais se desenvolvem aproximadamente no 32º dia após a fecundação no mesoderma intermediário que forma o mesonefro. Inicialmente as células das gônadas são completamente somáticas. Porém, até o final da 3ª semana de desenvolvimento embrionário algumas células endodérmicas do saco vitelínico dão origem às células germinativas primordiais que irão dar origem, por sua vez as oogônias ou espermatogônias conforme o sexo genético do embrião. As células que se originam próxima do alantoide, na 6ª semana de desenvolvimento migram (com movimentos amoebóides) até o local onde as gônadas estarão se diferenciando.

7.2 Indução da diferenciação sexual masculina A determinação testicular foi inicialmente relacionada à existência de um gene no braço curto do

cromossomo Y, denominado TDF (Testis Determining Factor). Entre o gene responsável por tal determinação foi identificado após 30 anos de pesquisas. Este gene foi então denominado SRY (Sex-determining Region on the Y chromosome). Apesar da grande importância do gene SRY para a diferenciação do sexo masculino este é um gene pequeno consistindo de um único éxon que codifica uma proteína com 204 aminoácidos. A proteína SRY possui 79 aminoácidos e atua como um fator de regulação da transcrição.

A expressão do gene SRY começa em torno da 6ª semana de desenvolvimento embrionário o que coincide com o inicio da diferenciação das gônadas primordiais em testículos. A sua principal função é induzir a diferenciação das células de Sertoli que, por sua vez desencadeiam a produção de testosterona que é de fundamental importância para a diferenciação sexual do embrião masculino. A expressão do gene SRY persiste em baixa quantidade nas células de Sertoli e nas células espermatogônias.

Ainda que o gene SRY seja fundamental para a determinação testicular existem evidências que sugerem a ocorrência de outros genes importantes para o processo de gonadogênese (formação dos testículos). Nos mamíferos, outro gene de fundamental importância para a diferenciação sexual é o gene WT-1 (Wilms Tumor supressor locus –gene 1). O gene WT-1 é um gene autossômico localizado no cromossomo 11 (11p13) que é essencial para o desenvolvimento do sistema urogenital. Este gene se expressa nas células que darão origem as gônadas, antes que ocorra a expressão do gene SRY e dos genes que determinam a formação do ovário. A partir da 6ª semana o produto do gene WT-1 já é detectado no embrião humano. No caso, a proteína WT1 ativa a transcrição do gene SRY.

Outro gene importante para a diferenciação sexual é o gene SF-1 (Steroidogenic Factor-1) que se expressa quando a gônada dos mamíferos ainda está na fase indiferenciada.

A formação dos ovários parece ser dependente da ausência da expressão do gene SRY (que ocorre quando o embrião não possui o cromossomo Y) e da expressão de pelo menos dois genes conhecidos: o gene DAX-1 e o gene WNT4. Também é importante salientar que para o desenvolvimento ovariano no embrião feminino o mesmo deve possuir a presença dos dois cromossomos X íntegros. Caso isto não ocorra os folículos ovarianos degeneram e a gônada se torna disgenética.

A Figura 7.1 mostra um esquema geral do processo de diferenciação sexual destacando a ação de alguns genes importantes para que este processo ocorra.

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Figura 7.1 Esquema geral da diferenciação do sexo destacando a ação de alguns genes como o SF-1, WT1, SRY, DAX-1 e WNT4a entre outros.

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8. MAL FORMAÇÕES EMBRIONÁRIAS

8.1 Considerações gerais e epidemiologia

Denomina-se malformações congênitas aquelas que dão origem a problemas morfofisiológicos que ocorreram ao longo do desenvolvimento embrionário. No início do século XIX Etienne Geoffroy cunhou o termo teratologia que literalmente significa o “estudo de monstros” para descrever investigações relacionadas às malformações congênitas. Denominamos genericamente de teratógeno qualquer fator capaz de induzir uma má formação.

Ao longo da embriogênese existem períodos críticos que são mais suscetíveis a ocorrência de malformações embrionárias. Até o inicio da terceira semana embrionária se ocorrer alguma malformação dada a grande capacidade regenerativa das células do embrião esta pode ou ser corrigida ou levar a morte prematura do embrião. Entre a terceira e a oitava semana do desenvolvimento é o período de maior suscetibilidade as malformações pois corresponde a etapa da organogênese. Depois da oitava semana esta suscetibilidade começa a diminuir. Após o terceiro mês de gestação as possíveis alterações que podem ocorrer são relacionadas a fisiologia (são funcionais) como é o caso do retardo mental ou mesmo anomalias de crescimento em algumas regiões corporais. É importante também salientar que cada órgão é tem período critico específico de suscetibilidade as má formações. Por exemplo, como o coração se desenvolve muito cedo na embriogênese este órgão é mais suscetível a teratógenos. Já órgãos que demoram mais tempo para se desenvolver, como é o caso do sistema nervoso central que inicia o seu desenvolvimento na terceira semana e demora muito tempo até ficar completamente formado, possuem um período muito longo de suscetibilidade.

Estudos epidemiológicos mostram que de 2 a 3% dos recém-nascidos apresentam algum tipo de malformação congênita reconhecível. No Brasil, muito possivelmente devido a problemas de subnotificação deste tipo de morbidade, as estatísticas de saúde baseadas nos dados do DATASUS mostram uma prevalência em torno que cresceu de 0,2 a 0,9% entre 1999 a 2004 (Figura 8.1).

Figura 8.1 Observação temporal da variação da prevalência de nascimentos com malformações que foram registradas nas Informações de Saúde sobre Nascimentos (http:www.datasus.gov.br) entre os anos de 1999 a 2004 nas principais regiões do Brasil e no Rio Grande do Sul.

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Existe uma grande quantidade de tipos de mal-formações. A Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde (CID-10) classifica as mal-formações do recém-nascido em 16 categorias gerais. A prevalência (freqüência de casos no passado) de mal-formações no ano de 2004, por categoria, é apresentada na Tabela 8.1. As malformações de interesse odontológico (fenda labial e fenda palatina) estão destacadas na Tabela. A Região Sul e a Centro-Oeste são as que apresentam maior prevalência deste tipo de mal-formação em relação às demais regiões do País.

Tabela 8.1. Prevalência de nascimentos com mal-formações no Brasil por categorias principais de acordo com o CID-10 (Código Internacional das Doenças). Fonte: http:www.datasus.go.br.

8.2 Etiologia

Em geral existem dois grupos de fatores que podem levar a ocorrência de más formações no embrião: fatores genéticos e fatores ambientais. Entretanto, existem subdivisões importantes dentro destes dois grandes grupos e também muitas informações que se originam a partir da interação gene-ambiente. Cabe comentar aqui que uma grande parte das informações aqui apresentadas tem como fonte o livro de César Gomes Dumm denominado “Embriologia Humana: atlas e texto” publicado em Língua Espanhola pela editora El Ateneo (2003).

A Tabela 3 apresenta uma síntese destes fatores genéticos. Epidemiologicamente falando o impacto das chamadas cromossomopatias é de: (1) causa de 50% dos abortos espontâneos; (2) 5% da causa de natimortabilidade; (3) ocorre em 2% dos fetos de mães com idade igual ou menor a 35 anos e 5% em mães com mais idade. 8.2.1 Fatores Ambientais: muitos fatores ambientais podem levar a ocorrência de máformação embrionária. Os efeitos ambientais podem ser subdivididos em fatores químicos, físicos (mecânicos) e maternos. No caso, se considerarmos a mãe o “substrato” para a formação do feto. Entre os efeitos maternos destacam-se as infecções por patógenos, presença de doenças crônicas não-transmissíveis como é o caso do diabetes mellitus e desnutrição (calórica ou mesmo deficiência de algum micronutriente mais específico). A seguir tais fatores serão brevemente comentados. Fatores químicos: existe uma grande quantidade de substâncias químicas que podem induzir teratogênese tanto em animais quanto em humanos. Podemos dividir estas substâncias em grupos químicos mais gerais como pode ser observado na Tabela 8.2

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Tabela 8.2 Principais grupos de fatores químicos com potencial teratogênico

8.2.2 Fatores maternos: condições ambientais em que a mãe está exposta podem afetar o desenvolvimento embrionário, inclusive levando a mal formações. Agentes infecciosos: em 1941 foi a primeira vez que se reconheceu que uma infecção materna poderia estar associada a mal formações embrionárias, quando se demonstrou tal associação com a infecção por rubéola. Atualmente as enfermidades infecciosas que com maior freqüência causam defeitos congênitos são as de origem viral, como a rubéola, parasitária como a toxoplasmose e bacteriana como a sífilis. O impacto destas infecções na embriogênese é dependente do momento em que a mesma ocorra. Geralmente o efeito mais dramático ocorre quando a infecção acontece no primeiro trimestre da gravidez podendo, inclusive, provocar aborto como é o caso da infecção por citomegalovírus. Entretanto, o vírus tanto da sífilis quanto da toxoplasmose podem cruzar a barreira fetal e levar a destruição no feto de órgãos já formados. Doenças crônicas nãotransmissíveis uma das morbidades mais críticas para o desenvolvimento fetal é o diabetes mellitus. Existe uma correlação entre a duração e severidade da doença com a interferência no desenvolvimento fetal ainda que não se entenda bem seus mecanismos.Os fetos de mulheres diabéticas tendem a nascer com peso e tamanho maior. Desnutrição materna: os aspectos nutricionais maternos possuem alta relevância epidemiológica não só por, causarem potencialmente mal-formações, mas também por aumentarem a taxa de mortalidade fetal e perinatal (mortalidade infantil) e aumentarem a suscetibilidade de doenças crônicas não-transmissíveis na idade adulta e na velhice. Quando falamos de desnutrição, não estamos falando somente de mães que passam fome (restrição calórica aguda), mas também de mães que possuem alguma deficiência de micronutrientes (vitaminas, sais minerais, etc.) na sua alimentação durante a gravidez. A seguir serão comentados alguns destes casos que hoje são de interesse em nível de saúde pública e ou que ainda são objeto de pesquisas.

Deficiência de iodo: O déficit severo de iodo na dieta materna pode levar ao aparecimento de alterações como cretinismo (retardo mental), mãos e dedos curtos, pele seca, dificuldade de aleitamento, e retardo na queda do cordão umbilical.

Ácido fólico: a deficiência do ácido fólico pode ser dramática para o desenvolvimento embrionário, pois pode levar ao não fechamento do tubo neural. Se o neurósporo anterior não fechar este processo irá causar uma má-formação denominada anencefalia que é caracterizada pela ausência da calota craniana ou mesmo abertura de parte da medula óssea. O não

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fechamento do neurósporo posterior pode causar espinha bífida. No primeiro caso o feto morre logo após o seu nascimento enquanto o segundo caso é passível de correção cirúrgica.

Baixo peso ao nascer: até 20 anos atrás o baixo peso ao nascer (< 2.400 Kg) era considerado fator de risco de mortalidade infantil. Entretanto, além deste grande risco estudos desenvolvidos na década de 1990 que foram iniciados pelo Dr. Baker na Inglaterra (Barker DJP, ed. Fetal and infant origins of adult disease. London: BMJ, 1992) sugeriram que o baixo peso ao nascer muda a programação genética de órgãos vitais como a formação do sistema cardiovascular. Estudando uma coorte de adultos caucasianos aos 64 anos de idade, Barker e colaboradores concluíram que o baixo peso ao nascer estaria associado a maior risco de desenvolvimento tardio de doença cardiovascular ou diabetes do tipo 2. A hipótese gerada propunha que alterações na nutrição e no estado endócrino do feto resultariam em adaptações de desenvolvimento que modificariam permanentemente sua estrutura, fisiologia e metabolismo. Assim, esses indivíduos estariam predispostos a doenças cardiovasculares, metabólicas e endócrinas na vida adulta. Essas observações foram confirmadas por outros estudos nos 10 anos subseqüentes. No caso, principalmente o coração tende a se desenvolver com um menor número de células a fim de “ economizar energia para o desenvolvimento do sistema nervoso central” e quando a criança nasce até a sua adolescência esta condição aumenta muito a sobrecarga da fisiologia cardiovascular aumentando a suscetibilidade a hipertensão, e também a obesidade. Dentro deste quadro, indivíduos que tiveram baixo peso ao nascer tendem a ter duas vezes maior risco de desenvolverem doenças cardiovasculares na idade tardia, independente dos outros riscos. Estudos recentes sugerem que doenças como diabetes tipo 2, coronariopatias, hipertensão arterial e obesidade, relacionam-se a um inadequado crescimento intra- uterino, fenômeno denominado programação ou hipótese da origem fetal de doenças.

8.2.3 Fatores físicos: os fatores físicos que podem levar a má-formação embrionária podem ser subdivididos em dois grupos: fatores físicos externos e fatores físicos internos (mecânicos). Entre os fatores físicos externos que tem maior potencial teratogênico destaca-se a exposição a radiação ionizante que foi bem caracterizada nas explosões nucleares ocorridas em Hiroshima e Nagasaki que incluíram alterações no desenvolvimento do sistema nervoso central (espinha bífida e retardo mental). Entretanto, ainda não existem evidências conclusivas se as doses de radiação ionizante usadas em nível diagnósticos possuem ação teratogênica. De qualquer modo, é de vital importância a proteção materna e a redução a exposição da radiação ionizante, mesmo se tratando, por exemplo, de um simples raio X dentário. Outros fatores que podem incidir sobre a formação fetal incluem temperaturas extremas, porém os estudos em seres humanos ainda não são conclusivos. Fatores físicos internos como é o caso da luxação congênita do quadril ou certas deformações cranianas podem ser atribuídos a pressões uterinas anormais sobre o feto. Esta pressão anormal pode ser causada por baixa quantidade de líquido aminiótico (oligohidramnios). Faixas amnióticas também podem causar amputações de membros do feto. 8.2.4 Fatores Genéticos: ocorrem quando existem anomalias na divisão cromossômica ou quando ocorrem mutações genéticas (espontâneas ou herdadas da família materna ou paterna). A Tabela 8.2 apresenta os principais grupos genéticos associados a malformações embrionárias.

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Tabela 8.2 Principais grupos de mal-formações genéticas

8.2.4 Mecanismos associados a mal-formação embrionária: não se conhece ainda todos os possíveis mecanismos, entretanto, alguns já estão bem caracterizados e são comentados a seguir: Duplicação embrionária: um exemplo notável de duplicação é a própria formação de gêmeos univitelinos. No caso, não se sabe bem o porque, no inicio da clivagem o embrião se separa e se desenvolve em dois indivíduos independentes mas geneticamente iguais (clones genéticos). Porém, muitas vezes este fenômeno não ocorre de forma completa e o resultado é o aparecimento de fetos gêmeos unidos (xipófagos). A união pode ocorrer em qualquer parte do corpo e em diferentes níveis. Alguns casos são passíveis de intervenção cirúrgica. Existe também uma condição denominada fetus in fetus em que um dos gêmeos tem um desenvolvimento anormalmente pequeno e localiza-se no interior da cavidade abdominal do irmão. Este pequeno gêmeo permanece mumificado. Estes casos ainda que raros sejam descobertos acidentalmente. Assimetria embrionária: um a cada 10 mil indivíduos que aparentemente tem uma morfologia normal, apresenta uma inversão parcial ou total de órgãos internos. Esta condição é denominada situs inverso e potencialmente está associada a alterações em genes que determinam o local e a identidade dos órgãos. Na mosca-das-frutas Drosophila melanogaster, que é muito estudada na genética, estudos sobre alterações na identidade de órgãos são muito desenvolvidos. Em 1996 os biólogos alemães Christiane Nusslein-Vollard e Eric Wieschaus receberam o Prêmio Nobel em Medicina por seus trabalhos sobre genes que controlam desenvolvimento embrionário e que foram estudados em Drosophila. Em seus experimentos, eles expuseram drosofilas a produtos químicos a fim de causarem mutações nos genes que controlam a segmentação e identidade dos órgãos. Estes estudos e de outros pesquisadores levaram ao reconhecimento da existência de grupos de genes associados: (1) formação dos eixos dorso-ventral e antero-posterior do embrião; (2) genes de segmentação; (3) genes homeóticos e (4) genes maternos. No caso dos seres humanos os três primeiros conjuntos de genes são os mais importantes e mais estudados uma vez que a influência materna no desencadeamento da embriogênese é muito pequena se comparada, a das mosca-dasfrutas. Como estes genes se mantem em diversos tipos de animais, incluindo homens e moscas, dizemos que eles são evolutivamente conservados.

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Perda de interações indutivas: nos estágios iniciais do desenvolvimento pode ocorrer a inibição de processos indutivos que levam, por exemplo, a não formação de um órgão (agnesia) como é o caso da não formação dos rins. Inibição da morte celular programada (apoptose): a apoptose é um mecanismo fundamental para a formação de diversos órgãos do corpo. Sua inibição pode resultar em má formações. Este é o caso da não formação esperado dos dedos das mãos e dos pés. Alterações na reabsorção tissular: algumas estruturas que estão presentes no inicio da embriogênese devem desaparecer ao longo do desenvolvimento (são reabsorvidas). Este é o caso, por exemplo, das membranas que recobrem as futuras cavidades oral e anal. Na embriogênese estas membranas são formadas a partir da ectoderme e endoderme. Se por algum motivo células de origem mesodérmica ficam entre estas duas camadas estas membranas se vascularizam (angiogênese) e não são posteriormente rompidas. A ocorrência mais freqüente deste tipo de mal-formação é a atresia anal. Falhas na migração celular: para que os órgãos sejam formados a migração (movimento) celular é de fundamental importância uma vez que os mesmos serão produzidos a partir da interação de diversos tipos de tecidos. Além do mais, muitas vezes o órgão recém formado precisa migrar do local de origem da sua formação para outro. Este é o caso dos testículos que precisam migrar da cavidade abdominal para o escroto. Quando este fenômeno não ocorre estamos diante de uma má-formação que é muito freqüente e denomina-se criptorquidia. Destruição de estruturas já formadas: a isquemia (ausência de irrigação sangúínea) causada por interferências nas estruturas de irrigação de um dado órgão pode levar a sua perda ou má-formação. Acredita-se que a ocorrência da focomelia (ausência ou máformação dos membros inferiores e superiores) que é típica da talidomida e também pode ser causada por alterações genéticas pode ser causada por este processo. Hipoplasia e hiperplasia: a proliferação celular também é um fenômeno que necessita de alto controle ao longo da embriogênese. Se for menor do que o esperado pode causar a formação de uma estrutura pequena (hipoplasia) enquanto que se for maior pode causar a formação de uma estrutura grande (hiperplasia). Má-formação na face pode envolver estes processos. Defeitos em receptores de moléculas regulatórias da embriogênese: a maioria das moléculas que controlam a diferenciação corporal age em células-alvo via a presença de receptores específicos que elas produzem. Este é o mecanismo pelo qual ocorre, por exemplo, a diferenciação das características sexuais primárias e secundárias. Um dos exemplos mais dramáticos de receptores alterados é o receptor associado a indução das características sexuais primárias no feto masculino. No caso, todos nós sabemos que é necessária a presença do cromossomo Y para que o feto tenha fenótipo masculino. Neste cromossomo existe um gene denominado SrY que é expresso e induz a formação dos órgãos sexuais internos e externos do homem. Para que o produto Sry funcione ele precisa se ligar a um receptor que se encontra nas células-alvo. Entretanto, alguns indivíduos podem ter alteração neste receptor causada especialmente por problemas genéticos (mutações). Deste modo, como o receptor não está funcional mesmo que o feto seja do sexo masculino e produza Sry ele não consegue induzir a formação das características sexuais primárias e desta forma o feto nasce geneticamente masculino mas fenotipicamente feminino. Defeitos de campo: a morfogênese de muitas regiões corporais é regulada por chamados “controle de campo”, ou seja, por padrões espaciais que são fundamentais que ocorram para que determinados processos morfogenéticos aconteçam. Estes campos morfogenéticos ainda são muito pouco compreendidos. Por exemplo, o aparecimento de pregas embrião parece ser fundamental para a formação dos membros superiores. Caso as mesmas não ocorram podem ocorrer eventos massivos de mal formação como por exemplo a fusão dos membros. Esta síndrome é conhecida como sirenomegalia. Defeitos nas camadas germinativas: se as camadas germinativas não se desenvolvem no padrão correto elas podem determinar anomalias diversas. Isto é o que ocorre e determina, por exemplo, no caso de

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mal-formação ectodérmica a produção de pelos muitos finos, dentes pobremente formados, estatura baixa, pele seca e unhas hipoplásicas. A seguir comentaremos brevemente algumas má-formações associadas com órgãos importantes do corpo humano. Aparelho Cardiovascular: mal formações cardíacas são de grande interesse clinico. Os principais tipos de mal formações são sintetizados na Tabela 8.3. Tabela 8.3 Malformações do sistema cardiovascular

Aparelho Gastrointestinal: existem também diversas má-formações associadas ao aparelho gastrointestinal entre estas podemos citar a atresia e estenose do intestino delgado. É uma mal-formação no qual o duodeno (a primeira parte do intestino delgado) não se desenvolveu de modo adequado e não se abre. Isto faz com que o conteúdo estomacal não consiga passar para dentro dos intestinos. A atresia duodenal ocorre em 1 a cada 6000 recém-nascidos. Os bebes afetados começam a vomitar abundantemente logo após o nascimento. O vômito pode ser verde (com bílis). O bebe pode defectar uma ou duas vezes (o mecônio), porém não as seguintes. Se não houver tratamento pode haver desidratação e morte. É necessário intervenção cirúrgica para reparar esta malformação. Os lactantes podem ter problemas sérios de alimentação e absorção mesmo depois da cirurgia. Sistema Reprodutivo: como foi anteriormente colocado a inibição a descida de um ou dos dois testículos para o escroto constitui uma mal formação comum em fetos do sexo masculino. Os testículos são formados dentro do abdômen. Na grande maioria dos meninos eles descem até a bolsa escrotal até o nascimento. Se não ocorreu o descimento este ainda pode acontecer até os 04 meses de vida. Se um testículo não está na bolsa escrotal até os 06 meses é provável que ele não desça. Neste caso é necessária uma intervenção cirúrgica. Problemas associados como a não descida testicular: (1) Fertilidade: A temperatura na bolsa escrotal é menor que dentro do abdome. Para a produção de espermatozóides no testículo é necessário que este permaneça no ambiente de menor temperatura corpórea existente na bolsa escrotal. Trazendo esse testículo para a bolsa escrotal na infância, aumenta-se a qualidade da produção do sêmen e a fertilidade ao longo da vida; (2) Câncer: testículos criptorquídicos têm um aumento de chance de desenvolverem câncer mais tarde. Não está claro se a

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colocação do testículo na bolsa escrotal logo na infância diminua as chances do câncer. No entanto a presença do testículo na bolsa escrotal permite o auto-exame do testículo e a detecção precoce do câncer de testículo; (3) Hérnia: o saco herniário é quase sempre associado com um testículo criptorquídico. Durante a operação para trazer o testículo para a bolsa escrotal, a hérnia é rotineiramente identificada e tratada; (4) Proteção: um testículo que permanece no abdome tem uma chance maior de sofrer uma torção com prejuízo de seu suprimento sanguíneo, resultando em um quadro de abdome agudo semelhante à apendicite.