Embalagens Plasticas BPA

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MARÇO. 2013 - JORNAL MEIO AMBIENTE 6 ciência Robinson Rolim Ressetti, M.S., Eng. Agr. <[email protected]> palavra 'plástico' é de- rivada do grego 'plasti- ko', que significa 'capaz de ser moldado'. O petróleo é a fonte mais importante na produção de matérias-primas (especialmente etileno e pro- pileno) para a fabricação do plástico convencional. O iso- por (EPS - poliestireno expan- dido) é produzido a partir do estireno e este é obtido do etil- benzeno. O etilbenzeno tem ori- gem na reação do etileno e ben- zeno. A indústria mundial de plásticos gerou, em 2008, 245 milhões de toneladas. No Bra- sil, foram produzidos 1,65 mi- lhões de toneladas nesse mes- mo ano. Sua ampla utilização se deve às suas propriedades, como facilidade de moldagem, baixa densidade, boa resistên- cia química e mecânica e trans- parência à luz visível entre ou- tras. O consumo de embala- gens plásticas tem crescido de 4 a 7 % ao ano e tem sua princi- pal aplicação no setor de alimen- tos (65 %). Mas seu uso é seguro? As- sim como no Brasil temos em- balagens de produtos alimen- tícios que exibem as expres- sões 'livre de gordura trans' e 'livre de transgênicos', nos Estados Unidos algumas gar- rafas plásticas reutilizáveis apresentam o selo 'BPA-free' (livre de BPA). O BPA (bisfenol A) é uma molécula chave na formação de polímeros (unidades estrutu- rais repetidas), e é apenas uma dentre as inúmeras substân- cias químicas produzidas in- dustrialmente. Ela pode atuar como hormônio artificial e/ou interferente no sistema endó- Embalagens plásticas em alimentos crino (conjunto de glândulas que produzem hormônios). Pesquisas recentes tem mostrado que diversos tipos de câncer e anomalias congê- nitas, em animais de labora- tório e em seres humanos, são provocados pela exposição a certos compostos químicos ar- tificiais. Segundo o Ministério da Saúde, 172.255 pessoas morreram de câncer no Bra- sil em 2009, representando 15,6 % do total de mortes no país. Nos últimos 60 anos, a contagem média de esperma- tozoides por indivíduo redu- ziu à metade, e dobrou a inci- dência de malformações do sistema reprodutivo em recém- nascidos. A exposição prolon- gada a baixas doses de dife- rentes substâncias artificiais, como agrotóxicos e interferen- tes no sistema endócrino, pode levar a inúmeros efeitos adver- sos que se manifestam no de- correr do tempo, incluindo as gerações seguintes. A taxa de transferência de BPA e outros compostos quí- micos artificiais, como ftala- tos e alquifenóis, dos plásti- cos para substâncias com as quais entram em contato (lí- quidos e alimentos entre ou- tros) depende do teor desses compostos no plástico, tem- po de contato, natureza da substância, temperatura e grau de agitação. A Agência Nacio- nal de Vigilância Sanitária (An- visa) permite uma quantidade máxima transferida (LME) de BPA, em alimentos ou seus simulantes, de 0,6 mg/kg. Si- mulante é um produto que 'imita' o comportamento de um grupo de alimentos que tem características semelhantes. A Anvisa determina, com a Resolução RDC nº 56 de 16 de novembro de 2012, a proi- bição e venda de mamadeiras e artigos similares destinados à alimentação de lactentes que contenham BPA. O BPA está em uso comercial desde 1957 e é empregado, principalmen- te, na manufatura de policar- bonato e resinas epóxi. Ele pode estar presente em garrafões retornáveis (20 L) de água mine- ral e em vernizes revestindo embalagens metálicas de ali- mentos e bebidas. Copos, pra- REFERÊNCIAS: Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Legislação. Disponível em: <www.anvisa.gov.br/legis/index.htm>. Acesso em: 01 mar 2013. Coltro, L; Duarte, L.C. Reciclagem de embalagens plásticas flexíveis: contribuição da identificação correta. Polímeros, v.23, n.01, p.128-134, 2013. Hess, S.C. Os plásticos podem ser perigosos? Ciência Hoje, v.49, p.21-25, 2012. Patisaul, H. Assessing risks from Bisphenol A. American Scientist, v.98, n.01, p.30-39, 2010. Peres, G.T. Bisfenol A: controvérsias e regulamentação. Brasília: Anvisa - Gerencia Geral de Alimentos, 2011. 16p. Disponível em: <portal.anvisa.gov.br/wps/ wcm/connect/6faa36004abfff95951ebfa337abae9d/Regulamentacao_do_Bisfenol_no_Brasil.pdf?MOD=AJPERES>. Acesso em: 01 mar 2013. tos e outros utensílios descar- táveis de plástico podem con- ter BPA, ftalatos e/ou alquife- nóis, todas substâncias inter- ferentes no sistema endócrino. A identificação do tipo cor- reto de resina aplicada na com- posição da embalagem facilita a separação e faz com que o plástico reciclado seja o mais homogêneo possível. Entretan- to, a falta de padronização no mercado, segundo a norma ABNT NBR 13230/2008, difi- culta a cadeia de reciclagem do plástico no Brasil e o proces- so de logística reversa (premis- sas da Política Nacional de Resíduos Sólidos, de 02 de agosto de 2010). As "incertezas científicas" tornam prematuras muitas es- timativas realistas dos perigos de exposição a novas molécu- las. Está em tempo de rever nossas estratégias na avalia- ção de 'efeitos imediatos e po- tenciais' de substâncias quími- cas liberadas para uso indus- trial e/ou consumo. Se não o fizermos, continuaremos a colocar em risco a nós mes- mos e nossos descendentes. A

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MARÇO. 2013 - JORNAL MEIO AMBIENTE6 ciência

Robinson Rolim Ressetti,M.S., Eng. Agr.

<[email protected]>

palavra 'plástico' é de-rivada do grego 'plasti-ko', que significa 'capaz

de ser moldado'. O petróleo éa fonte mais importante naprodução de matérias-primas(especialmente etileno e pro-pileno) para a fabricação doplástico convencional. O iso-por (EPS - poliestireno expan-dido) é produzido a partir doestireno e este é obtido do etil-benzeno. O etilbenzeno tem ori-gem na reação do etileno e ben-zeno.

A indústria mundial deplásticos gerou, em 2008, 245milhões de toneladas. No Bra-sil, foram produzidos 1,65 mi-lhões de toneladas nesse mes-mo ano. Sua ampla utilizaçãose deve às suas propriedades,como facilidade de moldagem,baixa densidade, boa resistên-cia química e mecânica e trans-parência à luz visível entre ou-tras. O consumo de embala-gens plásticas tem crescido de4 a 7 % ao ano e tem sua princi-pal aplicação no setor de alimen-tos (65 %).

Mas seu uso é seguro? As-sim como no Brasil temos em-balagens de produtos alimen-tícios que exibem as expres-sões 'livre de gordura trans' e'livre de transgênicos', nosEstados Unidos algumas gar-rafas plásticas reutilizáveisapresentam o selo 'BPA-free'(livre de BPA).

O BPA (bisfenol A) é umamolécula chave na formação depolímeros (unidades estrutu-rais repetidas), e é apenas umadentre as inúmeras substân-cias químicas produzidas in-dustrialmente. Ela pode atuarcomo hormônio artificial e/ouinterferente no sistema endó-

Embalagens plásticas em alimentos

crino (conjunto de glândulasque produzem hormônios).

Pesquisas recentes temmostrado que diversos tiposde câncer e anomalias congê-nitas, em animais de labora-tório e em seres humanos, sãoprovocados pela exposição acertos compostos químicos ar-tificiais. Segundo o Ministérioda Saúde, 172.255 pessoasmorreram de câncer no Bra-sil em 2009, representando15,6 % do total de mortes nopaís. Nos últimos 60 anos, acontagem média de esperma-tozoides por indivíduo redu-ziu à metade, e dobrou a inci-dência de malformações dosistema reprodutivo em recém-nascidos. A exposição prolon-gada a baixas doses de dife-rentes substâncias artificiais,como agrotóxicos e interferen-tes no sistema endócrino, podelevar a inúmeros efeitos adver-sos que se manifestam no de-correr do tempo, incluindo asgerações seguintes.

A taxa de transferência deBPA e outros compostos quí-micos artificiais, como ftala-tos e alquifenóis, dos plásti-

cos para substâncias com asquais entram em contato (lí-quidos e alimentos entre ou-tros) depende do teor dessescompostos no plástico, tem-po de contato, natureza dasubstância, temperatura e graude agitação. A Agência Nacio-nal de Vigilância Sanitária (An-visa) permite uma quantidademáxima transferida (LME) deBPA, em alimentos ou seussimulantes, de 0,6 mg/kg. Si-mulante é um produto que'imita' o comportamento de umgrupo de alimentos que temcaracterísticas semelhantes.

A Anvisa determina, com aResolução RDC nº 56 de 16de novembro de 2012, a proi-bição e venda de mamadeirase artigos similares destinadosà alimentação de lactentes quecontenham BPA. O BPA estáem uso comercial desde 1957e é empregado, principalmen-te, na manufatura de policar-bonato e resinas epóxi. Elepode estar presente em garrafõesretornáveis (20 L) de água mine-ral e em vernizes revestindoembalagens metálicas de ali-mentos e bebidas. Copos, pra-

REFERÊNCIAS:Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Legislação. Disponível em: <www.anvisa.gov.br/legis/index.htm>. Acesso em: 01 mar 2013.Coltro, L; Duarte, L.C. Reciclagem de embalagens plásticas flexíveis: contribuição da identificação correta. Polímeros, v.23, n.01, p.128-134, 2013.Hess, S.C. Os plásticos podem ser perigosos? Ciência Hoje, v.49, p.21-25, 2012.Patisaul, H. Assessing risks from Bisphenol A. American Scientist, v.98, n.01, p.30-39, 2010.Peres, G.T. Bisfenol A: controvérsias e regulamentação. Brasília: Anvisa - Gerencia Geral de Alimentos, 2011. 16p. Disponível em: <portal.anvisa.gov.br/wps/wcm/connect/6faa36004abfff95951ebfa337abae9d/Regulamentacao_do_Bisfenol_no_Brasil.pdf?MOD=AJPERES>. Acesso em: 01 mar 2013.

tos e outros utensílios descar-táveis de plástico podem con-ter BPA, ftalatos e/ou alquife-nóis, todas substâncias inter-ferentes no sistema endócrino.

A identificação do tipo cor-reto de resina aplicada na com-posição da embalagem facilitaa separação e faz com que oplástico reciclado seja o maishomogêneo possível. Entretan-to, a falta de padronização nomercado, segundo a normaABNT NBR 13230/2008, difi-culta a cadeia de reciclagem doplástico no Brasil e o proces-so de logística reversa (premis-sas da Política Nacional deResíduos Sólidos, de 02 deagosto de 2010).

As "incertezas científicas"tornam prematuras muitas es-timativas realistas dos perigosde exposição a novas molécu-las. Está em tempo de revernossas estratégias na avalia-ção de 'efeitos imediatos e po-tenciais' de substâncias quími-cas liberadas para uso indus-trial e/ou consumo. Se não ofizermos, continuaremos acolocar em risco a nós mes-mos e nossos descendentes.

A

Robinson
Note
Jornal Meio Ambiente, n.44, p.06, 2013.