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ELIZA SALGADO DE SOUZA
PANORAMA DO ESPORTE EM MANAUS - 1897 a 1911
Belo Horizonte
2017
ELIZA SALGADO DE SOUZA
PANORAMA DO ESPORTE EM MANAUS - 1897 a 1911
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Estudos do Lazer, da Escola de Educação Física,
Fisioterapia e Terapia Ocupacional, da Universidade Federal de
Minas Gerais, como requisito parcial à obtenção do título de
Mestre em Estudos do Lazer.
Orientador: Prof. Dr. Cléber Augusto Gonçalves Dias- UFMG
Belo Horizonte
Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da UFMG
2017
S719p
2017
Souza, Eliza Salgado de
Panorama do esporte em Manaus - 1897 a 1911 [manuscrito] / Eliza Salgado de
Souza – 2017.
96 f., enc.:il.
Orientador: Cleber Augusto Gonçalves Dias
Dissertação (mestrado) – Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de
Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional.
Bibliografia: f. 10-93
1. Lazer – Aspectos sociais – Teses. 2. Esportes – Teses. 3. Manaus (AM) –
História – Teses. I. Dias, Cleber Augusto Gonçalves. II. Universidade Federal de
Minas Gerais. Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional. III.
Título.
CDU: 379.8
Ficha catalográfica elaborada pela equipe de bibliotecários da Biblioteca da Escola de Educação Física,
Fisioterapia e Terapia Ocupacional da Universidade Federal de Minas Gerais.
In memoriam de José Januário Campos, José Fina
Salgado Campos e Luzia Salgado de Souza, meus avós
e minha mãe, que dedicaram suas vidas a família,
permitindo, com tanto trabalho, que pudéssemos sonhar
com dias melhores.
AGRADECIMENTOS
Gilberto Gil canta em uma música, onde ele diz: “andar com fé eu vou, que a fé
não costuma faiá”. Pra ter essa fé que ele canta e nos encanta na música, precisamos acreditar
em alguém ou alguma coisa, que nos faça segurar firme e não perder as esperanças. No meu
caso é um alguém, ou melhor, são duas divindades, o qual tenho fé. A eles gostaria de
agradecer, primeiramente. A Nossa Senhora de Fátima, santa que aprendi a ser devota com
minha mãe e a Deus, esse ser misterioso tão presente em várias vidas. Obrigada meu Deus e
minha Nossa Senhora de Fátima por não terem me desamparado!
Em segundo lugar, queria agradecer a oportunidade, singular, de frequentar uma
excelente universidade pública. Oportunidade essa, que em nossa sociedade ainda é um
privilégio para poucos. A Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), essa instituição de
ensino que me acolheu em um momento turbulento da minha vida, dedico o meu segundo
agradecimento. Também gostaria de agradecer a todos os professores dessa instituição, que
tive o prazer de conhecer, por compartilhar o conhecimento de forma tão contagiante. A essas
pessoas, meus sinceros agradecimentos. Queria de agradecer, em especial, ao Prof. Sílvio
Ricardo pela enorme contribuição em minha formação, não apenas profissional, mas pessoal,
humana. Salve Sílvio! Serei sempre grata!
De maneira especial, gostaria de agradecer também, o meu orientador, pessoa
serena, paciente... paciente... muito paciente, animada, amiga, divertida (...) e um pesquisador
inigualável que é para mim, um dos melhores pesquisadores que existe atualmente. Um ser
fora do normal, que tem grande domínio no assunto de História do Lazer e está a todo o
momento realizando leituras a fim de ampliar seu conhecimento sobre o assunto. Obrigada
Cléber! Salve!
Também queria agradecer aos meus companheiros desse percurso, que tantas
alegrias me proporcionaram. João, Luciana, Karla, Hérnan, Poliana Rocha obrigada por terem
compartilhado tantas conversas e vivências! Estão marcados... porém, no meu coração!
Gostaria de agradecer, de maneira especial, duas pessoas que também
compartilharam desse processo, Marcela e Flávia. Essas são duas pessoas maravilhosas que
dividiram tantos momentos alegres, os sorrisos, as tristezas, as incertezas (...) durante esse
percurso. Obrigada, saibam que vocês não são como os cometas que passam em nossa vida,
mas como as estrelas que ficam!
Queria agradecer aos meus amigos de graduação que sem dúvida contribuíram
para formação, a Hernanda, Poliana, Jonatha, Thaís, Carlos e outros que dividiram sorrisos,
alegrias, tristezas aprendizagens. Muito obrigada! Em especial queria agradecer a Gleice
Ferreira. Pessoa que é um exemplo! Que além de dividir sorrisos, alegrias, me amparou em
um momento de dificuldade, na realidade em mais de um! Obrigada!
Gostaria de agradecer de maneira mais que especial a Joyce. Na realidade, acho
que deveria ter agradecido a ela junto com divindades, pois tenho certeza que foi Deus ou
minha Nossa Senhora de Fátima que a colocou em minha vida e deu força para suportar
tamanha loucura que vivi nesse processo. Obrigada Joyce, pela paciência, pelas noites sem
dormir, pelo seu olhar cuidadoso, pelas broncas, pela força, pelos sorrisos, pelo aconchego,
pelo cuidado, pelo carinho (...), por tudo que você fez e continua fazendo por mim e na minha
vida! Se anjos existem, acredito que você seja o meu!
Também queria agradecer a minha família, em especial a Irinéia (minha irmã) e
ao seu José Belarmino (meu pai), pois tenho certeza que se não fosse o incentivo dos dois eu
provavelmente não estaria aqui. A Irinéia por segurar a barra sozinha enquanto tive que me
dedicar ao trabalho e ao meu pai por me apoiar financeiramente e por ter paciência e o carinho
representado pela sua presença em minha vida! Muito obrigada!
Gostaria de agradecer aos meus outros 6 irmãos, Geraldo, Eliene, Elisângela,
Pedro, Célio, Mauro, pelos aprendizados e carinho que muito importaram a minha formação.
Gostaria de agradecer aos meus sobrinhos, Lucas, Letícia, Nathália, Hebert, João Paulo e
Robert, por serem essa luz maravilhosa na minha vida!
Queria agradecer a minha família como um todo! Incluo na minha família uma
pessoa muito especial que traz energias tão boas, uma paz sem igual (...), Bruna. Obrigada
pelos anos de amizade e por dividir também esse processo!
Ao Hisla, grupo coordenado pelo meu orientador, queria agradecer as
contribuições e aprendizados.
Ao PET-Educação Física e Lazer por todas as vivências e experiências que
marcaram minha vida! Em especial Débora Oliveira, Daniel, Sara e Marcos Buba, obrigada!
Aos atores do Programa Escola Aberta que compartilham tantos aprendizados e me apoiaram
e ajudaram nessa caminhada!
Ao Programa de Pós Graduação em Estudos do Lazer por ter sido a estrada que
percorri nessa formação.
À Capes pela bolsa que tanto me ajudou!
A todos que contribuíram direta e indiretamente o meu mais sincero
agradecimento.
"O inferno dos vivos não é algo que será; se existe, é aquele que já está aqui, o inferno no qual
vivemos todos os dias, que formamos estando juntos. Existem duas maneiras de não sofrer. A
primeira é fácil para a maioria das pessoas: aceitar o inferno e tornar-se parte deste até o ponto
de deixar de percebê-lo. A segunda é arriscada e exige atenção e aprendizagem contínuas:
tentar saber reconhecer quem e o que, no meio do inferno, não é inferno, e preservá-lo, e abrir
espaço."
(Ítalo Calvino).
RESUMO
Este trabalho teve como objetivo investigar e descrever a organização esportiva na cidade de
Manaus no final do século XIX e início do XX. Para tanto, tomou-se como ponto de partida a
fundação de um clube esportivo, o Sport Club Amazonense, em 1897, delimitando o recorte
temporal até 1911, quando se interrompe o funcionamento do Prado Amazonense, importante
local de realização e apreciação do turfe na cidade, e há uma intensificação da organização do
futebol. Para realizar a pesquisa foram consultados periódicos da época disponíveis na
Hemeroteca Digital. Nesse período Manaus se tornou um importante centro importador e
exportador, sofrendo várias transformações que levaram a mudanças estruturais e sociais. Em
meio a esse espectro os clubes esportivos e os locais para a prática dos esportes, passam a
fazer parte das possibilidades de sociabilidade da cidade. A princípio destacam-se dois clubes,
O Sport Club Amazonense e o Grupo Cyclista Amazonense. O primeiro pela realização de
esportes e festas e o segundo pela organização de passeios e corridas de bicicleta pela cidade.
Todavia, com a virada do século XIX para o XX, novas agremiações são fundadas e espaços
construídos especificamente para a apreciação e prática dos esportes, o Velódromo
Amazonense, local das corridas de bicicleta e o Prado Amazonense, local das corridas de
cavalo.
Palavras – chave: Manaus. História do Esporte. Esportes. Imprensa.
ABSTRACT
This study aimed to investigate and describe the organization of sports in the city of Manaus
in the late 19th and early 20th centuries. For both, took as its starting point the foundation of a
sport club, the Sport Club of Amazonas, in 1897, delimiting the clipping temporal until 1911,
when it stops the operation of the Prado Amazonense, important place of realization and
appreciation of the turf in the city, and there is an intensification of the organization of
football. To accomplish the research were consulted periodicals of the time available in the
Hemeroteca Digital. During this period Manaus became an important center importer and
exporter, undergone many transformations that led to structural changes and social. In the
midst of this spectrum sports clubs and places for the practice of sports, become part of the
possibilities of sociability of the city. The principle are two clubs, Sport Club of Amazonas
and the Group Cyclista Amazonense. The first by the practice of sports and parties and the
second by organizing tours and races through the city. However, with the turn of the 20th
century, new clubs are founded and built spaces specifically for the consideration and practice
of sports, the Velódromo Amazonense, site of racing bike and the meadow of Amazonas, site
of horse racing.
Keywords: Manaus. History of Sport. Sports. Press.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
FIGURA 1 - Praça General Osório, 1909. .................................................................................. 29
FIGURA 2 - Programa das corridas do dia 15 de novembro. .................................................... 33
FIGURA 3 - Local onde foi construído o velódromo, círculo amarelo, e suas duas entradas, em
vermelho. .................................................................................................................................. 46
FIGURA 7 - Walthor e Lawson.................................................................................................. 56
FIGURA 8 - Offmann e Walthour. ............................................................................................. 56
FIGURA 9 - Coriolano Durand. ................................................................................................. 59
QUADRO 1 - Clubes fundados em Manaus século XIX e XX ............................................... 88
SUMÁRIO
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ............................................................................................. 10
2 AS PRIMEIRAS ORGANIZAÇÕES ESPORTIVAS DE MANAUS .................................. 14
2.1 Sport Club Amazonense ..................................................................................................... 17
2.2 Grupo Cyclista Amazonense .............................................................................................. 27
2.3 Mudanças à vista – a organização esportiva do século XX ................................................ 36
3 VELÓDROMO AMAZONENSE ......................................................................................... 44
3.1 A organização das corridas e seus programas .................................................................... 47
3.2 As corridas de bicicletas e as estratégias de atração do público ......................................... 53
3.3 Corridas de sensação: as variações das disputas ................................................................ 54
3.5 A tandem ............................................................................................................................ 60
3.6 Corrida a pé ........................................................................................................................ 62
3.7 Stoessel: o campeão amazonense ....................................................................................... 63
3.8 O grande clássico do ciclismo: Pará-Manaus ..................................................................... 65
3.9 Corridas mirabolantes ......................................................................................................... 67
4 PELO PRADO AMAZONENSE: O TURFE EM MANAUS .............................................. 70
4.1 Organização do turfe em Manaus ....................................................................................... 73
4.2 Entre confusões e tribofes: as corridas de cavalo em Manaus ........................................... 77
4.3 “Moralizando” o turfe: Derby Club .................................................................................... 82
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................ 87
FONTES ................................................................................................................................... 90
REFERÊNCIAS ....................................................................................................................... 91
10
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Foi a partir da elaboração do trabalho de conclusão de curso, que a história do
esporte em Manaus se tornou interesse de estudo. Nesse trabalho, uma das primeiras
agremiações esportivas da cidade, o Sport Club Amazonense, foi objeto de investigação, onde
vasculhando a imprensa para tal, foi possível perceber a presença do esporte, de maneira
abundante e instigante, em um período posterior ao Sport Club Amazonense. O contato com
essas fontes fez com que surgisse o interesse na continuidade dessa pesquisa, onde a intenção
passara a ser a ampliação da compreensão de como se deu o desenvolvimento dos esportes na
cidade manauara.
Nesse sentindo, esta dissertação teve como objetivo investigar e descrever o
desenvolvimento da história do esporte em Manaus no final do século XIX e início do XX,
procurando ampliar a visão, propiciada pela pesquisa do trabalho de conclusão de curso. Para
tanto, tomou-se como ponto de partida a fundação no Sport Club Amazonense em 1897,
procurando inquirir novos olhares, delimitando o recorte em 1911, quando se interrompe o
funcionamento do Prado Amazonense, importante local de realização e apreciação do turfe na
cidade, e há uma intensificação da organização do futebol.
De acordo com Melo, podemos dividir em cinco fases os estudos que dizem
respeito à História do Esporte no Brasil. A primeira que engloba as produções publicadas na
virada do final do século XIX e XX. A segunda, 1920-1940, onde se tem uma preocupação
mais acentuada com a história da educação física e da ginástica, todavia com a história
servindo para provar e legitimar posições pré-estabelecidas. A terceira, 1940-1980, marcada
pelo aumento da produção. Nessa fase há diferença no que se refere à compreensão
metodológica e teórica. A quarta fase, 1980, se destaca pela crítica e pelo anúncio de
redimensionamento dos estudos anteriores. E, a quinta, a partir da década de 1990, atual fase,
é caracterizada pela História do Esporte ser configurada mais claramente como campo de
investigação, tendo uma maior sistematização e institucionalização. Nesse processo foi
importante a organização de um grupo de pesquisa e a realização de encontros sobre o tema.
Desse momento em diante, a História do Esporte passou a ganhar mais notoriedade com
maior abertura em eventos científicos, teve a fundação de uma revista específica (Recorde:
Revista de História do Esporte)1, além de estar mais presente em periódicos, etc
2.
1 Essa é a primeira revista dedicada à História do Esporte, seu assunto central é “a trajetória, no tempo e no
espaço, das práticas corporais institucionalizadas (esporte, educação física, dança, ginástica, capoeira, entre
outras), bem como das atividades de diversão/lazer, em todos os períodos históricos”. MELO, Victor. Por que
11
Entretanto, apesar da configuração do campo de investigação e das novas
perspectivas, a concentração de estudos sobre a história do esporte ficou focada nos centros de
poder político e econômico, o que reforçou “a suposta centralidade e influência dos
acontecimentos das maiores cidades brasileiras, nomeadamente do Rio de Janeiro e de São
Paulo, sobre as demais regiões do país”. Nesse sentido, narrativas históricas nacionais,
“aparecem como o resultado de um conjunto mais ou menos arbitrário de reduções e
generalizações, onde práticas e imaginários de determinados grupos específicos, de regiões
específicas, se apresentarão como representações válidas para toda a nação” 3.
Esse é o caso dos estudos sobre a história do esporte em Manaus, onde pouco se
sabe sobre seu desenvolvimento. Ao buscar estudos sobre a história do esporte na cidade
amazonense foram encontrados apenas dois trabalhos sobre o tema. A dissertação de Tarcísio
Serpa Normando, nomeada “Jogos de bola, projetos de sociedade: por uma história social do
futebol na Belle Époque Manauara”, que trata da história social do futebol em Manaus no
início do século XX. Essa dissertação resultou na produção de um artigo publicado na revista
digital Lecturas, Educación Física y Desportes4, nomeado “Nas praças, nas ruas e nos rios: a
Amazônia esportiva em sua belle époque”, onde o autor apresenta os esportes mais retratados
nos jornais em Manaus. E, do livro de Abraim Baze chamado “Luso Sporting Club - a
Sociedade Portuguesa no Amazonas” 5. Nesse livro, o autor reúne várias memórias do Luso
Sporting Club, clube que se firmou no âmbito do futebol, fundando em 1912.
Este trabalho, que está concatenado com um projeto mais amplo que tem por
objetivo estudar a História do esporte nos sertões do Brasil, onde esses esforços para entender
melhor determinadas regiões do Brasil, constituem-se em esforços para entender mais e
melhor o próprio Brasil6, pretende lançar luz sobre questões relacionadas ao desenvolvimento
histórico do esporte em Manaus. Tendo em vista que a história do esporte vai cruzar com
muitas outras histórias nas diversas dimensões da sociedade (política, cultural, social,
uma revista brasileira de história do esporte? Breves palavras sobre esse periódico. Recorde: Revista de
História do Esporte, v. 1, n. 1, jun. de 2008. 2 MELO, Victor. FORTES, Rafael. História do esporte: panorama e Perspectivas. Fronteiras, Dourados, MS, v.
12, n. 22, p. 11-35, jul./dez. 2010.p.20, 21. 3 DIAS, Cléber. História do esporte no sertão brasileiro: memória, poder e esquecimento. Materiales para la
Historia del Deporte, v.x, p.24-36, 2012. Ver também: DIAS, Cléber. Esporte e cidade: balanços e perspectivas.
Tempo, v. 17 n. 34, p. 33-44, Jan./ Jun. 2013; PIRES, Roberto; DIAS, Cléber; LEITE, Marcos. História e
memória do esporte em Jequié. Recorde, v. 7, n. 1, p. 1-23, jan./jun. 2014. 4 Para mais informações sobre a revista digital Lecturas, Educación Física y Desportes consultar
http://www.efdeportes.com/. 5 BAZE, A. Luso Sporting Club-a Sociedade Portuguesa no Amazonas. Manaus, editora Valer, 2007.
6 * DIAS, Cléber. História do Esporte no sertão do Brasil. Rede Interinstitucional de Pesquisa em História
Regional do Esporte, p.16.
12
econômica, etc)7. E, que “através de cada realização no universo do esporte-iluminada pelo
olhar historiográfico, sociológico e antropológico – podemos compreender como a sociedade
funciona, como cada cultura se expressa, como a política se estabelece ou como a economia
se modifica” 8.
Para realizar essa tarefa, foram consultados jornais disponíveis na Hemeroteca
Digital9. Esses jornais foram selecionados utilizando o sistema de busca oferecido no site
10.
Como afirma Tosh estas publicações eram disseminadas com pouca consideração para a
posteridade. Elas se destinavam mais a informar, influenciar, iludir ou entreter os seus
leitores. Além do mais, segundo Ribeiro, “a imprensa é um ator histórico, político e social,
um órgão propagador de ideias e, também, negociador de conflitos” 11
. Contudo, por meio da
sua utilização dessas publicações é possível entender, de certo modo, a organização dos
esportes em diferentes épocas.
Dessa busca foram encontrados os jornais A Federação12
(1895 a 1900),
Commercio do Amazonas13
(1870 a 1912), Jornal do Commercio14
(1904 a 1979), Correio do
Norte15
(1906 a 1912), Diario Official16
(1893-1900), Quo Vadis?17
(1902 a 1904), Correio
Sportivo18
(1910, 1911 e 1916) e Diário de Manaos19
(1890 a 1894). Além dos jornais, foram
utilizados o Almanach administrativo, histórico, estatístico e mercantil da província do
7 MELO, Victor. FORTES, Rafael. História do esporte: panorama e Perspectivas. Fronteiras, Dourados, MS, v.
12, n. 22, p. 11-35, jul./dez. 2010. 8 MELO, V.; DRUMOND, M.; FORTES, R.; SANTOS, J. Pesquisa Histórica e história do esporte. Rio de
Janeiro: 7 Letras, 2013. 9 Portal de periódicos nacionais, da Fundação Biblioteca Nacional, que proporciona consulta ao seu acervo de
periódicos pela internet. Para mais informações e consultas, ver: http://bndigital.bn.br/hemeroteca-digital/. 10
Foi utilizado o filtro que oferece a pesquisa por local, período, periódicos e palavra chave. Nele foram
selecionados os seguintes itens: AM, todos os períodos e periódicos com a palavra-chave sport. Faz-se
necessário informar que na medida em foram sendo achadas outras palavras chaves, como velódromo e prado,
estas foram utilizadas. 11
RIBEIRO, P. D. Tavares. Do burgo podre ao leão do norte: o Jornal do Commercio e a modernidade em
Manaus (1904-1914). Dissertação (Mestrado). Universidade Federal do Amazonas, Manaus, 2014. 12
Este jornal era órgão do Partido Republicano Federal, de publicação diária. Ele tinha assinaturas semestrais e
anuais para a capital e interior. 13
De acordo com Ribeiro, este jornal foi fundado em 1869 por Gregório José de Moraes e a princípio foi um
porta-voz dos presidentes da Província. O jornal circulou na capital e no interior. RIBEIRO, P. D. Tavares. Do
burgo podre ao leão do norte: o Jornal do Commercio e a modernidade em Manaus (1904-1914). Dissertação
(Mestrado). Universidade Federal do Amazonas, Manaus, 2014. 14
Segundo Ribeiro, o Jornal do Commercio foi fundado por Joaquim Rocha dos Santos em 2 de janeiro de
1904, circulando na capital e no interior. Em 1907, depois da morte do seu fundador, foi comprado por Vicente
Reis. Esse é o jornal que foi mais utilizado na elaboração do trabalho. RIBEIRO, P. D. T. Ibidem. 15
Este jornal era órgão do Partido Revisionista do Estado do Amazonas. De acordo com Ribeiro, foi fundado por
Heliodoro Balbi em 1906. Era de publicação diária e circulava na capital e interior. RIBEIRO, P. D.T. Ibidem. 16
Era o porta-voz do Estado Federado do Amazonas. 17
Era um jornal que se intitulava órgão de interesses populares, de circulação diária, para capital, interior e
estrangeiro. 18
Se intitulava órgão do de propaganda esportiva, inaugurado em 1910. 19
Era um jornal de propriedade de uma associação. Seu responsável era Dr. Agesilão P. da Silva. Tinha
assinatura para a capital e para o estrangeiro.
13
Amazonas para o anno de 1884 e os Relatórios dos presidentes dos estados brasileiros (AM)
– 1891 a 1930.
Esta dissertação está dividida em três momentos. O primeiro capítulo, onde será
apresentado um contexto geral da cidade de Manaus e as agremiações esportivas que foram
encontradas no final do século XIX e início do XX. Será feita uma descrição de como essas
sociedades se organizavam, procurando mostrar as mudanças que se efetuaram com a virada
do século XIX para o XX.
O segundo capítulo tratará do Velódromo Amazonense, espaço construído em
1904, onde ocorriam as corridas de bicicleta. Neste tópico será abordado sobre sua fundação,
organização dos programas das corridas e estratégias para atrair o público ao velódromo.
No terceiro capítulo, será dedicado ao Prado Amazonense, local, onde aconteciam
as corridas de cavalo. Este começou a ser organizado em 1906 e logo assumiu um lugar de
destaque na sociedade em questão. A fundação, organização das corridas, as confusões e
tribofes e a tentativa de moralização do prado com a organização de uma agremiação serão os
assuntos deste capítulo.
14
2 AS PRIMEIRAS ORGANIZAÇÕES ESPORTIVAS DE MANAUS
A veiculação de informações relativas ao universo esportivo em Manaus parece
datar do final do século XIX. Notícias como a de um tal Dr. Tissié, que tratava do uso do
velocípede - dizia que o velocípede era um “excelente” exercício para a respiração, desde que
fossem tomados alguns cuidados, tais como: tinha que ser moderado, em terreno plano e a
velocidade não deveria exceder de 18 a 20 quilômetros para indivíduos experientes e 12 a 15
quilômetros para os iniciantes20
. Ou sobre o clero, autorizado pelo papa a fazer uso da
bicicleta no campo. E, outros eclesiásticos que jogavam florete21
. Passaram a circular na
cidade e contribuir para a propagação de um imaginário referente à prática esportiva. Tais
informações são veiculadas em um momento de transformações de ordem econômica, e
sociais, onde a cidade se torna objeto de intervenções no sentido da modernização22
. A
economia, a demografia e a estrutura urbana da cidade, bem como os comportamentos e
hábitos culturais de sua população, passaram por mudanças relativamente rápidas - foi nesse
momento que as elites iniciaram uma identificação própria, enaltecendo a cidade e
objetivando suas sincronias com o que era avaliado como moderno e civilizado em eixos do
sudeste e de fora do país23
.
Manaus sofrera uma aguda transformação nos últimos anos do século XIX.
Segundo Dias “A cidade sofre a partir de 1890 seu primeiro grande surto de urbanização, isto
graças aos investimentos propiciados pela acumulação de capital, via economia agrária
extrativista-exportadora, especificamente a economia do látex”.
A comercialização da borracha, cuja matéria prima encontrava-se com abundância
na região, desencadeou uma série articulada e complexa de mudanças na vida da cidade, que
ao lado de Belém, funcionara como um dos principais pontos para exportação do produto24
. O
20
Interessante observar que esse mesmo artigo do Dr. Tissie foi encontrado por Schetino no Jornal do Brasil no
Rio de Janeiro. SCHETINO, A. M. Pedalando na modernidade: a bicicleta e o ciclismo na transição do século
XIX para o XX. Rio de Janerio: Apicuri, 2008. Já em Manaus ela foi encontrada do Diario de Manaos.
Velocipede. Diario de Manaos, 31 dez. 1892, n.2, p.1. 21
O clero mundanisando-se. A Federação, Manaus 22 dez. 1895, n.351, p.2. 22
DAOU, Ana Maria. Instrumentos e sinais de civilização: origem, formação e consagração da elite
amazonense. História, ciência, saúde, v.6 (suplemento), p.867-888, set. 2000. 23
SANTOS JUNIOR, Paulo. A imposição da modernidade na Manaus da borracha. Cadernos de Pesquisa do
CDHIS, n. 36/37, ano 20, p. 119-131, 2007. 24
Esse não foi o único momento em que Manaus passou por mudanças provocadas por um boom econômico. De
acordo com Peixoto, a cidade vivenciou quatro desses momentos, que foram de curta duração e levaram a
retração e até a letargia. O primeiro foi o seu nucleamento inicial até as primeiras décadas do século XIX; o
segundo se localiza entre a década de 1830 e fins da década de 1870, onde a cidade tem dois reordenamentos
político-administrativos que são a implantação do Código do Processo (1833) e a criação da Província do
Amazonas (1850); o terceiro é o que está sendo tratado, expansão e crise da economia de exportação da
borracha; e o quatro com a implantação da Zona Franca de Manaus em meados dos anos sessenta. PINHEIRO,
15
início da extração e exportação do látex no Amazonas deu-se em 1827, quando 31 toneladas
do produto foram comercializadas. Em 1880, esse volume já era de 7 mil toneladas, atingindo
a marca de 17 mil toneladas em 1887, num crescimento produtivo acumulado de quase
55.000%, o que equivale a um crescimento médio anual superior a 900%, por um período de
60 anos. Em 1908, esta quantidade atingiu o patamar de 18 mil toneladas, quando, pela
primeira vez, Manaus superou Belém no total de borracha exportada. Considerando a
organização predominante da economia brasileira, voltada para a exportação de produtos
agrícolas, a borracha já figurava como produto nacionalmente importante, representando 28%
do total das exportações brasileiras em 1890. Em 1912, este percentual atingiria a
impressionante marca de 40%, quase se igualando a fatia ocupada pelo café, principal produto
brasileiro de exportação da época25
.
O ciclo de prosperidade promovido pela economia da borracha atraiu grande
número de migrantes e imigrantes para Manaus. A população de Manaus mais que dobrou
num período de 28 anos, saltando de 29 mil habitantes em 1872, para mais de 60 mil em
1900; número que atingiria os 80 mil em 1908. “Passaram a viver na capital não só as elites
agro-exportadoras, mas grandes negociantes, técnicos, profissionais diversos e uma gama de
trabalhadores que exerciam suas atividades na cidade que se expandia” 26
.
Esse crescimento populacional possibilitou considerável ampliação na rede de
contatos e mesmo no universo cognoscível de muitos habitantes, pois o contato mais
frequente e estreito com pessoas, objetos e costumes de outros lugares tende a exercer
influências sobre os hábitos da população. Já em 1884, a entrada e a saída do porto de Manaus
eram operadas por empresas de Nova York, Liverpool e Belém, além da própria Manaus, com
ligações comerciais que se estendiam até o Peru, Colômbia, Bolívia, Venezuela, Guiana
Inglesa, Equador, Itália, Inglaterra e Estados Unidos, sem mencionar outros portos brasileiros.
Isso, de certa forma, reforça a reflexão que os esportes e outros divertimentos deportaram em
Manaus com maior efetividade no final da década do século XIX e início do século XX,
“acompanhando ingleses, alemães, italianos, franceses, portugueses, e espanhóis: novos
L. B. S. P. Manaus na rota da Copa e o dilema de mudar com o passado ou contra o passado. Revista Estudos
Amazônicos, p. 3-17. 25
WEINSTEIN, B.. A borracha na Amazônia: expansão e decadência (1850-1920). São Paulo: Hucitec/Edusp,
1993. 26
SANTOS JUNIOR, Paulo. A imposição da modernidade na Manaus da borracha. Cadernos de Pesquisa do
CDHIS, n. 36/37, ano 20, p. 119-131, 2007.
16
marinheiros do capital que identificaram na província do Amazonas oportunidades comerciais
relevantes” 27
.
Neste mesmo ano, a cidade registrava expressivo comércio varejista, que incluía
bilhares, casas de pasto, hospedarias, armazém de vinhos, botequins, mercearias, empórios,
joalherias, livraria, lojas de moda, mercearias, padarias, tavernas, além de inúmeros
profissionais liberais e outros prestadores de serviços, como açougueiros, barbeiros ou
advogados28
.
Foi nesse período que o governador Eduardo Ribeiro pôs em prática um projeto
para reformar a estrutura urbana da capital do Estado: o Plano de Embelezamento de Manaus,
que concorreria enormemente para que a cidade fosse conhecida como a Paris das Selvas.
Mais que expectativas simplesmente estéticas, como o nome do plano sugerem suas
iniciativas também se radicava em necessidades de ordem material. Os governos do
Amazonas e do Pará concorriam diretamente pelos benefícios do processo de exploração
econômica do látex. Para isso, era necessário superar a falta de mão de obra, cronicamente
apontada por empresários e políticos como obstáculo difícil de transpor, mas também criar
condições atraentes para o capital internacional envolvido nesse ramo de negócios. É
sintomático nesse sentido que empresas estrangeiras estivessem à frente do fornecimento de
vários serviços públicos urbanos, como o de transporte, saneamento ou iluminação urbana.
Entre as empresas estrangeiras e economicamente importantes que atuavam em Manaus à
época, destacam-se a Manáos Harbour, a Amazon Telegraph, a Booth Line ou a Manáos
Tranways and Light29
.
Com efeito, foi precisamente neste contexto que aparece na cidade a figura do
sportman30
, com seus clubes esportivos e suas práticas. De maneira semelhante ao
desenvolvimento histórico dos esportes em outros locais31
. Em Manaus, as novas práticas
27
NORMANDO, T. S. Jogos de bola, projetos de sociedade: por uma história social do futebol na Belle
Époque manauara. Dissertação (Mestrado em Ciências Humanas) – Universidade Federal do Amazonas,
Manaus, 2003. 28
Almanach administrativo, histórico, estatístico e mercantil da província do Amazonas para o anno de
1884. Manaus: Typographia do Amazonas de José Carneiro dos Santos, 1884. 29
MESQUITA, O. M. La Belle Vitrine: o mito do progresso na refundação de Manaus (1890/1900). 439 f. Tese
(Doutorado em História) – Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2005. 30
De acordo com Capraro sportman era quase um sinônimo de gentleman, aquele que tinha um perfil refinado.
CAPRARO, A. M. Foot-ball, uma prática elitista e civilizadora: investigando o ambiente social e esportivo
paranaense do início do século XX. Dissertação (Mestrado em História). Universidade Federal do Paraná,
Curitiba, 2002 31
Ver: JUNIOR, E. G. O esporte e a modernidade em São Paulo: práticas corporais no fim do século XIX e
início do XX. Movimento: Porto Alegre, v. 19, n. 4, p. 95-117, 2013; SOARES, P.G.; MORORÓ, A. Futebol e
práticas corporais no final do século XIX e início do XX em Juiz de Fora/MG. Recorde: Revista de História do
Esporte, v. 4, n. 2, 2011.
17
funcionaram como indicadores bastante visíveis de uma nova dinâmica social. Articulado a
um processo mais geral de intensificação das interações sociais nos espaços públicos, o início
da organização de práticas esportivas tentava suprir expectativas simbólicas de uma elite
social bastante ciosa por demonstrar ostensivamente sua nova pujança econômica, bem como
sua afinidade cultural com as elites de outros centros urbanos tidos por mais modernos e
civilizados.
Na verdade, campos de esportes funcionavam mesmo como a materialização
prática de aspirações de cosmopolitismo e progresso que afetavam certos grupos da cidade,
compondo parte do cenário que pretendia dramatizar uma sociedade pulsante e em vertiginoso
progresso. Os esportes seriam, ou deveriam ser, de acordo com o sistema de crenças que
parecia animar seus primeiros adeptos, mais uma demonstração inequívoca de que a
modernidade, afinal, havia chegado a Manaus.
2.1 Sport Club Amazonense
[...] Club que em tão pouco tempo de existência tem já conseguido inúmeros
triumphos - os nossos elogios pelos exforços e dedicação que hão sempre revelado
para a inalterável manutenção dos creditos de que muito merecidamente goza a
sociedade que representam - sem contestação nenhuma a primeira de Manáos
[grifos meus]32
.
Tido como o primeiro clube esportivo de Manaus, o Sport Club Amazonense foi
fundado em 24 de outubro de 1897. Esse clube organizava seções de bicicleta, tiro, esgrima,
ginástica e jogos atléticos, além de partidas de tênis, jogo da bola e torneios. Todavia, ele se
destacava pela organização de festas em seus salões, que ora eram organizadas pelo próprio
clube, ora por parte da sociedade.
O Sport Club Amazonense tinha estatuto33
próprio, que foi publicado na íntegra
no jornal Diário Oficial. Esse documento contém informações quanto aos objetivos do clube,
a forma de admissão, os direitos e deveres dos sócios, sua logística de funcionamento e
organização financeira34
.
32
Sport Club. A Federação, Manaus 3 abr. 1899, n.386, p.1. 33
Estudos sobre associações recreativas ou sociais têm se valido de estatutos como fontes fundamentais de
análise, destacando suas possibilidades de revelar hierarquias de valores e regras que mantinham tais
associações, bem como os aspectos que lhes pareciam importante ser preservados ou reproduzidos. Como
exemplo nesse sentido, entre muitos possíveis, ver RAMOS, E. H. C. L.; WEBER, R. Sociabilidades
nacionalizadas: clubes sociais do sul do Brasil no contexto da Primeira Guerra Mundial. Revista de História
Regional, v.20, n.1, p. 149-164, 34
Todas as informações referentes ao estatuto do Sport Club Amazonense podem ser encontradas na seguinte
fonte: Estatutos do Sport Club Amazonense. Diario Official, Manaus 15 maio. 1898, n.1279, p.1-4.
18
Para administrar o clube havia uma diretoria35
que era inspecionada por uma
comissão fiscal e julgada em assembleia com a participação de no mínimo vinte sócios. As
atividades e encaminhamentos que se davam, eram determinados por grupos e comissões
designados pela diretoria. Foi dessa maneira que se deu a proposta de criação da seção de
esporte náutico do clube, onde um grupo de sócios parecem ter se dirigido ao jornal para
anunciar tal pretensão que estava em construção36
.
Ser um sócio do Sport Club Amazonense não era para qualquer habitante de
Manaus, pois, era necessário passar por uma série de procedimentos. O candidato a sócio
deveria gozar de bom conceito e ocupar posição social decente; ser adepto reconhecido em
qualquer um dos ramos de diversões compreendidos no programa do clube; ter o nome
apresentado por um dos seus sócios em pleno gozo dos seus direitos; e ser aprovado pela
diretoria, a quem deveria ser dirigida a proposta37
.
Nessa proposta, que seria destinada à diretoria do clube, deveria constar a
declaração da idade, naturalidade, estado civil, profissão e residência do proposto. E
finalmente, caso o candidato preenchesse todos os requisitos, deveria pagar a jóia de
admissão, diploma, estatutos e regulamento que eram 100$000 e arcar com a mensalidade de
10$000. Para dimensionar o custo real destes valores e perceber o quão proibitivo eles
poderiam ser, diga-se que o ganho diário de um trabalhador em Manaus em 1906 era de
aproximadamente 6$000, de acordo com estimativa fornecida por Dias38
.
Sendo assim, os procedimentos para ser um sócio concorriam para uma disposição
em tentar manter seus círculos de relação mais hermeticamente cerrados entre si, por meio de
uma composição de classe mais homogênea, o que não impedia necessariamente, porém,
cisões e divergências nos seus comportamentos ou nos seus valores.
Os esportes eram tidos como indicadores de civilidade e modernidade. No Brasil,
em várias ocasiões, a exibição pública de status e prestígio atuara como um importante fator
para a fundação de clubes esportivos39
. Em Manaus essa situação não era diferente. A elite
estava “ávida para mostrar seu status advindo da riqueza da comercialização da borracha”.
35
A diretoria era formada por um presidente, um vice-presidente, dois secretários, um tesoureiro e seis diretores,
que seriam eleitos anualmente. 36
Sport Club. Commercio do Amazonas, Manaus 24 jun. 1898, n.227, p.1. 37
Estatutos do Sport Club Amazonense. Diario Official, Manaus, 15 maio. 1898, n.1279, p. 1. 38
DIAS, E. M.. A ilusão do Fausto - Manaus 1890 – 1920. Manaus Editora Valer, 1999, p.131. 39
Vários trabalhos, tratando de diferentes regiões do Brasil, têm enfatizado o papel que teve o uso distintivo do
esporte para o seu processo de difusão entre os fins do século XIX e princípios do século XX. Entre outros, ver
CAPRARO, A. M. Foot-ball, uma prática elitista e civilizadora: investigando o ambiente social e esportivo
paranaense do início do século XX. Dissertação (Mestrado em História). Universidade Federal do Paraná,
Curitiba, 2002. LUCENA, R. F. O esporte na cidade: aspectos do esforço civilizador brasileiro. Campinas:
Autores Associados, 2001.
19
Nesse sentindo, o Sport Club Amazonense fazia parte dos esforços de concretização desse
ideário. Seus objetivos eram de “propagar e desenvolver o gosto pelos exercícios
concernentes aos múltiplos ramos que pode abranger sua própria designação, especialmente a
velocipedia, gymnastica, esgrima, patinação e jogos athleticos, além dos demais jogos não
prohibidos” e de promover “recreios e diversões uteis” compatíveis com o meio social dos
seus membros e clima40
.
Tais objetivos evidenciavam esse ideário que se pretendia alcançar naquela época,
considerando que havia duas categorias de atividades. A primeira era aquela que se pretendia
alcançar, ou seja, a realização dos esportes e diversões “úteis”. A segunda era a das atividades
que se pretendia combater, evitar, criando uma distinção, os jogos proibidos e as diversões
inúteis. Esses jogos e diversões inúteis eram aqueles considerados “aviltantes do espírito
humano”, como a roleta, o jogo de bilhar e a “jogatina” nos navios, na Praça de São Sebastião
e em áreas sobre vigilância sanitária41
. Isto é, eram os jogos de azar, onde era dito que o
sujeito colocava a sorte como definidora da sua vitória ou derrota.
Embora, a velocipedia, ginástica, esgrima, patinação e jogos atléticos estivessem
entre os esportes pretendidos a princípio, os que de fato fariam parte da vida esportiva do
clube seriam a esgrima42
, o tiro, ciclismo, ginástica, remo e jogo da bola. Eles seriam
propagados por meio das seções, concursos e campeonatos.
Não se sabe, ao certo, como eram as seções de tiro organizadas pelo Sport Club
Amazonense, todavia foi possível observar que ocorriam concursos entre os sócios. Esses
concursos eram anunciados pela imprensa que divulgava a chamada para inscrição. “No
próximo domingo haverá no Sport Club a magnífica diversão do tiro ao alvo para a qual estão
convidados os sócios que desejam inscrever-se” 43
. Sua periodicidade parecia ser a cada dois
meses. Em cada concurso de tiro era necessário a participação de três “juízes” que,
provavelmente, conferiam e somavam a pontuação de cada tiro. Geralmente, ao término dessa
competição a imprensa divulgava o resultado e comentava como estava o “clima” no local.
Como, por exemplo, no 6º concurso, onde era dito que “houve muita animação entre os
atiradores”,44
ou no sétimo, onde foi informado que havia “concorrência regular” 45
.
Simultaneamente as seções e concursos de tiro, o ciclismo era desenvolvido no
clube. Certa vez, por ocasião do jornal Commercio do Amazonas ter feito um artigo tentando
40
Estatutos do Sport Club Amazonense. Diario Official, Manaus, 15 maio. 1898, n.1279, p.1. 41
MOURA, K. B. Caixeiros: organização e vivências em Manaus (1906 – 1929), p.112. 42
Não se sabe como ocorria a organização da esgrima no clube, apenas que ela acontecia. 43
A Federação, Manaus 26 jul. 1900, n.710, p.1. 44
Commercio do Amazonas, Manaus 26 jul. 1898, n.241, p.1. 45
Commercio do Amazonas, Manaus 13 set. 1898, n. 278, p.1.
20
mostrar a utilidade da bicicleta em outra cidade, era deixado escapar que foram vistos no
Sport Club Amazonense mais de 40 ciclistas46
. Isso, provavelmente, aconteceu no edifício à
rua Municipal, lugar que em 1907 tinha 130 casas e moravam 619 adultos (homens e
mulheres) que deveriam ter notado essa movimentação em um determinado ponto da rua47
. A
bicicleta era um artefato novo que ainda parecia sofrer “inúmeros preconceitos”. Os jornais
tentavam defender seu uso, mostrando sua utilidade em outros países.
Na França se está actualmente empregando com êxito no serviço militar,
concorrendo assim para a defeza nacional. Na vida pratica official o seu primeiro
serviço foi servir de meio de transporte aos estafetas, que modestamente corriam de
um a outro ponto levando comunicações e transmittindo ordens. No nosso paiz
ainda se lhes não conhecem as vantagens praticas, continuando a servir como Sport
de recreio. 48
Além da seção de bicicleta, o clube procurava participar de corridas organizadas
na cidade, como em uma ocasião onde se pretendia homenagear a chegada do ex-governador
Eduardo Ribeiro. Nessa oportunidade, o Sport Club Amazonense só não teve a participação
efetiva dos seus ciclistas, porque ocorreu um desentendimento com outro clube que
organizava o programa da corrida49
. Essa situação parece ter nutrido a ideia no Sport Club
Amazonense de se investir na construção de um velódromo na cidade. O clube realizou seis
seções para tratar de sua construção, chegando a organizar uma comissão que daria o parecer
sobre o projeto, já que para construí-lo teria que realizar um empréstimo50
. Porém, não se sabe
se o projeto chegou a ser efetivado.
A seção de ginástica do clube funcionava regularmente, oferecendo aulas que
pareciam ter grande e regular frequência. Realizadas todas as noites, em um salão próprio,
contando com jogos de halteres e lecionadas pelo Sr. Alfredo Lemos, apontado pela imprensa
local como um dos responsáveis pelo progresso no desenvolvimento do estudo da ginástica
em Manaus, dizia-se mesmo que as aulas eram bastante concorridas51
. Aulas de ginástica
integravam o repertório mental e gestual de parte da população de Manaus ao menos desde
1884, quando instituições de ensino secundário da cidade assimilaram a prática em seus
46
Commercio do Amazonas, Manaus 31 ago. 1898, n.271, p.2. 47
Resenceamento de Manáos 1907. Jornal do Commercio, Manaus 12 abr. 1907, n.1001, p.2. 48
Commercio do Amazonas, Manaus 31 ago. 1898, n.271, p.2. 49
As corridas. Commercio do Amazonas, Manaus 17 dez. 1899, n.89, p.1. 50
Sport Club. Commercio do Amazonas, Manaus 17 jan. 1899, n.375, p.2. 51
Sport Club Amazonense. Commercio do Amazonas, Manaus, 30 jul. 1898, n.245, p.2; Seção Sportiva.
Commercio do Amazonas, Manaus, 03 set. 1898, n.274, p.2.
21
currículos52
. Na década seguinte, a partir de 1893, ao lado das evoluções militares, esgrima,
natação e jogos escolares, a ginástica seria incorporada por outras instituições de ensino,
ampliando seu alcance, embora ainda bastante restrito às elites, que basicamente compunham
o público frequentador dessas instituições educacionais. Nesses casos, conforme dizia os
regulamentos do Ginásio Amazonense, tratava-se de uma ginástica “exclusivamente higiênica
e educativa, sem caráter acrobático” 53
. A concepção de ginástica propugnada por este
regulamento opunha-se claramente às modalidades praticadas no circo, que também tinham
lugar em Manaus nessa época54
. No Sport Club Amazonense, totalmente de acordo com os
hábitos festivos dos seus sócios, a prática da ginástica, muitas vezes concebida como mais um
gênero de esporte, encerrava um conteúdo com pretensões higiênicas e sanitárias, embora
servisse também como oportunidade para a realização de festas e bailes dançantes55
.
As pessoas que praticavam a ginástica nas aulas do Sr. Alfredo Lemos, pareciam
ser as mesmas que estariam envolvidas em outras atividades esportivas promovidas pelo
clube, evidenciando uma difusão social ainda limitada das novas práticas, restritas apenas a
pequenos grupos. Quando o Sport Club organizou uma competição náutica no Rio Negro,
anunciada com grande entusiasmo em princípios de setembro de 1898, foi preciso interromper
temporariamente as aulas de ginástica, pois a maioria dos alunos estava inscrita na regata.
Esse evento foi organizado em homenagem ao dia 5 de setembro (data que elevou Manaus a
condição de Província). Nesta ocasião, tiveram seis páreos, entre eles um de honra, com
embarcações de 2 a 6 lugares, nos quais para participar era necessário realizar a inscrição.
Além disso, os vencedores seriam premiados com medalhas. Para esse tipo de competição
havia, pelo menos, o juiz de chegada. Essa figura era alguém convidado pela organização que
no fim das contas, acabou sendo um redator do jornal Commercio do Amazonas56
.
Como de costume, a imprensa local envolveu-se ativamente com o evento através
da publicação de notícias sobre a regata, que claramente tentavam alimentar expectativas ao
redor da competição.
Com grande animação para a regata que no dia 5 do próximo mês se realizará no
formoso Rio Negro. Consta-nos que todos os páreos serão renhidamente disputados.
Os amadores deste gênero de Sport continuam exercitando-se em remar e ainda no
domingo de tarde tivemos ocasião de ver o rio sulcado por numerosos escaleres.
52
Almanach administrativo, histórico, estatístico e mercantil da província do Amazonas para o anno de
1884. Manaus: Typographia do Amazonas de José Carneiro dos Santos, 1884, p.72. 53
Regulamento do Gymnasio Amazonense. Diario Official, Manaus, 8 mar. 1896, n.662, p.1-2. 54
Cf. Diario Official, Manaus, 28 maio 1895, n.438, p.3. 55
Sport. Commercio do Amazonas, Manaus, 24 jul. 1898, n.240, p.2; Seção Sportiva. Commercio do
Amazonas, Manaus, 03 set. 1898, n.274, p.2. 56
Commercio do Amazonas, Manaus 18 ago. 1898, n.260, p.1.
22
Todo este movimento tendente a subtrair-nos á apatia da vida de Manaus se deve
exclusivamente a esse grupo de rapazes que a despeito da má vontade que encontrou
em certa classe da nossa sociedade e através de dificuldades de toda espécie que se
lhe opuseram, conseguiu ainda assim organizar uma sociedade que hoje não teme o
confronto das melhores que há no Pará. Se até política quiseram fazer com ela!... A
verdade, porém, é que o Sport Club progride e faz honra á nossa Capital 57
.
No período estudado houve uma situação que levou as seções de ginástica,
ciclismo e jogos atléticos a serem interrompidas no início de 1899. O motivo dessa
interrupção era a participação de sócios que não estavam em dia com a mensalidade do clube
e outras pessoas que não comprovavam sua identidade. Com isso, em abril deste mesmo ano,
o clube deliberou que as seções fossem reatadas, não podendo, porém, “tomar parte em
qualquer ramo de diversão os socios que não estiverem em pleno goso de seus direitos e bem
assim os que não provarem a sua indentidade no acto da respectiva inscripção”58
.
Ao final de abril de 1899 o clube anunciou que iria realizar um “grande match’s
tennis”, onde dois “campeões” que haviam chegado à Manaus do Sul da União iriam tomar
parte da disputa. Não se sabe quem eram os dois “campeões”, porém isso demonstra a ligação
que o clube tinha com outras regiões do país.
O clube também tinha em seu rol de atividades um jogo que era praticado no Rio
de Janeiro desde 1764, o jogo da bola. Este foi inaugurado oficialmente no dia dezoito de
dezembro de 1898, em um domingo à tarde. Sua aceitação no clube foi de tal forma, que em
1900 para comemorar o dia da Proclamação da República estava sendo anunciado o
“Campeonato Annual do Jogo da Bola” 59
. Campeonato esse, que exigia dos seus
participantes a inscrição60
e do clube a compra de material novo como, por exemplo, novas
bolas61
. No jogo da bola se buscava o recorde que era anunciado no jornal62
. Esse recorde era
“medido” em partidas que chegavam a totalizar duas em um evento. Ao final do campeonato
eram apresentados os resultados, descritos da seguinte maneira:
-1º 16 Bollas:
Nino 107; Weaver 130, Probst 150; Bessler 126; Araujo 247; Hxempler 183;
Orlando 156; Pereira 192; Müller 116; Rodolpho 112:
- 2º 14 Bollas
Araujo 301; Hxempler 88; Pereira 143; Rodolpho 64; Weaver 161, Probest 111;
Nino 90; e Monteiro 6563
.
57
Seção Sportiva. Commercio do Amazonas, Manaus, 30 ago. 1898, n.270, p.2. 58
Commercio do Amazonas, Manaus 29 abr. 1899, n.453, p.1. 59
Commercio do Amazonas, Manaus 23 out. 1900, n.70, p.2. 60
Commercio do Amazonas, Manaus 23 out. 1900, n.70, p.2. 61
Commercio do Amazonas, Manaus 24 out. 1899, n.52, p.2. 62
Commercio do Amazonas, Manaus 11 out. 1899, n.43, p.1. 63
Commercio do Amazonas, Manaus 24 out. 1899, n.52, p.2.
23
De acordo com Victor Melo o jogo da bola no “Rio de Janeiro, chegou, vida da
Penísula Ibérica, conhecida como jogo da bola de pau e guardava semelhanças com o boliche.
Uma pelota de madeira era atirada por uma pista de terra ou tábua, para derrubar pinos que
tinham diferentes pontuações” 64
. Se esse exemplo for trazido para Manaus, é possível ter a
seguinte conclusão: 1º 16 bolas e 2º 14 bolas, se referindo a duas “partidas” diferentes, uma
com dezesseis bolas e outra com quatorze bolas. Os nomes que seguem de números como, por
exemplo, Nino 107 e Weaver 130, deveria se tratar da pontuação que cada um conseguiu na
“partida”.
Embora os esportes representassem parte significativa do rol de atividades do
Sport Club Amazonense, eram as festas que tinham mais destaque nos jornais. Isso, pois, elas
representavam um momento onde as mulheres e os homens estariam envolvidos numa mesma
atividade no clube, o que acarretaria maior visibilidade e adesão, possibilitando uma
aproximação da sociedade visada. Tanto que, suas dependências eram cedidas para festas e
reuniões, era utilizada na recepção de pessoas ilustres e serviu de palco para comemorações
de datas consideradas importantes na cidade.
Alegrou-me bastante uma noticiasinha , que li no Domingo em uma das folhas desta
Capital; noticia esta, que annunciava uma sauterie, resolvida quase á ultima hora,
pelo Sport Club. Que tal? Eu que já me sentia rheumatico por falta de exercícios
gymnasticos dansei bastante umas Walsas, Schottschs, Quadrilhas, erc; porém tudo
á americana! Sim; porque eu sou americano –não nego fogo-! E ainda fallam em
dansa![...] E assim, passei distraído a noite de Domingo. Que o Sport nos
proporcione sempre d’estas sauteries é o que desejo. Ao menos, não terei mais
rheumatismo....65
.
De fato, o Sport Club Amazonense passou a proporcionar mais sauteries. A partir
de 1899 o clube instaurou a ideia de realizar sauteries mensais como uma possível estratégia
para agradar aos sócios que não eram familiarizados com os esportes e para manter a saúde
financeira do clube, visto que os ingressos dessas festas eram os recibos das mensalidades do
clube. “De ordem da Directoria, convido aos Srs. Sócios para a sauterie mensal que este Club
realisará no dia 6 do corrente. O ingresso será o recibo do mez de Dezembro p. passado” 66
.
Além das festas mensais, o clube costumava ceder suas dependências para
comemorações. Esse foi o caso do baile em homenagem a abolição da escravidão67
que gerou
polêmicas dentro e fora do clube, que foram materializadas por meio dos jornais Commercio
64
MELO, V. Mudanças no padrões de sociabilidade e diversão: o jogo da bola no Rio de Janeiro (séculos XVIII
e XIX). História (São Paulo), v.35, n.105, p.3. 65
A Federação, Manaus 6 nov. 1898, n.244, p.2. 66
Commercio do Amazonas, Manaus 4 jan. 1899, n.365, p.2. 67
A abolição da escravidão em Manaus aconteceu em 1884, 4 anos antes da data oficial do Brasil. NÉRY, F. J.
S. O país das amazonas. Livraria Itatiaia Editora, 1979. Traduzido por Ana Mazur Spira.
24
do Amazonas e Amazonas. Uma dessas polêmicas foi ocasionada por “um pequeno auxilio
pecuniário para maior deslumbramento da festa” concedido pelo vice-governador do Estado.
Para o jornal Amazonas, esse auxílio parecia ser inapropriado, havendo manifestações
contrárias. Já o Commercio do Amazonas pedia “por Deus ou por Baccho” para que os
contrários ao ocorrido os deixassem sossegados, pois a pátria não corria perigo, porque o
vice-governador deu “um subsídio concedido gentilmente do seu bolsinho vice-presidencial e
não dos cofres públicos” 68
. A outra polêmica diz respeito à concessão dos salões para a
realização do baile. Para um cronista do jornal Commercio do Amazonas, o clube, ao ceder
suas instalações, “cumpriu um dever e satisfez a aspirações de todos os seus associados que
não conhecem os manejos políticos e intrigas das facções que se digladiam na conquista do
poder” 69
. Logo para o Amazonas, a decisão de ceder os salões foi motivo para a demissão de
um dos membros da diretoria. O que foi contestado pelo Commercio do Amazonas que
alegava ter sido o motivo da sua demissão “a impossibilidade de comparecer diariamente no
Club, como director de mez, e ahi ficar até que ser retire o ultimo sócio... o que succede
sempre depois da meia noite” 70.
Essas versões que circulavam pelas páginas do Commercio
do Amazonas revelavam tensões mais ou menos latentes entre os seus sócios, tanto no que diz
respeito à cessão de uso de suas instalações, quanto no que diz respeito à escravidão. Isso
mostra que as ideias do grupo que compunha o Sport Club Amazonense não eram
homogêneas. Todavia, elas não impediram a realização do baile que parece ter servido de
“ponto de encontro” para aqueles que desejavam ser distintos e seletos71
.
Embora o clube fosse uma organização particular, com várias restrições e
exigências para o acesso às suas instalações, parte das motivações para sua fundação e
funcionamento justificava-se na possibilidade de acontecimentos privados ganharem uma
dimensão pública. No Brasil, em várias ocasiões, a exibição pública de status e prestígio
atuara como um importante fator para a fundação de clubes esportivos72
. Em Manaus, não foi
outro o motivo pelo qual se destacou tão enfaticamente na imprensa local a dimensão,
literalmente, “distintiva” e “seleta” do Sport Club Amazonense.
68
Sport Club. Commercio do Amazonas, Manaus 14 jul. 1898, n.232, p.1. 69
10 de julho. Commercio do Amazonas, Manaus, 7 jul. 1898, n.226, p.1. 70
Sport Club. Commercio do Amazonas, Manaus 14 jul. 1898, n.232, p.1. 71
Sport Club. Commercio do Amazonas, Manaus 12 jul. 1898, n.230, p.1. 72
Vários trabalhos, tratando de diferentes regiões do Brasil, têm enfatizado o papel que teve o uso distintivo do
esporte para o seu processo de difusão entre os fins do século XIX e princípio do século XX. Entre outros, ver
CAPRARO, A. M. Foot-ball, uma prática elitista e civilizadora: investigando o ambiente social e esportivo
paranaense do início do século XX. 2002. Dissertação (Mestrado em História). Universidade Federal do Paraná,
Curitiba. LUCENA, R. F. O esporte na cidade: aspectos do esforço civilizador brasileiro. Campinas: Autores
Associados, 2001.
25
Nesse sentido, outras comemorações viriam reforçar essa noção, como a festa da
virada de ano (1898-1899). Apesar de ser restrita, um folhetim a descrevia detalhadamente.
Laura, a redatora, inicia o folhetim explicando que “incontestavelmente a sauterie realisada no
Sport Club Amazonense, na noite de 31 de dezembro, foi uma das mais bellas festas” que
havia assistido. Sua alegação para tal afirmação eram os participantes e a organização da
festa. Para ela, o que havia de mais “selecto” em Manaus, lá estava “deslumbrante de
satisfação.” Inclusive, “revelando nos olhares francos e expansivos a alegria intima de que
estavam possuídos.” Quanto à organização, a redatora informava que na entrada do salão
“elegantemente preparado” estava uma comissão formada por membros do Sport Club
Amazonense73
que recebiam todas as senhoras pelos braços e as acompanhava até
determinada parte do salão, “parecendo concorrentes a um concurso de amabilidades.” Ao
entrar na festa as convidadas recebiam um “cartãozinho” com um número. Esse cartão
serviria para o sorteio de “um broche de ouro representando um bandolim com um rolo de
música sobre as cordas”. Tal cartão era pendurado pelas convidadas sob o leque ou no cinto.
Depois de descrever algumas características da festa, Laura se detém a contar uma relação que
aquela celebração a permitia fazer sobre um lugar que visitara. Em seguida, ela passa a falar
das roupas de algumas pessoas presentes na festa como, por exemplo, de dona Sinhá
Pingarilho que “trajava um vestido elegantíssimo de fustão branco com flores naturaes no
cinto e duas adhalias vermelhas, também naturaes, uma sobre a lapella esquerda da jaqueta e
outra compondo o penteado.” E, da dona “Lulinha Palhano – trazia uma toilette cor de rosa, e
sempre graciosa, no seu porto distincto e nobre, distribuía sorrisos com as suas amigas.”
Ambas eram tidas como trajadas “elegantemente” pela cronista. Algumas descrições dos
trajes eram acompanhadas de observações sobre a fisionomia e a naturalidade da pessoa.
Como foi feito com dona Yayá Sá, pernambucana, que parecia um pouco preocupada para a
cronista que comentava em tom de fofoca: “Que teria elegante pernambucana”?
Quando a sauterie atingiu às doze horas da noite, foi tocado o hino nacional,
algumas pessoas levantaram alguns vinhos e no “Buffet um grupo de senhoras e cavalheiros
brindou o jovem anno de 99 com taças de champagne.” Nesse momento, foi realizado o
sorteio do brinde pelo presidente do clube que sorteou o número 36. Laura finalizou o
folhetim dizendo ter se retirado “satisfeitíssima”, deixando ainda muita animação na casa da
festa e saudando o presidente do Sport Club Amazonense “pelo brilhantismo da sua festa” 74
.
73
Faziam parte dessa comissão: Moura Alves, Antonio Silva, Antonio Bentes, Raymundo Silva e Raymundo
Pereira. 74
Commercio do Amazonas, Manaus 5 jan. 1899, n.366, p.1.
26
Diferente de outras temáticas dos jornais, as crônicas de festas, geralmente, eram
escritas por mulheres, como a que se passara no Sport Club Amazonense. As mulheres
ganharam espaço nas crônicas sociais, sendo que o reconhecimento desse gênero ganhou
maior dimensão a partir da década de 80 do século XIX. Nas crônicas, os jornais tendiam “a
destacar a elegância e refinamento das mulheres em festas e recepções públicas, que serviam
de pretexto para exibicionismo ostentatórios das grandes damas” 75
. Assim como foi o caso da
crônica de Laura.
Durante os dois primeiros anos de existência do Sport Club Amazonense, suas
dependências pareciam ser utilizadas como “sala de estar” da cidade. Nelas eram recebidas
pessoas “ilustres” que estavam de passagem pela cidade ou que haviam retornado. Esse era o
caso de dois interpretes da obra de Shakespears. Os dois eram da Itália e, provavelmente,
vieram se apresentar em algum teatro da cidade. Os dirigentes do Sport Club Amazonense
ajudaram na recepção dos artistas que até assinaram o livro de honra do clube76
. Outro
exemplo que pode ser citado se refere ao presidente do Partido Republicano e ex-governador
do Amazonas, Eduardo Gonçalves Ribeiro. Nessa ocasião, os salões do Sport Club
Amazonense foram, novamente, cedidos para uma comissão de amazonenses, onde estava
previsto um “grande sarau” que seria oferecido ao ex-governador77
. Esse sarau,
provavelmente, teve a participação de, aproximadamente, 650 pessoas, número de convites
que foram distribuídos78
.
Com isso, o Sport Club Amazonense ganhava notoriedade entre parte da
sociedade. A tal ponto que seria homenageado juntamente com a Associação Comercial e
Associação dos Empregados do Comercio em um festival no Eden-Teatro.79
E, por um
integrante do Circo Americano que dedicou a função daquele dia a “elegante sociedade Sport
Club Amazonense” 80
. Além disso, na comemoração do primeiro ano de existência do clube,
festejado juntamente com a data da Proclamação da República, o governador concedeu
permissão para que seus salões fossem iluminados à luz elétrica e que uma banda militar
tocasse na porta da sua sede social81
.
Foi por meio dessas festas que o clube encontrou a principal ferramenta para a sua
legitimação perante parte daquela sociedade, pois os esportes ainda não estavam disseminados
75
PINHEIRO, M. L. U. Folhas do Norte: Letramento e periodismo no Amazonas (1880 - 1920). Edua, 2015,
p.295. 76
Commercio do Amazonas, Manaus, 13 maio. 1899, n.462, p.1. 77
Commercio do Amazonas, Manaus 6 dez. 1899, n.64, p.6. 78
Commercio do Amazonas, Manaus 17 dez. 1899, n.89, p.1. 79
Commercio do Amazonas, Manaus 20 ago. 1899, n.5, p.2. 80
Commercio do Amazonas, Manaus 4 out. 898, n.295, p.1. 81
Commercio do Amazonas, Manaus 11 nov. 1898, n.325, p.2.
27
ao ponto de conferir uma aproximação à sociedade visada e o reconhecimento necessário para
manter uma organização como o Sport Club Amazonense. Dessa forma, as festas fariam parte
de suas entranhas com as sateuries mensais e seus salões seriam ora utilizados, ora cedidos
para comemorar datas consideradas importantes e recepcionar figuras “ilustres”, faria parte
dos esportes, como uma via de mão dupla. Além de ser um momento, onde havia a
participação efetiva das mulheres.
O Sport Club Amazonense desaparece das páginas dos jornais em meados de
1900. Ao que tudo indica um dos fatores que contribuiu para tal, foi a inauguração dos salões
do Teatro Amazonas82
, que passou a ser “sala de estar” da cidade. Além do mais, outro clube
se constituiu na cidade em 1898. Este tinha como foco o ciclismo, esporte que ficaria muito
conhecido no início do século XX.
2.2 Grupo Cyclista Amazonense
(...) hontem, uma autoridade sanhudamente respeitadora dos bons costumes e outras
coisas correlativas entendeu que o sr. Soares, proprietário da <Casa Haveneza>,
flanando em bycicleta e mostrando meio palmo das canellas – por signal bem
magrisellas, offendia a moralidade, suggerindo talvez ideias algo [o]bnóxias e
fazendo fever pensamentos inconfessáveis, porque trazia meia...curta.
E, exclamava féramente inflamado em moralíssimo zelo: ou veste meias altas ou
recolhe-se a casa.
Peremptorio! E o sr. Soares, triste cyclista, recolheu-se effectivamente aos penates
por não poder calçar meias...de senhora e evitar de dormir no xilindró por usar
meias...de homem! 83
Essa notícia data de 12 de junho de 1898, foi retirada do jornal Commercio do
Amazonas. O seu autor, não identificado, argumentava que em outros países, tais como
Inglaterra, França e Alemanha, onde o ciclismo “reinava” como uma “verdadeira instituição”
era de rigor, mormente em passeio, utilizar um vestuário ao mesmo tempo elegante, simples e
cômodo. Um exemplo dessa vestimenta seria utilizar uma camisola de lã ou seda, de variadas
cores, quase sempre sem mangas; calção de flanela azul ou branca, folgado e terminando nos
joelhos; e finalmente de sapatos apropriados e meias curtas deixando descoberto parte da
perna. Ele ainda esclarecia, que nesses países a legislação relativa à moralidade e bons
costumes era rigorosamente cumprida e que ninguém havia se ofendido com a vestimenta dos
ciclistas. Entretanto, em Manaus, como indica o autor, onde os carregadores e carroceiros
82
DAOU, A. M. A cidade, teatro e o “paiz da seringueiras”: práticas e representações da sociedade
amazonense na passagem do século XIX – XX. Rio de Janeiro: Rio Book’s, 2014. 83
Commercio do Amazonas, Manaus 12 jun. 1898, n.230, p.1.
28
andavam de perna a mostra e as mulheres se lavavam nos igarapés, uma autoridade se
ofendeu com um ciclista que mostrava suas magricelas canelas.
Esse ciclista era o Sr. Soares, negociante bem conhecido em Manaus que parece
não ter lamentado o ocorrido em casa 84
. No outro dia, no mesmo jornal havia uma notícia,
que parecia ser do mesmo autor, informando que o chefe de segurança da cidade iria “mandar
baixar as ordens competentes aos seus subalternos afim de que estes não tornem, como
arroubos de moralidade, a impedir os cyclistas de darem os seus passeios com os seus
canellins a vé-la”. Para justificar tal atitude do chefe de segurança, o autor deu novos
exemplos do vestir-se com parte do corpo a mostra. Como no Rio de Janeiro, no Velódromo
Nacional, nas corridas públicas noturnas, onde os corredores compareciam com os braços e
gambias desnudadas; em Itacoatiara, onde os catraieiros e um grande número de habitantes
mostravam dessassombradamente “seus negros pernis”; na Inglaterra, onde soldados
escoceses chamados highlanders que usavam por calças a pele das pernas com o ornamento
dos respectivos pêlos que lhes é peculiar. Por fim, informou que os ciclistas podiam passear
com toda a decência, mostrando o contorno da perna, do joelho ao tornozelo e retificou:
[...] para tranquilidade do Sr. Soares e em homenagem respeitosa a verdade, - o que
hontem avançamos um tanto levianamente, com relação ás suas pernas: - Não! Não
são magrisellas! Antes pelo contrario85
.
O Sr. Soares, protagonista do ocorrido, se chamava Joaquim da Costa Soares,
parecia ser de origem portuguesa86
, e era um dos donos de todas as transações das casas
comerciais denominadas Casa Havaneza e Barbeiro Elegante, além de tesoureiro da
Sociedade Beneficente Portuguesa.87
Ao que tudo indica, o Sr. Soares foi o presidente do
Grupo Cyclista Amazonense, grupo precursor do ciclismo em Manaus.88
O ocorrido com ele
demonstrava o conflito entre a chegada de novas ideias, que acompanhavam outro modo de se
vestir, com as ideias arraigadas na cidade. Segundo Santos “O período de remodelação de
Manaus trouxe novos olhares sobre a cidade, uma redefinição da identidade e representações
84
Aniversario. A Federação, Manaus 29 dez. 1898, n.296, p.8. 85
Commercio do Amazonas, Manaus 13 jul. 1898, n.231, p.1. 86
Essa identificação foi possível, devido a uma característica peculiar da comunidade portuguesa do Amazonas,
os nomes de seus estabelecimentos começavam com a letra “J”, o que Benchimol, denominou de “era dos Jotas”.
BENCHIMOL, S. A. Formação social e cultural. 3º Ed – Manaus: Editora Valer, 2009, p 85. 87
Declaração. Diario Official, Manaus 1 nov. 1896, n.845, p.4.; Beneficente Portuguesa. Commercio do
Amazonas, Manaus 1 dez. 1900, n.111, p.1. 88
Grupo Ciclista Amazonense. Commercio do Amazonas, Manaus 20 nov. 1898, n.332, p.2.
29
diferenciadas dos outros espaços por parte de seus próprios habitantes, especialmente suas
autoridades e elites” 89
. Como também, uma nova maneira de se portar e se vestir.
O Grupo Cyclista Amazonense era um clube que organizava, esporadicamente,
passeios, passeatas e corridas de bicicletas em Manaus, a partir 1898. Seus passeios e
passeatas eram realizados pelas ruas da cidade e as corridas na Praça General Osório90
no
largo 36. Como na cidade não havia um velódromo, algo que já podia ser observado, por
exemplo, no Rio de Janeiro91
e São Paulo92
, a praça era improvisada para as corridas. Dessa
improvisação um novo local surgia, o Velódromo Nacional que tinha uma “pista” com 250
metros de extensão.
FIGURA 1 - Praça General Osório, 1909.
Fonte: Retirada do site da Biblioteca Nacional.
As passeatas e passeios organizados pelo Grupo Cyclista Amazonense não
ocorriam com frequência regular e se restringiam a participação dos integrantes do clube. A
imprensa divulgava informações do evento como horário, local de saída, data, número de
participantes e sobre seu andamento. Um exemplo disso pode ser verificado na notícia de uma
passeata que foi organizada em 1899. “Hoje este grupo fará uma grande passeata pelas ruas da
89
SANTOS JUNIOR, P. M. A imposição da modernidade na Manaus da Borracha. Cadernos de pesquisa do
CDHIS, v.20, n. 30/37, p. 119 – 131. 2007. 90
Oriunda do largo da Campina, a praça foi extinta, hoje no local encontra-se o complexo esportivo do Colégio
Militar e Dom Bosco. DUARTE, D. Manaus entre o passado e o presente. Editora mídia ponto comm, v.1,
p.57. 2009. 91
Ver SCHETINO, A. M. Pedalando na modernidade: a bicicleta e o ciclismo na transição do século XIX para
o XX. Rio de Janeiro: Apicuri, 2008. 92
Ver GAMBETA, W. R. A bola rolou: o velódromo Paulista e os espetáculos de futebol (1895- 1916), Tese de
Doutorado, Universidade de São Paulo, 2013.
30
cidade. Informam nos que quase todos os membros deste Club não faltarão ao passeio
combinado, devendo sahir as 4 horas da tarde, do largo de S. Sebastião” 93
. E, na corrida do
dia 26 de fevereiro do mesmo ano, onde compareceram 27 ciclistas, número inferior ao
esperado - justificado pela chuva que abateu sobre cidade no dia94
.
A imprensa também procurava elogiar e incentivar a prática.
Gostamos deveras de ver a animação e o desenvolvimento que entre nós vae
tomando o sport velocipedico, devido exclusivamente a este grupo que não poupa
esforços para d’elle fazer uma verdadeira instituição. É preciso não desanimar em
tão bom caminho95
.
Além de se mostrar conectada com as notícias de corridas de bicicletas em outros
lugares do Brasil. Certa vez, em 1898, foi noticiado o resultado do 4º páreo de 12.000 metros
da corrida do dia 19 de junho no Velo Club, do Rio de Janeiro. Como a corrida parecia ser
exótica devido à distância, em Manaus não se deixou de anunciá-la. Informaram que seu
vencedor foi Nelson que percorreu 75 voltas no velódromo96
.
Para participar das corridas era necessário realizar inscrição. As inscrições eram
realizadas em estabelecimentos comerciais dos organizadores como, por exemplo, a Casa
Havaneza, Porta Larga e a Livraria Clássica Jayme & Camara97
. Geralmente, as corridas
tinham três etapas de divulgação na imprensa, nas quais ocorriam as chamadas para a
inscrição, programa das corridas e resultados.
O primeiro indício sobre a elaboração de uma corrida pelo Grupo Cyclista
Amazonense data de 31 de julho de 1898. A inscrição “Está aberta na Casa Havenesa e no
estabelecimento dos Srs. Jayme & Camara, a inscripção para a grande corrida, de bycicletas
que este grupo pretende realisar no proximo domingo as 4 ½ horas da tarde”. Essa corrida que
foi organizada em 7 páreos, ou seja, sete momentos diferentes onde haveria disputa entre os
93
Grupo Ciclysta amazonense. Commercio do Amazonas, Manaus 22 jan. 1899, n.379, p.2. 94
Grupo Cyclista Amazonense. Commercio do Amazonas, Manaus 28 fev. 1899, n.406, p.1. 95
Grupo Ciclysta amazonense. Commercio do Amazonas, Manaus 22 jan. 1899, n.379, p.2. 96
Commercio do Amazonas, Manaus 26 jul. 1898, n.241, p.1. 97
O estabelecimento Porta Larga era uma joalheria localizada na rua Municipal número 30, entre a livraria
Ferreira Penna e o Barbeiro Elegante, de posse de Pinto & Comp. Já a Livraria Classica Jayme & Camara estava
localizada na rua Guilherme Moreira e era de propriedade de Jayme do Canto Albuquerque e Joaquim Jacintho
da Camara. Ao que tudo indica, Pinto era José Joaquim Pinto de França, ciclista que disputava páreos
organizados nas corridas do Grupo Cyclista Amazonense e Arthur Moura Ribeiro que em 1908 viria a ser o
tesoureiro da Sociedade do Tiro Brasileiro no Amazonas. Enquanto Jayme do Canto Albuquerque e Joaquim
Jacintho atuavam como juízes nas corridas. Ver: Segunda Apparição à imprensa. A Federação, Manaus 25 dez.
1898, n.292, p.2. Ao commercio e as repartições publicas. Diario Official, Manaus 19 out. 1895, n.551, p.8.
Sociedade do Tiro Brasileiro no Amazonas. Jornal do Commercio, Manaus 12 mar. 1908, n.1424, p.3.
Commercio do Amazonas, Manaus 13 dez. 1898, n.347, p.1.; Ao commercio e as repartições publicas. Jornal
do Commercios, Manaus, 23 jul. 1904, n.176, p.3.; Velodromo Nacional. A Federação, Manaus 15 nov. 1898,
n.253, p.2.
31
ciclistas. Cada páreo recebia um nome – alguns desses nomes homenageavam pessoas, ou
instituições ou datas - e tinha uma premiação específica. Para essa corrida foram divulgados
os páreos e a sua premiação, esta última ficou exposta na Casa Havaneza no dia anterior ao da
corrida98
. O primeiro páreo se chamava “Grupo Cyclista” e tinha como prêmio um álbum para
retratos; o segundo era o “Baré” cujo prêmio era um chapéu e uma bengala; o terceiro era um
páreo infantil que ganhou a denominação de “Campeão”, onde seriam premiados os dois
primeiros colocados, um com uma abotoadora e o outro com uma caneta, ambos os objetos
eram de ouro; o quarto era o “31 de julho” que tinha como prêmio um “elegante” objeto para
cima da mesa; o quinto homenageava um coronel que ofereceu para o vencedor três “lindos”
botões de ouro; o sexto era o “Velocidade” que tinha dois prêmios, um alfinete de ouro
oferecido por um ciclista e um estojo para barba; o sétimo e último páreo era o “Consolação”
que tinha como prêmio uma “rica” caixa com perfumaria de Lubin99
. Os prêmios oferecidos
aos vencedores das corridas geralmente eram produtos comercializados nas casas dos
organizadores das corridas. Como, por exemplo, as joias encontradas na Porta Larga.
A divulgação e exposição dos prêmios pareciam denotar a necessidade de
incentivar a adesão dos ciclistas, pois ao que tudo indica, nessa corrida houve a abertura para
pessoas que não eram integrantes do Grupo Cyclista Amazonense.
Está aberta na Casa Havenesa e no estabelecimento dos srs. Jayme & Camara, a
inscripção para a grande corrida, de bycicletas que este grupo pretende realisar no
proximo domingo as 4 ½ horas da tarde. Sabemos que há grande animação para a
corrida, devendo ser distribuidos premios valorosos aos cyclistas vencedores. Esta
festa sportiva terá logar na praça General Osorio, que já está sendo
convenientemente preparada. Não podemos rebater aplausos ao grupo cyclista
amazonense, que, de accordo com os fins a que se destina e á medida de suas forças,
vae promovendo diversões populares, muito necessarias ao meio em que vivemos.
Bravos ao grupo100
!
Três dias depois o resultado da corrida foi publicado. Nele era informado os nomes
dos vencedores, as distâncias percorridas, o tempo gasto de cada páreo e que a “concurrencia
a essa festa da futurosa associação, foi enorme, o que deve ter animado o grupo para
promover outras diversões do mesmo genero” 101
.
98
Commercio do Amazonas, Manaus 30 jul. 1898, n.245, p.1. 99
Grupo Cyclista Amazonense. Commercio do Amazonas, Manaus 3 ago. 1898, n.248, p.1. 100
Grupo Cyclista Amazonense. Commercio do Amazonas, Manaus 28 jul. 1898, n.243, p.1. 101
Grupo Cyclista Amazonense. Commercio do Amazonas, Manaus 3 ago. 1898, n.248, p.1.
32
Ao que parece, essa corrida conferiu certa visibilidade ao grupo, de tal maneira que
integraram, com a realização de uma corrida, a programação de comemoração da
Proclamação da República102
.
O governo do Estado resolveu festejar a Proclamação da República em terras
brasileiras e prepara um programma todo popular que publicaremos mais tarde.
- A força federal dará, segundo somos informados, uma formatura na praça “General
Osorio”.
- O Sport Club, a brilhante sociedade que entre nós tem feito jus a consideração e
auxílio de todos, abrirá seus vastos salões, dando um magnífico baile.
- À praça “General Osorio” dizem-nos que o Grupo Cyclista Amazonense fará uma
magnífica corrida.
- Outros festejos se preparam ainda para o grande dia nacional. Em tempo opportuno
publicaremos o programma de todas as festas103
.
A corrida organizada pelo Grupo Cyclista Amazonense contou com a divulgação
de seu programa que continha a data, o local, o horário, nome dos juízes e suas funções,
atrações, prêmios e páreos. Marcada para acontecer no dia 15 de novembro à tarde, na Praça
General Osório no Velódromo Nacional, a corrida foi composta por 9 páreos que foram
estruturados da seguinte forma: número do páreo, nome, metros (voltas) e corredores como,
por exemplo, o primeiro, que se chamava “Amazonas”, tinha 1000 metros (4 voltas) e três
corredores. Nessa programação havia um páreo infantil, o terceiro com 500 metros. O páreo
“Consolação” para todos os que perderam e o páreo “Campeão” para todos os que ganharam.
Cada páreo teria o sinal de partida dado com um tiro de revolver “Nagham”. Além disso, as
disputas seriam executadas ao som de uma banda de música de um dos batalhões policias que
estaria posicionado no coreto ao centro da pista. Os três primeiros corredores de cada páreo
seriam premiados com medalhas, sendo o primeiro com medalha de ouro, o segundo com
medalha de prata e o terceiro com medalha de cobre. Os prêmios seriam entregues por uma
comissão no dia 21 a bordo do vapor que realizaria o passeio fluvial. Para a execução da
corrida foram necessários 5 tipos de juízes, um juiz de partida, um de confirmação, um de
chegada, quatro de raia, quatro “chronemetros”. Dentre os juízes estavam Jayme do Canto
Albuquerque, juiz “chronometro”, Joaquim Jacintho da Camara, juiz “de confirmação” e
Joaquim da Costa Soares, superintendente geral. Ambos eram comerciantes que cediam seus
estabelecimentos para o recebimento de inscrições 104.
102
Essa programação foi realizada em dois dias, o dia 15, data do feriado nacional, e o dia 21 data em que a
notícia da proclamação da república chegou à Manaus. 15 de nov. A Federação, Manaus 9 nov. 1898, n.247,
p.1. 103
15 de novembro. A Federação, Manaus 9 nov. 1898, n.247, p.1. 104
Velodromo Nacional. A Federação, Manaus 15 nov. 1898, n.253, p.2.
33
FIGURA 2 - Programa das corridas do dia 15 de novembro.
Fonte: Velódromo Nacional. A Federação, Manaus 15 de nov. 1898, n. 253, p.2.
34
No dia 16 de novembro o jornal A Federação publicou uma nota dizendo que os
páreos da corrida foram “valorosamente” disputados pelos “campeões” e que a assistência foi
“extraordinária”, reinando tudo na mais “completa animação” 105
. Porém, no dia 17 o mesmo
jornal publicaria uma descrição mais detalhada dos festejos em um texto denominado “As
festas do dia 15 de novembro”. Nele o jornal A Federação dizia sentir-se “feliz em descrever
nas suas columnas os festejos realizados no dia 15 de Novembro [...]”. Com muitos elogios ao
povo que foi tido como a grande força que ampara as sociedades e impulsiona o progresso e o
engrandecimento das nações, que pensa e não se deixa levar pelo despeito e pelas ambições
injustificáveis, eram feitas considerações sobre o dia 15, que era tido não apenas como a data
da vitória de um partido, mas como o maior feito da democracia e do mais admirável triunfo
de uma aspiração nacional.
Depois de fazer um apanhado da programação, a notícia emitida no jornal
informava sobre as corridas. Era dito sobre o público que esteve presente e o resultado.
Segundo consta, a corrida aconteceu conforme o anunciado, contando com a participação de 5
mil pessoas que tomaram parte na festa que teve uma “feição toda moderna”. Em seguida, foi
descrito o resultado, onde era apresentado o nome do corredor e o tempo gasto na realização
da corrida. Um exemplo disso pode ser dado baseado no oitavo páreo que teve como
vencedor René David conhecido sportivamente106
como Le Foutu com o tempo gasto de 4
minutos e 38 segundos107
.
Além de elogiar o Grupo Cyclista Amazonense e propagar a ideia de que suas
atividades davam a cidade uma “feição moderna”, a imprensa também censurava o modo de
agir do “povo” nas corridas, procurando enquadra-lo naquilo que era tido como civilizado.
Como na corrida do dia 4 de dezembro, que foi realizada para comemorar a Restauração da
Independência de Portugal108
. Para se ter noção, geralmente a imprensa ao informar sobre a
realização de uma corrida, tratava da frequência e resultados dos páreos. O que não aconteceu
na corrida do dia 4, onde o assunto foi o modo de agir do “povo”.
Com bastante affuencia de povo, teve logar hontem a corrida de bycicletas no
velodormo “General Osorio”.
Peza-nos ter de censurar aqui excessos de enthusiasmo de uma parte dos
espectadores, que não são gentis, vaiando aos dignos moços, para quem a victoria
não sorriu n’aquelle torneio.
105
A Federação, Manaus 16 nov. 1898, n.254, p.1. 106
Termo utilizado no jornal Correio Sportivo para explicar o uso de cognomes. 107
O Grupo Cyclista Amazonense. A Federação, Manaus 17 nov. 1898, n.255, p.1. 108
Velódromo Nacional. Commercio Amazonas, Manaus 4 dez. 1898, n.341, p.1.
35
O facto é que o povo amazonense encontra encantos nesse divertimento, e que os
dignos cyclistas que o promovem merecem um poucochinho mais de delicadeza da
parte de uns tantos grupos que se exageram nas manifestações de enthusiasmo pelo
seu part pris.
Aos vencedores, palmas, ovações; aos vencidos...consolação.
Esperamos pela ultima vez registrar , noticiando corridas do “Grupo Cyclistico
Amazonense”, esse facto desagradavel, que não nos honra, a nós que somos um
povo civilisado e educado [grifos meus].
De resto, tudo o mais correu muito bem, sendo digna de nota o respeito e a
disciplina dos distinctos sportmen, a quem felicitamos pela brilhante festa, com que
commemoraram a passagem da gloriosa data portugueza – 1º de Dezembro109
.
De acordo com Pinheiro, os “grandes” jornais veiculados no Amazonas traziam
consigo o agravante de estarem atrelados a projetos políticos e visões sociais consolidadas no
interior dos grupos dominantes. Com a expansão econômica a elite tendeu a ter um fascínio
pela modernidade e progresso que era reproduzido nos jornais, e os comportamentos que não
se encaixavam nesse ideal, eram reprimidos havendo uma tensão entre o público “ideal” e o
público efetivo110
. Assim como ocorreu nas corridas realizadas pelo Grupo Cyclista
Amazonense, onde se tentava instruir o que era ser educado e civilizado.
Na época era comum receber pessoas consideradas “ilustres” na cidade com a
organização de um festejo. Esse foi o caso da recepção do ex-governador Eduardo Ribeiro
que seria homenageado com a realização de uma corrida de bicicleta, organizada pelo Grupo
Cyclista Amazonense juntamente com a comissão de festejo. Para participar dessa corrida era
necessário fazer inscrição no estabelecimento Porta Larga, local que também serviu para a
exposição dos prêmios. A corrida foi composta por cinco páreos que seriam representados por
uma cor diferente - os corredores receberiam uma fita referente a cor do páreo que iriam
disputar. Ao invés de ser realizada no Velódromo Nacional, ela aconteceria na Avenida
Eduardo Ribeiro, a partir do Teatro Amazonas até a rua Municipal111
. Todavia, devido a um
desentendimento entre o Grupo Cyclista Amazonense e o Sport Club Amazonense a corrida
não ocorreu.
Infelizmente não será possível se realisar as corridas de bicyclettas, annunciadas
para hoje a tarde.
O grupo cyclista não chegou a um accordo, ao que nos informou, com a commissão
de festejos. Desejavam a exclusão do Sport Club.
109
O grupo Cyclistico Amazonense. A Federação, Manaus 06 dez. 1898, n.274, p.1. 110
Daou traz uma ideia semelhante ao que acontecia no teatro. DAOU, A. M. A cidade, teatro e o “paiz da
seringueiras”: práticas e representações da sociedade amazonense na passagem do século XIX – XX. Rio de
Janeiro: Rio Book’s, 2014. 111
O primeiro páreo “15 de novembro” teria a cor da fita verde, o segundo “5 de setembro” fita amarela, o
terceiro “Amazonia Infantil” fita branca, o quarto “18 de setembro” fita azul e o “Barés” fita encarnada. Ver:
Commercio do Amazonas, Manaus 8 dez. 1899, n.84, p.2.
36
Lamentamos profundamente este facto não querendo saber de que lado está a razão.
Tratava-se duma festa popular em obediência a um programma, e parece-nos que
deviam ser apagadas as rivalidades e esquecidas as dissenções112
.
Durante esse período, dois ciclistas se destacavam nas corridas organizadas pelo
Grupo Cyclista Amazonense, eram o Gomes e Pinto113
. A importância desses dois nomes era
tanta que eles estavam cotados para disputar o quinto páreo de uma corrida realizada no dia
16 de abril de 1899, mas, um deles sofreu um incômodo, sendo adiado o páreo para o dia 23
do mesmo mês. Nesse dia apenas os dois ciclistas correram no Velódromo Nacional114
.
O Grupo Cyclista Amazonense parece se desfazer quando um velódromo é
construído na cidade, ou seja, ele passa a integrar o quadro da empresa que gerenciava o novo
velódromo.
2.3 Mudanças à vista – a organização esportiva do século XX
Com a chegada do século XX ocorrem mudanças no cenário esportivo de Manaus.
Os dois clubes que antes se destacavam nos jornais saem de cena, para a entrada de novas
organizações esportivas na cidade. O Sport Club Amazonense parece perder visibilidade com
a inauguração dos salões do Teatro Amazonas, pois embora fosse um clube esportivo, ganhara
notoriedade devido as festas e recepções em suas dependências, que passaram a ser
organizadas nos salões do Teatro Amazonas. Já o Grupo Cyclista Amazonense se desfez, pois
seus ciclistas passam a correr em um novo velódromo da cidade, integrando o quadro de
ciclistas da empresa que o gerenciava. Além disso, surgem outros clubes esportivos, dois
jornais sobre o tema, há a construção de espaços específicos para determinadas práticas
esportivas e começa a ser notada a estruturação de um comércio em torno da sua prática
(oficinas de bicicletas, lojas com produtos para os esportes e até medicamento direcionado aos
sportmen). Sendo assim, nesse tópico será feito um panorama geral da organização esportiva
do século XX.
Segundo Normando:
As práticas esportivas espraiaram-se pela cidade; converteram-se numa verdadeira
febre entre os jovens e acabaram por propugnar uma ética do ativismo na qual as
atividades físicas e o corpo em movimento eram essenciais para a constituição do
homem do novo século. Através de diversas modalidades esportivas, ensejou-se que,
pelo menos, uma parte da juventude manauara pudesse complementar sua instrução
intelectual com a formação física, entendida na passagem para o século XX como
112
Commercio do Amazonas, Manaus 17 de dez. de 1899, n.00089, p.1. 113
Não se sabe quem era Gomes, porém o Pinto se referia a José Joaquim Pinto de França que era funcionário
público. Relatórios dos presidentes dos estados brasileiros (AM) – 1891 a 1930. Edição 1, p.24. 114
Grupo Ciclysta Amazonense. A Federação, Manaus 23 abr. 1899, n.404, p.2.
37
absolutamente vital para a otimização e preparação dos corpos visando uma nova
realidade, cuja dinamicidade era moldada pelos avanços científico-tecnológicos
típicos da modernidade115
.
De fato, no século XX as práticas esportivas parecem expandir-se pela cidade.
Vários outros clubes entram em cena nessa etapa, oferecendo novas modalidades esportivas
aos seus sócios, que agora parecem não serem tão restritos quanto os do Sport Club
Amazonense ou do Grupo Cyclista Amazonense.
É a partir de 1904 que esse movimento parece se organizar. Nesse ano, dois novos
clubes aparecem nas folhas dos jornais, o Lawn Tennis Club e Cricket Club que faziam parte
do mesmo grupo de sócios.
O Lawn Tennis Club foi criado para oferecer o lawn tennis que era tido como um
esporte “elegante” e popular na Europa, América, na Austrália, Nova Zelândia e África. Ele
era parecido com um antigo jogo da Europa chamado “La Longue Paume”, jogado com uma
bola de cortiça, sobre um parapeito de terra, com 2 pessoas que encontravam-se em lados
opostos, ferindo a bola com a palma da mão. A diferença desse jogo para o lawn tennis era a
rede ao invés do parapeito116
. Esse esporte estava sendo incentivado entre as mulheres que
começavam a ganhar a cena em outros âmbitos, não apenas nas atividades sociais. O Lawn
Tennis foi inaugurado em abril e realizava suas partidas no bosque da Cachoeira Grande, onde
houve a sua inauguração. Já o Cricket Club, ao que tudo indica, foi inaugurado antes do Lawn
Tennis Club, e tinha em sua composição pessoas ligadas ao comércio e a borracha117
.
Alguns anos depois, inaugura-se outro clube de tênis na cidade, o Tennis Club que
foi fundado no dia 1 de março de 1908. Seu ground era localizado na praça Floriano Peixoto,
no bairro da Cachoeirinha118
. Segundo consta, o Tennis Club contribuiu para a difusão do
Lawn Tennis que chegou a gozar de fama entre as mulheres. Elas eram vistas nos bondes se
dirigindo para a praça, trajando seus vestidos brancos. Embora o Lawn Tennis pareça ter
alcançado certa fama, logo caiu no marasmo. Um dos motivos que apontavam para tal fato era
que as mulheres preferiam gastar suas energias na dança, do que no jogo119
.
Além desses clubes, outros aparecem, o Manáos Sport Club e o Club Desportivo.
O primeiro foi fundado em 1908, tinha uma ligação com um dos clubes sociais da cidade,
115
NORMANDO, T. S. Jogos de bola, projetos de sociedade: por uma história social do futebol na Belle
Époque manauara. Dissertação (Mestrado em Ciências Humanas) – Universidade Federal do Amazonas,
Manaus, 2003. 116
Law Tennis. Correio Sportivo, Manaus 13 maio. 1910, n.4, p.2.; A propagação do Law Tennis. Correio
Sportivo, Manaus 12 jun. 1910, n.6, p.2. 117
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 15 abr. 1904, n. 90, p.1. 118
Diversões. Jornal do Commercio, Manaus 22 mar. 1908, n.1434, p.2. 119
As nossas Sportswomen. Correio Sportivo, Manaus 13 maio. 1910, n.4, p.2.
38
onde se reuniam para tratar de assuntos do clube120
e organizavam assaltos de esgrima121
. Já o
segundo, fundado no início de 1906 tinha como objetivo “cultivar os jogos athleticos e
desportivos” e “propagar o gosto desses salutares exercícios na sociedade amazonense.” O
Club Desportivo era tido como uma sociedade “útil”, que iria afluir de modo “bemfazejo” nos
usos e costumes de Manaus122
. Ou seja, tinha a intenção de modificar os costumes tradicionais
tidos como atrasados, em prol de outros. Além do mais, ainda no século XIX já havia um
movimento realizado por médicos que utilizando “argumentos de defesa da ciência passam a
determinar a melhor forma para cada um cuidar de seu corpo, em um projeto de mudanças de
hábitos” 123
.
O Club Desportivo funcionava em um prédio à rua do Andradas, próximo ao
igarapé dos Educandos, juntamente com outra associação que ministrava ginástica, esgrimas e
outros exercícios. Ao todo, haviam 40 sócios fundadores do clube, entre eles doutores,
comerciantes e um major124
.
Aparentemente, os comerciantes assumiram um papel importante no
desenvolvimento do esporte em Manaus. Em 1907 um grupo de “moços enthusiastas” do
comércio fundou o Sport Club de Manáos. Sua sede era um chalé no bairro da Cachoeirinha,
onde havia um terreno para os jogos esportivos125
. Pelo que parece esse clube teve o
funcionamento de aulas de ginástica e futebol, onde foi formado um time que disputava
partidas com outros da cidade126
.
A fundação de clubes que tinham como foco principal o desenvolvimento de
algum esporte específico também pôde ser observada. Tiro, ciclismo, remo e futebol eram os
120
A agremiação em questão era o Club Internacional que foi fundado em 1901 em Manaus. Club Internacional.
Quo Vadis?, Manaus 28 de abr. de 1903, n.127, p.1. Varias noticias. Jornal do Commercio, Manaus 3 maio.
1908, n.1475, p.1. 121
O dia de hoje. Jornal do Commercio, Manaus 21 jun. 1908, n.1524, p.1. 122
Club Desportivo. Jornal do Commercio, Manaus 21 maio. 1906, n.680, p.1 123
JÚNIOR, E. G. Ginástica, higiene e eugenia no projeto de nação brasileira: Rio de Janeiro, século XIX e
início do século XX. Movimento, Porto Alegre, v. 19, n.01, p.139-159, jan/mar. de 2013. 124
Os sócios fundadores do Club Desportivo são: “A. Monteiro de Souza, Agnello Bittencourt, Aprigio M. de
Menezes, Raymundo B. de Britto Pereira, Coriolano Durand, Dr. Satyro Marinho, José Francisco de A. Lima,
Raymundo Nicolau da Silva, João Bessler, Felippe Schlee, Engen Bartholomeu, Alcides Bahia, Carlindo
Machado e Silva, Gentil A. Bittencourt, Manoel V. Marinho, dr. Adalberto Pedreira, Deodoro Freire, Agostinho
Cezar de Oliveira, dr. Adriano Jorge, Antonio P. Bittencourt, Francisco Tapajós, Raul Gastão, dr. M. Sá
Antunes, Francisco Salles Vieira, Domingos de Queiroz, dr. Raphael Benayon, Cesar Silva, Silvio Nunes de
Lima, Major Pedro H. Cordeiro Junior, João J. Baptista da Rocha, dr. Guilherme Catramby, dr. Pedro Sympson,
Jose Maranhão, Joaquim Manoel do Passos, Frederico Menezes, Manoel Floriano de Britto, Antonio Bentes, dr.
B. Lauro Bittencourt, Julio Verne Pereira e Raul R. Braga.” Desses nomes Deodoro Freire, José Maranhão e
Raymundo B. Britto Pereira estariam na organização das corridas de bicicleta. Club Desportivo. Jornal do
Commercio, Manaus 21 maio. 1906, n.680, p.1. 125
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 20 set. 1907, n.1162, p.2. 126
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 22 set. 1907, n.1164, p.2.
39
esportes tidos como especialidades desses clubes que começaram a serem organizados a partir
de 1909.
A Sociedade de Tiro Brasileira no Amazonas foi fundada em 9 de fevereiro de
1908. Em 1909 ela foi incorporada à Confederação do Tiro Brasileiro sob o número 10,
ficando conhecida como Sociedade Brasileira Tiro n.10. Sua finalidade era ministrar aos seus
associados a instrução completa do tiro de guerra e o ensino elementar da arma de infantaria,
além de realizar concursos de tiro127
. De acordo com Normando, o tiro ao alvo praticado no
Brasil na primeira década do século XX, além de comprovar habilidades no manejo de armas
de fogo, tinha um caráter ufanista, pois assim como era tomado como esporte, assumia-se
como atividade cívica, alimentando “a digna preocupação de defesa nacional, transformando
o praticante num cidadão-soldado pronto para defender a pátria nos momentos necessários”.
Essa modalidade era praticada, principalmente, nas praças públicas e no bosque municipal128
.
O Velo Club Amazonense foi fundado no ano de 1909 e tinha como objetivo
“desenvolver todos os ramos de sport, como Gymnastica artística, Athletica, Lucta Romana,
Esgrima e com especialidade o Cyclismo” 129
. Logo após ser fundado, o clube já organizava
passeios ciclísticos pela cidade. Geralmente, esses passeios eram divulgados pelos jornais,
que anunciavam o seu ponto de saída, trajeto e ponto chegada, como em uma ocasião onde o
passeio teria início na Praça de São Sebastião indo para “avenida Eduardo Ribeiro, rua dos
Remedios, Silverio Nery, até Nazareth, Estrada Dr. Moreira, Saudade e Luiz Antony onde
debandar-se-há” 130
. Seu fundador era Deodoro Freire, ciclista conhecido como Stoessel que
era um verdadeiro entusiasta do ciclismo em Manaus.
Em 1908 são veiculadas notícias sobre regatas organizadas pelo Club de Regatas
Amazonense. Esse clube costumava realizar regatas no Igarapé dos Educandos, do qual
participavam mulheres e homens. Não se sabe ao certo a data de inauguração do clube, mas
parece ter sido por volta de 1908.
Esse não foi o primeiro clube de remo de Manaus. A partir de 1906 foi
introduzida na cidade de Manaus a primeira outrigger, embarcação para o remo, o que
127
Projecto de estatutos definitivos para a sociedade n. 10 da Confederação do Tiro Brasileiro. Jornal do
Commercio, Manaus 3 mar. 1909, n.1776, p.2. 128
Ainda segundo Normando, essa sociedade possuía um dos maiores quadros nacionais de associados, 770
cavalheiros, com componentes oriundos não só da capital, mas de Borba, Parintins e Santo Antônio da Madeira.
NORMANDO, T. S. Jogos de bola, projetos de sociedade: Por uma história social do futebol na Belle Époque
manauara. Dissertação (Mestrado em Ciências Humanas) – Universidade Federal do Amazonas, Manaus, 2003. 129
Notas Sportivas. Correio do Norte, Manaus 20 dez. 1909, n.320, p.1. 130
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 30 dez. 1909, n.2066, p.2.
40
estimulou a criação do Grupo Allemão e do Nautic-Club-Amazonense. Essas duas sociedades
passaram a realizar treinos e competições, além de importarem o material para a prática131
.
Além do remo, outra modalidade era vista em Manaus. O yachting que em 1910
começa a ganhar adeptos. No caso destes, foram vistos navegando até Marapatá ou Piracatuba
ou bordejando nas lagunas para além da Ilha dos Papagaios132
.
De acordo com Harari, existe uma teoria que concorda que nossa linguagem
evoluiu como uma forma de fofoca133
. Embora essa não seja a única teoria sobre a evolução
da linguagem, é certo que em Manaus a organização do futebol teve a fofoca como um grande
“ponta pé”. Em 1907 circulava no Jornal do Commercio uma crônica escrita por um tal de
U.V. que contava sobre uma conversa que havia escutado na partida do vapor “Olindas” entre
Luiz Paulino, um sportman paraense, e Sergio Ferreira. Segundo U.V. eles falavam da
provável fundação de um foot-ball association, da qual pretendiam movimentar entusiastas
“ardorosos da pugna” do ballonround. Ouvindo isso, U.V. começou a imaginar como seria
uma partida de futebol em Manaus.
[...] Era Oxford contra Cambridge; Amazonas contra Pará, num MATCH de
sensação! As linhas de FOROWARDS debatiam-se admiravelmente.
Os DRIKLINGS succediam-se de permeio com valente RUSHES, (e que rushes). A
lucta renhida absorvia a attenção toda dos LISNEMENS. Ouvia-se o trilhar dos
apitos dos capitães, e o BALLON surgia impulsionado pelo FOOT vigoroso, num
imaginoso SCHAT, ora neste, ora naquelle campo, num jogo de sentidos, verdadeira
e infernal dança macabra.
As opiniões dividiam-se.
De quando em vez um sussurro de vozes fazia-se ouvir entremeado de palmas e
brados de encorajamento partidos da assistência. Era um GOAL vasado com pericia
rara, ora por este para aquelle team, que desse modo se confirmava.
A hora porém epilograra-se. Além o REFEREE, que iniciara o torneio com o KICK-
OFF de honra mettia o apito na bocca e fnalisava o movimentado match,
annunciando o resultado: - 5, contra 0!
Victoria em toda a linha134
.
Ele prosseguia dizendo que foi até os sportmans de “maior evidência” que
conhecia em busca de adeptos da ideia, porém não obteve sucesso. “Não desanimamos ainda.
Admittimos que o calor da idéa se manifestasse entre elles latente, com reservas talvez, e
esperavamos, quando procurando fallar com o Paulino qual tão foi nossa desillusão” 135
..
131
NORMANDO, T. S. Jogos de bola, projetos de sociedade: Por uma história social do futebol na Belle
Époque manauara. Dissertação (Mestrado em Ciências Humanas) – Universidade Federal do Amazonas,
Manaus, 2003. 132
Yachting. Correio Sportivo, Manaus 12 de jun. de 1910, n.6, p.1. 133
HARARI, Yuval Noah. Sapiens: uma breve história da humanidade. Traduzido por Janaína Marcoantonio.
L&PM, p.28, 2015. 134
Foot-ball. Jornal do Commercio, Manaus 10 abr. 1907, n.999, p.2. 135
Foot-ball. Jornal do Commercio, Manaus 10 abr. 1907, n.999, p.2.
41
Alguns dias depois, Paulino responde a crônica de U.V., afirmando a vontade de
fundar um clube de futebol. Dizia ele, que o futebol era um esporte elegante de todos os
países e que em Manaus “vivia e vive” adormecido. Apesar disso, Paulino assegurava não ter
perdido as esperanças e que seria fundado, brevemente, um clube com o nome de Sport Foot-
Ball Club Manáos, com as cores encarnado e branco136
. De fato o clube foi fundado no dia 19
de abril de 1907, entretanto não sendo o primeiro da capital137
. Um tal de Fred C. ao ler a
notícia sobre a ideia de fundação do Sport Foot-Ball Club Manáos, informava que na cidade
já existia um clube de futebol, que se chamava Racing Club Amazonense, formado por
ingleses138
. Meses mais tarde, esses clubes se encontrariam em um match, no ground da
praça Floriano Peixoto139
. Após o aparecimento desses clubes, outros foram fundados na
cidade.
Tais notícias mostram o início da intensificação da organização esportiva que
concerniu, também, o início da estruturação de um mercado em torno da prática. Esse
comércio era formado por jornais e revistas que tratavam especificamente dos esportes.
Revistas vinham de fora do país para a cidade, como a “Tiro e Sport” que era publicada em
Lisboa e circulava em Manaus140
. Jornais sobre o tema passaram a ser produzidos em Manaus,
tais como “O Sport” e o “Correio Sportivo”. “O Sport” foi fundado em 1907, dirigido por
alguns do sportmen ligados ao Racing Club Amazonense e era um jornal de publicação
quinzenal141
. Esse jornal parecia se focar na apresentação de artigos sobre o futebol e
diferentes jogos, além exaltar os sportmens manauaras, veiculando imagens142
. Até o ano de
1910, esse jornal ainda estava em circulação na cidade. Porém, “O Sport” passaria a circular
com um concorrente.
Seu rival no âmbito da divulgação das informações esportivas era o “Correio
Sportivo”, que se intitulava um órgão de propaganda esportiva. Este foi inaugurado em março
de 1910143
. O Correio Sportivo defendia o esporte em Manaus, baseado na premissa que este
se prestava ao desenvolvimento físico da raça. De maneira geral, o jornal tratava dos
acontecimentos esportivos de Manaus, dos clubes, homenageava sportmans, e trazia notícias
do estrangeiro. Ele era vendido na Casa Itatiaya, comércio destinado à venda de cigarros. Para
136
Foot-Ball. Jornal do Commercio, Manaus 12 abr. 1907, n.1001, p.1. 137
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 20 abr. 1907, n.1009, p.1. 138
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 19 abr. 1907, n.1008, p.2. 139
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 16 jun. 1907, n.1066, p.2. 140
Varias noticias. Jornal do Commercio, Manaus 3 maio. 1908, n.1475, p.1. 141
Ver: Sport. Jornal do Commercio, Manaus 5 abr. 1910, n.2159, p.2.; Varias. Jornal do Commercio,
Manaus 13 set. 1909, n.1959, p.2. 142
Jornal do Commercio, Manaus 10 ago. 1909, n.1925, p.2. 143
Correio Sportivo, Manaus 27 mar. 1910, n.1, p.1.
42
ter acesso às informações contidas nesse jornal, era necessário adquiri-lo seja por assinatura,
número avulso ou número atrasado. A primeira, que se referia a assinatura do ano, era 5$000,
o número avulso era $200 e o número atrasado $500144
. Comparando com o Jornal do
Commercio, veiculado no mesmo ano, que custava 50$000 por ano na capital e 60$000 no
interior. Como se pode perceber o Correio Sportivo tinha preços mais acessíveis.
Dentro desse comércio em torno dos esportes, também foram encontradas oficinas
e lojas que ofereceriam produtos e serviços ligados aos mesmos. Isso, pois, “os negociantes
mais perspicazes prontamente relacionaram o interesse pelos esportes com possibilidade de
ganhos, independente do segmento comercial tradicional em que se estava estabelecido” 145
.
Como a “Alfaiataria Cosmopolita” que vendia roupas para os sportmen e a oficina Bourgeois
& Comp. que além de vender peças para máquinas, vendia peças para as bicicletas146
. E não
parava por aí.
A Livraria Clássica dizia ter, além dos livros e material de papelaria em geral, um
sortimento completo de bicicletas para crianças. Já as próprias para os passeios e
corridas eram destaques na loja Passe-Partourt. A drogaria Universal anunciava
suspensórios especiais para esportistas e pomadas para massagens. A sapataria
Mandarim prometia para breve os calçados especiais para o futebol. Os bazares
Mendonça & Filho, Alemão e Prato Chinez vendiam alteres, luvas de boxe,
trapézios e argolas para ginástica, bolas e raquetes de tênis, camisas e calções para
ciclistas14
. E claro, para não fugir ao preceito pseudo-blasé da Belle Époque, todos
os produtos eram devidamente importados147
.
Além disso, cursos que tomavam a esgrima e a ginástica passaram a ser
anunciados148
. Curso de Gymanastica
Theorico e pratico
Pessoa competente pretende estabelecer nesta cidade um curso de gymnastica
theorico e pratico por todo o mez de Junho. As pessoas, portanto, que se quizerem
inscrever no dito curso, dirijam se desde já á rua dos Remedios nº 27 (sobrado), das
6 horas da tarde em diante. Nos domingos de 1 hora às 3 da tarde149
.
Em 1905 foi inaugurado em Manaus outro tipo de organização que tinha como
foco os esportes. Porém, sua relação com os que tomavam parte de suas atividades se altera.
Ou seja, para frequentar tal local não era necessário mais ser um sócio, não que esse tivesse
deixado de existir, mas era preciso arcar com o preço de um ingresso. Esse ingresso daria
144
Se faz necessário explicar, que foram encontradas 6 edições do jornal Correio Sportivo do ano de 1910, na
Hemeroteca Digital, possibilitando uma abordagem mais detalhada. 145
NORMANDO, T. S. Nas praças, nas ruas e nos rios: a Amazônia esportiva em sua belle époque. Revista
Digital - Buenos Aires - Año 12 – n.112 – Sept. 2007. 146
Correio Sportivo, Manaus 27 mar. 1910, n.1, p.4; Jornal do Commercio, Manaus 26 mar. 1905, n.392, p.3. 147
NORMANDO, T. S. Nas praças, nas ruas e nos rios: a Amazônia esportiva em sua belle époque. Revista
Digital - Buenos Aires - Año 12 – n.112 – Sept. 2007. 148
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 14 jan. 1908, n.1367, p.2. 149
Curso de Gymnastica. Jornal do Commercio, Manaus 26 maio. 1906, n.685, p.2.
43
acesso a apreciação da prática esportiva, que antes era exposta aos olhares como um símbolo
de distinção e agora é vendida como uma mercadoria aqueles que não tinham acesso a tal.
Esse local era o Velódromo Amazonense que seria sucedido pelo Prado Amazonense.
44
3 VELÓDROMO AMAZONENSE
Um dos marcos mais importante para o ciclismo na cidade de Manaus, sem
dúvida, foi a construção de um espaço para a realização de corridas de bicicleta, ou seja, um
velódromo. O espaço utilizado pelo Grupo Cyclista Amazonense era adaptado e não tinha
uma estrutura permanente. Com a construção do velódromo a cidade passaria a ter um espaço
físico, construído para essa finalidade específica. O Velódromo Amazonense, ou Velódromo
da Manáos Sport, ou ainda, Velódromo da Cachoeirinha, foi construído à Praça Visconde do
Rio Branco150
no bairro da Cachoeirinha.
O Velódromo Amazonense, como seria mais conhecido, foi feito a partir da
associação entre dois coronéis, José de Albuquerque Maranhão e José Cardoso Ramalho
Junior151
. Essa associação foi realizada com o capital de 17:000$000 contos de réis, o que
equivalia, aproximadamente, a quatro anos de salário152
de um jardineiro do município.153
Sua construção aconteceu durante o ano de 1904 e envolveu uma série de previsões de
inauguração frustradas, como a que segue:
Vão muito adiantados os trabalhos de contrucção das archibancadas e pista do
Velodromo, da empreza Maranhão e Cª. Uma das secções das archibancadas acha-se
totalmente concluída, trabalhando-se activamente na outra. Na pista faltam apenas
os trabalhos finaes de rectificação de nível, o que faz supor que a inauguração das
corridas se poderá realisar no mez vindouro [...] 154
.
Além dessa suposição de inauguração do Velódromo Amazonense em outubro,
foram realizadas mais duas, a primeira apontando o dia 15 de novembro e a segunda o dia 21
150
Localizava-se entre as ruas Municipal, atual Sete de Setembro, Visconde de Porto Alegre, Ajuricaba e Duque
de Caxias é hoje o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amazonas – IFAM. Manaus:
entre o passado e o presente, v.1, p.58. 151
José Albuquerque Maranhão se envolveu ativamente em diversos negócios na cidade de Manaus, ele era um
empresário daquela época. Para se ter noção, além de coronel, ele era dono de um “prédio” na Avenida Joaquim
Nabuco com o valor locativo de 2:400$000, foi empreiteiro de obras públicas, era sócio do contrato das carnes
verdes e cunhado do coronel José Cardoso Ramalho Junior. Este último nasceu no Amazonas no dia 7 de abril de
1866, onde após terminar a escola primária foi para Portugal realizar os estudos preparatórios. Ao retornar para
Manaus trabalhou no comércio, entrando para a política em seguida, ligado ao Partido Democrata. Foi deputado
federal, coronel do Exército, vice-governador e governador do Amazonas. Ver: Superintendencia Municipal de
Manáos. A Capital, Manaus 20 jan. 1918, n.185, p.3; A defesa e a resposta ao repto. Quo Vadis, Manaus 15
maio. 1903, n.146, p.3.; Que contraste. Correio do Norte, Manaus 7 abr. 1906, n.66, p. 1. Disponível em: <
http://cpdoc.fgv.br/sites/default/files/verbetes/primeira-
republica/RAMALHO%20J%C3%9ANIOR,%20Jos%C3%A9%20Cardoso.pdf>. Acesso em 21 maio. 2017. 152
Intendencia Municipal. Jornal do Commercio, Manaus 28 dez. de 1905, n.629, p.2. 153
Contra a moral. Correio do Norte, Manaus 3 de mar. de 1906, n.36, p.1. 154
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 30 set. de 1904, n.236, p.1.; Jornal do Commercio de Manaus 08 jan.
de 1905, n.326, p.2.
45
do mesmo mês, porém todas frustradas155
. O velódromo foi inaugurado de fato, em 1905 com
a realização de uma corrida156
. Todavia, no final desse mesmo ano o local passou por
reformas.
Menos de um ano após a sua inauguração, o velódromo passou mais dois meses
em obras, entre 1905 e 1906, que visavam a sua reconstrução e aformoseamento. Sua pista foi
acimentada, foram construídos coretos, levantados grossos paredões de alvenaria, construídos
arabescos, lambrequins e bordaduras de madeira, além de ter sido pintado. Para essas obras
foram necessários 3 mestres de obras e, aproximadamente, 100 operários.
Esse grupo de operários parece ter procurado o jornal Correio do Norte para
relatar o que aconteceu durante a reconstrução e aformoseamento do velódromo. Contaram
que realizaram duas greves durante as obras, devido ao atraso de seus pagamentos. E, que só
finalizaram as obras, pois foram “seduzidos” pelos contratantes com gratificações em dinheiro
e mais duas caixas de cerveja. Além disso, informaram que o dinheiro para o pagamento deles
saia do tesouro e que a praça onde foi construído o velódromo era uma concessão ao José
Albuquerque Maranhão. O jornal Correio do Norte a par dessa situação, indagou: “Pedimos
ao Sr. Dr. Governador o obsequio de mandar-nos explicar a ligação, o laço de interesse que
tem o Estado com o mesmo Velodromo para, assim, com tanto descaro, sem autorisação
orçamentária, pagar as despesas de seu aformoseamento.” Três dias depois, o jornal escreve
outra notícia sobre essa situação. Dessa vez o cronista não indagava que as obras do
velódromo haviam sido pagas pelo tesouro, ele praticamente afirmava, e pedia ao Estado que
mandasse pagar os homens que já haviam executado os serviços, pois eles percorriam a
cidade como miseráveis, “cheios” de fome, sem teto e sem luz157
.
155
Manáos-Sport. Jornal do Commercio, Manaus 1 nov. 1904, n.264, p.4.; Velodromo. Jornal do
Commercio, Manaus 23 dez. 1905, n.626, p.2.; Manaos Sport. Jornal do Commercio, Manaus 19 fev. 1905,
n.362, p.1. 156
Jornal do Commercio, Manaus 28 dez. 1904, n.316, p.1. 157
Nesse mesmo ano aconteceram outras greves de trabalhadores em Manaus como, por exemplo, a greve dos
cocheiros que paralisaram os serviços devido a leis arbitrarias estabelecidas pela Intendência. Dias, E. M. A
ilusão do fausto. Manaus 1890-1920. p.161.Contra a moral. Correio do Norte. Manaus 3 mar. 1906, n. 36, p.1.;
Contra a moral. Correio do Norte, Manaus 6 mar. 1906, n.38, p.1.
46
FIGURA 3 - Local onde foi construído o velódromo, círculo amarelo, e suas duas entradas, em
vermelho.
Fonte: Site da Biblioteca Nacional. Cartografias.
Com 333 metros de comprimento o Velódromo Amazonense tinha sua pista com
o nível retificado, cercada com grossos paredões de pedra, um botequim e uma arquibancada.
Nele havia duas curvas, uma ao lado da rua Municipal e a outra na rua Duque de Caxias. Em
cada curva existia uma entrada. Estas serviam para separar a entrada e saída dos espectadores
- a entrada da rua Duque de Caxias era a “Popular” 158
– e eram utilizadas em algumas
disputas. Sua administração era realizada pela Manáos Sport e a empresa Maranhão & Cª que
eram responsáveis por arrendar o seu botequim e organizar as corridas159
.
O Velódromo Amazonense funcionou durante os anos 1905, 1906 e 1907, tendo
três diretores gerais, figuras que organizavam as corridas, deixando perpassar seu “gosto e
critério” nas mesmas160
. José Maranhão Albuquerque, Raymundo B. Britto Pereira e
Francisco d’Assis Guimarães foram os três diretores do velódromo. Esses diretores lançavam
mão de várias estratégias nos programas das corridas, para atrair o público, o que denotava
que intenção não era mais que o esporte fosse tão restrito a uma parcela da sociedade, mas
comercializado.
158
Velodromo Amazonense. Jornal do Commercio, Manaus 3 jan. 1907, n.905, p.3. 159
Manáos Sport. Jornal do Commercio, Manaus 30 out. 1904, n.263, p.1. 160
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 25 jan. 1907, n.927, p.2.
47
3.1 A organização das corridas e seus programas
Para tratar da organização das corridas, será necessário mostrar como elas eram
apresentadas nos seus programas em cada uma das três direções gerais do Velódromo
Amazonense, pois havia diferenças de direção para direção. Sendo assim, será feita uma
apresentação geral da organização das corridas de cada diretor, mostrando os seus programas.
Como primeiro diretor geral do Velódromo Amazonense, José de Albuquerque
Maranhão teceu a primeira base dos programas das corridas. Suas competições, que
aconteciam no domingo à tarde, geralmente, tinham quatro ou cinco páreos. Estes
costumavam ser compostos por um número de ciclistas que variavam entre três e seis. Os
ciclistas, assim como nas corridas organizadas pelo Grupo Cyclista Amazonense e demais
direções do velódromo, seriam tratados pelos seus cognomes, ou melhor, como eram
conhecidos sportivamente - “Figaro”, “Gladiador” e Liberal, por exemplo161
. Eles disputavam
corridas com distâncias que variavam entre 676 metros, 2 voltas e 4.995 metros, 15 voltas no
velódromo. Nessas corridas eram premiados apenas o primeiro colocado, que recebia dinheiro
ou um objeto de determinado valor. Para participar das corridas de bicicleta era necessário
fazer inscrição e pagar uma taxa, que não se sabe qual era seu valor. As inscrições eram
realizadas no escritório da empresa Manáos Sport que se localiza na rua Deodoro162
. Na
organização das corridas de José Albuquerque eram relacionados seis tipos de juízes: o de
partida; de confirmação; de raia; de chegada e de arquibancada. Em algumas dessas funções
era necessário mais de uma pessoa, resultando em um total de onze juízes por corrida.
Para assistir as corridas no velódromo era necessário pagar a entrada. Essa
cobrança era dividida em duas categorias: adulto e crianças. Quanto aos adultos, não foi
encontrado o preço que pagavam, pois era informado nos programas que o valor da entrada
era o de “costume”, essa maneira de divulgar o preço denotava certa proximidade com o
espectador. Aparentemente, a entrada não era cara, pois era dito que no velódromo havia
gente de “todas as classes, todas as idades, todas as côres, rico, pobre, honrado ou não” 163
. Já
as crianças “acompanhadas” não pagavam.
O programa das corridas de José Albuquerque Maranhão tinha, basicamente, a
seguinte estrutura: logo no início havia o nome do clube que organizava as corridas, “Manáos
Sport”; abaixo vinha o número da corrida, a data e o horário seguido da descrição das
161
Manáos Sport. Jornal do Commercio, Manaus 19 mar. 1905, n.386, p.1. 162
Velodromo. Jornal do Commercio, Manaus 23 dez. 1905, n.626, p.2. e Manaos Sport. Jornal do
Commercio, Manaus 19 fev. 1905, n.362, p.1. 163
Os bichos do jogo e a policia. Jornal do Commercio, Manaus 30 set. 1905, n.554, p.2.
48
informações dos páreos - o número e nome do páreo, voltas, distância e prêmio. Depois, eram
colocados os números dos ciclistas e seus nomes. Após os juízes e suas funções.
Previno aos Srs. cyclistas que, de hoje em diante só terão entrada no Velodromo, nos
dias de corridas, o que apresentarem aos porteiros ingressos especiaes que lhes serão
fornecidos pela Directoria, na véspera de cada corrida164
.
A apresentação dos “ingressos especiaes” para a entrada no Velódromo
Amazonense foi a primeira mudança instaurada por Raymundo B. Britto Pereira. Ele era o
dono do Prato Chines165
. Essa loja “vendia louças, vidrarias, candieiros, moveisera” e até
“filtros “antesepticos” que tinha a vantagem de gelar a água na medida em que era filtrada”166
.
Raymundo B. Britto Pereira era mais um comerciante que havia se aventurado na organização
dos esportes em Manaus. Seu envolvimento com o velódromo não se deu apenas na direção
geral, pois também foi o secretário da Manáos Sport no ano de 1905.
As corridas sob a direção de Raymundo B. Britto Pereira também aconteciam nas
tardes de domingo e contavam com 6 ou 7 páreos. Esses páreos envolviam diferentes tipos de
disputa, o handicap, o desafio, o match, o match à trois, e a corrida parada. Para agrupar os
diferentes ciclistas que iriam disputar um páreo passou a se adotar a separação em turmas.
Nelas os ciclistas passaram a serem distribuídos em diferentes turmas que tinham o objetivo
de separá-los pelo “equilíbrio das forças”, ou seja, agrupar aqueles ciclistas que tinham um
número de vitórias e derrotas parecidas.
Os ciclistas que tinham um desenvolvimento parecido, medido pelo seu progresso
nas corridas, eram agrupados em quatro tipos de turmas diferentes. Essas turmas eram a 1ª, 2ª,
3ª e 4ª que norteavam a montagem de cada páreo. Com isso, era esperado que a “organisação
dos pareos dá-lhes a incertesa sobre a victoria”, o que se constituía para alguns adeptos do
ciclismo “o verdadeiro enthusiasmo em uma porfia” 167
. Para disputar uma corrida, os
ciclistas precisavam se inscrever no Prato Chines, casa comercial ligada ao Raymundo e não
mais no escritório da Manáos Sport.
Os preços dos ingressos passaram a ser publicados em seu programa. Eles
variavam entre os diferentes tipos de lugares disponíveis no velódromo e o público. Havia
lugares mais caros que outros, como será mostrado adiante, e diferenciação do preço
164
Velodromo Amazonense. Jornal do Commercio, Manaus 25 maio. de 1906, n. 684, p.2. 165
Jornal do Commercio, Manaus 8 fevereiro de 1905, n.352, p.2 166
Prato Chines. Jornal do Commercio, Manaus 26 agosto1906, n.777, p.3; e Jornal do Commercio, Manaus
30 março de 1905, n.392, p.2. 167
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 22 abr. 1906, n. 651, p.2.
49
dependendo da faixa etária e sexo do público. Isso era um indicativo da distinção que se
deseja entre os diferentes grupos de Manaus, que passava a ficar mais nítido, pelo menos no
velódromo.
As corridas na gestão do diretor geral Raymundo B. Britto Pereira eram
publicadas nos jornais, tendo longas crônicas sobre o programa e o resultado. Nos seus
programas havia um novo padrão na estrutura do anúncio, onde se procurava destacar as
“grandes atrações”. No final, geralmente, haviam pedidos da direção que procuravam
“instruir” o comportamento do público e artigos do provável código das corridas, que
buscavam orientar os ciclistas sobre algumas condições.
O programa das corridas organizado nessa direção tinha a seguinte estrutura. Logo
no início havia o nome do velódromo e de uma das empresas que o gerenciava, “Velódromo
Amazonense” e “Manáos Sport”. Eles eram seguidos pela data, horário e número da corrida.
O nome da outra empresa que gerenciava o velódromo aparecia em seguida, Maranhão &
Companhia. Na sequência era informado sobre o grupo, lugar, pessoa ou data que era
homenageada na corrida. Uma das estratégias para atrair o público feminino eram os sorteios
de brinde que ganhavam notoriedade pelo destaque que era dado ao seu anúncio. Em seguida,
eram destacadas as “grandes atrações” da corrida. Nessa administração o número de juízes
aumentou de 11 para 20. Eram anunciadas a função e o nome do juiz que iria realiza-la: 4
juízes de arquibancada; 1 juiz de partida; 2 juízes de chegada; 5 juízes “chronometers”; 1 juiz
médico; 1 juiz telegraphista; e 6 juízes de pista. Além do diretor de corridas e do diretor geral.
Os páreos eram anunciados da seguinte maneira: nome do páreo; distância a ser
percorrida, número de voltas que seriam efetuadas; o valor ou o objeto que seria entregue
como premiação, neste caso havia prêmio para o 1º e 2º colocado; o horário da partida do
páreo; e os nomes dos ciclistas que disputariam o páreo. Sobre os páreos existiam diferentes
tipos de disputa que passaram a ser evidenciados. Posteriormente, era publicado um o pedido
da diretoria ou instruções sobre a organização das disputas. Um desses pedidos que mais
chamou a atenção foi a “campanha” para não vaiar os ciclistas que “distanciados, perdiam as
corridas”.
Além do pedido foram anexados ao programa dois dos 24 artigos168
que
regulamentavam as corridas. O primeiro artigo tratava do início da corrida, onde após ser
dado o sinal de partida nada mais determinaria sua invalidade. O segundo explicava os
critérios de desempate. Essas situações, provavelmente, aconteceram em outras ocasiões, pois
168
O acesso ao código de corrida ficou restrito ao que era divulgado nos programas.
50
essas mudanças (acréscimo de regra) eram observadas apenas quando havia algum tipo de
necessidade. Ao final do programa eram apresentados os preços para assistir as corridas no
velódromo. Sobre os preços, foram divididos em cinco categorias. Algumas eram referentes
ao espaço que seria comprado e outros aos espectadores. Os preços eram assim: arquibancada
custava 3$000; geral - 2$000; carro de luxo - 5$000; cavalheiro - 5$000; e famílias e crianças
- entrada grátis. Famílias nesse caso podem ser interpretadas como mulheres. Para se ter
noção do que representavam esses preços, um trabalhador ganhava em média na cidade de
Manaus cerca de 6$000 diários, em um lugar onde se dizia que os preços dos gêneros de
primeira necessidade custavam os “olhos da cara” 169
. Em 1907, na última corrida da direção
de Raymundo B. Britto Pereira, o preço das arquibancadas sofre um aumento, ele passa a
custar 4$000. Além disso, foi criada uma nova categoria chamada de “Popular” que custava
1$000. Sua entrada era restrita a rua Duque de Caxias. A entrada de populares por essa rua era
estratégica, pois ela dava acesso aos bairros, onde a população estava, de certo modo,
“invisível” 170
.
Uma mudança aplicada sob a direção geral de Raymundo B. Britto Pereira era a
divulgação de apostas, que também passaram a fazer parte dos programas. As apostas
pareciam pela intervenção do acaso ser um meio de reverter os papéis e de reafirmar a crença
geral na redistribuição das fortunas pela fortuna171
.
Além de todas as mudanças ocorridas no programa, a partir da corrida do dia 29
de julho de 1906, passou a ser utilizado um meio para comprovar as chegadas dos ciclistas
que não se baseavam apenas no olhar do humano. Era a “chapa photographica” que vinha
auxiliar na conferência do vencedor. Na primeira corrida que teve seu uso foi que “houve um
desaccordo entre o jury e os espectadores, desaccordo terminado pela exhibição da chapa
photographica tirada á chegada dos dois cyclistas á méta.” Com o uso desse recurso, foi
possível sancionar uma vitória verificada pela diferença de “um pneumático” 172
.
Diferente dos outros diretores gerais que eram membros da elite amazonense,
Francisco d’ Assis de Souza Guimarães pertencia a outro grupo de Manaus. Ele fazia parte da
169
DIAS, E. M.. A ilusão do Fausto - Manaus 1890 – 1920. Manaus Editora Valer, 1999, p.131. 170
SCHWEICKARDT, J. C. Ciência, nação e região: as doenças tropicais e o saneamento no estado do
amazonas (1890-1930). Manaus: Fiocruz/Casa de Oswaldo Cruz, 2009. 171
ROCHE, D. O povo de Paris. Ensaios sobre a cultura popular no século XVIII. Tradução Antonio de Pádua
Danesi. São Paulo: Editatora Universidade de São Paulo, 2004. 172
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 30 jul. 1906, n.750, p.2.
51
classe caixeiral173
. Ele era um dos componentes da Associação dos Empregados no
Commercio do Amazonas (AECA), mais especificamente, era o seu primeiro secretário.
Fundada em novembro de 1906 a Associação dos Empregados no Commercio
tinha como objetivo defender os interesses dos caixeiros frente ao patronato. Todavia, essa
articulação de defesa dos interesses da classe caixeiral tinha uma maneira de operar, onde se
evitava o embate. Segundo Moura:
os caixeiros eram uma categoria de trabalhadores que primavam pela ascensão
social. Por isso, o doutrinamento e o sonho de chegar ao patronato eram
características inerentes à profissão. Sendo assim, optavam pelo diálogo e cooptação
com os poderes constituídos e o patronato. A cooptação e o diálogo eram as
estratégias utilizadas para ganhar a confiança do patrão e com o tempo poderiam
chegar ao cargo de comerciante. Por isso, evitavam os embates diretos e adotavam
uma postura política neutra nos confrontos políticos que fervilhavam em Manaus no
início do século174
.
Essa vontade de ascender socialmente demandava uma participação dos caixeiros
em atividades que iam além do trabalho, tais como, as corridas de bicicleta no velódromo,
onde alguns caixeiros atuavam como juízes175
. Nesse lugar, os caixeiros demonstravam
estarem ligados aos divertimentos que eram aceitos e incentivados por parte da elite e assim
consolidavam mais a sua relação com o patronato.
Sob a direção geral de Francisco d’ Assis Souza Guimarães houve modificações
na forma de anunciar o programa, nos termos utilizados na descrição das corridas, nas
atrações e nos preços dos ingressos, procurando trazer para o velódromo, principalmente, a
classe caixeiral. No programa houve uma mudança no seu padrão, sendo incluídos novos
elementos, como, por exemplo, a frase “festa familiar” (a partir do segundo programa) que
passaria a ideia de que nesse lugar a festa não se restringia apenas aos homens, mas as
mulheres e crianças também. Tanto que, além do sorteio dos brindes às senhoras e senhoritas,
o velódromo passava a oferecer brinquedos às crianças que mais tarde foram trocados pelos
bombons. Nas pistas era levado a cabo o confronto entre Stoessel e Alcebiades que
representavam Manaus e Belém. Nas disputas eram incluídas noções de internacionalização,
ou seja, do confronto entre países e criadas corridas com tons mais irreverentes. Para realizar
as inscrições ou resolver algum problema o local não seria mais o “Prato Chinês”, mas o
prédio da AECA.
173
De acordo com Kleber Barbosa de Moura os caixeiros eram trabalhadores do comércio que atuavam nas
diversas áreas, como balconistas, escriturários, administrativos, guarda-livros e estoquistas. MOURA, K. B.
Caixeiros: organização e vivências em Manaus (1906 – 1929), p.18. 174
Idem, p. 54. 175
Esse é o caso de Raymundo Tribuzy que também foi membro da AECA.
52
O programa das corridas continuava levando o título de “Velodromo
Amazonense” e como subtítulo o nome da empresa, “Manaos Sport”. O que mudou da
direção passada para essa foi a retirada do nome da empresa “Maranhão e Cª, que não era
mais utilizado. Logo em seguida, aos nomes das empresas, era anunciada alguma atração das
corridas como: “Deslumbrantes corridas de bycicletas nas quaes tomarão parte os Sprinters
nacionais e estrangeiros, actualmente em Manaos.” Depois, eram apresentados as informações
como a numeração da corrida, o nome do diretor, o dia de realização, e o horário. Outros
destaques da corrida são apresentados, eles aparecem com mais veemência, escrito em caixa
alta, com fonte grande, quase no meio do anúncio. Em seguida, são destacados os sorteios de
brindes para as mulheres e as crianças176
. Logo após eram anunciados os páreos. As turmas
dos páreos mudaram de denominação, de 1ª, 2ª, 3ª e 4ª turmas que para “Seniors 1ª” e
“Juniors 1ª”, “Seniors” e “Juniors”. Essa denominação não seria permanente. Quanto aos tipos
de disputas colocados nos páreos, se mantiveram as formas adotadas na direção anterior. No
programa as homenagens dadas pelo nome no páreo ou a dedicação da corrida, passaram a
abranger uma nova classe, ou seja, os caixeiros ganhavam espaço em homenagens nos páreos
e nas corridas. No quinto páreo da primeira corrida, por exemplo, o nome dado ao mesmo, era
“Pheniz Caixeiral” que homenageava a classe.
Os juízes e júri também tiveram alteração em seu quadro. Houve mudança nas
denominações de algumas funções, o acréscimo de funções e o aumento de seu número de
envolvidos. Trinta e quatro pessoas passam a compor esse quadro. O jury passara a ter um
presidente, vice-presidente e secretário. Os juízes começaram a serem compostos pelas
funções de juiz de chegada, delegado junto aos ciclistas, diretores de arquibancada, starterl,
médicos, farmacêutico, chronographistas, fiscais de pista, diretor de corridas e o diretor
geral177
.
Ao final do anúncio os artigos e avisos continuaram sendo publicados. Dos preços
e lugares, apenas a arquibancada teve alteração. De 4$000 ela passou para 3$000 178
. Os
programas eram anunciados nas páginas comerciais do Jornal Commercio do Amazonas.
Página essa que trazia informações de editais, avisos, protestos, anúncios de comércios, e de
atividades culturais. Isso denotava a sua intenção de comercialização e visibilidade.
176
Velodromo Amazonense. Jornal do Commercio, Manaus 25 jan. 1907, n.927, p.3. 177
Velodromo Amazonense. Jornal do Commercio, Manaus 25 jan. 1907, n.927, p.3. 178
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 25 jan. 1907, n. 927, p.2.
53
3.2 As corridas de bicicletas e as estratégias de atração do público
Vamos ao Velodromo, ao “Manáos Sport”, roletar um bocado ao ar livre, triboflar
outro bocado, que lá estaremos socegados.
Aquella atmosphera selecta em casa com estatutos e licença, não serve: - a polícia dá
n’ellas.
O chic é roletar em publico e raso como gente desconhecida, em sociedade
cosmopolita, de todas as classes, todas as idades, todas as côres, rico, pobre, honrado
ou não179
.
Os primeiros anos de funcionamento do Velódromo Amazonense foram marcados
por tribofes e por acidentes que resultavam no afastamento do público. De acordo com Melo,
“tribofes eram as falcatruas, as confusões, as polêmicas, as brigas das mais diferentes que
comumente aconteciam nos eventos de turfe” 180
. Em Manaus esse termo era utilizado tanto
no ciclismo, quanto no turfe e designavam a combinação de resultado que levava a confusões
e polêmicas. Os acidentes na pista do velódromo ocorriam frequentemente na sua curva, pois
se dizia que era muito ampla e não permitia a inclinação das bicicletas181
.
Os tribofes eram comentados pela imprensa que apontava as disputas onde ele
havia acontecido, levando, muitas vezes, os corredores a se defender, escrevendo cartas aos
jornais. Como no caso de um corredor chamado Patagonia, que recorreu ao Jornal do
Commercio para se defender de acusações de tal ato. Patagonia dizia que os jornais o
“Amazonas” e o “Ideal” em sua “secção sportiva” haviam o acusado de ter atrapalhado seu
concorrente, batendo sua bicicleta na dele, resultando a queda dos dois. Ele explicava que não
era verdade e que quem havia jogado a bicicleta em cima da sua foi o outro ciclista, que o
vendo na frente quis atrapalha-lo, para que um terceiro corredor ganhasse182
.
Os acidentes na pista do velódromo também pareciam ser constantes, como
explica o cronista do Jornal do Commercio:
Ainda está bem viva na lembrança de todos o formidável tombo de que foi victima
Mattosinhos, tombo que lhe valeu quase um mez de cama.
Cyclo tambem passou doente mais de um mez por via de uma queda nas curvas, a
qual, alem de lhe magoar seriamente um braço, ainda lhe arrebentou a bicycleta.
Do tombo que no penúltimo domingo apanhou, Patagonia que, com o cahir perdeu
os sentidos, sahiu horrorosamente ferido, sendo obrigado a reconhecer-se ao hospital
da Beneficente Portuguesa, de onde, há poucos dias, sahiu. E Liberal, Ubirajara,
Espalhado, Hamburgo, todos cyclistas, em fim, excepto Stoessel que, por muito feliz
tem escapado183
?
179
Os bichos do jogo e a policia. Jornal do Commercio, Manaus 30 set. 1905, n.554, p.2. 180
MELO, V. A. Dicionário do esporte no Brasil: do século XIX ao início do século XX. Editora Autores
Associados, 2007. 181
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 15 maio. 1906, n.674, p.2. 182
Notas Sportivas. Jornal do Commercio, Manaus 19 out. 1905, n.570, p.3. 183
Velodromo. Correio do Norte, Manaus 20 mar. 1906, n.50, p.1.
54
Esses acidentes pareciam comprometer os resultados que eram esperados nas
corridas, ou seja, a disputa acirrada e as apostas. Nesse sentido, a diretoria precisava buscar
novas estratégias para evitar os tribofes e atrair o público. Algumas dessas estratégias serão
apresentadas abaixo. Elas, basicamente, eram a inclusão de novos tipos de disputa e o
acréscimo de novas atrações aos programas.
3.3 Corridas de sensação: as variações das disputas
No primeiro ano de funcionamento do velódromo, sob a direção geral de José
Albuquerque Maranhão as disputas que eram realizadas nos páreos pareciam se basear em
corridas onde os ciclistas largavam alinhados, sendo vencedor o que primeiro cruzasse a linha
de chegada. Já nos anos seguintes, principalmente, na gestão de Raymundo B Britto Pereira,
outras variações das disputas passaram a ser empregadas. Eram o handicap, o match, o match
à trois, o desafio e a “partida parada” que traziam diferentes sensações para as corridas de
bicicletas, organizadas no Velódromo Amazonense.
O handicap era uma disputa onde havia o scratch e o limitman. O primeiro era o
corredor que cedia aos outros uma determinada distância de vantagem. O segundo era aquele
que recebia a distância de vantagem. A disputa foi encontrada pela primeira vez em uma
corrida de março 1906, onde ela seria realizada em um páreo que teria corredores a pé (o
limitman) e de bicicleta (o scratch). Essa disputa foi considerada na época como “desastrada e
inepta”, devido à desproporção na forma por que foi realizada, pois a vantagem de um lado
era tão grande que era possível adivinhar, antecipadamente, o resultado da corrida184
.
Outro tipo de variação das disputas era o match, que era o confronto entre os
ciclistas partindo da mesma distância, ou seja, era uma maneira diferente de nomear as
disputas onde os ciclistas largavam alinhados, sendo vencedor o que primeiro cruzasse a linha
de chegada. O match ainda ganhava uma nova variação, quando era disputado por três
ciclistas. Nessa ocasião ele passava a ser chamado de match à trois. O match ainda podia ser
disputado em duas manches, ou seja, uma disputa realizada em dois páreos.
O desafio era outra forma de disputa que se materializava no velódromo. Ele
acontecia quando um ou mais ciclistas desafiavam outros a correr determinada distância.
184
Velódromo. Correio do Norte, Manaus 27 mar. 1906, n.56, p.1.
55
Como na 24ª corrida de 1906, onde houve um “desafio de honra da equipe Hamburgo-
Stoessel a Liberal, em 10 voltas [...]” 185
.
A tentativa de bater um recorde também se estabelecia em algumas ocasiões,
como uma variação da disputa. Nesse caso, a disputa era realizada em “partida parada” que se
concebia em tentar superar sozinho (daí a ideia de parada) um limite de tempo estabelecido
por outro ciclista em uma determinada distância.
A partir da direção de Raymundo B. Brito Pereira o velódromo incorporou a sua
programação algumas atrações. Uma delas, que parecia causar mais interesse no velódromo,
era o uso da motocicleta, mais um símbolo de ostentação da elite manauara. As bicicletas
naquela época já eram tidas como possibilidade de poucos, o que se restringe mais, quando se
pensa na motocicleta. De acordo com Gambeta, as bicicletas custavam muito caro, mesmo na
Europa, para se ter um exemplo, em Paris a mais barata custava, em média, o equivalente a
1655 horas de trabalho de operário francês, em 1893. No Brasil esse valor era agravado por
uma alta taxa da alfândega e os custos de importação, só mesmo os mais ricos conseguiam
compra-las186
.
A motocicleta era uma novidade tecnológica que parecia trazer para o velódromo
novas sensações, pois ela era utilizada para puxar os ciclistas, os fazendo alcançar maior
velocidade. O seu uso fez surgir nas corridas uma figura tida como entraineur187
. De acordo
com Melo essa palavra é de origem inglesa e designava os treinadores188
. No Velódromo
Amazonense ela servia para designar os motociclistas que puxavam os ciclistas pela pista,
soltando-os em determinado momento, como será ilustrado abaixo.
185
Velodromo Amazonense. Jornal do Commercio, Manaus 3 ago. 1906, n.754, p.3. 186
GAMBETA, W. R. A bola rolou: o velódromo Paulista e os espetáculos de futebol (1895- 1916), Tese de
Doutorado, Universidade de São Paulo, 2013. 187
Os entraineurs nas corridas de bicicleta em Manaus também eram conhecidos como entrainadores, eram os
sujeitos que iriam entrainar os ciclistas. Isso pode denotar um desconhecimento dos termos pelos cronistas, ou
as modificações na grafia que a palavra foi sofrendo até adquirir a forma atual, treinador. 188
DE MELO, Victor Andrade. Dicionário do esporte no Brasil: do século XIX ao início do século XX.
Editora Autores Associados, 2007.
56
FIGURA 4 - Walthor e Lawson.
Fonte: Correio Sportivo, Manaus 23 abr. 1916, n.5, p.1.
FIGURA 5 - Offmann e Walthour.
Fonte: Correio Sportivo, Manaus 23 abr. 1916, n.5, p.1.
57
A primeira imagem era do ciclista americano Walthour e do seu entraineur
Lawson e a segunda do entraineur Offmann e de Walthour. Ambas as imagens servem como
um bom exemplo de como as motocicletas eram utilizadas nas corridas de bicicletas. O
motociclista se posicionava a frente do ciclista, que por sua vez, tinha sua roda dianteira presa
a motocicleta. Em seguida, o ciclista era puxado até um determinado percurso, onde ele era
solto e terminava o percurso sozinho.
Em Manaus a motocicleta passou a fazer parte das corridas em 1906. Geralmente,
ela era destacada nos programas e na descrição dos páreos. No programa era dedicado um
espaço para comentar a participação do entreineur e a sua motocicleta.
O primeiro registro das corridas com a participação da motocicleta foi encontrado
em uma crônica que descrevia o resultado da corrida do dia 15 de abril de 1906. Nesta, a
motocicleta foi usada como entraineur dos ciclistas que estavam disputando o recorde dos
10.000 metros189
. Algo que não foi observado em outros lugares do Brasil190
.
A motocicleta era do seu entraineur, assim como a bicicleta pertencia ao seu
ciclista. Foi Francisco Velosso a primeira pessoa a levar para o velódromo sua motocicleta,
“Minerva” 191
. Sua participação parece não ter tido sucesso. Ele foi apresentado como uma
das atrações da 10ª corrida que foi descrita pelo cronista com “desconforto invencível”, por
causa do “desalento provocado pela estupefação” que ele diz ter causado o “mau”
desempenho do programa. Esse “mau” desempenho foi justificado por vários fatores, estando
dentre eles um problema ligado a motocicleta, seu pneumático furou, ficando impossibilitado
a participação do entraineur192
. Embora a motocicleta tenha apresentado problemas, ela
continuou a figurar no velódromo.
Pouco tempo depois, a motocicleta apareceria em dose dupla no velódromo, ou
seja, duas motocicletas passaram a compor o programa das corridas. Inclusive, seria dedicado
um páreo com uma disputa entre as duas. A corrida seria no modelo handicap, onde um
motociclista iria correr 30 voltas e o outro, 22 voltas. No programa era justificado essas
distâncias pelas desigualdades nas forças das motocicletas. Além da corrida entre as
motocicletas, elas seriam utilizadas como entraineur nos páreos de bicicleta. Porém, as
motocicletas não galgaram sucesso novamente. Segundo o cronista, não seria dado o resultado
189
Essa corrida será detalhada no tópico: Stoessel: campeão amazonense. 190
Estudos sobre ciclismo no Brasil, ver: MORAES, Ronaldo. O início da prática do ciclismo em Porto Alegre
e sua relação com o jornalismo, 2012. SCHETINO, A. M. Pedalando na modernidade: a bicicleta e o
ciclismo na transição do século XIX para o XX. Rio de Janerio: Apicuri, 2008. 191
Velodromo Amazonense. Jornal do Commercio, Manaus 22 abr. 1906, n. 651, p.3. 192
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 23 abr. 1906, n.652, p.2.
58
dessa corrida que não havia agrado, por se ter desconcertado uma das motocicletas193
.
Novamente, por problemas no funcionamento das motocicletas, a sua utilização não pôde se
concretizar, causando desagrado.
Quando os problemas mecânicos cessavam, permitindo a sua utilização uma
polêmica surgiu. As disputas, onde apenas um ciclista era puxado pela motocicleta começou a
ser visto com desconfiança. Quanto a isso, o cronista Jupiter do Correio do Norte,
argumentava: “É incontestavel o desequilibrio que causa nas corridas este antipathico
instrumento. O cyclista que, correndo, tem a felicidade de colar a motocicleta adquire uma
dupla força, auxilio artificial que só um aproveita dando vantagens de um folgado handicap.”
Entretanto, o cronista propõe uma solução, que buscaria a equidade nesse tipo de disputa. Ele
dizia que deveria “haver uma motocycleta para cada corredor que disputar um pareo” 194
. Essa
ideia foi levada adiante e realizada no dia 8 de julho de 1906.
Porém, o uso da motocicleta causava divergências. Dentre os não adeptos ao uso
da motocicleta no Velódromo Amazonense estava Victor Breyer que publicou um artigo no
Jornal do Commercio, transcrevendo um ocorrido em Paris.
Agora que entre nós está tomando um certo incremento os jogos de sportivos, é de
toda a conveniencia que os nossos ciclistas conheçam o artigo que em seguida
transcrevemos para nossas columnas. Esse artigo foi publicado pela importante
revista pariense – “La Vie em Grand Air” - que só se occupa desses assumptos
sportivos e tem como titulo – “O Treinamento mortífero” - O terrível accidente em
que Právot perdeu a vida e a recente reabertura do Velodromo Buflalo, em que se
vae, parece-nos, dar novamente asilo aos terríveis engenhos, chamou a attenção
sobre o treinamento feito nos velódromos pelas poderosas motocyclettas. Attenção
pouco benévola, aliás, convem dizer, si pensar-se na listta atroz dos delictos cuja
culpa recahe sobre as monstruosas machinas. Uma quinzena de mortos e outros
tantos estropiados de um todo seleccionado grupo de jovens cheios de vigor e saúde.
É o caso de se perguntar porque o publico que tanto praser demonstra pelos
espectaculos sportivos não manifesta seu profundo degosto pela exhibição desse
gênero em vez de ir assistil-as em massa.
Porque está hoje admittido por motocycletas monstruosamente ant-desportivas é
desprovida de todo o valor athetico. De facto o concurrente nella fica rebaixado ao
papel de simples accessorio e seu valor próprio desapparece quase inteiramente em
proveito do motor em cuja colla elle vae ser aspirado até o poste de chegada.
Si além da corrida de pura velocidade que constitue o mais seguro criterium da
qualidade do campeão cyclista se deseja outra cousa para abrir os nossos
programmas e permittir que todas as aptidões se mostrem – o treinamento humano
corresponde a isso perfeitamente. E tem sobre o outro a vantagem de possuir um
valor athletico e desportivo incontestável. – Porque então desprezal-o? Será
unicamente porque não comporta os riscos mortaes” 195
?
193
A festa do velódromo. Correio do Norte, Manaus 1 maio. 1906, n.85, p.1. 194
Velodromo. Correio do Norte, Manaus 23 maio. 1906, n.104, p.1. 195
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 3 maio. 1906, n.663, p.2.
59
Victor Breyer apresenta aspectos interessantes do uso da motocicleta. Ao citar
uma revista francesa, demonstra o quanto esse país influenciava a cidade de Manaus, pois o
uso desse exemplo procurava convencer os espectadores e os ciclistas do perigo do uso da
motocicleta. Na sua declaração, também era possível notar que, de fato, os esportes pareciam
ter tomado proporções notáveis na cidade, pois ele inicia o artigo chamando a atenção do
leitor para esse fato e no decorrer do texto aponta que a assistência aos espetáculos esportivos,
mais especificamente o ciclismo, eram assistidos em massa. Algo que ele não entendia, pelo
seu desprezo ao uso da motocicleta nesse espaço. Para Victor Breyer a motocicleta era
responsável por uma quinzena de mortos e estropiamentos que aconteciam nos velódromos,
além de tirar do ciclista o valor atlético.
Dois dias após a publicação do artigo de Victor Breyer, um cronista que utilizava
as páginas do Jornal do Commercio para defender os esportes na cidade de Manaus,
especialmente o ciclismo, se manifestara. Seu nome era Coriolano Durand, juiz que fazia a
cronometragem de diversas corridas da Manáos Sport e que a partir de 1906 passou escrever
as crônicas esportivas do Jornal do Commercio. Coriolano Durand era conhecido pelo
pseudônimo de Petit Breton. Ele era tido como um “distincto e férvido sportman
amazonense”, além de ser um “esforçado” propagandista do progresso físico dos
manauaras196
.
FIGURA 6 - Coriolano Durand.
Fonte: Correio Sportivo, Manaus 10 abr. 1910, n.2, p.1.
196
Correio Sportivo, Manaus 10 de abr. 1910, n.2, p.1.
60
Coriolano Durand escreveu uma longa crônica contra argumentando os pontos
levantados por Victor Breyer, onde ele considerou pouco racional as razões expostas para
condenar o uso da motocicleta. Para Coriolano Durand,
os estropiamentos e mortes causados por estas poderosas machinas não são razões
para que sejam ellas excluídas dos velódromos, sob pena de ficar o sr. Breyer
intimado por força da coherencia a reprovar, como mortífero, o uso dos carros,
automóveis e das locomotivas a vapor, que maiores registros de mortes e
estropiamentos não existem no universo do que o de catastrophes verificadas por
encontros e descarrilamentos de trens de ferro.
O mérito do homem que calvaga uma motocycleta está precisamente em o fazer de
modo a que evite os desastres que, somente por imperícia, tanto susto estão levando
no coração do sr. Breyer.
Não acreditamos que a morte lamentável de Henri Prêvot – o celebre pedestrianista,
figure no artigo que refutados, como facto que demonstre a necessidade de
suppressão dos entrainemento por motocycleta, sinão sim como protesto para ser
feita a reclamação contra o uso da poderosa machina; e isto pelo simples motivo de
não haver Prêvot sido morto montando uma motocycleta; mas por tel-o apanhado
uma destas machinas por occasião de fazer o seu entrainement pedestre.
Poder-se-á allegrar que as locomotivas, apezar das desgraças que promovem prestam
importantes serviços ao commercio – o que já è bastante para se supportar o seu uso.
(...) Discordamos da falta de valor athetico nas corridas puxadas por motocycleta. É
verdade que o cyclista que lhe vae collado é como que arrastado; mas nem por isso
elle deixa de ter os membros em movimento. Desde que o cyclista cesse de pedalar a
motocycleta, ainda que traga cortavento e seja muito poderosa, não conseguirá
delocal-o. A motocycleta é um simples auxiliar que, sob o ponto de vista em que
estão os espectadores, maior interesse desperta pela vertigem da velocidade que
pode adquirir.
(...) Si nestas disputas sportivas o cyclista perdesse o valor que lhe é próprio, em
egualdade de circumstancias a victoria seria nulla pelo empate dos corredores.
Effectivamente assim não succede; porque em récord com a mesma motocycleta e a
mesma bicycleta, em condições eguaes de hora etc, finalmente em egualdade de
todas as circumstancias anteriores aos cyclistas, os tempos não são eguaes.
Com isto não queremos dizer em uma fucção sportiva sejam abolidas as corridas
sem motocycleta, por menos interesse causarem: mas simplesmente que esta
machina não seja abolida dos velódromos, porque, si não tem o total do valor
athletico, tem pelo menos uma parcella que não deve ser desprezada197
.
Embora, a motocicleta tenha sofrido certa desconfiança, ela continuaria sendo
utilizada no velódromo, pois o que de fato importava, eram as sensações que tal objeto parecia
trazer aos adeptos das corridas.
3.5 A tandem
Outra atração que era utilizada nas pistas do Velódromo Amazonense era a
tandem. Esse veículo que é definido pelo dicionário Aurélio como “velocípede com dois
selins e outros tantos pares de pedais para ser montado e movido por duas pessoas”, parecia
197
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 5 maio. 1906, n.664, p.2.
61
despertar a atenção dos espectadores por envolver a participação de dois ciclistas no seu
manejo198
.
Anunciada algumas vezes nos destaques, o tandem era utilizado em corridas com
a motocicleta ou com outras bicicletas, chamadas de “corrida mixta”. Sua participação, assim
como a da motocicleta, às vezes, era tida com muita frustração, pois a tandem também sofria
com os problemas mecânicos apresentados durante as corridas. Isso fazia os cronistas terem
que anunciá-las, explicando que aos espectadores que seu uso não seria frustrado.
Segundo informações que nos ministram, o tandem, em que, com Hamburgo, elle
vae disputar o Liberal o ultimo pareo do programma de hoje, está em boas
condições, pois passou por taes transformações, como adaptação de rodas de pista,
substituições de espheras, etc, que o podem tornar capaz de auxiliar os esforços nos
dous corredores199
.
A primeira referência do uso desse veículo foi em um anúncio de uma corrida de
junho de 1906, onde era informado que o ciclista “Liberal” iria disputar em seis voltas (2.000
metros) um objeto de arte com os ciclistas Hamburgo e Espalhado em tandem200
.
Mais tarde, em julho do mesmo ano, outro anúncio do tandem iria surgir. A ideia
era a mesma da corrida anterior, um ciclista contra dois em tandem. Essa disputa foi
anunciada nos destaques da corrida no sétimo páreo, onde os ciclistas disputariam 150$000
em seis voltas, novamente201
. Essa disputa rendeu uma explicação de como Stoessel e
Hamburgo deveriam conduzir o tandem para ganhar o páreo. Nessa explicação era dito que
“para um tandem offerecer garantias de triumpho é preciso que machina e corredores formem
um todo homogêneo”, ou seja, que os ciclistas tenham um plano “organizado” de corrida e
que saibam “praticar com precisão e harmonia.” Para conseguir essa harmonia. diziam que era
necessário longos treinamentos, onde os imprevistos poderiam ser extinguidos com um plano
bem “delineado”. Algo que não poderia acontecer na corrida com o tandem era o “desacordo
entre os dois ciclistas”, pois isso traria “sérios prejuízos ao êxito da corrida.” De fato, correr
em tandem com alguém implicaria harmonia, uma vez que o inverso poderia dificultar a
locomoção do tandem. Todavia, o cronista não apostou a vitória no tandem, mas no seu
adversário, visto a dificuldade em conseguir um “tour de force” sobre o tandem202
.
O resultado dessa corrida confirmou a aposta do cronista. Para ele a corrida do
tandem foi além da expectativa, pois Liberal venceu “só por dous pneumáticos.” A sua
198
Acessado: https://dicionariodoaurelio.com/tandem, dia 29. 199
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 29 jul. 1906, n.749, p.2. 200
Velodromo Amazonense. Jornal do Commercio, Manaus 8 jun. 1906, n.698, p.4. 201
Velodromo Amazonense. Jornal do Commercio, Manaus 27 jul. de 1906, n.747, p.3. 202
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 29 jul. 1906, n.749, p.2.
62
frustração foi o desenvolvimento do tandem que deveria “fazer” dez metros, porém estava
desenvolvendo apenas seis metros e oitenta centímetros. Isso foi justificado, visto que
Hamburgo pedalo com menos velocidade que Stoessel, de maneira que ella é
prejudicada por aquelle, ficando, portanto, este cyclista sobrecarregado do
desenvolvimento que tem que dar á machina e do esforço que deve empregar para
neutralisar a resistência da menor oscillação das pernas de Hamburgo, que por isso
mesmo se oppõe á rotação velos dos pedaes203
.
Utilizando de conhecimentos específicos, o cronista tentava explicar o motivo da
derrota de Stoessel e Hamburgo em tandem para Liberal. O fato dos dois ciclistas disputarem
uma corrida juntos, parecia ser uma atração que despertava a atenção dos espectadores.
Porém, não era suficiente para manter a frequência no Velódromo Amazonense.
3.6 Corrida a pé
Outra atração que se fez necessária no programa das corridas de bicicleta da
Manáos Sport foram os páreos a pé. Elas começaram a ser projetadas em maio de 1906, a
priori, em disputas com as bicicletas em handicap. A sua organização gerou críticas, pois os
corredores em bicicletas ganharam a prova sem gerar nenhum tipo de dúvida, o que estava
contra a ideia de “equilíbrio das forças”. Segundo o jornal Correio do Norte: “foi uma
desastrada e inepta desproporção na forma por que foi feito este pareo, cuja vantagem de um
lado era tão grande que garantia juízo antecipado sobre o resultado da corrida” 204
.
Todavia, não se deixou de realizar as corridas a pé. Apenas se alterou a
organização pela qual ela seria executada, dessa vez em páreos com corredores a pé, somente.
Quem disputava essas corridas no velódromo, também eram ciclistas, que se despiam da
bicicleta para correr em uma disputa de “perna contra perna”. Para essas disputas haviam
prêmios e poderia serem realizadas apostas (poule).
Em páreos dedicados exclusivamente as corridas a pé, a aceitação das mesmas
parecia aumentar. “As corridas pedestres começam a despertar interesse, pois temos visto nos
ultimos programmas um pareo a ellas dedicado.” Esse “interesse” chegou a fazer o cronista
sugerir que os corredores tivessem “uma pessoa que disso entenda, se occupar a ministrar aos
nossos corredores pedestres regras essenciaes referentes á hygiene, á educação dos
movimentos e sobretudo á respiração.” Prevendo que em um ano se tivessem em Manaus
203
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 30 jul. 1906, n.50, p.2. 204
Velódromo. Correio do Norte, Manaus 27 mar. 1906, n.56, p.1.
63
“excellentes corredores de fundo e de velocidade.” Realmente, ao menos na imprensa, as
corridas a pé despertavam interesse, pois se iniciou uma série de dois artigos que explicavam
como deveria ser o desenvolvimento de um corredor, e podia ser observado certa expectativa
pelas corridas pedestres. “Esperaremos pelo resultado do pareo pedestre de hoje, afim de
podermos, fazer umas tantas considerações sobre o pedestrianismo” 205
. De fato, o
pedestrianismo parecia estar causando empolgação, ao menos no cronista (Petit Betron) que
resolveu ensinar em dois artigos “técnicas” sobre como correr.
Outra ideia utilizando a corrida a pé, começou a ser instaurada no Velódromo
Amazonense. Era o páreo a pé para crianças nos intervalos dos páreos dos adultos. Não se
sabe se essa ideia surgiu a partir do sucesso dos páreos a pé. Dentro dessa mesma perspectiva
também passou a ser utilizada a corrida de velocípede entre crianças206
. Além dessas atrações
que incrementavam os programas, um ciclista foi consagrado “campeão amazonense”. Essa
ideia também concorria para tornar atrativas as corridas.
3.7 Stoessel: o campeão amazonense
O sportman Deodoro de Alcântara Freire, conhecido “sportivamente” por
Stoessel, era filho de Pedro Freire, um doutor muito envolvido com as festividades da cidade,
Stoessel era um engenheiro civil formado na Bélgica, onde diziam ter cultivado o ciclismo.
Em Manaus a ele era dado dois recordes207
. Embora se tenha a noção que Stoessel cultivou o
ciclismo na Bélgica, nas notícias das corridas é possível observar sua presença em um páreo
infantil da corrida do dia 15 de novembro de 1898, o que pode significar que o cultivo ao
ciclismo também aconteceu no Brasil.
Desde a direção geral de José Maranhão, o nome de Stoessel figurava entre os
corredores do Velódromo Amazonense. Ali, Stoessel ganhava destaque em uma confusão
envolvendo outro corredor, onde era acusado de ter combinado o resultado208
. Tendo
combinado ou não esse resultado, Stoessel aumentava sua notoriedade nos jornais. Essa
notoriedade se fazia transparecer pela cidade: “nas vitrines que a acreditada Photographia
Alemã tem em frente ao seu prédio acham-se os retratos dos cyclistas Stoessel e Hamburgo,
dois dos mais valentes corredores do Manáos Sport” 209
.
205
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 22 abr. 1906, n.651, p.2. 206
Velodromo Amazonense. Jornal do Commercio, Manaus 20 jul. 1906, n.740, p.3. 207
A margem do “JC” de ontem. Jornal do Commercio, Manaus 31 dez. 1995, n.36.835, p.4. 208
Notas Sportivas. Jornal do Commercio, Manaus 19 out. 1905, n.570, p.3. 209
Varias noticias. Jornal do Commercio, Manaus 26 out. 1905, n.576, p.1.
64
Embora houvesse uma expectativa em ver Stoessel correndo, essa ficaria mais
latente após a concretização de dois recordes, o dos 500 metros e o dos 10.000 metros. O
recorde dos 500 metros aconteceu no dia 25 de março de 1906 em uma corrida descrita como
“magnífica”, onde havia a presença de muitas famílias que ocupavam quase todos os lugares
da arquibancada. Nessa corrida havia um páreo, onde disputariam o menor tempo, três
ciclistas, Hamburgo, Patagonia e Stoessel. O primeiro a correr foi Hamburgo que fez o
percurso em 42 3/5. O segundo foi Patagonia, que causou uma polêmica. Patagonia fez seu
percurso em 43’’, alegando aos juízes que havia batido com um pedal na curva da pista, sendo
assim prejudicado, fazendo um tempo maior do que deveria. Os juízes autorizaram Patagonia
a correr novamente, depois de Stoessel. Em seguida, correu Stoessel que por sua vez, concluiu
o trajeto em 41 3/5. Patagonia correu novamente, fazendo o percurso em 45’’, dois segundos a
mais que na primeira corrida210
. O recorde de Stoessel parece o ter feito “de novo o senhor
absoluto da pista”, fazendo com que se criassem dentro dos programas, páreos que tinham
como objetivo a superação desse tempo. Sendo eles, inclusive, os destaques das corridas.
A outra corrida em que Stoessel batera o recorde dos 10.000 metros aconteceu no
dia 15 de abril de 1906. Seu resultado foi descrito por Dangla, que não poupou elogios a essa
corrida. Dizia ele, que com “elevadíssimo número de espectadores” o programa tinha como 2º
páreo uma partida parada que consistia no ataque ao recorde dos 500 metros e no 7º páreo o
recorde dos 10.000 metros. No primeiro, correram dois ciclistas que não conseguiram bater o
recorde de Stoessel. Ao final desse páreo, Dangla concluía que: “por enquanto nenhum dos
excellentes corredores da primeira turma está apto a bater este Record, porém não
desgostaríamos se algum desses cyclistas nos fosse capaz de nos desmentir.” Conclusão essa
que seria consumada no 7º páreo, tido como “a mais bela corrida do ano de 1906” que foi
assim descrita:
A anciedade da multidão que enchia o velodromo era immensa, devido ao valor dos
corredores e a importância do pareo: determinar o “Record dos 10 kilometros” entre
os nossos cyclistas.
Na hora exacta do programma e em meio de um silencio religioso partiram
“Stoessel”, “Espalhado” e “Patagonia” habilmente puxados pelo motocyclista
Velosso.
Ao principio ia na colla “Espalhado”, que depois teve que cedel-a a “Stoessel”, da
11ª volta, abandonando a corrida. “Patagonia” alcançou a meta de chegada com duas
voltas e meia de differença de Stoessel. Apezar disso nada justifica a vaia que alguns
espectadores quizeram dar-lhe.
A brilhante victoria de “Stoessel” deu lugar a extraordinária ovação do publico a
esse valente corredor.
210
Velódromo. Correio do Norte, Manaus 3 abr. 1906, n.62, p.2.
65
[...] Logo em seguida a essa brilhante victoria Stoessel foi conduzido
triumphalmente a sua residência pelos seus admiradores [grifos meus]211
.
Por meio da utilização do recorde um campeão foi consagrado e se tornou motivo
suficiente para reclamar a presença do público ao velódromo212
. O “campeão amazonense”,
como era insistentemente chamado, era uma figura comparada aos “melhores ciclistas do
mundo” 213
.
De acordo com Schetino “o ciclismo, assim como diversos outros esportes, cria a
partir do espetáculo a figura do ídolo: o grande campeão, o atleta, responsável por grandes
façanhas na modalidade” 214
. E, em Manaus isso não foi diferente.
3.8 O grande clássico do ciclismo: Pará-Manaus
Uma das atrações de destaque dos programas realizados era o enfrentamento de
Stoessel e Alcebíades215
que representavam as suas cidades Manaus e Belém,
respectivamente. Alcebiades chegou a Manaus no fim do ano de 1906 e logo em seguida
disputara duas corridas com Stoessel, a primeira no dia 25 de dezembro, onde eles se
enfrentaram no páreo “Campeões da Amazônia” e a outra no dia 30 do mesmo mês no match
“Pará-Manáos”.
A disputa entre Stoessel e Alcebiades foi levada ao público como uma grande
atração, estando vinculada nos destaques dos programas como “A Belle do Match”. No
programa era apresentado que seria a decisão final dessa sensacional corrida entre Pará-
Manaus. Para se ter uma ideia da importância dessa disputa, todos os demais páreos estavam
sendo premiados de 20$000 a 70$000 ou medalhas e esse tinha o prêmio para o vencedor de
200$000216
. Os dois iriam correr no terceiro páreo, três voltas ou 3.000 metros. Para a
imprensa, esse páreo seria “a nota sensacional do dia”, onde um dos grandes campeões da
Amazônia, Stoessel e Alcebiades, firmariam a “supremacia” de um sobre o outro217
. A disputa
entre os dois foi colocada como a principal atração de várias corridas.
Dois dias depois da disputa, o Jornal do Commercio publica a crônica com o
resultado. Foi explicado que “a belle do match entre Alcebiades e Stoessel foi o pareo
211
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 17 abr. 1906, n.646, p.2. 212
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 30 jul. 1906, n.750, p.2. 213
Velodromo. Correio do Norte, Manaus 17 abr. 1906, n.00073, p.1. 214
SCHETINO, A. M. Pedalando na modernidade: a bicicleta e o ciclismo na transição do século XIX para o
XX. Rio de Janeiro: Apicuri, 2008. p.83. 215
Era um ciclista paraense que viera competir no Velódromo Amazonense. 216
Velodromo Amazonense. Jornal do Commercio, Manaus 25 jan. 1907, n. 927, p.3. 217
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 27 jan. 1907, n. 929, p.2.
66
principal.” Que os dois “arrojados campeões da Amazonia empataram depois de uma
porfiadissima luta.” Devido a isso, o regulamento do velódromo foi utilizado. Nesse caso os
dois ciclistas deveriam correr mais uma volta de 333 metros como desempate. Sendo assim,
na corrida de desempate o vencedor por “um quarto de toda” foi Alcebiades218
.
Stoessel e Alcebiades se enfrentariam novamente, porém dessa vez com um terceiro
ciclista. Essa corrida era mencionada como o “requinte do bello na arte, os dois campeões do
extremo Norte, Stoessel e Alcebiades, em lucta com o arrojado corredor Patagonia.” O páreo
ficou chamado de “Luzo Brasileiro”, pois Patagonia era português219
. Eles iriam disputar
100$000 em 1.000 metros. Dias após a sua execução, o jornal apresentaria o vencedor desse
páreo: “Stoessel mais uma vez elevou bem alto o nome dos cyclistas amazonenses, dos quaes
é o campeão acclamado e inconteste.” Ele “em brilhante e disputadíssima corrida bateu
valentemente o campeão paraense, sendo por esse facto delirantemente victoriado pelo
publico.” Nessa corrida Stoessel foi o primeiro colocado, Alcebiades o segundo e Patagonia o
terceiro220
.
Quando Alcebiades estava próximo de deixar Manaus, para retornar a sua cidade
natal, Pará, os dois realizaram uma nova disputa. Dessa vez em 666, em dois páreos, ou seja,
duas manches221
. Na imprensa era dito que Alcebiades queria “arrancar a palma da victoria” e
que seria de “extraodinario valor se os campeões desenvolvessem a velocidade que são
capazes”222
. Desta maneira, a corrida foi anunciada como “certamen de velocidade no qual os
dous campeões nortistas patentearão suas forças, não desmentindo suas glorias
reciprocamente obtidas”, era o “match sensacional entre Stoessel e Alcebiades” em duas
voltas223
.
Apesar de ter tido uma frequência nomeada de “bastante avultada” e “vivamente
interessada nos diversos pareos”, o desfecho não foi o esperado. Pois, “Stoessel depois que a
chuva diminiu, bateu-se valentemente contra Alcebiades, mas, ao entrar na ultima volta da 1ª
manche foi victima de uma desastrada queda que felizmente não teve graves
consequências”224
. Portanto, sendo interrompido o match entre os dois ciclistas, deixando
Stoessel foram das outras corridas.
218
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 5 fev. 1907, n. 938, p.2. 219
Velodromo Amazonense. Jornal do Commercio, Manaus 17 fev. 1907, n. 949A, p.3. 220
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 18 fev. 1907, n.949B, p.1. 221
Disputa decidida em dois páreos. 222
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 10 mar. 1907, n.969, p.2. 223
Velodromo Amazonense. Jornal do Commercio, Manaus 10 mar. 1907, n.969, p.3. 224
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 12 mar. 1907, n.971, p.2.
67
Como Alcebiades estava perto de partir para o Pará a direção resolveu fazer uma
corrida em seu “benefício” que foi dedicada pelo beneficiado a “novel e digna Sociedade
Beneficente de Praticos do Amazonas”. Nessa corrida foi informado que o ciclista paraense
iria procurar bater os dois recordes de Stoessel, o de 500 metros e 10.000 metros225
. Visto que
o “campeão amazonense”, Stoessel, estava machucado. Depois de uma tentativa falha de bater
o recorde de Stoessel, Alcebiades alegou estar com “fortíssima dor de cabeça” o que o
deixava o “impossibilitava” de correr os demais páreos226
. Deixando Stoessel dono dos
recortes.
No dia vinte e quatro de maio Alcebiades retornou para o Pará. Antes de partir,
Alcebiades dizia aguardar o ciclista alemão Karl Schoeler para disputas no velódromo do
Pará. A imprensa julgava como quase certo, a visita de Karl Schoeler ao Pará. Já Stoessel
retornou para as corridas, porém como entraineur, visto não ter mais condições de correr227
.
3.9 Corridas mirabolantes
A organização dos páreos com diferentes, ou melhor, “mirabolantes” tipos de
disputas são colocados à tona, principalmente, sob a direção de Francisco d’Assis Souza
Guimarães. Foram observadas cinco tipos de páreos diferentes que, possivelmente, eram o
reflexo da necessidade de tornar a ida ao velódromo mais interessante. Corrida de handicap
com quinze ciclistas em bicicleta e dois em tandem, por equipes (internacional), torneio das
bonecas, de obstáculos, e de perseguição.
A primeira dessas corridas “mirabolantes” foi o “mixto handicap”, 15 ciclistas em
bicicleta contra 2 em tandem, em 3.333 metros (10 voltas)228
. Nessa corrida seriam premiados
até o quarto colocado, os prêmios variavam entre 100$000 e 120$000. Ao que parece, todos
os ciclistas estavam relacionados para essa disputa. No outro dia, o resultado dessa corrida era
tido como “interessantíssimo”, com “luta entre todos renhidíssima”. O vencedor dessa prova
foi o ciclista que tinha 333 metros de handicap. Os dois ciclistas em tandem ficaram em
terceiro229
.
Na tentativa de valorizar as corridas do velódromo, outro tipo de corrida foi
inventada. Essa era a “corrida internacional por três equipes” mista. Pois, as equipes foram
225
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 25 mar. 1907, p.1. 226
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 9 abr. 1907, n.998, p.2. 227
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 25 mai. 1907, n. 1044, p.2. 228
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 15 fev. 1907, n.947, p.1. 229
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 18 fev. 1907, n.949B, p.1.
68
divididas pela nacionalidade dos corredores em equipe alemã, portuguesa e brasileira. Nela
iriam correr duas equipes em bicicletas e uma em tandem230
. Nessa corrida, embora fosse em
equipe, o corredor que primeiro chegasse a meta tornaria vencedora a equipe. A equipe
vencedora dessa disputa foi a alemã, ficando em último lugar a brasileira231
.
Outra corrida que demonstrava a capacidade de criação dos organizadores foi a
disputa chamada de “as bonecas”. A ideia dessa corrida era homenagear o “bello sexo”. A
priori, os ciclistas que participariam da corrida, seriam nomes desconhecidos desse meio no
velódromo, “diversos moços da sociedade em questão”. Porém, no dia da corrida pelo fato de
ter faltado um dos corredores, Stoessel faria parte dessa disputa. Esse páreo foi organizado
com quatro corredores, em 666 metros (2 voltas). Seu prêmio era uma surpresa. No programa
dessa corrida havia uma nota explicando como se daria o páreo.
Nota: - A Directoria chama attenção dos apreciadores do Bello para este pareo que é
dedicado ao que há de mais bello – O Bello Sexo.
Os corredores deste sensaccional torneio offerecerão á 4 senhoritas presentes, as
bonecas com que têm de disputar a corrida. Uma vez acceito esse offerecimento, as
senhoritas, pela gentileza que lhes é peculiar, acompaharão os corredores á pista,
onde, depois de sentadas nos respectivos lugares, darão começo ao vestuário das
bonecas.
Dado o signal de Partida, os corredores sahirão em suas bicycletas.
Percorrida a 1ª volta, as bonecas que estiverem promptas serão conduzidas pelos
corredores, respectivamente. Se, porém, nenhuma estiver preparada, os corredores
apoiar-se-ão afim de esperar o final das toilettes, depois do que receberão seus
falismans, partindo em seguida em busca do triumpho que é a conquista do 1º lugar.
A boneca vencedora, bem como as demais, serão pelo Jury examinadas e julgado o
trabalho com que foram preparadas
A Directoria agradece antecipadamente o concurso das senhoritas a este torneio232
.
Como pode ser observado, cada corredor teria uma boneca que levaria consigo até
o final da corrida. Essa boneca deveria ser indumentada por mulheres escolhidas na
arquibancada. Quando finalizada a primeira volta, os ciclistas pegariam a boneca e
disputariam o primeiro lugar. Sobre essa corrida foi dito apenas que “tomaram parte
gentillissimas senhoritas”, vencendo Stoessel que havia substituído um ciclista233
.
Realizar corridas com obstáculos também passou a ser uma estratégia da direção.
Esse tipo de disputa foi realizado mais de uma vez no velódromo. A ideia era colocar vários
obstáculos pela pista como: barricas e sacos, por exemplo. Nesse sentido, os ciclistas
230
As equipes foram organizadas da seguinte forma: equipe Allemã 1: Karl Scholer e Adler (em bicycleta),
equipe Portuguesa 2: Paiva e Patagonia (em bicycleta) e equipe Brazileira 3: Alcebiades e Stoessel (em tandem).
Velodromo Amazonense. Jornal do Commercio, Manaus 24 fev. 1907, n.955, p.4. 231
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 26 fev. 1907, n.957, p.1. 232
Velodromo Amazonense. Jornal do Commercio, Manaus 2 mar. 1907, n.961, p.4. 233
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 4 mar. 1907, n.963, p.1.
69
deveriam saltar e procurar maneiras de conseguir avançar, para ganhar a prova. Essa prova
não tinha uma distância a ser percorrida e o prêmio, dizia o programa, era uma surpresa234
.
Esse páreo chegou a ser chamado de “great attration” pelo cronista que via nele “um torneio
de grande enthusiasmo e hilaridade” 235
.
Além das corridas descritas acima, outras tiveram espaço no velódromo, como a
corrida de “perseguição eliminatória” que parecia ter uma função: fazer com que os ciclistas
não esmorecessem. Realizada com os ciclistas ditos de primeira e segunda turmas, esse páreo
funcionária da seguinte maneira:
os corredores serão collocados a distancia iguaes, de accôrdo com o valor de cada
um e deverão procurar passar áquelles que lhes estiverem na dianteira.
Conseguindo esse desideratum, fica eliminado o corredor batido, que deixará
immediatamente a pista. Para que haja maior esforço por parte de todos é
absolutamente prohibida a colla. O tempo maximo deste pareo é de 15 minutos e
será vencedor, d’entre os cyclistas cujas distancias não forem batidas, aquelle que,
pela ordem da sahida, estiver na frente236
.
Essa corrida foi tratada no programa como “surprehendente e maravilhosa”,
porém ao anunciar o resultado, apenas informaram o vencedor.
Todas essas atrações diferentes pareciam ter o objetivo de atrair o público,
principalmente, pois, em 1907 o ciclismo ganhou uma concorrência de peso. Era o Prado
Amazonense, que passara a funcionar, oferecendo as corridas de cavalo237
. Mas não só as
corridas de cavalo, as apostas também. Estas parecem terem sido abolidas das corridas sob a
direção de Raymundo B. Britto Pereira, ao menos dos programas e resultados, onde já não era
possível encontrá-las. Com isso, o Prado Amazonense toma o lugar de destaque das corridas
de bicicleta que desaparecem das folhas dos jornais.
234
Velodromo Amazonense. Jornal do Commercio, Manaus 2 mar. 1907, n. 961, p.4. 235
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 10 mar. 1907, n.969, p.2. 236
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 17 mar. 1907, n.976, p.2. 237
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 19 abr. 1907, n.1008, p.2.
70
4 PELO PRADO AMAZONENSE: O TURFE EM MANAUS
Em Manaus, o lugar para o lazer desportivo mais sofisticado na década de 10 do
século XX era, sem dúvida, o Prado Amazonense, que ao lado do Teatro Amazonas,
do Ideal Club e do Cine Odeon, constituiu-se no espaço por excelência da
sociabilidade da elite gomífera238
.
Em 1905 começa a veicular pelas folhas dos jornais a informação que se pretendia
fundar um prado em Manaus. Este já contava com um projeto de estatutos e o capital239. Os
prováveis responsáveis eram Luiz Travassos da Rosa e José de Albuquerque Maranhão240
. O
primeiro era coronel e contador-tesoureiro. Tinha uma firma chamada “Travassos e
Maranhão”, juntamente com José Albuquerque Maranhão, que era o antigo proprietário do
Velódromo Amazonense e também coronel. Juntos, eles foram concessionários dos Serviços
Elétricos de Viação e Luz do Estado durante um período 241.
Pouco tempo após, seria informado que a sociedade Prado Amazonense estava
fundada. Sua fundação foi anunciada no Jornal do Commercio que elogiava os esforços dos
envolvidos nessa empreitada. “Fundada a esforços de varios cavalheiros da nossa sociedade, e
principalmente do Sr. coronel Travassos da Rosa reúnem hoje os accionistas da sociedade
Prado Amazonense, para elegerem a sua primeira directoria” 242
. Dessa diretoria eleita se sabe
apenas os nomes de dois membros: Silverio Nery243
que era o presidente da assembleia geral e
um dos diretores, e Coriolano de Carvalho e Silva244
.
O Prado Amazonense, ao que tudo indica, foi construindo durante o ano de 1906,
onde aparecia nas páginas dos jornais devido a uma denúncia referente aos materiais
utilizados na sua construção.
238
NORMANDO, T. S. Jogos de bola, projetos de sociedade: por uma história social do futebol na Belle
Époque manauara. Dissertação (Mestrado em Ciências Humanas) – Universidade Federal do Amazonas,
Manaus, 2003. 239
Varias noticias. Jornal do Commercio, Manas 3 dez. 1905, n.609, p.1. 240
Prado amazonense. Jornal do Commercio, Manaus 16 dez. 1905, n.620, p.2. 241
Os sorteios dos coupons da Viação. Jornal do Commercio, 2 fev. 1905, n.347, p.1. O carnaval. Jornal do
Commercio, Manaus 13 fev. 1907, n.945, p.1. Relatórios dos Presidentes dos Estados Brasileiros (AM) – 1891 a
1930, Manaus 1907, n.1, p.42- 44. 242
Varias noticias. Jornal do Commercio, Manus 28 dez. 1905, n.629, p.1. 243
Silvério Nery era mais um político que se envolvia ativamente na organização dos esportes em Manaus. Ele
teve larga carreira na política. Ele foi Vereador Municipal da monarquia, várias vezes Deputado Estadual na
república, Deputado Federal reeleito, Governador do Estado, Chefe de Partido e Senador Federal.
BITTENCOURT, A. Dicionário amazonense de biografias: vultos do passado. Rio de Janeiro: Conquista,
1973, p.459. Obra parcialmente cedida, gentilmente, pelo pessoal da Biblioteca Virtual do Amazonas. 244
Prado Amazonense. Jornal do Commercio, Manaus 5 mar. 1907, n.964, p.1.
71
Assim, como aconteceu na reconstrução do Velódromo Amazonense, a
construção do Prado Amazonense estava sendo acusada de irregularidades. As irregularidades
eram denunciadas por um dito “cidadão brasileiro, no goso de seus direitos civis”. Ele
escreveu uma carta para o jornal Correio do Norte que foi publicada. Nela era informado que
o governo do Estado do Amazonas havia despachado de Liverpool vários materiais e que
embora a lei não permitisse, estavam sendo empregados na construção do Prado Amazonense,
empresa particular, que estava sendo levantada no bairro da “Preguiça” 245
. Quanto ao local
onde o prado foi construído, Dias explica que muitos trabalhadores que ali residiam, tiveram
suas barracas destruídas em prol dessa modernização246
.
A carta seria replicada, novamente, no dia 27 de julho levando o título
“Contrabando do Governo do Amazonas” que resultou em reação247
. Essa reação seria notada
no próprio “Correio do Norte” que respondia as argumentações de outro jornal, nomeado de
“jornal do beco”. Utilizando de um provérbio popular, onde era dito que “há ocasiões em que
o silêncio é ouro”, o cronista do “Correio do Norte” explicou ter recordado desse provérbio
ao ler o artigo do “jornal do beco” que defendia o auxílio do governo nas obras do Prado
Amazonense. Ele dizia que “aquela gente”, provavelmente o redator do “jornal do beco”,
ainda não havia se convencido de que não viviam mais em uma terra de bugres e que não
escreviam para uma população “ingênua e boçal”. Isso, pois, o “jornal do beco” havia
colocado em seu artigo que achava que os poderes públicos tinham o dever de auxiliar as
associações que se organizassem para as indústrias e as artes, estando o Prado Amazonense
dentre essas associações. O Prado Amazonense, de acordo com o “jornal do beco”, teria como
fim o aperfeiçoamento da espécie cavalar, o que já era um melhoramento no Estado.
Contrariando os argumentos do “jornal do beco”, o cronista do Correio do Norte apontava
que havia necessidades mais “urgentes e úteis”. Como a proteção e auxílio aos credores do
gado vaccum que estavam feridos de morte, auxílio à indústria agrícola e auxílio e proteção a
indústria “extractiva”, principalmente a goma elástica que já estava sofrendo com a
concorrência dos mercados africanos, asiáticos e outros. Porém não terminava aí, ele fazia
críticas aos impostos cobrados a todos os gêneros de exportação e pedia para o governo ao
invés de auxiliar o Prado Amazonense, a ir estudar as associações que se formavam na Europa
para o plantio de goma elástica, onde já era utilizada a bicicleta e outro processo de
solidificação do leite da seringueira, mais eficiente que o utilizado em Manaus. Ao final o
245
De palanque. Correio do Norte, Manaus 21 jun. 1906, n.129, p.1. 246
DIAS, E. M. A ilusão do Fausto. Manaus 1890-1920. Manaus: Editora Valer, 1999, p.139. 247
Contrabando do Governo do Amazonas. Correio do Norte, Manaus 27 jun. 1906, n.134, p.1.
72
cronista pedia para que o governo tratasse das coisas que são “mais úteis, mais urgentes”, pois
delas dependeriam o futuro do Estado248
.
Como ficou perceptível, havia um confronto entre os cronistas sobre a construção
desse tipo de espaço, tido como necessários por uns e inúteis por outros. O argumento
utilizado pelos defensores do prado era semelhante ao encontrado no Rio de Janeiro. Nessa
cidade os regulamentos e os clubes de corrida repetiam os argumentos para o
desenvolvimento do turfe na França e, principalmente, na Grã-Bretanha, que eram: trazer uma
diversão para a população e desenvolver a “raça cavalar brasileira”, considerada inferior a
europeia e argentina. Todavia, o objetivo que de fato pareciam levar a tal empreendimento era
a grande possibilidade de negócio que surgia ao redor das corridas249
.
Apesar dessa denúncia, a construção do Prado Amazonense prosseguiria até o ano
de 1907, onde seria encerrada. Porém, no início desse ano, outra polêmica seria instaurada.
Dessa vez a polêmica estava relacionada à diretoria do Prado Amazonense, causada por um
anúncio no jornal “Amazonas”. Nesse anúncio alguns acionistas e credores do prado queriam
saber quando e por qual número de votos havia sido eleita a direção que estava sendo
anunciada no jornal, além de criticarem, dizendo que as eleições do Prado Amazonense não
deveriam ser “as ocultas”. Com isso, os acionistas e credores informavam estarem aguardando
um posicionamento da diretoria, provando, assim, que não eram “filhos do bico da pena” 250
.
Como a notícia que divulgara a lista dos eleitos estava no jornal “Amazonas” e o
acervo da Biblioteca Nacional não tinha tal edição, o entendimento de tal articulação ficou
limitado, pois ao que parece, até o ano de 1907 essa diretoria tinha nesse jornal o seu “porta-
voz”, quando foi substituído pelo Jornal do Commercio, novo canal de comunicação do Prado
Amazonense com seus acionistas, credores e espectadores. Algo que sustenta essa ideia são as
seis primeiras corridas do ano de 1907 que não foram anunciadas no Jornal do Commercio,
demonstrando que o meio de comunicação da diretoria responsável pelo Prado Amazonense
no início de 1907 era outro. Todavia, isso seria modificado com a eleição de um novo corpo
dirigente251
. Essa eleição aconteceu no Club Internacional, onde foram empossados os eleitos
248
As colunas da bibliotheca. Correio do Norte, Manaus 1 jul. 1906, n.138, p.1. 249
VOTRE, S. J.; SALLES, J. G. C.; MELO, V. A. Representação Social do Esporte e da Atividade Física:
ensaios etnográficos. Brasília: Ministério da Educação e do Desporto./INDESP, 1998. 250
Prado Amazonense. Jornal do Commercio, Manaus 1 jan. 1907, n.903, p3. 251
Nessa assembleia comandada por Silverio Nery, foram eleitos os seguintes nomes para as seguintes funções:
Raymundo da Silva Perdigão, presidente; João Leandro Hermes de Araújo, primeiro secretário; Julio Nogueira,
segundo secretário; para a diretoria, Henrique Eduardo Weaver, Emygdio Pineiro, Antônio José da Silva Junior,
Luiz Rodolpho Cavalcati de Albuquerque e Antonio D. de Mattos Aerosa; como suplentes da diretoria, Porfirio
Nogueira, Eduardo F. de Azevedo, José Antonio Fernandes Guimarães, Eduardo Simões Ferreira e Aristides do
Valle Guimarães; para o conselho fiscal, Carlos de Castro Figueiredo, Arthur Ferreira e W. Peters; para suplentes
do conselho fiscal Lorival Muniz, Juvencio de Oliveira França e Avelino Augusto Martins.
73
e lido o relatório sobre as contas do Prado Amazonense, onde a administração anterior foi tida
como “desastrosa”, pois se devia 232:047$142252
.
Dias após a eleição e posse da nova diretoria do Prado Amazonense, começavam
a circular pelas páginas dos jornais as notícias das corridas de cavalo. Notícias essas, que não
se limitavam as dimensões do prado. Nelas eram anunciados os projetos das corridas, as
inscrições, os resultados das inscrições, os programas, os palpites, os resultados de cada páreo
e das poules, além de tratar do comércio que começava a surgir entorno dessa prática.
4.1 Organização do turfe em Manaus
As corridas de cavalo em Manaus aconteciam no Prado Amazonense, aos
domingos, assim como no Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, onde as corridas de cavalos
eram atrações esportivas e de lazer253
. As suas instalações contavam com guichês, secretaria,
casa de poule e arquibancadas. É importante explicar que “esses lugares que eram tidos como
apropriados para a prática do turfe, possuíam, em sua estrutura, arquibancadas ao redor da
pista oval, circular ou elíptica, permitindo que toda a assistência pudesse visualizar as corridas
em todo o seu percurso” 254
. O que, provavelmente, foi feito no Prado Amazonense.
A organização das corridas de cavalo era feita de 1907 a 1909, realizada por uma
diretoria do próprio Prado Amazonense, a partir daí seria criado um clube para tal. Sua
organização era parecida com a do ciclismo, onde as disputas se passavam nos páreos. Cada
corrida tinha cerca de cinco páreos. Em cada páreo era percorrida uma determinada distância,
anunciada no projeto da corrida, ou programa que variava entre 800 metros e 2200 metros. A
partir do dia 14 de agosto de 1907 ficou estabelecido que nenhum páreo se realizaria sem que
se inscrevessem e corressem, pelo menos quatro cavalos255
.
A priori, a separação dos cavalos era realizada com o auxílio dos seus
proprietários no momento da inscrição. Até que foi criado um conjunto de “categorias” para
auxiliar nessa separação. Existia uma ideia, que também circulava no ambiente do ciclismo,
que se baseava em tentar organizar os páreos com competidores “da mesma força”. Essa
noção, inclusive, era utilizada, assim como no ciclismo, para avaliar se os páreos estavam
252
Prado Amazonense. Jornal do Commercio, Manaus 5 mar. 1907, n.964, p1. 253
Ver: PEREIRA, E. L.; MAZO, J. Z. As práticas equestres e o lazer dos porto-alegrenses (décadas de 1920 a
1940). Licere, Belo Horizonte, v.17, n.4, dez/2014, p.7. 254
PEREIRA, E. L.; MAZO, J. Z. As práticas equestres e o lazer dos porto-alegrenses (décadas de 1920 a 1940).
Licere, Belo Horizonte, v.17, n.4, dez/2014, p.7. 255
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 28 jul. 1907, n.2008, p.2.
74
“bem organizados” ou não256
. A separação dos cavalos passou a ser realizada baseada em
categorias, que foram sendo modificadas no decorrer do tempo. Essas categorias, a princípio,
eram: animais nacionais; animais da Amazônia e Ceará (animais de outros estados); animais
de qualquer país; animais nacionais que não tenham corrido no Prado e animais nacionais que
não tenham alcançado vitória; animais nacionais que não tenham ganhado grandes prêmios e
nem o páreo Amazonas; animais de menos de meio sangue que não tenham tido vitória no
prado; animais de menos de meio sangue que não tenham mais de uma vitória em uma
determinada distância; animais de menos de meio sangue; animais de sangue; e animais
estrangeiros. Sendo modificadas para as séries, 1ª, 2ª, 3ª e 4ª, que também levavam em
consideração se o animal era nacional ou estrangeiro, se tinha vitória ou não, e se eram puro
sangue.
Em cada corrida havia, aproximadamente, 20 cavalos inscritos. Esses cavalos
eram montados ou pelo proprietário, ou por uma pessoa contratada, especificamente, para essa
função – essa pessoa, muitas vezes, era alguém fora do círculo da elite política e econômica
como, por exemplo, o jóquei Antônio Francisco Xavier que era talhador de carnes257
. Isso
acontecia, pois, “o típico sportman era um dono de cavalos parelheiros que assistia aos páreos
da tribuna de honra e recebia aplausos ao desfilar ao lado de sua cria vencedora” 258
. Sendo
assim, não era sempre que o dono do cavalo montava o seu animal. Como os jóqueis podiam
ser contratados, era possível ver nos resultados das corridas um mesmo jóquei ganhar
diferentes páreos com cavalos diversos. Esses jóqueis, geralmente, disputavam prêmios em
dinheiro que eram entregues aos primeiros e segundos colocados. Além de correr, os jóqueis
também costumavam serem os entraineurs259
dos cavalos.
Nas corridas de cavalo eram permitidas as poules, principal atividade que
diferenciava o ciclismo do turfe, ao menos de maneira formal. Sua aceitação no universo do
turfe atraía diversos apostadores para o Prado Amazonense que se manifestavam em situações
duvidosas. Esse tipo de atividade era algo que veio da Europa, onde o turfe, já convivia com
as apostas como parte indissociável das disputas em páreos260
. No caso de Manaus, essas
apostas podiam ser simples ou duplas. As disputas entre os cavalos, em sua maioria, eram
compostas por corridas, onde os cavalos estavam alinhados, ou seja, parecido com a ideia do
256
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 12 set. 1907, n.1154, p.2. 257
Jornal do Commercio, 29 jun. 1905. 258
GAMBETA, W. R. A bola rolou: o Velódromo Paulista e os espetáculos de futebol 1895-1916. p.42. 259
Nas corridas de cavalo a palavra tinha o sentido de treinamento. 260
GAMBETA, W. R. A bola rolou: o Velódromo Paulista e os espetáculos de futebol 1895-1916. p.50.
75
match no ciclismo. Algumas vezes, era possível perceber, alguma variação na disputa dos
páreos, isso acontecia com as disputas de handicap por peso ou corrida de velocidade.
Também fazia parte das corridas de cavalo, homenagens, “grandes prêmios” e
páreos amadores, que eram realizados devido a uma data especial ou na tentativa de encurtar
vínculos com determinados grupos.
Como as corridas de cavalo que foram realizadas em homenagem a colônia
francesa de Manaus. Nelas teve a presença do cônsul da França e de “grande número” de
membros da colônia francesa. Nessa corrida, um dos páreos foi nomeado de “República
francesa”. Ao seu término, a “directoria convidou o consul francez para ir à casa da poule,
onde lhe foi servida uma taça de champague” e foram feitas saudações261
. No Prado
Amazonense em algumas ocasiões especiais, tais como nas homenagens, era comum que uma
banda de música tocasse, completando a programação.
A disputa do “Grande Prêmio” em 2200 metros foi realizada pela primeira vez
em 1907262
. Ela era organizada quando havia uma data comemorativa como, por exemplo, o
dia 5 de setembro, data que “elevou o Amazonas á cathegoria de província” 263
. Nessa ocasião
se dizia que achavam-se inscritos os “melhores cavallos estrangeiros do nosso turf.” Na
descrição do resultado dessa corrida foi dito que tiveram o “brilhantismo e foram
concorridíssimas”, onde houve a participação do governador do Estado, acompanhado do
comandante do distrito militar264
. Já as corridas de cavalo com páreos amadores passaram a
serem realizadas a partir de 1908. Elas eram tidas como outra atração que o prado oferecia,
divulgadas como destaque pelos cronistas265
.
Para participar das corridas era necessário realizar a inscrição, onde era cobrado
um valor que não foi identificado. Quando o animal estava inscrito e acontecia algo que o
impedira de participar, era preciso fazer forfait, esta era uma declaração a ser entregue na
secretaria do Prado Amazonense até uma determinada data266
. Ao que tudo indica até 1908 as
inscrições eram realizadas na secretaria do Prado Amazonense, quando elas passaram a
ocorrer no Café dos Terríveis, por causa da mudança de direção que houve nesse momento.
Inicialmente, as corridas de turfe eram anunciadas em meio a outras notícias de
esporte, tais como futebol e o ciclismo, onde não havia um programa ou palpites, mas apenas
a informação que aconteceria a corrida no Prado Amazonense. “Domingo proximo haverá
261
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 15 jul. 1907, n.1095, p.2. 262
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 28 ago. 1907, n.1139, p.2. 263
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 27 ago. 1907, n.1138, p.2. 264
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 6 set. 1907, n.1148, p.2. 265
Prado Amazonense. Jornal do Commercio, Manaus 21 jun. 1908, n.1524, p.1. 266
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 2 maio. 1907, n.1021, p.2.
76
mais uma esplendida corrida no Prado Amazonense. Os pareos foram bem organizados
eportanto é natural uma bôa concorrencia aquella casa e que as corridas despertem real
interesse ao publico” 267
. Com o tempo, passou a ser notado o anúncio das inscrições para as
corridas, regras, palpites e os programas.
Nos programas haviam informações sobre os juízes e da composição de cada
páreo. As corridas eram compostas por seis tipos de juízes: de arquibancada, de chegada, de
partida, de pesagem, de encilhamento e de raia. Ao todo eram 15 pessoas realizando essas
funções. Como havia apostas nas corridas eram necessárias várias informações sobre os
cavalos. Devido a isso, os páreos eram anunciados divulgando o número, nomes dos cavalos,
pêlo, idade, peso, naturalidade, cores das vestimentas e proprietário. Embora não esteja
anexado nesse programa, havia taxas de entrada, que eram divididas em carro cujos valores
eram 5$000; carro com passageiro, 10$000; arquibancada com direito ao encilhamento,
3$000; geral, 1$000; e senhoras que tinham a entrada grátis.
O comércio ligado a venda e compra de animais também surge nesse momento.
Em meados de 1907 cavalos vindos do Rio de Janeiro começam a ser comercializados em
Manaus. Esse é o caso do cavalo Asseguá de meio sangue. Nascido “no Rio Grande do Sul na
estância do Sr. Jo e Antonio Soares de Preixo”, ele foi vendido para o Rio de Janeiro, onde
corria no “Prado do Derby Club”, até que foi comprado pelo comandante do paquete
Maranhão. Esse comandante levou Asseguá para Manaus, onde tentava vendê-lo.
Com o fim de vender n’esta capital, o seu proprietário, trouxe a bordo do navio ao
seu comando, aqui chegando hontem.
Alguns dos nossos sportmens foram examinar o animal, havendo já algumas
offertas.
O Asseguá correu pela ultima vez no Rio de Janeiro, no dia 23 de Julho no prado do
Deby Club.
[...] Partindo com sensível vantagem, Jacy logrou vencer de ponta à ponta por dous
corpos de luz.
Asseguá, que partiu em segundo, manteve a collocação, a Dante e Cavour, os
favoritos, chegaram em condições de não poder ameaçar a egua da coudelaria
Esperança268
.
Nesse mesmo mês, outro cavalo chegara a Manaus. Era o cavalo inglês “Orel” que
foi comprado no Rio de Janeiro, onde corria no Jockey Club. Ele chegou em Manaus pelo
vapor Alagôas e seria batizado com o nome de Petropolis269
. Esse tipo de transação, era visto
pela imprensa como prova de que o turfe estava “enraizado” na cidade270
.
267
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 22 abr. 1907, n.1011, p.1. 268
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 9 ago. 1907, n.1120, p.2. 269
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 18 de ago. 1907, n.1129, p.2. 270
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 22 dez. 1907, n.1345, p.2.
77
Entre proprietários de Manaus, vendas de cavalos também aconteciam,
principalmente quando o Prado Amazonense sofria uma debandada dos espectadores, devido
à desconfiança dos resultados das corridas. Esse é o caso de um proprietário que vendeu os
cavalos “Albatroz e Malho” que faziam parte da sua coudelaria271
. Um foi vendido para a
coudelaria “Triumpho” e o outro para um “despachante” 272
. Além disso, os cavalos da cidade
eram vendidos para outras capitais, como o cavalo Vinicins, que foi vendido para Rio
Branco273
.
Mas não era apenas o comércio de cavalos que movimentava os bastidores do
turfe. A contratação dos jóqueis também movimentava o comércio. Alguns contratavam
jóqueis em Manaus e outros iam buscá-lo fora do Brasil. Isso foi o que fez o senador Silvério
Nery que contratou um jóquei na França. Esse jóquei se chamava A. Bergés e chegou a
Manaus no paquete Antony em 1908. Ou do jóquei Roselincker, também de nacionalidade
francesa, que corria em Manaus. Em julho de 1908, ele partiu para a França, para ver sua
família, prometendo voltar com dois cavalos274
.
Durante 1907 e 1909 o que mais se destacava nas corridas de cavalo do Prado
Amazonense eram as confusões e tribofes que pareciam contradizer a ideia das corridas serem
diversões civilizadas.
4.2 Entre confusões e tribofes: as corridas de cavalo em Manaus
Assim como no ciclismo, onde aconteciam situações envolvendo tribofes,
problemas mecânicos das bicicletas, tandem ou motocicletas, no turfe não era diferente.
Tribofes, a postura de alguns jóqueis e o desconhecimento das regras ou o seu não
cumprimento por parte do público, juízes e diretoria levavam para o Prado Amazonense cenas
ditas como de “selvageria”, que resultavam, muitas vezes, em uma concorrência diminuta por
uma dita falta de moralidade naquele lugar.
271
De acordo com a definição do dicionário Michaelis, coudelaria era um estabelecimento ou posto de criação,
geralmente estatal, de cavalos, com o intuito de aperfeiçoar as raças. Disponível em:
<http://michaelis.uol.com.br/busca?id=DXYa>. Acesso em: 20 de abril 2017. No ano de 1908 era possível
encontrar cerca de seis coudelarias em Manaus. A saber: Coudelaria Idealista, Coudelaria Cruzeiro do Sul,
Coudelaria Brasil, Coudelaria Fortaleza, Coudelaria Rio Negro e Coudelaria Aliança. 272
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 31 out. 1907, n.1203, p.2. 273
Gazetilha. Jornal do Commercio, Manaus 20 jul. 1908, n.1552, p.1. 274
Gazetilha. Jornal do Commercio, Manaus 20 jul 1908, n.1552, p.1.
78
A dificuldade em emparelhar os cavalos para saída era uma dessas situações. Ela
acontecia com frequência no Prado Amazonense, fazendo o público se manifestar275
. Os
motivos para tal, geralmente, eram a chamada incorreção dos jóqueis, plano especial de saída
e o desentendimento entre o juiz que dava a largada e os jóqueis.
Logo na primeira corrida de cavalos em 1907, na qual estreava a nova direção do
prado, ocorreu uma dessas confusões. Nela houve o que foi chamado de “incorreção dos
jockeys” na saída do segundo páreo. Com quatro cavalos disputando os prêmios de 150$000
ao primeiro e 25$000 ao segundo, em uma distância de 850 metros, dois jóqueis tiveram que
ser suspensos por terem ficado parados depois que a largada havia sido dada pelo starter, juiz
de largada276
.
Em maio do mesmo ano outra situação parecida voltaria a acontecer. No páreo de
900 metros entre animais nacionais com a mesma premiação da corrida citada anteriormente,
houve demora na saída, mas dessa vez o motivo não foi a dificuldade em emparelhar os
animais, mas o fato dos jóqueis terem um “plano especial para a saída.”
Este pareo, devido á maioria dos jockys ter um plano especial para sahida, ficou por
isso a mesma demoradissima a ponto do publico, com grande frenesi manifestar-se,
havendo necessidade do juiz de partida multar os jockys Manoel Archanjo e José
Mendes. Depois de ½ hora conseguiu-se emfim, dar uma sahida regular, ficando
parado o cavallo Boreas277
.
Dessa vez, o público protestou fazendo com que os juízes tivessem que multar os
dois jóqueis. Mesmo assim, um dos cavalos continuou parado após dado a largada.
Em outra corrida, a situação foi ainda mais comprometedora. No quarto páreo,
disputa dos prêmios de 150$000 e 25$000 na distância de 1.000 metros, os jóqueis
“castigaram” os animais e partiram em disparada. Quando perceberam que o juiz não havia
arriado a bandeira, eles seguraram os cavalos. Porém, um dos animais não conseguiu parar
antes dos 600 metros percorridos. Na nova saída, esse cavalo foi alcançado nos 700 metros,
fazendo o cronista insinuar que isso aconteceu devido ao fato do animal estar muito cansado
dos 600 metros percorridos por engano278
. Essas situações faziam com que o público ficasse
impaciente e indisposto, sendo um dos fatores que em determinado momento contribuiu para
o distanciamento dos espectadores ao Prado Amazonense279
.
275
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 20 maio. 1907, n.1039, p.2. 276
Prado. Jornal do Commercio, Manaus 8 abr. 1907, n.997, p.1- 2. 277
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 20 maio. 1907, n.1039, p.2. 278
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 20 janeiro de 1908, n. 1373, p.2. 279
Gazetilha. Jornal do Commercio, Manaus 3 ago. 1908, n.1567, p.1.
79
Além dos atrasos na saída dos páreos, os tribofes também aconteciam. Uma
dessas ocasiões em que ocorreu o tribofe envolveu o jóquei Raymundo de Castro. Ele
disputava o quinto páreo da corrida do dia 18 de agosto de 1907 em 1.700 metros que tinha
como prêmios 600$00 e 90$000. Os quatro cavalos que disputavam o prêmio haviam largado
em uma partida dita como “optima”. Todavia, o jóquei Raymundo de Castro, que montava
Albatroz, logo após ter corrido 50 metros, segurou e parou o cavalo, enquanto os demais
animais “tocaram para o pau”. O vencedor desse páreo foi Manoel Archanjo. O cronista
explicou que quando a corrida foi finalizada “o povo protestou energicamente contra o
procedimento do jockey de Albatroz, que era o favorito”. Essa situação, fez com que a
diretoria tivesse que marcar uma reunião para o dia seguinte com a finalidade de decidir a
penalidade que seria aplicada ao jóquei280
.
Quando aconteciam tribofes, geralmente, quem levava a culpa de tal ato eram os
jóqueis. Porém existiam aquelas circunstâncias, onde os juízes também estavam envolvidos.
Uma ocasião que retrata bem esse envolvimento dos juízes era a corrida de setembro de 1908,
mais especificamente, no segundo páreo, chamado Animação, de 1.000 metros, que tinha
como prêmio 25$000. Seu primeiro colocado foi o cavalo Macuxy, de J. Emigdio, que de
acordo com o cronista foi favorecido “vergonhosamente”. Nele o cronista dizia:
Crêmos que todos os pareos disputados, na presente estação, nas diversas corridas de
nosso hippodromo, foi este um dos peiores e que mais irregularidades deixou
entrever.
A sahida foi má, favorecendo vergonhosamente Macuxy.
Além d’isso, D’ Artagnan, no qual estavam todas as esperanças de ganhar, com
muitas probabilidades, correu preso de fio a pavio, chegando em 3º logar, havendo,
conservado, contudo, do começo ao fim.
É mister que se dêm por findas taes maroreiras, que não sabemos se partio do jockey
L. Gomes, se de ordem do proprietário. O que não ha duvida, é que antes da partida
já os magnatas sabiam os animais que deviam ganhar.
Se foi culpa do jockey, convém que a diretoria tome uma providencia enérgica, afim
de que isso não se repita.
Era caso para multa e suspensão – não sabemos se isto se deu.
Todas as pessoas presentes reclamaram em altas vozes contra isso que só depõe em
desfavor do Prado Amazonense281
.
Em sua crônica é possível perceber que havia uma cobrança pelo fim do que ele
nomeou de “maroreiras” que não se sabia se partiam do jóquei ou dos proprietários dos
cavalos. Ele pedia providências energéticas da diretoria e dizia que tudo isso depunha em
desfavor do Prado Amazonense.
280
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 19 ago. 1907, n.1130, p.2. 281
Gazetilha. Jornal do Commercio, Manaus 7 set. 1908, n.1602, p.1, 2.
80
Situações por parte dos jóqueis que eram chamadas de “abusos” também faziam
os cronistas exigirem providências da diretoria. Esses “abusos” praticados pelos jóqueis eram
utilizados para ganharem as provas e se baseavam em segurar a rédea do concorrente,
derrubá-lo ou até chicoteá-lo. Esse tipo de situação foi registrado em uma corrida que
homenageava a colônia francesa de Manaus. Nessa corrida havia cinco páreos, sendo o
terceiro o “palco” desse ocorrido. Os protagonistas desse acontecimento foram o jóquei
Aggeu montado em A’batroz, e E. Rocha, montado em Bismarck. Quando eles estavam “na
altura do poste do destanciado”, o jóquei Aggeu utilizou de um “expediente nada serio”. Ele
pegou nas rédeas do cavalo Bismarck e com a mão esquerda prendeu os movimento do jóquei
E. Rocha. Com isso, Bismarck perdeu a corrida “por cabeça”. No final o cronista dizia que
“directoria do Prado compete reprehender severamente estes abusos, que com maior
descaramento estão sendo praticados bem defronte das archibancadas. Este facto já não é o
primeiro, pois no domingo passado houve a mesma scena em que o jockey “Rio Pardo” foi
em cima de “Bismarck” 282
. Com isso, ficava claro que esse tipo de situação estava
acontecendo no Prado Amazonense, não apenas nessa corrida, mas em outras.
Em 1908 aconteceu uma corrida de cavalos que culminou em uma grave
confusão, se tornando caso de polícia. Havia cinco páreos e quatorze animais inscritos para
participar das disputas. O programa era dito como “bem organizado”, tendo inscrito os
“melhores pugnas” do turfe de Manaus283
. Porém, apesar da expectativa, alguns imprevistos
aconteceram. Isso tinha haver com as chegadas, onde houve dúvidas sobre o vencedor e um
incidente envolvendo jóqueis e um dono de cavalo. O cronista dizia que “os pareos foram
todos bem disputados, a ponto de haver chegadas em que era difícil classificar o vencedor.” O
que levou a “protestos de diversos espectadores que se julgavam prejudicados com as
decisões do jury”. Todavia, para o cronista os protestos “não tinha razão de ser”. Em seguida
ele passava a narrar o fato ocorrido no Prado Amazonense:
corriam neste pareo os cavalos Rio Pardo, Tupy e Bysmarck, respectivamente
montados pelos jockeys Manoel Archanjo, João Gonçalves e A. Bergés. Este ultimo
de nacionalidade franceza, chegou a esta capital a bordo do paquete Antony,
contractado pelo senador Silverio Nery e hontem pela primeira vez corria no
hypodromo.
Logo que o juiz deu o signal de partida, pulou na ponta Rio Pardo, seguido por Tupy,
correndo em ultimo Bismarck, que ia preso. Este valente animal estava habilmente
dirigido. Ao passar a setta dos 600 metros, o jockey soltou-o e ele aproximou-se de
Tupy, travando os dois renhida luta, da qual Bismarck sahiu vencedor. O jockey
Bergés, na ocasião de fazer a passagem, deu umas chicotadas no seu animal, indo a
ponta do chicote atingir o piloto de Tupy. Apezar da lucta, Bismarck conseguiu
282
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 15 jul. 1907, n.1095, p.2. 283
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 19 jan. 1908, n.1372, p.2.
81
chegar ao vencedor junto com Rio Pardo, sendo por isso classificados ambos
vencedores.
O jockey Gonçalves quando passou o poste do vencedor, deu uma forte chicotada
em Bergés, que (...) [ilegível].
Quando os animaes sahiam da raia, com direção ao assilhamento e passavam em
frente às archibancadas, o tenente Paulo Silva, um dos proprietários do Tupy, ergueu
uma bengala e deu forte pancada no jockey Bergés, que recebeu um ferimento na
cabeça, derramando bastante sangue.
Como sempre, o povo alvoraçou-se e o dr. Chefe de policia, que ali se achava, deu
voz de prissão ao agressor.
O jockey Bergés foi transportado para a casa da poule onde lhe fizeram a lavagem
da ferida, sendo depois conduzido à policia, para ser submetido a corpo de delicto.
O dr. Alvaro Maia, medico legista, classificou de leves os ferimentos, rasão por que
o agressor prestou fiança para solto se livrar284
.
Com isso, a diretoria do Prado Amazonense teve que se reunir no dia seguinte e
decidiu expulsar o jóquei João Gonçalves que havia sido atingindo pelo chicote de A. Bergés,
não aceitando os animais que tinha ele como entraineur. Além disso, proibiu por tempo
indeterminado a entrada nas dependências do prado de Paulo Emilio Pereira da Silva285
. Já o
jóquei da França, embora tivesse iniciado a confusão, não foi penalizado pela diretoria.
Acidentes envolvendo os cavalos e os jóqueis também marcaram o Prado
Amazonense. Um desses acidentes marcou o fim das corridas com a participação do cavalo
Petropolis que “ao ser dada a partida, pulou em 3º logar; mas, ao passar pela curva, junto do
ensilhamento, cahiu e quebrou as pernas deanteiras.” Com isso, Petropolis não poderia ser
mais utilizado. O jóquei que montava Petropolis, Edmundo Soares, “ficou muito maltratado,
sendo tal o seu estado que foi transportado em braços para a casa da poule, onde o Dr.
Sebastião Barroso Nunes lhe prestou os soccorros de que carecia, sendo depois transportado
para um quarto particular da Santa Casa, por conta de seus patrões” 286
.
Situações que eram explicadas pela falta de conhecimento ou de aplicação das
regras do “Código de Corridas” também ocorriam. O terceiro páreo de uma corrida realizada
em setembro de 1907, um jóquei que estava com a silha frouxa foi “cuspido por terra”.
Todavia, o seu cavalo, Rayon d’Or, continuou correndo, chegando em primeiro lugar, distante
dos outros cavalos. Isso fez com que algumas pessoas quisessem que Rayon d’Or fosse
considerado o vencedor desse páreo, gerando confusão287
.
Durante o período analisado, essas situações prejudicavam o Prado Amazonense
de tal forma, que no decorrer do ano de 1908 teve uma mudança na direção, onde era iniciada
a retórica que o prado havia se moralizado, de que a partir daquele momento valia a pena
284
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 20 jan. 1908, n.1373, p.2. 285
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 21 jan. 1908, n.1374, p.2. 286
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 25 fev. 1908, n.1409, p.2. 287
Sport. Jornal do Commercio, Manaus 6 set. 1907, n.1148, p.2.
82
frequentar o prado. Essa retórica era propagada na tentativa de atrair o público novamente,
porém, ainda ocorriam cenas que não agradavam288
. Isso fez com que outra mudança fosse
processada: a criação de um clube para gerenciar as corridas.
4.3 “Moralizando” o turfe: Derby Club
Em todos os Estados do paiz, existem sociedades sportivas onde o povo se diverte
nos dias de festa, e é justo, portanto, que aqui em Manáos que é uma cidade bastante
adiantada, tambem se mantenha uma ao menos nas condições do Derby Club que
vem preencher uma grande lacuna289
.
No final do ano de 1909 o Prado Amazonense foi arrendado por uma associação
esportiva, o Derby Club290
. Ela foi fundada no dia 13 de dezembro de 1909, tinha estatutos
próprios, um presidente, um vice-presidente, um secretário, um tesoureiro e um orador291
.
Tida como a “reanimadora” do turfe em Manaus, o Derby Club procurava trazer
novidades, pois apenas as corridas de cavalo e as apostas, pareciam não ser suficiente para
voltar a atrair o público. Sendo assim, as homenagens seriam recorrentes, páreos de corrida a
pé e o tiro ao alvo seriam incluídos as programações das corridas.
O programa das corridas do Derby Club trazia novidades. A primeira informação
que podia ser observada era o nome do Derby Club que estava no início, em caixa alta e era
praticamente da largura do programa. Abaixo do nome do clube estava uma figura composta
por três homens sobre cavalos. Eles pareciam estar disputando uma corrida, porque cada um
deles estava em uma posição diferente, ou seja, havia um que estava à frente, o outro no meio
e outro atrás, simulando a disputa de um páreo. Além disso, havia uma “nuvem” abaixo dos
cavalos que parecia representar a poeira que era produzida pelos animais em contato com o
chão de terra nas corridas. Isso demonstrava o interesse em tornar o programa mais atraente,
utilizando o uso de uma imagem.
No programa podia ser observado, que se tentava passar a noção que o Prado
Amazonense estava organizado. Tanto que algumas regras foram anexadas ao mesmo. Essas
288
Gazetilha. Jornal do Commercio, Manaus 9 nov. 1908, n.1664, p.1, 2. 289
Divertimentos. Jornal do Commercio, Manaus 2 jan, 1910, n.2069, p.1. 290
Prado Amazonense. Jornal do Commercio, Manaus 5 dez, 1909, n.2042, p.2. 291
O presidente era Dr. Gaspar Antonio Vieira Guimarães, juiz; o vice-presidente, Dr. José Maria Corrêa
d’Araujo, Juiz Federal; o secretário, Cursino Gama, funcionário público; o tesoureiro, Manoel Vicente de Lima,
comerciante; e o orador, Aristides do Valle Guimarães, tesoureiro da repartição. Informações retiradas de: Sport.
Jornal do Commercio, Manaus 14 dez. 1909, n.2051, p.2.; Diario Oficial, 13 fev. 1900, edição 1792, p 5;
Jornal do commercio, 25 maio. 1909, edição 2206, p 7; Jornal do Commercio, Manaus 21 out. 1911,
n.2705,p.2.; Comerciante. Jornal do Commercio, 25 mar. 1905. Edição 391 , p 3; Relatorios dos presidentes
dos Estados Brasileiros. 31 maio. 1902. Edição 2 p, 260.
83
regras diziam respeito ao momento de encilhamento dos cavalos, onde os que disputariam o
primeiro páreo deveriam estar encilhados com uma hora de antecedência ao início da disputa
e os demais no início do primeiro páreo. Além disso, os preços das entradas foram
modificados. Esses continuavam variando de acordo com o lugar, sexo e idade. A
arquibancada e encilhamento e a geral continuavam custando os mesmos preços, 3$000 réis e
1$000 réis, respectivamente. Os carros e automóveis passaram a ter a entrada grátis - nesse
caso, o passageiro pagava de acordo com os preços de uma tabela que não foi identificada.
Crianças e mulheres não pagavam a entrada. Os programas do Derby Club eram anunciados
no jornal e distribuídos pela cidade.
Para competir era necessário realizar a inscrição que era feita no botequim Bolsa
Universal situado na praça do comércio292
. As corridas tinham cerca de 4 páreos e 20 cavalos
que eram organizados em séries (1ª, 2ª, 3ª e 4ª, como nos anos anteriores).
A primeira corrida realizada pelo Derby Club aconteceu no dia 2 de janeiro de
1910 e já apresentava novidades. Para a sua realização houve a distribuição de convites para a
imprensa que agradecia ao Derby Club: “O jornal Correio do Norte agradecia o convite
recebido para a primeira corrida de 1910 e estimava a concorrência de grande número de
espectadores ao Prado Amazonense” 293
. E, contou com a participação de duas bandas de
música294
.
Essa corrida não obteve o público esperado. A imprensa justificativa essa baixa
adesão por dois motivos: os bondes e o programa. Quanto aos bondes era dito que eles
estavam passando de uma em uma hora, o que parece ter desanimado o público. Isso era um
problema que a diretoria tentava resolver. Todavia, foi na 12ª corrida que ele foi solucionado.
Nessa corrida o serviço de bonde foi ampliado, pois funcionaram “os reboques, com dous
carros, o que muito auxiliou á frequência, que foi grande” 295
.
Importante ressaltar, que tanto para o Prado Amazonense, quanto para o
velódromo, o serviço de viação pública, inaugurado no dia 1º de março de 1896 que ligava o
perímetro urbano aos subúrbios foi fundamental, para que esses espaços pudessem galgar
292
Divertimentos. Jornal do Commercio, Manaus 11 abr. 1910, n.2165, p.2 e Notas Sportivas. Correio do
Norte, Manaus 18 dez. 1909, n.331, p.1. 293
Clubs e associações. Correio do Norte, Manaus 31 dez. 1909, n.322, p.1. 294
Divertimentos. Jornal do Commercio, Manaus 2 jan. 1910, n.2069, p.1. 295
Divertimentos. Jornal do Commercio, Manaus 23 maio. 1910, n.2204, p.1.
84
algum sucesso296
. Esse, de fato, é um dos motivos da consolidação de tal prática, assim como
no Rio de Janeiro297
.
Já os programas não foram distribuídos, tendo a diretoria que pedir “mil
desculpas” quanto a esse problema. Como a imprensa estava sendo homenageada e parecia
que a diretoria queria estreitar seus vínculos com esse órgão, “no intervalo do terceiro pareo
foi servido uma taça de champagne aos representantes da imprensa”, com direito ao
pronunciamento do presidente do Derby Club e de um representante da imprensa. Ao final era
desejado que a “directoria possa corresponder a espectativa geral, moralizando este gênero de
sport que é um dos mais preciosos no nosso meio social” 298
. A imprensa parece ter aderido a
uma nova postura diante da divulgação das notícias, evitando tratar de tribofes e confusões.
Nesse sentido, a imprensa “divulgava exatamente uma representação do esporte no mesmo
sentido da dos organizadores das competições” 299
.
Além da imprensa, políticos, a classe caixeiral e os operários também foram
homenageados. Esse foi o caso do deputado federal e sócio do Desportivo Club A. Monteiro
de Souza que estava sendo aguardado do Sul do Brasil e seria homenageado em uma corrida
no Prado Amazonense300
. Nessa corrida houve a participação de coronéis e doutores que
pertenciam a classe de políticos da cidade, dentre eles o governador do estado301
.
Esse tipo de homenagem aos políticos aconteceria novamente em beneficio ao
Congresso do Estado, a Municipalidade, ao segundo aniversário do governo do coronel
governador do Estado e ao senador Jorge de Moraes. Destas, cabe destacar a 14ª corrida em
homenagem ao segundo aniversário de governo do coronel. Para essa corrida houve a
distribuição de “convites especiaes aos membros do Congresso do Estado, municipalidade,
Associação Commercial, imprensa, Gremio Familiar, associações sportivas e recreativas,
autoridades civis e militares e consulados.” Nela haveria policiamento que seria feito pelo
Tiro Brasileiro e tocariam três bandas de músicas.
296
MESQUITA, O. M. La Belle Vitrine: o mito do progresso na refundação de Manaus (1890/1900). 439 f.
Tese (Doutorado em História) – Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2005. 297
MELO, V. A. Esporte: uma diversão no Rio de Janeiro. Revista Brasileira de Estudos do Lazer. Belo
Horizonte, v.2, n.3, p.49-66, 2015. 298
As informações correspondem as seguintes datas, edições e páginas: Notas Sportivas. Correio do Norte,
Manaus 4 jan. 1910, n.2070, p.2 e Divertimentos. Jornal do Commercio, Manaus 4 jan. 1910, n.2070, p.2. 299
VOTRE, S. J.; SALLES, J. G. C.; MELO, V. A. Representação Social do Esporte e da Atividade Física:
ensaios etnográficos. Brasília: Ministério da Educação e do Desporto./INDESP, 1998. p.94. 300
Divertimentos. Jornal do Commercio, Manaus 18 jan. 1910 n.2084, p.1. 301
Os nomes das pessoas que foram vista no prado: Srs. coronel Antonio Bittencourt governador do Estado, Dr.,
Monteiro, coronéis Publio, Lazaro e Agnello Bittencourt, Drs. José Duarte Sobrinho, Adelino Costa, Benjamin
de Araujo Lima, coronéis Guerreiro Antony, José Gonçalves, Cyrillo Neves e muitos outros cujos nomes não
podemos notar.
85
Na sexta corrida o prado mudou de nome. Ele passou a ser chamado de Prado de
São João. Essa corrida, onde aconteceu a troca de nome do prado, foi dedicada a Associação
dos Empregados no Commercio do Amazonas. Essa foi uma das corridas que levou ao prado
um grande número de espectadores. Calculava-se cerca de duas mil pessoas presentes. Devido
a isso, a imprensa considerava “renascente o sport hippico.” Nessa corrida a direção da
Associação dos Empregados no Commercio do Amazonas compareceu em grande número,
juntamente com a classe caixeiral. Essa diretoria “offereceu ao jockey vencedor do 5º pareo,
dedicado a essa estimadíssima corporação, uma valiosa chatelaine de ouro”.
A partir da segunda corrida uma nova atração foi anunciada. Era o tiro ao alvo
entre mulheres. Esta concedia a presença feminina não apenas nas arquibancadas, mas
participando ativamente, sendo o centro das atenções. Nele as senhoras e senhoritas seriam
posicionadas a cinco passos de distância do alvo e portando uma carabina “Winchester”
calibre 22, automática, teriam cinco disparos para acertar o alvo. A que tivesse a maior
pontuação ganharia um prêmio302
. O tiro ao alvo parecia ganhar notoriedade no prado, tanto
que a partir da 9ª corrida ele foi anunciado para ter início às três horas da tarde, para que mais
mulheres pudessem participar303
. Em certa ocasião, em que a disputa teve a sua distância
alterada, de 5 para 12 metros, foi registrada a participação de 11 mulheres e de 3 dirigentes do
torneio304
.
Após a realização do torneio em algumas corridas, o tiro ao alvo passou a ser
realizado entre os homens, onde os prêmios seriam medalhas com dizeres alusivos305
. Essa
premiação era completamente diferente das mulheres que recebiam, por exemplo, uma “rica”
boneca, elegantemente vestida306
. Essa prática, posteriormente, passou a ser realizada no
Prado Amazonense variando entre o clube Tiro n.10, a Infantaria e entre mulheres ligadas a
clubes307
.
Outras atrações também foram adotadas. Na décima terceira corrida uma das
atrações utilizadas no velódromo foi adotada no prado. Era a corrida pedestre entre os jóqueis.
Essa corrida seria realizada em 300 metros, onde o vencedor ganharia duas libras esterlinas308
.
302
Derby Club. Jornal do Commercio, Manaus 16 jan. 1910, n.2082, p.7. 303
Prado Amazonense. Jornal do Commercio, Manaus 20 abr. 1910, n.2174A, p.7. 304
Divertimentos. Jornal do Commercio, Manaus 10 abr. 1910, n.2164, p.2. 305
Divertimentos. Jornal do Commercio, Manaus 17 jul. 1910, n.2258, p.2. 306
Derby Club. Jornal do Commercio, Manaus 16 jan. 1910, n.2082, p.7. 307
Jornal Commercio, Manaus 5 fev. 1911, n.2444B, p.7.; Tiro Brasileiro. Correio do Norte, Manaus 10 fev.
1911. n.613, p 1.; Divertimento. Jornal do Commercio, Manaus 18 jun. 1911, n.2571, p.2. 308
Divertimentos. Jornal do Commercio, Manaus 5 jun.1910, n.2217, p.2.
86
Além disso, sorteio de brinde para as crianças começavam a fazer parte das corridas309
. Ao
sortear o brinde das mulheres era feito o sorteio de um brinquedo para as crianças.
Certa vez, o Derby Club fez um contrato com os senhores A. Reis&Ca. Esse
contrato era para trazer ao prado a luta de um leão contra um touro. “No Prado Amazonense,
ás 4 horas da tarde, terá logar a sensacional lucta de um touro bravo com o leão africano
Nero” 310
. Essa atração inusitada aconteceria na 19ª corrida, onde o programa foi dividido em
duas partes. A primeira era referente a disputa dos quatro páreos e a segunda entre a luta do
leão contra o touro311
. Com duas bandas de música, bilhetes sendo vendidos em diferentes
casas comerciais a 5$000 a corrida foi executada. Todavia, a expectativa se encontrava em ver
a luta entre o leão e o touro. Foi levada para o prado uma “grande” jaula com o leão e o touro.
No momento do confronto o touro foi colocado dentro da jaula do leão para que iniciasse a
luta. Entretanto, nada aconteceu, pois “nenhum dos dois animaes se hostilisaram” 312
.
Ao que tudo indica, mesmo com a criação de um clube para organizar as corridas
no prado, este não conseguiu recuperar a “moralidade” nas corridas e trazer os adeptos ao
prado. Isso pode ser notado na necessidade da criação dos juízes de apostas313
. Essa função foi
criada a partir da 28ª corrida e tinha o objetivo de verificar o movimento da casa poule. Além
do mais, o futebol passara a ganhar notoriedade, o que certamente concorria com a frequência
desse local.
O Derby Club se desfez em 1911. O motivo que foi dado para tal, foi o aumento
do aluguel do Prado Amazonense, considerado “excessivo” por seus membros. Com isso, eles
planejavam criar uma nova associação, chamada Hypodromo Amazonense, onde estava sendo
planejada a construção de um novo prado.
309
Divertimentos. Jornal do Commercio, Manaus 19 set. 1910, n.2321, p. 1, 2. 310
Divertimentos. Jornal do Commercio, Manaus 7 ago. 1910, n.2279, p.2. 311
Notas Sportivas. Correio do Norte, Manaus 7 ago. 1910, n.510, p.1. 312
Divertimentos. Jornal do Commercio, Manaus 8 ago. 1910, n.2280, p.2. 313
Derby Club. Jornal do Commercio, Manaus 23 out. 1910, n.2352, p.7.
87
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O surgimento de práticas ligadas ao esporte em Manaus tem uma intrínseca
ligação com o terceiro boom econômico da cidade, a comercialização da borracha. Nesse
contexto aconteceram transformações que levaram a mudanças de ordem econômica, política,
social e cultural. A cidade passa por um grande surto urbanizador, para atender as novas
demandas, onde há a necessidade de substituição dos hábitos tradicionais pelos tidos como
civilizados. Em meio a esse interim surgem os esportes que eram utilizados como indicadores
de modernidade, fruto desses hábitos ditos como civilizados.
No final do século XIX são criados dois clubes que desenvolviam os esportes na
cidade, o Sport Club Amazonense e o Grupo Cyclista Amazonense. O primeiro tinha como
integrantes a elite local e se destacava pelas festas realizadas em seus salões. O segundo
parecia ser formado por comerciantes portugueses e expunha para a cidade uma novidade, o
ciclismo. Por meio desta, o grupo influencia a forma de se vestir dos homens.
A partir do século XX se tem a inauguração de outros clubes esportivos e o
surgimento de novos gêneros do esporte. Nesse momento há o inicio da estruturação de um
mercado em torno da prática. Além de haver a fundação de dois locais específicos para o
desenvolvimento dos esportes. Eles eram tidos como lugares necessários para as pessoas se
divertirem. Estes locais eram o Velódromo Amazonense e o Prado Amazonense, que
instauraram uma nova relação com os apreciadores dos espetáculos esportivos - para assisti-
los era necessário a compra de ingressos. Isso, certamente, influenciou na criação de várias
estratégias para atrair o público, o que denotava que essas práticas ainda não estavam
totalmente inseridas na sociedade.
A participação feminina no final do século XIX parecia estar restrita às atividades
sociais promovidas por clubes. Já no século XX é possível notar o incentivo da participação
feminina nas práticas esportivas tidas como adequadas, lawn tennis e o remo, por exemplo.
Além disso, no velódromo e no prado sua participação era incentivada por meio dos sorteios
de brinde e na disputa do tiro ao alvo.
É importante destacar o papel fundamental das praças no desenvolvimento do
esporte em Manaus. Esses espaços eram palcos das práticas esportivas, os quais eram
transformados em prol dos esportes, como nos casos do Velódromo Nacional e do Velódromo
Amazonense que teve suas praças readaptadas para que fosse possível a prática esportiva.
Esses locais eram utilizados também pelos clubes.
88
Os serviços de viação pública, ou melhor, os bondes também foram importantes
nesse contexto, pois auxiliavam no deslocamento das pessoas para os lugares, onde
aconteciam os espetáculos esportivos e a sua prática. Por meio de seu uso era possível se
deslocar do perímetro urbano aos subúrbios, onde se localizavam alguns desses locais, tais
como o velódromo.
A imprensa era um instrumento utilizado para propagar ideias ligadas ao
desenvolvimento esportivo em Manaus, pois incentivava a prática, divulgava e reprimia
comportamentos tidos como inadequados. A fundação de jornais, como por exemplo, o
Correio Sportivo que tratava especificamente dos esportes, denotava a ideia de ter uma ampla
divulgação sobre diferentes práticas, porém muito circunscrito do ponto de vista positivo,
distinto do que os outros jornais faziam, contando as fofocas, denunciando armações e
tribofes.
Ao final da primeira década do século XX há uma nova mudança na conformação
do cenário esportivo de Manaus, se no início da organização esportiva se destacava o ciclismo
e o turfe, a partir de 1909, essas modalidades passam a dividir espaço com o futebol, que tem
uma ascensão com a criação de vários clubes. Isso fez com que houvesse uma intensificação
da prática na cidade, onde as praças se tornam palco das disputas. O Quadro 1 exemplifica
essa ideia.
QUADRO 1 - Clubes fundados em Manaus século XIX e XX
Nº Nome do clube esportivo Ano de inauguração ou do primeiro
registro
1. Sport Club Amazonense 1897
2. Grupo Cyclista Amazonense 1898
3. Manáos Sport 1904
4. Lawn Tennis Club 1904
5. Cricket Club 1904
6. Club Desportivo Amazonense 1906
7. Sport Club de Manáos 1907
8. Sport-Club Foot-Ball Manáos 1907
9. Club Inglez Sport Foot Ball 1907
10. Bloco Mettre 1907
11. Tennis Club 1908
12. Derby Club 1909
89
13. Club de Regatas Amazonense 1909
14. Amerika Sport Club 1909
15. Resbem Foot Ball Club 1909
16. Brasil Foot Ball Club 1909
17. Manáos Foot-Ball Club 1909
18. Ideal Foot Ball Club 1909
19. Guarany Club 1909
20. União Foot Ball Club 1909
21. Manáos Atletic Club 1909
22. Independencia Foot Ball Club 1909
23. Brasil Club 1909
24. Republica Foot Ball 1909
25. Racing Club Amazonense 1909
26. Velo Club Amazonense 1909
27. Club Estrella 1909
28. Club Uruguay 1909
29. Fluminense Foot Ball Club 1910
30. Sport Club Victoria 1910
31. Club S. Salvador 1910
32. Club Itapagipe 1910
33. Juvenil Foot-Ball Club 1910
Fonte: elaboração própria
Certamente essas questões não foram esgotadas nesse estudo, muito pelo
contrário, vários problemas de pesquisa podem surgir para averiguações futuras. Como a
investigação de figuras importantes para o desenvolvimento do esporte, tais como Deodoro
Alcântara Freire e José Maranhão de Albuquerque, tentando entender a relação desses sujeitos
com o desenvolvimento dos esportes. Ou ainda, sobre a rede de comunicação, formada pelos
correspondentes dos jornais, que é criada para se manter as informações sobre os esportes nos
jornais, as quais parecem ser fundamentais para a circulação de ideias referentes ao assunto
esportivo e sua consolidação.
90
FONTES
1. Periódicos
A Federação (1895 a 1900)
Commercio do Amazonas (1870 a 1912)
Jornal do Commercio (1904 a 1979)
Correio do Norte (1906 a 1912)
Diario Official (1893-1900)
Quo Vadis? (1902 a 1904)
Correio Sportivo (1910, 1911 e 1916)
Diário de Manaos (1890 a 1894)
2. Outras fontes
Almanach administrativo, histórico, estatístico e mercantil da província do Amazonas para o
anno de 1884.
Relatórios dos presidentes dos estados brasileiros (AM) – 1891 a 1930.
91
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