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1 Elisa Munhoz Cazorla; Eliane Sebeika Rapchan Linguagem: um olhar antropológico sobre teorias universalistas Durante uma aula particular, Lucy, de seis anos, mostra-se uma aluna muito atenta e esperta. Mas, ao perceber que Jane, sua mãe adotiva, apesar do grande esforço em fazer isso com a máxima discrição, está para sair para o trabalho, Lucy imediatamente interrompe a aula e começa a fazer uma cena de profunda tristeza, deitando-se no chão em posição fetal e balançando-se para frente e para trás como uma criança autista, o que enche sua mãe de profunda tristeza e culpa por deixar seu bebê. (Fouts, 1998, p. 161). Isso não causaria muito espanto, pois, podemos reconhecer o comportamento típico de uma criança de seis anos tentando manipular seus pais, até descobrirmos que Lucy se trata de uma chimpanzé que foi criada por humanos que se relacionavam com ela e se comportavam como se fossem seus pais. Esta prática é um tanto quanto comum e se chama ―maternidade cruzada postiça‖, situação na qual um chimpanzé passa a fazer parte de uma família como um membro dela, um filho ou uma filha, e seus pais humanos a tratam como se fosse seu próprio filho ou filha, vestindo, alimentando à mesa com pratos, copos e talheres, pondo para dormir em camas em quartos com brinquedos, castigando ou premiando se agirem de acordo com o que aprenderam ser um comportamento inadequado ou adequado respectivamente (Fouts, 1998). Quando esses animais são submetidos à essas práticas, são considerados 'aculturados' (Fouts, 1998), o que pressupõe que chimpanzés podem adquirir cultura a partir do contato com humanos. Indo além, há primatólogos que classificam como cultural o comportamento não herdado geneticamente e socialmente aprendido por chimpanzés selvagens (Rapchan, 2005). A dupla interface de aquisição de referenciais culturais por não- humanos sugere um dos pontos críticos do processo de redefinição do humano e do não humano. Podemos concluir que tratar animais como se fossem seres humanos é muito comum e frequentemente acontece com gatos, cachorros e com a maior parte de bichinhos de estimação. Sabemos também que esses bichinhos conseguem inclusive manipular seus donos assim como Lucy. Logo, a grande fascinação nos comportamentos dos grandes primatas não-humanos está na capacidade de inteligência e aprendizado que esses grandes animais não-humanos possuem e que outros animais parecem não demonstrar. Os estudos comparativos entre comportamentos de seres humanos e grandes primatas não-humanos buscam analisar, entre outras coisas, a maneira como ambos lidam com problemas utilizando-se de inteligência para se comunicar (De Waal, 2007 p. 56).

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Elisa Munhoz Cazorla; Eliane Sebeika Rapchan

Linguagem: um olhar antropológico sobre teorias universalistas

Durante uma aula particular, Lucy, de seis anos, mostra-se uma aluna muito atenta e esperta.

Mas, ao perceber que Jane, sua mãe adotiva, apesar do grande esforço em fazer isso com a máxima

discrição, está para sair para o trabalho, Lucy imediatamente interrompe a aula e começa a fazer

uma cena de profunda tristeza, deitando-se no chão em posição fetal e balançando-se para frente e

para trás como uma criança autista, o que enche sua mãe de profunda tristeza e culpa por deixar seu

bebê. (Fouts, 1998, p. 161).

Isso não causaria muito espanto, pois, podemos reconhecer o comportamento típico de uma

criança de seis anos tentando manipular seus pais, até descobrirmos que Lucy se trata de uma

chimpanzé que foi criada por humanos que se relacionavam com ela e se comportavam como se

fossem seus pais.

Esta prática é um tanto quanto comum e se chama ―maternidade cruzada postiça‖, situação

na qual um chimpanzé passa a fazer parte de uma família como um membro dela, um filho ou uma

filha, e seus pais humanos a tratam como se fosse seu próprio filho ou filha, vestindo, alimentando à

mesa com pratos, copos e talheres, pondo para dormir em camas em quartos com brinquedos,

castigando ou premiando se agirem de acordo com o que aprenderam ser um comportamento

inadequado ou adequado respectivamente (Fouts, 1998). Quando esses animais são submetidos à

essas práticas, são considerados 'aculturados' (Fouts, 1998), o que pressupõe que chimpanzés podem

adquirir cultura a partir do contato com humanos. Indo além, há primatólogos que classificam como

cultural o comportamento não herdado geneticamente e socialmente aprendido por chimpanzés

selvagens (Rapchan, 2005). A dupla interface de aquisição de referenciais culturais por não-

humanos sugere um dos pontos críticos do processo de redefinição do humano e do não humano.

Podemos concluir que tratar animais como se fossem seres humanos é muito comum e

frequentemente acontece com gatos, cachorros e com a maior parte de bichinhos de estimação.

Sabemos também que esses bichinhos conseguem inclusive manipular seus donos assim como

Lucy. Logo, a grande fascinação nos comportamentos dos grandes primatas não-humanos está na

capacidade de inteligência e aprendizado que esses grandes animais não-humanos possuem e que

outros animais parecem não demonstrar. Os estudos comparativos entre comportamentos de seres

humanos e grandes primatas não-humanos buscam analisar, entre outras coisas, a maneira como

ambos lidam com problemas utilizando-se de inteligência para se comunicar (De Waal, 2007 p. 56).

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Caixinha Humanos e Caixinha Não Humanos

A discussão sobre o que nos faria universalmente iguais e o que nos diferenciaria uns dos

outros, fortaleceu-se na Antropologia com importante ênfase na dicotomia Natureza versus Cultura

que, a partir das ideias de Darwin, começa a ocupar seu espaço no meio científico ocidental e passa

a se tornar uma disciplina respeitada (Nuenberg e Zanella, 2003). As discussões de Darwin em A

Origem das Espécies publicado em 1859 fizeram com que as discussões sobre natureza e cultura

suscitassem a ideia de que a cultura seria a via de adaptação dos seres humanos em busca de

garantir a sobrevivência e manutenção dessa espécie (Nuenberg e Zanella, 2003).

As primeiras discussões sobre cultura surgem nos trabalhos de Lewis Henry Morgan (1818-

1881), Edward Brunett Tylor (1832-1917) e James George Frazer (1854-1941), clássicos da

Antropologia que, sob uma perspectiva da história da antropologia, coincidem com os acalorados

debates acerca das ideias darwinianas. Entre o final do século XIX e início do século XX, a ideia de

evolução se manifestou na antropologia e provocou o repasse das explicações oferecidas à natureza

aos fenômenos sociais e constituiu, talvez, o único paradigma integralmente descartado pela

antropologia contemporânea (Rapchan, 2010).

O antropólogo contemporâneo Jorge W. Stocking Jr., professor emérito da Universidade de

Chicago nos EUA, atraído pelo darwinismo social e pelo evolucionismo cultural, assim como foram

os autores clássicos da antropologia, em sua obra Race, Culture and Evolution (1982) analisa o

impacto das ideias de Darwin e de outras concepções de evolução sobre os antropólogos que

produziram ideias entre o final do século XIX e o início do século XX a fim de explicar as

diferenças existentes entre povos, etnias e culturas estabelecendo relações diretas entre os

fenômenos relacionados à cultura ou à sociedade e as concepções de evolução que pressupunham

uma história universal válida para toda a humanidade (Stocking, 1982 in: Rapchan, 2010).

Morgan, em seu trabalho chamado Ancient Society, propõe, apoiando-se nas ideias de

Darwin, uma perspectiva evolucionista do desenvolvimento humano, ou seja, a evolução da raça

humana. Através de períodos históricos unilineares, a raça humana se desenvolveria desde a

barbárie, para a selvageria até atingir a civilização (Matias, 2008).

Edward B. Tylor é o primeiro a propor um conceito de cultura introduzindo a sintetização

das ideias de Kultur, que significaria todos os aspectos espirituais de um grupo humano, e de

Civilization que se referia aos aspetos materiais de uma sociedade. Em seu livro Primitive Culture

publicado em 1871, ele propõe o vocabulário Culture que

"tomado em seu amplo sentido etnográfico é este todo complexo que inclui conhecimentos,

crenças, arte, moral, leis, costumes ou qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo

homem como membro de uma sociedade" (Tylor 1871 In: Laraia 2001).

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Tylor (1871) e mais tarde Kroeber (1876), definiram que ―todo o comportamento aprendido,

tudo aquilo que independe de uma transmissão genética‖ é cultura (in: Laraia, 2001). Tylor propõe

a ideia de que a cultura é um fenômeno natural dos seres humanos e um objeto de estudo

sistemático que pode ser classificado objetivamente revelando estágios evolutivos, explicando o

passado, compreendendo o presente e prevendo o futuro da humanidade. Sua preocupação estava

em demonstrar a igualdade entre os seres humanos a partir da proposição de uma humanidade

universal apesar de hierarquicamente desigual. A diversidade cultural encontrada entre grupos

humanos seria explicada a partir dos estágios evolutivos (in: Laraia, 2001).

Mais de um século depois de Tylor e Kroeber, quando primatólogos, na década de 1970,

começaram a estudar o comportamento de primatas selvagens não-humanos, encontraram nas

explicações de Tylor (1871) o conceito que explicaria o que eles mesmos não podiam explicar. A

partir de então, algo aceito como universal e unicamente humano, a cultura, passou a figurar nas

definições de comportamentos de seres não-humanos.

As concepções contemporâneas de cultura são resultado das discussões dos pensadores

considerados clássicos na disciplina Antropologia sobre a mente humana. Autores como James G.

Frazer (1854-1941), Lucien Lévy-Bruhl (1857-1939), Franz Boas (1858-1942), Bronislaw

Malinowski (1884-1942), Margaret Mead (1901-1978), Claude Lévi-Strauss (1908-2009) e Clifford

Geertz (1926-2006) são os clássicos fundamentais que introduziram o debate sobre mente ao

pensamento antropológico. A seguir, apresentaremos brevemente a contribuição de cada um desses

pensadores para esse debate (Kuper, 1994).

Influenciado pelas ideias de Tylor, Frazer em seu trabalho The Golden Bough publicado em

1890, propõe uma comparação entre os estágios evolutivos dos seres humanos desde o que o autor

chama de primitivos até os mais evoluídos com a finalidade de entender seu desenvolvimento ao

encontrar aspectos permanentes em ambos os estágios, ou seja, em toda a evolução mental dos seres

humanos, uma crença em mágica, que seria o primeiro estágio, precederia a religião, ou segundo

estágio, que, por sua vez, se desenvolveria na chamada ciência ocidental, que seria o terceiro

estágio (Matias, 2008).

Lévy-Bruhl ficou na escuridão da antropologia por meio século ao afirmar que existiam

mentes lógicas e mentes pré-logicas em seu livro A Mentalidade Primitiva publicado em 1925

(Laraia, 2001), tendo sido resgatado do esquecimento por um antropólogo brasileiro, Márcio

Goldman, que publicou em 1994 seu livro chamado Razão e diferença - afetividade, racionalidade

e relativismo no pensamento de Lévy-Bruhl, resultado de sua tese de doutorado apresentada no

Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da UFRJ em 1991 (Giumbelli, 1995, p.177).

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Boas vem, com suas ideias, contribuir profundamente o fortalecimento da Antropologia

enquanto uma ciência. Em seu livro A Mente do Ser Humano Primitivo, primeiramente publicado

em 1938, Boas separa raça e cultura como duas coisas que podem existir separadamente, ou seja, o

tipo físico não determina o caráter, a visão de mundo ou a cultura. As discussões sobre raça e

cultura revolucionaram a maneira de pensar o outro quando ele afirmou que "não existe uma

diferença fundamental nos modos de pensar do ser humano primitivo e do civilizado. Uma estreita

relação entre raça e personalidade nunca foi estabelecida" (Boas, 2010 [1938], p. 7).

O próximo grande marco na Antropologia foi a proposta apresentada por Bronislaw

Malinowski em seu livro Os Argonautas do Pacífico Ocidental publicado em 1922. Neste trabalho,

Malinowski apresenta um método para a coleta de dados etnográficos e para o trabalho de campo

onde o pesquisador é participante e descreve a vida dos nativos de maneira a fazer com que o leitor

'veja', 'sinta', 'toque' com os olhos e as mãos do pesquisador, o etnógrafo protagonista. Seu novo

método foi responsável por grandes e importantes monografias consideradas clássicos das

Antropologia (Giumbelli, 2002). Sua pesquisa entre os Trobriandeses levantou a discussão sobre a

cultura enquanto conjunto de funções sociais que tem a finalidade de suprir as necessidades físicas,

sociais e simbólicas dos grupos humanos. O funcionalismo de Malinowski não tem a preocupação

em explicar o presente pelo passado, mas sim, explicar o passado pelo presente. Dessa forma ele

rompe com o evolucionismo e com o determinismo biológico (in: Giumbelli, 2002).

Margaret Mead (1901-1978) em seu trabalho intitulado Macho e Fêmea, publicado em

1971, contribui para a discussão e fortalece o conceito de cultura em Antropologia quando reflete

sobre a ideia de endoculturação, ou seja, o comportamento dos indivíduos depende de educação, de

aprendizagem. Um menino ou uma menina irá comportar-se a partir do processo de educação ao

qual foram submetidos, a partir do que aprenderam e não pelo determinismo biológico (in: Laraia,

2001).

Lévi-Strauss é um dos antropólogos mais influentes na Antropologia. Ele é personagem

central na elaboração da abordagem que ficou conhecida depois dele como Estruturalista (Descola,

2009). Em sua obra aclamada por importantes pesquisadores e antropólogos, O cru e o Cozido,

Lévi-Strauss oferece uma explicação sugestiva a partir da análise de mitos indígenas como sistemas

de transformações, para explicar como se estrutura a mente e o pensamento. Para ele o cru seria a

metáfora para a natureza (os animais se alimentam da carne crua) e a carne cozida, que é consumida

pelo ser humano que conseguiu controlar o fogo, seria a metáfora para a cultura, ou a transformação

da natureza (Lévi-Strauss, 2004). Por ter como princípio básico de seu método o mito, que não

existe isoladamente e está relacionado com outros mitos, Lévi-Strauss se aproxima da linguística

por considerar os sistemas mitológicos como sistemas em transformação e uma ferramenta

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fundamental nos estudos de etnologia uma vez que a interpretação de um mito somente se torna

possível quando analisado conjuntamente com outros grupos de mitos que lhes são próximos (in:

Laraia, 2006, p. 167).

Suas discussões sobre natureza e cultura dão uma forte base para essa ciência. Para ele, o

incesto (enquanto expressão natural do desejo) e o tabu do incesto (a regra cultural que o define e

regula) expressariam não só a universalidade humana, mas, também, a complexa relação entre

natureza e cultura. Todos os grupos humanos têm regras que proíbem o relacionamento sexual do

homem com alguma categoria de mulheres (in: Laraia, 2001). Lévi-Strauss não distingue natureza e

cultura em relação aos seres humanos. Segundo ele, somos ambas simultaneamente.

Além disso, Lévi-Strauss defende que a universalidade do ser humano, sua natureza, está na

cultura, na capacidade de produzir símbolos e o cérebro humano seria o órgão capaz de construir

sistemas simbólicos. Seu interesse está em desvendar os princípios mentais que constroem estes

conjuntos simbólicos que se manifestam através das estruturas da sociedade que, por sua vez, são

também expressões dessas estruturas, ou seja, os mitos, a arte, o parentesco e a linguagem. Segundo

Lévi-Strauss, a mente de cada um dos seres humanos possui uma unidade psíquica - o mito. O "(...)

pensamento humano está submetido a regras inconscientes, ou seja, um conjunto de princípios —

tais como a lógica de contrastes binários, de relações e transformações — que controlam as

manifestações empíricas de um dado grupo" (Lévi-Strauss, 1976 in: Laraia, 2001, p. 61).

Terminaremos nosso apanhado histórico dos principais autores que discutiram a questão

natureza e cultura na Antropologia com Clifford Geertz (1926-2006). Seu interesse está em definir

o que é cultura e, assim, definir o que é o ser humano (in: Laraia, 2001). Para ele, todos os seres

humanos são capazes geneticamente de aprender e produzir cultura a qual, por sua vez, seria como

um programa que regulamenta o comportamento humano.

Para o autor, o ser humano é capaz de se adaptar em qualquer cultura, ou seja, "todos

nascemos com um equipamento para viver mil vidas, mas terminamos no fim tendo vivido uma só!"

(Geertz, 1966, in: Laraia, 2001, p. 62). Em outras palavras, quando nascemos temos a plena

capacidade mental para sermos socializados e aprender qualquer cultura existente. Esta aptidão

diminui conforme envelhecemos e nos socializamos em uma cultura determinada dentre as tantas

existentes (in: Laraia, 2001).

Hoje, as ciências sociais tecem suas discussões sobre a ideia de que não existe dualidade

estanque entre natureza humana e a cultura. Por outro lado, as ciências naturais não abrem mão da

separação entre natureza e cultura. Apesar de alguns pesquisadores considerarem a impossibilidade

de encontrar tal linha divisória, eles aceitam que ela existe. De acordo com De Waal em seu livro

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Eu, Primata, seria impossível extrair o que é inato ou não uma vez que não existam seres humanos

que não tenham sofrido a influência da cultura em qualquer nível (De Waal, 2007).

Nas ciências sociais parece haver um consenso sobre o conceito antropológico de cultura ser

um aspecto universal e exclusivamente humano, o que também é um paradoxo considerando que

cada cultura é única e singular. Entretanto, entre cientistas de outras áreas, principalmente as

naturais, este assunto ainda não está encerrado e as discussões sobre o estabelecimento de fronteiras

entre natureza e cultura continuam abertas.

Muitas das pesquisas que têm como objetivo compreender ou encontrar a chamada

'singularidade humana' parecem concordar que o cérebro poderia ser um lugar onde se poderia

começar a investigação. Talvez o próprio cérebro, órgão palpável - a massa encefálica, capaz de

produzir materiais subjetivos não palpáveis - os pensamentos, pudesse ser um dos responsáveis -

considerando que há algum responsável nesse sentido - por essa suposta 'duplicidade' da espécie

humana, ou seja, seres que estão, ao mesmo tempo, sujeitos aos seus instintos naturais - ser animal,

e são capazes de raciocinar, ter intenções e produzir símbolos - ser cultural. Seria essa a maneira

mais satisfatória de pensar o cérebro: o órgão responsável por causar determinados efeitos?

Deveríamos separar o cérebro (corpo físico) e a mente (entidade produtora de pensamentos) ou

poderíamos pensar que o cérebro seria o próprio pensamento e o pensamento seria em si o próprio

cérebro?

O pensamento científico ocidental postulou que, devido à separação entre os aspectos

genéticos e os aspectos sociais, as características que definem e diferenciam uma espécie de outras

espécies deveriam ser naturais, ou seja, inatas. Por exemplo, a capacidade para andar, falar e criar

seriam uma constante ou atributos fixos entre os seres humanos independentemente do ambiente

que os cercam. Partindo dessa ideia, ou seja, de que certas características universais de uma

determinada espécie são inatas, encontrar o momento em que elas teriam surgido seria o mesmo que

encontrar a origem dessa espécie.

Na busca por um tipo de linha divisória ou por um suposto momento de origem que

indicaria a separação entre animais não-humanos e seres humanos, o antropólogo Tim Ingold nos

desafia a pensar sobre como seria o ser que teria vivido próximo à esse momento de transição. Teria

sido um ser que não seria nem uma espécie e nem a outra. Seria, talvez, um ser parte animal e parte

humano. Para Ingold, para entendermos como ou por que os seres humanos são como são, não é

preciso imaginar um ponto onde teria se originado a evolução biológica ou a evolução cultural, mas

sim, observar como se dá a história da vida do ser humano. Essa história é uma continuação dentro

do campo das relações humanas de um processo que está acontecendo através do mundo orgânico

(Ingold, 2004, p. 218).

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Embora a ciência biológica procure explicar a natureza das diferenças entre a evolução e a

história dos seres vivos como coisas autônomas e separadas, ambas acontecem simultaneamente.

Segundo Ingold, não há divisão estanque entre a história das relações dos seres humanos e sua

evolução biológica. A combinação de aspectos culturais com propriedades biológicas não seria um

problema, pois, o ser humano é ao mesmo tempo um ser biológico e um ser cultural. Entretanto,

reduzir o que é biológico ao que é genético é, de acordo com o Ingold, um os problemas no discurso

das ciências naturais (Ingold, 2004). Para resolver este problema temos que expandir o nosso

entendimento sobre a relação entre as dimensões sociais e biológicas da existência humana. A

interação pela qual o desenvolvimento de um organismo se processa, não é entre gene e ambiente,

mas sim entre organismo e ambiente, e o organismo não é uma constante, mas a ininterrupta

mudança de personificação de toda uma história de interações prévias que moldaram seu curso até

esse ponto.

A história do ser humano não é um movimento onde se fabrica a sociedade, mas sim, um

movimento no qual os seres humanos se fazem crescer uns aos outros (Ingold, 2002); um processo

no qual os organismos ou pessoas obtêm suas formas particulares e capacidades e nas quais, através

de suas atividades situadas ambientalmente são condicionadas pelo desenvolvimento de outros

organismos ou pessoas com as quais se relacionam (Ingold, 2004). A história é como um processo

no qual os seres humanos não são tanto transformadores do mundo, mas, principalmente, atores

desempenhando um papel na transformação do mundo por ele mesmo. A história é, em síntese, um

movimento de autopoiese, ou seja, a capacidade dos seres vivos de produzirem a si próprios

(Ingold, 2002). Desta forma, dissolvemos o suposto ponto de origem do ser humano e a dicotomia

entre sociedade e natureza, entre evolução e história, e reconhecemos que os processos pelos quais

as gerações humanas moldam as condições de vida de seus sucessores estão em continuidade com

aqueles que ocorrem em todo o mundo orgânico (Ingold, 2002).

A partir do pensamento oferecido por Ingold, podemos afirmar que a linguagem, assim

como, por exemplo, a bipedia ou o uso de ferramentas não são atributos fixos da espécie humana,

mas sim mudanças que emergiram, e continuam a emergir neste momento, em nossa espécie através

das atividades das pessoas. Somente ao seguirmos um caminho que vá além da teoria da evolução

através da variação sob a seleção natural e ao considerarmos as propriedades de uma auto-

organização dinâmica de um sistema desenvolvimentista, poderemos descobrir as possíveis

consequências das mudanças que podem ser explicadas através de seleção natural para o próprio

processo evolutivo (Ingold, 2004).

O pensamento relacional de Ingold sugere que tratemos o organismo como um lócus

particular de crescimento e desenvolvimento dentro de um campo contínuo de relacionamentos e

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não como uma entidade discreta e pré-especificada. Não estamos descartando a evolução biológica,

entretanto, nossa concepção de evolução é topológica, ou seja, diversos modos de dispor e interligar

as partes que compõem um sistema, e não estatística, que prevê uma escala gradual de

transformações (Ingold, 2004).

A proposta de Ingold é algo diferente tanto do que as biociências têm oferecido quanto do

que a maior parte dos antropólogos tem apresentado até o presente. Não é uma tentativa de reciclar

as cansadas pré-concepções, mas uma nova maneira de pensar sobre os seres humanos e seus

lugares no mundo, centrada em seus processos de desenvolvimento e nas propriedades dinâmicas

dos campos relacionais. Esta nova maneira de pensar não apenas promete uma reintegração da

antropologia social e biológica, mas também estabelece uma pauta evolutiva radical para o século

XXI. Ingold e suas ideias inaugurarão a chegada da era da antropologia enquanto uma ciência do

compromisso com um mundo relacional (Ingold, 2004).

É a partir desse ponto de vista que pretendemos avaliar uma amostra das pesquisas (73

artigos) atuais que enfocam os fenômenos relativos à "comunicação", "linguagem" e "cultura"

publicadas pelas biociências e por cientistas naturais nas revistas internacionais mais proeminentes

em relação a esse campo de conhecimento entre 1990 e 2012 analisando respostas e

comportamentos de chimpanzés em laboratório.

De acordo com Ingold (1994), em seu texto Humanidade e Animalidade, a cada geração a

sociedade ocidental constrói os conceitos que definem o que é ser humano e essas mesmas

definições de humanidade mudam de acordo com as mudanças históricas e culturais. Por exemplo, a

humanidade já foi definida como o conjunto de seres que possuem exclusivamente a habilidade para

a linguagem, a razão, a inteligência e a consciência moral, entretanto, recentemente, primatólogos

têm questionado esse tipo de exclusividade e se tais capacidades seriam inatas ou adquiridas ao

observarem que, além das similaridades genéticas, o comportamento dos chimpanzés também é da

mesma forma, muito similar ao nosso. Ou seja, se nasce humano ou se aprende a ser humano?

(Rapchan, 2012). Se entender o comportamento humano é importante para os cientistas sociais,

entender por que o comportamento dos chimpanzés se assemelha ao do ser humano poderia

contribuir para as discussões sobre natureza versus cultura e evitar possíveis distorções que advém

da atribuição de características animais a seres humanos e vice-versa.

Não encontramos grandes discussões no meio acadêmico científico que venham questionar a

validade das ideias darwinianas que nos colocam como participantes de uma espécie que

compartilha um antepassado comum com os grandes primatas não-humanos ou sobre a origem

humana. Entretanto, quando se trata da cultura e da vida social, é difícil encontrarmos algum

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cientista social que queira realmente saber como se deram os processos evolutivos e/ou adaptativos

que permitiram ao ser humano a se tornar o que é (Kuper, 1994; Rapchan, 2009).

Assim como Ingold, Bruno Latour também é um antropólogo bastante atuante e influente,

especialmente, na discussão sobre 'natureza' versus 'cultura'. A crítica à dualidade presente em

Ingold e Latour é o fundamento da proposição de uma certa epistemologia que informa uma

concepção de conhecimento e, portanto, articula teoria e método. Sendo assim, é possível, deste

ponto de vista, aproximar os dois autores.

Ingold e Latour parecem apontar, por meio de suas análises, para um objetivo intelectual

convergente. Ambos criticam a maneira de pensar e de fazer ciência dos ―modernos‖ e ocidentais.

Entretanto, os caminhos que cada um escolhe traçar são diferentes, mas, ao mesmo tempo,

complementares. Enquanto Latour (2009 [1994]) propõe um programa de ação acadêmica com o

intuito de instrumentalizar pesquisadores a fim de que possam desmontar a maneira "moderna" de

pensar através de suas pesquisas, Ingold (1988; 1993; 2000; 2007), por sua vez, constrói um debate

marcadamente retórico e crítico que leva o pesquisador a pensar e questionar os paradigmas do

pensamento científico ocidental.

Embora abordagens não lineares e não dicotômicas, como as de Ingold e Latour, proponham

mudanças teóricas e metodológicas, os resultados e as discussões recentes sobre a condição humana

nas biociências indicam que os biocientistas adotam a perspectiva de uma linha divisória rígida

entre natureza e cultura e buscam encontrar uma habilidade ou um certo momento crítico que

indiquem a passagem de uma para a outra, ao invés de pensar em termos de processos e

mecanismos complexos multicausais. Segundo Latour, a construção de dicotomias ou de linhas

divisórias rígidas é uma estratégia daqueles que ele chama de "modernos" (Latour, 2009 [1994]).

Para Latour, apesar de vivermos em uma época descrita e denominada como moderna,

jamais fomos realmente modernos (Latour, 2009 [1994]). Jamais o fomos, pois, na concepção do

autor, jamais existiram de fato as práticas ou métodos científicos que definiriam as características

desse momento chamado de modernidade, distinguindo-o radicalmente de outros momentos

históricos anteriores em relação à produção de conhecimento. "Percebemos então que jamais fomos

modernos no sentido da Constituição. A modernidade jamais começou. Jamais houve mundo

moderno" (Latour, 2009 [1994], p. 51).

Segundo Latour, a modernidade está assentada em quatro princípios. O conjunto desses

princípios seria o que ele chama de Constituição. As garantias da Constituição da modernidade são:

"(1) ainda que sejamos nós que construímos a natureza, ela funciona como se nós não a

construíssemos; (2) ainda que não sejamos nós que construímos a sociedade, ela funciona como se

nós a construíssemos; (3) a natureza e a sociedade devem permanecer absolutamente distintas; o

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trabalho de purificação deve permanecer absolutamente distinto do trabalho de mediação; (4) o

afastamento de Deus da dupla construção social e natural". Em outras palavras, eliminar a origem

divina da natureza e da sociedade (Latour, 2009 [1994], p. 37-38).

Assegurados dessas garantias, Latour afirma que os cientistas ―modernos‖ acreditavam que

poderiam, finalmente, alcançar o conhecimento considerado verdadeiro através de categorias, do

método baseado na razão e da separação daqueles objetos misturados erroneamente pelos antigos,

chamados de pré-modernos, sem correr o risco de confundi-lo com os possíveis erros cometidos por

homens falhos ou mesmo com os seus pontos de vista (Latour, 2009 [1994]). Os ―modernos‖

acreditaram que era possível separar os mecanismos naturais e as paixões dos interesses ou da

ignorância dos seres humanos: "O obscurantismo das idades passadas, que misturavam

indevidamente necessidades sociais e realidade natural, foi substituído por uma aurora luminosa que

separava claramente os encadeamentos naturais e a fantasia dos homens" (Latour, 2009 [1994], p.

40).

Esta separação seria causa de grande vibração para os "modernos". Latour afirma que

aqueles que nunca sentiram vibrar dentro de si uma dupla potência ou que nunca foram obstinados

pela distinção entre o racional e o irracional, entre falsos saberes e verdadeiras ciências, jamais

foram modernos (Latour, 2009 [1994], p. 41). Na mesma linha de pensamento, Boaventura Souza

Santos afirma que o método científico se assenta na redução da complexidade, pois, segundo esse

pensamento científico, o mundo seria complicado e a mente humana só poderia compreendê-lo

completamente se, primeiramente, dividisse e classificasse seus objetos de estudo para depois poder

determinar relações sistemáticas entre o que se separou (Santos, 2008, p. 28).

As concepções de Latour (2009 [1994]) e ideias de Ingold foram aplicadas para analisar as

publicações que expressam perspectivas, concepções e modos de fazer pesquisa dos primatólogos.

O objetivo deste texto não é responder à questão histórica da antropologia sobre quais são os (e eu

diria, se há quaisquer) limites entre natureza e cultura. Entretanto, esta pergunta enfatiza o ponto

central desse artigo: a purificação dos objetos de pesquisa nas ciências ditas modernas. O debate

que este texto levanta é se a concepção de modernidade tal como analisada por Latour (2009

[1994]) se faz presente em pesquisas recentes. Buscamos saber, principalmente, se é possível

identificar as práticas que Latour chama de "modernas" nas pesquisas contemporâneas e se os

pesquisadores envolvidos com o estudo do comportamento de chimpanzés em laboratório poderiam

ser chamados de "modernos", de acordo com os princípios do que é o ser moderno para Latour

(Latour, 2009 [1994]).

Este é todo o paradoxo moderno: se levamos em consideração os híbridos, estamos apenas

diante de mistos de natureza e cultura; se consideramos o trabalho de purificação, estamos

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diante de uma separação total entre natureza e cultura. É a relação entre os dois processos

que eu gostaria de compreender (Latour, 2009 [1994] p. 35).

Traçamos uma reflexão através da Antropologia da Ciência (Latour, 2000) e da

Antropologia de Ingold (Ingold, 1994, 2011) sobre as pesquisas em comunicação e linguagem,

tomando como referência os chimpanzés em laboratório e buscamos saber se se elas "purificam"

seus objetos e seus resultados com a finalidade de produzir um conhecimento que contribua com as

ciências sociais, e com a antropologia em particular, em relação à compreensão da revolução, em

curso, sobre a definição do que é humano. Ou, então, se há iniciativa de pesquisa sobre o assunto

que estão produzindo "híbridos".

Seres Humanos Não Possuem Linguagem

Na contramão do pensamento "moderno" e em acordo com o pensamento de Ingold, a

linguagem, assim como a bipedia ou o uso de ferramentas, não é um atributo fixo da espécie

humana. Somente ao seguirmos um caminho que vá além da teoria da evolução através da variação

sob a seleção natural e ao considerarmos as propriedades de uma auto-organização dinâmica de um

sistema desenvolvimentista, poderemos descobrir as possíveis consequências das mudanças que

podem ser explicadas através de seleção natural para o próprio processo evolutivo (Ingold, 2004).

Embora a linguagem seja facilmente observada entre os seres humanos, é possível, após

considerarmos as propostas de Ingold sobre como pensar o mundo, a vida e nós mesmos,

afirmarmos que não possuímos linguagem. Os seres humanos não possuem, mas sim, são

linguagem. A ideia de que a capacidade para a linguagem surgiu ou originou-se em algum momento

durante a evolução do ser humano é insustentável. Essa ideia trata a linguagem como se fosse um

aparelho já acabado, pronto, ou uma propriedade embutida na composição do ser humano. É como

se ela existisse fora do ser humano. Para Ingold (2000), uma ideia que poderia melhor explicar a

linguagem seria pensar que ela é algo inerente ao ser humano e não algo que poderia ser separado

dele. A linguagem não apareceu simplesmente num certo momento da vida humana, ela emerge ou

se desenvolve ao mesmo tempo em que os seres humanos são o que são, ou seja, dançam, cantam,

percebem os diferentes sons na natureza, pintam paredes, falam, etc. A linguagem é parte integral e

imersa nas próprias atividades dos seres humanos (Ingold, 2000; 2004). A linguagem não pode ser

concebida separadamente dos humanos.

The forms of language, for example, emerge through people’s activities of talking to one

another; thus language evolves even as we speak. Likewise the capacity of the feet to carry

us over varied terrain, and that of the hands to deliver precise movements, evolve as we

walk around and use tools or play instruments. Neither language, nor bipedality, nor tool-

use is given as a fixed attribute of human nature, out with the current of speaking, walking and tool-using (Ingold, 2004, p. 218).

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Durante as leituras dos artigos, percebemos que um assunto está muito presente: a discussão

sobre uma possível origem das características que definiriam os seres humanos. Oferecer debates

sobre essas questões parece ser indispensável para os autores dos artigos apresentados pelas

biociências que levantamos e analisamos. Por exemplo: "If language did not emerge from a gesture-

call system, we must ask what other starting point it might have had" (Burling, 1993, p. 26). Aqui,

podemos perceber que segundo ao autor tem que haver um ponto de origem. E, além disso, tem que

ser um único ponto de origem. Observamos que do total de artigos analisados, mais da metade (39

artigos entre 73) contém, em seus textos, traços que indicam o interesse dos autores em descobrir as

possíveis origens de determinadas características que resolveriam o que significa pertencer à

espécie Homo sapiens. Ingold (1986) tem alertado há quase três décadas que procurar definir e

explicar os seres vivos, inclusive os seres humanos, através de métodos e teorias que estabeleçam

rupturas ou separações entre o que seria natural (ou inato) de um lado e o que seria aprendido (ou

cultural) de outro, não pode fornecer explicações satisfatórias sobre o ser humano.

Acredito que nosso problema principal seja resolver esse dilema, reconciliar a continuidade

do processo evolutivo com a consciência de vivermos uma vida que se coloca além do

"meramente animal". Isso não pode ser realizado pela redução do estudo da humanidade

seja a uma pesquisa da natureza e evolução da espécie Homo sapiens, seja a uma

investigação da condição humana conforme manifestada na cultura e na História.

Nossa meta deveria ser transcender a oposição entre essas concepções que têm se mantido

tradicionalmente como territórios exclusivos da ciência natural e das humanidades. Em

outras palavras, precisamos estudar a relação entre a espécie e a condição, entre seres

humanos e ser humano (Ingold, 1994, p. 32).

Concordamos com Ingold e Latour e, junto com eles, acreditamos que a maneira de enxergar

a vida e de fazer ciência pode ser reformulada. Os cientistas devem construir suas pesquisas

baseadas em teorias que consideram o ser vivo como um organismo total e seu desenvolvimento

como inseparável tanto de suas condições biológicas e sociais quanto de seus ambientes ecológicos.

Os resultados das pesquisas que selecionamos para análise nos levam a questionar sobre a

pretensão das biociências em explicar a vida de maneira generalizante e totalizante sem considerar

as condições tão particulares e subjetivas de cada organismo vivo, seu contexto, sua história e seu

grupo. Vemos um exemplo disso quando Nowak e Krakauer (1999, p. 8028), afirmam que sua

teoria fornece uma abordagem sistemática para pensar a origem e a evolução da linguagem humana.

Seria como afirmar que todo ser humano em qualquer lugar no mundo possuiria a mesma

linguagem que, por sua vez, tem uma origem e um processo evolutivo independente da realidade

particular do indivíduo.

O tom nos debates sobre a origem da linguagem nesses artigos parece defender a ideia de

que a linguagem humana, como uma característica universal, de acordo com esses pesquisadores,

parece estar separada do próprio ser humano, pois, o pertencimento do sujeito a uma determinada

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comunidade, ser membro de uma determinada cultura ou estar em um lugar e tempo particulares

sujeitos a singularidades ambientais e climáticas não são consideradas como condições

determinantes para discutir a origem e a evolução desta linguagem. Essas particularidades parecem

ser entendidas por esses autores como acessórios que não interferem em um processo que parece

acontecer apenas dentro do cérebro ou apenas nos genes.

Mesmo quando os pesquisadores operam sob a condição de que é preciso haver um

desenvolvimento ou que é preciso haver uma interação social, tais condições são entendidas como

complementares e não como elementares. Em última instância, os genes são a grande resposta. Não

seria nem mesmo a natureza, em sentido pleno, a responsável pela reprodução e manutenção da

vida e dos seres. Para muitos pesquisadores, principalmente, mas, não somente, nas biociências, os

grandes determinantes da vida em todas as suas formas são exclusivamente os genes.

A ciência "moderna", nos termos de Latour (2009 [1994]), além de isolar fenômenos,

continua afirmando que suas descobertas feitas sobre uma população de chimpanzés, por exemplo,

podem ser generalizáveis, não apenas para todos os chimpanzés, mas também podem ser

verificáveis entre todos os seres humanos (p.e. Tennie et. al., 2010, p. 337). Esse tipo de hipótese é

verificável na seguinte afirmação: "We are more likely to find hints about language origins by

studying how primates use their minds than by studying how they communicate" (Burling, 1993,

p. 25).

Além da busca por uma origem e pelo fenômeno universalizante, outros aspectos como

análises pautadas em dualismos e relações diretas e específicas de causa e efeito também podem ser

observados nos textos analisados. Esses três fenômenos nos remetem às críticas, tanto de Latour

(2009 [1994]) quanto de Ingold (1988; 1993; 2000; 2007a) às construções do pensamento científico

ocidental e à maneira de fazer pesquisa e entender o mundo através dos métodos e teorias impostos

por esse pensamento marcado por dualidades e relações de causa e efeito que se legitima e se

justifica por meio de uma retórica sobre atingir a objetividade e a verdade somente através da

purificação, ou seja, do distanciamento daquele que estuda e seu objeto de pesquisa e através de

recortes do real.

Embora os resultados das pesquisas, na maioria das vezes, apontem para elementos que

escapam de caixinhas e de teorias pré-estabelecidas, ainda não têm sido suficientemente influente a

ponto de levar os pesquisadores a questionarem os princípios teóricos que orientam suas

abordagens. Em outras palavras, apesar das contaminações que vemos nos resultados das pesquisas,

ou seja, das afirmações sobre a importância das interações e vivências coletivas, as grandes

estruturas de produção de conhecimento, os pressupostos teóricos de classificação e de

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categorização não são abalados. E, porque não se abalam, continuamos a falar de características

universalizantes de um humano genérico.

Entre Evolução e História

A partir do darwinismo e, posteriormente da síntese neodarwinista, bem como do

surgimento das ciências sociais como formas autônomas de conhecimento, os seres vivos, inclusive

os seres humanos, sofrem dois grandes tipos de processos de transformações: um decorrente do

processo evolutivo e outro decorrente de um processo histórico. O primeiro seria independente do

último e suas funções seriam completamente diferentes, por isso, deveriam ser entendidas como

duas coisas distintas e pesquisadas, da mesma forma, separadamente. Em poucas palavras, no

primeiro processo temos como agente principal as moléculas de DNA, os genes. E no segundo

processo, temos as relações sociais entre os seres em seu ambiente.

Essas definições não representam exatamente a amplitude plena dos fenômenos relativos a

todos os seres vivos em nosso planeta. Essa é uma maneira de pensar e explicar o mundo que foi

"escolhida" dentre outros pensamentos (muitas vezes impostos através da violência e autoridade de

líderes - mas, esse assunto é para um outro texto) e tem sido reproduzida desde o século XVIII,

como já discutimos em outro momento neste trabalho.

Segundo Ingold (2004), esse pensamento oitocentista alega que os nossos ancestrais

primatas foram conduzidos através desse processo evolutivo até se tornarem seres humanos e,

tantos os primeiros como os últimos, a partir da explicação evolutiva, são reconhecidamente do

mesmo tipo, ou seja, as diferenças entre eles são diferenças de grau. Isso tem repercussões

profundas tanto nas concepções anátomo-fisiológicas quanto em termos de comportamento

individual e coletivo.

O processo histórico cultural, ainda de acordo com aquele pensamento, conduziu o passado

primitivo da humanidade até à ciência moderna e a civilização. O encontro desses dois

processos de mudanças estabeleceriam o ponto de origem onde nossos ancestrais teriam

cruzado a linha para a verdadeira humanidade e iniciado o curso da história. Algo único e

sem qualquer precedente na evolução de qualquer outra espécie (Ingold, 2004, p. 2012).

Apesar de críticas a esse pensamento, que pode levar a erros tais como colocar a figura do

sujeito caçador-coletor de hoje neste ponto de origem onde a história diverge da evolução e a

cultura da biologia e considera-lo como modelo vivo de nossos ancestrais, ainda vemos

pesquisadores em uma caçada por encontrar o 'o que, onde e quando' o ser humano passou a ser

mesmo humano. Para alguns, este momento de origem teria sido aquele em que nossos ancestrais

começaram a se utilizar da linguagem de alguma forma (Arcadi, 2000; Arnold & Zuberbühler,

2008; Boesch, 1991; Boesch & Tomasello, 1998; Boesch, 2003; Burkart & Strasser, 2008; Burling,

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1993; Castelli & Peretto, 2006; Delgado, 2000; Ghazanfar & Rendall, 2008; Nowak & Krakauer,

1999; Tomasello et al., 2005; Urban, 2002).

A ênfase na busca por origens que encontramos nos artigos analisados é um exemplo de

pesquisas contemporâneas nas biociências pautadas em paradigmas do pensamento científico

ocidental que, para ser legítimo, deve buscar as causas responsáveis por determinados efeitos.

Como discutimos anteriormente, essa busca deve efetuar um recorte do real para garantir a

objetividade científica, o que significa que os pesquisadores devem ter em mente que apenas uma

(ou no máximo duas) variáveis que podem ser a causa de determinado efeito.

Separar e isolar fenômenos para serem analisados são práticas típicas da ciência "moderna"

que constrói e opera a partir de dualismos (2009 [1994]; Ingold, 2006). As dualidades como a

distinção entre evolução e história e natureza e cultura são expressões da estrutura do pensamento

ocidental.

Da mesma forma que a razão é considerada como tendo superado as barreiras da natureza,

supõe-se que o fato de ser humano ultrapassa o limite de um escrutínio biológico exaustivo

da natureza e do funcionamento do organismo. (...) E, se considerarmos que as

modificações que a história provoca na subjetividade humana são distintas daquelas

causadas pela evolução biológica sobre o organismo, então, devemos considerar também

que a pessoa excede o organismo precisamente na mesma medida em que a história excede

a evolução (Ingold, 2006, p.28).

Para Ingold (2006), os seres vivos, e no caso de nosso trabalho, particularmente os seres

humanos, são organismos totais que não possuem tais divisões como natureza de um lado e cultura

do outro. Além disso, o ambiente no qual estão inseridos os seres humanos é igualmente

responsável por suas características e desenvolvimento e não é possível pensar em um determinado

sujeito sem pensar o seu ambiente e as relações que estabelece com ele.

Pois a vida orgânica, tal como a concebo, é ativa e não passiva, aberta e não pré-

programada: é o desdobramento criador de um campo total de relações, no interior do qual

seres aparecem e tomam suas formas particulares, cada um em relação aos outros. Desse

ponto de vista, a vida não é a atualização de formas pré-especificadas, mas o próprio

processo no qual as formas são engendradas (Ingold, 2006, p. 30).

Embora as experiências sociais e culturais de cada indivíduo, a partir do ponto de vista de

Ingold sob o qual estamos nos baseando, sejam fundamentais no desenvolvimento total do ser

humano, os biocientistas continuam a reproduzir a purificação dos fenômenos (Latour, 2009

[1994]), ou seja, isolam um pequeno grupo de fatores de seu contexto para encontrar uma causa

anatômica que explique a origem da linguagem. Mesmo quando reconhecem que e os estímulos

sociais são importantes, os ignoram e não os tomam como essenciais. Por razões de teoria e método,

esses elementos não participam da análise dos fenômenos. Parece que fatores específicos e

singulares, tais como a cultura e as relações sociais, não são considerados fundamentais e essenciais

para o desenvolvimento do ser humano tanto quanto os fatores universais e generalizantes, como os

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processos cognitivos e neuropsicológicos (Delgado, 2000, p.143; D'andrade, 2002, p. 224; Urban,

2002, p. 234).

Para Ingold (2006), a história humana é um processo no qual os homens e as mulheres de

cada geração, através de suas atividades sociais e de suas relações com sua cultura, fornecem os

contextos de desenvolvimento nos quais seus sucessores chegam à maturidade. A partir desse

entendimento sobre a história, é possível aceitar que não há uma divisão ou distinção absoluta entre

o processo de evolução e o processo histórico. Assim, está dissolvida a ideia de uma humanidade

universalizante e totalizante. Por essa perspectiva, não se pode definir o que é um ser humano

independentemente de seu contexto social, histórico, ecológico, biológico, cultural (Ingold, 2006, p.

32).

As consequências dessa dissolução são impressionantes. Pois ela põe um fim à ideia de que,

no curso da história concebida como um processo social, os seres humanos permanecem

biologicamente os mesmos, equipados universalmente com um conjunto de estruturas e de disposições ocorridas no Pleistoceno por um processo de evolução e adaptação. É

necessário admitir que as diferenças humanas são biológicas quanto às aptidões, às

capacidades e às disposições particulares mobilizadas pelos homens em suas vidas, em

diferentes tempos e lugares. Tais diferenças foram incorporadas no seu processo de

desenvolvimento – nos aspectos particulares de sua neurologia, de sua musculatura e

mesmo de sua anatomia – em função da diversidade das experiências adquiridas crescendo

em determinados tipos de meio ambiente (Ingold, 2006, p.32).

Os paradigmas do pensamento e das práticas científicas ocidentais e "modernas" criticadas

por Latour e Ingold são uma constante nas publicações dos resultados das pesquisas que

analisamos, ou seja, pensamento dual, isolamento de fenômenos, generalizações, e relação de causa

e efeito. Mas, também observamos que existe um certo movimento na tentativa de mudar ou inovar

a maneira pela qual alguns desses pesquisadores encaram seu objeto de pesquisa.

O início de uma possível mudança

Percebemos, no material analisado, algumas tentativas (10 artigos) no sentido de evitar o

isolamento dos fenômenos e uma busca por explicações que contemplem e considerem as relações e

interações entre os elementos (Arcadi, 2000; Call & Hernández-Lloreda, 2007; Claidière & Sperber,

2009; Delgado, 2000; D’Andrade, 2002; Herrmann, 2007; Hill, Barton & Hurtado, 2009; Kirby,

Dowman & Griffths, 2007; Moll & Tomasello, 2010; Munhall, 2006; Nowak, Komarova & Niyogi,

2002; Tomasello, 1999). Mesmo que ainda não seja a mudança que Ingold defende como

necessária, já é algo que aponta para o desejo de debater paradigmas e a possibilidade de mudanças,

particularmente, na maneira de entender os seres humanos como organismos totais que emergem e

se desenvolvem enquanto interagem com os outros membros de seu grupo, seres não humanos e seu

ambiente, numa relação de interdependência.

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They are rather developmentally enhanced achievements of the whole organism-person, at

once body and mind, positioned within a field of relations with the manifold human and

non-human constituents of its environment. And to account for these achievements, what

we need is nothing less than a new approach to evolution, one that sets out to explore not

the variation and selection of intergenerationally transmitted attributes, but the self-

organising dynamics and form-generating potentials of relational fields (Ingold, 2004, p.

218).

Ingold (2004) nos leva a pensar de maneira diferente sobre as relações entre os seres vivos

como organismos e seus ambientes. Uma mudança na maneira de enxergar essas relações pode

transformar completamente as definições e entendimentos sobre a vida, que são apresentadas hoje

de maneira, ao mesmo tempo, fragmentada e universalizante.

Ingold (2004) nos oferece uma proposta que ele chama de pensamento relacional. Uma

proposta que trata os organismos não como entidades pré-especificadas, mas como um local de

crescimento e desenvolvimento inserido num contínuo campo de relacionamentos. Contrário às

generalizações, Ingold nos inspira a entender cada organismo, cada pessoa, como a incorporação de

uma maneira particular de viver (Ingold, 2004, p. 219).

Veremos na citação a seguir algo que talvez seja interessante e contribua para o nosso

debate. Os autores sugerem que a partir do estudo da transmissão cultural, a interação dos três

processos responsáveis pela origem da linguagem pode ser estudada. Este é um exemplo da

tentativa em apresentar uma explicação alternativa que aponta para um esforço em favor da

hibridização do conhecimento.

Human language arises from biological evolution, individual learning, and cultural

transmission, but the interaction of these three processes has not been widely studied. We

set out a formal framework for analyzing cultural transmission, which allows us to investigate how innate learning biases are related to universal properties of language. We

show that cultural transmission can magnify weak biases into strong linguistic universals,

undermining one of the arguments for strong innate constraints on language learning. As a

consequence, the strength of innate biases can be shielded from natural selection, allowing

these genes to drift. Furthermore, even when there is no natural selection, cultural

transmission can produce apparent adaptations. Cultural transmission thus provides an

alternative to traditional nativist and adaptationist explanations for the properties of human

languages (Kirby et al., 2007, p. 5241).

Os autores parecem apresentar uma crítica à visão evolutiva ortodoxa que trata a linguagem

como tendo surgido, ou sido causada, a partir de apenas de dois sistemas adaptativos. Os autores

criticam esse procedimento e propõe que além desses dois, mais um sistema adaptativo seja

acrescido. Esse sistema adaptativo seria a transição cultural. Esse pensamento sugere a produção de

conhecimento a partir de um modelo híbrido (Latour, 2009 [1994]).

In this paper, we argue that there are serious problems with this orthodox

evolutionary/biolinguistic approach. It treats language as arising from two adaptive systems, individual learning and biological evolution, but in doing so misses a third:

cultural transmission (Kirby et al., 2007, p. 5241).

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Em nossas análises encontramos um tom em alguns dos textos que indica a adoção de

explicações alternativas à ideia de que há simplesmente uma predisposição inata à linguagem ou à

ideia de que há pressões seletivas favorecendo uma comunicação ótima que favoreceria a

sobrevivência e reprodução dos indivíduos. Encontramos críticas ao mecanicismo do pensamento

dual, a partir dos pressupostos de suas áreas de conhecimento. Essas críticas são importantes pela

perspectiva de Ingold (1988) que não espera um consenso, mas sim a mudança de pontos de vista

no processo de produção de conhecimento.

Em contrapartida, tal processo é tortuoso e difícil de implementar. Verificamos em alguns

dos artigos analisados que, embora os autores procurem apresentar certos tipos mudanças, algumas

ortodoxias da ciência ocidental "moderna", nos temos de Latour (2009 [1994]), permanecem

presentes. Por exemplo, mesmo quando os autores parecem fazer referência a uma certa história

evolutiva segundo a qual o cérebro não reage apenas à experiências diretas, mas, também à registros

comunicados ao cérebro por outras vias, continuam a isolar, a purificar os fenômenos (Arcadi,

2000; Call & Hernández-Lloreda, 2007; Claidière & Sperber, 2009; Delgado, 2000; D’Andrade,

2002; Herrmann, 2007; Hill, Barton & Hurtado, 2009; Kirby, Dowman & Griffths, 2007; Moll &

Tomasello, 2010; Munhall, 2006; Nowak, Komarova & Niyogi, 2002; Tomasello, 1999).

É válido que os autores salientem a importância das relações entre as diferentes partes do

cérebro, não podemos negar que os impulsos neuronais são necessários para que a capacidade para

a teoria da mente, por exemplo, seja possível. Por outro lado, será que apenas essas conexões

neurológicas isoladas são suficientes para que um indivíduo consiga interpretar o estado mental de

outros indivíduos? Não seria importante considerar como se dão as relações sociais e culturais

particulares de determinados sujeitos inseridos em seus contextos ecológicos e culturais e como elas

atuam para estimular tal comportamento? Ao ignorar completamente esses fenômenos, parece que

os autores desconsideram a influência que tais atividades podem exercer sobre o desenvolvimento

neurológico do indivíduo.

O procedimento padrão da maioria dos artigos que analisamos é levantar dados sobre as

atividades das áreas mentais mediante certos estímulos e, ao fazerem isso, isolam o fenômeno e o

submetem a experimentos. Essa prática caracteriza uma forma de purificar os elementos. Ao mesmo

tempo, alguns autores parecem apresentar uma perspectiva favorável a uma possível mudança na

maneira de entender as relações entre os seres humanos quando sugerem que a emergência da

consciência se dá num processo "de mãos dadas com" o desenvolvimento da sinalização social

resultando em cooperação e na contínua criação intergeracional (Frith & Frith, 2007, p. 730).

O trabalho de Herrmann et. al. (2007) também destoa da maioria dos artigos e chamou nossa

atenção. Embora também busque uma suposta origem, as hipóteses dos autores procuram não isolar

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os fenômenos nem os sujeitos. Embora aceitem as hipóteses sobre o tamanho do cérebro influenciar

no surgimento da linguagem, dão um passo à frente e consideram também as ações dos indivíduos

como ativamente responsáveis pelas mudanças nos seres (Herrmann et. al., 2007). Esses autores

mais ousados buscam a origem da inteligência social e cultural nos seres humanos não apenas nas

funções cerebrais, mas em relações sociais e atividades que envolvem outros parceiros e o meio

ambiente. Essas ideias se aproximam das ideias de Ingold (2000; 2002; 2004).

More specifically, in this analysis, primate cognition of the physical world evolved mainly

in the context of foraging: to locate food, primates need cognitive skills for dealing with

'space', to choose wisely among multiple food sources, they need cognitive skills for dealing with 'quantities' and for extracting food from difficult places, they need cognitive

skills for understanding 'causality' (including, for some species, the context of tool use)

(Herrmann et al., 2007, p. 1361).

Um outro aspecto interessante desses autores (Herrmann, 2007; Hill, Barton & Hurtado,

2009; Kirby, Dowman & Griffths, 2007; Moll & Tomasello, 2010; Tomasello, 1999) e que também

os diferencia dos outros é uma aparente recusa em purificar dados. Essa preocupação os aproxima

tanto de Ingold (2000) quanto de Latour (2009 [1994]). Isso fica mais evidente diante da afirmação

que as características unicamente humanas não serão encontradas através apenas da comparação dos

sequenciamentos do genoma dos humanos e dos chimpanzés. Além disso, ainda segundo esses

autores, são necessárias pesquisas, que visem comparar também o comportamento e as capacidades

cognitivas entre humanos e seus parentes mais próximos, os primatas não-humanos:

But to do this with specific reference to behavior and cognition, what is needed first are

comprehensive and detailed comparisons among humans and closely related primates at the

level of the phenotype, in terms of the actual behavioral and cognitive skills that have

promoted survival and reproduction (Herrmann et al., 2007, p. 1365).

No material pesquisado encontramos outros autores (Burkart & Strasser, 2008; Szathmáry &

Számadó, 2008) que parecem recusar a via da purificação para produzir conhecimento. Contudo,

sua estratégia corresponde a aprofundar a comparação entre diferentes espécies para elaborar suas

conclusões, ao invés de considerar os vários aspectos sociais e as relações dos indivíduos entre si,

mas, também com o meio onde vivem como sugere Ingold (2000, 2002, 2004).

O limite das tentativas em evitar a purificação dos dados está na construção de dicotomias,

principalmente entre mente e corpo e entre ação e cognição, de modo que a primeira precede a

última. Embora pareça indiscutível que a mente e o corpo sejam duas coisas e que a mente comande

as ações do corpo, essa maneira dual de pensar não é uma representação do real, mas sim uma

construção metodológica do pensamento tradicional ocidental (Ingold 1993; Latour 2009 [1994]).

O pensamento dual também se manifesta nos autores que consideram a linguagem como a chave

explicativa para a evolução dos outros traços considerados humanos (Szathmáry & Számadó, 2008).

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Ora, baseadas em Ingold perguntamos, por que a linguagem seria a chave para o

desenvolvimento do conjunto de traços que nos fazem unicamente humanos? Embora os autores

afirmem que os humanos são seres complexos e que suas características singulares devem ter

evoluído em conjunto com outros traços, a opção de análise recai no isolamento de características e

na busca de um elemento focal e disseminador de todos os processos. Esse elemento é localizado e

seria o cérebro (Szathmáry & Számadó, 2008).

Ingold (1993), não concorda com a ideia de que a inteligência e a cognição sejam o lugar

para se encontrar as informações sobre a evolução e origem das capacidades técnicas e sociais dos

seres humanos. Para nosso autor, cognição não pode ser entendida como um mecanismo

exclusivamente interno do indivíduo que serve como um veículo para informações. A cognição,

ainda segundo Ingold, poderia ser comparada com a locomoção, pois, para poder se locomover, o

ser deve utilizar-se de todas as partes de seu corpo para desenvolver o equilíbrio, desenvolver as

forças musculares necessárias para esse ato, relacionar-se com o solo em que pisa e a atenção aos

obstáculos que terá que ultrapassar em seu meio ambiente. Assim como andar, pensar faz parte da

pessoa como um todo (Ingold, 1993, p. 431). Para ele:

There is therefore no such thing as an "intelligence" apart from the animal itself, and no

evolution of intelligence other than the evolution of animals with their own powers of

perception and actions. In the study of human evolution, we are concerned to undertand the

specific powers of human beings, and to produce an account of how and why they came to

be formed (Ingold, 1993, p. 431).

Percebemos o esforço de alguns biocientistas em afastarem-se de uma das fortes

características da ciência "moderna" (Latour, 2009 [1994]), que é a purificação dos dados. Para isso

eles se esforçam em integrar o meio, as condições naturais e as socioculturais em abordagens que

contemplem a combinação de diferentes fatores, inclusive com o ambiente, para explicar a evolução

e desassociar explanações referentes à origem e à propagação do comportamento das explanações

sobre a estabilidade de certas características em determinadas espécies (Claidière & Sperber, 2009).

Apesar disso, o pensamento universalizante ainda persiste e, talvez, a construção de dualismos seja

um dos aspectos do pensamento ocidental "moderno‖ mais difícil de superar ou mesmo evitar.

Pode-se observar isso em autores (Hill, Barton & Hurtado, 2009) que mesmo buscando uma

abordagem mais histórica da natureza, num esforço aparente de superar as barreiras postas entre

evolução (genética) e história (cultura), para explicar a evolução dos importantes traços que

definiriam os seres humanos, como a cognição, sugerindo assim, complexidade e relações múltiplas

em vários domínios, recaem nos domínios duais.

O tratamento da cognição como um domínio plural, verificado nos trabalhos de Hill, Barton

e Hurtado (2009) e de Tomasello (1999) aproxima-se das ideias de Ingold.

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Because social learning mechanisms are shaped by genetic evolution, but also influence the

relative advantage of alternative genotypes, genes and culture co-evolve. It has become

clear that dual inheritance theory is requisite for a complete understanding of human

behavior (Hill, Barton & Hurtado, 2009, p. 188).

If we are searching for the origins of uniquely human cognition, therefore, our search must be for some small difference that made a big difference .some adaptation, or small set of

adaptations, that changed the process of primate cognitive evolution in fundamental ways.

In my view there is only one candidate for this small difference that made a big difference

and that is human culture. (...) But human social organization is something else again, and

this organization was, in my view, an integral part of the process by which human cognition

came to have many of its most distinctive characteristics. That is, although the cognition of

many mammalian and primate species is influenced (Tomasello, 1999, p. 510).

Ingold e Latour oferecem, respectivamente, uma maneira de pensar sobre o mundo e um

método para produzir conhecimento. Ambos podem ser considerados revolucionários. Ingold

(2002), especificamente, declara abertamente que sua intenção não é renovar o que já vem sendo

feito. Sua proposta, sua tese antropológica, pretende revolucionar o entendimento sobre a

interdependência dos organismos que só podem existir e desenvolver-se dentro de relacionamentos

complexos e indivisíveis entre organismos vivos e seus ambientes.

What I offer is something different, not a recycling of tired preconceptions but a genuinely

new way of thinking about human beings and their place in the world, centred on processes

of development and the dynamic properties of relational fields, that not only promises a

new reintegration of social and biological anthropology, but also sets a radical evolutionary

agenda for the twenty-first century. It will, I hope, inaugurate the coming-of-age of

anthropology as a science of engagement in a relational world (Ingold, 2004, p. 220).

Os paradigmas e dogmas da ciência ocidental hoje ainda não aceitam essas ideias relacionais

como legitimamente científicas. Entretanto, as pequenas mudanças que pudemos identificar nesses

artigos que analisamos podem indicar que alguns pesquisadores tem sentido a necessidade de

mudanças teóricas e metodológicas e têm feito algo a esse respeito.

Encerramos este texto com o desejo de termos contribuído com o debate sobre a necessidade

de mudanças nos paradigmas científicos. Esperamos que este debate tenha oferecido ideias que

possam se somar nessa busca por mudanças, com o desejo de que outros pesquisadores,

principalmente nas ciências humanas e, particularmente, na antropologia, sintam-se estimulados a

pensar de modo diferente e aplicar essas mudanças em seus trabalhos.

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Considerações Finais

De acordo com as pesquisas que analisamos, o cérebro parece ser um elemento central para

investigar uma possível singularidade humana. Ele, com todo o seu aparato neurológico, é um órgão

intimamente relacionado à imaginação, ao questionamento e à reflexão, inclusive sobre ele mesmo

e sobre o que estaria passando no cérebro, no pensamento, nas ideias, de um outro ser. Isso fez com

que muitos pesquisadores voltassem sua atenção para ele.

Apesar disso, todas essas capacidades não fazem do cérebro um sujeito independente e

autônomo em relação ao corpo que o abriga. A partir da perspectiva de Ingold (2000), podemos

afirmar que o cérebro não é matéria MAIS pensamento. O cérebro é o pensamento e é a matéria ao

mesmo tempo. Da mesma forma, o ser humano não é corpo MAIS pensamento, os seres humanos

são corpo e pensamento ao mesmo tempo.

As emoções, os sentimentos, os símbolos, etc., não são produtos ou produtores de um

cérebro em contato com o ambiente que o rodeia. Não se trata de entidades distintas. As emoções,

os sentimentos, os símbolos, etc., são o próprio ser humano e ambiente juntos, constituem um todo

complexo, impossível de romper-se em pequenas partes, e que se desenvolvem e emergem sem

origem e sem fim. Embora, como vimos, a ciência dita "moderna" (Latour, 2009 [1994]) continua a

estabelecer rupturas entre seus objetos de pesquisa. Essa ciência ―moderna‖ continua a construir

dicotomias como natureza versus cultura ou emoção versus razão. Mesmo quando alguns buscam

dar ênfase na importância da relação entre as duas partes, continuam a separar o ser humano em

duas partes distintas ou independentes.

O nosso objetivo de colocar a teoria de Latour (Latour, 2009 [1994]), à prova em relação às

pesquisas sobre "linguagem" e "comunicação" em humanos e chimpanzés de laboratório,

publicadas nas revistas internacionais mais proeminentes em relação a esse campo de conhecimento

entre 1990 e 2012 foi alcançado. E, o que vimos foi que as pesquisas continuam a estabelecer

dicotomias como natureza versus cultura. Latour (2009 [1994]) estava certo quanto à continuidade e

manutenção das práticas científicas de "purificação" dos objetos em relação ao tema e a área

analisados nessa pesquisa.

A questão que parece ser consenso entre os pesquisadores que analisamos: "o que faz do ser

humano humano?", já se apresenta como uma dicotomia pronta. Ou seja, se há algo que pertence

apenas à nossa espécie e que nos caracterizaria enquanto únicos humanos, mas que não são óbvias e

precisam ser encontradas, então, devem existir coisas que não são unicamente humanas também

encontráveis nos humanos. Seguindo esse raciocínio, o ser humano é um ser dual e paradoxal,

dividido entre seu lado animal, que compartilha com outros animais, e seu lado cultural, ou mental

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ou linguístico, único em sua espécie e que parece encobrir ou dominar a parcela animal dos seres

humanos.

A ideia de que seria possível encontrar os traços unicamente humanos depois que todos os

possíveis traços compartilhados com a espécie viva mais próxima geneticamente dos humanos

fossem descartadas, parece ser uma constante nos artigos que analisamos. Entretanto, desdobrando

a premissa de Latour (2009 [1994]), essas dicotomias não são necessariamente um fato científico

nem verdade absoluta ou mesmo uma verdade científica. Essas dicotomias que parecem fazer de

seres humanos um tipo mutante constituído por uma faceta animal versus uma faceta cultural

poderiam ser uma estratégia metodológica dos pesquisadores que estudam humanos e animais não-

humanos, mas só isso e nada mais.

As ideias ocidentais sobre a humanidade e os seres humanos têm moldado e, por sua vez,

sendo elas próprias também moldadas pelas ideias sobre o que é animal, uma vez que os seres

humanos são considerados como parte ou à parte do mundo animal a partir das histórias dessas

ideias.

For those of us reared in the tradition of Western thought, 'human' and 'animal' are terms

rich in association, fraught with ambiguity, and heavily laden with both intellectual and emotional bias. From classical times to the present day, animals have figured centrally in

the Western construction of 'man'—and we might add, of Western man's image of woman.

Every generation has recreated its own view of animality as a deficiency in everything that

we humans are uniquely supposed to have, including language, reason, intellect and moral

conscience. And in every generation we have been reminded, as though it were some

startling new discovery, that human beings are animals too, and that it is by comparison

with other animals that we can best reach an understanding of ourselves. (Ingold, 1994, p.

14).

Nosso pensamento científico é marcado por dicotomias. As pesquisas que analisamos estão

pautadas em dicotomias, no caso deste trabalho, na dicotomia "natureza" versus "cultura". Mas, o

fato de essa ser a estratégia escolhida para guiar metodologicamente as pesquisas não faz dessa

ideia uma verdade absoluta. É uma estratégia, uma maneira de enxergar e entender o mundo. Além

dessa, existem outras.

A peculiaridade dos ocidentais foi a de ter imposto, através da Constituição, a separação

total dos humanos e dos não-humanos - Grande Divisão interior - tendo assim criado artificialmente o choque dos outros. "Como alguém pode ser persa?" Como e possível que

alguém não veja uma diferença radical entre a natureza universal e a cultura relativa? Mas a

própria noção de cultura é um artefato criado por nosso afastamento da natureza. Ora, não

existem nem culturas - diferentes ou universais - nem uma natureza universal. Existem

apenas naturezas-culturas, as quais constituem a única base possível para comparações

(Latour, 2009 [1994], p. 102).

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