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ELEMENTOS PARA A CARACTERIZAÇÃO DAS EMPRESAS DE ELETRÔNICA DO APL DE SANTA RITA DO SAPUCAÍ Ariana Ribeiro Costa (Usp) [email protected] Renato Garcia (Usp) [email protected] Antonio Carlos Diegues (Ufscar) [email protected] Jose Eduardo Roselino (Unisal) [email protected] O principal objetivo deste trabalho é analisar os principais fatores que determinam a competitividade dos produtores de eletrônicos do sistema local de produção de Santa Rita do Sapucaí. Dessa maneira, o trabalho pretende identificar e anallisar os principais pontos fortes e os gargalos encontrados entre as empresas locais que exercem impactos sobre a sua competitividade. A principal suposição, amplamente discutida na literatura, é que a aglomeração dos produtores é capaz de proporcionar um conjunto de externalidades que reforçar a capacidade competitiva das empresas. Para proceder a essa análise, foi realizada uma ampla pesquisa de campo, qualitativa e de caráter empírico, junto aos produtores locais, que permitiu levantar seus pontos fortes e identificar alguns gargalos e entraves ao incremento da competividade dos produtores. Os principais resultados encontrados mostram que as diversas empresas que compõem o sistema produtivo local possuem especificidades que não permitem que a análise seja realizada de modo conjunto. Então, foi elaborada uma tipologia das empresas locais, com o intuito de identificar essas condições específicas, com evidentes implicações gerenciais e de políticas públicas. Palavras-chaves: estrutura produtiva, arranjo produtivo local, eletrônica XXXII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Desenvolvimento Sustentável e Responsabilidade Social: As Contribuições da Engenharia de Produção Bento Gonçalves, RS, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2012.

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ELEMENTOS PARA A

CARACTERIZAÇÃO DAS EMPRESAS

DE ELETRÔNICA DO APL DE SANTA

RITA DO SAPUCAÍ

Ariana Ribeiro Costa (Usp)

[email protected]

Renato Garcia (Usp)

[email protected]

Antonio Carlos Diegues (Ufscar)

[email protected]

Jose Eduardo Roselino (Unisal)

[email protected]

O principal objetivo deste trabalho é analisar os principais fatores que

determinam a competitividade dos produtores de eletrônicos do

sistema local de produção de Santa Rita do Sapucaí. Dessa maneira, o

trabalho pretende identificar e anallisar os principais pontos fortes e

os gargalos encontrados entre as empresas locais que exercem

impactos sobre a sua competitividade. A principal suposição,

amplamente discutida na literatura, é que a aglomeração dos

produtores é capaz de proporcionar um conjunto de externalidades que

reforçar a capacidade competitiva das empresas. Para proceder a essa

análise, foi realizada uma ampla pesquisa de campo, qualitativa e de

caráter empírico, junto aos produtores locais, que permitiu levantar

seus pontos fortes e identificar alguns gargalos e entraves ao

incremento da competividade dos produtores. Os principais resultados

encontrados mostram que as diversas empresas que compõem o

sistema produtivo local possuem especificidades que não permitem que

a análise seja realizada de modo conjunto. Então, foi elaborada uma

tipologia das empresas locais, com o intuito de identificar essas

condições específicas, com evidentes implicações gerenciais e de

políticas públicas.

Palavras-chaves: estrutura produtiva, arranjo produtivo local,

eletrônica

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1. Introdução

O principal objetivo deste trabalho é analisar os principais fatores que determinam a

competitividade dos produtores de eletrônicos do sistema local de produção de Santa Rita do

Sapucaí, de modo a identificar e analisar os principais pontos fortes e os gargalos encontrados

entre as empresas locais. O trabalho parte da premissa, discutida na literatura, de que a

aglomeração dos produtores é capaz de proporcionar um conjunto de externalidades que tem a

capacidade de fortalecer a competitividade das empresas. Nesse sentido, as forças locais da

aglomeração especializada dos agentes econômicos representam um importante fator para a

promoção do desenvolvimento dos produtores individuais.

Para proceder a essa análise, foi realizada uma ampla pesquisa de campo, de caráter empírico,

junto aos produtores locais. Dessa forma, foi possível coletar e organizar um conjunto de

informações que foram utilizadas para a análise da competitividade das empresas, o que

permitiu levantar pontos fortes, e identificar gargalos e entraves ao incremento da

competividade dos produtores. No entanto, verificou-se que as diversas empresas que

compõem o sistema produtivo local possuem especificidades que não permitem que a análise

seja realizada de modo conjunto. Então, foi elaborada uma tipologia das empresas com o

intuito de identificar suas condições específicas, com evidentes implicações gerenciais e de

políticas públicas.

O trabalho está dividido em seis seções, incluindo essa introdução. A segunda traz uma breve

recuperação dos principais pressupostos conceituais. Em seguida, a seção 3 apresenta os

procedimentos metodológicos e a quarta apresenta o panorama competitivo da indústria

eletrônica. Na seção 5, estão analisados e discutidos os principais resultados encontrados,

assim como a tipologia das empresas locais. Por fim, a seção 6 apresenta as considerações

finais e alguns dos principais desafios encontrados.

2. Breve revisão conceitual: os benefícios da aglomeração industrial

Há uma vasta literatura a respeito dos benefícios da concentração geográfica de produtores.

Todos esses trabalhos têm como origem o estudo pioneiro de Marshall sobre os distritos

industriais ingleses do século XIX. De acordo com Marshall (1984), as pequenas e médias

empresas localizadas dos distritos eram capazes de apresentar desempenho competitivo

superior por conta da elevada especialização produtiva das firmas locais. Assim, as economias

externas geradas pela especialização dos produtores, e pela extensiva divisão do trabalho entre

eles, compensavam, e até suplantavam, as economias internas geradas pela grande empresa

industrial.

Nesse contexto, Marshall identificou três principais fontes de vantagens competitivas dos

produtores. A mão-de-obra qualificada e as habilidades específicas que formam um conjunto

expressivo de capacitações locais. A importância da presença, e da atração, de fornecedores

especializados. E os transbordamentos locais de conhecimento, relacionados especialmente

com a elevada facilidade para a circulação de informações e o compartilhamento do

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conhecimento. Uma vez que, as estruturas produtivas localizadas são capazes de construir

elementos relacionados com a confiança mútua e pelo contato face-a-face.

A partir do trabalho de Marshall, diversos autores mais recentes apontaram os benefícios da

aglomeração industrial. Dentre os mais importantes, destacam-se Schmitz (1997); Belussi e

Gottardi (2000); Maskell (2001) e Lombardi (2003).

Schmitz (1997) ressalta que em adição às externalidades de caráter eminentemente

incidentais, decorrentes da simples concentração geográfica dos produtores, as possibilidades

de ação conjunta dos agentes podem ser um fator importante para reforçar as economias

externas locais e, assim, a competitividade dos produtores. A concentração geográfica das

empresas e instituições coligadas ao sistema local pode facilitar o estabelecimento de ações

coletivas que certamente vão atuar no sentido de reforçar os benefícios incidentais da

aglomeração econômica.

No debate brasileiro, as principais contribuições são de Cassiolato e Lastres (2001); Suzigan

et al. (2001); Fauré e Hasenclever (2007), entre outros. O elevado interesse dos estudiosos

sobre o tema esteve bastante relacionado com as amplas possibilidades de ação de políticas

públicas. Como apontaram Scott (1998) e Suzigan (2001), o papel das políticas em sistemas

locais de produção está associado com as possibilidades de reforço dos benefícios da

aglomeração das empresas, por meio da criação de mecanismos capazes de reforçar a

capacidade de geração de externalidades positivas para o conjunto dos produtores locais.

No período recente, ocorreu um interessante debate no que se refere ao papel do

conhecimento nessas estruturas produtivas. Para alguns, a ampla disponibilidade do

conhecimento gerado pelos agentes locais representava um dos mais importantes benefícios

da aglomeração.

Gertler (2003) reconhece que a proximidade geográfica é um elemento muito importante para

a difusão de informações e o compartilhamento do conhecimento, especialmente quando se

trata de conhecimentos de caráter tácito, específico e complexo. A importância da

proximidade geográfica decorre do fato que a construção do conhecimento tácito ocorre

somente dentro do contexto social, por meio da utilização de regras próprias e canais

específicos de comunicação, cuja construção é facilitada pelas interações face-a-face.

Todavia, esses canais de comunicação podem ser construídos também no seio das redes não

locais de profissionais, nas chamadas comunidades de prática, de modo que o fator mais

importante é a proximidade organizacional ou relacional entre profissionais, que pode ocorrer

ou não localmente.

3. Procedimentos metodológicos

Para alcançar os objetivos, a pesquisa partir de uma abordagem qualitativa, de caráter

empírico. Segundo Martins (2009) tal abordagem abriga uma série de técnicas de

interpretações que procuram descrever, decodificar e traduzir o fenômeno estudado. Para

Gephart (2004) tal pesquisa enfatiza os processos e significados que ocorrem naturalmente,

estuda fenômenos em ambientes nos quais eles realmente acontecem e usa o significado dos

atores sociais para entender os processos.

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Uma vez que a pesquisa visava extrair componentes, que não conseguiriam ser extraídos de

alguma base de dados, a abordagem qualitativa se caracterizou como a mais apropriada

(CASSELL ET AL., 2009; GEPHART, 2004). Foram realizadas entrevistas com agentes

locais, através de um calendário de visitas, que respeitava a diversidade e a complexidade da

estrutura produtiva local. Nesse levantamento de informações foram utilizados questionários

semiestruturados, previamente utilizados em outros esforços de pesquisas (GARCIA, 1996),

que foram adaptados às especificidades locais.

A fim de compreender a diversidade e a complexidade do sistema local foram entrevistadas

doze empresas de portes distintos e que atuam em diferentes segmentos da indústria

eletrônica, quatro instituições de ensino e duas incubadoras de empresas. A escolha das

empresas entrevistadas procurou construir uma amostra representativa da diversidade local.

Tal seleção foi feita em conjunto com o SINDVEL – Sindicato das Indústrias do “Vale da

Eletrônica”, órgão que possibilitou acesso aos dirigentes das empresas e das instituições.

Foram delimitados pontos de análises que seriam abordados nas entrevistas e consolidação do

relatório, seguindo os parâmetros:

a) Caracterização das empresas (estrutura produtiva, tamanho, faturamento);

b) Nível de esforço tecnológico (fontes de informação e aprendizado, fontes de

introdução da inovação);

c) Interação com os agentes do polo (fontes de informação, prestação de serviços,

cooperação, aprendizado, representatividade política, iniciativas conjuntas, entre

outras);

d) Interação com agentes de fora do polo (importação de insumos e matérias primas,

mercados compradores, entre outras);

e) Fontes de financiamento;

f) Entraves à competitividade;

g) Ameaças e oportunidades.

4. Panorama competitivo da indústria eletroeletrônica

O setor eletroeletrônico é constituído por um conjunto bastante extenso e diversificado de

segmentos. O mercado global de bens eletrônicos inclui os bens de informática e de

automação, equipamentos de telecomunicações, eletrônica de consumo e utilidades

domésticas e componentes eletrônicos como semicondutores.

Em alguns países em desenvolvimento, como Coréia do Sul, Taiwan e China, houve um

desenvolvimento recente da indústria eletrônica, fortemente associado aos processos de

desenvolvimento tecnológico e industrial. Do ponto de vista da distribuição da produção e da

localização dos principais atores globais nota-se que a produção de equipamentos e

componentes eletrônicos concentra-se nos países do Leste Asiático, como China, Coréia do

Sul, Taiwan e Cingapura. Estes se consolidaram como os principais provedores do mercado

internacional, ultrapassando países desenvolvidos da Tríade (Estados Unidos, Japão e União

Europeia) no ranking dos maiores produtores internacionais.

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Dentro desse contexto, o Brasil detém de 2,0 a 2,3% da produção mundial, o que o coloca na

posição de 10º maior produtor (OECD, 2008). Essa participação está associada ao seu vasto

mercado consumidor doméstico e às atividades de montagem de bens eletrônicos finais.

A produção brasileira caracteriza-se por ser dependente da importação de partes, peças e

componentes. A balança comercial é deficitária. Ao analisar o cenário brasileiro observam-se

as seguintes características setoriais (BAMPI, 2010):

a) Indústria seguidora dos produtos mundiais;

b) Dedicada ao mercado interno com baixo coeficiente de exportação;

c) Produção de bens finais sem agregação de valor;

d) Inexistências de marcas nacionais;

e) Baixo conteúdo tecnológico.

5. O APL de Santa Rita do Sapucaí

A cidade de Santa Rita do Sapucaí está localizada geograficamente na Região Sul de Minas

Gerais. Fica distante cerca de 200 km de São Paulo, 350 km do Rio de Janeiro e 400 km de

Belo Horizonte. Segundo com o Censo Demográfico do IBGE de 2010, a cidade possui

37.364 habitantes.

A origem do APL de Santa Rita do Sapucaí, também chamado “Vale da Eletrônica”, está

associado aos esforços deliberados de formação e qualificação de mão de obra. Ao final dos

anos 50 foi criada uma escola técnica de eletrônica na cidade - a primeira da América Latina.

A criação desta foi decorrência de uma iniciativa individual de uma senhora pertencente à

antiga oligarquia rural local, Luíza Rennó Moreira. A partir de seu empreendedorismo, foi

criada em 1959 a Escola Técnica de Eletrônica “Francisco Moreira da Costa” (ETE), que

passou a ser dirigida pelos padres jesuítas (DEMATTOS, 1990; PEROBELLI, 1996;

FONTES, 2007).

Além da ETE, outra instituição de ensino importante é o Instituto Nacional de

Telecomunicações (Inatel), que atua na formação e qualificação de mão de obra em nível

superior. Criado em 1965, o instituto veio a reforçar a existência de um contingente de

trabalhadores qualificados para eletrônica e seus segmentos, assim como de empreendedores

responsáveis pela criação de diversas empresas locais.

A partir dessas condições iniciais, conformou-se no Vale da Eletrônica uma estrutura

produtiva complexa e diversificada, em que podem ser encontradas empresas produtoras de

bens eletrônicos e de diversos segmentos correlatos, como telecomunicações, informática,

segurança e equipamentos médicos-odontológicos, além da provisão de alguns tipos de peças

e componentes.

Constatou-se, que as empresas locais podem ser divididas em dois grandes grupos e quatro

subgrupos:

a) Empresas Nascentes: que se subdivide em empresas incubadas e em implementação; e

empresas em consolidação;

b) Empresas consolidadas: subdivididas entre empresas intermediárias/em estágio de

transição; e empresas maduras/ de referência.

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A despeito de a classificação proposta sinalizar na direção que as empresas situam-se em

estágios distintos de desenvolvimento, há algumas características em comum. Seu reduzido

porte quanto comparadas a suas congêneres internacionais, a atuação em inúmeros segmentos

de mercado, e a iniciativa de alunos e ex-alunos das instituições locais de ensino para a

fundação das empresas.

5.1. Empresas nascentes

Tomando inicialmente as empresas incubadas e em implementação (diferenciam-se

basicamente pelo fato das primeiras ainda não estarem completamente aptas a concorrerem no

mercado). Caracterizam-se por serem de porte bastante reduzido. Aquelas ainda em processo

de incubação geralmente são constituídas apenas por um grupo pequeno de sócios fundadores,

normalmente oriundos das instituições locais de formação de mão de obra. As que estão em

fase de implementação, além dos sócios apresentam alguns poucos funcionários. Na grande

maioria dos casos essas empresas têm como objeto de comercialização apenas um ou dois

produtos, os quais invariavelmente originam-se de esforços tecnológicos – em graus de

complexidade variados e nem sempre na fronteira tecnológica – iniciados pelos próprios

sócios nas instituições locais. Observa-se claramente que a interação com as instituições

locais, principalmente incubadoras e instituições de ensino, é uma fonte fundamental de

informação e de aprendizado tecnológico. Essa interação representa formas de suporte aos

agentes que também contribuem em alguma medida para conferir dinamismo a empresas, uma

vez que podem viabilizar casos de colaboração – quase sempre informal – para a solução de

problemas técnicos, dúvidas de caráter mercadológico, prestação de serviços diversos como a

fabricação de moldes e manufatura, esclarecimentos de questões legais, de normas e de

certificação.

Porém, com os agentes externos ao polo a capacidade de interação mais sistemática e

continuada é reduzida, e restrita a esforços de cunho comercial. Em grande parte, essa

incapacidade decorre de uma deficiência mais ampla relacionada com a inexistência de uma

estrutura empresarial consolidada. A escassez de recursos, principalmente em relação aos

recursos humanos e de escala, inviabilizam a implementação de uma estrutura empresarial

mais complexa.

Outra dimensão está associada ao perfil dos sócios fundadores, já que a grande maioria

apresenta caráter técnico, as questões relacionadas à gestão são negligenciadas. Detectou-se

também a insuficiência de fontes de financiamentos pós-desenvolvimento do produto. Apesar

das limitações e entraves, as diversas empresas desse grupo têm orientado sua atuação para

áreas e segmentos de mercado com grandes potenciais de crescimento, como segurança,

convergência em telecomunicações, eletrônica voltada à biomedicina, entre outras.

O segundo grupo de empresas entre as nascentes são as em consolidação que se caracterizam

como agentes de porte reduzido, porém que apresentam elevadas taxas de crescimento em seu

faturamento.

Em geral, os produtos não representam inovações tecnológicas de ruptura na indústria. Em

grande medida, os esforços tecnológicos que sustentaram a criação desses produtos

concentram-se no desenvolvimento de melhorias incrementais, adaptações e customizações a

partir de produtos que já são referência. Existe a ausência de esforços expressivos e

sistemáticos de atividades de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D). Grande parte dos esforços

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tecnológicos foram inicialmente desenvolvidos nas incubadoras e, em seguida, por meio de

esforços internos de desenvolvimento de produto, a partir da utilização de recursos oriundos

das agências públicas de fomento.

Vale destacar que, apesar da importância das interações e do aprendizado viabilizados pela

atividade de incubação, as empresas deste subgrupo relatam que as interações com

instituições de ensino e pesquisa locais com vistas ao fomento dos esforços tecnológicos da

empresa tem importância relativamente reduzida, especialmente quando se tratam de projetos

conjuntos de desenvolvimento. Ocorre que, em muitos casos, os esforços de pesquisa

científica empreendidos nas instituições locais de pesquisa, como é o caso do Inatel, são

tecnologicamente muito mais avançadas e, assim, não são capazes de atender suas demandas.

Outro entrave é a dificuldade das empresas absorverem os custos dos serviços tecnológicos

prestados.

Na esfera produtiva a interação das empresas deste subgrupo com os demais agentes é

bastante intensa. O que se observa é que a maioria destas empresas, devido a seu reduzido

porte, opta por terceirizar parcela substancial de suas atividades manufatureiras para outros

agentes locais.

Em suma, essas empresas estão sujeitas a restrições de acesso a recursos e capacitações que

lhes permitissem construir e gerir uma estrutura produtiva competitiva, além de confrontarem

com concorrentes bem mais consolidados no mercado, principalmente em relação ao

tamanho, à estrutura gerencial e de comercialização e à capacidade de financiamento.

5.2. Empresas consolidadas

Nesse grupo são identificados duas categorias de empresas: as intermediárias e as maduras.

As empresas intermediárias são as que se encontram em estágio de transição em direção a

uma forma de inserção mais fortalecida e sustentável no mercado. Estas quando comparadas

aos subgrupos anteriores caracterizam-se por apresentarem maior porte, estruturas produtivas

e gerenciais mais complexas, idade média mais elevada (para os padrões locais) e maior

participação e reconhecimento no mercado nacional.

Pode-se afirmar que a dinâmica de acumulação destas apresenta uma maior autonomia

relativa no que diz respeito aos condicionantes e potencialidades oriundas de sua localização.

Isto não significa que as empresas não sejam capazes de se apropriar dos benefícios da

localização, mas que sua sobrevivência não depende em si do apoio das instituições locais.

No entanto, devido à sua maior idade média, a maioria destas firmas estabeleceu-se antes da

institucionalização das incubadoras. Desse modo as capacitações tecnológicas, produtivas e

gerenciais iniciais destas empresas foram desenvolvidas de maneira mais autônoma,

beneficiando-se apenas de formas de apoio e suporte local de caráter informal.

Nestas é comum observar a presença interna de atores dedicados exclusivamente a esforços de

aprendizado tecnológico - mesmo que variando em termos de número de atores e na

complexidade das tarefas. Estes são fortemente concentrados nas tarefas de engenharia de

produto, em detrimentos das atividades de P&D.

As empresas possuem uma rede de fornecedores que transcende a esfera local, englobando

agentes dispersos tanto no território nacional quanto internacional (principalmente asiáticos).

Há também o estabelecimento de redes de comercialização dos produtos, as quais são

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importantes para as empresas, na medida em que, em sua maioria, os produtos destas

destinam-se a consumidores finais localizados principalmente no varejo.

As empresas locais, mesmo as de maior porte, ainda apresentam tamanho bastante reduzido

em relação à experiência internacional, o que as impede o maior aproveitamento das

economias de escala, de escopo e de especialização produtiva.

Em relação às atividades de produção, observa-se que diversas empresas ainda possuem um

grau de automação relativamente reduzido, uma vez que operam com máquinas e

equipamentos afastados da fronteira tecnológica e estão relativamente distantes das técnicas

mais avançadas de produção. O nível de profissionalização é em geral bastante modesto.

É preciso apontar as inadequações das fontes de financiamento como outras potenciais

ameaças à competitividade das empresas locais. Isso porque a maior parte das empresas desse

subgrupo financia sua expansão a partir de recursos acumulados enquanto que seus potenciais

concorrentes dispõem de recursos públicos subsidiados para financiar seu crescimento.

Assim, além de ser comparativamente mais oneroso, o autofinanciamento impõe limites,

devido à quantidade limitada de recursos, mesmo em um cenário econômico pujante. Ainda

que diversas empresas locais contem com recursos dos projetos de subvenção, esses

programas não permitem investimentos em elevação da capacidade produtiva ou mesmo na

manutenção de esforços sistemáticos de P&D – uma vez que são sempre vinculados a um

determinado projeto.

O segundo subgrupo das empresas consolidadas são as empresas maduras que são

consideradas de referência dentro da estrutura produtiva local. Neste estão incluídas as

empresas precursoras do Vale e que já se consolidaram como atores importantes no mercado.

Para estas, as interações locais com vistas ao aprendizado tecnológico são bastante intensas e

muitas vezes estabelecidas a partir de projetos formais de cooperação com instituições locais,

sobretudo com o Inatel.

A existência no polo, de um número amplo de fornecedores capacitados é de fundamental

importância para a sua competitividade. Isso porque ao longo de seu desenvolvimento tais

empresas optaram por adotar estruturas desverticalizadas.

São usuárias importantes e frequentes de recursos dos fundos públicos de subvenção

econômica, sobretudo da Finep e da Fapemig. Para os empresários, as ações do SINDVEL são

elementos importantes para que esses fundos continuem sendo direcionados aos projetos de

inovação.

O segundo ponto bastante destacado pelas empresas diz respeito à importância dos benefícios

fiscais relacionados com o tratamento tributário diferenciado, que permite o diferimento do

ICMS, para empresas que atuam na área eletrônica e que se encontram no município.

Já com relação às interações com os agentes de fora do polo, foram verificadas algumas

atividades importantes, como importação de insumos e matérias primas, estabelecimento de

redes de comercialização e participação em feiras. Há esforços importantes, mesmo que

pontuais, de interação com universidades e instituições de pesquisa de outras regiões

brasileiras, por meio de projetos conjuntos, com o intuito de fomentar o aprendizado

tecnológico na empresa. Outra forma importante de interação das empresas com agentes

externos se dá por meio de contatos informais, de caráter pessoal, que são estabelecidos entre

os dirigentes das empresas locais com profissionais, oriundos da cidade, de outras empresas

localizadas em outros polos da indústria eletrônica brasileira.

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Um entrave à competitividade detectado diz respeito à sua capacidade gerencial. Essa

insuficiência tem duas naturezas. Em primeiro lugar, sua fundação por técnicos e engenheiros,

que possuíam capacitações técnicas muito importantes, mas não possuíam capacidades

gerenciais semelhantes. Em segundo, a rápida expansão dessas empresas na última década o

que levou ao crescimento de forma desordenada do ponto de vista gerencial.

Por fim, outra ameaça ao desenvolvimento das empresas locais é de caráter macroeconômico,

a sistemática valorização do real frente ao dólar e a decorrente redução de preço dos produtos

concorrentes importados.

A tabela 1 apresenta as principais características das empresas que compõem o APL da

indústria eletrônica de Santa Rita do Sapucaí.

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Fonte: Elaboração própria.

Tabela 1 – tipologia das empresas de Santa Rita do Sapucaí

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6. Desafios e considerações finais

O trabalho buscou elucidar a aglomeração industrial da cidade de Santa Rita do Sapucaí,

Minas Gerais. De acordo com a literatura, a aglomeração industrial gera benefícios de

localização para as empresas, formando vantagens competitivas ligadas à mão de obra,

especialização e transbordamentos de conhecimentos. O setor de eletrônica possui um caráter

de transversalidade e está presente em países com estruturas produtivas mais consolidadas. No

Brasil seu desenvolvimento é incipiente, porém, no Vale da Eletrônica, existe um número de

empresas que juntas desenvolvem produtos em diversos nichos do setor, como segurança,

biomédicas, telefonia, entre outros.

As vantagens desse arranjo estão intimamente ligadas ao esforço de formação de mão de obra

especializada em eletrônica, de nível técnico e superior, o que reintera a noção que a

facilidade de difusão e compartilhamento de conhecimento são características próprias de tais

modelos.

Conformou-se no Vale uma estrutura produtiva bastante complexa e diversificada, com

empresas que se situam em estágios bastante distintos de desenvolvimento, mesmo que com

algumas características em comum. A apresentação e a análise do cenário atual da cidade,

através da tipologia proposta, permite identificar um conjunto de oportunidades, mas também

desafios.

Problemas de extensionismo industrial, que visam melhorias contínuas; empreendedorismo,

principalmente na gestão comercial e empresarial; financiamento; formação de mão de obra,

em áreas correlatas, como mecânica e manufatura; e acesso a informações tecnológicas e de

comércio podem ser identificadas como passíveis a intervenção de políticas públicas. Uma

vez que, como já apontado anteriormente, estas em sistemas locais de produção levam ao

reforço dos benefícios da aglomeração industrial.

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