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ELEMENTOS PARA A
CARACTERIZAÇÃO DAS EMPRESAS
DE ELETRÔNICA DO APL DE SANTA
RITA DO SAPUCAÍ
Ariana Ribeiro Costa (Usp)
Renato Garcia (Usp)
Antonio Carlos Diegues (Ufscar)
Jose Eduardo Roselino (Unisal)
O principal objetivo deste trabalho é analisar os principais fatores que
determinam a competitividade dos produtores de eletrônicos do
sistema local de produção de Santa Rita do Sapucaí. Dessa maneira, o
trabalho pretende identificar e anallisar os principais pontos fortes e
os gargalos encontrados entre as empresas locais que exercem
impactos sobre a sua competitividade. A principal suposição,
amplamente discutida na literatura, é que a aglomeração dos
produtores é capaz de proporcionar um conjunto de externalidades que
reforçar a capacidade competitiva das empresas. Para proceder a essa
análise, foi realizada uma ampla pesquisa de campo, qualitativa e de
caráter empírico, junto aos produtores locais, que permitiu levantar
seus pontos fortes e identificar alguns gargalos e entraves ao
incremento da competividade dos produtores. Os principais resultados
encontrados mostram que as diversas empresas que compõem o
sistema produtivo local possuem especificidades que não permitem que
a análise seja realizada de modo conjunto. Então, foi elaborada uma
tipologia das empresas locais, com o intuito de identificar essas
condições específicas, com evidentes implicações gerenciais e de
políticas públicas.
Palavras-chaves: estrutura produtiva, arranjo produtivo local,
eletrônica
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Bento Gonçalves, RS, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2012.
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1. Introdução
O principal objetivo deste trabalho é analisar os principais fatores que determinam a
competitividade dos produtores de eletrônicos do sistema local de produção de Santa Rita do
Sapucaí, de modo a identificar e analisar os principais pontos fortes e os gargalos encontrados
entre as empresas locais. O trabalho parte da premissa, discutida na literatura, de que a
aglomeração dos produtores é capaz de proporcionar um conjunto de externalidades que tem a
capacidade de fortalecer a competitividade das empresas. Nesse sentido, as forças locais da
aglomeração especializada dos agentes econômicos representam um importante fator para a
promoção do desenvolvimento dos produtores individuais.
Para proceder a essa análise, foi realizada uma ampla pesquisa de campo, de caráter empírico,
junto aos produtores locais. Dessa forma, foi possível coletar e organizar um conjunto de
informações que foram utilizadas para a análise da competitividade das empresas, o que
permitiu levantar pontos fortes, e identificar gargalos e entraves ao incremento da
competividade dos produtores. No entanto, verificou-se que as diversas empresas que
compõem o sistema produtivo local possuem especificidades que não permitem que a análise
seja realizada de modo conjunto. Então, foi elaborada uma tipologia das empresas com o
intuito de identificar suas condições específicas, com evidentes implicações gerenciais e de
políticas públicas.
O trabalho está dividido em seis seções, incluindo essa introdução. A segunda traz uma breve
recuperação dos principais pressupostos conceituais. Em seguida, a seção 3 apresenta os
procedimentos metodológicos e a quarta apresenta o panorama competitivo da indústria
eletrônica. Na seção 5, estão analisados e discutidos os principais resultados encontrados,
assim como a tipologia das empresas locais. Por fim, a seção 6 apresenta as considerações
finais e alguns dos principais desafios encontrados.
2. Breve revisão conceitual: os benefícios da aglomeração industrial
Há uma vasta literatura a respeito dos benefícios da concentração geográfica de produtores.
Todos esses trabalhos têm como origem o estudo pioneiro de Marshall sobre os distritos
industriais ingleses do século XIX. De acordo com Marshall (1984), as pequenas e médias
empresas localizadas dos distritos eram capazes de apresentar desempenho competitivo
superior por conta da elevada especialização produtiva das firmas locais. Assim, as economias
externas geradas pela especialização dos produtores, e pela extensiva divisão do trabalho entre
eles, compensavam, e até suplantavam, as economias internas geradas pela grande empresa
industrial.
Nesse contexto, Marshall identificou três principais fontes de vantagens competitivas dos
produtores. A mão-de-obra qualificada e as habilidades específicas que formam um conjunto
expressivo de capacitações locais. A importância da presença, e da atração, de fornecedores
especializados. E os transbordamentos locais de conhecimento, relacionados especialmente
com a elevada facilidade para a circulação de informações e o compartilhamento do
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conhecimento. Uma vez que, as estruturas produtivas localizadas são capazes de construir
elementos relacionados com a confiança mútua e pelo contato face-a-face.
A partir do trabalho de Marshall, diversos autores mais recentes apontaram os benefícios da
aglomeração industrial. Dentre os mais importantes, destacam-se Schmitz (1997); Belussi e
Gottardi (2000); Maskell (2001) e Lombardi (2003).
Schmitz (1997) ressalta que em adição às externalidades de caráter eminentemente
incidentais, decorrentes da simples concentração geográfica dos produtores, as possibilidades
de ação conjunta dos agentes podem ser um fator importante para reforçar as economias
externas locais e, assim, a competitividade dos produtores. A concentração geográfica das
empresas e instituições coligadas ao sistema local pode facilitar o estabelecimento de ações
coletivas que certamente vão atuar no sentido de reforçar os benefícios incidentais da
aglomeração econômica.
No debate brasileiro, as principais contribuições são de Cassiolato e Lastres (2001); Suzigan
et al. (2001); Fauré e Hasenclever (2007), entre outros. O elevado interesse dos estudiosos
sobre o tema esteve bastante relacionado com as amplas possibilidades de ação de políticas
públicas. Como apontaram Scott (1998) e Suzigan (2001), o papel das políticas em sistemas
locais de produção está associado com as possibilidades de reforço dos benefícios da
aglomeração das empresas, por meio da criação de mecanismos capazes de reforçar a
capacidade de geração de externalidades positivas para o conjunto dos produtores locais.
No período recente, ocorreu um interessante debate no que se refere ao papel do
conhecimento nessas estruturas produtivas. Para alguns, a ampla disponibilidade do
conhecimento gerado pelos agentes locais representava um dos mais importantes benefícios
da aglomeração.
Gertler (2003) reconhece que a proximidade geográfica é um elemento muito importante para
a difusão de informações e o compartilhamento do conhecimento, especialmente quando se
trata de conhecimentos de caráter tácito, específico e complexo. A importância da
proximidade geográfica decorre do fato que a construção do conhecimento tácito ocorre
somente dentro do contexto social, por meio da utilização de regras próprias e canais
específicos de comunicação, cuja construção é facilitada pelas interações face-a-face.
Todavia, esses canais de comunicação podem ser construídos também no seio das redes não
locais de profissionais, nas chamadas comunidades de prática, de modo que o fator mais
importante é a proximidade organizacional ou relacional entre profissionais, que pode ocorrer
ou não localmente.
3. Procedimentos metodológicos
Para alcançar os objetivos, a pesquisa partir de uma abordagem qualitativa, de caráter
empírico. Segundo Martins (2009) tal abordagem abriga uma série de técnicas de
interpretações que procuram descrever, decodificar e traduzir o fenômeno estudado. Para
Gephart (2004) tal pesquisa enfatiza os processos e significados que ocorrem naturalmente,
estuda fenômenos em ambientes nos quais eles realmente acontecem e usa o significado dos
atores sociais para entender os processos.
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Uma vez que a pesquisa visava extrair componentes, que não conseguiriam ser extraídos de
alguma base de dados, a abordagem qualitativa se caracterizou como a mais apropriada
(CASSELL ET AL., 2009; GEPHART, 2004). Foram realizadas entrevistas com agentes
locais, através de um calendário de visitas, que respeitava a diversidade e a complexidade da
estrutura produtiva local. Nesse levantamento de informações foram utilizados questionários
semiestruturados, previamente utilizados em outros esforços de pesquisas (GARCIA, 1996),
que foram adaptados às especificidades locais.
A fim de compreender a diversidade e a complexidade do sistema local foram entrevistadas
doze empresas de portes distintos e que atuam em diferentes segmentos da indústria
eletrônica, quatro instituições de ensino e duas incubadoras de empresas. A escolha das
empresas entrevistadas procurou construir uma amostra representativa da diversidade local.
Tal seleção foi feita em conjunto com o SINDVEL – Sindicato das Indústrias do “Vale da
Eletrônica”, órgão que possibilitou acesso aos dirigentes das empresas e das instituições.
Foram delimitados pontos de análises que seriam abordados nas entrevistas e consolidação do
relatório, seguindo os parâmetros:
a) Caracterização das empresas (estrutura produtiva, tamanho, faturamento);
b) Nível de esforço tecnológico (fontes de informação e aprendizado, fontes de
introdução da inovação);
c) Interação com os agentes do polo (fontes de informação, prestação de serviços,
cooperação, aprendizado, representatividade política, iniciativas conjuntas, entre
outras);
d) Interação com agentes de fora do polo (importação de insumos e matérias primas,
mercados compradores, entre outras);
e) Fontes de financiamento;
f) Entraves à competitividade;
g) Ameaças e oportunidades.
4. Panorama competitivo da indústria eletroeletrônica
O setor eletroeletrônico é constituído por um conjunto bastante extenso e diversificado de
segmentos. O mercado global de bens eletrônicos inclui os bens de informática e de
automação, equipamentos de telecomunicações, eletrônica de consumo e utilidades
domésticas e componentes eletrônicos como semicondutores.
Em alguns países em desenvolvimento, como Coréia do Sul, Taiwan e China, houve um
desenvolvimento recente da indústria eletrônica, fortemente associado aos processos de
desenvolvimento tecnológico e industrial. Do ponto de vista da distribuição da produção e da
localização dos principais atores globais nota-se que a produção de equipamentos e
componentes eletrônicos concentra-se nos países do Leste Asiático, como China, Coréia do
Sul, Taiwan e Cingapura. Estes se consolidaram como os principais provedores do mercado
internacional, ultrapassando países desenvolvidos da Tríade (Estados Unidos, Japão e União
Europeia) no ranking dos maiores produtores internacionais.
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Dentro desse contexto, o Brasil detém de 2,0 a 2,3% da produção mundial, o que o coloca na
posição de 10º maior produtor (OECD, 2008). Essa participação está associada ao seu vasto
mercado consumidor doméstico e às atividades de montagem de bens eletrônicos finais.
A produção brasileira caracteriza-se por ser dependente da importação de partes, peças e
componentes. A balança comercial é deficitária. Ao analisar o cenário brasileiro observam-se
as seguintes características setoriais (BAMPI, 2010):
a) Indústria seguidora dos produtos mundiais;
b) Dedicada ao mercado interno com baixo coeficiente de exportação;
c) Produção de bens finais sem agregação de valor;
d) Inexistências de marcas nacionais;
e) Baixo conteúdo tecnológico.
5. O APL de Santa Rita do Sapucaí
A cidade de Santa Rita do Sapucaí está localizada geograficamente na Região Sul de Minas
Gerais. Fica distante cerca de 200 km de São Paulo, 350 km do Rio de Janeiro e 400 km de
Belo Horizonte. Segundo com o Censo Demográfico do IBGE de 2010, a cidade possui
37.364 habitantes.
A origem do APL de Santa Rita do Sapucaí, também chamado “Vale da Eletrônica”, está
associado aos esforços deliberados de formação e qualificação de mão de obra. Ao final dos
anos 50 foi criada uma escola técnica de eletrônica na cidade - a primeira da América Latina.
A criação desta foi decorrência de uma iniciativa individual de uma senhora pertencente à
antiga oligarquia rural local, Luíza Rennó Moreira. A partir de seu empreendedorismo, foi
criada em 1959 a Escola Técnica de Eletrônica “Francisco Moreira da Costa” (ETE), que
passou a ser dirigida pelos padres jesuítas (DEMATTOS, 1990; PEROBELLI, 1996;
FONTES, 2007).
Além da ETE, outra instituição de ensino importante é o Instituto Nacional de
Telecomunicações (Inatel), que atua na formação e qualificação de mão de obra em nível
superior. Criado em 1965, o instituto veio a reforçar a existência de um contingente de
trabalhadores qualificados para eletrônica e seus segmentos, assim como de empreendedores
responsáveis pela criação de diversas empresas locais.
A partir dessas condições iniciais, conformou-se no Vale da Eletrônica uma estrutura
produtiva complexa e diversificada, em que podem ser encontradas empresas produtoras de
bens eletrônicos e de diversos segmentos correlatos, como telecomunicações, informática,
segurança e equipamentos médicos-odontológicos, além da provisão de alguns tipos de peças
e componentes.
Constatou-se, que as empresas locais podem ser divididas em dois grandes grupos e quatro
subgrupos:
a) Empresas Nascentes: que se subdivide em empresas incubadas e em implementação; e
empresas em consolidação;
b) Empresas consolidadas: subdivididas entre empresas intermediárias/em estágio de
transição; e empresas maduras/ de referência.
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A despeito de a classificação proposta sinalizar na direção que as empresas situam-se em
estágios distintos de desenvolvimento, há algumas características em comum. Seu reduzido
porte quanto comparadas a suas congêneres internacionais, a atuação em inúmeros segmentos
de mercado, e a iniciativa de alunos e ex-alunos das instituições locais de ensino para a
fundação das empresas.
5.1. Empresas nascentes
Tomando inicialmente as empresas incubadas e em implementação (diferenciam-se
basicamente pelo fato das primeiras ainda não estarem completamente aptas a concorrerem no
mercado). Caracterizam-se por serem de porte bastante reduzido. Aquelas ainda em processo
de incubação geralmente são constituídas apenas por um grupo pequeno de sócios fundadores,
normalmente oriundos das instituições locais de formação de mão de obra. As que estão em
fase de implementação, além dos sócios apresentam alguns poucos funcionários. Na grande
maioria dos casos essas empresas têm como objeto de comercialização apenas um ou dois
produtos, os quais invariavelmente originam-se de esforços tecnológicos – em graus de
complexidade variados e nem sempre na fronteira tecnológica – iniciados pelos próprios
sócios nas instituições locais. Observa-se claramente que a interação com as instituições
locais, principalmente incubadoras e instituições de ensino, é uma fonte fundamental de
informação e de aprendizado tecnológico. Essa interação representa formas de suporte aos
agentes que também contribuem em alguma medida para conferir dinamismo a empresas, uma
vez que podem viabilizar casos de colaboração – quase sempre informal – para a solução de
problemas técnicos, dúvidas de caráter mercadológico, prestação de serviços diversos como a
fabricação de moldes e manufatura, esclarecimentos de questões legais, de normas e de
certificação.
Porém, com os agentes externos ao polo a capacidade de interação mais sistemática e
continuada é reduzida, e restrita a esforços de cunho comercial. Em grande parte, essa
incapacidade decorre de uma deficiência mais ampla relacionada com a inexistência de uma
estrutura empresarial consolidada. A escassez de recursos, principalmente em relação aos
recursos humanos e de escala, inviabilizam a implementação de uma estrutura empresarial
mais complexa.
Outra dimensão está associada ao perfil dos sócios fundadores, já que a grande maioria
apresenta caráter técnico, as questões relacionadas à gestão são negligenciadas. Detectou-se
também a insuficiência de fontes de financiamentos pós-desenvolvimento do produto. Apesar
das limitações e entraves, as diversas empresas desse grupo têm orientado sua atuação para
áreas e segmentos de mercado com grandes potenciais de crescimento, como segurança,
convergência em telecomunicações, eletrônica voltada à biomedicina, entre outras.
O segundo grupo de empresas entre as nascentes são as em consolidação que se caracterizam
como agentes de porte reduzido, porém que apresentam elevadas taxas de crescimento em seu
faturamento.
Em geral, os produtos não representam inovações tecnológicas de ruptura na indústria. Em
grande medida, os esforços tecnológicos que sustentaram a criação desses produtos
concentram-se no desenvolvimento de melhorias incrementais, adaptações e customizações a
partir de produtos que já são referência. Existe a ausência de esforços expressivos e
sistemáticos de atividades de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D). Grande parte dos esforços
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tecnológicos foram inicialmente desenvolvidos nas incubadoras e, em seguida, por meio de
esforços internos de desenvolvimento de produto, a partir da utilização de recursos oriundos
das agências públicas de fomento.
Vale destacar que, apesar da importância das interações e do aprendizado viabilizados pela
atividade de incubação, as empresas deste subgrupo relatam que as interações com
instituições de ensino e pesquisa locais com vistas ao fomento dos esforços tecnológicos da
empresa tem importância relativamente reduzida, especialmente quando se tratam de projetos
conjuntos de desenvolvimento. Ocorre que, em muitos casos, os esforços de pesquisa
científica empreendidos nas instituições locais de pesquisa, como é o caso do Inatel, são
tecnologicamente muito mais avançadas e, assim, não são capazes de atender suas demandas.
Outro entrave é a dificuldade das empresas absorverem os custos dos serviços tecnológicos
prestados.
Na esfera produtiva a interação das empresas deste subgrupo com os demais agentes é
bastante intensa. O que se observa é que a maioria destas empresas, devido a seu reduzido
porte, opta por terceirizar parcela substancial de suas atividades manufatureiras para outros
agentes locais.
Em suma, essas empresas estão sujeitas a restrições de acesso a recursos e capacitações que
lhes permitissem construir e gerir uma estrutura produtiva competitiva, além de confrontarem
com concorrentes bem mais consolidados no mercado, principalmente em relação ao
tamanho, à estrutura gerencial e de comercialização e à capacidade de financiamento.
5.2. Empresas consolidadas
Nesse grupo são identificados duas categorias de empresas: as intermediárias e as maduras.
As empresas intermediárias são as que se encontram em estágio de transição em direção a
uma forma de inserção mais fortalecida e sustentável no mercado. Estas quando comparadas
aos subgrupos anteriores caracterizam-se por apresentarem maior porte, estruturas produtivas
e gerenciais mais complexas, idade média mais elevada (para os padrões locais) e maior
participação e reconhecimento no mercado nacional.
Pode-se afirmar que a dinâmica de acumulação destas apresenta uma maior autonomia
relativa no que diz respeito aos condicionantes e potencialidades oriundas de sua localização.
Isto não significa que as empresas não sejam capazes de se apropriar dos benefícios da
localização, mas que sua sobrevivência não depende em si do apoio das instituições locais.
No entanto, devido à sua maior idade média, a maioria destas firmas estabeleceu-se antes da
institucionalização das incubadoras. Desse modo as capacitações tecnológicas, produtivas e
gerenciais iniciais destas empresas foram desenvolvidas de maneira mais autônoma,
beneficiando-se apenas de formas de apoio e suporte local de caráter informal.
Nestas é comum observar a presença interna de atores dedicados exclusivamente a esforços de
aprendizado tecnológico - mesmo que variando em termos de número de atores e na
complexidade das tarefas. Estes são fortemente concentrados nas tarefas de engenharia de
produto, em detrimentos das atividades de P&D.
As empresas possuem uma rede de fornecedores que transcende a esfera local, englobando
agentes dispersos tanto no território nacional quanto internacional (principalmente asiáticos).
Há também o estabelecimento de redes de comercialização dos produtos, as quais são
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importantes para as empresas, na medida em que, em sua maioria, os produtos destas
destinam-se a consumidores finais localizados principalmente no varejo.
As empresas locais, mesmo as de maior porte, ainda apresentam tamanho bastante reduzido
em relação à experiência internacional, o que as impede o maior aproveitamento das
economias de escala, de escopo e de especialização produtiva.
Em relação às atividades de produção, observa-se que diversas empresas ainda possuem um
grau de automação relativamente reduzido, uma vez que operam com máquinas e
equipamentos afastados da fronteira tecnológica e estão relativamente distantes das técnicas
mais avançadas de produção. O nível de profissionalização é em geral bastante modesto.
É preciso apontar as inadequações das fontes de financiamento como outras potenciais
ameaças à competitividade das empresas locais. Isso porque a maior parte das empresas desse
subgrupo financia sua expansão a partir de recursos acumulados enquanto que seus potenciais
concorrentes dispõem de recursos públicos subsidiados para financiar seu crescimento.
Assim, além de ser comparativamente mais oneroso, o autofinanciamento impõe limites,
devido à quantidade limitada de recursos, mesmo em um cenário econômico pujante. Ainda
que diversas empresas locais contem com recursos dos projetos de subvenção, esses
programas não permitem investimentos em elevação da capacidade produtiva ou mesmo na
manutenção de esforços sistemáticos de P&D – uma vez que são sempre vinculados a um
determinado projeto.
O segundo subgrupo das empresas consolidadas são as empresas maduras que são
consideradas de referência dentro da estrutura produtiva local. Neste estão incluídas as
empresas precursoras do Vale e que já se consolidaram como atores importantes no mercado.
Para estas, as interações locais com vistas ao aprendizado tecnológico são bastante intensas e
muitas vezes estabelecidas a partir de projetos formais de cooperação com instituições locais,
sobretudo com o Inatel.
A existência no polo, de um número amplo de fornecedores capacitados é de fundamental
importância para a sua competitividade. Isso porque ao longo de seu desenvolvimento tais
empresas optaram por adotar estruturas desverticalizadas.
São usuárias importantes e frequentes de recursos dos fundos públicos de subvenção
econômica, sobretudo da Finep e da Fapemig. Para os empresários, as ações do SINDVEL são
elementos importantes para que esses fundos continuem sendo direcionados aos projetos de
inovação.
O segundo ponto bastante destacado pelas empresas diz respeito à importância dos benefícios
fiscais relacionados com o tratamento tributário diferenciado, que permite o diferimento do
ICMS, para empresas que atuam na área eletrônica e que se encontram no município.
Já com relação às interações com os agentes de fora do polo, foram verificadas algumas
atividades importantes, como importação de insumos e matérias primas, estabelecimento de
redes de comercialização e participação em feiras. Há esforços importantes, mesmo que
pontuais, de interação com universidades e instituições de pesquisa de outras regiões
brasileiras, por meio de projetos conjuntos, com o intuito de fomentar o aprendizado
tecnológico na empresa. Outra forma importante de interação das empresas com agentes
externos se dá por meio de contatos informais, de caráter pessoal, que são estabelecidos entre
os dirigentes das empresas locais com profissionais, oriundos da cidade, de outras empresas
localizadas em outros polos da indústria eletrônica brasileira.
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Um entrave à competitividade detectado diz respeito à sua capacidade gerencial. Essa
insuficiência tem duas naturezas. Em primeiro lugar, sua fundação por técnicos e engenheiros,
que possuíam capacitações técnicas muito importantes, mas não possuíam capacidades
gerenciais semelhantes. Em segundo, a rápida expansão dessas empresas na última década o
que levou ao crescimento de forma desordenada do ponto de vista gerencial.
Por fim, outra ameaça ao desenvolvimento das empresas locais é de caráter macroeconômico,
a sistemática valorização do real frente ao dólar e a decorrente redução de preço dos produtos
concorrentes importados.
A tabela 1 apresenta as principais características das empresas que compõem o APL da
indústria eletrônica de Santa Rita do Sapucaí.
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Fonte: Elaboração própria.
Tabela 1 – tipologia das empresas de Santa Rita do Sapucaí
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6. Desafios e considerações finais
O trabalho buscou elucidar a aglomeração industrial da cidade de Santa Rita do Sapucaí,
Minas Gerais. De acordo com a literatura, a aglomeração industrial gera benefícios de
localização para as empresas, formando vantagens competitivas ligadas à mão de obra,
especialização e transbordamentos de conhecimentos. O setor de eletrônica possui um caráter
de transversalidade e está presente em países com estruturas produtivas mais consolidadas. No
Brasil seu desenvolvimento é incipiente, porém, no Vale da Eletrônica, existe um número de
empresas que juntas desenvolvem produtos em diversos nichos do setor, como segurança,
biomédicas, telefonia, entre outros.
As vantagens desse arranjo estão intimamente ligadas ao esforço de formação de mão de obra
especializada em eletrônica, de nível técnico e superior, o que reintera a noção que a
facilidade de difusão e compartilhamento de conhecimento são características próprias de tais
modelos.
Conformou-se no Vale uma estrutura produtiva bastante complexa e diversificada, com
empresas que se situam em estágios bastante distintos de desenvolvimento, mesmo que com
algumas características em comum. A apresentação e a análise do cenário atual da cidade,
através da tipologia proposta, permite identificar um conjunto de oportunidades, mas também
desafios.
Problemas de extensionismo industrial, que visam melhorias contínuas; empreendedorismo,
principalmente na gestão comercial e empresarial; financiamento; formação de mão de obra,
em áreas correlatas, como mecânica e manufatura; e acesso a informações tecnológicas e de
comércio podem ser identificadas como passíveis a intervenção de políticas públicas. Uma
vez que, como já apontado anteriormente, estas em sistemas locais de produção levam ao
reforço dos benefícios da aglomeração industrial.
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