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ISSN 2177-8892 2021 EDUCAÇÃO SUPERIOR AGRÍCOLA, MODERNIZAÇÃO CAPITALISTA E INTERFERÊNCIA ESTRANGEIRA. O CASO DA ESALQ-USP, 1960 A 1980. Rodrigo Sarruge Molina Doutorando na Faculdade de Educação (UNICAMP) Departamento de Filosofia e História da Educação (DEFHE) GT História, Sociedade e Educação no Brasil (HISTEDBR) Financiamento: CAPES [email protected] INTRODUÇÃO Este texto é baseado no atual projeto de doutorado que o pesquisador esta desenvolvendo no programa de pós-graduação da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) sob orientação do livre docente José Luís Sanfelice. O objetivo do estudo é entender a História da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” da Universidade de São Paulo entre as décadas de 1960 e 1980, período em que ocorreu um amplo processo de expansão da educação superior agronômica no Brasil. Este processo foi materializado com a inauguração de 40 cursos e a ampliação dos já existentes, quando, por exemplo, a ESALQ/USP tornou-se uma das grandes referencias nacionais em educação e pesquisa ao sediar um dos primeiros cursos de pós-graduação (stricto sensu) na área das ciências agrárias em 1964 por meio do financiamento de entidades nacionais (Fapesp, CNPq), estadunidenses (USAID e Rockfeller) e internacionais, sob “direção” ianque (ONU-FAO e IICA-OEA). Entende-se que este fenômeno esteve inserido em um contexto amplo conhecido como “Revolução verde”, quando o campo brasileiro passou por um processo de “modernização capitalista1 por meio de altos investimentos na aquisição de tratores, fertilizantes, agrotóxicos, educação e pesquisa que resultaram na expropriação indígena e camponesa, concentração e compra de terras por empresas multinacionais, poluição do 1 Para Prado Junior (1979, p. 9), “se houve alguma modificação (...)foi no sentido de consolidar, repetir sob novas formas e estender os velhos padrões, no fundamental, do passado colonial, isto é, o fornecimento e disponibilidade de mão-de-obra de fácil exploração e custo mínimo”.

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2021

EDUCAÇÃO SUPERIOR AGRÍCOLA, MODERNIZAÇÃO CAPITALISTA E

INTERFERÊNCIA ESTRANGEIRA. O CASO DA ESALQ-USP, 1960 A 1980.

Rodrigo Sarruge Molina

Doutorando na Faculdade de Educação (UNICAMP)

Departamento de Filosofia e História da Educação (DEFHE)

GT História, Sociedade e Educação no Brasil (HISTEDBR)

Financiamento: CAPES

[email protected]

INTRODUÇÃO

Este texto é baseado no atual projeto de doutorado que o pesquisador esta

desenvolvendo no programa de pós-graduação da Faculdade de Educação da Universidade

Estadual de Campinas (UNICAMP) sob orientação do livre docente José Luís Sanfelice. O

objetivo do estudo é entender a História da Escola Superior de Agricultura “Luiz de

Queiroz” da Universidade de São Paulo entre as décadas de 1960 e 1980, período em que

ocorreu um amplo processo de expansão da educação superior agronômica no Brasil. Este

processo foi materializado com a inauguração de 40 cursos e a ampliação dos já existentes,

quando, por exemplo, a ESALQ/USP tornou-se uma das grandes referencias nacionais em

educação e pesquisa ao sediar um dos primeiros cursos de pós-graduação (stricto sensu) na

área das ciências agrárias em 1964 por meio do financiamento de entidades nacionais

(Fapesp, CNPq), estadunidenses (USAID e Rockfeller) e internacionais, sob “direção”

ianque (ONU-FAO e IICA-OEA).

Entende-se que este fenômeno esteve inserido em um contexto amplo conhecido

como “Revolução verde”, quando o campo brasileiro passou por um processo de

“modernização capitalista”1 por meio de altos investimentos na aquisição de tratores,

fertilizantes, agrotóxicos, educação e pesquisa que resultaram na expropriação indígena e

camponesa, concentração e compra de terras por empresas multinacionais, poluição do

1 Para Prado Junior (1979, p. 9), “se houve alguma modificação (...)foi no sentido de consolidar, repetir sob

novas formas e estender os velhos padrões, no fundamental, do passado colonial, isto é, o fornecimento e

disponibilidade de mão-de-obra de fácil exploração e custo mínimo”.

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meio ambiente e nossa dependência cultural, visto que dentro da divisão internacional do

trabalho o “suporte” estrangeiro em tecnologia, educação agronômica e pesquisas

científicas eram ideologicamente e materialmente determinadas.

Em suma, pretende-se examinar todo este processo de “subordinação” e

“modernização capitalista conservadora” e suas contradições, quando, para além da

modernização, o Brasil sofreu com a perversidade imperialista que visou lucrar, eliminar os

modelos de desenvolvimento alternativos.

1. JUSTIFICATIVAS

Por que estudar a “História da Educação Agrícola” por meio da Escola Superior de

Agricultura “Luiz de Queiroz” da Universidade de São Paulo (ESALQ/USP)?

Acreditamos que estudar esta instituição pode colaborar para a compreensão da

configuração e re-configuração da classe dominante brasileira, em especial sua fração

ruralista e quais eram seus projetos educacionais.

De uma instituição quase falida, a escola se consolidou, no decorrer do século XX

como um centro estratégico da classe dominante para a formação de quadros para a direção

do Estado e da agricultura nacional. Foram graduados no campus de Piracicaba: 9 Ministros

Federais de Agricultura, Pecuária e Abastecimento, 22 Secretários de Agricultura e

Abastecimento do Estado de São Paulo, 4 Secretários do Estado de São Paulo e 5 Ministros

e Secretários de Estado Interinos. Os últimos esalqueanos na administração do Ministério

da Agricultura foram: Roberto Rodrigues (01/01/2003 a 30/06/2006) e Luiz Carlos Guedes

Pinto (03/07/2006 a 22/03/2007). Recentemente, José Graziano da Silva formado na escola

em 1972, foi eleito para assumir a gestão de 2012 a 2015 como Diretor Geral da

Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO).

Entende-se que este é um dos pontos fundamentais do estudo da ESALQ/USP, visto

que, entender seu sentido histórico é também entender a formação educacional e ideológica

dos quadros de direção do Estado brasileiro. Atualmente, no campo da História, o estudo

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mais aprofundado e crítico da formação ou redefinição da classe dominante brasileira pouca

curiosidade tem despertado. Tal postura, contribui para reificar a própria noção de classe

dominante – “banalizada enquanto noção vazia e abstrata”(MENDONÇA, 2000, p.1).

O Estudo também se atentará para a relação entre a escola e a produção agrícola,

pois, para além de formadora de quadros para a administração do Estado, a ESALQ/USP

também se tornou uma das principais instituições formadoras de profissionais para o setor

agroindustrial, posicionando-se atualmente como uma das bases ideológicas do

“agribusiness”2. Segundo o diário oficial paulista de 2001 (resolução SAA – 14, de 15-5-

2001), o governo do Estado de São Paulo elegeu o agronegócio como “O Negócio de São

Paulo” e a “ESALQ” base deste desenvolvimento do agronegócio do Estado de São Paulo e

do Brasil”(GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO, 2001).

Dentro de nosso recorte cronológico proposto, 1960 a 1983, também entendemos

que nosso estudo pode contribuir para a maior compreensão da relação entre a ditadura

militar e a educação superior agrícola e o avanço de agências estrangeiras, especialmente

dos Estados Unidos, que visaram orquestrar o processo de modernização capitalista do

campo brasileiro.

2.DELIMITAÇÃO DO PROBLEMA

Historicamente, a ESALQ/USP foi uma instituição quase extinta em 1904 e teve

grande ascensão com destaque internacional entre os anos de 1960 e 1980, período em que

uma grande soma de capitais internacionais e nacionais foram investidos na ampliação de

instituições de ciências agrárias já existentes, como foi o caso da ESALQ/USP, ou na

inauguração de novos programas educacionais por todo o Brasil.

2 Além das instituições oficiais (CAPES, FAPESP, CNPQ), empresas privadas estrangeiras e nacionais

também investem capitais na ESALQ/USP, visando retorno para seu sistema produtivo. Entre as principais

investidoras estão a Caterpillar, Monsanto, Lannes & Hoffmann, ABS Quality Evaluations, Votorantim

Celulose e Papel (VCP), Suzano Papel e Celulose, Grupo Marchiori, Massey Ferguson, John Deere, New

Holland, Serrana, Syngenta, AGCO Corporation.

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Entre 1910 e 1929 diversas escolas de Agronomia e Veterinária foram

criadas. Elas chegaram a atingir o número de 20, pelo País afora (Lima et

alli, 1961). Muitas delas estão hoje extintas. Elas funcionaram ora como

cursos de agronomia, ora de Veterinária, ora como ambos. Dos cursos

criados entre 1930 e 1961, permaneceram somente seis de Veterinária e

dois de Agronomia: mas, a partir de 1961, ocorre verdadeira proliferação

de escolas superior e, além disso, surgem novos cursos de Engenharia

Florestal, Zootecnia e Engenharia Agrícola (Capdeville, 1991, p. 14)

Este processo histórico também é conhecido como “Revolução Verde”, quando o

“capitalismo imperialista” aprofundou suas relações no campo brasileiro. Octavio Ianni nos

ajuda a entender este contexto histórico por meio da citação abaixo.

A inclusão da agricultura, em geral, na política governamental de

exportação a qualquer custo, levou o poder estatal a favorecer, sob todas

as formas, os negócios das empresas que se criavam ou estavam

funcionando no setor. Criaram-se estímulos e favores fiscais e creditícios

para a formação, expansão, crescimento, aperfeiçoamento ou

modernização da empresa agrícola, pecuária, extrativista ou

agroindustrial. Tanto a agricultura intensiva como a extensiva receberam

favores e estímulos fiscais e creditícios, econômicos e políticos de bancos,

superintendências e fundos pertencentes ao Estado, e postos à disposição

da empresa nacional e estrangeira. A política de crédito rural adotada

pelos governos militares situa-se nesse programa de desenvolver intensiva

e extensivamente o capitalismo na agricultura do país (...) A agricultura

foi transformada em um mercado importante e crescente para a produção

do setor industrial, principalmente máquinas, implementos agrícolas,

fertilizantes e defensivos. Ao mesmo tempo o capital industrial ainda se

beneficiava da produção agrícola devido aos fornecimentos de gêneros

alimentícios aos assalariados urbanos, em geral, e ao proletariado

industrial, em especial (IANNI, 1981, p. 47 e 90).

Entre as década de 1960 e 1980, o Estado brasileiro inaugurou 40 instituições

escolares de ensino superior agrícola, sendo que destas, apenas 1 escola encerrou suas

atividades3. Dinâmica reversa se encontra ao analisar os dados históricos entre as décadas

de 1870 a 1950, quando o Brasil vivenciou em 80 anos de História, somente 30

inaugurações de escolas agrícolas superiores que resultaram em 18 falências. (Capdeville,

3 Década de 60 (UFP, UFSM, FUB, FAMESF, UFGO, FCABJ/UNESP, FCAVJ/UNESP, ESAM, FPE);

Década de 70 (UFES, FFALM, Patos, UFAL, UEMA, ESACMA, ESAPP, UFMT, UFSC, FUA, UFPI,

FUEM, FAT/FUnBA, UEL, UFMS, UT, PUC/RS); Década de 80 (UDESC, ESUCARV, FEIS/UNESP,

UEPG, UFA, ESAI, FESIT, UESB, FCAA, UFU, FAI, UNIJUI, FAZU, UNIFENAS)

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1991, pp. 163-64). Nesse sentido, é possível afimar que a expansão do ensino superior

agrícola entre os anos de 1960 e 1980 esta relacionado com o avanço do capitalismo no

campo e a necessidade de constituir pesquisa e mão-de-obra especializada para

supervisionar este processo economico. Segundo, Brumer e Santos:

Diversos autores caracterizam o período de governo militar que vai de

1965 até 1979, como de `modernização conservadora´, no qual o Estado

assumiu um papel importante na indução da modernização da agricultura

através de créditos subsidiados. Como indica Martine (1987), `o novo

modelo apoiava-se tanto na oligarquia rural preocupada com a

efervescência dos movimentos sociais no campo, como nos setores mais

modernos do capital urbano interessados na ampliação do seu raio de

atuação”. Como meta final, o modelo visava a internacionalização da

economia brasileira e a acelaração do processo de industrialização. (...)As

políticas de modernização favoreceram as culturas destinadas à

exportação e/ou às agroindústrias, tais como cana-de-açúcar, café, trigo e

soja, deixando num plano secundário a produção de gêneros de consumo

da população de renda mais baixa, tais como feijão e mandioca.”

(BRUMER e SANTOS, 1998, p. 21)

Dentro desta dinâmica histórica, também pretendemos examinar as contradições,

como por exemplo, a repressão no período da ditadura militar contra os projetos

alternativos a “modernização capitalista subordinada”. Dentro da ESALQ/USP

encontramos evidências de prisão de alunos, o corte de verbas para professores e a

vigilância do aparelho Estatal e estudantil de direita contra o movimento estudantil de

esquerda. Já em nível nacional, as contradições ficam evidentes com a penetração extensiva

do capitalismo imperialista e monopolista no campo, fenômeno que colaborou na

concentração de terras e a luta por sua posse.

É principalmente a luta pela terra que gera pendências e conflitos entre

índios e posseiros, índios e grileiros, posseiros e grileiros ou índios,

posseiros, grileiros, latifundiários, fazendeiros e empresários. Nessas

pendências e conflitos, entram também jagunços, pistoleiros, policiais,

advogados e outros membros da burocracia privada e pública. Em geral o

resultado das lutas é a expansão da grande propriedade, com a expulsão

ou subordinação de indígenas, sitiantes e colonos (IANNI, 1986, p. 95).

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Nesse processo, observou-se a intensificação da exploração da força de trabalho

assalariada no mundo agrário, aumentando os problemas entre os opressores (proprietários)

e oprimidos (trabalhadores).

O maior peso da ditadura caiu sobre a classe operária, urbana e rural.

(...)Houve intervenções e fechamentos de sindicatos operários urbanos e

rurais, as ligas camponesas foram simplesmente apagadas dos seus

lugares pela brutalidade da repressão; houve prisões, processos,

cassações, sumiços e mortes. Há os que ficaram mutilados para sempre.

Muitos “mortos sem sepultura”. O aparelho repressivo “trucidou líderes

camponeses paraibanos em terras de Pernambuco, jogando seus

cadáveres no mato”. Em muitos, muitos casos “nunca se soube, ao certo

a identidade dos mortos” (...)Foram muitos os trabalhadores rurais,

camponeses e operários presos, torturados, acidentados, desaparecidos,

assassinados” (IANNI, 1981, pp. 99-100)

3. A ESALQ/USP na Guerra Fria.

Neste contexto de “modernização” capitalista no campo e as ampliações e

inaugurações de instituições de educação e pesquisas agronômicas no Brasil, retratado com

a abertura de 40 cursos (1960-1980), ocorreram grandes articulações internacionais e

bilaterais na ESALQ/USP.

No pós-segunda Guerra, ocorreram alterações nas relações políticas e econômicas

internacionais. Os Estados Unidos da América e a União das Repúblicas Socialistas

Soviéticas constituíram-se como superpotências, modificando as relações e o mapa

geopolítico internacional. Um dos fenômenos observados foi o surgimento de novas nações

e novas organizações internacionais como Organizações das Nações Unidas (ONU), Banco

Mundial (BID) e o Fundo Monetário Internacional (FMI), criados em 1945, com o discurso

de manter a paz mundial e o intercambio entre os países do mundo.

Contraditoriamente, após estas institucionalizações cujos objetivos seriam criar uma

nova ordem de paz, as grandes potências, implantaram, na prática, uma grande corrida

armamentista, principalmente atômica, visando o controle e hegemonia do globo. Em

decorrência disso, houve grande divisão geopolítica do globo entre um ocidente capitalista

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liderado pelos EUA e um oriente comunista, sob orientação da URSS. (HOBSBAWN,

1995).

Este contexto internacional, conhecido por Guerra Fria, teve reflexos no

posicionamento da instituição ESALQ/USP, como mostra uma analise preliminar de

documentos que se encontram nos arquivos do prédio central e no museu “Luiz de

Queiroz”. Estas fontes evidenciam que a instituição aprofundou suas relações com

organismos internacionais como: Organização das Nações Unidas para Agricultura e

Alimentação (FAO-ONU), o Centro Interamericano de Ciências Agrícolas da Organização

dos Estados Americanos (IICA-OEA), o Escritório Técnico de Agricultura Brasil – Estados

Unidos (ETA-USAID), Ohio State University e Fundação RockFeller. Segundo Capdeville

(1991):

(...)o Escritório Técnico de Agricultura (ETA/USAID) desempenhou

importante papel, para as escola de agronomia e Veterinária, entre 1955 e

1968. Sua participação foi de especial importância no treinamento de

professores, na aquisição de equipamentos, no desenvolvimento da

pesquisa e na criação dos cursos de pós-graduação stricto sensu. Por meio

dele estabeleceu-se intenso intercâmbio de professores e técnicos entre

universidades brasileiras e norte-americanas, na área agrária. O

desenvolvimento quantitativo e qualitativo dos cursos da área de ciências

agrárias ocorrido na década de sessenta muito deve às ações do Ponto IV4,

por meio do Projeto ETA-555. (CAPDEVILlLE 1991, p. 93).

Por trás destas instituições internacionais como ONU e OEA estava o Banco

Mundial, que no final da década de 1960, entendera que deveria investir nas periferias

visando seu crescimento econômico articulado com o combate a miséria, aspectos que

evitariam “distúrbios” revolucionários que ameaçariam a hegemonia capitalista, tais como

aconteceu em Cuba em 1959.

4 O Ponto IV tratou da assistência técnica aos paises em desenvolvimento. Segundo Capdeville (1991), à

imagem dos programas de assistência técnica e financeira aos paises da Europa atingidos pela segunda guerra

mundial (Plano Marshall) e ao Japão, e já no contexto da guerra fria, sua proposta visava impedir o

deslocamento dos países subdesenvolvidos para a órbita comunista. 5 Projeto ETA-55 foi um convênio entre universidades brasileiras e estadunidenses que objetivaram implantar

a pós-graduação em ciências agronômicas no Brasil. (Capdeville, 1991)

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Este arrazoado de caráter humanitário explica apenas uma parte do

problema. A preocupação do Banco em relação á marginalização

econômica deu-se também pelas relações sociais que eclodiram no

Terceiro Mundo, marcadamente na América Latina, a partir da década de

60. Neste caso, as medidas voltadas para a distribuição mais justa da

riqueza não constituíam apenas `um objetivo moral mas, antes de tudo,

um imperativo político´ para resguardar a estabilidade do mundo

ocidental, segundo o então presidente do Banco (McNamara apud

Fonseca, 2000)

Outro exemplo foi a Organização das Nações Unidas para a educação (UNESCO),

que instrumentalizada pelo bloco capitalista, chefiados pelos EUA, visavam influenciar

todos os países do globo por meio de políticas de ajuda, objetivando forjar ideologicamente

o mundo para o capitalismo, contrários, portanto, ao crescimento socialista sob liderança

soviética. Nesse sentido, organizavam todos os anos conferências gerais, reuniões regionais

para debater o ensino, a educação de base, a educação de adultos, o combate ao

analfabetismo e a melhoria na formação de professores (MARCÍLIO, 2005, p. 154).

Foi neste contexto histórico, a década de 60, que os convênios bilaterais e

internacionais foram aprofundados na ESALQ/USP. A instituição viveu uma grande

expansão quando o campus passou a abrigar o Centro de Energia Nuclear na Agricultura

(CENA) e inaugurou seus primeiros cursos de pós-graduação. Estes cursos e centros de

pesquisa criados no pós-guerra no campus USP de Piracicaba tiveram grande participação

ideológica e financeira de agrônomos estadunidenses.

(...)em 19 de abril de 1963 firma-se um convênio entre o Estado de São

Paulo, a Universidade de São Paulo, a Escola Superior de Agricultura

Luiz de Queiroz, de um lado, e, de outro, a Agência para o

Desenvolvimento Internacional, dos Estados Unidos (USAID/Brasil), com

a participação do representante brasileiro do ponto IV, Engenheiro-

Agrônomo Luiz Simões Lopes. O item II do convênio estabelece suas

finalidades, destacando-se a primeira : 1. Adaptar o ensino, a pesquisa e a

educação do lavrador na ESALQ, ao padrão do sistema norte-americano

de `Land Grant Colleges” (CAPDEVILLE, 1991, p. 98)

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Segundo Eurípides Malavolta6, um dos primeiros professores do CENA-ESALQ, as

intervenções das agências estadunidenses foram personificadas na figura do professor C.C.

Delwiche da Universidade da Califórnia, que fundamentou o Centro de Energia Nuclear na

Agricultura (CENA), inaugurado em 1966.

O que estava ocorrendo era o desdobramento natural da política

econômica de desenvolvimento capitalista dependente – ou de economia

aberta que os governos ditatoriais começaram a pôr em prática desde

1964, em termos agressivos e repressivos. A idéia de “economia aberta”

que fundamentou o chamada “modelo econômico” brasileiro desde 1964,

foi inspirada e alimentada pelos interesses da grande empresa imperialista.

A rigor, o “modelo” e o “milagre” econômicos, de que falam os

tecnocratas, ideólogos e cronistas, não foram senão os produtos da ampla

captura do poder estatal do país pelo capital monopolista. Por isso, e pela

forma agressiva e repressiva com que a ditadura se exerce sobre o

proletariado industrial e agrícola, é que o Golpe de Estado de 1964 ficou

na História do Brasil e da dominação imperialista no Brasil. (IANNI,

1986, p. 100).

Na “Luiz de Queiroz” as intervenções estadunidenses também eram sucedidas por

meio da fundação Rockfeller. Para prosseguir o projeto ideológico iniciado nos EUA, a

fundação doava equipamentos aos ex-bolsistas da escola que estudavam nos Estados

Unidos e voltavam para o Brasil prosseguindo as diretrizes da agricultura ianque.

Com a proclamação da Doutrina Truman, os governos dos Estados Unidos

aprofundaram a política imperialista de intervenção em todo globo terrestre, legitimandos

pelo “destino manifesto”7 e o discurso de defesa da “liberdade” e “democracia”, que

supostamente estariam sendo ameaçados pela expansão comunista.

Em nível nacional, esta intervenções estadunidenses também foram forjas por meio

do Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD), fundado em maio de 1959, a

organização colaborou para a preparação ideológica para o golpe de 1964. De acordo com

Saviani, esta entidade foi:

6 http://www.cena.usp.br/historico/historicopage3.htm (acessado em 20/7/2010)

7 Destino Manifesto é a ideologia que defende a escolha divina do povo dos Estados Unidos para comandar o

mundo. (KARNAL, 2001; NARO, 1987)

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(...)a primeira organização empresarial especificamente voltada para a

ação política. Sua finalidade explícita era combater o comunismo

(...)Fundado por Ivan Hasslocher, de quem se dizia que era agente da

Central de Inteligência dos Estados Unidos (CIA), órgão de espionagem

do governo americano, o IBAD era financiado por grandes empresas

nacionais e internacionais, especialmente norte-americanas. Suas ações

caracterizavam por intensa propaganda e pela interferência nos bastidores

da política, mediante financiamento de candidatos para as eleições

legislativas e para os governos estaduais, lançando mão, também, do

recurso ao aliciamento e compra de parlamentares. (...)Outra investida dos

empresários, esta de maior duração e de mais amplas conseqüências no

âmbito educacional, foi o instituto de Pesquisas e Estudos sociais (IPES)

(SAVIANI, 2007, p. 339) .

No campo da educação agrícola, em julho de 1960 foi criada na ESALQ/USP a

“Associação Brasileira de Educação Agrícola Superior” (ABEAS). Nos primeiros anos de

existência, esta associação teve seu funcionamento atrelado ao Escritório Técnico de

Agricultura Brasil – Estados Unidos – ETA/USAID, na cidade do Rio de Janeiro, ali

permanecendo no período de 1965 a 19688, ano em que findavam as atividades do ETA no

Brasil.

Após ser amparada pela USAID, a ABEAS passou a ser sediada no escritório do

Instituto Interamericano de Ciências Agrícolas (IICA-OEA) de 1970 a 1981, também no

Rio de Janeiro. A ABEAS tinha a função técnica e política de conduzir o ensino agrícola

nacional por meio das diretrizes estadunidenses (USAID e OEA, sob direção ianque).

Segundo a página eletrônica da instituição9, a ABEAS: “Participou e influenciou nos

processos de federalização de diversas faculdades de ciências agrárias e introduziu a

cooperação entre as IES e organismos como o IICA-OEA e as universidades norte-

americanas”.

(...)o Instituto Interamericano de Ciências Agrárias (IICA), da

Organização dos Estados Americanos (OEA) (...)desenvolveu várias

ações, principalmente em convênio com a AEAVB/ABEAS, promovendo

o treinamento de professores, apoiando as unidades de apoio pedagógico

8 Também em 1968 foi decretada à conhecida “lei do boi” (Lei n

o 5.465, de 3/7/1968), “que reservava 50%

das vagas do vestibular das instituições de ensino agrícola superior para agricultores e filhos de agricultores”.

(Capdeville, 1991) 9 http://www.abeas.com.br/wt/criacao.php (acessado em 6/5/2011)

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(UAPs) e fornecendo infra-estrutura à AEAVB/ABEAS. A ação do IICA

foi especialmente importante na década de sessenta, mas em 1959 já

sugeria a criação, com seu apoio, de mestrado na área de Zootecnia, em

Minas Gerais, com a colaboração das Escolas Superiores de Agricultura

de Viçosa e a Escola Superior de Veterinária de Belo Horizonte e com a

participação do Instituto de Zootecnia de Minas Gerais e do departamento

Nacional de Produção Animal do Ministério da Agricultura (Capdeville,

1991, p. 94).

A ESALQ/USP entre os anos de 1964 e 1972, diferente de sua gênese entre os anos

de 1881 a 1901 e suas primeiras experiências na primeira República, quadra em que

percalços de toda ordem surgiram e se repetiam, principiou com firmeza em 1964 um dos

primeiros programas de pós-graduação (stricto sensu) na área de ciências agrárias na

América Latina. Inicialmente o programa era composto por 6 cursos nas áreas de:

Experimentação e Estatística (atualmente Estatística e Experimentação Agronômica),

Fitopatologia, Genética e Melhoramento de Plantas, Mecânica, Motores e Máquinas

Agrícolas (desativado em 1970), Nutrição de Plantas e Solos. Ainda nos anos 60, novos

cursos foram criados: Ciências Sociais Rurais (1966), Nutrição Animal e Pastagens (1966,

atualmente Ciência Animal e Pastagens), Entomologia (1968), Fitotecnia (1968); em 1969,

a ESALQ/USP foi divulgada nacionalmente como centro de excelência no

desenvolvimento de pós-graduação e pesquisa em Ciências Agrárias, título concedido pelo

CNPq. Na graduação as inovações foram a aberturas dos cursos de economia doméstica em

1967 e engenharia florestal em 1972. (A PÓS-GRADUAÇÃO DA ESALQ, 2004, p. 23).

Estes cursos, teriam a função de “formar a mão-de-obra especializada requerida pelas

empresas e preparar os quadros dirigentes do país” (SAVIANI, 2007, p. 340).

Essa iniciativa veio ao encontro das necessidades de formação de

doutores para prover as instituições de ensino superior do País e, também,

a recém criada Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa),

que iniciou oficialmente suas atividades em 1973, congregando 830

pesquisadores oriundos de institutos de pesquisa, dos quais 17% tinham

pós-graduação, sendo apenas dois doutores. À época, a Diretoria da

Embrapa decidiu dar prioridade à capacitação de seus técnicos em escolas

estrangeiras e brasileiras, entre as quais figurou a Esalq. (A PÓS-

GRADUAÇÃO DA ESALQ, 2004, p. 25).

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2032

Paralelo ao desenvolvimento do ensino agrícola, especialmente o superior, foram

forjadas instituições destinadas à pesquisa agronômica visando difusão da tecnologia

agrícola “com programas de animação rural ou “extenção rural”. Assim, o Estado brasileiro criou

a Associação Brasileira de Crédito e Assistência Rural (ABCAR), que, a partir de 1973, passou a

chamar-se Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMBRATER) e a

Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), também em 1973.

(Capdeville, 1991, p. 15)

Neste contexto histórico, a ESALQ/USP reorganizou sua estrutura pedagógica e

administrativa vigente desde 1963, quando as 23 cadeiras professorais foram transformadas

no ano de 1970 em 15 departamentos (Perecin, 2004). Desde 1901, a instituição era

organizada por meio das cadeiras professorais, no entanto, devido a reforma empreendida

nas unidades da Universidade de São Paulo em 1970, as disciplinas organizadas em

cadeiras professorais foram transformadas em departamentos. Por exemplo, a cadeira de

Agricultura juntamente da de Horticultura e suas respectivas seções técnicas e

disciplinares, foram transformadas no Departamento de Agricultura e Horticultura.

(Graner, 1975)

Nesta época, outra inovação institucional na ESALQ foi a criação da Fundação de

Estudos Agrários Luiz de Queiroz” (FEALQ).10

Inaugurada em 1976, a entidade privada

funcionava como captadora de recursos externos para promover programas de pesquisa

cientifica, publicações, eventos e cursos que atendem os interesses da agroindústria.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Entendemos que neste período histórico, o período de preparação ao golpe de 1964

até a consolidação da ordem ditatorial, é fundamental explorar as relações da ESALQ/USP

10

Atualmente “É proprietária da Fazenda Figueira, em Londrina, Estado do Paraná, onde estabeleceu uma

estação agrozootécnica voltada ao desenvolvimento de projetos de pesquisa com bovinocultura de corte,

forragicultura, silvicultura e outras áreas relacionadas com ciências agrárias e preservação ambiental.”

(www.fealq.org.br) Atualmente, seu forte negócio esta atrelado ao mercado da educação, com a oferta de

cursos presenciais, semi-presenciais ou “a distância”.

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com a chamada “revolução verde”, quando uma enorme quantia de recursos financeiros

dos centros capitalistas foram destinados aos paises periféricos visando sua “modernização

capitalista”. Este processo “transformou” o campo com a mecanização agrícola, uso de

insumos industriais (fertilizantes e agrotóxicos), melhoramento genético de sementes,

introdução da energia nuclear para a produção, entre outras inovações de caráter industrial

responsável pela poluição ambiental11

e expulsão dos pequenos lavradores de suas terras, já

que não tinham capital para acompanhar esta onda desenvolvimentista.

A terra devoluta, tribal e ocupada é transformada em monopólio de

grandes latifúndios e empresas nacionais e estrangeiras. Expropriam-se

índios, posseiros, caboclos, sitiantes e outros trabalhadores rurais, que se

transformam em peões, vaqueiros, agricultores, mineradores, mineiros,

operários ou mesmo lumpen. A violência privada, a jagunçagem, atua

livremente, ou associada com a violência estatal. O aparelho de Estado é

posto a serviço da formação e expansão do latifúndio e empresa, por meio

da parafernália burocrática, as isenções de impostos, os favores

creditícios, a proteção econômica e política ;enquanto são esquecidos,

controlados ou expropriados índios, posseiros, caboclos, sitiantes e outros

trabalhadores rurais, que vivem de suas roças e criações, pesca e caças,

em terras tribais, devolutas ou ocupadas (...)A terra transformada em

mercadoria, e monopolizada por latifúndios e empresas, aparece separada,

independente, do trabalhador rural, caboclo, sitiante, posseiro, índio. Está

em curso o desenvolvimento das relações capitalistas de produção no

campo, juntamente com a acumulação primitiva, como processo

estrutural. (IANNI, 1986, p. 248)

Neste processo político-economico, os EUA “prometiam” uma série de benefícios.

“Venderam” aos brasileiros um pacote que incluía desde intercâmbios entre instituições de

educação e pesquisas até importações de maquinários e insumos estadunidenses, o que

garantiu uma grande soma de lucros ao EUA e nossa dependência cultural nacional. Além

do governo estadunidense, “o projeto do Banco Mundial visava reforçar o modelo norte-

11

A modernidade da questão ambiental – da idéia de que a relação com o ambiente natural coloca um

problema radical e inescapável para a continuidade da vida humana – deve ser entendida em sentido amplo.

Ela não está relacionada apenas com as consequências da grande transformação urbano-industrial que ganhou

uma escala sem precedentes a partir dos séculos XIX e XX, mas também com uma série de outros processos

macro-históricos que lhe são anteriores e que com ela se relacionam (dentro do jogo de continuidades e

descontinuidades que caracteriza os processos históricos). É o caso da expansão colonial européia e da

incorporação de vastas regiões do planeta, uma grande variedade de territórios e ecossistemas, a uma

economia-mundo sob sua dominância. (Pádua, 2002).

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americano de desenvolvimento rural, que fundamentava o enfoque pedagógico da escola-

fazenda.” (Fonseca, 2000, p. 236)

A partir da década de 70, os projetos do BIRD (que antes limitavam-se ao

financiamento de infra-estrutura e energia) voltam-se para o incremento

da produtividade, especialmente no setor agrícola, considerado como um

dos fatores para conter o crescimento da pobreza. O setor social, incluindo

a educação, que até então não era privilegiado no projeto de

financiamento do Banco, passa a ter acesso ao créditos dessa agência.

(Fonseca, 2000, p. 231).

Desde sua fundação, a performance destas agências internacionais e bilaterais,

caracterizou-se por um tipo de desenvolvimento econômico desigual e injusto,

concentrando renda e causando a exclusão de paises pobres, assim como devastando o meio

ambiente. Foi este o papel que cumpriu no Brasil dos anos de 1970, por meio de sua

“modernização capitalista”, o que culminou com a crise de endividamento da década de

1980. Além de forte recessão e agravamento da miséria12

pela via da exclusão social, o

Banco Mundial também passou a influenciar a própria legislação brasileira (TOMASI,

2000).

Avançando no tempo, percebe-se que estas intervenções estrangeiras na instituição,

em especial as estadunidenses, não mudaram. Segundo dados do ano de 1998, grande parte

dos recursos que a ESALQ/USP dispõe para seus programas de pesquisa e educação são

capitaneados da Fundação Rockefeller, Ohio University/Usaid, Michigan State University,

Midwest Consortium for Internacional Activities, Unicef, BID, Conselho Britânico e

Universidade de Gembloux (Bélgica). (SANTOS, 1998, p. 86)

As consequências da situação até aqui descrita, no entanto, necessitam de melhor

investigação por meio do exame das seguintes questões:

1- Quais seriam os interesses econômicos, sociais, políticos e culturais (nacionais e

internacionais), destas instituições estrangeiras ao investir recursos na ESALQ/USP e como

12

Cerca de 40% da população brasileira passou a viver abaixo da linha da pobreza, o que representa menos de

dois dólares por indivíduo para a sobrevivência diária. (SOARES in TOMASI , 2000, p. 17)

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essas intervenções deram-se no interior da instituição, como o movimento estudantil ou as

disciplinas ministradas na escola?

2 - Qual a relação destes fatos expostos acima com a política estatal de abertura de

40 cursos superiores de agronomia entre 1960 e 1980?

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