EDUCAÇÃO saberes e práticas · Atuação do pedagogo em ... portante papel social nas formas...

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EDUCAÇÃO EM DEBATE 8CH-PERIObICOS Maria José Camelo Maciel! Isabel Magda Said Pierre Cerneíro/ Atuação do pedagogo em espaços extra-escolares: saberes e práticas Resumo o presente artigo parte da análise das transformações que estão ocorrendo no mundo do trabalho e suas implicações para a atuação profissional do pedagogo, referendando que este profissional tem um portante papel social nas formas e nos meios da ação educativa que ocorre em diversos âmbitos sociais. _':'..nalisa também a questão da atuação do pedagogo em espaços não formal e formal não convencional, siüocstuio os saberes mobilizados na realização do trabalho pedagógico nesses espaços a partir de um estudo realizado em um hospital e em uma escola de ensino profissional, o qual revela que os saberes do _=eclagogosãoplurais, interdisciplinares e provenientes de diferentes espaços sociais. Por conseguinte, nc1ui que os saberes construidos nos cursos de Pedagogia devem favorecer uma visão ampla das ;;:áticas pedagógicas, que são indissociáveis de uma consciência crítica sobre a educação e seu papel za sociedade, assim como, contribuir para que o pedagogo desenvolva os saberes necessários sobre os seus próprios saberes, ou seja, sobre o saber de seu trabalho, de sua profissão. alavras-chave: Pedagogia. Pedagogo. Espaços de atuação profissional e saberes. Abstract Pedagogy and pedagogues in non-formal and formal non-conventional institutions: technical competence and política I competence The following article begins by the analysis of the changes occurring in the field of work and its plications towards the work of the pedagogue, assuring this professional an important social role ...::diverse ways and sources of educational actions that take place in diverse social fields. It analyses - well the matter of the pedagogue's work in non-formal and formal non-conventional institutions xusing on the knowledge used in the pedagogical work, in these places, beginning by a study done in e nospite! and in a school of Professional Education which reveals that the pedagogue's knowledge is - uiei, interdisciplinary and originates ia difterent social areas. It conc1udes that the lmowledge built in .?edagogy courses should favor a broad view of the pedagogical practices, that it must be connected to a zxice: consciousness towards education and its role in society as well as they should contribute to the edagogue 's development of the necessary knowledge about his or her own lmowledge, ín other words, - ut the knowledge of his or her work and profession. ywords: Pedagogy. Pedagogue. Fields ofwork and knowledge. _ agoga. Mestre em Políticas Públicas e Sociedade pela Universidade Estadual do Ceará. Doutoranda em Educação Brasileira pela ':niversidade Federal do Ceará - UFC. E-mail: mazzarnacielgrhotmail.corn. ?edagoga. Mestre em Educação Brasileira pela Faculdade de Educação da UFC. E-mail: [email protected]. 67 EDUCAÇÃO EM DEBATE. Ano 28 - V I - N°. 51/52 - 2006

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EDUCAÇÃOEM DEBATE

8CH-PERIObICOS

Maria José Camelo Maciel!Isabel Magda Said Pierre Cerneíro/

Atuação do pedagogo emespaços extra-escolares:saberes e práticas

Resumo

o presente artigo parte da análise das transformações que estão ocorrendo no mundo do trabalhoe suas implicações para a atuação profissional do pedagogo, referendando que este profissional tem um

portante papel social nas formas e nos meios da ação educativa que ocorre em diversos âmbitos sociais._':'..nalisatambém a questão da atuação do pedagogo em espaços não formal e formal não convencional,siüocstuio os saberes mobilizados na realização do trabalho pedagógico nesses espaços a partir de umestudo realizado em um hospital e em uma escola de ensino profissional, o qual revela que os saberes do_=eclagogosão plurais, interdisciplinares e provenientes de diferentes espaços sociais. Por conseguinte,

nc1ui que os saberes construidos nos cursos de Pedagogia devem favorecer uma visão ampla das;;:áticas pedagógicas, que são indissociáveis de uma consciência crítica sobre a educação e seu papelza sociedade, assim como, contribuir para que o pedagogo desenvolva os saberes necessários sobre osseus próprios saberes, ou seja, sobre o saber de seu trabalho, de sua profissão.

alavras-chave: Pedagogia. Pedagogo. Espaços de atuação profissional e saberes.

Abstract

Pedagogy and pedagogues in non-formal and formal non-conventional institutions:technical competence and política I competence

The following article begins by the analysis of the changes occurring in the field of work and itsplications towards the work of the pedagogue, assuring this professional an important social role

...::diverse ways and sources of educational actions that take place in diverse social fields. It analyses- well the matter of the pedagogue's work in non-formal and formal non-conventional institutionsxusing on the knowledge used in the pedagogical work, in these places, beginning by a study done in

e nospite! and in a school of Professional Education which reveals that the pedagogue's knowledge is- uiei, interdisciplinary and originates ia difterent social areas. It conc1udes that the lmowledge built in.?edagogy courses should favor a broad view of the pedagogical practices, that it must be connected to azxice: consciousness towards education and its role in society as well as they should contribute to the

edagogue 's development of the necessary knowledge about his or her own lmowledge, ín other words,- ut the knowledge of his or her work and profession.

ywords: Pedagogy. Pedagogue. Fields ofwork and knowledge.

_ agoga. Mestre em Políticas Públicas e Sociedade pela Universidade Estadual do Ceará. Doutoranda em Educação Brasileira pela':niversidade Federal do Ceará - UFC. E-mail: mazzarnacielgrhotmail.corn.?edagoga. Mestre em Educação Brasileira pela Faculdade de Educação da UFC. E-mail: [email protected].

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Introdução

o debate acerca do reconhecimento daimportância da Pedagogia em diversos espaçosescolares e extra-escolares tem se ampliado,principalmente a partir dos anos 1990. A in-tensidade de tal debate se coloca a partir dastransformações sociais, políticas e econômicasque vêm ocorrendo no mundo, impulsionadas,principalmente pelas novas demandas postaspelo que tem sido chamado Revolução da Tec-nologia da Informação (CASTELLS,2000). Essecenário revela que os avanços na comunicação,na informática, e as outras mudanças tecnoló-gicas e científicas têm influenciado os novossistemas de organização do trabalho e das rela-ções profissionais, os quais requerem cada vezmais que os processos de educação se realizempara além dos muros das escolas e, conseqüen-temente, têm implicado uma redefinição dosespaços de atuação do pedagogo e dos seussaberes'.

Articular teoria e prática, integrar os sa-beres científico-tecnológicos, bem como asso-ciar os conhecimentos específicos da formaçãoprofissional e os saberes tácitos advindos daspráticas sociais e da experiência profissional asua prática, relacionando-os e adequando-osaos lugares em que trabalham, sem se descui-dar da explicitação do sentido da sua prática,são alguns dos desafios a serem enfrentadospelo pedagogo em sua atuação profissional.

Como contribuição a esse debate, apre-sentamos neste trabalho os resultados de umestudo sobre a prática do pedagogo em hospi-tais e escolas de educação profissional, objeti-vando evidenciar com base em ações concretas,como o trabalho pedagógico se desenvolve nes-ses espaços e que os saberes mobilizados pelopedagogo são plurais, interdisciplinares e pro-venientes de diversas fontes sociais.

Para a realização deste estudo, foram in-vestigados dois espaços: um não formal e outroformal não convencional 2 . No primeiro local, osdados foram obtidos através de observaçõesdiretas, com relatos registrados em diário decampo, e entrevista semi-estruturada com uma

pedagoga, a única existente na instituição. Aanálise sobre a atuação do pedagogo no segun-do espaço se baseou em elementos extraídos deuma pesquisa realizada pela instituição de edu-cação profissional com a equipe de coordenaçãopedagógica composta por quinze pedagogos epedagogas e de entrevista direta à gerência derecursos humanos. A pesquisa realizada com aequipe de coordenação pedagógica versava so-bre o lócus de aquisição de suas competências,tendo como instrumento avaliativo um questio-nário com perguntas abertas e fechadas sobreas fontes sociais que contribuíram para a cons-trução dessas competências.

Contextualizando O tema

A educação é um processo social queocorre em toda sociedade através de diferentesmeios e em distintos espaços sociais. SegundoFranco (2005), "à medida que a sociedade setornou tão complexa, há que se expandir a in-tencionalidade educativa para diversos contex-tos, abrangendo diferentes tipos de formaçãonecessários ao exercício pleno da cidadania"(p.177-178). Nessa perspectiva, as referências ereflexões sobre as diversas formas e meios deação educativa deverão também constar do rolde atribuições de um pedagogo e, mais que isso,referendar seu papel social transformador.

O comentário de Franco nos leva à refle-xão sobre o papel cada vez mais central que oconhecimento assume na contemporaneidadee, conseqüentemente, a prática educativa cons-titui apelo constante, pois vivenciamos atual-mente uma nova configuração da sociedadecapitalista, a qual se convencionou denominar"sociedade do conhecimento".

Observamos, nesse novo momento dasociabilidade capitalista, o surgimento de umapreocupação central com a formação das pes-soas em diversos segmentos sociais, como asempresas, por exemplo, que passam a inves-tir fortemente em treinamento para atenderas suas finalidades. Tanto é assim que muitasdelas possuem escolas, centros de treinamen-to e reciclagem de seus empregados, ou fazem

I A noção de saberes incorpora conhecimentos, competências, habilidades, valores do pedagogo, referindo-se também ao saber, saberfazer e saber ser.

- o ed cação não formal, segundo Libâneo (2004, p. 89), é aquela cujas atividades contêm caráter de intencionalidade, porém com; gra de estrururação e sistematização, implicando certamente relações pedagógicas, mas não formalizadas. A educação formal

cíoaal se refere às atividades de ensino em que se fazem presentes a intencional idade, a sistematicidade e as condições;:..~rioi;:=te ?:ep;L--aeas, arriou os que caracterizam um trabalho pedagógico-didático, ainda que realizado fora do marco escolar0-

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convênios com outras empresas destinadas ex-clusivamente a esse tipo de atividade. Tambémvárias outras instâncias e atividades sociaisatualmente se organizam em torno de projetoseducativos, corno, por exemplo, o turismo, quese nutre de princípios corno o de cidade educa-tivaê. A mídia televisiva, agora de forma bemmais acentuada e direta, lança mão de canaiseducativos ou programas educativos voltados,por exemplo, para educação arnbiental, educa-ção para a cidadania, qualidade de vida etc.,através de diferentes estratégias, nas quais seinclui de forma significativa a educação a dis-tância. Parece evidente que a sociedade resol-veu incorporar um papel educativo, o que co-loca a necessidade de se investigar com quecritérios e com que finalidades, urna vez quenem sempre os processos educativos a que sãosubmetidos os sujeitos implicam humanizaçãoe emancipação.

Ora, se a educação é o instrumento porexcelência da humanização dos homens em suaconvivência social, ocorre que dadas as condi-ções socíopolítíco-culturais concretas do mo-mento histórico atual, impõem-se limites a esseprojeto, urna vez que nem todas as condiçõeseducacionais conduzem a mais humanidade emais emancipação. Muitas práticas educativasnão se concretizam corno tal e funcionam, mui-tas vezes, corno instrumentos de desumaniza-ção, de opressão e de alienação. Adorno (2003,p. 21) sabiamente sentencia: "a educação temsentido unicamente corno educação dirigida aurna auto-reflexão crítica", ou seja, cabe à edu-cação, qualquer que seja a modalidade, formarpessoas capazes de pensar.

Entendemos, nesse sentido, ser funda-mental o papel da Pedagogia, enquanto ciênciaque torna a educação cornoobjeto, na explicita-ção da intencionalidade pretendida à ação edu-cativa social, senão corre o risco de se subsu-mir a urna configuração "técnico-científica" denatureza meramente instrumental, tecnicista,tecnológica, distanciando-se dos sentidos daintencionalidade da prática.

Para Giroux (1999),a função social do tra-balho educativo ultrapassa a função contempla-tiva e alcança um viés de ação educativa que éinerente ao processo de transformação social.

A pedagogia e, em parte, uma tecnologia dopoder, da linguagem e da prática que produze legitima formas de regulamentação morale política, que constrói e oferece aos sereshumanos visões particulares de si próprios edo mundo. Essas visões jamais são inocentes eestão sempre implicadas no discurso e nas rela-ções de ética e de poder. Invocar a importânciada pedagogia é suscitar questões não apenassobre a maneira como os alunos aprendem,mas também como os educadores (no sentidomais amplo do termo) constroem as posiçõesideológicas e políticas a partir das quais elesfalam. Está em questão aqui um discurso queao mesmo tempo situa os seres humanos den-tro de uma história e torna visíveis os limitesde suas ideologias e valores (p. 98).

Giroux (1999), em sua Pedagogia CríticaRadical, chama-nos a atenção de que é neces-sário vislumbrar o trabalho educacional trans-formador a partir das seguintes perspectivas:

A primeira nos alerta da necessidadede percebermos professores e alunos cornointelectuais transformadores, partindo da pre-missa que pensamento e atuação estão intrin-secamente relacionados. Para tanto nos ofere-ce à reflexão urna contra-ideologia para as pe-dagogias instrumentais e administrativas queseparam concepção de execução e ignoram aespecificidade das experiências e formas sub-jetivas que condicionam o comportamento doseducadores e das educadoras.

A segunda perspectiva nos alerta tam-bém para o fato de que o conceito de intelectu-al transformador traz corno referência os inte-resses políticos e normativos que subjazem àsfunções sociais que estruturam e são expressasno trabalho de educadores e estudantes quedevem servir corno referência para que profes-sores problematizem os interesses que estãoinscritos nas formas institucionais e práticascotidianas experimentadas e reproduzidas nasescolas. (Giroux, 1999).Esta perspectiva buscao tensionamento entre a realidade e a reflexãosobre a mesma.

Pressupõe um trabalho para além daconstatação dessa realidade, mas de inserçãoe responsabilidade sobre a mesma. Pressupõe,portanto, que a dinâmica entre sujeitos e con-textos, educadores e educandos possibilitará

3 o conceito de cidade educativa incorpora a idéia de que a cidade se constitui em uma comunidade, quer dizer, uma organizaçãosocial e espacial ordenada basicamente por valores que deverão embasar os processos de aprendizagem coletiva e de formação deum sujeito coletivo a partir de valores culturalmente incorporados pelas gerações que fazem parte da cidade.

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para o espaço educativo, o desafio da mediaçãonos espaços de atuação, que reside na consta-tação de que precisamos analisar o que estáposto, desnaturalizando a realidade, compre-endendo-a corno um processo historicamenteconstruí do e passível de transformação pelosseus sujeitos.

A contribuição do autor citado nos dá im-portantes pistas sobre o campo das possibilida-des de construção de um trabalho pedagógicotransformador nos espaços de atuação profis-sional do pedagogo. Todavia, é importante re-gistrar que não estamos creditando aos educa-dores, especialmente aos pedagogos, sujeitosde análise neste trabalho, a exclusividade degerenciar o processo educativo de modo unila-teral, no qual só ele decide, planeja e "educa",mas que também o percebemos corno um su-jeito que sofre a intervenção do contexto social,tanto nas suas referências de mundo corno nassuas ações.

Entendemos que implementar urna prá-tica pedagógica transformadora se coloca cornoum grande desafio ao pedagogo atualmente,que, utilizando-se de fundamentos de diversasáreas do conhecimento, deve construir catego-rias de análise para a apreensão e compreen-são de diferentes práticas pedagógicas que sedesenvolvem em diversos contextos conformeas relações sociais de nossa época; transformaro conhecimento social e historicamente produ-zido em saber escolar, selecionar e organizarconteúdos a serem trabalhados através de es-tratégias metodológicas adequadas; construirformas de organização e gestão dos sistemasde ensino nos vários níveis e modalidades; e, fi-nalmente, no fazer desse processo de produçãode conhecimento sempre coletivo, participarcorno um dos atores da organização de projetoseducativos, escolares e não escolares que ex-pressem os anseios da transformação social edos diversos sujeitos sociais.

Portanto, seu papel não se encerra so-mente numa dimensão técnica, mas tambémengloba urna dimensão ético-política, urna vezque o "quê" e o "corno" ensinar não se disso-ciam do "para quê" ensinar. A dimensão éti-co-política é que vai garantir que a ação que opedagogo realiza assuma simplesmente urnaconfiguração "técnico-científica" de natureza

eram ente instrumental, tecnicista, tecnológi-ca, distanciando-se dos sentidos da intenciona-

e da prá ica,~...,.,a uação do _edagogo em espaços edu-

: !,""""âlS e extra-escolares

o trabalho pedagógico nohospital X

o hospital X é urna instituição dedicada àreabilitação e ao tratamento de deformidades,traumas, doenças do aparelho locomotor e pro-blemas de neurodesenvolvimento. O objetivodos programas desenvolvidos em seu ãrnbitoé proporcionar ao paciente a possibilidade dedesenvolver, ao máximo, suas capacidades, seupotencial de funcionalidade, para que possa tercondições de retomar seus papéis sociais e ati-vidades nas áreas afetiva, social, educacional eprofissional.

Para concretização da proposta, o hospitalconta com equipes interdisciplinares, incluindoo pedagogo. Esse profissional desenvolve umtrabalho voltado para o reforço escolar, reedu-cação escrita, orientação e estímulo, buscandoajudar na reabilitação do paciente e orientar afamília para proceder de forma adequada nesseprocesso. Ele também realiza visitas escolaresno intuito de, juntamente com os professoresdas escolas, discutir as possibilidades de in-serção do paciente na instituição educacional.Nessa perspectiva, a intervenção pedagógicabusca contribuir para o desenvolvimento físico,psicológico, social, profissional e educacionaldo paciente compatível com seu comprometi-mento fisiológico e limitações arnbientais.

É interessante destacar que sua atuaçãose correlaciona com os diversos programas dainstituição: Pediatria, Reabilitação Infantil, Le-são Cerebral e Lesão Medular, sempre em con-sonância com a equipe composta por fisiotera-peutas, psicólogos, nutricionistas, professoresde educação física, fonoaudiólogos, assistentessociais, médicos clínicos e neurologistas, pro-fissionais da enfermagem e, evidentemente,paciente e sua família.

A concepção de trabalho interdisciplinardo hospital X parte do princípio de que um aten-dimento hospitalar envolve tratamento físico eoutros aspectos ligados ao ser humano, corno aparte psicológica, social e familiar, sendo estaúltima urna participante integral de tudo o quese relaciona com o indivíduo, sua doença, suasinternações e seu restabelecimento.

Isso nos permite perceber que a inter-relação da pedagoga com os diferentes profis-sionais é bastante significativa, pois possibilitaurna troca de informações, tanto referentes àdoença quanto ao paciente, favorecendo o pro-cesso de inclusão do indivíduo na sociedade.

Todavia, as funções que exerce são específicasdo fazer profissional do pedagogo, embora al-gumas atividades sejam ponto de interseçãocom outras áreas de conhecimento, como, porexemplo, a Psicologia.

Como exemplo desse trabalho interdis-ciplinar, verificamos que no grupo de afasía? opedagogo tem o papel de socializar os conheci-mentos com o acompanhante", dando-lhe infor-mações e orientações a respeito da doença, dasrepercussões da lesão e de como pode ajudar opaciente em seu processo de reabilitação. As-sim, orienta e estimula o acompanhante paraque aprenda a lidar melhor com o paciente, per-cebendo que cada lesão tem suas peculiarida-des e cada indivíduo tem uma história social di-ferente. Além disso, desenvolve atividades deestimulação com o paciente sempre mostrandopara a família a forma de fazer em casa, poisa idéia é de que "a família esteja transferindopara o dia-a-dia as atividades "(pedagogo). En-fim, seu trabalho não perde o foco do educar edo educativo em si. A reflexão que o pedagogofaz sobre seu trabalho e a possibilidade de ou-tro profissional realizá-lo é a seguinte:

o psicólogo também pode realizar, mas narealidade, no momento de criar estratégias,metodologias, a forma de expor, exemplificaruma linguagem do acompanhante e repassar asinformações, tudo isso é próprio do professor.É uma competência ligada à formação, de criarestratégias, de criar um fim para gerar a apren-dizagem. O pedagogo dispõe de mais material,mais recurso, isso não quer dizer que o psicólo-go não possa fazer, mas eu percebo que o meuconhecimento pedagógico faz o diferencial.

Através dessa fala percebemos a impor-tância que o trabalho pedagógico tem na insti-tuição hospitalar. Segundo Fabre (2004), os sa-beres pedagógicos denominados pelos proces-sos de ensino-aprendizagem, as determinaçõeslegais da área de educação e particularmente oconjunto de saberes necessários à gestão dosprocessos educacionais fundamentam a açãodo pedagogo, possibilitando-lhe interagir comos outros sujeitos no contexto em que atua.

Quanto às competências esperadas parao desempenho das funções do pedagogo no

hospital, encontra-se a necessidade de estarem consonância com a filosofia da instituição,que tem como princípio básico a interdiscipli-naridade; saber lidar com a diversidade de pro-fissionais; trabalhar em equipe e relacionar-secom o paciente, com a família e com o público.Além disso, o pedagogo deve buscar sempre obem-estar das pessoas e estudar questões queenvolvem educação e saúde.

Em relação às dificuldades verificadaspelo pedagogo percebemos sua necessidadede estar em sintonia com a linguagem médicae de estar sempre atualizado sobre os diferen-tes conhecimentos da instituição hospitalar, osquais não constituem práticas do âmbito esco-lar nem fazem parte, geralmente, da organiza-ção curricular dos cursos de formação para omagistério. Conforme registro da entrevista-da, pouco se divulga no contexto universitáriosobre a atuação em ambientes hospitalares e,durante a graduação, não são repassadas infor-mações sobre essa alternativa de prática peda-gógica: "Ao entrar no hospital X, não sabia daexistência dessa área de atuação do pedagogo,isso demonstra o quanto a universidade aindaapresenta uma visão um tanto quanto restritadesse profissional". Especificamente sobre ocurso de Pedagogia, ela afirma: "durante todaminha faculdade, por exemplo, nunca vi nadaligada ao papel do pedagogo em recursos hu-manos nem mesmo à atividade que exerço nomomento".

As reflexões da profissional se tomampreocupantes no que diz respeito ao tipo de for-mação inicial que os estudantes vêm receben-do. As mudanças constantes da sociedade atu-al têm demandado cada vez mais profissionaisda área de Educação em diferentes espaços nãoescolares, mas parece que a universidade nãovem acompanhando as novas exigências.

No entanto, é necessário considerar que,apesar da ausência de conhecimentos especí-ficos para a atuação do pedagogo em espaçosnão escolares, existe no curso de Pedagogia umconjunto de conhecimentos advindos de dife-rentes campos científicos, como Sociologia, Psi-cologia, Filosofia, Antropologia, História, entreoutros, que contribui para uma leitura crítica,reflexiva e transformadora do mundo.

I Neste grupo se reúnem pacientes que apresentam os mesmos problemas. Conforme a localização e a gravidade da lesão, pessoas comacidente vascular cerebral podem apresentar alterações da linguagem, sendo a mais freqüente a afasia, que pode incluir alteraçãoda capacidade de se expressar através da fala e da escrita, assim como da compreensão da fala e da escrita.

2 O paciente quando está internado no hospital tem direito de ficar com um acompanhante, seja amigo ou parente, participando detodos os momentos que envolvem o período da internação.

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Esse corpus de conhecimentos tambémcontribui para uma leitura pluridimensional dopedagogo sobre realidade e situações de suaintervenção pedagógica, permitindo-lhe identi-ficar e interpretar as múltiplas facetas que seapresentam em seu cotidiano.

Essa compreensão implica, portanto, queos múltiplos saberes e conhecimentos acumu-lados historicamente pela humanidade exigemdo pedagogo leituras interdisciplinares dos fe-nômenos educacionais.

O trabalho pedagógico em escolas deeducação profissional

As escolas e instituições que lidam coma educação profissional encerram característi-cas que se diferem da escola de ensino regulare as tornam específicas. Muitas dessas insti-tuições se auto definem como empresas e nãocomo escolas. Contudo, concebemos a educa-ção, inclusive a profissional, como uma práticasocial que tem como objetivo as realizações hu-manas materializadas em saberes, habilidades,técnicas, atitudes, valores existentes no meioculturalmente organizado, o que lhe imprimecaracterísticas especiais, uma vez que lida como fenômeno da humanização.

Nesses espaços de formação profissio-nal confluem determinações distintas que seapóiam em lógicas, às vezes até antagônicas,como, por exemplo, a lógica do mundo dos ne-gócios e da mercadoria e a lógica da formaçãoe emancipação humana. A clivagem de pensa-mentos tão diversos muitas vezes descaracteri-za e esvazia o trabalho pedagógico nos referi-dos espaços. É precisamente nesse sentido quebuscamos demarcar a importância da Pedago-gia na escola de educação profissional. Os sa-beres do pedagogo nessa escola assumem umsentido especial no encaminhamento de umapráxis que, ao vincular-se a uma visão de to-talidade do mundo do trabalho e da educação,amplia o referencial de compreensão de mundodos trabalhadores que ali são formados e con-tribui para a sua emancipação política.

A escola sobre a qual situamos esta aná-lise do trabalho do pedagogo conta para a reali-zação do seu projeto educativo com uma equipede coordenação pedagógica que tem como mis-são garantir a materialização do projeto políti-co-pedagógico. Uma das principais responsabi-lidades dessa equipe é encontrar docentes quereúnam em seu perfil saberes técnicos e peda-

ógicos, sendo, de forma geral, essa a grande-'" dade enfrentada nessas escolas de edu-

roãssío . Cabe à equipe de coordena-

ção pedagógica ser o elo entre o projeto políti-co-pedagógico e o professor, nas ações concre-tas de sala de aula. Sua ação deve abranger trêsetapas estruturadoras da ação docente: plane-jamento, acompanhamento e avaliação. De fato,nas três etapas deve ocorrer a formação do do-cente em serviço de forma contínua.

Além dessa tarefa, a equipe também éresponsável pelo planejamento e pela imple-mentação do programa de desenvolvimentode educadores, seleção de docentes, análise eplanejamento do material didático, coordena-ção do trabalho de construção das estruturascurriculares dos cursos oferecidos ao público,bem como pela realização de várias outras ati-vidades.

Diante das profundas transformaçõesno mundo do trabalho, a escola também, prin-cipalmente nos últimos dez anos, tem passa-do por significativas mudanças que afetam osplanos político-pedagógico e administrativo-organizacional.

Quanto a essas modificações, cabe citar,como mais impactante para a prática da equipede coordenação pedagógica, a adoção de umaorientação curricular com foco em competênciase de um modelo de administração institucionaltambém baseado em gestão de competências.

Esse processo é reflexo de dois movimen-tos principais. O primeiro é a reforma efetivadana legislação educacional brasileira nos anos1990, quando se assiste a uma alteração pro-funda do sistema educacional no seu conjunto,especialmente da educação profissional, para aqual o conceito de competência torna-se refe-rência para a organização do trabalho escolar.O segundo é o alinhamento das políticas de re-cursos humanos às estratégias empresariais,incorporando à prática organizacional o concei-to de competência como base do modelo parase gerenciar pessoas.

No âmbito do trabalho da coordenaçãopedagógica, as alterações do modelo pedagó-gico se expressam por meio de novos ideários,métodos e programas de ensino que trazemsubjacentes modos de pensar os cursos, os con-teúdos, o aluno, o espaço escolar, criando dife-rentes concepções sobre a educação nas quais ocoordenador pedagógico deve orientar o docen-te para construir a sua prática. Isso passa a re-querer novas competências desse profissional.

Essas novidades, ao mesmo tempo quereformulam modos de organizar o tempo, o es-paço e o saber escolar, também sugerem modos

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de pensar/fazer a educação, estabelecendo ou-tros padrões de comportamento. Vale ressaltarque a compreensão desse conjunto de mudan-ças, tanto para sua implementação quanto, eprincipalmente, para sua crítica e possível res-significação, exige do pedagogo um profundoconhecimento sobre a relação trabalho e educa-ção, sobre a educação e suas correspondentespolíticas que regulam as ações, além de traçarlimites, prever comportamentos e criar lingua-gens coletivas.

As alterações no plano gerencial da esco-la levaram à definição de novas competênciaspara a equipe de coordenação pedagógica con-formadas ao novo alinhamento estratégico dainstituição. A definição das competências docoordenador pedagógico, de acordo com a ge-rente de recursos humanos,

deu-se através do processo de busca pararealinhamento de estratégias num momentoem que a instituição se depara com um novocenário e o próprio contexto atual cobra o do-mínio de novas competências que garantam aexcelência em educação profissional.

Para a gerente de recursos humanos, aconstrução de um novo perfil do coordenadorpedagógico teve comopremissas básicas: cons-cientização de que a implementação do projetopolítico-pedagógico da escola exige da equipede suporte pedagógico um perfil específico;convicção de que o cargo de coordenador peda-gógico tem características próprias e deve serocupado por profissionais que apresentem umperfil de competência diferenciado; reconheci-mento de que aqueles que ocupam tal funçãodevem garantir o cumprimento da missão daescola como instituição de educação profissio-nal, bem como a implementação do projeto po-lítico-pedagógico.

As competências foram definidas numprocesso de discussão coletiva incluindo os co-ordenadores pedagógicos, das quais destaca-mos as seguintes como mais significativas:

• compreender a educação profissionalà luz das transformações político-econômicascontemporâneas, com o fim de atuar com umavisão de totalidade sobre os fenômenos econô-micos e político-sociais sobre os quais se assen-ta tal modalidade de educação na atualidade;

• alcançar acordos através do diálogo,encontrando e constituindo objetivos comunspara garantir ambiente de alto desempenho;

• colaborar e cooperar com outras pesso-as e unidades para atingir um objetivo comum,compartilhando informações e conhecimentosrelevantes;

• desenvolver os docentes, realizandodiagnósticos de seu desempenho pedagógico,promovendo sua formação contínua em serviço,atuando em nível estratégico da organização esustentando processos que promovam o apren-dizado orqanízacíonal:

• compreender, incorporar e disseminaros fundamentos e práticas da educação profis-sional, visando adequar o pensar e o fazer daescola ao seu projeto político-pedagógico;

• demonstrar capacidade de propor no-vas estratégias, novas ações e novos projetospara a educação profissional, articulando-os àsnovas necessidades e demandas do mundo daeducação e do trabalho.

A respeito das fontes sociais sobre asquais os coordenadores pedagógicos constro-em suas competências, a gerente de recursoshumanos nos ofereceu alguns dados colhidosatravés de instrumento de avaliação aplicado àequipe e aos seus gestores. Foram apresenta-das quatro opções (sendo uma aberta) de fon-tes a que o coordenador pedagógico atribuiriapesos de 1 a 5, conforme a relevância da contri-buição destas na construção de suas competên-cias. O resultado foi o seguinte: 1)escola básicae universidade - 21% dos pedagogos e pedago-gas atribuíram o peso máximo; 2) cursos ofe-recidos pela instituição e o próprio ambientede trabalho - 79% atribuíram peso máximo aessa fonte na aquisição de suas competências;3) movimentos/atividades sociais - foram con-sideradas as segundas fontes mais relevantespara obtenção de competências por 71% dosentrevistados; 4) outras fontes, 71% considera-ram que a busca do autodesenvolvimento emdiversas fontes é bastante significativa para aconstrução de suas competências. Comooutrasfontes, foram citados, com um maior número deocorrências, cursos de atualização profissionalfeitos fora da instituição, seminários, palestrase encontros da área educacional.

É interessante notar que as três fontesmais valorizadas na construção das competên-cias dos pedagogos, conforme sua própria vi-são, são aquelas que foram responsáveis peladimensão técnica - cursos oferecidos pela ins-tituição e o próprio local de trabalho e cursos,seminários, palestras realizados fora da institui-ção - e as que dão conta de uma dimensão polí-tica ou ética - movimentos e atividades sociais.

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Ao mesmo tempo, vale evidenciar quena produção teórica da área educacional, prin-cipalmente no âmbito da didática, é comum ateorização que destaca o papel das tendênciaspedagógicas críticas na consolidação de um en-gajamento ético do educador, bem como o pa-pel que desempenham os conhecimentos socio-lógicos e filosóficosno âmbito do currículo doscursos de Pedagogia. Todavia esse aspecto nãofoi lembrado como de maior relevância pelospedagogos na construção de suas competên-cias, sendo citado como de grande relevânciapor apenas 21% da equipe.

Tal atitude nos leva a crer que os saberestidos como mais relevantes pelos pedagogos epedagogas da escola de educação profissionalsão aqueles que se ligam mais imediatamentecom o projeto de educação que idealizam e quepraticam no cotidiano escolar.

Para Ciavatta (2005,p. 97),a possibilidadede definição de projetos depende, entre outrosfatores, da consciência, sendo o projeto a ante-cipação do futuro, uma vez que busca, atravésdo estabelecimento de objetivos, a organizaçãodos meios pelos quais esses objetivos poderãoser atingidos. Nas palavras da autora:

A sociedade fomenta uma multiplicidade demotivações, produzindo a necessidade de pro-jetos, inclusive contraditórios ou conflitantes.O projeto é dinâmico e está sendo elaboradopermanentemente, reorganizando a .memóriado indivíduo, dando-lhes novos sentidos e sig-nificados, o que repercute em sua identidade.[....] Com isso, queremos dizer que a identi-dade que cada escola e seus professores, ges-tores, funcionários e alunos constroem é umprocesso dinâmico, sujeito permanentementeà reformulação relativa às novas vívências, àsrelações que se estabelecem. De outra parte,esse processo está fortemente enraizado nacultura do tempo e do lugar onde os sujeitossociais se inserem na história que se produziua partir da realidade vivenciada, que constituiela mesma "um lugar de memória".

Nessa mesma linha de raciocínio,Damas-ceno (2005, p. 142), ao discorrer sobre a noçãode saber social e sobre os sentidos e significa-dos que os atores sociais têm de sua realidade,demarca que

É importante deixar claro o caráter históricodeste saber, isto significa que o saber trazidopeios agentes educacionais traduz-se em um

prática social, na medida em que é

apropriado e incorporado pelo grupo social- em função de sua prática social, dos seusinteresses, enquanto grupo específico.

Entendemos que os saberes que o profis-sional pedagogo mobiliza na sua atuação paraorganizar práticas pedagógicas traduzem-senum saber específico, elaborado pelo conjuntode pedagogos em função de sua formação, suasatividades e competências comuns e do proje-to de mundo, sociedade e escola que advogam,o que lhes confere uma identidade própria en-quanto grupo social ou categoria profissionalespecífica. Entendemos, pois, que esses sabe-res são indissociáveis do significado atribuído àeducação e ao seu papel na sociedade, a partirdo que se estabelecem os limites e as possibili-dades de sua prática em relação à interpretaçãodos determinantes econômico-sociais e políti-cos presentes em nossa sociedade. Isso remeteà possibilidade dos sujeitos sustentarem proje-tos contra-hegemônicos conforme suas visõesde mundo.

Considerações finais

Na análise dos pedagogos acerca das fon-tes sociais nas quais constroem suas competên-cias, um dos fatos que nos chamou a atenção,em primeiro lugar, foi a posição dos pedagogos,de ambos os espaços, em relação aos saberesprovenientes dos cursos de Pedagogia.

Pelo que pudemos constatar, na opiniãodo coordenador pedagógico que atua na esco-la de educação profissional, as competênciasmais significativas para a sua atuação não sãoas desenvolvidas nos espaços acadêmicos naopinião da maioria. Também na visão da peda-goga que atua no hospital, o currículo do cur-so de Pedagogia é considerado restrito e nãocontempla a atuação do pedagogo em espaçosextra-escolares.

Todavia, é evidente que os saberes pe-dagógicos necessários à prática desses profis-sionais advêm, em boa parte, de sua formaçãoacadêmica, mas como o currículo dos cursosnão contempla uma visão mais ampla do traba-lho pedagógico, os entrevistados não a conside-raram uma fonte tão relevante.

Isso nos leva a pensar que se a Pedagogiadesenvolve-se em diversos espaços educativosescolares e extra-escolares e se o pedagogo éum profissional cuja identidade se reconheceno campo da investigação e na variedade de

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atividades voltadas para o educacional e o edu-cativo e cuja função está relacionada a todasas atividades de aprendizagem e de desen-volvimento humano, seja de crianças, jovens,adultos ou idosos, trabalhadores ou outros, deacordo com o perfil da instituição em que atua,havemos de reconhecer a necessidade de seformar o profissional da Educação e não exclu-sivamente o docente.

Todavia, também devemos reconhecer aimpossibilidade da formação inicial do peda-gogo abarcar toda a gama de saberes especía-lizados que ele mobiliza nos diversos espaçosescolares e extra-escolares em que atua, secolocando a necessidade precípua da educa-ção continuada. Contudo, entendemos queessa formação deve avançar para além de umfoco exclusivo em determinadas tarefas peda-gógicas para uma concepção mais ampla queapreenda, de forma crítica, as transformaçõesque estão ocorrendo no mundo do trabalho, nasinstituições educacionais, no país e no mundo.Isso implica uma abordagem mais focada nosconhecimentos do campo da Educação, quedeverá ocorrer a partir da indissociável arti-culação teoria-prática, tendo a pesquisa comoum princípio estruturante dos saberes a seremconstruídos.

É importante também notar que o saberdo pedagogo, conforme expressa Tardif (2003),é um saber plural, pois sua prática integra di-versos saberes com os quais mantém diferen-tes relações. Senão vejamos o caso da pedago-ga que trabalha em ambiente hospitalar, emque seu saber complementa uma das dimen-sões que se tem sobre o desenvolvimento doser humano numa relação de interdependênciacom outros saberes de diferentes profissionais,os quais atuam no objetivo comum da reabili-tação do ser humano que, devido a traumas eenfermidades, teve seu desenvolvimento com-prometido. Nesse caso, os saberes de sua áreade formação, ou seja, os saberes pedagógicosassociados à competência socio-comunicativa,são condições indispensáveis à sua atuaçãonesse espaço.

Tais requisitos também são essenciais àequipe de pedagogos que atua no espaço daeducação profissional, uma vez que as novasexigências postas aos profissionais que atuamno âmbito da atividade pedagógica vão deman-dar uma pluralidade de saberes, que vão dossaberes profissionais aos psicossociais, tendoem vista o estabelecimento de diretrizes parao novo modelo formativo. Apesar de não pre-

tendermos esgotar aqui a discussão da impor-tância e do lugar desses saberes nos cursos deformação inicial do pedagogo, vale colocar queas convicções e os saberes acerca da Educaçãoe de seu papel na formação humana, os saberespedagógicos e a competência comunicativa tor-nam-se imprescindíveis para a prática pedagó-gica em qualquer espaço educativo.

Tardif (2003) refere-se ao pluralismo dosaber profissional relacionando-o com os luga-res onde os docentes atuam/trabalham, com asorganizações que os formam, com as fontes deaquisição desse saber e seus modos de integra-ção no trabalho docente. Transpondo essa ob-servação para o caso do pedagogo, mesmo atu-ando em atividades que não sejam a docência,ela permanece válida e se confirma a partir doestudo da atuação profissional dos pedagogosestudados neste trabalho.

Finalmente, entendemos que os saberesque o pedagogo mobiliza na sua atuação paraorganizar práticas pedagógicas devem ser in-dissociáveis de uma consciência crítica sobre aEducação, seu papel na sociedade (os limitese possibilidades do processo educativo em re-lação aos determinantes econômico-sociais epolíticos presentes em nossa sociedade), assimcomo, que lhe possibilite a agudeza teórica eprática no sentido de que possa desenvolver ossaberes necessários sobre os seus próprios sa-beres, ou seja, sobre o saber de seu trabalho,de sua profissão. Entendemos que o favoreci-mento dessa condição deva ser uma atribuiçãoprecípua dos cursos de Pedagogia.

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