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FACULDADE DE PARÁ DE MINAS CURSO DE PEDAGOGIA Débora Cristina dos Santos EDUCAÇÃO NA PENITENCIÁRIA Pará de Minas 2013

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FACULDADE DE PARÁ DE MINAS

CURSO DE PEDAGOGIA

Débora Cristina dos Santos

EDUCAÇÃO NA PENITENCIÁRIA

Pará de Minas 2013

Débora Cristina dos Santos

EDUCAÇÃO NA PENITENCIÁRIA Monografia apresentada à Coordenação do curso de Pedagogia da Faculdade de Pará de Minas como requisito parcial para a conclusão do curso de Pedagogia. Orientador: Jessé Saturnino Junior.

Pará de Minas 2013

Débora Cristina dos Santos

EDUCAÇÃO NA PENITENCIÁRIA

Monografia apresentada à Coordenação do curso de Pedagogia da Faculdade de Pará de Minas como requisito parcial para a conclusão do curso de Pedagogia.

Aprovada em: __________/__________/__________ _____________________________________________________________

Professor orientador: Jessé Saturnino Junior

_____________________________________________________________ Professor examinador

_____________________________________________________________ Professor examinador

RESUMO

O presente texto busca explicar a relação que a educação tem na melhoria da

qualidade de vida dos presos, por isso será importante seu estudo. A prisão, da

forma como existe hoje, dificulta o processo de ressocialização, pois até mesmo a

maneira como é construída e como os presos são tratados, demonstram que eles

são realmente excluídos e assim o serão sempre. A educação, neste caso, pode ser

vista como uma forma de trazer um pouco mais de dignidade e humanidade para

estes detentos. Com isso, neste trabalho, são expostos vários conceitos que

poderão auxiliar no entendimento do tema aqui proposto para que possa ser

desenvolvida a questão pertinente à educação em uma instituição prisional.

Palavras chave: Prisão; Educação; Ressocialização; Detentos.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 5 1.1 Objetivo ............................................................................................................... 6

1.1.1 Objetivo geral .................................................................................................... 6 2 REFERENCIAL TEÓRICO ...................................................................................... 7 2.1 A prisão: história, características e função ..................................................... 7 2.2 A função punitiva da pena ................................................................................. 8 2.2.1 A Vingança Privada ........................................................................................... 8 2.2.2 Vingança Divina ............................................................................................... 10 2.2.3 Vingança Política ............................................................................................. 11 2.3 As penitenciárias brasileiras e os detentos: perfil, características e situação atual ......................................................................................................................... 15 2.4 Educação: conceito e características ............................................................. 23 2.4.1 O caráter social da educação .......................................................................... 24 2.5 Educação na prisão .......................................................................................... 27 2.5.1 Origens da inserção da educação nas penitenciárias ..................................... 27 2.5.2 Os professores e a educação na prisão .......................................................... 31 3 METODOLOGIA ................................................................................................... 35 4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DO PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO ................. 36 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 41

REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 43

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1 INTRODUÇÃO

Neste texto, tentaremos abordar a Pedagogia e a educação nas prisões. Este

é um tema que percorre as políticas públicas e os processos de escolarização no

cárcere privado, tendo em vista o sistema prisional brasileiro atual e como este

assunto é visto e tratado pelos doutrinadores.

Segundo Pereira (2011), legalmente, a educação no cárcere:

[...] é um tipo de educação de adultos que visa escolarizar, formar e qualificar pessoas temporariamente encarceradas para que, depois que cumpram o tempo de privação da liberdade, possam reinserir-se com dignidade no mundo social e do trabalho, já que essas pessoas, em sua maioria, têm baixa ou nenhuma escolarização. Nesse sentido, grande parte dessas pessoas presas necessita de uma educação ampla e diferenciada para que adquiram conhecimentos, saberes e práticas que lhes possibilitem a (re)construção de sua cidadania, se é que em algum momento de sua vida social e produtiva ela foi ou se sentiu cidadã. (PEREIRA, 2011, p. 3).

As pessoas que estão em instituições carcerárias, assim como as demais

pessoas, têm o direito à educação e este direito está previsto em nossa legislação e

também em normas internacionais.

Desta forma, o problema que envolve a questão é: como a educação pode

contribuir para humanizar e melhorar o sistema prisional brasileiro?

Num primeiro momento pode-se pensar que a educação teria pouco

significado dentro do sistema prisional, pois o cárcere não deixa espaço para

qualquer proposta de humanização. Com isso, os processos educacionais

desenvolvidos nas prisões estariam fadados ao insucesso total, já que as estruturas

do sistema carcerário brasileiro são autoritárias, desumanas e repressoras, não

permitindo, com isso, qualquer espaço de formação dos detentos.

Porém, é direito dos detentos obter a educação na prisão e, caso haja

vontade por parte deles, será proveitoso para os mesmos o aprendizado, pois,

quando puderem sair poderão, ao menos, tentar uma reinserção na sociedade e no

mercado de trabalho de forma mais qualificada.

Muitos detentos não possuem ensino médio ou mesmo fundamental, da

mesma forma, não possuem qualificação profissional. Com isso, a reinserção na

sociedade torna-se ainda mais difícil e precária, após sua liberdade.

A educação e o estudo podem ajudar neste caso, pois, como se sabe, a partir

do momento em que o preso passa à tutela do Estado ele não perde apenas o seu

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direito de liberdade, mas também todos os outros direitos fundamentais. O que se vê

nas prisões atualmente é um total desrespeito aos detentos, tanto no que se refere à

superlotação das celas, que não dão a menor condição de sobrevivência física,

gerando doenças, brigas etc.

Assim, a educação poderia ajudar estas pessoas a se sentirem melhor e com

mais dignidade para que possam, inclusive, voltar à sociedade com uma condição

de vida mais humana.

Onofre (2007) afirma que “a prisão, em vez de devolver à liberdade indivíduos

educados para a vida social, devolve para a sociedade delinquentes mais perigosos,

com elevado índice de reincidência”.

Diante destes desafios e contradições é que se coloca o presente estudo que

irá pesquisar a importância e a função da educação para os detentos dentro do

cárcere privado.

Onofre (2007) explica que:

[...] a característica fundamental da pedagogia do educador em presídios é a contradição, é saber lidar com conflitos, com riscos. Cabe a ele questionar de que maneira a educação escolar pode contribuir para modificar a prisão e o preso, para tornar a vida melhor e para contribuir com o processo de desprisionalização e de formação do homem preso. (ONOFRE, 2007, p. 15).

Neste estudo, são apresentadas as características e a história das prisões,

bem como o conceito e a função social da educação. Após, é apresentado o

conceito e as características da educação prisional e, ao final, faremos uma análise

sobre o Projeto Político Pedagógico da Escola Estadual Professor Agmar Gomes do

Couto, que é localizada dentro da Penitênciária Dr. Pio Canedo, em Pará de Minas.

1.1 Objetivo

1.1.1 Objetivo geral

Apresentar a importância e as características da educação escolar no

ambiente prisional, e ainda de que maneira ela poderá contribuir para uma melhoria

na vida dos detentos.

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2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 A prisão: história, características e função

Pena e prisão estão diretamente ligadas, mas não são a mesma coisa e

também possuem conceitos distintos.

A pena surgiu nos primórdios da civilização. Em alguns momentos históricos,

ela valia para a preservação da espécie humana, pois, conforme explica Otobonni

(2001), a civilização mais antiga julgava dispensável a segregação, por considerar o

crime de responsabilidade coletiva e individual, sendo que quem reparava o dano

causado era, em primeiro lugar, o infrator e, na ausência dele, o clã ao qual ele

pertencia.

Já em outros momentos a pena servia apenas como instrumento para

intimidar as pessoas. Como instrumento de intimidação, ocorria principalmente em

momentos considerados mais pacíficos. Através dos tempos, contudo, a pena foi

reduzida a um castigo. Neste caso, o castigo era considerado como sendo uma

forma do infrator reparar o dano causado e tomar ciência de que aquele ato era

errado e não mais poderia ser feito.

Com relação à prisão, pode-se dizer que ela foi criada a menos tempo do que

a pena em si.

Carvalho Filho (2003) afirma que pena é a expiação ou castigo estabelecido

pela lei, com o intuito de prevenir e de reprimir a prática de qualquer ato ou omissão

de fato que atente contra a ordem social, o qual seja qualificado como crime ou

contravenção, por uma dada sociedade e tempo histórico.

Ottoboni (2001) explica que “pena é a sanção, consistente na privação de

determinados bens jurídicos, que o Estado impõe contra a prática de um fato

definido na lei como crime”.

Já Cesare Beccaria (2002) afirma que:

A necessidade obrigou os homens a cederem parte de sua liberdade; e é certo que cada um não quer colocar no depósito público senão a mínima porção possível que baste para induzir os demais a defendê-lo. O conjunto dessas mínimas porções possíveis forma o direito de punir, tudo mais é abuso e não justiça; é fato, e não direito. As penas que excederem a necessidade de conservar o depósito da saúde pública são injustas por natureza; e tanto mais justas são as penas quanto mais sagrada e inviolável seja a sua segurança e maior a liberdade que o soberano conserva para os súditos. (BECCARIA, 2002, p. 20).

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Michel Foucault, citado por Dias (2005), afirma que a prisão é menos recente

do que se costuma dizer:

A forma prisão preexiste à sua utilização sistemática nas leis penais. Ela se constitui fora do aparelho judiciário, quando se elaboram, por todo o corpo social. O processo para repartir os indivíduos, fixá-los e distribuí-los espacialmente, classificá-los, tirar deles o máximo de tempo, e o máximo de forças, treinar seus corpos, codificar seu comportamento contínuo, mantê-los numa visibilidade sem lacuna, formar em torno deles, um aparelho completo, de observação, registro e notações, constituir sobre eles um saber que se acumula e se centraliza. (DIAS, 2005, p. 01).

Goffman (1947) classifica a prisão como sendo uma “instituição total”

incluindo nesta nomenclatura outros tipos de estabelecimentos como os

manicômios. Mas, no caso da prisão, ele a conceitua como sendo uma instituição

organizada para proteger a comunidade contra perigos intencionais, sendo que o

bem-estar das pessoas assim isoladas não constitui um problema imediato.

Da mesma forma, Goffman (1974) expõe que:

(...) o aspecto central da instituição total pode ser descrito com a ruptura das barreiras que comumente separam algumas esferas da vida, pois no caso das instituições, todos os aspectos da vida são realizados no mesmo local e sob uma única autoridade; cada fase da atividade diária é realizada na companhia imediata de um grupo sendo que este grupo é tratado da mesma forma. Todas as atividades são realizadas em horários preestabelecidos, e tais atividades são impostas e obrigatórias, organizadas para atender aos objetivos oficiais da instituição. (GOFFMAN, 1974, 17-18).

A prisão, sob o aspecto físico, vem sofrendo diversas alterações ao longo da

história segundo determinada visão de época, buscando garantir segurança.

Todavia, o que mais preocupa parte da sociedade é o modo da execução da pena,

pois muitas vezes o detento não possui as condições necessárias, na instituição,

para seu desenvolvimento social capaz de promover sua ressocialização.

Neste ponto, a pena e a prisão deveriam estar aliadas para a manutenção de

um bem comum, sendo este considerado um bem para toda a coletividade.

2.2 A função punitiva da pena

2.2.1 A Vingança Privada

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Segundo Dias (2005), nos primórdios da civilização a concepção da pena

girava em torno da prevalência da lei do mais forte (Lei de Darwin), onde cabia a

auto-composição, conhecida como vingança de cunho pessoal (vingança privada),

utilizada pelo ofendido em busca de sanar a lide, sendo esta faculdade de resolução,

dada a sua força própria, grupo ou família, para assim conseguir exercê-la em

desfavor do criminoso.

A pena não obedecia ao princípio da proporcionalidade, quando de sua aplicação vingativa se estendendo à família do acusado. Assim, na hipótese do criminoso pertencer à mesma tribo da vítima, a sanção penal visava à perda da paz ou banimento do membro do clã, sendo que por esta decisão o agressor perdia a proteção do grupo ao qual pertencia, podendo ser agredido por qualquer pessoa e consequentemente se encontrava exposto a forças hostis de outras tribos ou da própria natureza, isto, se concretizava na morte do condenado. (DIAS, 2005, p. 1).

Contudo, o que ocorria é que os homens primitivos já sentiam a necessidade

de acreditar num poder superior, assim adoravam e cultuavam objetos que eram

chamados de “totens”, exigindo respeito, obrigação que deveria ser cumprido por

toda a sociedade.

Por isso, segundo Dias (2005) “a pena era de caráter sacro essa vingança

pessoal não era tida como punição, mas sim como um meio de restauração da

integridade coletiva perante a divindade cultuada”.

Ottoboni (2001) afirma que no Brasil, os povos indígenas adotavam valores

culturais de punição condizentes à vingança de sangue, regra de Talião1, a perda da

paz, a pena de morte através de tacape e as penas corporais, sob a concepção de

suas crendices.

Por isso, é possível dizer que nessa fase vemos uma desproporcionalidade

da pena, pois esta atingia não só o ofensor, mas também todo o seu grupo familiar.

Com as transformações sociais ocorridas, bem como a necessidade de evitar

genocídios, segundo Dias (2005) surge a Lei Mosaica (Talião), surgindo o primeiro

indício de proporcionalidade entre pena e delito, ao prescrever a máxima “sangue

por sangue, olho por olho, dente por dente”, portanto, restringia-se à retribuição

proporcional ao mal causado.

____________ 1 Também dita pena de talião, consiste na rigorosa reciprocidade do crime e da pena,

apropriadamente chamada retaliação. Esta lei é frequentemente expressa pela máxima olho por olho, dente por dente. É uma das mais antigas leis existentes.

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As civilizações antigas possuíam uma legislação penal que se caracterizava

pela natureza religiosa de suas penas. A prática da lei de Talião, por exemplo, foi

adotada por diversos códigos na antiguidade: Código de Hamurabi (século XXIII a

C.), na Babilônia, pela legislação hebraica (Êxodo) e pela Lei das XII Tábuas, em

Roma.

Dias explica que:

Na antiga legislação babilônica editada pelo rei Hamurabi, verifica-se que se

um pedreiro construísse uma casa e esta desabasse, matando o morador, o

pedreiro seria morto; no entanto, se também morresse o filho do morador, o

filho do pedreiro haveria de ser sacrificado. De nada adiantaria ter

observado as regras usuais nas construções de uma casa, ou pretender

associar o desabamento a um fenômeno sísmico (uma acomodação do

terreno, por exemplo). Seria, sempre, objetivamente responsável; ele e sua

família, dependendo da extensão do dano causado. (DIAS, 2005, p. 01).

A composição era uma forma de pena que se utilizava para que fosse criada

uma inimizade entre a sociedade e o infrator e sua família, sendo que estes

deveriam sofrer a vingança do sangue (morte) ou a substituição do cumprimento da

pena pelo pagamento de outros bens (como dinheiro, gado, vestes etc.), sendo que,

mesmo assim, o dano deveria ser reparado.

A composição foi adotada pelo Código de Hamurábi e pelo Código de Manu

na Índia.

2.2.2 Vingança Divina

Após a queda do Império Romano, que ocorreu no século IV, houve a

conquista dos povos germânicos, como isso, instituiu-se o direito germânico que

também possuía natureza religiosa em suas penas. A vingança divina era uma

questão voltada para o pecado.

Segundo Dias (2005):

O fator que contribui para essa consolidação da influência da igreja é o fortalecimento do poder centralizado do Direito germânico, que buscava adquirir com maior amplitude o caráter de poder público estatal, daí a adoção da concepção da Igreja de oposição à pratica individualista da vingança privada (vingança do sangue) utilizada no início do domínio dos povos germânico, embora essa interpretação das escrituras sagradas eram deturpadas e os métodos de verificar a culpabilidade provinham de uma revelação divina inquestionável que impunha provações das mais variadas, a fim de corrigir o infrator. (DIAS, 2005, p. 1).

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Pelas palavras do autor, percebe-se que, nesta fase, Estado e Igreja, se

confundiam ao exercer o poder de punição.

Neste período histórico surgiu a privação de liberdade como pena. O cárcere

era tido como penitência e meditação, o que originou a palavra “penitenciaria”.

Otobonni (2001) explica que a Igreja Católica chamava de penitenciário a

clausura onde se recolhiam os pecadores arrependidos para cumprirem penitência,

refletirem sobre o erro praticado e abominá-lo. Daí a origem do termo penitenciária,

empregado para denominar estabelecimentos penais de maior porte.

Soares (2010) ainda afirma que a prisão é uma criação do direito canônico

para purificar e fazer o condenado expiar os seus crimes, e foi um marco importante

na história da justiça penal, representando um grande triunfo sobre a pena de morte,

passando a conservar a vida.

Ainda segundo o autor:

Com o desuso das penas cruéis e de morte e com o advento da pena privativa de liberdade, surge a necessidade de um local onde pudessem colocar-se os criminosos, e com ela a pena de prisão. Assim, com a consolidação da ideia de “humanização” da pena, começa a aparecer em todos os países da Europa a pena privativa de liberdade, substituindo em muitos casos a pena de morte. (SOARES, 2010, p. 7).

Porém, apesar do suposto avanço em relação à pena de morte, as prisões

constituíram verdadeira afronta ao condenado na sua condição de ser humano, pois

eram insalubres, sem as mínimas normas de higiene e moralidade, relegando-o ao

completo abandono.

2.2.3 Vingança Política

De acordo com Dias (2005):

[...] no século XV, com a queda de Constantinopla, em 1.453, e o desaparecimento do feudalismo, surge a Idade Moderna, e consigo inúmeras guerras religiosas, e por resultado uma crise social se generalizou por todo o continente europeu e consequentemente o número de desafortunados e delinquentes, nesta fase o Estado busca assumir sua função punitiva, embora, com influências da Igreja, cujo mérito atingido pelo Direito Penal canônico foi consolidar a punição pública como a única justa e correta, em oposição à pratica individualista da vingança privada utilizada pelo Direito germânico. (DIAS, 2005, p. 1).

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Assim, no Estado absolutista, a pena foi adotada como um castigo, ou seja,

um “pagamento” por algum pecado cometido contra um soberano, pois este era tido

como um representante de Deus e todo poder estava em suas mãos, por isso o

Estado poderia impor as penas.

Com o fim do feudalismo, iniciou a era do capitalismo como regime

econômico e político, sendo um dos principais motivos parada criação das prisões

como meio emergente para conter a grande massa da classe menos favorecida do

regime dominante, que era o da burguesia, o qual implantava disciplinas e às

condições impostas ao trabalho do regime capitalista.

A pena serviu também para suprir a falta e a crescente necessidade de mão

de obra. Portanto, as casas de correção ou de trabalho, para onde eram mandados

os condenados, foram os antecedentes do que hoje conhecemos por cárcere.

Assim, a pena, atendia à prevenção geral, através da qual, segundo Dias

(2005):

[...] o trabalhador livre sentia-se intimidado e com medo de ser enclausurado em uma casa de trabalho, motivo pelo qual acabava por se acostumar à disciplina e às condições impostas ao trabalho no regime capitalista, ou ficarem presos nas casas de trabalhos, que exigiam os trabalhos forçados do presidiário sem lhes remunerar (exploração), sistema iniciado na Inglaterra e desenvolvida entre os holandeses. Logo, disseminado por todo o mundo. (DIAS, 2005, p. 1).

Neste período de transição, a Igreja perdeu parte de seu poder, sendo agora

a imagem de representante do onipotente transferido ao Monarca, que significava o

Estado e era reconhecido pelos súditos a quem deferiram o poder de castigá-los.

Nesta época, a pena predominante era a de morte, aplicada por meios cruéis

e desumanos como pela forca, fogueira, roda, arrastamento, esquartejamento,

estrangulação, sepultamento em vida etc.

Por outro lado, no Brasil, conforme explica Dias (2005) ocorria a fase do

“descobrimento” e posterior colonização, adveio a legislação penal exportada pela

Coroa Portuguesa, constantes nas famosas Ordenações do Reino.

Assim, no período colonial brasileiro, vigoraram as ordenações Afonsinas e

Manuelinas que tratavam do tema penal como uma privação da liberdade que era

usada para garantir o julgamento ou como meio coercitivo no pagamento da pena

em dinheiro. Já as ordenações filipinas, que foram introduzidas no Brasil

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posteriormente, e continham previsões de delitos e várias formas de suplício que

poderiam ser aplicados aos condenados.

Estas ordenações foram substituídas pelo código de D. Sebastião (até 1603).

Passou-se, então, para as Ordenações Filipinas, que refletiam o Direito Penal dos

tempos medievais. Este é considerado o primeiro Código Penal brasileiro.

Segundo Duarte (2013), esta ordenação fundamentava-se largamente nos

preceitos religiosos. O crime era confundido com o pecado e com a ofensa moral,

punindo-se severamente os hereges, apóstatas, feiticeiros e benzedores. As penas

severas e cruéis (açoites, degredo, mutilação, queimaduras etc.) visavam infundir o

temor pelo castigo.

Além da larga cominação da pena de morte, executada pela força, com torturas, pelo fogo etc., eram comuns as penas infamantes, o confisco e os galés. Aplicava-se, até mesmo, a chamada "morte para sempre", em que o corpo do condenado ficava suspenso e, putrefazendo-se, vinha ao solo, assim ficando, até que a ossada fosse recolhida pela Confraria da Misericórdia, o que se dava uma vez por ano. (DUARTE, 2013, p. 2).

Além de tudo isso, as penas eram desproporcionais à falta praticada, não

sendo fixadas antecipadamente. Eram desiguais e aplicadas com extrema

perversidade.

Proclamada a independência, previa a Constituição de 1824, que se

elaborasse uma nova legislação penal e, em 16 de dezembro de 1830 D. Pedro I

sancionava o Código Criminal do Império.

Duarte (2013) afirma que:

[...] de índole liberal, este código fixava-se na nova lei um esboço de individualização da pena, previa-se a existência de atenuantes e agravantes, e estabelecia-se um julgamento especial para os menores de 14 anos. A pena de morte, a ser executada pela força, só foi aceita após acalorados debates entre liberais e conservadores no congresso e visava coibir a prática de crimes pelos escravos. Todavia, não separada a Igreja do Estado, continha diversas figuras delituosas, representando ofensas à religião estatal. (DUARTE, 2013, p. 2).

Com a República foi editado, em 11 de outubro de 1890, o Código Criminal da

República, logo alvo de duras críticas pelas falhas que apresentava que decorriam,

evidentemente, da pressa com que fora elaborado.

Segundo Duarte (2013):

Em virtude de a Constituição de 1891 haver abolido a pena de morte, a de galés e a de banimento judicial, o Código Republicano de 1890 contemplou

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as seguintes sanções: prisão; banimento (que era o banimento judicial que consistia em pena perpétua, diversa, portanto, desse, que importava apenas em privação temporária); interdição (suspensão dos direitos políticos, etc.); suspensão e perda de emprego público e multa. (DUARTE, 2013, p. 2).

Todavia, houve a necessidade de modificar este código, sendo que várias leis

esparsas foram sendo criadas para isso. Mas, tais leis não poderiam ficar desta

forma, então coube ao desembargador Vicente Piragibe o encargo de consolidar tais

leis. Surgia, portanto, através do Decreto nº 22.213, de 14 de dezembro de 1932, a

denominada Consolidação das Leis Penais de Piragibe, que vigorariam até 1940.

Duarte (2013) afirma que “composta de quatro livros e quatrocentos e dez

artigos, a Consolidação das Leis Penais realizada pelo Desembargador Vicente

Piragibe, passou a ser, de maneira precária, o Estatuto Penal Brasileiro”.

O Código Penal brasileiro atual entrou em vigor no ano de 1940, com

alterações em 1969, 1978 e 1984. O Código de Processo Penal (LEP) passou a

vigorar no ano de 1941. Já a lei de execuções penais, que tem por objetivo efetivar

as disposições de sentenças ou decisões criminais e proporcionar condições para a

harmônica integração social do condenado e do internado, é datada de 1984.

Esta lei, segundo a exposição de motivos que a acompanha, tentou obedecer

no que coubesse às regras mínimas da ONU (Organizações das Nações Unidas)

equivalente aos direitos dos presos, pois estas constituem a expressão de valores

universais tidos como imutáveis no patrimônio jurídico do homem.

E, além destes direitos inerentes à saúde, educação, trabalho, etc, a Lei de

Execução Penal dispõe que ao preso cabe cela individual, com requisitos básicos à

salubridade e área mínima. As Penitenciárias e as Cadeias Públicas deveriam,

portanto, ter celas individuais. Mas, isto não é o que ocorre na realidade, pois o que

se vê é um grande amontoado de condenados que têm que dividir seu espaço em

celas superlotadas.

O que se conclui é que esta lei tentou manter um mecanismo onde os presos

pudessem ter seus direitos garantidos no que se refere aos direitos humanos e às

garantias constitucionais. Contudo, não é o que acontece na prática, pois as prisões

estão cada vez mais superlotadas e os direitos humanos cada vez mais esquecidos

pelo Estado e pela sociedade.

Ottoboni (2001) dispõe ainda que a função da pena é dupla: punitiva e

recuperativa. Punitiva pela sua própria natureza e de emenda do infrator na sua

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essência. O delinquente é condenado e preso por imposição da sociedade, ao passo

que recuperá-lo é um imperativo de ordem moral, do qual ninguém deve se escusar.

2.3 As penitenciárias brasileiras e os detentos: perfil, características e situação

atual

As relações em sociedade implicam regras e limites.

Segundo Corrêa (2009):

É próprio do ser humano viver em sociedade, no entanto, como se pode observar atualmente, essa convivência está repleta de problemas. Estes conflitos são históricos, uma vez que as relações em sociedade possuem complexidades, oriundas de opiniões contrárias, de papéis invertidos, ou compromissos e deveres não assumidos, conforme pôde ser visto anteriormente. No âmbito penitenciário, estes conflitos tornam-se ainda mais expressivos, por uma infinidade de motivos, principalmente pelo papel omisso do Estado em garantir direitos mínimos. (CORRÊA, 2009, p. 29).

As penitenciárias, inicialmente, foram criadas para terem como objetivo

buscar a reeducação do indivíduo que cometeu algum delito perante a lei, através da

reclusão. É a medida mais eficaz encontrada na atualidade para punir o indivíduo

que infringe a lei, privando-o da liberdade, maior bem comum ao cidadão.

Todavia, conforme explicam Guerreiro, Matos e Belfort (2010):

[...] em toda sociedade verifica-se a dificuldade de compreender os direitos que devem ser alcançados pelos reclusos, pois a sociedade é “treinada” a vê-los como pessoas sem direito. Os reclusos têm a privação da liberdade como uma consequência da prática de algo que contraria a lei e ainda os limites que implicam as relações sociais, no entanto isso não os priva de terem ao seu alcance, alguns direitos mínimos, como saúde e educação. (GUERREIRO; MATOS; BELFORT, 2010, p. 7).

Mesmo reclusas estas pessoas continuam tendo estes direitos, pois sua

dignidade deve ser respeitada.

O art. 41 da Lei de Execução Penal enuncia os direitos do preso. Além disso,

os direitos humanos do preso estão previstos em vários documentos internacionais e

nas Constituições modernas. A Constituição de 1988 contém garantias explícitas

para proteção da população encarcerada, entre essas o inciso onde "é assegurado

aos presos o respeito à integridade física e moral". E o Código Penal, em seu art. 38,

descreve que: “O preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da

liberdade, impondo-se a todas as autoridades o respeito à sua integridade física e

moral”.

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Segundo o Jornal Eletrônico “Recomeço” (2010), a população carcerária do

Brasil está distribuída em vários estabelecimentos de diferentes categorias, incluindo

penitenciárias, presídios, cadeias públicas, cadeiões, casas de detenção e distritos

ou delegacias policiais. A LEP estabelece que as várias categorias de

estabelecimentos sejam identificáveis por características específicas e que sirvam a

tipos específicos de presos. Na prática, no entanto, essas categorias são muito mais

maleáveis e a troca de presos das várias classificações entre os diversos

estabelecimentos, muito maiores do que a lei sugere.

Magnabosco (1998) afirma que o preso não só tem deveres a cumprir, mas é

sujeito de direitos, que devem ser reconhecidos e amparados pelo Estado. O recluso

não está fora do direito, pois se encontra numa relação jurídica em face do Estado, e

exceto os direitos perdidos e limitados a sua condenação, sua condição jurídica é

igual à das pessoas não condenadas. São direitos e deveres que derivam da

sentença do condenado com relação a administração penitenciária.

O artigo 41 da Lei de Execução Penal fala que o preso tem direito à vida,

assistência à saúde, assistência material, jurídica e religiosa.

E ele tem também direito de orientar a educação de seus filhos e de ter sua

própria educação, mesmo dentro da prisão.

Magnabosco (1998) dispõe sobre alguns direitos dos presos:

(...) relativamente, aos direitos sociais: direito à educação e ao trabalho remunerado, juntamente com os benefícios da seguridade social, descanso, pecúlio e recreação; Direito à seguridade social, como direito adquirido, que não se suspende com o rompimento da relação de emprego no meio livre. Direito ao tratamento reeducativo (é direito fundamental, do qual derivam os demais direitos); Direito a cela individual; Direito a alojamento com condições sanitárias; Direito ao processo disciplinar, quando lhe for suposta infração disciplinar, não tipificada ou sem justificativa; Direito à qualidade de vida; Direito à progressão e afetação do regime apropriado, e ao estabelecimento que lhe for indicado pelo Centro de Observação; Direito do egresso à assistência pós-penal, que decorre da obrigação do Estado de assistir moral e materialmente o recluso na sua volta ao meio livre; Direito de propor ação judicial para defesa de seus direitos por intermédio de Defensoria Pública ou advogado constituído. (MAGNABOSCO, 1998, p. 2).

Todavia, estes direitos não são garantidos aos presos, tendo em vista a

realidade da situação atual das penitenciárias brasileiras.

Guerreiro, Matos e Belfort (2010) afirmam que:

O sistema carcerário no Brasil está falido. A precariedade e as condições subumanas que os detentos vivem hoje são contrárias à dignidade da pessoa humana, pois os presídios se tornaram depósitos humanos, onde a

17

superlotação acarreta uma série de problemas, tais como; violência sexual entre presos, que por sua vez acarretam doenças graves que se proliferem, drogas cada vez mais são apreendidas dentro dos presídios, e o mais forte, subordina o mais fraco, realidade vivida hoje, no sistema prisional brasileiro, onde quase diariamente a mídia publica matéria sobre rebeliões em presídios, meio pelo quais os detentos encontram para reivindicar seus direitos. (GUERREIRO; MATOS; BELFORT, 2010, p. 8).

Os estabelecimentos penitenciários brasileiros variam quanto ao tamanho e

capacidade de lotação. Todavia, o problema é que assim como nos

estabelecimentos penais ou em celas de cadeias o número de detentos que ocupam

esses lugares é muito superior ao permitido por lei.

De acordo com o Jornal Eletrônico “Recomeço” (2010), a LEP dispõe que os

estabelecimentos para presos condenados seriam divididos em três categorias

básicas: estabelecimentos fechados, como os presídios; semi-aberto, que incluem

colônias agrícolas e industriais; e estabelecimentos abertos, como as casas do

albergados. Um preso condenado seria transferido para um desses

estabelecimentos segundo o período de sua pena, o tipo de crime, periculosidade

avaliada e outras características. No entanto, se ele iniciasse o cumprimento de sua

pena em um presídio, ele deveria normalmente ser transferido para um do tipo

menos restritivo antes de servir toda sua pena, permitindo assim que ele se

acostumasse com uma liberdade maior e, de forma ideal, ganhasse noções úteis

antes de retornar à sociedade.

Mas, na prática, não é isso que acontece. O que se vê uma realidade que

passa longe das descrições da lei. Primeiro, o sistema penal do país sofre a falta de

uma infraestrutura física necessária para garantir o cumprimento da lei.

Ainda, de acordo com o Jornal Eletrônico “Recomeço” (2010), em muitos

estados, por exemplo, as casas dos albergados simplesmente não existem; em

outros, falta capacidade suficiente para atender o número de detentos. Colônias

agrícolas são igualmente raras. Com isso, não existem vagas suficientes nos

presídios para suportar o número de novos detentos, forçando muitos presos

condenados a permanecerem em delegacias durante anos ou então, superlotarem

as celas dos presídios.

Os detentos não conseguem manter sua dignidade e garantir seus direitos.

Com isso, surgem as rebeliões e o regresso do preso ao crime quando é libertado.

As prisões, que deveriam ressocializar os detentos, acabam por torna-los ainda mais

perigosos para a sociedade.

18

Gerreiro, Matos e Belfort (2010) afirmam que “a superlotação devido ao

número elevado de presos é talvez o mais grave problema envolvendo o sistema

penal. As prisões encontram-se abarrotadas, não fornecendo ao preso um mínimo

de dignidade”.

Assis (2007) explica que:

A superlotação das celas, sua precariedade e insalubridade tornam as prisões um ambiente propício à proliferação de epidemias e ao contágio de doenças. Todos esses fatores estruturais, como também a má-alimentação dos presos, seu sedentarismo, o uso de drogas, a falta de higiene e toda a lugubridade da prisão fazem com que o preso que ali adentrou numa condição sadia de lá não saia sem ser acometido de uma doença ou com sua resistência física e saúde fragilizadas. (ASSIS, 2007, p. 1).

E, acima de tudo, como não há garantia dos direitos mínimos dos detentos, as

prisões não conseguem atingir sua finalidade precípua, que seria a punição e a

ressocialização, onde o preso voltaria para a sociedade sabendo que não mais

poderia cometer outros crimes.

Ressocialização deriva de sociedade, e significa retorno ao convívio social, é

este o objetivo para que a pena reeduque o detento, para que não ocorra a

reincidência.

Além disso, é de competência do Estado, garantir segurança pública e o bem-

estar social, mas também é de sua competência respeitar todas as garantias e

direitos do preso, porem o sistema prisional, acaba violando seu principal direito

fundamental, a dignidade humana.

O estado deve investir nos estabelecimentos prisionais, investir em trabalhos

profissionais, técnicos, religiosos entre outros, para que ele possua mais chances de

ser reeducado. Deve também garantir e assegurar aos presos as garantias previstas

em lei durante o cumprimento de sua pena.

Porém, segundo Ferreira (2012):

[...] da forma como hoje se apresenta, o sistema carcerário não atende ao duplo objetivo da teoria da pena. O objetivo preventivo, na generalidade dos sistemas carcerários, não se concretiza, e o objetivo repressivo se concretiza com inúmeras falhas, precipuamente com violações aos direitos humanos assegurados em Tratados Internacionais e aos direitos fundamentais resguardados na Constituição de 1988. (FERREIRA, 2012, p. 1).

Ferreira (2012) ainda explica que a estrutura carcerária vigente funciona como

uma “escola da criminalidade”, onde detentos de diferentes potenciais criminosos

19

são obrigados a conviver em conjunto, em situações de expressiva afronta a

dignidade humana, o que leva à ausência de perspectivas de uma vida melhor e, por

conseguinte, à continuidade da vida criminosa, inclusive a graus mais elevados pela

influência de detentos mais habituados ao ambiente do crime.

Apesar da Constituição de 1988 dispor sobre os preceitos garantidores da

dignidade no âmbito penal, na prática, estes preceitos não se aplicam.

Ferreira(2012) afirma que:

Esta situação de colapso do sistema carcerário e desrespeito aos direitos fundamentais se dá, sobretudo pela descrença da população em um sistema que recupere o preso, o que leva ao desejo de um sistema de punição mais intenso. Direcionados por esse ponto de vista da população e pela falta de conveniência para a promoção pessoal e política muito governantes se abstêm de se engajarem na recuperação do sistema prisional. (FERREIRA, 2012, p. 1).

Segundo nossa legislação penal, a liberdade é a regra e a prisão a exceção e

a punição excessiva e cruel não pode ser implementada.

Mas, na prática, o que ocorre na atualidade, conforme explica Assis (2007):

[...] é constante violação de direitos e a total inobservância das garantias legais previstas na execução das penas privativas de liberdade. A partir do momento em que o preso passa à tutela do Estado, ele não perde apenas o seu direito de liberdade, mas também todos os outros direitos fundamentais que não foram atingidos pela sentença, passando a ter um tratamento execrável e a sofrer os mais variados tipos de castigos, que acarretam a degradação de sua personalidade e a perda de sua dignidade, num processo que não oferece quaisquer condições de preparar o seu retorno útil à sociedade. (ASSIS, 2007, p. 4).

Da forma como estão dispostas, hoje, as penitenciárias brasileiras, não há

garantia dos direitos dos detentos, com isso, a reincidência ao crime depois do

retorno à sociedade, é maior do que o número de detentos que conseguem voltar ao

trabalho e passam a ter uma vida longe do crime.

Essa realidade é um reflexo direto da forma como os presos são tratados

dentro das penitenciárias, pois além das condições subumanas a que são

submetidos, eles também tem que lidar com a rejeição da sociedade, quando

retornam para este convívio, de serem ex-detentos.

Assim, a educação dentro das penitenciárias é vista, além de um direito

primordial dos presos, como uma possível solução para a questão do trabalho,

quando o preso estiver fora da penitenciária.

20

Além de sofrer com o estigma de ser um ex-dentento, caso o preso não

possua nenhuma qualificação profissional, ficará ainda mais difícil sua reinserção na

sociedade. Se ele possuir instrução ou até mesmo graduação, o ingresso no

mercado de trabalho tende a ficar mais fácil de ser conseguido, com isso, a

criminalidade pode diminuir.

As pessoas encarceradas, assim como todos os outros, têm o direito à

educação. A Declaração Universal dos Direitos Humanos reconhece o direito

humano à educação em seu artigo 26 e estabelece que o objetivo dele é o pleno

desenvolvimento da pessoa humana e o fortalecimento do respeito aos direitos

humanos. Entende-se que os direitos humanos são universais, ou seja, para todas

as pessoas, são exigíveis e indivisíveis, por isso, devem ser respeitados.

Embora seja pacífico que os detentos são pessoas possuidoras de direito e

que devem ter garantida sua dignidade, o que se vê atualmente é um sistema

carcerário, no Brasil, que não funciona, pois a precariedade e as condições

subumanas que os detentos vivem hoje são contrárias à dignidade da pessoa

humana.

Guerreiro, Matos e Belfort (2010) afirmam que:

Os presídios se tornaram depósitos humanos, onde a superlotação acarreta uma série de problemas, tais como; violência sexual entre presos, que por sua vez acarretam doenças graves que se proliferem, drogas cada vez mais são apreendidas dentro dos presídios, e o mais forte, subordina o mais fraco, realidade vivida hoje, no sistema prisional brasileiro, onde quase diariamente a mídia publica matéria sobre rebeliões em presídios, meio pelo quais os detentos encontram para reivindicar seus direitos. (GUERREIRO; MATOS; BELFORT, 2010, p. 10).

Por isso, é que se fala na necessidade urgente de uma modernização, tanto

na estrutura física das penitenciárias, como também na estrutura interna relacionada

à assistência jurídica, melhoria de assistência médica, psicológica e social,

ampliação dos projetos visando o trabalho do preso e a ocupação, separação entre

presos primários e reincidentes, acompanhamento na sua reintegração à vida social,

bem como oferecimento de garantias de seu retorno ao mercado de trabalho entre

outras medidas.

Diante do que se vê atualmente e pelo conceito de educação, que melhor

será explicado no próximo capítulo, fica claro que a educação seria uma importante

solução para acabar com a ociosidade dos detentos e oferecer uma possibilidade de

voltar ao mercado de trabalho.

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Todavia, além de não ter o apoio necessário para que este projeto seja

seriamente implementado, os estabelecimentos penitenciários brasileiros estão

superlotados e não há sequer local para ministrar as aulas, nem mesmo motivação

para os detentos virarem alunos.

As penitenciárias brasileiras variam quanto ao tamanho, forma e desenho. O

problema é que assim como nos estabelecimento penais ou em celas de cadeias o

número de detentos que ocupam esses lugares chega a ser de cinco vezes mais

que a capacidade.

Segundo Guerreiro, Matos e Belfort (2010):

[...] rebeliões são formadas para buscar no Estado a dignidade humana de que o preso tem direito. Com a lotação do sistema prisional, não existem mais estabelecimentos prisionais destinados, exclusivamente, aos presos que aguardam julgamento. A reivindicação mais comum é a de melhores condições nos estabelecimentos prisionais. (GUERREIRO; MATOS; BELFORT, 2010, p. 10).

No Brasil, dados do Sistema Integrado de Informações Penitenciárias –

Infopen (apud CARREIRA, 2010) apontam que de 2008 a 2010 o Brasil possuía uma

média de 446.687 pessoas adultas privadas de liberdade, sendo que 94% são

homens e 6% mulheres, distribuídos em 1094 unidades prisionais estaduais e

federais.

Muitas dessas pessoas não completaram sequer o ensino fundamental e

também, a maioria, é jovem, com idade entre 18 e 29 anos.

Com relação à atividade laboral e educacional, o Infopen (apud CARREIRA,

2010) aponta que apenas 26% participam de atividade laboral e 18% de atividade

educacional dentro da prisão.

Segundo o relatório de desenvolvimento humano no Brasil, o perfil da população carcerária é o resultado de uma sequencia de fatores, dentro dos quais está incluído a maior exposição de certos segmentos (homens, negros, jovens, pobres) a situações que levam ao crime, mas também um eventual tratamento desigual da Justiça, aplicando as penas mais ou menos rigidamente, dependendo do tipo de grupo de que se trate. Os indicadores desse setor, apesar de falhos em alguns pontos, não deixam dúvidas: homens negros (sobretudo os de cor preta) têm participação maior na população carcerária do que na população brasileira adulta. (CARREIRA, 2010, p. 18).

Além disso, segundo diagnóstico sobre a situação das prisões, realizado pelo

Conselho Nacional de Justiça – CNJ (apud CARREIRA, 2010), várias pessoas

22

estavam presas de forma irregular, pois já poderiam ter seus processos analisados e

estarem em liberdade. Havia casos em que, depois de anos de prisão, os inquéritos

policiais nem sequer tinham sido concluídos.

Para Carreira (2010):

[...] desde a democratização do país, as políticas penitenciárias estão imersas numa dinâmica contraditória: de um lado, pesam as heranças de arbítrio e violência, de gestão autoritária, de invisibilidade dos territórios de encarceramento, de baixos controles sobre a administração; de outro, a vigência do estado de direito impondo a necessidade de ajuste de agências e agentes às diretrizes democráticas. (CARREIRA, 2010, p. 18).

Magnabosco (1998) por sua vez, afirma que:

[...] a prisão tem sido nos últimos séculos a esperança das estruturas formais do Direito em combater o processo da criminalidade. Ela constituía a espinha dorsal dos sistemas penais de feição clássica. É tão marcante a sua influência em todos os setores das reações criminais que passou a funcionar como centro de gravidade dos programas destinados a prevenir e a reprimir os atentados mais ou menos graves aos direitos da personalidade e aos interesses da comunidade e do Estado. (MAGNABOSCO, 1998, p. 3).

Por isso, no momento em que o legislador e a sociedade entendeu que a

pena capital não atendia aos objetivos da prevenção, a prisão veio como forma de

atingir aos anseios culturais e sociais do povo e do próprio sistema político.

Para Magnabosco (1998)

A prisão é o monoacordo que se propõe a executar a grande sinfonia do bem e do mal. Nascendo geralmente do grito de revolta das vítimas e testemunhas na flagrância da ofensa, ela é instrumento de castigo que se abate sobre o corpo do acusado e o incenso que procura envolver a sua alma caída desde o primeiro até o último dos purgatórios. Somos herdeiros de um sistema que encontrou o seu apogeu no século das luzes quando o reconhecimento formal dos direitos naturais, inalienáveis e sagrados do Homem, impunha a abolição das penas cruéis. E a prisão não seria, portanto, uma pena cruel principalmente porque ela mantinha a vida que tão frequentemente era o preço do resgate para o crime cometido. (MAGNABOSCO, 1998, p. 3).

Isso mostra que o sistema prisional onde apenas o preso que é pobre é

condenado à reclusão não deve vigorar, pois a integridade física e a justiça deve ser

preservada, independente da classe social.

Carreira (2010) explica que “são relações de força e violência que organizam

e orientam as interações sociais dentro das unidades prisionais e as extrapolam,

fugindo a racionalidade legal que pauta um Estado Democrático de Direito”.

23

Por isso, torna-se urgente a necessidade de revisão da qualidade e

quantidade das sanções, não apenas quanto aos momentos da cominação e da

aplicação, mas também em referência à execução destas penas.

2.4 Educação: conceito e características

Segundo Durkheim (1978) a palavra educação tem sido muitas vezes

empregada em sentido demasiadamente amplo, para designar o conjunto de

influências que, sobre a nossa inteligência ou sobre a nossa vontade, exercem os

outros homens, ou, em seu conjunto, realiza a natureza. Ela compreende tudo aquilo

que fazemos por nós mesmos, e tudo aquilo que os outros intentam fazer com o fim

de aproximar-nos da perfeição de nossa natureza.

Porém, o que interessa para definir educação é a finalidade que ela atinge.

Kant (apud DURKHEIM, 1978) explica que o fim da educação é desenvolver,

em cada indivíduo, toda a perfeição de que ele seja capaz. E esta perfeição está

relacionada com o fato de levar ao mais alto grau possível todos os poderes que

estão em nós.

Esta definição levaria ao entendimento de que a educação poderia ser um

instrumento de felicidade para as pessoas.

Todavia, segundo Durkheim (1978):

Cada sociedade considera em momento determinado de seu desenvolvimento um tipo e um sistema de educação que é imposto aos indivíduos. Por isso, há costumes aos quais as pessoas são obrigadas a aceitar. Isso mostra que todo o passado da humanidade contribuiu para estabelecer um conjunto de princípios que dirigem a educação de hoje. (DURKHEIM, 1978, p. 76).

Assim, para se ter uma definição de educação é preciso considerar os

sistemas educativos que existem e compará-los para saber quais são as

características comuns.

Observando as características de cada sociedade, as ideias que são impostas

ao longo do tempo, os costumes das pessoas, pode-se chegar ao entendimento do

que é educação.

Neste ponto, Durkheim (1978) explica que a educação “é a ação exercida,

pelas gerações adultas, sobre as gerações que não se encontrem ainda preparadas

para a vida social; tem por objeto suscitar e desenvolver, na criança, certo número

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de estados físicos, intelectuais e morais, reclamados pela sociedade política, no seu

conjunto, e pelo meio especial a que a criança, particularmente, se destine”.

Deste conceito é possível entender que a educação consiste em uma

socialização da sociedade ao longo do tempo, pois a educação satisfaz as

necessidades sociais. As experiências pelas quais as pessoas vão passando são

aproveitadas pelas outras gerações e isso também faz parte da educação daquele

povo.

E a educação é um direito de todos, garantido constitucionalmente. Desta

forma, é dever do Estado garantir que este direito seja obtido por todas as pessoas.

O Estado tem influência direta na educação destas gerações, apesar de que,

devido aos costumes da sociedade, conforme foi dito anteriormente, a comunidade e

a família também tem total influência e colaboração nesta esfera.

Mas, mesmo sendo um dever do Estado garantir a educação, pois ela é uma

função essencialmente social, não incumbe a ele impor, conforme explica Durkheim

(1978):

[...] uma comunhão de ideias e sentimentos que tem a finalidade apenas de concretizar objetivos políticos. Assim, para o autor, a educação tem por objeto superpor ao ser que somos ao nascer, individual e associal, um ser inteiramente novo. Ela deve conduzir-nos a ultrapassar a natureza individual: só sob essa condição, a criança irá se tornar um homem. (DURKHEIM, 1978, p. 78).

2.4.1 O caráter social da educação

Toda transformação que seja importante na organização de uma sociedade

apresenta uma mudança de igual importância na ideia que o homem deve fazer de

si mesmo. Por isso, se fala que a educação tem caráter social, pois é ela que traça o

modelo do homem que cada um deve ser.

Desta forma, segundo Durkheim (1978), “a educação é, acima de tudo, o

meio pelo qual a sociedade renova perpetuamente as condições de sua própria

existência”.

Assim, quanto melhor a sociedade for conhecida, mais a escola poderá

evoluir.

Da mesma maneira, a educação, por possuir este caráter social, se faz

também necessária para o crescimento e a evolução das pessoas. Por isso,

percebe-se sua importância, ainda mais no caso dos detentos que, por sua vez, já

25

estão segregados e necessitam de motivação e estrutura para voltar a conviver em

sociedade.

Para Santana, Martins e Calil (2012) o direito à educação está insculpido

entre os direitos sociais da Constituição de 1988:

É também um direito fundamental porque, de um lado, consubstancia-se em prerrogativa própria à qualidade humana, em razão da exigência de dignidade, e, de outra parte, porque é reconhecido e consagrado por instrumentos internacionais e pelas constituições que o garantem. (SANTANA; MARTINS; CALIL, 2012, p. 150).

Com relação aos presos, o direito à educação, como sendo um direito social,

faz parte também do rol de seus direitos subjetivos, pois não é afetado pela

sentença que o condena e nem pela lei. Aliás, a lei garante a eles o direito á

educação.

Porém, apesar destas constatações, a educação permanece distante dos

mecanismos tradicionais de reabilitação do encarcerado.

A contradição entre a educação e a reabilitação penitenciária incide preponderantemente neste aspecto. A primeira almeja a formação dos sujeitos, a ampliação de sua leitura de mundo, o despertar da criatividade e da participação para a construção de conhecimento, a transformação e a superação de sua condição. Já a segunda atribui a absoluta primazia na anulação da pessoa, na sua mortificação enquanto sujeito, aceitando sua sujeição e condição como imutáveis ou, ao menos, cujas possibilidades para modifica-las estão fora de seu alcance, quando demonstra a necessidade da estruturação do processo educativo do preso fundamentalmente no diálogo, pressuposto para que os homens tornem-se humanos. (BÁRTOLI apud SANTANA, MARTINS, CALIL, 2012, p. 151).

Assim, as discussões a respeito da educação escolar no sistema prisional,

têm enfatizado as dificuldades em desenvolver, efetivamente, um programa de

educação, se este estiver ligado ao esquema de funcionamento da prisão, cujo

caráter é essencialmente disciplinar.

Nesse espaço, segundo Onofre (2004):

[...] a reabilitação requer a anulação do ser e não um empreendimento próprio para a sua formação como sujeito, tendo sua primazia centrada na aceitação da situação, e estando, portanto, as possibilidades de mudança fora de seu alcance. A educação, por seu lado, almeja a formação dos sujeitos, a ampliação de sua leitura de mundo, o despertar da criatividade, a participação na construção do conhecimento e a superação de sua condição atual. (ONOFRE, 2004, p. 3).

O princípio fundamental da educação escolar, que é por essência

transformador, aponta o tempo-espaço da escola como possibilidade enquanto a

26

cultura prisional, caracterizada pela repressão, pela ordem e disciplina, visando

adaptar o indivíduo ao cárcere, aponta para um tempo-espaço que determina

mecanicamente as ações dos indivíduos.

Santana, Martins e Calil (2012) explicam que “ainda que se considere que a

lei de execução penal trace alguns direitos ao preso, com a justificativa de reeduca-

lo para a reinserção social, o que se denota é que os mecanismos até então

aplicados são falhos”.

Além disso, muitas pessoas ainda tem o pensamento de que a educação não

é um direito fundamental, mas sim um privilégio que os presos têm e que gera

muitos gastos.

Por isso, segundo Onofre (2004):

[...] os programas educativos estabelecidos para as prisões devem estar inseridos em uma política pública de âmbito nacional, mas quando se pensa em formular esses programas, não pode ser esquecida uma referência básica – a relação futuro-presente-passado, uma vez que para o aprisionado, essa relação é fundamental, em qualquer programa educativo que se lhe apresente. (ONOFRE, 2004, p. 3).

O dia a dia estabelece muitas diretrizes, pois é ali que se vê o que é possível

fazer junto à realidade dos detentos.

Segundo Onofre (2004), a escola pode oferecer condições para que ele possa

conviver, no presente, com diferentes circunstâncias, sabendo a hora de “mostrar-

se” ou “esconder-se”, de falar ou de calar, de proteger-se para sobreviver. O

aprisionado traz, por outro lado, como memória, vivências por vezes negativas, de

situações pelas quais passou antes e durante sua carreira delinquência.

A autora revela que:

Em suas expectativas de futuro, está o desejo de começar uma nova vida, na qual possa trabalhar, voltar a estudar e construir uma família. Embora os estudos sobre a reincidência criminal apontem que suas expectativas acabam, na maioria das vezes, frustradas pelos rótulos, pelo despreparo em assumir atividades profissionais, por distorções de visão de mundo que fatalmente adquirem na “sociedade dos cativos”, é necessário que sejam prosseguidos estudos em busca da (re)construção de projetos educativos que visem à melhoria das escolas das unidades prisionais. (ONOFRE, 2004, p. 3).

Conforme foi dito anteriormente, os homens fazem a história a partir de uma

dada circunstância concreta e de uma estrutura que já existe. A sala de aula de

27

qualquer espaço educativo é portadora de várias culturas, várias cidadanias, várias

entidades, e a escola trabalha com esse jogo complexo de filiações e pertences.

Desta forma, segundo Onofre (2004):

[...] apesar dos limites de caráter ideológico, social, político e cultural, o professor tem presente que o elemento fundamental da eficácia de seu papel reside no processo de resgate da liberdade, e a escola é uma das instituições que melhor cumpre a tarefa de oferecer possibilidades que libertam e unem, ao mesmo tempo. Se o aprisionado vive em função desse resgate, não há que se medir esforços para o repensar da escola e de outras práticas educativas que ocorrem no interior das prisões. Embora o quadro que se apresenta não seja alentador, dada à falta de transparência das organizações penitenciárias e a distância entre o que propõe o governo e o que realmente ocorre no espaço prisional que dificultam possíveis melhorias, alguns passos podem ser dados, visto que muitos dos problemas existentes no interior da escola das unidades prisionais têm semelhanças com os de outros espaços escolares. (ONOFRE, 2004, p. 4).

2.5 Educação na prisão

2.5.1 Origens da inserção da educação nas penitenciárias

A educação nas prisões enfrenta uma situação onde ainda não há uma

modalidade específica que possa ser seguida, como é previsto na Lei de Diretrizes e

Bases da Educação – LDB. A educação na prisão insere-se na modalidade de

Educação de Jovens e Adultos- EJA. Porém, a educação na prisão é estigmatizada,

pois a sociedade ainda não consegue entender a viabilidade de sua prática,

colocando a questão como sendo uma “perda de tempo”.

Além disso, conforme Graciano (2005), de um lado, há as históricas restrições

à educação de jovens e adultos, mas, de outro, há o total descaso, por parte das

autoridades nacionais responsáveis pela efetivação da educação no País, em

relação à educação penitenciária, de tal modo que nem as insuficientes ações

educativas destinadas à população jovem e adulta chegam ao sistema prisional.

Apenas em março de 2005 o Ministério da Educação, através da Diretoria de

Educação de Jovens e Adultos implementou uma ação integrada com o Ministério

da Justiça e também com a Secretaria de Direitos Humanos no sentido de

desenvolver um projeto educativo voltado para os detentos.

Assim, ainda sem orientações claras do Ministério da Educação, a educação

para os presidiários acontece de acordo com as políticas públicas dos governos

estaduais.

28

A educação para pessoas jovens e adultas está formalmente assegurada

desde a Constituição de 1824, mas apenas em 1940 este tipo de educação serviu

de objeto para ações políticas educacionais.

De acordo com Santos (2005) a educação no sistema penitenciário é iniciada

a partir da década de 1950:

Até o principio do Século XIX, a prisão era utilizada unicamente como um local de contenção de pessoas – uma detenção. Não havia proposta de requalificar os presos. Esta proposta veio a surgir somente quando se desenvolveu dentro das prisões os programas de tratamento. Antes disso, não havia qualquer forma de trabalho, ensino religioso ou laico. (SANTOS, 2005, p. 1).

Para Foucault (1987) pensava-se que somente a detenção proporcionaria

transformação aos indivíduos enclausurados:

A ideia era que estes refizessem suas existências dentro da prisão para depois serem levados de volta à sociedade. Entretanto, percebeu-se o fracasso desse objetivo. Os índices de criminalidade e reincidência dos crimes não diminuíram e os presos em sua maioria não se transformavam. A prisão mostrou-se em sua realidade e em seus efeitos visíveis denunciadas como “grande fracasso da justiça penal”. (FOUCAULT apud SANTOS, 2005, p. 1).

Na década de 1950 percebeu-se que o sistema prisional não havia alcançado

sucesso, por isso, houve uma busca maior por novos caminhos de ressocialização,

o que acabou por motivar a inserção da educação nas prisões.

Para Foucault (apud SANTOS, 2005, p. 1) “a educação do detento é, por

parte do poder público, ao mesmo tempo uma precaução indispensável no interesse

da sociedade e uma obrigação para com o detento”.

Como exemplo, é possível citar a forma promovida pelo estado de São Paulo

que, até 1979, executava o ensino básico nos presídios através de professores

comissionados pela Secretaria de Educação que seguiam o calendário letivo das

escolas, com séries anuais e utilizavam o material didático-pedagógico que era

aplicado nestas escolas comuns.

Já em 1988 este fato mudou e a responsabilidade da educação nos presídios

foi delegada para a Fundação Estadual de Amparo ao Trabalhador Preso – FUNAP

que, conforme Santos (2005) “era encarregada da remuneração dos monitores,

funcionamento das escolas e metodologia de ensino a ser aplicada”.

29

Todavia, Sena (apud GRACIANO, 2005) afirma que a ausência de políticas

educacionais para a população encarcerada é resultado de uma controvérsia acerca

da responsabilidade administrativa sobre tal grupo:

A oferta do Ensino Fundamental para aqueles que a ele não tiveram acesso na idade própria é, em princípio, competência concorrente de Estados e Municípios. Ocorre que, ao Estado incumbe administrar o sistema penitenciário. Esta é, portanto, uma função que deve ser desta esfera federativa. Os sistemas estaduais de ensino regulamentam a educação de jovens e adultos sem abordar a questão dos presos. Os acadêmicos não se detêm, tampouco, nesta clientela específica. (SENA apud GRACIANO, 2005, p. 43).

Outro ponto importante de ser mencionado é que a educação escolar nas

prisões também não é bem vista pela sociedade civil. E as organizações de direitos

humanos que atuam na defesa dos direitos dos presos possuem bastante demanda

neste sentido e dão prioridade para a violação dos direitos civis principalmente com

relação à integridade física dos detentos.

Assim, atualmente, a educação de pessoas encarceradas no sistema prisional

ainda integra a chamada Educação de Jovens e Adultos - EJA.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB define a educação

de jovens e adultos como aquela destinada a pessoas “que não tiveram acesso ou

continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na idade própria” (BRASIL,

LDB, 1996).

A LDB regulamenta o direito previsto na Constituição brasileira em seu

capítulo II, seção 1, artigo 208, inciso I, de que todos cidadãos e cidadãs têm o

direito ao “Ensino Fundamental obrigatório e gratuito, assegurada, inclusive, sua

oferta para todos os que a ele não tiverem acesso na idade própria”. (BRASIL,

CRFB, 1988).

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional determina também que os

sistemas de ensino devem assegurar cursos e exames que proporcionam

oportunidades educacionais apropriadas aos interesses, condições de vida e

trabalho de jovens e adultos. Prevê que o acesso e a permanência devem ser

viabilizados e estimulados por ações integradas dos poderes públicos.

Sobre o Plano Nacional de Educação (PNE), lei aprovada pelo Congresso em

2001, Carreira (2009) explica que:

[...] estabelece que até 2011 o Brasil deve “implantar, em todas as unidades prisionais e nos estabelecimentos que atendam adolescentes e jovens

30

infratores, programas de educação de jovens e adultos de nível fundamental e médio, assim como de formação profissional, contemplando para esta clientela as metas nº 5 (financiamento pelo MEC de material didático-pedagógico) e nº 14 (oferta de programas de educação a distância)” (17ª meta). (CARREIRA, 2009, p. 14).

Existe uma proposta de Diretrizes Nacionais para Educação no Sistema

Prisional que ainda está sendo implementado e aguardando aprovação do Conselho

Nacional de Educação – CNE. O documento que consta tais diretrizes foi aprovado

no ano de 2009 pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária.

Sobre esta Diretriz, dispõem Sauer e Julião (2012):

Os Ministérios da Educação e da Justiça, reconhecendo a importância da educação para este público, iniciaram em 2005 uma proposta de articulação nacional para implementação do Programa Nacional de Educação para o Sistema Penitenciário, formulando as suas Diretrizes Nacionais. A referida proposta, apoiada pela UNESCO, culminou em 2006 com o I Seminário Nacional de Educação para o Sistema Penitenciário e, em 2007, o II Seminário Nacional. Uma série de atividades vem sendo desenvolvidas no sentido de estruturar tal política, destacando-se, dentre outras, a decisão dos dois Ministérios de investir, por meio de convênios com Estados, na construção de políticas estaduais de educação para os jovens e adultos em situação de privação de liberdade e do repasse de recursos financeiros visando à melhoria das condições de atendimento em nível local. (SAUER; JULIÃO, 2012, p. 3).

Conforme dispõem os autores, houve a aprovação das Diretrizes Nacionais

para a oferta de educação em estabelecimentos penais e também as Diretrizes

Nacionais para oferta de educação para jovens e adultos em situação de privação

de liberdade nos estabelecimentos penais.

Segundo Sauer e Julião (2012).

O governo federal, através do Ministério da Justiça, tem também apresentado uma série de ações e propostas que se destinam à prevenção, controle e repressão da criminalidade, atuando em suas raízes socioculturais e articulando ações de segurança pública com políticas sociais por meio da integração entre União, estados e municípios, vislumbrando a consolidação das diretrizes do Sistema Único de Segurança Pública. Os investimentos são voltados para o desenvolvimento de políticas para a melhoria do sistema prisional que contemplem a valorização dos profissionais e o apoio à implementação de projetos educativos e profissionalizantes para as pessoas com penas restritivas de liberdade e aos egressos do sistema penitenciário. Apontando alternativas para as metodologias utilizadas atualmente, vem tratando a segurança pública como uma política descentralizada e articulada com os estados e municípios, estimulando o reconhecimento dos programas de segurança como partes integrantes das políticas de inclusão social de habitação, educação, trabalho, lazer, assistência e geração de emprego e renda. (SAUER; JULIÃO, 2012, p. 3).

31

A implementação destas diretrizes será um avanço para a educação dos

jovens e adultos que estão em estabelecimentos penais, principalmente no que se

refere à didática proposta, à gestão e desenvolvimento do ensino-aprendizagem.

Além disso, houve uma alteração em 2011 na Lei de Execução Penal, sendo

que, se o preso passar a estudar na prisão, poderá haver uma redução de sua pena

do detento caso este faça parte do sistema de aprendizagem.

A própria Lei de Execução Penal (LEP), de 1984, prevê a educação no

sistema prisional no capítulo “Da Assistência”, seção V, dos artigos 17 a 21:

Art. 17. A assistência educacional compreenderá a instrução escolar e a formação profissional do preso e do internado. Art. 18. O ensino de 1º grau será obrigatório, integrando-se no sistema escolar da Unidade Federativa. Art. 19. O ensino profissional será ministrado em nível de iniciação ou de aperfeiçoamento técnico. Parágrafo único. A mulher condenada terá ensino profissional adequado à sua condição. Art. 20. As atividades educacionais podem ser objeto de convênio com entidades públicas ou particulares, que instalem escolas ou ofereçam cursos especializados. Art. 21. Em atendimento às condições locais, dotar-se-á cada estabelecimento de uma biblioteca, para uso de todas as categorias de reclusos, provida de livros instrutivos, recreativos e didáticos. (BRASIL, 1984).

Todavia, a educação nas penitenciárias ainda se encontra relativamente sem

respaldo específico para seu desenvolvimento. É necessário maior engajamento dos

governos federais, estaduais e municipais para que seja possível implementar as

diretrizes que vão nortear tal serviço e também sua efetivação.

2.5.2 Os professores e a educação na prisão

Onofre (2004) realizou uma pesquisa com alguns professores de São Paulo

que lecionam nas penitenciárias. Diante do que foi proposto pela autora, os

professores afirmaram faltar na escola da prisão uma melhor organização, pois,

segundo eles, as classes são heterogêneas e, apesar de haver muitos alunos

matriculados (até sessenta), apenas dez ou quinze são frequentes.

Ainda segundo a autora:

Da mesma forma, a rotatividade e a desistência acabam por se constituir em problemas para administrar as salas de aula. A heterogeneidade dos alunos aparece como uma das maiores dificuldades para os professores,

32

pois são jovens e adultos com diversos tipos de crimes e penas, primários e reincidentes, analfabetos e alfabetizados. Há também, aqueles que pararam de estudar recentemente, os que pararam há 10, 15, 30 anos e os que nunca foram à escola. Além desses elementos, existem os relacionados ao comportamento, ao interesse pelo estudo, às formas de aceitar, de encarar a vida na prisão e fora dela, às expectativas de vida e de integração social. (ONOFRE, 2004, p. 7).

Nos estudos desta autora, outro problema que os professores enfrentam é a

atitude dos próprios funcionários das penitenciárias que entendem que os detentos

não possuem direito à educação.

Com relação ao material didático, em sua pesquisa, os professores afirmam

que o despreparo para enfrentar a sala de aula é muito sério:

[...] Eles se formam na prática. Quando são contratados, recebem apenas algumas orientações gerais e muitas recomendações, tendo que se limitar ao que é permitido e não a uma prática autônoma e criativa. Às vezes, assistem a uma ou a duas aulas com um professor mais experiente e já têm que assumir as salas. (ONOFRE, 2004, p. 8).

Como se sabe, a formação continuada e a capacitação dos professores é

muito importante, todavia, não é o que se percebe na prática e no cotidiano da

educação na prisão. Por isso é tão importante a aprovação de uma diretriz e a

efetivação da mesma no sentido de buscar na prática a metodologia correta de

ensino e também da valorização dos professores.

Outra importante questão é apontada pela autora quanto à integração de

outros profissionais para a recuperação do detento:

Para os professores, a integração com os profissionais da segurança, saúde, psicologia, assistência social não ocorre, uma vez que não há aproximação nem preocupação com o trabalho dos outros e segundo eles, inexiste uma proposta educativa a ser desenvolvida pela equipe de reabilitação em busca da reinserção do preso à sociedade. Em suas falas, os professores deixam claro ser fundamental a integração de todos os profissionais envolvidos no processo de educação, e a percepção e compreensão de que o homem e a vida não estão prontos, acabados, cabendo a cada um fazer-se homem com a ajuda do outro. (ONOFRE, 2004, p. 10).

Da maneira como está estruturada hoje a escola na prisão, fica complicado

estabelecer critérios de didática e metodologia de ensino.

Onofre (2004), em sua pesquisa, relata que os professores apontam que o

coordenador da escola na prisão tem seu poder limitado, pois pode decidir sobre o

funcionamento da escola apenas nos fatos corriqueiros do dia-a-dia, e desde que

não mexa em nada da estrutura:

33

Sua função, na realidade, é manter a estrutura que ali está, e que a direção do presídio acha que é a ideal. [...] O funcionamento da prisão possuindo, portanto, estratégias e astúcias próprias, acaba por assegurar a sua existência e o seu fracasso. O coordenador tem função específica e não consegue penetrar a intimidade dos estabelecimentos não atingindo, assim, a consecução de suas metas. Fica claro, portanto, que a penitenciária, que se pretende um espaço de reeducação e ressocialização do preso, ao construir uma experiência ancorada no exercício autoritário do poder e da dominação, acaba por constituir-se, em uma organização cujas relações se socializam na delinquência, em universidade do crime, funcionando, dessa forma, pelo avesso. Tal funcionamento impede e afasta possibilidades de “outros pensares” sobre a instituição; há uma resistência do sistema em deixar-se conhecer, em avaliar as práticas com que executa suas funções e em reconhecer o discurso dos agentes que convivem em seu cotidiano e podem contribuir para a melhoria da qualidade das atividades que se desenvolvem em seu interior. (ONOFRE, 2004, p. 11).

O que fica claro é que os professores, embora saibam da importância da

escola e da educação, acabam por não conseguir realmente efetivar a intenção real

do ensino-aprendizagem na prisão.

Eles acreditam que da forma como está estruturada hoje nas penitenciárias, a

educação não consegue contribuir tanto para a ressocialização do detento “por não

ser um espaço autônomo e independente da organização penitenciária e sofrer

descaso dentro do espaço prisional”. (ONOFRE, 2004).

Para os professores, quando o aprisionado entra na prisão, deixa de ser cidadão e acaba estigmatizado pelo delito cometido. Ele passa a ser chamado pelo número do processo ou da infração – ‘o que pegou o 12’, ‘aquele que assaltou o supermercado’, ou ainda ‘o que matou o motorista’. Assim, ao ser chamado por um número em vez de um nome; ser obrigado a gestos de respeito e subordinação quando se dirige aos funcionários; usar um uniforme – que não tem somente uma função simbólica, mas permite sem hesitação a sua identificação – e por ter cometido um crime, ele renuncia ao seu direito de pertencimento à sociedade, ao status de cidadão, a ser membro atuante da sociedade na qual vive. É esse vínculo de confiança perdido que o aprisionado busca estabelecer com o professor. Para reintegrar essas pessoas ao convívio social, os professores afirmam que é preciso estar despojado de preconceitos sociais e culturais e conhecer o discurso do transgressor. (ONOFRE, 2004, p. 12).

Os próprios professores veem a prisão como um lugar que não recupera o

detento.

É nesse sentido que Castro et al. (apud ONOFRE, 2004), ao analisarem a

condição de estigmatizado do egresso penitenciário, afirmam que o aprisionado,

quando deixa a prisão, defronta-se com um dilema de outra natureza, que é o de

sobreviver frente a condições tão adversas de liberdade, que acabam por significar,

em muitos casos, a possibilidade real e concreta de retorno à prisão.

34

A prisão, apesar de ter em seu fundamento o objetivo de ressocialização, não

consegue obter sucesso diante das técnicas adotadas para seu desenvolvimento.

Os professores querem conceber uma educação escolar voltada para a

autonomia dos alunos e também para a real efetivação do ensino-aprendizagem.

Contudo, diante do espaço repressor dos estabelecimentos penais, este intuito

torna-se mais difícil de ser alcançado.

Para finalizar, cabe citar as palavras de Onofre (2004):

A educação escolar no interior das prisões deve e pode estar comprometida com as condições de vida dos encarcerados e contribuir para melhorá-las. É preciso afastar-se, no entanto, de qualquer postura ingênua em relação ao papel da escola dentro do sistema prisional, mas não há como negar que, nesse espaço, o homem aprisionado, muitas vezes, busca a sua identidade e o diálogo, reconstrói a sua história e valoriza os momentos de aprendizagem, tendo, portanto, como defendem os professores, o direito a uma escola competente, solidária, produtiva e libertadora. (ONOFRE, 2004, p. 15).

35

3 METODOLOGIA

Para o estudo, foi utilizada a abordagem qualitativa da pesquisa, bem como

análise documental.

A pesquisa qualitativa, segundo Santos (2000) é:

[...] aquela que busca descrever significados que são socialmente construídos, e por isso é definida como subjetiva; tem características não estruturadas, é rica em contexto e enfatiza as interações; e através da coleta de dados qualitativos, obtêm-se respostas que são semi-estruturadas ou não-estruturadas. As técnicas de análise são indutivas, orientadas pelo processo, e os resultados não são generalizáveis. Este tipo de pesquisa tem o intuito de identificar benefícios e resultados na clientela. Isto inclui a explicitação da subjetividade da percepção do outro. (SANTOS, 2000, p. 35).

Fizemos uma revisão bibliográfica de acordo com um referencial teórico

específico.

A pesquisa documental, para Santos (2000) é aquela realizada a partir de

documentos, contemporâneos ou retrospectivos, considerados cientificamente

autênticos:

A pesquisa documental é realizada em fontes como tabelas estatísticas, cartas, pareceres, fotografias, atas, relatórios, obras originais de qualquer natureza, notas, diários, projetos de lei, ofícios, discursos, mapas, testamentos, inventários, informativos, depoimentos orais e escritos, certidões, correspondência pessoal ou comercial, documentos informativos arquivados em repartições públicas, associações, igrejas, hospitais, sindicatos. A análise documental constitui uma técnica importante na pesquisa qualitativa, seja complementando informações obtidas por outras técnicas, seja desvelando aspectos novos de um tema ou problema. (SANTOS, 2000, p. 35).

O instrumento de análise documental foi o Projeto Político Pedagógico, em

vigência na Escola Estadual Professor Agmar Gomes Do Couto, na Penitênciária Dr.

Pio Canedo.

36

4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DO PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO

O presente capítulo apresenta a análise dos resultados da pesquisa realizada

na Escola Estadual Professor Agmar Gomes Do Couto, no intuito de conhecer a

realidade da escola na prisão.

Não foi possível aplicar questionários a todos devido ao tempo

disponibilizado, mas os resultados obtidos permitiram conhecer e refletir sobre o

tema pesquisado.

A Escola está localizada na Estrada dos Costas, sem número, na cidade de

Pará de Minas-MG.

De acordo com as informações fornecidas pela secretaria da Escola Estadual

Professor Agmar Gomes do Couto, seu corpo de profissionais conta com:

a) 01 diretor;

b) 01 vice diretor;

c) 02 especialistas;

d) 19 professores;

e) 01 eventual;

f) 01 professor auxiliar de biblioteca;

g) 02 auxiliares de secretaria;

h) 01 ajudante de serviços gerais.

Estão matriculados na Escola aproximadamente 250 alunos, distribuídos nos

seguintes turnos:

a) 1° turno, horário de 8h:00 ás 10:30 min; (Pavilhão I, Pavilhão semiaberto e

Pavilhão feminino);

b) Turno intermediário no Pavilhão Feminino, horário de 12h:30 min, ás 14h00

min;

c) 2° Turno, horário de 13h:30min as 16h00 min; (Pavilhão I, Pavilhão

semiaberto e Pavilhão feminino);

d) 3° Turno no Pavilhão Feminino, horário de 14h:30 min ás 17h00 min.

Como objetivo geral a escola busca aplicar e definir seu projeto colocando o

aluno como centro do processo de ressocialização e ensino aprendizagem

compromissado com a qualidade da educação.

Os objetivos específicos da escola têm como proposta um trabalho dinâmico,

37

construído e vivenciado em todos os momentos por todos os envolvidos no processo

de educação e ressocialização dos alunos.

O projeto político pedagógico foi desenvolvido dentro das necessidades e da

realidade da Escola, visando o desenvolvimento da potencialidade do aluno-

sentenciado e posteriormente sua reinserção social por meio do Ensino orientado

para sua formação:

a) Pessoal: desenvolvendo lhe o instrumento necessário à auto realização e a

comunicação interpessoal, de modo que se torne agente de seu próprio

desenvolvimento e da mudança social;

b) Social: desenvolvendo lhe as capacidades de reintegração social, de

desempenho consciente dos deveres e direitos dos cidadãos;

c) Intelectual: desenvolvendo lhe a aquisição de habilidades básicas como raciocínio

lógico e crítico.

Para Onofre (2007, p. 122) “a procura do saber através da Escolarização é

uma forma do aluno sentenciado reconstruir sua identidade firmando-se na

sociedade com a garantia de um futuro promissor”.

A família do aluno sentenciado é desconhecida da escola, não podendo ter

acesso à mesma, por medida de segurança. Os alunos são oriundos de várias

cidades da nossa Comarca e abrange vários perfis socioculturais.

Todo trabalho pedagógico deverá ser voltado para resgatar a autoestima,

valores e especialmente a normatização dos direitos e deveres do aluno sentenciado

perante a sociedade.

A maioria das salas de aula possuem turmas multisseriadas para adequar as

necessidades dos alunos.

A rotatividade e a movimentação dos alunos detentos é grande como:

transferências de unidades prisionais, mudanças de pavilhões devido às alterações

de cálculo de pena e como é de direito continuar a estudar, isto causa ausência e

muita das vezes um número maior ou menor de alunos em sala de aula.

Todas as atividades previstas no Calendário Escolar são voltadas para a

valorização do Ser Humano e o gosto pelo ensino-aprendizagem, procurando assim

reverter o quadro e preparar o sentenciado para que o mesmo seja inserido na

sociedade e apto à construção de sua ressocialização perante sua nova vida.

A escola tem como linha de pensamento Paulo Freire. Neste sentido, Onofre

38

(2007, p. 123), utilizando os ensinamentos de Freire explica que “o objetivo maior da

educação é conscientizar o aluno. Isso significa em relação ás parcelas

desfavorecidas da sociedade, levá-los a entender sua situação de oprimidos e agir

em favor da própria libertação”.

Quanto ao regime didático, a escola pesquisada utiliza o seguinte:

a) Ensino Fundamental - Anos Iniciais: Duração de três anos letivos,

organizados em três períodos desenvolvidos em regime atual, tendo cada

uma a duração de duzentos dias letivos, num total de 1.700 horas;

b) Ensino Fundamental - Anos Finais: Duração de três anos letivos, organizados

em três períodos desenvolvidos em regime atual, tendo cada uma a duração

de duzentos dias letivos, num total de 1.700 horas;

c) Ensino Médio: Duração de dois anos letivos, organizados em três períodos,

sendo o 1° período desenvolvido em regime anual de duzentos dias letivos, e

o 2° e o 3° períodos em regime semestral de cem dias letivos cada um, num

total de 1.200 horas.

Onofre dispõe que:

Pode-se dizer que a prática pedagógica dos professores atende, em parte, aos alunos do século XXI, sendo que a facilidade da utilização de recursos audiovisuais e outros incrementam a prática pedagógica, fazendo com que a mesma se aproxime sempre mais da realidade atual. Por outro lado, ainda há certa dificuldade de acesso a alguns desses recursos, como computador, juntamente com a internet. (ONOFRE, 2007, p. 128).

As aulas, na maioria das vezes são expositivas. Procuram sempre usar nas

aulas, sempre que possível, recursos como: músicas, gravuras, vídeos e outros para

expor o conteúdo programático. Há aulas que são ministradas com muitos recursos

que não são atraentes, pois, na escola não se pode entrar com qualquer material

sem antes passar pela revista, e muitas das vezes barrados devido a segurança.

As avaliações são elaboradas de acordo com o conteúdo lecionado, porém

não se pode aprofundar nos temas, já que se trata de um sistema prisional, onde

são restritos os métodos pedagógicos para uma melhor aprendizagem como por

exemplo: impedimentos de determinados materiais por parte da segurança, a

proibição quantos aos alunos levarem seus materiais (cadernos, livros, folhas), para

a cela e assim reforçar o seu próprio aprendizado.

As avaliações são de caráter brando, e na maioria das vezes, de consulta, já

que os alunos tem acesso ao material pedagógico somente dentro da sala de aula, o

39

que dificulta o aprofundamento nos testes de conhecimento.

Educação Física e o ensino religioso serão trabalhados através do Projeto

"Resgate com valores humanos na recuperação de uma vida melhor", implantado

em fevereiro de 2012.

Os estudos periódicos de recuperação paralela é ao final de cada bimestre

caso o aluno não obtenha, a média proposta do regimento. Assim sendo, é aplicado

um exercício avaliativo sobre o conteúdo aplicado durante o bimestre e em seguida,

a avaliação referente ao mesmo conteúdo.

A biblioteca é utilizada por todos os professores constituindo um acervo

razoável. A carga horária do aluno às vezes deixa a desejar, pois se trata de uma

escola dentro do presídio e muitas vezes, é preciso esperar para entrar nas salas

devido a procedimentos que são característicos de um sistema prisional, contudo, é

importante lembrar que vem melhorando.

É notório que os professores são queridos pelos alunos, pois além de

educadores, os professores são vistos como um dos poucos contatos com o mundo

exterior.

Estão sendo executados os seguintes projetos:

a) Projeto "RESGATE COM VALORES HUMANOS PARA A RECUPERAÇÃO

DE UMA VIDA MELHOR" implantado em 2012, contribuindo assim para a

formação humana, os sentenciados resgatam a essência de viver em

comunidade;

b) Projeto MEIO AMBIENTE, elaborado para tentar solucionar o descarte do lixo

orgânico do Complexo Penitenciário Dr. Pio Canedo, através da construção

de um minhocário e composteira gerenciada pela própria unidade e com a

participação dos alunos e demais detentos. Abrange a falta e o mau uso da

água dentro e fora da unidade, o descarte consciente de materiais reciclados

usados por todos na unidade. Este projeto está em fase de construção devido

á falta de recurso humano;

c) Projeto/ esquema de trabalho sobre as drogas, onde terão acesso á palestras,

vídeos educativos e ou informativos, panfletos, textos e outros.

Assim, diante de toda a pesquisa, foi possível verificar que a escola é

considerada como algo positivo dentro da prisão, a relação entre alunos e

professores favorece a aprendizagem e a permanência do preso na escola. Mesmo

40

com todas as dificuldades, limitação de espaço, material didático, os alunos

encontram no ambiente escolar um momento de descontração, um lugar de refúgio.

41

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Não há dúvidas que tanto as penas, quanto os sistemas prisionais evoluíram

com o passar do tempo, o que antes era visto como retribuir “o mal com o mal”, hoje

deu lugar á prevenção do ato criminoso e a recuperação do condenado, embora

uma das penas é reconhecer o mal causado pelo delito.

Esta pesquisa me levou a refletir sobre o grave problema da exclusão social

existente em nosso país, e acredito que é um erro afirmar que por si só a educação

conseguirá solucionar isso.

A condição precária dos estudantes no sistema educativo é uma forma de

exclusão. A diferença existente de outros sistemas educativos é que a educação

prisional está inserida no discurso de “escola, um direito de todos”, mas não para

todos.

Mas qual o papel da escola dentro do sistema prisional? Não tem como tentar

responder essa pergunta sem deparar com inúmeros obstáculos. Estrutura física

precária, falta de material didático, ausência de políticas públicas eficazes.

Quanto ás hipóteses de pesquisa pude compreender que nem todas fazem

parte da realidade prisional.

As políticas públicas não foram organizadas para resolver questões de

desigualdade, mas sim para administrar a pobreza, falta de higiene, limpeza,

alimentação e fechar os olhos diante dos problemas.

A escola no sistema prisional, ou seja, a EJA não se enquadra na realidade

dos encarcerados. É necessário criar estratégias que garantam não só o direito a

educação, mas a sua real efetivação.

Quanto aos professores, os recursos, estrutura física, material didático, tudo é

precário, trabalham em péssimas condições e ainda com medo pois são deixados á

própria sorte dentro da “cela” de aula, contam apenas com a cooperação e o

respeito dos educandos.

A escola proporciona mesmo que de forma limitada que os presos repensem

novas oportunidades de vida fora do sistema prisional e almejem um futuro em

sociedade.

Contudo fica claro, a necessidade de olhar para a condição miserável do

nosso sistema prisional para que seja efetiva a educação dentro e fora das prisões.

Este trabalho se encerra com as palavras de Onofre (2007):

42

Para entendermos a educação como mediadora de transformações, precisamos estar atentos ás suas ambiguidades, sermos críticos aos seus interesses, princípios e fins. A educação, como sabemos, tanto poderá ser um canal para a reprodução das normas e dos costumes que são hegemônicos em uma determinada sociedade quanto um meio importante para transformação (e não adaptação), para a luta contra a opressão, como forma de resistência, enfim, como “uma prática para a liberdade”. (ONOFRE, 2007, p. 152).

O detento cometeu algum erro, por isso está encarcerado. No entanto,

mesmo encarcerado ele é um ser humano, portador de direitos. A educação é um

direito, que sendo implementado com sucesso, na prisão, poderá fazer com que

esse ex-detento, possa acessar outros direitos e reconquistar a plenitude da

cidadania.

43

REFERÊNCIAS

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