Eduardo Pellejero_ Aquém Da Biopolítica (Aurora)

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  • 7/23/2019 Eduardo Pellejero_ Aqum Da Biopoltica (Aurora)

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    AQUM DA BIOPOLTICAA parte (sem parte) de Jacques Rancire

    Eduardo Pellejero

    Prof. da Universidade Federal do Rio Grande do orteE!mail" edupellejero#$mail.com

    Resumo%Aqu&m da 'iopoltica t*m pelo menos dois sentidos quando nos apro+imamos dao'ra de Jacques Rancire. Refere, por um lado, o enclausuramento da poltica nodomnio do que ele denomina de polcia, por parte de certas formas da filosofiacontempor-nea, a conta de uma rela/o de uma co!pertena entre o poder e a vida quedaria conta do funcionamento das sociedades modernas 0 nesse sentido, %aqu&msi$nifica uma insufici*ncia na coloca/o da quest/o, o fato de redu1ir o pro'lema da

    poltica 2 quest/o das rela3es de poder4. 5as %aqu&m da poltica refere, por outrolado, a postula/o contra!intuitiva da poltica enquanto processo especfico, aqu&m detoda a partil6a policial do sensvel, isto &, da poltica entendida enquantoadministra/o efetiva do comum, seja so' as suas fi$uras 6ist7ricas 6e$em7nicas, sejaso' as suas formas menores emer$entes 0 nesse sentido, %aqu&m di1 respeito a umespao transcendental no qual & possvel continuar a colocar a quest/o daemancipa/o universal al&m de qualquer supersti/o 6istoricista, mas tam'&m al&mde qualquer tentativa de redu/o da poltica 2 &tica. E+plorar o alcance e os limitesdesses dois sentidos da reserva crtica de Rancire em rela/o 2 quest/o da 'iopoltica& o modesto o'jeto deste arti$o.

    Palavras-chave" Rancire, 'iopoltica, poltica, polcia, emancipa/o.

    BEFORE BIOPOLITICS86e (no) part of Jacques Rancire

    As!rac!%9efore 'iopolitics 6as t:o meanin$s :6en :e approac6 t6e :or; of JacquesRancire. First, it means t6e imprison of politics in t6e domain of :6at 6e calls%police '< some forms of contemporar< p6ilosop6

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    A confronta/o com os discursos que temati1am o 'iopoder e a 'iopoltica &

    tardia na o'ra de Rancire, e n/o sur$e nos seus te+tos principais de forma direta (a

    rela/o da poltica e da vida na leitura de Arendt, pelo contrrio, perpassa de forma

    mais ou menos constante a sua refle+/o, e j & denunciada e+plicitamente em Nas

    bordas do poltico, 4BBHI). A sua interven/o no de'ate, em todo o caso, em certa

    medida forada atrav&s de entrevistas do $rupo associado 2 revista Multitudes, est

    li$ada com o que Rancire identifica como uma so'redetermina/o da poltica pela

    ontolo$ia, e cuja anlise desenvolvera so' o conceito de arqui!poltica em O

    desentendimento (4BBD). Perante a cele'ra/o $enerali1ada do retorno da filosofia

    poltica, Rancire manifestava ent/o uma reserva c6amativa, identificando nesse

    fenKmeno, menos uma redesco'erta filos7fica da pure1a da poltica (durante muito

    tempo redu1ida a mscara das rela3es sociais pelo mar+ismo), que um esva1iamento

    da poltica pela filosofia (num sentido pr7+imo, ainda que n/o id*ntico, ao

    denunciado por 9enjamin, na Aleman6a na1ista, a m/os da est&tica).A vitalidade demostrada pela filosofia poltica nas Lltimas d&cadas, em $rande

    medida consequ*ncia da sua redefini/o a partir de uma ontolo$ia da vida cujas

    formas se desdo'ram em projetos de diversos si$nos 0 da $enealo$ia do 'iopoder

    foucaultiana 2 fundamenta/o ne$riana de uma 'iopoltica revolucionria, e da

    delimita/o arendtina da vida econKmica e da vida poltica 2 filosofia da 6ist7ria de

    tom niilista que A$am'em reconstr7i a partir das no3es de so'erania e vida nua 0, a

    vitalidade demostrada pela filosofia poltica, di$o, constitui para Rancire uma derivadessa ordem. Procurando remeter a funda/o da poltica a modos de vida ou formas

    de e+ist*ncia (como & o caso em Arist7teles, que esta'elece uma distin/o entre os

    IM confronto com Arendt & especialmente interessante no te+to que Rancire dedica 2 quest/o dosdireitos do 6omem (RA?@RE, IHH). a entrevista condu1ida por Eric Allie1, tudo comea pela tentativa de enquadrar Rancire no6ori1onte do pensamento so're a 'iopoltica, interpretando o par conceitual polticaNpolcia em termosde duas formas de vida (RA?@RE, IH4H).Em O desentendimento, Rancire ar$umenta que os fil7sofos polticos de todas as &pocas, de Plat/o a

    5ar+, e de Arist7teles a Arendt, sempre tentaram su'stituir a desordem pr7pria da poltica pela ordem6ierrquica da filosofia, remitindo a poltica a princpios antropol7$icos, metafsicos ou reli$iosos. Parauma compreens/o da evolu/o do pensamento poltico de Rancire, ver PEOOEJERM (IHHB).

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    seres dotados de vo1 e os seres dotados de lin$ua$em), o pensamento filos7fico

    incorre num crculo vicioso, n/o oferecendo a descri/o falsa de um fenKmeno

    verdadeiro, mas oferecendo a descri/o verdadeira de um epifenKmenoD.

    escon6ecendo uma oposi/o fundamental, n/o entre dois modos de vida, mas entre

    duas partil6as do sensvel, entre duas estrutura3es do mundoC(a policial e a poltica),

    o pensamento 'iopoltico passa por alto que a poltica (e a sua impu$na/o da

    administra/o policial do comum) e+iste apenas como suplemento de qualquer forma

    de bios, de qualquer forma de su'jetividade constituda, de qualquer esfera de

    e+ist*ncia identificvel (RA?@RE IH4H, p. QC)Q.

    outras palavras, a refle+/o poltica n/o $ira em torno de modos de vida,

    como poderiam ser a vida nua e a vida qualificada, a vida do animal laboranse a do

    homo politicus, etc., mais em torno de duas formas de partil6a do sensvel, que,

    aqum das apostas do 'iopoder e das tentativas de articular uma alternativa

    'iopoltica, Rancire denomina de poltica e polcia (indo de encontro ao nosso modo

    6a'itual de compreender a poltica, isto &, c6amando de polcia o que 6a'itualmente

    pensamos so' a cate$oria do poltico).

    ?6amamos $eralmente pelo nome de poltica o conjunto dos processos pelos

    quais se operam a a$re$a/o e o consentimento das coletividades, aor$ani1a/o dos poderes, a distri'ui/o dos lu$ares e fun3es e os sistemas dele$itima/o dessa distri'ui/o. Propon6o dar outro nome a essa distri'ui/o eao sistema dessas le$itima3es. Propon6o c6am!la de polcia. (RA?@RE4BBC, p. 4)

    S verdade que nisso Rancire retoma uma no/o e+plorada por Foucault no

    pr7prio conte+to do nascimento da 'iopoltica, mas se$undo uma estrat&$ia de

    apropria/o que a separa =da associa/o 6a'itual polciaNaparel6o repressivo e

    tam'&m da pro'lemtica foucaultinana de disciplinari1a/o dos corpos 0 ou daD =A simples oposi/o entre os animais l7$icos e os animais fKnicos n/o & pois, de forma al$uma, odado so're o qual se funda a poltica.> (RA?@RE, 4BBC, p. D)C@sto &, entre duas maneiras de dividir o espao e o tempo, de ver e falar de o'jetos comuns, de ouvirou i$norar os sujeitos falam de tais o'jetos.QUma das tpicas cenas 2s quais Rancire remete a sua 6ip7tese de que a poltica n/o se funda numaforma especfica de vida, mas, pelo contrrio, & o processo pelo qual uma forma de vida passa a serconsiderada (tornada visvel, audvel, competente) no mundo comum, & o de Ml

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    %sociedade de vi$il-ncia> (RA?@RE, IH4H, p. Q). Rancire parece e+trair da

    no/o foucaultiana de polcia o seu duplo transcendental, enquanto princpio de

    partil6a do sensvel, conta$em totali1ante da situa/o, ordem do visvel e do di1vel 0

    caracteri1ada pela adequa/o ima$inria dos lu$ares, das fun3es e das maneiras de

    ser, assim como pela aus*ncia de va1ios e suplementos 0 a partir da qual s/o

    definidas, num se$undo momento, as estrat&$ias e as t&cnicas de poder (RA?@RE,

    IH4H, p. HH).

    A polcia & assim, antes de mais nada, uma ordem dos corpos que define asdivis3es entre os modos do fa1er, os modos de ser e os modos do di1er, que fa1que tais corpos sejam desi$nados por seu nome para tal lu$ar e tal tarefa &uma ordem do visvel e do di1vel que fa1 com que essa atividade seja visvel

    e outra n/o o seja, que essa palavra seja entendida como discurso e outra comorudo. S, por e+emplo, uma lei de polcia que fa1 tradicionalmente do lu$ar detra'al6o um espao privado n/o re$ido pelos modos do ver e di1er pr7prios doque se c6ama o espao pL'lico, onde o ter parcela do tra'al6ador &estritamente definido pela remunera/o de seu tra'al6o. A polcia n/o & tantouma %disciplinari1a/o dos corpos quanto uma re$ra de seu aparecer, umaconfi$ura/o das ocupaes e das propriedades dos espaos em que essasocupa3es s/o distri'udas. (RA?@RE, 4BBC, p. I)

    os tra'al6os de Foucault so're a $overna'ilidade, a polcia n/o constitua

    apenas uma institui/o ou um mecanismo no seio do Estado, mas uma t&cnica do

    $overno pr7pria do Estado"

    o que, at& o final do Anti$o Re$ime, se denominava polcia n/o era, ou n/oeraapenas, a institui/o policial era o conjunto dos mecanismos pelos quaiseram asse$uradas a ordem, o crescimento canali1ado das rique1as e ascondi3es de manuten/o da saLde %em $eral. (FMU?AUO8, 4BB, p. 4Q 0modificado por n7s)

    Foucault di1 que essa nova confi$ura/o do poder (que enquanto tal n/o

    aparece at& meados do s&culo VW@@), n/o & nem judiciria, nem militar, nem

    completamente poltica, e se encontra li$ada 2 necessidade capitalista de que todos os

    indivduos sejam vi$iados ao pr7prio nvel da sua inte$ra/o 2s normas do tra'al6o,

    em ordem a que, enquanto seres vivos, produ1am mais fora. %Polcia desi$na, nesse

    sentido, o novo domnio no qual o poder poltico e administrativo do Estado vai

    concentrar a sua interven/o (FMU?AUO8, 4BB, p. 4DH) o seu o'jeto estrat&$ico & o

    pr7prio 6omem, nas suas rela3es com o pr7prio corpo e com os outros 6omens, com

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    os territ7rios e as coisas, com a propriedade e com a produ/o, etc. (?AX8RM, IHH).

    Em resumo, o 6omem e tudo o que se encontra li$ado 2 sua felicidade. essa mesma

    medida, a no/o foucaultiana de polcia constitui =um dispositivo social onde se

    conju$am o m&dico, o assistencial e o cultural> (RA?@RE, 4BBC, p. 4),

    manifestando uma si$nificativa pro+imidade com a constitui/o 6ist7rica do 'iopoder,

    isto &, com esse deslocamento estrat&$ico que fa1 da vida 0 dos corpos dos indivduos

    ao flu+o das popula3es 0 um o'jeto dos investimentos do poder, da sua

    administra/o, controlo eNou disciplinamento.

    Rancire far dessa li$a/o o centro dos seus ataques aos discursos que

    pro'lemati1am o 'iopoder, na medida em que estes se situariam aqumda poltica, no

    domnio duma anlise restrita do e+erccio do poder, uma anlise que se limitaria a

    considerar a partil6a policial dos corpos e das a$re$a3es dos corpos, uma anlise que

    diria apenas respeito aos efeitos de poder na individuali1a/o da vida e na

    sociali1a/o das popula3es. 8odavia, Rancire dedu1ir polemicamente que, na

    medida em que a pro'lemtica do 'iopoder se encontra so'redeterminada pela anlise

    do e+erccio do poder, essa dist-ncia que a separa da poltica n/o pode ser desfeita

    sem reconfi$urar os termos do pro'lema, sem deslocar a perspectiva da apro+ima/o.

    Redu1idos a uma teoria do poder eNou a uma investi$a/o dos espaos da sua

    le$itimidade e funcionamento, os discursos que temati1am o 'iopoder n/o v/o al&m

    da esfera da polcia, n/o c6e$am a colocar jamais de forma pr7pria a quest/o poltica,

    que n/o se define pelo e+erccio do poder (RA?@RE, IHH4), ra1/o pela qual a

    no/o de 'iopoltica & sempre va$a e confusa.

    T certo parado+o em se querer inverter o pol*mico dispositivo de Foucault,visando afirmar um enrai1amento vitalista crucial da poltica. Pois, se a ideiade 'iopoder & clara, a de 'iopoltica & confusa. Uma ve1 que tudo o que

    Foucault menciona, situa!se no espao daquilo que eu denomino polcia. XeFoucault pode falar, indiferentemente, em 'iopoder e em 'iopoltica, & porqueseu pensamento so're poltica foi construdo em torno da quest/o do poder,uma ve1 que jamais esteve teoricamente interessado na quest/o dasu'jetiva/o poltica. (RA?@RE, IH4H, p. QQ)

    A leitura que Rancire fa1 de Foucault & certamente contestvelB,e voltaremos

    so're a mesma, mas o seu valor & menos 6ermen*utico que pol*mico, na medida em

    BPara comear, quando Rancire fala de uma aus*ncia de interesse pela su'jetiva/o poltica em

    Foucault, desestima qualquer valor poltico da temati1a/o foucaultiana da su'jetividade, que na suainterpreta/o se restrin$iria 2 &tica. Para um questionamento dessa interpreta/o ver 8assin (IH4I), vere Oa11arato (IHHH).

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    que se encontra associada 2 tentativa de denunciar a redu/o da poltica 2 quest/o do

    e+erccio do poder redu/o que, nas apropria3es contempor-neas do dispositivo

    foucaultiano, define $enericamente as duas lin6as maiores de desenvolvimento do que

    entendemos por %'iopoltica" 4) o solapamento do poder so'erano e a vida nua

    caracteri1ado por Gior$io A$am'en, e I) a ontolo$ia vitalista das multid3es nas

    condi3es do imp&rio desenvolvida por 5ic6el Tardt e 8on

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    poltica & redu1ida ao poder, um poder que & crescentemente assimilado a umirresistvel destino 6ist7rico!ontol7$ico do qual s7 eus parece poder livrar!nos. (RA?@RE, IHH, p. H4)

    A vida nua, e+posta sem reservas ao poder so'erano, encontra!se efetivamente

    aqum da poltica (tal como definida por Rancire). ?omo assinala o pr7prio

    A$am'en, nas condi3es do estado de e+ce/o permanente ao qual d lu$ar o

    'iopoder, so'redeterminada a 6umanidade at& os seus fundamentos 'iol7$icos por

    estruturas totali1antes, a teoria e a pr+is poltica s7 podem apresentar!se aos nossos

    ol6os nas formas do ne$ativo, aprisionadas e im7veis, a uma dist-ncia insupervel de

    qualquer forma de poltica emancipat7ria. esse sentido, o 'iopoder a$am'eniano

    constitui para Rancire uma forma atuali1ada do niilismo 6eide$$eriano

    (estrate$icamente permeado pela filosofia de Tanna6 Arendt4H).

    Zualquer tipo de reivindica/o de direitos (...) & assim encerrada por princpiona mera polaridade da vida nua e o estado de e+ce/o. Essa polaridade aparececomo uma esp&cie de destino ontol7$ico" cada um de n7s se encontraria nasitua/o do refu$iado num campo. (RA?@RE, IHH, p. H4)

    ?ertamente vivemos em ordens policiais oli$rquicas, re$idos por princpios

    de desi$ualdade, e, em $rande medida, essas ordens encontram!se perpassadas pelosdispositivos do 'iopoder (e, em casos e+tremos, por articula3es que e+p3em sem

    reservas a vida nua ao poder so'erano). Rancire poderia estar de acordo com tudo

    isso, mas em termos $erais n7s novivemos em campos (RA?@RE, IHHD, p. 4). A

    crtica de Rancire vai ao encontro desse dia$n7stico, e est associada a uma

    recupera/o de um conceito de poltica (e de democracia) que, na medida em que

    aspira a dar conta da possi'ilidade da nossa desincorpora/o em rela/o aos re$imes

    nos quais vivemos, relana mais uma ve1 o son6o preterido da emancipa/o universal.

    I) Em se$undo lu$ar, Rancire dialo$a, a uma dist-ncia crtica, com a

    tentativa de atri'uir um conteLdo positivo 2'iopoltica, ora a partir de modos n/o

    estatais de $overno e administra/o da vida, ora a partir de uma ontolo$iada vida que

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    Para ume mel6or aprecia/o da posi/o de Rancire em rela/o 2s crticas de Arendt e A$am'en aosdireitos 6umanos, ver o te+to de Ernst Wan en Temel (IHH). Enquanto aos elementos da filosofiaarendtiana que permeiam a o'ra de Rancire, ver 8assin (IH4I).

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    identifica a quest/o da su'jetividade poltica com a quest/o das formas de

    individua/o. A 'iopoltica confunde!se ent/o, se$undo Rancire, com uma

    transforma/o espiritual ou transfi$ura/o da vida (retomando nisso o modelo dos

    pro$ramas das van$uardas 6ist7ricas, que identificavam a reali1a/o da arte com a sua

    pr7pria supress/o na ela'ora/o de novas formas de vida), e cuja consequ*ncia

    imediata & a dissolu/o da poltica na tentativa de articular um novo poder

    constituinte.

    Ac6o que isso ainda se encontra vivo na vis/o contempor-nea de Tardt ee$ri so're o comunismo franciscano de multid3es, implantado atrav&s dopoder irresistvel das redes $lo'ais, que far e+plodir as fronteiras do @mp&rio.Em todos esses casos, a poltica e a arte reali1am a sua auto!supress/o em

    'eneficio de uma nova forma de vida indivisa. (RA?@RE, IHHC)

    A poltica & solapada ent/o pela ideia de uma sociedade nova, cujos elementos

    j se encontrariam formados no seio mesmo da sociedade atual. o caso de Tardt e

    e$ri, a esperana da refunda/o do comunismo a partir da pot*ncia das multid3es se

    apoia no investimento cada ve1 mais direto do poder na vida dos indivduos e das

    coletividades, e nas formas de produ/o imateriais pr7prias da sua inteli$*ncia

    coletiva, que nem sequer necessitam ser e+propriadas (tal & a 'oa nova) para fa1er

    e+plodir a ordem do @mp&rio" todo o que & necessrio & uma autoafirma/o

    et6opoi&tica.

    Rancire & irredutvel nisso. @nterro$ado por Eric Allie1 (RA?@RE, IH4H, p.

    QB) so're a possi'ilidade de pensar o conceito de 'iopoltica a partir de uma esp&cie

    de invers/o do 'iopoder, isto &, enquanto forma de articula/o de uma resist*ncia da

    vida social em rela/o aos dispositivos pr7prios do capitalismo, a sua resposta &

    cate$7rica" n/o 6 qualquer possi'ilidade de articular uma passa$em entre o 'iopoder

    (enquanto modo de e+erccio do poder) e a poltica (enquanto modo pr7prio de des!

    su'jetiva/o poltica que nos coloca necessariamente al&m de qualquer forma de vida

    determinada). 8rata!se, para Rancire, de duas l7$icas diferentes, de duas dimens3es

    diferentes" a das rela3es de poder e a das verifica3es da i$ualdade.

    A min6a posi/o atual & distanciar!me desse tipo de pensamento" n/o &quest/o de reapropriar!nos de uma capacidade que se encontra alienada e queconstitui o poder do capitalismo. M poder &, realmente, a coletivi1a/o da

    capacidade que j possumos, [a capacidade de\ criar uma rede especfica derela3es i$ualitrias. Para mim, portanto, esse & o ponto principal" di1 respeito

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    ao modo em que pensamos a rela/o entre a pressuposi/o da i$ualdade e aideia de uma possvel inteli$*ncia coletiva. (RA?@RE!PM]ER, IH4Ha, p.4)

    Para Rancire a poltica e+i$e renunciar 2 f& nos princpios que pressup3e o

    novo materialismo 6ist7rico (mais imaterial que nunca)" as formas de vida produ1idas

    por um sistema de domina/o nunca s/o mais do que a vida desse sistema, nen6uma

    sociedade desi$ual, nen6uma partil6a policial do sensvel carre$a em si nen6uma

    sociedade i$ualitria. As multid3es n/o nascem da sua desa$re$a/o (de nen6uma das

    suas partes) nem constituem a su'jetividade emer$ente de um processo 6ist7rico

    $lo'al. a mesma medida que os campos, o @mp&rio est aqumda poltica, que 'em

    pode prescindir de tais supersti3es. Pura contin$*ncia que amaa toda a ordem

    social44, a poltica & menos previsvel e mais precria.

    [A poltica\ n/o se funda em nature1a al$uma das coisas, nem se encontra$arantida por nen6uma forma institucional. /o & sustentada por necessidade6ist7rica al$uma nem sustenta nen6uma. /o se encontra confiada sen/o 2const-ncia dos seus pr7prios atos. (RA?@RE, IHHD, p. 4HC)

    A emancipa/o depende para Rancire da nossa desincorpora/o em rela/o

    2s partil6as policiais nas quais vivemos, encontra!se associada a uma especial formade su'jetiva/o. 5as trata!se de um processo de des!identifica/o e n/o de um

    processo de individua/o, de um processo de de!sujei/o e n/o de institui/o de novas

    formas de su'jetividade4I. outras palavras, trata!se da manifesta/o de uma

    diferena (entre uma su'jetiva/o e uma identifica/o), de um distanciamento (em

    rela/o s partes recon6ecidas na divis/o do comum), lo$o, de um movimento de des!

    su'jetiva/o, enquanto condi/o de possi'ilidade da instaura/o de uma comunidade,

    44 =Pois o fundamento da poltica, se n/o & nature1a, n/o & tampouco conven/o" & aus*ncia defundamento, & a pura contin$*ncia de toda ordem social. T poltica simplesmente porque nen6umaordem social est fundada na nature1a, porque nen6uma lei divina ordena as sociedades 6umanas.>(RA?@RE 4BBC, p. H)4I=%5ul6er em poltica & o sujeito de e+peri*ncia ^ o sujeito desnaturado, desfemini1ado ^ quemede a dist-ncia entre uma parcela recon6ecida ^ o da complementaridade se+ual ^ e uma aus*nciade parcela. %Mperrio, ou mel6or %proletrio, & da mesma forma o sujeito que mede a dist-ncia entre a

    parcela do tra'al6o como fun/o social e a aus*ncia de parcela daqueles que o e+ecutam na defini/odo comum da comunidade. 8oda su'jetiva/o poltica & a manifesta/o de um afastamento desse tipo.A 'em con6ecida l7$ica policial que jul$a que os proletrios militantes no so tra'al6adores masdesclassificados, e que as militantes dos direitos das mul6eres s/o criaturas estran6as a seu se+o tem,afinal de contas, fundamento. 8oda su'jetiva/o & uma desidentifica/o, o arrancar 2 naturalidade de

    um lu$ar, a a'ertura de um espao de sujeito onde qualquer um pode contar!se porque & o espao deuma conta$em dos incontados, do relacionamento entre uma parcela e uma aus*ncia de parcela.>(RA?@RE, 4BBC, p. )

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    mesmo que seja apenas so' a forma do lit$io so're a comunidade e so're a i$ualdade

    que pressup3e toda ordem des!i$ualitria. Pro'lemtica comunidade (porque

    pressup3e a i$ualdade mas s7 e+iste pela divis/o4) que & colocada a prova

    (verificada) caso a caso, mas da qual n/o se dedu1 conteLdo nen6um, forma de vida

    nen6uma, individua/o al$uma.

    A poltica n/o tem o'jetos pr7prios, nem sujeitos pr7prios, nem sequer

    quest3es pr7prias (RA?@RE, 4BBC, p. ). A poltica & simplesmente a institui/o

    de um lit$io" n/o d lu$ar instaura/o de um novo poder constituinte, apenas coloca

    em causa, torce, fora a reconfi$ura/o da ordem policial e+istente.

    A atividade poltica & a que desloca um corpo do lu$ar que l6e era desi$nado

    ou muda a destina/o de um lu$ar ela fa1 ver o que n/o ca'ia ser visto, fa1ouvir um discurso ali onde s7 tin6a lu$ar o 'arul6o, fa1 ouvir como discurso oque s7 era ouvido como 'arul6o. (RA?@RE, 4BBC, p. I cf. p. D)

    Em resumo, a defesa de uma no/o de poltica, enquanto interrup/o eventual

    (fu$a1, intempestiva) dos re$imes policiais e+istentes, leva Rancire a opor!se 2stentativas de pensar a poltica na encru1il6ada entre o poder e a vida, seja de um modo

    niilista, seja de um modo revolucionrio. Em am'os os casos Rancire encontra a

    mesma deriva ontol7$ica, a mesma so'redetermina/o ontol7$ica da poltica, quero

    di1er, o mesmo peri$o" porque, mesmo tratando!se de ontolo$ias da vida, am'as

    condu1em, n/o no sentido de uma maior compreens/o da poltica, mas no sentido da

    dissolu/o da desordem poltica na ordem filos7fica, na postula/o dos princpios que

    pretendem re$ula o seu espao ao mesmo tempo que projetam a sua e+terioridade.8al & 6ori1onte da denuncia da funda/o da su'jetividade poltica numa

    ontolo$ia da vida ou da e+ist*ncia, que Rancire identifica por i$ual nas distin3es

    entre vida qualificada e vida nua em A$am'en, vida alienada e vida recuperada em

    e$ri, e, mais profundamente, entre animal laborans e homo politicus em Arendt.

    Para Rancire, pensar a poltica corretamente (e distin$ui!la da polcia) implica fa1er

    4

    =A i$ualdade n/o & um dado que a poltica aplica, uma ess*ncia que a lei encarna nem um 'jetivoque ela se prop3e atin$ir. E apenas uma pressuposi/o que deve ser discernida nas prticas que a p3emem uso.> (RA?@RE, 4BBC, p. D)

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    um movimento de des!ontolo$i1a/o, recusando dedu1ir a poltica de qualquer forma

    de ontolo$ia (?TA59ERX, IH44, p. 4).

    Por outro lado, como j notamos, e reforando os ar$umentos contra!

    ontol7$icos, a crtica de Rancire ao 'iopoder, e, especialmente, 2queles que

    pretendem condu1ir essa anlise no sentido de uma 'iopoltica, passa por uma

    circunscri/o contra!intuitiva da pr7pria no/o de poltica, que a desli$a

    completamente das quest3es associadas 2 institui/o do poder, a or$ani1a/o do

    estado, a articula/o do social, a ar'itra$em do de'ate so're a coisa pL'lica, etc.

    (aspectos todos que di1em apenas respeito, se$undo Rancire, 2 partil6a policial do

    sensvel)4.

    @sto n/o si$nifica que Rancire reste toda import-ncia 2 anlise crtica da

    ordem policial nas nossas sociedades (noutras palavras, 2 poltica tal como &

    compreendida ordinariamente). e fato, na medida em que al$um tipo de ordem

    policial (uma certa constitui/o sim'7lica do social) & inevitvel, na medida em que

    n/o & possvel pensar a institui/o 6ist7rica plena da i$ualdade ou da li'erdade (n/o

    6 fora a'soluto em rela/o 2 ordem policial), Rancire desenvolve instrumentos

    crticos para avaliar, desde dentro, os re$imes 6ist7ricos nos quais vivemos. Zuero

    di1er que Rancire n/o remete a partil6a policial do sensvel a um plano de

    indefini/o onde tudo & equivalente, onde tudo vale por i$ual"

    T a polcia menos 'oa e a mel6or ^ n/o sendo a mel6or, alis, a que se$ue aordem supostamente natural das sociedades ou a ci*ncia dos le$isladores, masa que os arrom'amentos da l7$ica i$ualitria vieram na maioria das ve1esafastar de sua l7$ica _natural_. A polcia pode proporcionar todos os tipos de

    'ens, e uma polcia pode ser infinitamente prefervel a uma outra.(RA?@RE, 4BBC, p. )

    A$ora, mesmo se & possvel os re$imes policiais serem avaliados, contestados,

    e+postos ao risco da poltica, nada disso muda o fundamental" inclusive sendo $entil e

    amvel, a ordem policial =continua sendo, mesmo assim, o contrrio da poltica, e

    conv&m circunscrever o que ca'e a cada uma delas> (RA?@RE, 4BBC, p. ).

    um sentido similar, tentando delimitar uma no/o da esquerda, eleu1e

    afirmava n/o e+istir $overno de esquerda, ar$umentando que a pr7pria quest/o do

    $overno n/o era uma quest/o da esquerda" =/o & que n/o e+istam diferenas nos

    4Para uma apro+ima/o 2 sin$ularidade do deslocamento conceitual proposto por Rancire em rela/o2s no3es de poltica e democracia, ver o te+to introdut7rio de ?6am'er (IH4H), %Police and oli$arc6

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    $overnos. M que pode e+istir & um $overno favorvel a al$umas e+i$*ncias da

    esquerda. 5as n/o e+iste $overno de esquerda, pois a esquerda n/o tem nada a ver

    com o $overno> (EOEUYE!PARE8, 4BBD). Rancire retomar essa f7rmula

    pol*mica dir" =/o 6, propriamente, $overno democrtico. M $overno & sempre

    e+ercido por uma minoria so're uma maioria> (RA?@RE, IHHD, p. DB). A estrita

    separa/o da poltica da polcia proposta por Rancire responde 2 mesma preocupa/o

    manifestada por eleu1e (associada, pela sua ve1, 2 distin/o da 6ist7ria e do devir,

    do maior e do menor), e se$uramente est li$ada i$ualmente a eventualizao da

    poltica, isto &, a sua inscri/o numa ontolo$ia do acontecimento4D.

    Porque a poltica & rara para Rancire. A poltica acontece, ocorre, tem lu$ar

    cada ve1 que a l7$ica da ordem policial dominante & desafiada em nome de um

    princpio irracional e irra1ovel (lo$o, n/o fundante)" a i$ualdade da parte dos sem

    parte como comunidade de um lit$io. E, quando a poltica acontece, a divis/o da

    comunidade nas suas partes desi$uais, a ordem da domina/o de umas partes so're

    outras & interrompida por um lit$io que & comum aos que tem parte e aos que n/o

    tem parte.

    & tam'&m mediante a e+ist*ncia dessa parcela dos sem!parcela, desse nada que

    & tudo, que a comunidade e+iste enquanto comunidade poltica, ou seja,enquanto dividida por um lit$io fundamental, por um lit$io que afeta aconta$em de suas partes antes mesmo de afetar seus %direitos. (RA?@RE,4BBC, p. I e IQ)

    A poltica tem lu$ar a partir dessas cenas liti$iosas, mas n/o institui nada, n/o

    pode, fora dessa parado+al comunidade do lit$io so're a conta das partes, que cintila

    nas trevas das rela3es desi$uais. Fora dessa institui/o, n/o 6 poltica (RA?@RE,

    4BBC, p. IQ e Q). Xe essas cenas de emancipa/o, se essas su'jetiva3es procuram

    institucionali1ar!se de outra forma (mais su'stancial) s7 podem dar lu$ar a novos

    estados de domina/o.

    @sso quer di1er que n/o e+iste sempre poltica. Ela acontece, alis, muitopouco e raramente. M que comumente se atri'ui 2 6ist7ria poltica ou 2 ci*nciado poltico na verdade depende, com freq`*ncia muito maior, de outrasmaquinarias, que por sua ve1 prov*m do e+erccio da majestade, do vicariato

    4DRancire vai nisso ao encontro de outras formas de pensamento contempor-neo que fa1em da no/o

    de acontecimento e da eventuali1a/o da 6ist7ria as c6aves de uma compreens/o renovada da polticacf. PEOOEJERM, E. As novas aventuras da dial&tica" Tollo:a

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    da divindade, do comando dos e+&rcitos ou da $est/o dos interesses. X7 e+istepoltica quando essas maquinarias s/o interrompidas pelo efeito de umapressuposi/o que l6es & totalmente estran6a e sem a qual, no entanto, emLltima inst-ncia, nen6uma delas poderia funcionar" a pressuposi/o dai$ualdade de qualquer pessoa com qualquer pessoa, ou seja, em definitivo, a

    parado+al efetividade da pura contin$*ncia de toda ordem. (RA?@RE,4BBC, p. 4)

    Esta'elecida a sin$ular posi/o de Rancire, em todo o caso, devemos

    per$untamo!nos se, na sua vontade de com'ater a redu/o da poltica 2 quest/o do

    e+erccio do poder, e as supersti3es onto!teo!l7$icas so're as quais se fundam os

    projetos contempor-neos que perse$uem a articula/o da disrup/o poltica com a

    funda/o de um novo poder constituinte, Rancire n/o fica aqu&m das nossas

    e+pectativas, e dos pro'lemas (sempre em a'erto) que levanta o son6o da institui/o

    de uma ordem menos a'surda.

    A preserva/o da poltica, enquanto interrup/o i$ualitria das partil6as

    policiais desi$ualitrias, pode constituir um conceito c6ave para manter uma reserva

    crtica indispensvel perante os re$imes oli$rquicos (mais ou menos duros) nos quais

    estamos condenados a viver (RA?@RE, IHHD, p. QB), lo$o, um espao paracontinuar a pensar a emancipa/o universal, em condi3es nas quais at& a nossa vida

    'iol7$ica aparece inscrita nas mal6as do poder. Por&m, o que se resi$na nessa reserva

    & muito, a comear pela necessidade premente de encontrar uma forma consistente de

    li$ar os momentos de desincorpora/o poltica 2 institui/o de formas menos

    desi$ualitrias de constitui/o sim'7lica do social.

    um arti$o de IH4H, 5auri1io Oa11arato assinalava que isolar o ato poltico

    enquanto tal, na forma em que o fa1 Rancire, comporta o risco de fal6ar aespecificidade do poder capitalista, que a$encia numa articula/o comple+a a divis/o

    desi$ualitria da sociedade e a produ/o de modelos de e+ist*ncia ou formas de vida

    (OAYYARA8M IH4H). Oa11arato su$eria que, na medida em que o capitalismo

    contempor-neo fa1 da vida e da su'jetividade o'jetos privile$iados dos seus

    investimentos, a media/o &tica (no sentido da constitui/o de um ethos, da forma/o

    de um sujeito) resulta imprescindvel para co'rir a dist-ncia entre a impu$na/o da

    ordem policial e a articula/o de a$enciamentos que permitam amadurecer as

    su'jetiva3es polticas, conju$ando a transforma/o do mundo com a transfi$ura/o

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    da vida e a transvalora/o de todos os valores (para o qual considera que os Lltimos

    cursos de Foucault continuam a ser uma refer*ncia imprescindvel).

    a leitura foucaultiana (...) a i$ualdade constitui uma condi/o necessria, mas

    n/o suficiente, da poltica. (...) A a/o poltica se produ1 no quadro das%rela3es parado+ais que a i$ualdade mantem com a diferena, cujo resultado& a produ/o de novas formas de su'jetiva/o e de sin$ularidade.(OAYYARA8M IH4H)

    Evidentemente, a reconsidera/o que Oa11arato prop3e dos processos de

    su'jetiva/o desde uma perspectiva foucaultiana (2 qual Rancire restara toda

    import-ncia) se apoia na convic/o de que a reconfi$ura/o da vida (individual e

    coletiva) constitui o reto por antonomsia das lutas polticas (OAYYARA8M IHHC).

    as novas condi3es econKmicas e polticas, no atualestado da situa/o, isto, &, na

    partil6a policial dominante, a i$ualdade n/o e+i$e para Oa11arato apenas a sua

    verifica/o, mas a sua inven/o. A poltica deve des'ordar o recon6ecimento (sempre

    conflitivo) da i$ualdade, em dire/o 2 cria/o de novas formas de vida capa1es de

    escapar ao 'iopoder, de resistir!l6e atrav&s de uma do'ra das rela3es de poder

    institudas nas pr7prias formas da su'jetividade, dando lu$ar a uma verdadeira

    'iopoltica revolucionria.

    M 'ios, a e+ist*ncia, a vida n/o s/o conceitos vitalistas aos quais poderiamopor!se os conceitos da divis/o poltica do demos, mas domnios onde see+erce a micro!fisica do poder e so're os quais 6 luta, liti$io, sujei3es esu'jetiva3es. (OAYYARA8M IH4H)

    Posto isto, a crtica que Oa11arato diri$e a Rancire n/o descon6ece certos

    mal!entendidos" a comear pela assimila/o do princpio de i$ualdade 2 pressuposi/o

    de uma e+terioridade em rela/o 2s rela3es de poder (ideia incompatvel com ano/o da poltica para Rancire), passando pela acusa/o de lo$ocentrismo diri$ida 2

    l7$ica do desentendimento (quando o certo & que a desincorpora/o poltica e+cede

    claramente para Rancire a quest/o do lo$os e se desenvolve no quadro do que ele

    denomina de est&tica primeira), e concluindo com a redu/o pol&mica das diversas

    anlises de casos concretos propostas por Rancire 2s suas defini3es te7ricas da

    poltica.

    o fundo, como admite o pr7prio Oa11arato, o que se encontra em jo$o s/o

    =duas concep3es radicalmente 6etero$*neas da su'jetiva/o poltica> (OAYYARA8M

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    IH4H)" uma apontando 2 verifica/o poltica da i$ualdade, outra dependente da

    diferencia/o &tica dos sujeitos. M suplemento &tico 2s prticas polticas que prop3e

    Oa11arato na tril6a a'erta por Foucault implica que a luta por outro mundo possvel s7

    pode passar pela constituio de uma vida dierente, enquanto que para Rancire a

    su'jetiva/o poltica n/o se encontra associada a nen6uma forma de ethos coletivo

    tomando a vo1 (RA?@RE, 4BBC, p. ) 0 pelo contrrio, o suplemento poltico 2

    estrutura/o do mundo comum a partir da diferencia/o da vida, implica para

    Rancire que a luta tem lu$ar ao nvel dosarticios da i"ualdade, isto &, das novas

    formas de representa/o do mundo dado efetuadas pelos sujeitos polticos, que n/o

    le$itimam uma outra vida, mas confi$uram um mundo comum diferente

    (RA?@RE, IH4H, p. QC).

    Um sujeito poltico n/o & um $rupo que %toma consci*ncia de si, se d vo1,imp3e seu peso na sociedade. E um operador que junta e separa as re$i3es,as identidades, as fun3es, as capacidades que e+istem na confi$ura/o dae+peri*ncia dada, quer di1er, no n7 entre as divis3es da ordem policial e o quenelas j se inscreveu como i$ualdade, por fr$eis e fu$a1es que sejam essasinscri3es. (RA?@RE, 4BBC, p. DI).

    8odavia, enquanto que a interrup/o poltica se encontra imediatamente

    associada 2 afirma/o da emancipa/o universal (a parte dos sem parte & a parte de

    todos, o princpio de um processo de su'jetiva/o que supera todas as divis3es, de

    uma conta n/o totali1vel que separa a comunidade poltica da sua partil6a policial4C),

    a afirma/o &tica & sempre sin$ular e poster$a o momento poltico de articula/o das

    diferenas (um movimento de movimentos & uma necessidade assumida, mas a l7$ica

    et6opoi&tica n/o nos permite entrever como poderia ser articulado, ficando limitada 2s

    suas manifesta3es sin$ulares).

    Em Lltima inst-ncia, nos deparamos com perspectivas que focam os impasses

    das lutas polticas contempor-neas desde -n$ulos opostos, e cuja avalia/o crtica

    constitui para n7s uma e+i$*ncia que n/o podemos poster$ar.

    Por um lado, n/o & possvel ne$li$enciar a poltica das afirma3es i$ualitrias,

    cujo correlato & a institui/o de =um universal pol&mico> (RA?@RE, 4BBC, p. 4),

    compreendido nas cenas de desincorpora/o da ordem policial descritas por Rancire

    4C

    =M proletariado n/o & uma classe mas a dissolu/o de todas as classes, e nisso consiste suauniversalidade, dir 5ar+. (b) A universalidade da poltica & a de uma diferena a si de cada parte e ado diferendo como comunidade.> (RA?@RE, 4BBC, p. )

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    (elas oferecem um 6ori1onte, precrio mas imprescindvel, na dispers/o das lutas nas

    quais nos vemos involucrados no dia a dia). Por outro lado, na medida em que esse

    6ori1onte i$ualitrio n/o & instituvel numa ordem qualquer, parece imprudente

    desatender o paciente tra'al6o et6opoi&tico de constru/o de territ7rios e+istenciais

    (eles fornecem um espao diferencial, fr$il mas consistente, onde os resultados das

    altera3es produ1idas pelos atos de (des)su'jetiva/o poltica eventualmente podem

    amadurecer, opondo uma resist*ncia temporria 2 coopta/o dos mesmos pelos

    dispositivos de poder)4Q.

    /o quero di1er com isto que as duas l7$icas se complementem (isso

    si$nificaria i$norar a vontade e a inteli$*ncia que os seus autores colocaram nos seus

    tra'al6os). Entre a impu$na/o e a reconfi$ura/o do mundo comum ainda se

    imp3em uma s&rie de quest3es fundamentais, que a pra+is poltica e o tra'al6o te7rico

    n/o dei+am de levantar (a comear pela per$unta so're a possi'ilidade de a$enciar

    coletivamente a vida sem produ1ir pelo mesmo movimento novas rela3es de

    domina/o), num e+erccio necessariamente paciente, que est sempre por

    recomear4.

    esse sentido, se no comeo assinalei que, na apro+ima/o de Rancire,

    %aqu&m da 'iopoltica tin6a pelo menos dois sentidos, ac6o que a$ora, a conta do

    e+posto, podemos postular um terceiro sentido dessa e+press/o. Porque, na tentativa

    de repensar a poltica al&m das rela3es de poder, sem recair nos credos pro$ressistas

    da modernidade nem a'andonar!se ao luto infinito dos seus ideais emancipat7rios,

    qui Rancire resi$na demasiado, pa$ando pela consist*ncia te7rica da sua posi/o

    crtica com o 'ali1amento da sua sensi'ilidade poltica, que si$nificativamente dei+a

    de lado certos movimentos que a$itam o nosso mundo, as suas apostas e as suas

    e+pectativas4B.

    4Q um arti$o pu'licado recentemente em espan6ol, Etienne 8assin coloca isto Lltimo de formacontundente" =Xi las relaciones parad7jicas entre i$ualdad < diferencia no pueden inscri'irse ni en unaconstituci7n, ni en le

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    5as %aqu&m desi$naria ent/o, menos uma insufici*ncia da sua o'ra que uma

    tarefa, que nem os conceitos de Foucault, nem os reparos de Oa11arato podem

    resolver por n7s uma tarefa na qual 0 acredito 0 todos aqui nos encontramos

    involucrados, n/o apenas como pensadores, mas tam'&m como 6omens e mul6eres

    que em todo o momento est/o dispostos a colocar a prova (a verificar) a i$ualdadedas

    inteli$*ncias, lo$o, a lutar pela emancipa/o da vida das mal6as nas quais & 6oje

    canali1ada, e+plorada, ou a'andonada a morrer.

    Re&er'(c)as

    ?AX8RM, Ed$ardo. El vocaular)o %e M)chel Foucaul!* U( recorr)%o al&a+!)co,or sus !emas co(ce,!os # au!ores. 9uenos Aires" Universidad de Zuilmes, IHH.

    ?TA59ERX, Xamuel. I(!ro%uc!)o( !o The lesso(s o& Ra(c).re. Prepared for t6eUWA Political 86eor< ?olloquium, 4 ovem'er IH44. ?onsultado em"6ttp"NN:::.pu'licaffairs.vir$inia.eduNdrupalNpoliticsNs

  • 7/23/2019 Eduardo Pellejero_ Aqum Da Biopoltica (Aurora)

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    RA?@RE, Jacques PM]ER, ina. I(!erv)e$ $)!h 3ac7ues Ra(c).re. @n"Ep6emera, v. 4H(4), Oondres" Xc6ool of 9usiness and 5ana$ement ! Universit< ofOondon, IH4Ha. ?onsultado em" 6ttp"NN:::.ep6emera:e'.or$NjournalN4H!4N4H!4rancierepo:er.pdf (HDN4INIH4I)

    RA?@RE, Jacques. B)o,ol9!)ca ou ,ol9!)ca:@n" Urdimento. Revista de Estudos emArtes ?*nicas, Universidade Estadual de Xanta ?atarina N ?EAR8, n. 4D, Mutu'ro deIH4H.

    RA?@RE, Jacques. O %ese(!e(%)me(!o; Pol9!)ca e &)loso&)a. 8radu/o portu$uesade n$ela Oeite Oopes. X/o Paulo" Editora , 4BBC.

    RA?@RE, Jacques. Te( Theses o( Pol)!)cs. @n" 86eor< k Event D ()" I4, IHH4.isponvel em" 6ttp"NN:::.ucd.ieNp6ilosop6