EDITORIAL - EcoDebateCom certeza. Afinal, o “business” ... e outras áreas permite traçar...

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E D I T O R I A L

Caros Amigos,

Quando pensamos em clima e Terra, já não é preciso bola de cristal, piromancia,

jogo de búzios, cartas ou outra técnica divinatória. Neste tópico, o amanhã está

cruelmente antecipado. Mesmo que a ciência climatológica ainda não garanta

irrefutável precisão no tocante aos fatores – naturais ou antropogênicos? – do

aquecimento global, a realidade já se impôs: nós, humanos, estamos contribu-

indo exponencialmente para a degradação da Terra.

2010 encerra-se sob o signo da incerteza, embora as intranquilidades que nos

espreitam estejam se confirmando em todas as latitudes. Embora

desalentador, o balanço ambiental de 2010 traz embutido as sementes da

resistência. Mesmo que as COPs 15 e 16 tenham resultado em inexpressivas

ações vinculantes da governança global pela estabilização e recuperação dos

déficits ambientais, as exigências da sociedade civil por “soluções” vêm mi-

nando as “insustentabilidades” do atual desenvolvimento econômico que

exaure o Planeta. Nunca antes falou-se tão abertamente que o modelo está

nu, arruinado e sem perspectiva de deixar a UTI!”

Economia de baixo carbono, mitigação das emissões de GEE, democrati-

zação das fontes energéticas limpas e renováveis, penalização das energias

fósseis poluentes, proteção da biodiversidade, valorização dos serviços ecos-

sistêmicos, contenção do desperdício, não ao consumismo... Tudo isso e

muito mais é fruto da real preocupação com a sustentabilidade ambiental –

única forma de gerir com responsabilidade os recursos naturais.

Alega-se que a “preocupação ambiental” nada mais é que um novo “busi-

ness”. Será que poderia ser de outra forma? Não basta dizer “não” às bizar-

rias do modelo econômico gerador do comportamento predatório. A de-

sejada era de harmônica “coabitação sociedade-meio ambiente” ora em

construção só ganhará vida através de inovadoras tecnologias e propostas

focadas na substituição do “poluente e insustentável” pelo “limpo e susten-

tável”. Será possível realizar esta utopia? Com certeza. Afinal, o “business”

move montanhas! O lamentável é que esse equilíbrio de relacionamento não

chegará a tempo de beneficiar a todos – humanos, animais e vegetais.

A situação ambiental é alarmante e carente de medidas urgentes. Confira

no artigo Perspectivas para a Biodiversidade no século 21 – balanço do relatório

Panorama da Biodiversidade Global 3, produzido pela Convenção sobre

Diversidade Biológica (CDB) – o quadro atual do meio ambiente, as

ações de mitigação e soluções possíveis, e as projeções nada alentadoras

para ecossistemas terrestres, de águas interiores e costeiros e marinhos em

2100. Faça a sua parte para que o meio ambiente não seja levado ao

irreversível ponto de ruptura – o desastre ambiental irremediável. No

tópico “agenda climática”, publicamos quatro análises do que deveria ter

sido e o que realmente foi a COP-16, de Cancún.

Helio Carneiro

EditorEditada e impressa no Brasil.

A Revista Cidadania & Meio Ambiente nãose responsabiliza pelos conceitos e opiniõesemitidos em matérias e artigos assinados.

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Editor

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Projeto Gráfico

Regina [email protected]

Hélio [email protected]

Henrique [email protected]

Lucia H. [email protected]

Colaboraram nesta ediçãoAna Paula DominguesCensus of Marine Life –A Decade of Discovery

Convenção sobre Biodiversidade BiológicaGerusa Barbosa/MMA

Henrique CortêzKuo Pao Lian

Luana Lourenço/Agência BrasilMelissa Silva/MMAOxfam International

Pavlina IlievaRichard Black/BBC News

Shareable.net/blogTomás Togni Tarquínio

Utner ReaderUtner ReaderValdemir José SondaWorld Future Society

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030977217763007ISSN217-630X

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Nº 30 – 2010/2011 - ANO VCapa:Stylocheilus longicauda Foto: Gustav Paulay

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Perspectivas para a Biodiversidade no século21Caso os ecossistemas forem pressionados para além dos pontos de ruptura, existe alto risco de dramáticaperda de biodiversidade acompanhada da degradação dos serviços ecossistêmicos. Confira o quadro atualdo meio ambiente, as ações de mitigação e as projeções para ecossistemas terrestres, de águas interiores ecosteiros e marinhos em 2100. Por Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB)

Terra: o custo da destruiçãoÉ preciso precificar os serviços prestados pelos ecossistemas para desenvolver estratégias e respostas políticaseficazes ao problema da perda acentuada de biodiversidade a nível global. Por Richard Black/BBC News

Primeiro Censo da Vida Marinha 2010Após 10 anos de coleta de dados, o censo revela milhares de novas espécies, desvenda os segredos daságuas profundas e ajuda a avaliar as mudanças climáticas e as interferências antropogênicas nos oceanos.Por Census of Marine Life – A Decade of Discovery

Cancún: a vez dos pobres?O que a COP16/CMP6 deveria levar às rodadas de negociação para garantir ações eficientes e imediatas desocorro aos pobres da Terra, principais vítimas da atual crise climática global. Confira neste relatórioassustador. Por Oxfam Internactional

COP16: um pequeno passo adianteEm Cancún, prevaleceu o realismo discreto ao definir-se uma agenda mínima, ainda que secundária eamplamente insuficiente, para enfrentar a crise ambiental global. Por Tomás Togni Tarquínio

O planeta vai continuar com febrePredominou em Cancún o espírito de Copenhague de enfrentar o problema do aquecimento global commedidas estruturadas ao redor da economia. E aí reside o grande equívoco, pois o sistema econômico quegerou a crise não pode ser o mesmo que nos vai tirar dela. Por Leonardo Boff

Cancún: Perdeu o planeta, venceu o mercado... de novoO tema central e relevante da COP-16 – a fixação de metas para redução das emissões de GEE – foinovamente preterido pelos interesses econômico-financeiros. Por Henrique Cortez

Fundo Clima: agora realidadeDecreto brasileiro que regulamenta o Fundo é o primeiro no mundo a utilizar recursos provenientes doslucros da cadeia produtiva do petróleo para financiar ações de mitigação e adaptação às mudançasclimáticas. Por Melissa Silva e Gerusa Barbosa/MMA

O que as favelas podem ensinar às cidadesE se houvesse uma melhor maneira de viver? Uma perspectiva mais ecológica, econômica, propícia àconstrução da comunidade e que não demande grandes investimentos? Este novo conceito de existência jáexiste nas chamadas periferias. Por Pavlina Ilieva e Kuo Pao Lian

Prêmio Lagoa VivaAo comemorar 10 anos, o Instituto Cultural e Ecológico Lagoa Viva conferiu o I Prêmio Honra ao MéritoEcológico a 26 personalidades que apoiam o Pacto de Resgate Ambiental. Por Ana Paula Domingues

2011 - O futuro já!Antecipar as tendências do futuro imediato em tecnologia, meio ambiente, economia, relações internacionaise outras áreas permite traçar estratégias de governabilidade para nosso planeta em vertiginosa fase detransformações. Por World Future Society

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Acontínua extinção de espécies mui-to acima do índice histórico, a perdade habitats e as alterações na distri-

buição e na abundância de espécies são pro-jetadas ao longo deste século, de acordocom todos os cenários analisados para esteRelatório. Existe alto risco de uma perda dra-mática de biodiversidade e subsequente de-gradação de uma ampla variedade de servi-ços ecossistêmicos, se o sistema terrestrefor empurrado para além de certos limiaresou pontos de ruptura. Provavelmente a per-da de tais serviços causará impacto, em pri-meiro lugar e mais gravemente, aos pobres,considerando que estes tendem a ser de-pendentes mais diretos dos seus ambientesimediatos; mas todas as sociedades serãoimpactadas. Há potencial maior do que foireconhecido em avaliações anteriores paraenfrentar as mudanças climáticas e a cres-cente demanda por alimentos, sem causarmaior perda adicional de habitats.

Para as finalidades do presente Relatório,cientistas de uma extensa variedade de dis-ciplinas se uniram para identificar possíveisresultados futuros para a mudança da bio-diversidade durante o resto do século 21.Os resultados aqui resumidos são basea-dos na observação de um conjunto de ten-dências, modelos e experiências. Eles sebaseiam e são compilados a partir de todosos exercícios anteriores de cenários rele-vantes conduzidos para a Avaliação Ecos-sistêmica do Milênio (Millennium Ecosys-tem Assessment), a Perspectiva AmbientalGlobal (Global Environment Outlook) e edi-ções anteriores do Panorama da Biodiver-sidade Global (Global Biodiversity Out-look), bem como cenários que estão sendodesenvolvidos para o próximo relatório deavaliação do Painel Intergovernamentalsobre Mudanças Climáticas (IPCC). Elesdão atenção especial à relação entre a alte-ração da biodiversidade e seus impactossobre as sociedades humanas. Além daanálise dos modelos e cenários existentes,foi realizada uma nova avaliação de poten-ciais “pontos de ruptura”, que poderiamconduzir a mudanças grandes, rápidas e po-

Existe um alto risco de perda dramática de biodi-

versidade, acompanhada da degradação de uma

grande extensão de serviços ecossistêmicos, se

os ecossistemas forem empurrados para além de

certos limites ou pontos de ruptura

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tencialmente sem retorno. A análise chegoua quatro conclusões principais:

º% As projeções do impacto das mudançasglobais sobre a biodiversidade mostramcontínuas e muitas vezes aceleradasextinções de espécies, perda de habitat na-tural e alterações na distribuição e na abun-dância de espécies, grupos de espécies ebiomas, ao longo do século 21.

º% Existem limites generalizados, amplian-do respostas e efeitos retardados, levan-do a “pontos de ruptura”, ou mudançasabruptas no estado da biodiversidade edos ecossistemas. Isso faz com que osimpactos das mudanças globais sobre abiodiversidade sejam difíceis de prever ede controlar – uma vez iniciados e uma vezproduzidos, lentos, custosos ou impossí-veis de reverter o processo depois de te-rem ocorrido [ Quadro 1 e Figura 1].

º% A degradação dos serviços prestados àsociedade humana por ecossistemas emfuncionamento está muitas vezes mais rela-cionada às mudanças na abundância e dis-tribuição das espécies dominantes ou fun-damentais do que às extinções globais;mesmo uma alteração moderada da biodi-versidade global pode resultar em mudan-ças desproporcionais para alguns gruposde espécies (por exemplo, predadores detopo) que têm uma forte influência sobre osserviços ecossistêmicos.

º% As alterações na biodiversidade e nosecossistemas poderiam ser evitadas, redu-zidas significativamente, ou mesmo reverti-das, se uma ação enérgica urgente, abran-gente e adequada fosse aplicada em níveisinternacional, nacional e local. Essa açãodeve se concentrar em atacar as causas di-retas e indiretas que promovem a perda dabiodiversidade e deve se adaptar às mu-danças do conhecimento e das condições.As projeções, os potenciais pontos de rup-tura, os impactos e as opções para alcançarmelhores resultados estão resumidos naspáginas seguintes:

Um ponto de ruptura é definido, para efeitos do presente Relatório, como umasituação na qual um ecossistema experimenta um deslocamento para um novasituação, com mudanças significativas para a biodiversidade e nos serviços àspessoas que ele sustenta, em uma escala regional ou global. Pontos de rupturatambém têm pelo menos uma das seguintes características:

❚ A mudança se converte em um círculo vicioso por meio das chamadas reações positi-vas, por exemplo: o desmatamento reduz a precipitação regional, o que aumenta orisco de incêndios, o que provoca a retração das florestas e posterior dessecamento.

❚ Há um limite além do qual uma mudança abrupta de estados ecológicos ocorre,embora o ponto limite raramente possa ser previsto com precisão.

❚ As alterações são de longa duração e de difícil reversão.º% Há uma importante defasagem entre as pressões que promovem a mudança eo aparecimento de impactos, criando grandes dificuldades no manejo ecológico.

Os pontos de ruptura representam uma grande preocupação para cientistas, gesto-res e formuladores de políticas, por causa de seus impactos potencialmente grandessobre a biodiversidade, os serviços ecossistêmicos e o bem-estar humano. Pode serextremamente difícil para as sociedades se adaptarem a mudanças rápidas e poten-cialmente irreversíveis no funcionamento e nos traços de um ecossistema do qualelas dependem. Embora seja quase certo que os pontos de ruptura irão ocorrer nofuturo, a dinâmica, na maioria dos casos, ainda não pode ser prevista com exatidãocom aviso antecipado suficiente para permitir abordagens específicas e orientadaspara evitá-los, ou para atenuar os seus impactos. A gestão de risco responsávelpode, consequentemente, requerer uma abordagem preventiva para as atividadeshumanas conhecidas por promoverem a perda de biodiversidade.

Fig1 - PONTOS DE RUPTURA – Uma ilustração do conceito

As crescentes pressões sobre os riscos à biodiversidade empurram alguns ecossistemas paranovos estados, com graves consequências para o bem-estar humano, à medida que pontos deruptura são cruzados. Embora a posição exata de pontos de ruptura não seja fácil de determi-nar, uma vez que um ecossistema se mova para um novo estado, pode ser muito difícil, senãoimpossível, devolvê-lo ao seu estado anterior.

Fonte: Secretaria da Convenção sobre Diversidade Biológica

Quadro1- O QUE É UM PONTO DE RUPTURA?

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DIVERSIDADE no SÉCULO 21 DIVERSIDADE no SÉCULO 21

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CENÁRIO BASEADO EM MODELOS

E PROJEÇÕES ATUAIS:As mudanças no uso da terra continuam aser a principal ameaça de curto prazo, comas mudanças climáticas e as interações en-tre estas duas causas tornando-se progres-sivamente importantes. As florestas tropi-cais continuam a ser derrubadas, abrindocaminho para as plantações e para os bio-combustíveis. Extinções de espécies, mui-tas vezes mais frequentes do que a “taxa deextinção de fundo” histórica, e perda dehabitats continuam a ocorrer ao longo doséculo 21. As populações de espécies sil-vestres diminuem rapidamente, com enor-mes impactos especialmente para a Áfricaequatorial e partes do sul e sudeste da Ásia.

As mudanças climáticas fazem com que as flo-restas boreais se estendam em direção ao nor-te para dentro da tundra, deixando de existirnas suas margens ao sul, dando lugar às espé-cies de clima temperado. Por sua vez, as flores-tas temperadas deverão desaparecer na partesul e na margem de baixa latitude de sua exten-são. Muitas espécies sofrem reduções nas suasáreas de distribuição e/ou chegam perto da ex-tinção, à medida que suas áreas de ocorrênciase movem várias centenas de quilômetros emdireção aos polos. A expansão urbana e agrí-cola limita ainda mais as oportunidades para asespécies migrarem para novas áreas, em res-posta às mudanças climáticas.

ECOSSISTEMAS TERRESTRES ATÉ 2100IMPACTOS SOBRE AS PESSOASA conversão em larga escala de habitats na-turais em terras de cultivo ou florestas mane-jadas ocorrerá às custas da degradação dabiodiversidade e dos serviços dos ecossiste-mas que ela sustenta, tais como a retenção denutrientes, suprimento de água limpa, contro-le de erosão do solo e armazenamento de car-bono, a menos que práticas sustentáveis se-jam usadas para prevenir ou reduzir essasperdas. Mudanças induzidas pelo clima nadistribuição de espécies e tipos de vegetaçãoterão impactos importantes sobre os servi-ços disponíveis para as pessoas, tais como aredução no fornecimento de madeira e as opor-tunidades de recreação.

ALÉM DISSO, existe um alto risco de perdadramática de biodiversidade e degrada-ção dos serviços ecossistêmicos terres-tres se certos limiares forem ultrapassa-dos. Os cenários plausíveis incluem:

■ A FLORESTA AMAZÔNICA, devido à interação dedesmatamentos, incêndios e mudançasclimáticas, sofre uma ampla retração, mu-dando de floresta tropical para floresta decerrado ou floresta estacional em vastasáreas, especialmente no leste e no sul doBioma. A floresta poderia mover-se para umciclo vicioso de incêndios mais frequen-tes, secas mais intensas e morte florestalperiférica mais acelerada. A retração da

Amazônia terá impactos globais, por meiodo aumento das emissões de carbono,acelerando as mudanças climáticas. Elatambém irá conduzir à uma redução dasprecipitações regionais, que poderiamcomprometer a sustentabilidade da agri-cultura regional.

º% O SAHEL, na África, sob pressão dasmudanças climáticas e sobrexplotaçãodos recursos limitados da terra, desloca-se para estados alternativos, degradados,resultando em desertificação, com gravesimpactos sobre a biodiversidade e a pro-dutividade agrícola. A contínua degrada-ção do Sahel causou e poderá continuara causar perda de biodiversidade e es-cassez de alimentos, fibras e água na Áfri-ca Ocidental.

■ OS ECOSSISTEMAS INSULARES são afligidos poruma verdadeira cascata de extinções einstabilidades dos ecossistemas, devidoao impacto de espécies exóticas invaso-ras. As ilhas são particularmente vulnerá-veis a invasões, já que as comunidadesde espécies evoluíram de forma isoladae, muitas vezes, carecem de defesa con-tra predadores e patógenos. À medidaque as comunidades invadidas se tornamcada vez mais alteradas e empobrecidas,sua vulnerabilidade a novas invasõespode aumentar.

Floresta AmazônicaEcossistema das Ilhas

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Devem ser levadas em conta as emissõesde gases de efeito estufa associadas à con-versão em larga escala de florestas e outrosecossistemas em áreas agrícolas. Isso im-pedirá incentivos impróprios pela destrui-ção da biodiversidade, por meio do rema-nejamento em larga escala das culturas debiocombustíveis, em nome da mitigação dasmudanças climáticas ( Figuras 2 e 3). Quan-do são consideradas as emissões advindasdas mudanças no uso da terra, ao invés deapenas a emissão por fonte energética, sur-

gem vias de desenvolvimento plausíveispara combater as mudanças climáticas semo uso generalizado de biocombustíveis. Autilização de pagamentos por serviços am-bientais, mecanismos como a Redução deEmissões por Desmatamento e Degradação(REDD), podem ajudar a alinhar os objeti-vos de combate à perda de biodiversidadee às mudanças climáticas. No entanto, es-ses sistemas devem ser cuidadosamenteconcebidos, visto que conservar áreas comelevado valor de carbono não significa ne-

O gráfico apresenta projeções de cobertura florestal global para 2050, de acordo com vários cenários extraídos de quatroavaliações, que assumem diferentes abordagens para as questões ambientais, cooperação regional, crescimento econômico eoutros fatores. Essas incluem três avaliações anteriores (Avaliação Ecossistêmica do Milênio, Panorama da Biodiversidade Global2 e Panorama Ambiental Global 4) e um modelo (MiniCam, desenvolvido para o quinto relatório de avaliação do PainelIntergovernamental sobre Mudanças Climáticas).Quando os diferentes cenários são considerados em conjunto,a diferençaentre os melhores e os piores resultados para a biodiversidade é maior do que foi sugerido em qualquer uma das avaliaçõesanteriores. Além disso, os cenários MiniCam mostram uma extensão ainda maior. Eles representam, principalmente, os resulta-dos contrastantes para as florestas, dependendo do fato de as emissões de carbono a partir de mudanças no uso da terra seremou não consideradas nas estratégias de mitigação das mudanças climáticas. Fonte: Leadley e Pereira et al (2010)

Fig 2 PERDAS FLORESTAIS PROJETADAS ATÉ 2050 SOB DIFERENTES CENÁRIOS

SOLUÇÕES ALTERNATIVAS

Aliviar a pressão das mudanças do uso daterra nos trópicos é essencial para que osimpactos negativos da perda de biodiversi-dade terrestre e de serviços ecossistêmi-cos associados possam ser minimizados.Isso envolve um conjunto de medidas, in-cluindo um aumento na produtividade dasculturas e pastagens existentes, reduzindoas perdas pós-colheitas, o manejo florestalsustentável e a redução do consumo ex-cessivo de carne.

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cessariamente conservar áreas de elevadaimportância para a conservação – isto estásendo reconhecido no desenvolvimentodos chamados mecanismos “REDD Plus”(mecanismos similares ao já conhecidoREDD, com a adição dos programas de con-servação e manejo florestal).

Pontos de ruptura têm mais probabilidadede ser evitados se a mitigação das mudan-ças climáticas para manter o aumento datemperatura média abaixo de 2 graus Celsiusfor acompanhada de medidas para reduziroutros fatores que pressionam o ecossis-tema para um estado alterado. Por exemplo,na Amazônia estima-se que manter o des-matamento abaixo de 20% da extensão ori-ginal reduzirá bastante o risco de ampla re-tração da floresta. Com a tendência atual,provavelmente o percentual de 20% da flo-resta terá sido desmatada até o ano 2020,portanto, um programa de restauração sig-nificativa da floresta seria uma medida pru-dente para se ter uma margem de seguran-ça. Opções de melhor manejo da floresta naregião do Mediterrâneo, incluindo a maiorutilização de espécies nativas de folha lar-ga, poderiam tornar a região menos pro-pensa a incêndios. No Sahel, uma melhorgovernança, o combate à pobreza e ajudacom técnicas de cultivo irão proporcionaralternativas aos atuais ciclos de pobreza ede degradação da terra.

Evitar a perda de biodiversidade em áre-as terrestres envolverá também novasabordagens para a conservação, tantodentro de áreas protegidas como além desuas fronteiras. Em especial, uma aten-ção maior deve ser dada à gestão da bio-diversidade em paisagens dominadas pelohomem, pois estas áreas terão um papelcada vez mais importante: o de atuar comocorredores de biodiversidade para a mi-gração das espécies e comunidades de-vido às mudanças climáticas.

Há oportunidades para reconstituição depaisagens de terras agrícolas abandona-das em algumas regiões – na Europa, porexemplo, aproximadamente 200.000 qui-lômetros quadrados de terra deverão serdesocupadas até 2050. A restauração eco-lógica e a reintrodução de grandes herbí-voros e carnívoros serão fundamentaispara a criação de ecossistemas auto-sus-tentáveis, com necessidade mínima de in-tervenção humana adicional. ■

AS TRÊS IMAGENS REPRESENTAM UMA COMPARAÇÃO DE PADRÕES DIVERSOS DE USO GLOBAL DATERRA EM DIFERENTES CENÁRIOS, PARA OS MESMOS CENÁRIOS MINICAM.

❚❚❚❚❚ Cenário A – Representa o uso da terra sob atividade comercial como cenário habitual.

❚❚❚❚❚ Cenário B – Ilustra um cenário no qual os incentivos,equivalentes a uma taxa global de carbono,são aplicados para todas as emissões de dióxido de carbono, incluindo os resultantes da mudança nouso da terra, para manter as concentrações de dióxido de carbono abaixo de 450 partes por milhão.

❚❚❚❚❚ Cenário C – Ilustra o que irá acontecer se os incentivos aplicáveis somente às emissões dedióxido de carbono provenientes de combustíveis fósseis e emissões industriais, sem considerar asemissões resultantes da mudança no uso da terra. Sob o cenário C, há um declínio dramático tantonas florestas quanto nas pastagens, à medida que mais terra é dedicada à produção de biocombustíveis.

A diferença dramática na extensão dos remanescentes de florestas e pastagens em 2095, no âmbitodos respectivos cenários, enfatiza a importância de se levar em conta uso da terra, quando se concebempolíticas de combate às mudanças climáticas.

Fonte: Wise et al. (2009). Science

FIG3 MUDANÇA NO USO DA TERRA EM DIFERENTES CENÁRIOS

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ECOSSISTEMAS DE ÁGUAS INTERIORES ATÉ 2100

CENÁRIO BASEADO EM MODELOS

E PROJEÇÕES ATUAIS

Os ecossistemas de águas interiores conti-nuam a ser submetidos a enormes mudanças,como resultado de múltiplas pressões, e a bi-odiversidade continua a se perder mais rapi-damente do que em outros tipos de ecossis-temas. Os desafios relacionados à disponibi-lidade e à qualidade da água se multiplicamno mundo todo, com crescentes demandasde água agravadas por uma combinação decausas: mudanças climáticas, introdução deespécies exóticas, poluição e construção debarragens, colocando mais pressão sobre abiodiversidade da água doce e os serviçosque ela presta. Represas, açudes, reservatóri-os de abastecimento de água e desvios parairrigação e para fins industriais criam, cadavez mais, barreiras físicas que bloqueiam amovimentação as migrações dos peixes, co-locando em perigo ou causando a extinção demuitas espécies de água doce.

Espécies endêmicas de peixes de uma únicabacia tornam-se especialmente vulneráveis àsmudanças climáticas. Uma projeção sugeremenos espécies de peixes em cerca de 15%dos rios até 2100, somente por causa das alte-rações climáticas e do aumento das retiradasde água. As bacias hidrográficas dos paísesem desenvolvimento enfrentam a introduçãode um número crescente de organismos não

nativos como um resultado direto da ativida-de econômica, aumentando o risco de perdade biodiversidade por espécies invasoras.

IMPACTOS SOBRE AS PESSOAS

A degradação total projetada das águas in-teriores e dos serviços que prestam, lançaincerteza sobre as perspectivas para a pro-dução alimentar dos ecossistemas de águadoce. Isso é importante, porque cerca de 10%da pesca na natureza são relativos às deáguas interiores, e muitas vezes compõemgrandes frações de proteína dietética paraas comunidades ribeirinhas ou de lagos.

ALÉM DISSO, existe um alto risco de perdadramática de biodiversidade e degradaçãodos serviços ecossistêmicos de água docese certos limites forem ultrapassados. Oscenários plausíveis incluem:

■ EUTROFIZAÇÃO DA ÁGUA DOCE CAUSADA por acú-mulo de fosfatos e nitratos de fertilizantesagrícolas, esgotos de águas pluviais e oescoamento de efluentes urbanos trans-formam os corpos de água doce, especi-almente lagos, em um estado dominadopor algas (eutrófico). À medida que as al-gas apodrecem, os níveis de oxigênio naágua se esgotam e ocorre uma falênciageneralizada das outras vidas aquáticas,incluindo os peixes. Um mecanismo de

reciclagem é ativado, o que pode mantero sistema eutrófico mesmo depois queos níveis de nutrientes forem substanci-almente reduzidos. A eutrofização dos sis-temas de água doce, agravada em algu-mas regiões pela diminuição das chuvase aumento de demanda hídrica, pode le-var ao declínio da disponibilidade de pei-xes, com implicações para a alimentaçãoem muitos países em desenvolvimento.Também ocorrerá perda de oportunidadesde lazer e rendado turismo e, em algunscasos, riscos para a saúde de pessoas eanimais, causados pelo crescimento ex-plosivo de algas tóxicas.

■ MUDANÇAS DOS PADRÕES DE DERRETIMENTO DE

NEVE E DE GLACIARES nas regiões montanho-sas, devido às mudanças climáticas, pro-vocam alterações irreversíveis para al-guns ecossistemas de água doce. O au-mento da temperatura da água, um maiorescoamento durante uma temporadamais curta de derretimento e o aumentodos períodos de estiagem, perturbam adinâmica natural dos rios e dos proces-sos ecológicos que dependem do sincro-nismo, duração e volume dos fluxos. Osimpactos irão abranger, entre muitos ou-tros, perda de habitat, alterações nas vari-ações e respostas sazonais (fenologia) emudanças na química da água.

Neve e glaciares Eutrofização de água doce

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CENÁRIO BASEADO EM MODELOS

E PROJEÇÕES ATUAIS

A procura por frutos do mar continua a crescercom o aumento da população e com mais pes-soas tendo renda suficiente para incluí-los emsua dieta. Estoques pesqueiros continuam sobpressão e a aquicultura se expande. A crescen-te tendência da extensão da exploração pes-queira para toda a cadeia alimentar marinha,dos predadores de topo de cadeia para os de-mais níveis tróficos, ocorre às custas da biodi-versidade marinha (em contínuo declínio noÍndice Trófico Marinho em muitas áreas). Asmudanças climáticas fazem com que as popu-lações de peixes se redistribuam em direçãoaos polos e os oceanos tropicais se tornemcomparativamente menos diversificados. A ele-vação do nível do mar ameaça muitos ecossis-temas costeiros. A acidificaçãodo oceano en-fraquece a capacidade de moluscos, crustáce-os, corais e fitoplânctons marinhos formaremseus esqueletos, ameaçando destruir a cadeia

ECOSSISTEMAS COSTEIROS

E MARINHOS ATÉ 2100alimentar marinha, bem como as estruturasde recifes. As descargas crescentes de nu-trientes e de poluição aumentam a incidên-cia de zonas costeiras mortas, e o aumentoda globalização cria mais danos por espéci-es exóticas invasoras transportadas emáguas de lastro de navios.

IMPACTOS SOBRE AS PESSOAS

O declínio dos estoques de peixes e sua re-distribuição em direção aos polos têm im-portantes implicações para a segurança ali-mentar e nutricional em regiões tropicais maispobres, visto que as comunidades muitasvezes dependem de proteínas de peixe paracompletar sua dieta. O impacto da elevaçãodo nível do mar, à medida que reduz a área deecossistemas costeiros, aumentará os riscospara os assentamentos humanos, e a degra-dação dos ecossistemas costeiros e recifesde coral terão impactos muito negativos so-bre a indústria do turismo.

Alguns valores estimados de biodiversidade costeira1 A pesca mundial emprega cerca de 200 milhões de pessoas, fornece cerca de 16% da proteína consumida no mundo inteiro e tem umvalor estimado em US$ 82 bilhões.

2 O valor dos serviços ecossistêmicos prestados pelos recifes de coral alcança mais de US$ 18 milhões por quilômetro quadrado por ano para a gestão dosriscos naturais, até US$ 100 milhões para o turismo, mais de US$ 5 milhões para material genético e bioprospecção e até US$ 331.800 para a pesca.

3 O valor econômico médio anual das pescas sustentadas por habitats de manguezal no Golfo da Califórnia foi estimado em US$ 37.500 porhectare de margem de manguezal.

4 O valor dos manguezais como proteção costeira pode chegar até US$ 300.000 por quilômetro de litoral. No ejido (terra de propriedade coletiva)de Mexcaltitán, Nayarit, no México, os valores direto e indireto dos manguezais contribuem para 56% de aumento da riqueza anual do ejido.

O QUE ESTÁ EM JOGO?

2

43

1

SOLUÇÕES ALTERNATIVAS

Há grande potencial para minimizar os im-pactos na qualidade da água e reduzir o ris-co de eutrofização, por meio do investimen-to em tratamento de esgotos, proteção e res-tauração de zonas úmidas e controle do es-coamento agrícola, especialmente no mun-do em desenvolvimento.

Existem também oportunidades muito difun-didas para melhorar a eficiência do uso da água,especialmente na agricultura e na indústria.Isso ajudará a minimizar as compensações entrea crescente demanda por água potável e a pro-teção dos muitos serviços prestados pelosecossistemas saudáveis de água doce.

Uma gestão mais integrada de ecossistemas deágua doce irá ajudar a reduzir os impactos ne-gativos das pressões concorrentes. A restau-ração de processos interrompidos, como a re-conexão de várzeas, a gestão de barragens paraimitar os fluxos naturais e a reabertura de aces-so aos habitats dos peixes – bloqueados porbarragens, podem ajudar a reverter a degrada-ção. Pagamentos por serviços ambientais, comoa proteção de bacias hidrográficas de montan-te por meio da conservação das matas ciliares,podem recompensar as comunidades que as-seguram a continuidade da prestação destesserviços aos usuários dos recursos de águasinteriores em diferentes partes de uma bacia.

O ordenamento do território e redes de áreasprotegidas podem ser adaptados mais espe-cificamente para as necessidades dos siste-mas de água doce, salvaguardando os pro-cessos essenciais em rios e zonas úmidas esuas interações com os ecossistemas terres-tres e marinhos. A proteção dos rios que ain-da não foram fragmentados pode ser vistacomo uma prioridade para a conservação dabiodiversidade de águas interiores. Manter aconectividade dentro das bacias hidrográfi-cas será cada vez mais importante, para queas espécies tenham maior capacidade de mi-grar, em resposta às mudanças climáticas.

Mesmo com as medidas mais agressivas paraatenuar as mudanças climáticas, alterações sig-nificativas nos regimes de derretimento de nevee de glaciares são inevitáveis, e já estão sendoverificadas. No entanto, os impactos sobre a bi-odiversidade podem ser reduzidos, minimizan-do outras pressões como a poluição, a perda dehabitat e a captação de água, pois isto irá au-mentar a capacidade das espécies e ecossiste-mas aquáticos de se adaptarem às mudançasrelativas ao derretimento de neve e glaciares.■

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plotação dos peixes herbívoros irá mantero equilíbrio da simbiose entre algas e co-rais, aumentando a resiliência do sistema.

O planejamento de políticas que permitam odeslocamento de brejos, manguezais e ou-tros ecossistemas costeiros para o interiorirá torná-los mais resilientes ao impacto daelevação do nível do mar e, dessa forma, aju-dará a proteger os serviços vitais que pres-tam. A proteção dos processos continentais,incluindo o transporte de sedimentos paraestuários, também pode impedir que a eleva-ção do nível do mar seja agravada pelo afun-damento de deltas ou estuários. ■

ALÉM DISSO, existe um alto risco de perdadramática de biodiversidade e degradaçãodos serviços ecossistêmicos marinhos ecosteiros, se certos limites forem ultrapas-sados. Os cenários plausíveis incluem:

■ OS IMPA CTOS COMBINADOS DA ACIDIFICAÇÃO E ELE-VAÇÃO DAS TEMPERATURAS DOS OCEANOS tornam ossistemas de recifes de coral tropicais vul-neráveis a colapsos. Mais água ácida (pro-vocada por altas concentrações de dióxidode carbono na atmosfera) diminui a dispo-nibilidade de íons carbonatos necessári-os para construir esqueletos de coral. Con-centrações atmosféricas de dióxido de car-bono de 450 partes por milhão (ppm), ini-bem o crescimento de organismos calcifi-cadores em quase todos os recifes de co-ral tropicais e subtropicais. A partir de umaconcentração de 550 ppm, os recifes decoral começam a se dissolver.Os impactos do branqueamento dos coraisprovocado pelo aquecimento da água, junta-

mente com uma variedade de pressõescausadas pelos homens, tornam os recifescada vez mais dominados por algas, comperdas catastróficas de biodiversidade.

■ OS SISTEMAS DE ZONAS ÚMIDAS COSTEIRAS ficamreduzidos a faixas estreitas ou se perdempor completo no que pode ser descrito comouma “compressão costeira”. Isso se dá pelaelevação do nível do mar, cujo efeito é exa-cerbado pelas construções e obras costei-ras, tais como viveiros de aquicultura. O pro-cesso é ainda reforçado por uma maior ero-são costeira gerada pelo enfraquecimentoda proteção fornecida pelas zonas úmidasde marés. Uma maior deterioração dosecossistemas costeiros, incluindo os reci-fes de coral, trará múltiplas consequênciaspara milhões de pessoas cuja subsistên-cia depende dos recursos que eles forne-cem. A degradação física dos ecossistemascosteiros, como restingas e manguezais,também tornará as comunidades costeiras

mais vulneráveis a tempestades em terra eaos aumentos repentinos das marés.

■ A DIMINUIÇÃO DRÁSTICA DE ESPÉCIES DE GRANDES

PREDADORES dos oceanos, provocada pelaexploração excessiva, leva a uma modifica-ção do ecossistema para o domínio de es-pécies menos desejáveis e mais resilien-tes, como a água-viva. Os ecossistemasmarinhos sob tal alteração tornam-se mui-to menos capazes de fornecer a quantida-de e a qualidade de alimentos necessáriasàs pessoas. Essas mudanças podem re-velar-se duradouras e difíceis de reverter,mesmo com a redução significativa da pres-são de pesca, como foi sugerido pela faltade recuperação dos estoques de bacalhauao largo da Terra Nova, desde o colapsopopulacional do início dos anos 1990. Ocolapso de pescas regionais poderia tertambém consequências sociais e econô-micas de grande alcance, incluindo o de-semprego e perdas econômicas.

Recifes de coral tropicaisANTES

DEPOIS

Zonas úmidas costeiras

DEPOIS

Panorama da Biodiversidade Global 3 – Texto produzido pela Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), em maio de 2010.A versão em português está disponível em http://gbo3.cbd.int. e www.mma.gov.br/portalbio. © Secretariado da CDB.

pesca. O desenvolvimento da aquiculturadebaixo impacto, lidando com as questõesde sustentabilidade que têm incomodadoalgumas partes da indústria, também aju-daria a satisfazer a crescente demanda porpeixes sem adicionar pressão sobre os es-toques pesqueiros.

A redução de outras formas de pressãosobre os sistemas de corais pode torná-los menos vulneráveis aos impactos daacidificação e do aquecimento das águas.Por exemplo, reduzir a poluição costeirairá remover um estímulo adicional para ocrescimento de algas, e reduzir a sobrex-

ANTES

SOLUÇÕES ALTERNATIVAS

A gestão mais racional da pesca oceânicapode tomar vários caminhos, inclusive a apli-cação mais estrita das regras existentes paraevitar a pesca ilegal, não declarada e nãoregulamentada. Os cenários sugerem que odeclínio da biodiversidade marinha poderiaser interrompido se a gestão da pesca seconcentrar na reconstituição de ecossiste-mas, ao invés de maximizar a captura no cur-to prazo. Modelos de pesca sugerem quereduções modestas das capturas poderiamproduzir melhorias substanciais no estadodo ecossistema e, simultaneamente, melho-rar a rentabilidade e a sustentabilidade da

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Governos e empresas precisam começar a computar as perdas causadas pela deterioração da nature-

za em seus orçamentos e PIBs, conclui oestudo “A Economia dos Ecossistemas eBiodiversidade” patrocinado pelas NaçõesUnidas e divulgado durante a Convençãoda ONU sobre Diversidade Biológica, emNagoya, no Japão, em outubro último. Osdanos ao capital natural, incluindo florestas,mangues e vai de US$2 bilhões a US$5 bi-lhões ao ano – um prejuízo não formalmentecontabilizado. “Essa invisibilidade precisamudar para que se tomem medidas capazesde salvar ecossistemas que constituem fon-tes vitais de alimento, água e renda”, alertaPavan Sukhdev, líder do estudo Economia dosEcossistemas e Biodiversidade (conhecidopela sigla em inglês, TEEB).

“Infelizmente, a ausência de uma lente eco-nômica para refletir essas realidades temsignificado que tratamos esses assuntos deforma negligente, que eles não são cen-trais nas discussões de política pública oude negócios. Não podemos continuar a tra-tar a questão de fora leviana”, arrematouSukhdev na reunião da ONU sobre biodi-versidade realizada em Nagoya, Japão, ondecerca de 200 países buscaram definir metasde preservação ambiental para 2020.

Sukhdev apresentou conclusões de diver-sos relatório TEEB que analisam o valor danatureza, incluindo florestas que purificam

o custo da destruição

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Fonte: Agência Reuters (20/10/2010) e RichardBlack, BBC News.

o ar, abelhas que polinizam plantações e re-cifes de coral que abrigam milhões de espé-cies. Reduzir o desflorestamento pela meta-de até 2030 cortaria o dano causado peloaquecimento global em mais de US$3,7 tri-lhões. Exemplos: as abelhas garantem naSuíça uma produção comercial agrícola ava-liada em US$213 milhões, enquanto contri-buem com cerca de 440 milhões de libraspara a economia da Grã-Bretanha.

Em sintonia com o relatório, o Banco Mundiallançou um programa global cujo objetivo é aju-dar países a incluir os custos da destruição danatureza nas contas públicas. O presidente dobanco, Robert Zoellick, reafirmou que a des-truição ambiental acontece em parte porque osgovernos não contabilizam o valor da nature-za. “Uma das causas da depleção ambiental énosso fracasso em avaliar propriamente osecossistemas e tudo o que eles fazem por nós –e a solução, portanto, está em contabilizar osserviços oferecidos pelos ecossistemas quan-do os países fazem políticas.”

A apreciação de Zoellick ecoou nas pala-vras de Erik Solheim, ministro do MeioAmbiente da Noruega: “Precisamos sair dasituação na qual os benefícios dos servi-ços do ecossistema são privatizados en-quanto os custos são socializados. Os cus-tos totais dos impactos negativos sobre anatureza devem ser cobertos pelos que re-cebem os benefícios de sua destruição.”Também Caroline Spelman, secretária britâ-

nica do Meio Ambiente, endossou a tese:“O relatório da ONU ajudou a definir aimportância da biodiversidade sob novaótica. Agora está absolutamente claro queprecisamos mudar a forma como atribuí-mos valor ao capital natural e aos servi-ços ecossistêmicos, e integrá-los aos pro-cessos principais de tomada de decisõesde governos e da iniciativa privada.”

Segundo Achim Steiner, diretor executivodo Programa Ambiental da ONU, um relató-rio do Fórum Econômico Mundial mostrouque 8% do setor privado considera a perdade biodiversidade uma ameaça maior do queo terrorismo (4%). “ Embora ainda hajaempresas que tiram vantagem da legisla-ção frouxa para fazer o que não mais serápossível no futuro, muitos empresários jáprocuram formas de minimizar os riscosambientais e empresariais.”

Entre os 200 países reunidos em Nagóia, Bra-sil e Índia declararam apoio ao esforço daONU ao afirmar que usarão o TEEB comoguia. Segundo Bráulio Dias, secretário doMinistério do Meio Ambiente, “no nívelnacional, estamos discutindo a implementa-ção de um estudo TEEB de nosso capitalnatural, e o setor privado brasileiro tambémplaneja ir na direção de uma abordagem prá-tica e sustentável”. ■

TERRA: Tib

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É preciso precificar os ser-viços prestados pelosecossistemas para facili-tar o desenvolvimento derespostas políticas efica-zes ao problema da per-da acentuada de biodiver-sidade a nível global.

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101º CENSOVIDA MARINHA

e desenharem mapas corretos das zonas dehabitação e rotas de migração. Outros ain-da perguntaram: “Qual a quantidade de cadatipo de vida?”, e apontaram para o apetitehumano pelos frutos do mar. Todos se preo-cupavam com as alterações na vida marinhae com a necessidade de melhorar a gestãooceânica via conhecimento seguro.

No ano 2000, os cientistas fundaram oCenso da Vida Marinha, estratégia visan-do a elaboração de um Censo marinhoglobal para avaliar e explicar a diversida-

de, a distribuição e a abundância da vidanas águs salgadas. Assim, foi criado oprograma para explorar os limites do co-nhecimento da vida marinha, cujos resul-tados são agora apresentados.

UMA DÉCADA DE PESQUISA

Pesquisando em arquivos, participando de540 expedições em todos os oceanos e com-partilhando dados com organizações e pro-gramas de pesquisa, os 2.700 cientistasoriundos de mais de 80 naçõesconstituírama comunidade do Censo, coligindo, ampli-

Finalizado após 10 anos de coleta de dados, o censo de U$650 milhões que

envolveu 2.700 especialistas de 80 países revela milhares de novas espécies

– algumas consideradas extintas desde o Jurássico –, desvenda os segredos

das águas profundas, revela a beleza e a variedade dos organismos e ajuda

a avaliar as mudanças climáticas e as interferências antropogênicas nos oce-

anos. Finalmente, os oceanos começam a ser decifrados.

da

por Census of Marine Life – A Decade of Discovery

um oceano de descobertas

final dos anos 90, os principais cientistasmarinhos compartilharam sua preocupaçãosobre o fato de que o conhecimento da hu-manidade sobre a vida nos oceanos estariamuito aquém do nosso desejo e necessida-de de conhecimento. Alguns realçaram aquestão: “Que tipos de vidas habitam osoceanos?” Referiam-se às oportunidadesdedescoberta de novos tipos de vida e ca-talogação da totalidade da vida no vastooceano global. Outros perguntaram: “O quevive onde?” Assinalavam a necessidade dese estabelecerem endereços da vida marinha

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ando e organizando o que se sabe sobre avida nos oceanos. E estableceram as linhasmestres para aferir as modificações na vidamarinha após alterações ambientais naturaise ações antropogênicas. Também importan-te é o fato de o Censo mapeasr sistematica-mente, pela primeira vez, o oceano desco-nhecido. O texto abaixo resume os achados,descreve os legados e mostra como o proje-to foi concretizado.

DIVERSIDADE

O Censo descobriu uma inesperada profu-são de espécies, o que constata a vitalida-de da diversidade. Aumentou o conheci-mento estimado de espécies marinhas, de230.000 para cerca de 250.000. Dentre osmilhões de espécimes recolhidos, tanto emáguas conhecidas como em sítios raramen-te explorados, o Censo encontrou mais de6.000 potenciais novas espécies e comple-tou as descrições formais de mais de 1.200delas. E descobriu que as espécies rarassão frequentes.

Com o um arquivo digital coletivo amplia-do para cerca de 30 milhões de observa-ções, o Censo compilou as primeiras com-parações regionais e globais da diversida-de marinha. Ajudou a criar a primeira listaexaustiva das espécies marinhas conheci-das (que ultrapassaram 190.000, em setem-bro de 2010) e também ajudou na veiculaçãode informações para mais de 80.000 delasna Enciclopédia da Vida, na web.

Ao aplicar a análise genética numa escalasem precedentes à base de dados de 35.000espécies de grupos de vida marinha ampla-mente diferentes, o Censo traçou gráficosda afinidade e distanciamento entre espé-cies distintas, revelando uma nova face daestrutura genética da diversidade marinha.Com a análise genética, apresentada sob aforma de codificação por barras, o Censoreduziu as diversidades aparentes ao reve-lar que alguns organismos foram equivo-cadamente considerados não relacionados.Mas, no âmbito geral, as análises expandi-ram o número de espécies, especialmente avariedade de micróbios diferentes, incluin-do bactérias e arqueanos.

Mesmo após esse trabalho de envergadu-ra, o Censo não foi capaz de estimar de for-ma segura o número total de espécies e ostipos de vida conhecida e desconhecida nooceano. Pelos dados levantados, pode-seestimar pelo menos um milhão de tipos de

organismos marinhos, sendo dezenas oumesmo centenas de milhões deleenquadráveis na categoria dos micróbios.

DISTRIBUIÇÃO

O Censo descobriu criaturas vivas em todosos sítios que investigou, mesmo onde o ca-lor derretia o chumbo, em água salgada con-gelada e onde a luz e o oxigênio eram escas-sos. Expandiu os habitats e as variedades co-nhecidas por todo o universo ocoeânico.Descobriu que nos habitats marinhos, o ex-tremo ou o excepcional é normalidade.

Com sondas, satélites e dispositivos ele-trônicos, muitas vezes transportados pelaprópria vida marinha, o Censo realizou oacompanhamento de milhares de animais,cartografou rotas migratórias de inúmerasespécies e criou gráficos mostrando seuspontos de encontro e rotas usuais pelosoceanos interligados. À medida que nada-vam e mergulhavam, os animais monitora-dos revelaram onde vivem e morrem. O Cen-so encontrou zonas de temperatura preferi-das pelas espécies e detectou a migraçãopara novas condições em função de altera-ções ambientais, como, por exemplo, o der-retimento do gelo. Agora, qualquer pessoapode ver a distribuição de uma espécie ma-rinha digitando seu nome em http://www.iobis.org (Ocean BiogeographicInformation System), website que acessaos “endereços” compilados na base de da-dos do Censo da vida marinha global.

Com os nomes e “endereços” das espéciesregistrados em sua base de dados, o Censo

descobriu e traçou mapas dos pontos dealta e baixa diversidade da vida marinha emescala global. As espécies costeiras apre-sentam diversidade máxima no trópico doPacífico Ocidental, ao passo que a grandediversidade de espécies frequentadoras demar aberto atingiu o máximo em largas faixasde latitudes médias em todos os oceanos.Nas águas profundas e nas profundezasabissais o Censo descobriu padrões de vidaem cumes montanhosos, cordilheiras sub-marinas, planícies abissais e nas margenscontinentais, fato que definiu novas provín-cias e classificações. Os dados do Censorevelam também os locais ainda inex-plorados pelo homem – o oceano desco-nhecido. A base de dados do Censo aindanão tem nenhum registro para mais de 20%do volume oceânico, e muito poucos regis-tros para outras vastas áreas.

ABUNDÂNCIA

Partindo das bases históricas fornecidas porobservações, capturas e mesmo cardápios derestaurante, o Censo documentou um decrés-cimo em quantidades e tamanho ds espécieseconomicamente aproveitdas. Em alguns ca-sos, para estimular a conservação, o Censodocumentou a recuperação de algumas espé-cies. A história mostra que a humanidade ini-ciou a captura das espécies marinha em seusprimórdios e que tal aproveitamento vai muitoalém do que se pensou. Historicamente, o ex-cesso da pesca e da destruição de habitats sãoas principais ameaças antropogênicas à vidamarinha. Utilizando sondas, o Censo obser-vou dezenas de milhões de peixes se reuniremrapidamente e nadarem em cardumes tão gran-

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Fonte: www.coml.org/media-resources/maps

ÁREAS PROJETADAS - CENSO DA VIDA MARINHA

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des quanto a ilha de Manhattan, e tambémobservou grande número de animais se movi-mentarem das águas superfíciais para asprofunds em horários regulares.

O Censo afirma que, pelo peso, mais de 90%da vida marinha é microbiana. O peso dosmicróbios marinhos do Planeta equivale acerca de 35 elefantes para cada ser humano.

Ao analisar os registros fornecidos por embar-cações oceânicas desde 1899, os investigado-res do Censo descobriram que o fitoplânctonprodutor de alimentos junto àsuperfície dimi-nuiu em escala global. A cartografia do fundomarinho ralizado pelo Censo mostrou que ofornecimento de alimento a partir das águassuperficiais é vital para as espécies que habi-tam as águas profundas. No fundo do mar, aabundância de vida assume seu pico nas regi-ões polares, ao longo das margens continen-tais, nos pontos onde as correntes frias sobemem direção à superfície e onde as correntesequatoriais divergem. Em sítios do mar profun-do, o Censo descobriu inesperados tapetes debactérias e de recifes de coral, que se esten-dem por centenas de quilômetros. Embora te-nha sido comprovado o decréscimo defitoplâncton na camada inferior da cadeia ali-mentar e se tenha atestado o declínio das po-pulações de animais de grande porte no topoda cadeia alimentar, a estabilidade ou a redu-ção do “volume total da vida oceânica” ainda éuma incógnita.

LEGADOS

No final da década, o Censo deixa legados deconhecimento, tecnologia e rotina de pesqui-sa. Quanto ao conhecimento, o Censo regis-trou as suas descobertas em mais de 2.600 do-cumentos, muitos on-line e de acesso livre. OCenso construiu o maior banco de dados so-bre espécies marinhas por meio da compilaçãode observações já existentes às quais so-mou as suas próprias. Assim, criou uma infra-estrutura acessível ao público para pesquisasfuturas, dados que os governos se compro-meteram em disponibilizar. O Censo traçou aslinhas de base que ajudarão as nações e aConvenção Internacional sobre a DiversidadeBiológica a selecionar as áreas e as estratégiascapazes de garantir maior proteção à vidamarinha. Tais medidas ajudarão a avaliar asalterações de habitat provocadas por aqueci-mento da água ou por danos causados peloderramamento de petróleo.

■ T ecnologia – As contribuições do Cen-so neste quesito são formidáveis. O projeto

Resumo de relatório do Census of MarineLife: a Decade of Discovery – Em www.coml.org.Recomendamos a visita ao portal paravisualização de imagens, vídeos e análise dosdados do Censo. Outra vital fonte de informaçãoé o site http://www.iobis.org, do Ocean Biogeo-graphic Information System.

tonrou realidade a nova tecnologia de iden-tificação da vida marinha por código de bar-ras de DNA. Diseminou sistemas de escutae detecção desde a Califórnia, passando peloCanadá até chegar ao Alasca para monitoraro oceano global e estabelecer redes de mo-nitoramento de muitas espécies. Também in-ventou estruturas autônomas para o contro-le de recifes, que permitem padronizar a ava-liação global da vida nestes habitats. E ins-talou sistemas acústicos para medir a abun-dância de vida marinha ao longo de dezenasde milhares de quilômetros quadrados. Emconjunto, essas tecnologias provfam que oincipiente Sistema de Observação do Ocea-no Global pode monitorar a vida, bem comoa temperatura da água e das ondas.■ Métodologia operacional – O Censo reuniu

cientistas de diferentes áreas e nacionalidadesnum mesmo projeto de forma a garantir proto-colo-padrão de amostragem da vida marinha,acelerar a adoção de boas práticas, diminuir oscustos e fomentar as iniciativas no campo dainvestigação marinha. Fortaleceu o intercâm-bio entre estudantes de ciências humanas, so-ciais e naturais para o compartilhamento daspesquisas na construção do retrato fiel da vidaoceânica e na avaliação das alteraçõesdediversidade, distribuição e abundância.

■ Como funcionou – O Censo constatou queas causas que separam o conhecido, o desco-nhecido e o incognoscível da vida marinhadividem-se em cinco categorias: a invisibili-dade do passado perdido, a vastidão dos oce-anos, as dificuldades para coligir num todoo conhecimento disperso, as “vendas” quenos impomos para não ver e as perturba-ções imprevisíveis, como os tsunamis. O Cen-so mostrou que sabemos menos sobre os pe-quenos do que sobre os grandes e que emgeral o conhecimento é inversamente propor-cional ao tamanho. Por exegiência de relati-vidade, o Censo elaborou ferramentas macropara fazer sentido em regiões ou conjuntos dedados muito grandes e para superar os limitesdo conhecimento.

O Censo encontrou um oceano cada vez maisexplorado economicamente. E ao estabelecer aslinhas de base de diversidade, distribuição eabundância das espécies, o primeiro Censo daVida Marinha documentou um oceano em mu-dança, mais rico em diversidade, mais interliga-do, mais negativamente impactado pelos sereshumanos e ainda menos explorado do que pen-sávamos. O Censo multiplicou os peritos quali-ficados, desenvolveu e difundiu tecnologias,otimizou o acesso a dados informatizados so-bre espécies e habitats. Os legados do Censo –as linhas de base do conhecimento, novas tec-nologias e a colaboração internacional – pro-metem trazer ainda mais benefícios para a huma-nidade e para os oceanos. ■

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O primeiro Censo

da Vida Marinha

documentou um oceano

em mudança, mais rico

em diversidade, mais

conectado por meio

da distribuição

e da circulação,

mais impactado pelos

seres humanos e ainda

muito menos explorado

do que se pensa.”

Crédito fotos pág.14 da esq. para dir.:Ian MacDonald, DR, Renewzi, Keith Harris,Gustav Paulay, Tin Mot Tam Muoi, William VanOrden, David Casi Moody, Bluhm-Iken,Christina Kulfan (www.coml.org/photo-credits)

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Após a frustrante COP15, em Copenhague, o que a COP16/CMP6, em Cancún,

deveria levar às rodadas de negociação para garantir ações eficientes e imedi-

atas à questão da crise climática global? A organização independente não-

governamental OXFAM avança as respostas no incisivo relatório Now More

Than Ever: Climate talks that work for those who need them most, cujos pontos

principais transcrevemos a seguir. Confira onde está a “luz no fim do túnel”.

Em meio a muita apatia e total desencan-to, os governos mundiais reuniram-seem Cancún, México, neste novembro,

para nova rodada de negociações sobre a ques-tão climática. Um ano atrás, os que esperavamum acordo justo, ambicioso e vinculativo glo-bal na COP 15, em Copenhagem, também saí-ram muito decepcionados. Daí alguns questio-narem a viabilidade da Convenção Quadro daONU sobre Mudança Climática (UNFCCC), eoutros aproveitarem a oportunidade para se-mear dúvidas sobre a base científica para açõescontra o aquecimento global.

Só que já passou a hora de abandonar-se oprocesso iniciado pela ONU. Cancún não veráos governos chegarem a uma unanimidade.Mas eles podem da passos vitais para mostrar

por Oxfam Internactional1

que há uma luz no fim do túnel. Para milhõesde pobres em todo o mundo – os primeirosmais gravemente atingidos pela crise ambien-tal que não criaram –, um acordo justo e segu-ro para enfrentar as mudanças climáticas éagora mais necessário do que nunca.

De Bangladesh a Malawi, as pobres mulhe-res que laboram a terra não precisam de cien-tistas para informar que a meteorologia estácada dia mais imprevisível ou que as esta-ções do ano estão em permanente mutação.Todas já enfrentam as consequências de nãosaberem a que tempo e quais culturas seme-ar. As pessoas com quem a Oxfam colaboranão perdem de vista a necessidade de seavançar nas metas da Convenção do Clima.Neste 2010, ocorreram reuniões sobre a ques-

tão climática em todo o mundo, inclusive noBrasil e na Índia, e caravanas internacionaisde pequenos agricultores, povos indígenas edos que lutam por acordo climático rumarampara Cancún. A disposição para combater asmudanças climáticas está mais acesa do quenunca. E somente um acordo concretizado sobos auspícios da ONU pode garantir resulta-dos aos mais necessitados da Terra.

PARCEIROS POUCO ENVOLVIDOSAs discussões sobre mudanças climáticas em-preendidas nos quadros do Fórum EconômicoMundial e do G20 – um punhado de parceirosricos e poderosos na mesa de negociação –atéagora não chegaram a decisões práticas, nemsão capazes de tomar deliberações sobre todasas questões que importam. Essas questões in-

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S E G U R A N Ç A C L I M Á T I C A

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cluem todo tipo de apoio – inclusive novosfinanciamentos – para que os pobres consi-gam se adaptar aos impactos climáticos e ospaíses pobres possam dar continuidade ao de-senvolvimento de baixo carbono. Entre os ob-jetivos figuram, para os países ricos, metas deemissões de gases GEE suficientemente ambi-ciosas e juridicamente vinculativas. Se o pro-gresso pode ser penosamente lento e a ambi-ção, por vezes, perigosamente voraz, então é apolítica dos países ricos que deve ser questio-nada e desafiada – não o processo da ONU.

Embora neste 2010 a atenção internacional te-nha focado os EUA e a China – tanto no to-cante à economia global quanto a questão dasmudanças climáticas –, Cancún é muito maisdo que o mundo G20. A busca de soluçõesefetivas para a crise climática não pode seratributo de apenas um punhado de países, nãoimporta quão poderosos sejam. Cancún nãovai resolver tudo o que uma resposta global àsmudanças climáticas exige. Mas pode ofere-cer resultados que trarão benefícios tangíveisaos pobres – incluindo a criação de um fundoclimático global justo –, além de ainda ajudar areconstruir a confiança entre os países. Issoajudaria a colocar as negociações climáticasde volta aos trilhos.

Em 2010, tivemos fortes advertências dopoder devastador das inundações, das on-das de calor e da elevação do nível do mar.Esses lembretes são motivo suficiente paraum acordo justo, seguro e urgente.

2010 E OS EFEITOS DASMUDANÇAS CLIMÁTICAS

A mudança climática constitui um fardo adi-cional aos que vivem na pobreza. 2010 foi umdos anos mais quentes registrados. Váriospaíses têm batido recordes de calor, incluin-do o Paquistão, que em maio atingiu tempe-ratura de 53,7 °C, a maior já registrada na Ásia.A extensão de gelo do mar Ártico foi a tercei-ra mais baixa até hoje registrada e um dos prin-cipais afluentes do Amazonas, o Rio Negro,desceu a seu menor nível desde que os regis-tros começaram em 1902. Na China, as inun-dações atingiram 140 milhões de pessoas e aseca afetou outras 51 milhões.

2010 teve mais que o dobro de vidas ceifadasem conseqüência de desastres relacionadosao clima em seus primeiros três trimestres doque todo o ano de 2009. Também está no ca-minho para registrar a maior quantidade deeventos climáticos extremos do que a verifi-cada na média de dez anos, da ordem de 770.

As advertências devastadoras das inundações,

ondas de calor e elevação do nível do mar em 2010

são motivo suficiente para um acordo climático

justo, seguro e urgente.

Inundacão no Paquistão

É difícil atribuir desastres individualizados re-lacionados ao clima com as mudanças climáti-cas. Mas os cientistas prevêem que tais even-tos climáticos extremos se tornarão mais fre-qüentes e graves no futuro como resultadodas alterações climáticas. Como informa o Dr.Peter Stott, diretor de monitoramento climáticodo UK Met Office (Bureau Meteorológico doReino Unido), são altas as probabilidades deeventos climáticos extremos ocorrerem “commaior frequência, a ponto de serem conside-rados normais em meados deste século”.

O aumento da temperatura global terá grandeinfluência sobre o regime pluviométrico, comgravidade crescente dos extremos de estaçãoseca e úmida. Omar Baddour, do WorldMeteorological Office comprova que “asmudanças climáticas estão agravando a in-tensidade dos extremos”. Tais mudanças cli-máticas impactam de forma nefasta a vida e osustento das populações pobres e vulnerá-veis de todo o mundo. Veja o exempo:

INUNDAÇÕES NO PAQUISTÃO:

❚ CERCA DE 20% DO TERRITÓRIO INUNDADO.❚ 20 MILHÕES DE PESSOAS AFETADAS E 2MIL

MORTAS.❚ 1.900 MIL CASAS DANIFICADAS OU DESTRUÍDAS.❚ DIARRÉIA, SURTOS DE CÓLERA E MALÁRIA.❚ MAIS DE 2 MILHÕES DE HECTARES DE CULTU-RAS PERDIDAS (US$ 1 BILHÃO).

❚ 5 MIL MILHAS DE ESTRADAS E 1 MIL PONTES

DESTRUÍDAS.❚ PELO MENOS 7 MIL ESCOLAS E 500 OSPITAIS

DESTRUÍDOS.❚ 5,3 MILHÕES DE EMPREGOS PERDIDOS OU AFE-TADOS.❚ O BANCO MUNDIAL E O ASIAN DEVELOP-MENT BAMK (ADB) ESTIMAM O CUSTO DOS DA-NOS DAS INUNDAÇÕES EM US$ 9,7BILHÕES.Fonte: Compilação Oxfam

FINANCIAR A ADAPTAÇÃOPODE SALVAR VIDASCada dólar gasto em medidas de adaptaçãopoderiam economizar cerca de 60 dólaresem perdas evitadas. Estima-se que os paí-ses em desenvolvimento devem arcar com75-80% dos custos devidos às alteraçõesclimáticas nefastas.

Futuramente, os países em desenvolvimentodeverão suportar 75-80% dos custos das al-terações climáticas nefastas, especialmente naÁfrica e no sul da Ásia. Este é mais um fardoa exigir fundos adicionais, além do 0,7% doPIB prometido pelos países desenvolvidosna forma de Assistência Oficial ao Desenvol-vimento (ODA, em inglês). Pegar dinheiro jácomprometido em ODA para solucionar asconsequências das questões climáticas repre-senta o risco de se desviar recursos para in-vestimentos em escolas e hospitais. Fato que

Seca no Rio Negro

PERDAS HUMANAS DEVIDO ÀS MUDANÇAS CLIMÁTICAS DESDE A COP 15 (MUNICH RE)

Até setembro de 2010 725 21.000

Total em 2009 850 10.000

Eventos meteorológicos extremos Perdas humanas

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pode fazer retroagir em décadas as conquis-tas de desenvolvimento em marcha.

Estima o Banco Mundial que entre 2010 e 2050os países em desenvolvimento precisarão deUS$70–100 bilhões por ano para se adaptaremàs mudanças climáticas. O equivalente a cercade 80% do que é atualmente gasto em ajudaexterna para reduzir a pobreza. Segundo o Eco-nomics of Climate Adaptation Working Group,os impactos climáticos já custam aos paísescerca de 1% a 12% do PIB ao cano, cifra quepoderá chegar a 19% em 2030.

Mas o financiamento de adaptação bemgasto pode salvar vidas – e muito dinheiro.Algumas estimativas sugerem que para asemissões “business as usual” ao longo dospróximos dois séculos, em termos de valoratual, cada dólar gasto em medidas de adap-tação poderiam representar uma economiade cerca de US$60 em perdas evitáveis. Aseguradora Swiss Re sugere que o custo-benefício das medidas de adaptação podereduzir em muito a perda potencial – em al-gumas localidades mais de 90%. 27

CANCÚN: AS RESOLUÇÕES IDEAISPARA OS MAIS NECESSITADOSEm Copenhague, os países tentaram chegar aum acordo global sobre todos os aspectos deum novo regime climático internacional – umaabordagem do tipo “tudo ou nada”. Mas, emCancún, os países adotarão uma atitude “pas-so a passo” visando um conjunto equilibra-do de decisões para os setores passíveis deacordo, lançando dessa forma as bases paraas questões mais complicadas e ardilosas aserem resolvidas posteriormente.

Isto significa que não haverá acordo globaljuridicamente vinculativo em Cancún. Noentanto, a Oxfam acredita que a COP16 podemarcar um passo decisivo na luta contra aalterações climáticas, se as decisões:❚ OFERECEREM RESULTADOS CONCRETOS NA FOR-MA DE BENEFÍCIOS TANGÍVEIS ÀS PRIMEIRAS VÍTI-MAS A PADECER AS CONSEQUÊNCIAS DA CRISE

QUE NÃO CRIARAM, E❚ RESTAURAR A CONFIANÇA ENTRE PAÍSES RICOS

E POBRES, COLOCANDO O MUNDO DE VOLTA NO

CAMINHO CERTO PARA SE CHEGAR A UM ACOR-DO GLOBAL JUSTO E SEGURO.

PARA A OXFAM, O SUCESSO EM CANCÚN

SE RESUME A TRÊS ASPECTOS:1 – Os participantes devem estabelecer umfundo climático global justo que garanta aospobres, especialmente às mulheres, a con-

dução das conquistas no tocante ao finan-ciamento climático.2 – Os negociadores devem levar à pauta dedecisão as reivindicações de mitigação dospaíses desenvolvidos, aceitarem o fato de quetais metas não são suficientes para manter oaquecimento global abaixo de 1,5 ºC e aceita-rem fazer alguma coisa para resolver a questão.3 – Acordar meta para um acordo global abran-gente, justo, ambicioso e obrigatório tanto para oProtocolo de Quioto quanto para a Ação Coope-rativa de Longo Prazo (Long-term CooperativeAction under the Convention – AWG-LCA).

UM FUNDO CLIMÁTICO GLOBAL JUSTOO financiamento climático é prioritário paraos países em desenvolvimento porque vi-tal para adaptarem-se aos impactos promo-vidos pelas alterações climáticas e embar-carem no desenvolvimento de baixo carbo-no. Um fundo climático justo é essencialpara assegurar que novos e adiionais finan-ciamentos públicos cheguem àqueles quemais precisam e melhor podem utilizá-los.

As modalidades existentes de financiamentoclimático estão muito aquém do que o neces-sário. Assemelha-se a um emaranhado de ca-nais diversos, tanto a nível bilateral comomultilateral. Os países em desenvolvimentotêm de “comprar” em diferentes fundos, cadaum com critérios próprios de elegibilidade, deprocedimentos de aplicação e de requisitosde informação. E isso tudo para montantesrelativamente pequenos e geralmente únicos.

A maioria destes fundos atrelam-se a paradig-mas de ajuda estabelecidos pelos doadores, e

que tendem a privilegiar os interesses dos do-adores sobre os dos destinatários. Os Fundosde Investimento Climático do Banco Mundial(CIF, em inglês) – os preferidos por muitos pa-íses desenvolvidos – estão abrigados numainstituição em que os principais acionistas sãopaíses ricos. O financiamento climático nãoconstitui ajuda nem caridade e não deve sertratado como tal. Trata-se de responsabilidadelegal dos países desenvolvidos no âmbito daUNFCCC em reconhecimento aos danos cau-sados pelo processo de sua industrializaçãorica em carbono.

Necessita-se portanto, urgentemente, umaúnica “loja de compra de fundo” sob a res-ponsabilidade da ONU. Para ser eficaz, a deci-são sobre um novo fundo em Cancún deveconter pelo menos dois elementos chave:1 – Esse fundo deve garantir o fluxo de recur-sos suficientes para ajudar os países pobresa se adaptarem. A Oxfam estima que menos de10% de financiamento climático global estáfluindo para tal processo de adaptation. 28Um novo fundo deve preencher esta lacunaatravés da criação de uma janela dedicada àadaptação e garantir pelo menos 50% de to-dos os recursos no fundo para ela.2 – O novo fundo deve sintonizar as preocu-pações específicas das mulheres. As mulhe-res estão na linha de frente da crise climática.Elas são as mais afetadas pelos impactos cli-máticos e por isso vitais no enfrentamento daquestão nas comunidades pobres. Como ob-servou Bangladesh em Tianjin, as pequenasagricultoras sabem mais sobre adaptação doque os que negociam futuro delas. As mulhe-res devem ser ouvidas por quem controla o

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O financiamento climático não constitui ajuda ou

caridade. Trata-se de responsabilidade legal dos países

desenvolvidos em reconhecimento aos danos causados

pelo processo de sua industrialização rica em carbono.”

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dinheiro do clima. A composição do conselhoexecutivo do Fundo deve considerar equilí-brio de gênero, e as mulheres devem figurar nocentro das prioridades de financiamento. Osgovernos também devem realizar progressostanto em escala quanto em fontes de financia-mento público de longo prazo. Em Copenha-gem verificou-se progressos limitados no quetange financiamento de longo prazo.

Até 2020, os países desenvolvidos comprome-teram-se a investir US$100 bilhões/ano em fun-dos novos e adicionais para apoiar a adaptaçãoe a mitigação nos países em desenvolvimento.Embora ainda pairem dúvidas sobre este mon-tante – por exemplo, quanto deve vir de fundospúblicos e o que deve ser definido como “fun-dos novos e adicionais” 29 – Cancún deve pelomenos referenciar aquele montante como refe-rência para o financiamento climático de longoprazo necessário a um novo fundo.

O Grupo Consultivo de Alto Nível para Fi-nanciamento das Mudanças Climáticas (AGF)publicou em novembro um relatório mostran-do que se pode conseguir US$100.000 milhõessem achacar os contribuintes ou saquear osfundos já prometidos para o financiamentodo desenvolvimento. Uma das melhores opor-tunidades para se fazer isso é através de umesquema que brinde as emissões não contro-ladas dos transportes internacionais (‘bun-kers’). Em Cancún, os governos deveriam es-tabelecer um imposto sobre o combustívelmarítimo e aéreo, providência que angariariabilhões de dólares para novos fundos.

Por fim, os governos dos países ricos de-vem manter a promessa feita em Copenha-gem de constribuir com US$30 bilhões parao início de um “financiamento rápido” ‘em2010–2012. Já está claro que uma parcela sig-nificativa desse montante não é nova nemadicional. Em Cancún, os países ricos de-vem ser honestos em relação a isso e nãomanipularem dados a fim de se esquivaremdos compromissos assumidos. Os países ri-cos devem reconhecer que suas promessasde financiamento nunca serão totalmenteconfiáveis caso não sejam regidas por re-gras contabilísticas comuns. A concordân-cia com tais normas é uma prioridade para aarquitetura financeira pós–2012.

AS PROMESSAS DE MITIGAÇÃO

DOS PAÍSES DESENVOLVIDOSA prova de fogo da questão regime climáti-ca consiste em saber se o mundo é capaz defazer uma rápida, profunda e eficiente redu-

Texto extraído do relatório “Now More ThanEver: Climate talks that work for those whoneed them most” publicado por OXFAM Inter-national Media Briefing (Ref: 08/2010), em no-vembro de 2010. Recomendamos a leitura dotexto integral por sua riqueza de referências ecomplementos. O relatório pode ser baixadono site www.oxfam.org. Tradução livre de Ci-dadania & Meio Ambiente.

NOTA DO EDITOR

1 – A confederação internacional Oxfam International é umgrupo de organizações independentes não-governamentaisda Austrália, Bélgica, Canadá, França, Alemanha, Hong Kong,Índia, Irlanda, Itália, Japão, México, Holanda, Nova Zelândia,Canadá, Espanha, Reino Unido e EUA.

ção das emissões globais a tempo de evitaruma mudança climática catastrófica. Por te-rem emitido GEE durante sua industrializa-ção, os países desenvolvidos têm mais res-ponsabilidade e capacidade em ser os pri-meiros a reduzir as emissões de forma maisrápida. Em Cancún, eles devem mostrar se-rieade em relação a isso.

Para evitar retrocesso, os países ricos devemem primeiro lugar inserir as promessas de mi-tigação feitas no âmbito do Acordo de Cope-nhagem no processo formal de negociação.Os países desenvolvidos signatários do Pro-tocolo de Quioto devem ratificar as negocia-ções para um segundo período de compro-misso, a partir de 2012. Todos os países ricosdevem registrar seus compromissos em ne-gociações no âmbito da Avaliação do Ciclode Vida (ACV). No entanto, estes compro-missos são insuficientes para atender o crité-rio que a ciência sugere ser necessário à boachance de manter o aquecimento global abai-xo da meta dos 2ºC estabelecida no Acordode Copenhague – e muito menos que o 1,5ºCnecessário. Na verdade, a maioria das estima-tivas sugere que o mundo ruma para mais de3ºC de aquecimento 30, fato que teria conse-qüências catastróficas para os contingenteshumanos mais vulneráveis do planeta.Cancún tem de reconhecer essa inadequa-ção e equacionar como tratar a questão ade-quadamente. Os custos do postergamentoserá medido em vidas humanas.

CONCLUSÃO

A mudança climática não é notícia do anopassado – é atual e de amanhã. Para as pes-soas na linha de frente das novas e imprevi-síveis condições climatológicas, para os queenfrentam as cada vez mais graves e freqüen-tes enchentes e secas, a história das mudan-ças climáticas não passa: é sempre atual.

Cancún não vai finalizar o acordo que nós e ospaíses em desenvolvimento desejaram em Co-penhague. Mas isso não quer dizer que o pro-cesso emcampado pela ONU está quebrado.Não há alternativas que não seja as NaçõesUnidas na tomada de decisões significativasque vinculem todos os países numa ação.

Será que os EUA teriam colocado na mesa denegociações no Fórum das Maiores Econo-mias sua promessa – mesmo que inadequada– de redução de 17%? Teria a União Européiaaprovado o mais extenso pacote de legisla-ção climática do mundo – o Pacote clima-ener-gia de 2008 – no auge da crise bancária global

sem os prazos impostos pela ONU? Será queos países BASIC (Brasil, África do Sul, Índiae China, teriam tomado medidas preventivasou se comprometido sem a pressão da ONU?Teriam os governos dos países vulneráveiscomeçado a considerar seriamente as neces-sidades de adaptação de suas populações viaimplantação de planos de ação? Teriam maisde 100 líderes mundiais – a despeito de recri-minações, enganações e desconfiança – sereunido num edifício para falar sobre a ques-tão definidora de sua geração e das geraçõesvindouras – as mudanças climáticas – sem aforça propulsora da ONU?

A resposta para todas essas perguntas é“não”. Os que estão na linha de frente da cri-se climática não podem aceitar que as negoci-ações sejam esquecidas ou que não resultemem nada. Em Cancún e nas difíceis negocia-ções que sem dúvida se seguirão, o papel daONU é fato que não pode ser ignorado pornegociadores, jornalistas, ativistas e políticos.

Cancún deve estabelecer um Fundo GlobalClimático justo destinado aos pobres, especi-almente as mulheres. Ele deve mostrar o cami-nho para um acordo completo, justo, ambicio-so e vinculativo de que necessitam os países eas comunidades mais vulneráveis. Como mos-tram os devastadores impactos das mudançasclimáticas em 2010, trata-se hoje de uma ques-tão mais necessária do que nunca. ■

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Ilustração: itzallahustle.ning.com

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Enquanto em Copenhague a Conferên-cia da ONU sobre o Clima iniciou em

fanfarra, com direito a balé de chefes deestado, a de Cancún ficou marcada pela dis-crição, inclusive por parte da mídia. Mesmoassim, mais de 15 mil pessoas participaramdo evento representando 194 países, movi-mentos ecológicos, ONG, associações, em-presas, etc. A diversidade de atores e inte-resses em jogo ilustra a dificuldade para sechegar a um consenso, tanto mais que qual-quer acordo significa reduzir o nível do con-sumo de matérias-primas e energia.

Se em Copenhague a decepção foi a tônica, emCancún prevaleceu o realismo discreto ao defi-nir-se uma agenda mínima, ainda que secundá-ria e amplamente insuficiente. O acordo con-sensual obtido está longe de colocar a huma-nidade ao abrigo dos riscos decorrentes datemperatura média do planeta superar 2ºC comrelação à era pré-industrial, como os cientistasrecomendam até o final do século. Apesar dis-to, o fato de que todos os países aceitaram aidéia de reduzir voluntariamente as suas pró-prias emissões de gases de efeito estufa (GEE)foi um passo importante. Mesmo que os maio-res poluidores tenham se oposto à adoção de

por Tomás Togni Tarquínio

Em Cancún, prevaleceu o realismo discreto ao definir-se umaagenda mínima, ainda que secundária e amplamente insufici-ente, para enfrentar a crise ambiental global.

Tomás Togni Tarqüinio – Antropólogo compós-graduação em Prospectiva na EHESS,email: 3.ttt{at}bol.com.br Texto publicado noportal Ecodebate (17/12/2010).

metas obrigatórias de emissão submetidas acontroles internacionais regulares.

Outro aspecto importante foi a criação de umFundo Verde, que prevê a alocação de 100 bi-lhões dólares por ano, a partir de 2020. Mas, asmodalidades operacionais deste Fundo aindanão estão definidas. A este esforço financeirohá que agregar os 30 bilhões de dólares deajuda imediata já aprovados em Copenhague.

O acordo de Cancún também fortaleceu osistema REDD, que visa a redução de emis-sões de GEE por degradação de florestas,um mecanismo que permitirá aos países flo-restais que lutam eficazmente contra o des-matamento a criar créditos de emissões aserem vendidos no mercado. Além destesaspectos, uma nova instituição também foicriada, o Comitê de Adaptação, cuja funçãoserá a de auxiliar as políticas nacionais deadaptação às conseqüências das mudan-ças climáticas, particularmente no caso dospaíses mais pobres.

O caminho baseado na cooperação inter-nacional, na definição de metas negocia-das de emissão, na instituição de regras

comuns e com procedimentos de verifica-ção mútua iniciado na Rio-92 esgotou-seem Copenhague. Em Cancún, ainda preva-leceu a lógica nacional. Todos os paísesestão de acordo quanto à redução das emis-sões de GEE desde que o esforço seja feitopelo outro. “L’enfer c’est les autres!”, comodisse o filósofo Jean-Paul Sartre.

Apesar disto, Cancún foi a arte do possívelem uma conjuntura desfavorável às propos-tas do movimento ecológico. A situação se-gue como dantes: a crise ecológica se esten-de rapidamente e os segmentos sociais cons-cientes deste fato não conseguem inflectir atendência. Enquanto isto, os responsáveispelo sistema social resistem às mudanças in-dispensáveis à preservação da vida. Aindahá muita água a passar em baixo da ponte atéque sejam tomadas soluções à altura do de-safio. O movimento ecológico deverá fazerprova de que é politicamente capaz de proporsoluções e sensibilizar a população.

COP-16um pequeno passo adiante

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ACOP 16 terminou na madrugada do dia 11 dezembro em Cancún com pífias

conclusões, tiradas mais ou menos a fórceps.Como elas foram amplamente noticiadas, nãocabe aqui referi-las. Devido ao clima geral dedecepção, os resultados foram até mais doque se esperava, mas menos do que deveri-am ser, dada a gravidade da crescente degra-dação do sistema Terra. Predominou o espíri-to de Copenhague de enfrentar o problemado aquecimento global com medidas estrutu-radas ao redor da economia. E aqui reside ogrande equívoco, pois o sistema econômicoque gerou a crise não pode ser o mesmo quenos vai tirar da crise. Usando uma expressãojá usada pelo autor: tentando limar os dentesdo lobo, crê-se tirar-lhe a ferocidade, na ilu-são de que esta reside nos dentes e não nanatureza do próprio lobo. A lógica da econo-mia dominante que visa o crescimento e oaumento do PIB implica na dominação da na-tureza, na desconsideração da equidade so-cial (dai a crescente concentração de riquezae a célere apropriação de bens comuns) e dafalta de solidariedade para com as futuras ge-rações. E querem-nos fazer crer que esta dinâ-mica nos vai tirar das muitas crises, sobretu-do a do aquecimento global.

Mas cumpre enfatizar: chegamos a um pon-to em que se exige um completo repensa-mento e reorientação de nosso modo deestar no mundo. Não basta apenas umamudança de vontade mas, sobretudo, exi-ge-se a transformação da imaginação. Aimaginação é a capacidade de projetar ou-tros modos de ser, de agir, de produzir, de

Predominou em Cancún o espírito

de Copenhague de enfrentar o pro-

blema do aquecimento global com

medidas estruturadas ao redor da

economia. E aí reside o grande

equívoco, pois o sistema econômi-

co que gerou a crise não pode ser o

mesmo que nos vai tirar dela.

O planeta vai continuar com febrepor Leonardo Boff

consumir, de nos relacionarmos uns comos outros e com a Terra. A Carta da Terra foiao coração problema e de sua possível so-lução ao afirmar: “Como nunca antes nahistória, o destino comum nos conclama abuscar um novo começo. Isto requer umamudança nas mentes e nos corações. Re-quer um novo sentido de interdependên-cia global e de responsabilidade univer-sal. Devemos desenvolver e aplicar comimaginação a visão de um modo de vidasustentável aos níveis local, nacional, re-gional e global”.

Este propósito não se fez presente em ne-nhuma das 16 COPs. Predomina a convic-ção de que a crise da Terra é conjuntural –não estrutural –, e pode ser enfrentada como arsenal de meios de que o sistema dispõe,com acordos entre chefes de Estado e em-presários quando toda a comunidade mun-dial deveria ser envolvida. A referência debase não é a Terra como um todo, mas osestados-nações, cada qual com seus inte-resses particulares regidos pela lógica doindividualismo e não pela da cooperação eda interconexão de todos com todos, comoexigido pelo caráter global do problema.

Não se firmou ainda na consciência coletivao fato de que o Planeta é pequeno, possuirecursos limitados, se encontra superpovo-ado, contaminado, empobrecido e doente.Não se fala em dívida ecológica. Não se tomaa sério a crise ecológica generalizada que émais que o aquecimento global. Não sãosuficientes a adaptação e a mitigação sem

conferir centralidade à grave injustiça socialmundial, aos massivos fluxos migratórios quealcançaram já a cifra de 60 milhões de pesso-as, a destruição de economias frágeis com ocrescimento em muitos milhões de pobres efamintos, a violação do direito à seguridadealimentar e à saúde. Falta articular a justiçasocial com a justiça ecológica.

O que se impõe, na verdade, é um novoolhar sobre a Terra. Ela não pode continuara ser um baú sem fundo de recursos a se-rem explorados para benefício exclusiva-mente humano, sem considerar os outrosseres vivos que também precisam da bios-fera. A Terra é Mãe e Gaia, tese sustentadasem qualquer sucesso pela delegação boli-viana, e por isso sujeita de direitos e mere-cedora de respeito e de veneração. A crisenão reside na geofísica da Terra, mas nanossa relação de agressão para com ela. Nósnos tornamos uma força geofísica altamen-te destrutiva, inaugurando, como já se fala,o antropoceno, uma nova era geológica mar-cada pela intensiva intervenção descuida-da e irresponsável do ser humano.

Se a humanidade não se acertar ao redor dealguns valores mínimos como a sustenta-bilidade, o cuidado, a responsabilidadecoletiva, a cooperação e a compaixão po-deremos nos acercar de um abismo abertolá na frente. ■

Leonardo Boff é Teólogo e foi observadorna COP-16 em Cancún.

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Ao final da COP-16, a mídia mundial es-palhou a notícia do sucesso das ne-

gociações, das comemorações das Ongs eda festa da diplomacia. Todos celebrando amissão cumprida. Tudo muito bom, só quea Conferência de Cancún foi um fracasso.

O tema central do encontro – mudanças cli-máticas – ficou para depois. COP significaconferência de partes (de um protocolo ouconvenção da ONU). São diversas COPspara diversos protocolos/convenções e aCOP-16 foi a 16ª edição da Convenção so-bre Mudanças Climáticas.

No máximo, em Cancún, decidiu-se manteras negociações, e só. Em termos reais e prá-ticos, apenas avançaram as discussõessobre um “Fundo Verde” e sobre REDD(Redução de Emissões de Desmatamento eDegradação de Floresta). Avançaram emtermos, porque ainda serão organizadas aolongo de 2011. Ou seja, temas da agendaparalela de Cancún e acessórios à Conven-ção do Clima. O tema central e relevante eraa fixação de metas para redução nas emis-sões de gases de efeito estufa (GEE).

Na reunião do G8, em L’Áquila, julho de2009, foi firmado um compromisso retóricode que o aquecimento, ao longo deste sé-culo não deveria superar 2oC. Na COP-15,em Copenhague, dez/2009, ratificou-se aposição do G8 e firmou-se o ‘compromisso’de empreender esforços para manter o aque-cimento global médio em no máximo 2ºC,tido como o limite máximo aceitável.

Na prática, o ‘consenso’ reconheceu o quea comunidade científica já destaca como ir-

O tema central e relevante da COP-16 –

a fixação de metas para redução das emis-

sões de GEE – foi novamente preterido.

Henrique Cortez, coordenador editorial do Por-tal EcoDebate, com informações do UOL Notícias.

reversível. O CO2 acumulado na atmosfera

somado às emissões previstas até 2020 jáserão suficientes para conduzir o planeta aum aquecimento de 2ºC. Os maiores emis-sores, portanto, apenas reconheceram oóbvio. Terminada a conferência, continua-mos ‘congelados’ à mesma retórica, ao mes-mo consenso oco da reunião do G8, emL’Áquila.

Quanto aos ‘celebrados’ avanços em Can-cún, vejamos algumas questões:Fundo Verde – A grande decisão foi sobreesse fundo, que será “a entidade operaci-onal de mecanismos de financiamento daConvenção”. Ele estará sob responsabili-dade da ONU, mas terá o Banco Mundialcomo tesoureiro nos primeiros três anos.Deverá ser governado por 24 países, divi-didos igualmente, entre ricos e pobres.

O financiamento de início rápido prevê adestinação de U$30 bilhões de 2010 a 2012,com uma alocação balanceada entre açõesde redução e adaptação. Já a longo prazoficou decidido que novos fundos devemser criados em vista às necessidades ur-gentes e imediatas dos países em desen-volvimento vulneráveis às mudanças climá-ticas. O texto reconhece o compromisso deos países desenvolvidos doarem U$100 bi-lhões por ano até 2020, recursos que po-dem vir de setores privados e públicos e deacordos bi ou multilaterais. No entanto fal-tou resolver um pequeno detalhe: quemcontribui e com quanto. Aprovou-se o fi-nanciamento, sem definir o financiador.

REDD (Redução de Emissões de Desmata-mento e Degradação de floresta) – O paco-

Cancún: perdeu o planeta,

por Henrique Cortez

venceu o mercado... de novote balanceado também determina regras paraa criação do REDD, que proveria recursospara os países preservarem suas florestas(grandes armazenadores de CO

2). Estima-

se que 20% de todas as emissões atuaissejam causadas pelo desmatamento, fican-do o Brasil e a Indonésia com os maioresíndices mundiais.

As chamadas salvaguardas – respeito aoconhecimento dos povos indígenas e comu-nidades locais, e sua participação como par-te integrante – devem ser apoiadas. A men-suração ou verificação destas políticas desalvaguarda foi retirada do texto, a pedidode brasileiros. Esta é uma importante medidapara o Brasil, pois, segundo a ministra doMeio Ambiente Izabella Teixeira, “dá outraperspectiva para discutir políticas públi-cas internacionais sobre o tema”. O país jápossui um ‘precursor’ do REDD, o FundoAmazônia, que recebe doações por diminuiro desmatamento florestal. Novamente, fal-tou resolver alguns detalhes, como concei-tos, salvaguardas, métrica e metodologiade cálculo e auditoria.

Sinceramente, o maior avanço da COP-16em relação à COP-15 foram as belas praiasde Cancún. E a COP-17, em Durban, Áfricado Sul, também terá belas praias e ótimosurf. Pelos menos, nesta ótica, os milharesde turistas climáticos que circulam pelasCOP’s não terão do que reclamar.

E o clima?Bem, as negociações continuam... ■

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Decreto que regulamenta o Fundo Nacional sobre Mudançado Clima é o primeiro no mundo a utilizar recursos da par-ticipação especial dos lucros da cadeia produtiva do petró-leo para financiar ações de mitigação e adaptação às mu-danças climáticas e seus efeitos.

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A partir de agora, o Comitê Gestor doFundo – instituído pelo decreto e

coordenado pelo Ministério do Meio Ambi-ente, composto por representantes governa-mentais, comunidade científica, empresários,trabalhadores e organizações não governa-mentais – terá condições de administrar, acom-panhar e avaliar a aplicação dos recursos emprojetos, estudos e empreendimentos de mi-tigação e adaptação da mudança do clima eseus efeitos. Assim, será vital na promoçãodo modelo de desenvolvimento sustentávelde baixo carbono projetado para o país. OFNMC ou Fundo Clima apoiará atividadesvoltadas ao combate à desertificação, àadaptação à mudança do clima, a ações deeducação e capacitação, aos projetos deREDD+, ao desenvolvimento de inclusão detecnologias, à formulação de políticas pú-blicas, ao apoio a cadeias produtivas sus-tentáveis e ao pagamento por serviços am-bientais, entre outras atividades.

Ao assinar o decreto durante a reunião anualdo Fórum Brasileiro de Mudanças Climáti-cas (FBMC – 26/10/2010), o presidente Luladestacou que “o país pode se orgulhar daspolíticas ambientais que vem adotando nosúltimos anos. A agenda voltada para asmudanças climáticas sintetiza os esforçose os resultados de uma série de ações con-duzidas com sucesso pelo governo em par-ceria com setores da sociedade”.

ORÇAMENTO

Para 2011, o Comitê dispõe de um orçamentode R$226 milhões, sendo R$200 milhõesreembolsáveis para empréstimos e financiamen-tos voltados para a área produtiva, cujo agen-te financeiro será o Banco Nacional de Desen-volvimento Econômico e Social (BNDES). Osoutros R$26 milhões serão administrados pelo

FUNDO CLIMA BRASIL:

Fonte: Melissa Silva e Gerusa Barbosa, Mi-nistério do Meio Ambiente

MMA para investimento em projetos de pes-quisa, mobilização e avaliações de impacto dasmudanças do clima, podendo ser repassadospara estados e municípios por meio de convê-nios e termos de cooperação. A esse orçamen-to inicial poderão somar-se recursos de outrasfontes, inclusive doações internacionais, quevenham a ser estabelecidos no âmbito da Con-venção do Clima. Como tais recursos provêmprincipalmente dos lucros da cadeia produtivado petróleo, o Fundo não onera a população.

EMISSÕES DE GEE E DESMATAMENTO

Em 009, após a Conferência do Clima em Co-penhague (COP 15), o Brasil aprovou a Políti-ca Nacional sobre a Mudança do Clima e as-sumiu voluntariamente o compromisso emreduzir, até 2020, as emissões projetadas degases do efeito estufa, entre 36% e 39%. Des-de que o Plano de Ação para a Prevenção eControle do Desmatamento na Amazônia(PPCDAm) foi instituído, em 2003, o país evi-tou a emissão e 2,9 bilhões de tCO2eq (tone-ladas de carbono equivalente) e contabilizouo menor índice de desmatamento dos últimos21 anos. Se esse ritmo for mantido, a metaanunciada na COP 15 será antecipada em qua-tro anos. O país terá reduzido em 80% o des-matamento ainda em 2016 e não em 2020 comoanteriormente previsto sem prejuízo do de-senvolvimento econômico.

Na mesma cerimônia, o secretário-executi-vo do Fórum, Luiz Pinguelli, recebeu os su-mários executivos dos cinco planos de açãoque reúnem diretrizes e ações estratégicasvoltadas à redução voluntária da emissãode gases previstos na Política Nacional so-bre Mudança do Clima aprovada em 2009 ecorrespondentes aos compromissos assu-midos na COP 15. Dois planos trazem asações para prevenção e controle do desma-

tamento – Amazônia e Cerrado – e os ou-tros três são específicos para os setores deenergia, agricultura e siderurgia.

INVENTÁRIO

Durante a reunião do Fórum, o Ministérioda Ciência e Tecnologia também apresen-tou o segundo Inventário Nacional de Emis-sões Antrópicas por Fontes e Remoçõespor Sumidouros de Gases de Efeito Estufa,para o período de 1990 a 2005. De acordocom o documento, o pico de emissões lí-quidas de 2,675 Gt de CO

2eq aconteceu em

2004, quando ainda era alto o índice de des-matamento de florestas, principalmente naAmazônia. No entanto, com as políticas deredução de desmatamento e o monitoramen-to constante, as taxas caíram radicalmente,de forma que em 2009 as emissões líquidascaíram para 1,775 Gt de CO2eq, uma redu-ção de 33,6% em cinco anos.

Parte da Segunda Comunicação Nacionalsobre o status da implementação da Con-venção das Nações Unidas sobre Mudan-ça do Clima no Brasil, o inventário reúneinformações sobre as emissões nos diver-sos setores da atividade econômica e avan-ça em cinco anos o período estabelecidopelas diretrizes da Convenção, que era de1990 a 2000. O documento atualiza os da-dos de 1990 a 1994 e apresenta novas in-formações para o período de 1995 a 2005.Mais de 600 instituições e cerca de 1.200especialistas de diversos setores – energé-tico, industrial, florestal, agropecuário, detratamento de resíduos – foram mobiliza-dos para sua elaboração. ■

agora realidade

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por Pavlina Ilieva e Kuo Pao Lian

E se houvesse uma me-

lhor maneira de viver?

Uma perspectiva mais

ecológica, mais econô-

mica, mais propícia à

construção da comuni-

dade e que não exija

grandes investimentos?

Este novo método de

existência já existe e as

pessoas já dele partici-

pam em lugares que

nunca tínhamos pensa-

do em olhar.

Hoje, nos países mais subdesenvol-vidos do mundo, nas áreas nasquais o impacto das regras formais

ou governamentais e o capital são escas-sos, há indivíduos criando outro modo vi-ver. Conhecemos esses lugares pelos no-mes de cortiços, favelas e guetos. No en-tanto, tais assentamentos são fontes desaber no quesito padrão de desenvolvimen-to natural com maior eficiência no uso decomodidades, de recursos e com grande sus-tentabilidade. O livro Informal City: Cara-cas Case1 apresenta muito claramente o quevem a ser o fenômeno da “cidade informal”.

O arquiteto ambiental futurista StewartBrand e seu par Teddy Cruz, de San Diego,Califórnia, passaram anos tentando apren-der e comunicar as lições oferecidas poressas áreas. Todos são alta densidade e“transitáveis”, atendendo os dois principaisobjetivos que a maioria dos designers ur-banos consideram de vital importância aoplanejarem bairros de bilhões de dólarespara americanos ricos e poderosos. Nessas

O que

as favelaspodem ensinar às cidades

cidades informais, comércio e habitaçãomisturam-se livremente, beneficiando igual-mente moradores e comerciantes. No Oci-dente, fala-se muito da necessidade dereciclar. Os habitantes das favelas semprefizeram uso de material reciclado de formamais eficaz, incluindo os que ninguém maisquer e descarta.

Em março de 2009, a escritora RebeccaTuhus-Dubrow publicou no jornal BostonGlobe artigo informando que alguns paísescomeçaram a “minimizar seus problemasatravés das favelas, não com a eliminaçãodas favelas”. Como observa Cruz, os habi-tantes exercitam “sofisticadas práticasparticipativas”, mostrando um “jeito lightde ocupar a terra, já que, quando se lutapara sobreviver, a criatividade floresce”.

Essas áreas são as mais vulneráveis a inun-dações e desastres naturais, como os acon-tecimentos no Haiti deixam claro. A totalausência de planejamento não é a meta al-mejada pelos urbanistas. Mas, nas favelas,

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por Pavlina Ilieva e Kuo Pao Lian

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as pessoas sobrevivem e se desenvolvemcom muito pouco capital ou amparo oficial,fato que as tornam muito boas na arte dehabitar. Se pudermos aprender o que as fa-velas têm para nos ensinar, poderemos en-contrar melhores modos de viver em nossopróprio habitat. Nossa interpretação da“comunidade informal” foi batizada de “co-munidade autogeradora” (SGC, do inglêsself-generative community).

A COMUNIDADE AUTOGERADORA

A vida moderna é frustrante e decepcionan-te. Trabalhamos muito para gastar muito porcoisas que dificilmente queremos. A alterna-tiva mais óbvia para nossos sentimentos dedescontentamento tecnológico e de distan-ciamento é dar um basta ao mundo, largar oemprego altamente estressante, dar uma ba-nana à sociedade e a suas regulamentaçõese instituições, mudar para um lugar de me-lhor clima e passar a olhar o que nos cerca enão mais nossos umbigos. O que também éconhecido como “chutar o balde”, ou seja,dar um basta a todo e qualquer sentido desociedade ou de obrigação.

Propomos a possibilidade de viver num novotecido urbano capaz de distribuir recursosautogerados – alimento, aprendizagem, ha-bilidade, talento humano – e naturalmentecriar conexões entre os habitantes e a natu-reza. Este modo de vida é calcado nas liçõesaprendidas com os que habitam as comuni-dades mais pobres do planeta, descartadasas dificuldades indesejáveis da pobreza. OSGC é um retrato da humanidade, não na suapobreza extrema, mas na forma mais enge-nhosa, responsável e ambientalmente cons-ciente. O objetivo do SGC é conscientizarpara a sustentabilidade socioeconômica fa-bricada em casa através do manejo adequa-do do meio ambiente e da tecnologia.

COMO CRIAR UM SGC?

VEMOS A QUESTÃO EM TRÊS ETAPAS:

■ A evidenciação dos recursos naturaisda área;■ A utilização adequada tanto do capitalnatural quanto social (como a formataçãode parcerias, de cooperativas etc) a fim depromover o desenvolvimento econômico e;■ A integração de um sofisticado mix de pro-gramas em um modelo de alta densidade.

PRIMEIRO PASSO:

RESTAURAR E RECONECTAR TERRA E CÉU

Restaurar, neste contexto, refere-se à bior-remediação ou restauração dos ciclos natu-

rais, conforme seja necessário. As naçõesdo mundo desenvolvido têm alterado a pai-sagem urbana até o ponto em que a águaquase não mais chega ao solo para filtraçãoe drenagem, e os telhados desperdiçam aenergia solar que a natureza oferece para usomais produtivo. Existem melhores formas detratar estes dois recursos.

Quando se pensa em construir uma SGC emdeterminada área urbana, o cumprimento daprimeira etapa pode ser o simples arrancarda pavimentação urbana que não dá sus-tentação à uma estrutura ativa, a fim de per-

mitir que a água da chuva seja absorvidapelo solo. Comunidades em todo o mundofuncionam de forma eficaz com muito menospavimentação do que o resta da humanida-de no mundo industrializado. Novamente, aquestão não é criar uma situação que des-respeite as características e tipos de solo, ouonde estruturas não-zoneadas impedem ofluxo de águas pluviais, fator de inundações.Infelizmente, esta é uma realidade em muitasdas comunidades mais pobres do mundo.Nós simplesmente propomos a remoção dopavimento desnecessário de uma forma in-teligente e fundametantada.

Ao longo da década de 1990, Medellín, segunda maior metrópole da Co-lômbia, era a capital mundial de homicídios, dos famigerados cartéis dedrogas, de comunidades aterrorizadas e de paramilitares nacionalistas en-volvidos na batalha contra a guerrilha urbana revolucionária.

Hoje, a associação de Medellín com a violência e o caos é passado. A taxa dehomicídios caiu 90% em uma década e a cidade converteu-seem exemplo dereabilitação cívica. A transformação se enraizou em 2002, quando o recém-eleito presidente Álvaro Uribe começou a desmobilizar os paramilitares, e atin-giu seu estágio atual de “paraíso”em 2004, sob a vontade política de inclusãocidadã do Prefeito Sergio Fajardo. O “milagre” pode ser sintetizado nesta máxi-ma: para cada redução de violência, uma melhoria urbanística concreta.

Filho de arquiteto, Fajardo acreditou que um bom projeto urbanístico podecriar uma forma mais otimista, sustentável e socialmente justa de se habitaruma cidade. Fiel ao mantra “aos mais pobres, os mais belos edifícios”e atra-vés da renovação urbana, as autoridades municipais converteram os bairrosdeserdados e brutalizados de Medellín em exemplos de zonas habitacionaise de convivívio de alto padrão. As comunidades foram brindadas com esco-las, espaços de esporte e lazer, bibliotecas, centros informatizados, praças,jardins,iluminação, mobiliário urbano, coleta de lixo, hospitais e infraestrutu-ra sanitária. Criaram-se postos de trabalho e dotou-se a comunidade detransporte público confiável e segurança. Urbanismo + programas sociais +apoio às pequenas empresas ajudaram a quebrar as barreiras físicas e psico-lógicas para a superação da pobreza e do desespero. Exemplo de sucessoconstruído sobre um ethos simples e sustentável, Medellin é fonte de inspi-ração para a inclusão social e a paz urbana.

Fonte: 9 - www.utne.com/Politics/Medellins-War-on-Drugs-City-Planning-Community.

MEDELLÍN: O URBANISMO VENCEUAS DROGAS, AS ARMAS E A VIOLÊNCIA.

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Cidadania&MeioAmbiente 29

No contexto de cada cidade e na vida

de cada bairro existe uma sinergia com

potencial para desenvolver algo único,

para reconstruir o ambiente urbano e

alcançar seu pleno potencial.

Mas será que sua cidadepermitirá que você acabecom a calçada? Pois saiba,que já há governos locaisencarando tal possibilida-de com seriedade. A partirde junho de 2010, o estadode Maryland, EUA, passoua aplicar uma nova lei queestipula o atendimento derigorosas exigências degestão da água em funçãodo empreendimento a serconstruído. Mas para umaimagem real da verdadeiragestão da água só há umcaminho: a floresta.

SEGUNDO PASSO:

PLANTAR E ENERGIZAR

AS SEMENTES

Isso se refere à construçãode uma nova infra-estruturasocial, econômica e ambien-tal com base na capacidadede cooperação, ou na quan-tidade de tempo e de talentoque a vizinhança está dis-posta a investir para fazersua área economicamente auto-sustentável.

Recensear as fontes de energia renováveislocais para gerar receitas imediatas e ajudar asustentar o desenvolvimento é a chave paraconcretizar a segunda etapa. Isto pode signi-ficar cooperativa de energia solar, em quecada bairro constrói seus próprios sistemasfotovoltaicos nos telhados das habitações.Também pode significar o cultivo de biocom-bustíveis num sítio urbano, ou a instalaçãode jardins hidropônicos em subsolos ou áre-as não aproveitadas das construções. Podeser tudo isso e muito mais. A idéia é iniciar acoleta de energia renovável disponível paradesenvolver as empresas locais ou vendê-lapara empresas de energia. A geração de ener-gia torna-se um negócio comunitário. Destaforma, ela se integra perfeitamente ao desen-volvimento futuro da região.

Isso está diretamente conectado ao modo devida da cidade informal. No mundo desenvol-vido, comumente percebemos as favelas comozonas econômicas mortas, como casos perdi-dos, quando na verdade elas são focos de au-tossustentação do comércio. O que deve ser.

As cidades informais são também de “usomisto” em seu desenho urbanístico. Ou seja,

comércio, residência, indústrias leves e ativi-dades agrícolas ocorrem lado a lado. Nessainstância, esse mix é a chave para capitalizaras relações de cooperação, buscar parceriaspotenciais dentro da comunidade e desen-volver estratégias de integração. O SGC tam-bém deve ser adaptável e versátil. As comu-nidades mudam constantemente; as SGCs de-vem refletir e sustentar essas mudanças.

TERCEIRO PASSO:

RESPIRAR, NUTRIR E CRESCER

O terceiro passo visa introduzir uma série deprogramas interligando governo local e comu-nidade. Em termos de proposta programáticapara atender às necessidades da comunidade,não existe um modelo único de estratégia. Tem-pos atrás, apresentamos à cidade de Baltimore oplano Hidden Walls. O plano mirava a reabilita-ção de quarteirões de sobrados abandonadosdo centro da cidade. A comunidade com altataxa de desemprego que ali habitava precisavade meios para reconstruir e valorizar a área. Tam-bém precisavam proteger os filhos do notóriotráfico de drogas de Baltimore. Nossa propostafinal foi uma moderna interação da vila senhorialmedieval só que com internet de alta velocidadee sem senhor feudal. Os programas propostosvisaram principalmente a educação da comuni-dade e seu desenvolvimento econômico.

Sugerimos diferentes solu-ções programáticas parauma região de Dallas naqual a comunidade procurafazer uso da abundante luzsolar e dos espaços aber-tos. A chave, aqui, foi adici-onar novos programas etransformar o relacionamen-to entre os habitantes à me-dida que mais e mais pesso-as chegaram ao local paratransformá-lo. Não há umaabordagem formalista paraa construção de uma comu-nidade autogeradora. A coi-sa é mais sistemática. A com-plexidade amplia-se natural-mente em função de como acomunidade se desenvolve.

No contexto de cada cida-de e na vida de cada bairroexiste uma sinergia com po-tencial para desenvolveralgo único, para reconstruiro ambiente urbano e alcan-çar seu pleno potencial.Não há nenhuma tecla má-

gica capaz de criar um ambiente mais justo,assim como não há tecla “deletar” para oselementos indesejados e outra capaz de dardestino correto aos recursos descartados.

Para regenerar nossas cidades e comunidadese restaurar o sentimento de pertencer ao lugar,devemos parar de agir como meros consumi-dores. Se podemos ser cidadãos, eleitores eprodutores, também podemos conquistar umoutro tipo de habitat – ambiental, sociológico eculturalmente autossustentável –, precisamenteporque ele brinda todas essas áreas vitais davida de forma equitativa e justa. ■

Pavlina Ilieva e Kuo PaoLian são fundadores dogrupo de design PI.KL es-pecializado em soluçõessustentáveis urbanas e pla-nejamento ecológico estra-tégico. Seus trabalhos sãopublicados em Architectu-

Rio de Janeiro: Rocinha, comunidade em busca de integração. Foto: Alicia Nidjan

Referência Bibliográfica:(1) Informal City: Caracas case. Brillembourg Tamayo,Alfredo; Feireiss, Kristin; Klumpner, Hubert. London:Prestel 2005.

ral Record, Dwell, Metropolis, Urbanite e TheFuturist. Texto originalmente publicado em TheFuturist, com permissão da World Future Socie-ty. Reproduzido de http://shareable.net/blog/what-so-called-slums-can-teach-american-cities

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Lagoa Viva premia ambientalistas

A valorização de boas idéias re-percute em importantes ações decidadania e de conscientizaçãosocioambiental. Prova dissoocorreu na noite de 14 de de-zembro, quando o Instituto Cul-tural e Ecológico Lagoa Vivacomemorou seus 10 anos deatuação conferindo a 26 perso-nalidades o I Prêmio Honra aoMérito Ecológico em reconhe-cimento ao apoio dado ao mo-vimento Pacto de Resgate Am-biental, que vem revitalizando abacia hidrográfica da Barra daTijuca/Jacarepaguá, zona oesteda capital fluminense.

Com apoio institucional da Câ-mara de Cultura, da Associaçãode Imprensa da Barra da Tijuca(ACIBarra), das Faculdades In-tegradas de Jacarepaguá (FIJ)e de inúmeras empresas priva-das, a premiação foi criada parareconhecer, agradecer e home-

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por Ana Paula Domingues ❚ Fotos: Claudinho Guedes

nagear ambientalistas, mem-bros do governo, personalida-des públicas, empresas e insti-tuições que, ao longo dos últi-mos 10 anos, disponibilizaramcompetências e energias emcontribuições voluntárias parasolucionar os problemas ambi-entais da região.

“Esse é um momento de respos-ta a todos que contribuem paraa revitalização de nossa re-gião. O sonho de ver essaságuas limpas está se constru-indo e se realizando”, comemo-rou Donato José Velloso, presi-dente do Instituto Cultural La-goa Viva, ao iniciar a cerimôniaque homenageou Luiz Firmi-no (Pres. INEA), WagnerVicter (Pres. CEDAE), CarlosAlberto Muniz (Sec. Mun.Meio Ambiente), Suzana Mon-teiro de Barros (SMAC), LuizaCristina Krau (Pres. Cons. Est.

Rec. Hídricos), David Zee (Oce-anógrafo), Mario Moscatell(Ecólogo), José Chacon (Pres.AFEA), Wanderley Rebello(Pres. Com. Meio AmbienteCV), Beto Filho (Pres. ONG AltoAstral), Marianina Impagliaz-zo (Coord. Gestão Ambiental daFIJ), Carlos Felipe Carvalho(Vice-pres. Carvalho Hosken),Ninon Machado (Pres. Inst. Ipa-nema), Luiz Carlos Couto (Bió-logo), Hildon e Ana Carrapito(Projeto Limpeza na Praia), DoraHess de Negreiros (Inst Baíade Guanabara–IBG), MarcosSant’Anna (Inst. Terrazul), Ma-rilene Ramos (Sec. Est. Ambi-ente), Suzana Gueiros (Profª.Eng. Produção Ecodesign–UFRJ), Adacto Otoni (Coord.Meio Ambiente CREA), MárciaBaccarini (Engª. CEDAE), LuizCarlos Rogrigues (Dir. Rec. Hí-dricos BNDES) e Jayme Garcia(Pres. Marina Club Barra).

Ao receber sua estatueta dasmãos de Marta Maria de SouzaLima, diretora da Câmara de Cul-tura, Hélio Carneiro, editor daRevista Cidadania & Meio Ambi-ente, destacou a importância doLagoa Viva em iniciativas ambi-entais. “Esse prêmio é o reconhe-cimento do papel da revista Ci-dadania e Meio Ambiente naluta pelo desenvolvimento sus-tentável e em prol do meio ambi-ente. O instituto é fundamentalpara a recondução do desenvol-vimento sustentável e para a sal-vação desse universo de águasda Barra da Tijuca. Além disso,tem uma ação determinante noresgate da cidadania”. Jornalista, coordenador do Por-tal EcoDebate e vice-editor daRevista Cidadania & Meio Ambi-ente, Henrique Cortez recebeuseu prêmio das mãos da presiden-te da Câmara de Cultura, Regina

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Lima. “É uma grande e imensahonra receber esse prêmio por-que ele vem do Lagoa Viva, quefaz um trabalho fantástico, hon-rado e com responsabilidade afavor do meio ambiente”. Além da premiação, o salão no-bre do Marina Barra Clube abri-gou o lançamento do livro “Ci-dadania Ambiental: Água”, deHenrique Cortez. Nas 125 pági-nas da publicação, o ambienta-lista aborda a relação entre o tãocomentado aquecimento globale a água. Cortez apresenta infor-mações, conceitos, ideias e su-gestões próximas do cotidianode todos, sem “cientificês”. Se-gundo o próprio escritor, é umlivro leigo para leigos. “A natu-reza é extremamente eficiente,produzindo o máximo com omínimo de esforço e de recur-sos. Precisamos aprender a fa-zer o mesmo, garantindo a sus-tentabilidade e a capacidade desuporte de vida do planeta. Po-demos e devemos evitar novosdesastres socioambientais, aomesmo tempo em que lidamoscom os imensos passivos ambi-entais que já existem. Ainda hátempo”, lembra Cortez. Além da medalha de Honra aoMérito Ecológico, os homenagea-dos também foram brindados comum belo troféu realizado em vidroreciclado, criado especialmentepela artista plástica Andréia Jun-queira. A artesã se inspirou em umdos mais importantes elementosda natureza – a água –, fruto deatenção especial do Lagoa Viva ede seu Pacto de Resgate Ambien-tal. O evento foi ainda abrilhanta-do com as imagens da exposição“O renascer do Complexo Lagu-nar”, assinadas pelo fotógrafoJúlio Teixeira, e a apresentação doportal do Pacto de Resgate Ambi-ental. Embalados ao som de clás-sicos da música brasileira pela Or-questra Rio Fij Jazz, homenagea-dos e convidados festejaram a pri-meira década das exemplares ati-vidades do Instituto Cultural eEcológico Lagoa Viva. ■

Na foto maior, o grupo de laureadoscom o I Prêmio Honra ao MéritoEcológico. No sentido horário: Tro-féu criado pela artista plástica AndréiaJunqueira; Alvaro Nassaralha eDonato Velloso (Lagoa Viva), a ,jor-nalista Letícia Levy e o comunicadorDelfim Aguiar; Ana Carvalho eMario Moscatelli; Regina Lima eHenrique Cortez; Marta Souza Limae Hélio Carneiro; convidados nosalão do Marina Clube; David Zee;Mario Moscatelli e o presidente daCEDAE Wagner Victer; Dora Hesse Marcos Sant´anna.

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O futuro já!

1. OS ECONOFÍSICOS PODE-

RÃO LIDERAR AS PREVISÕES

ECONÔMICAS DE AMANHÃ.

Ao contrário dos econo-mistas convencionais, quedependem de médias esta-tísticas, os econofísicosestudam sistemas comple-xos, desdobramentos defeedback, efeitos em cas-

2011

cata, tomadas de decisão irracional e outras influências desestabi-lizadoras que podem ajudá-los a prever turbulências econômicas.

Exemplo: pesquisadores que investigam variedades de redes comple-xas afirmam ter descoberto estranhas similaridades entre o funciona-mento do mercado de ações, o Ártico e o cérebro humano. Segundoartigo de 2009 publicado na revista Nature, muitos sistemas comple-

xos – mercado, populações animais e ecossistemas – sinalizam “aler-tas precoces” identificadores de comportamentos antes da ocorrên-cia de grandes mudanças desestabilizadoras, como acidentes.

2. OS AMBIENTALISTAS PODERÃO ADOTAR OS CULTIVOS GENETICAMENTE MO-

DIFICADOS COMO ESTRATÉGIA TECNOLÓGICA PARA A REDUÇÃO DE CARBONO.

Assim como ocorre com a energia nuclear, as culturas de organismosgeneticamente modificados (OGM) têm sido o “cabalo de Tróia” dos

ambientalistas. No entanto,Stewart Brand, autor de “AWhole Earth Discipline: anEcopragmatism Maniphes-to”, argumenta que osOGMs podem vir a ser con-siderados benéficos como“ralos de CO

2”. Ou seja, os

cultivares obtidos via cria-

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Partindo do pressuposto “o

amanhã se constrói hoje”, os

editores do The Futurist Ma-

gazine analisam no recém

lançado relatório Outlook

2011 as principais tendên-

cias em tecnologia, meio

ambiente, economia, rela-

ções internacionais e outras

áreas, com o propósito de

traçar um cenário abrangen-

te, credível e provável do fu-

turo imediato. Objetivo de

tais previsões: instigar a re-

flexão, balizar tendências e

inspirar ações imediatas pa-

ra estratégias de governabi-

lidade das sociedades deste

planeta em vertiginosa fase

de transformações.

por World Future Society

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Cidadania&MeioAmbiente 33

ção de variedades geneticamente modificadas poderiam evitar a libe-ração do dióxido de carbono estocado no solo.

Os crescentes níveis de CO2 estão beneficiando as culturas de

OGMs e as plantas daninhas. Já foi comprovado que o dióxido decarbono atmosférico estimula o crescimento tanto da soja geneti-camente modificada quanto das ervas daninhas que se modificampara enfrentar o novo meio ambiente rico em CO

2. Pelo lado nega-

tivo, o rápido crescimento das ervas daninhas invasoras pode setornar ainda mais problemático à medida que os níveis de CO

2

atingirem as previstas 550 partes por milhão até 2050.

3. OS SISTEMAS DE BUSCA BREVEMENTE FORNECERÃO RESULTADOS

FALADOS E NÃO APENAS EM TEXTO.

Os programas de TV e ou-tros tipos de registros gra-váveis já podem ser com-pilados e convertidos viaprogramas desenvolvidospelo Instituto Fraunhoferde Análise Inteligente( h t t p : / / w w w. i a i s . -fraunhofer.de). Hoje, as

pessoas passam mais tempo sob as lentes das câmeras e falandoao microfone. Como tais registros são imediatamente colocadoson-line, um rastreador da palavra falada com capacidade de buscasemântica poderá permitir que alguém com um telefone inteligentebusque “qualquer conversa gravada” entre duas pessoas com amesma facilidade com que faz um upload no Facebook.

Preocupante? Nem tanto. Face à facilidade com que as tecnologi-as de comunicação podem distribuir palavras que lamentamos terproferido, os cientistas da computação da Universidade de Wa-shington criaram uma maneira de colocar datas de vencimento eme-mails, mensagens de chat e nas postagens do Facebook. O sis-tema, chamado Vanish, criptografa mensagens e distribui os da-dos entre diferentes computadores em redes de compartilhamentode arquivos. Desse modo, os usuários podem controlar uma parteda chave criptografada tornando a mensagem indecifrável.

4. HAVERÁ GUERRAS DE LIXO NO FUTURO?

Os produtores de lixo domundo desenvolvido envi-arão muito mais detritos paralixões em países em desen-volvimento, fato que susci-tará protestos nas terras deacolhimento. Estima-se quea partir de 2025, os países

em desenvolvimento fecharão seus lixões aos resíduos estrangei-ros, forçando os produtores a desenvolver tecnologias de recicla-gem de resíduo em energia. Em última instância, poderá até ser ne-cessário exumar o lixo enterrado para reciclagem e, assim, dar espaçonos lixões fechados aos materiais irreutilizáveis. De qualquer forma,os programas de transformação de resíduos em energia contribuirãoem pequena proporção para a questão “o que fazer com o lixo”.

O irrefreável aumento de consumo dos países em desenvolvimen-to levará à crescente produção de resíduos, deixando menos espa-

ço para recebimento de lixo dos países desenvolvidos. Nos Esta-dos Unidos, os governos estaduais e municipais tornarão maisseveras as regulamentações existentes e aumentarão os custos de“recepção de lixo” na Pensilvânia, Carolina do Sul, Louisiana e emoutras localidades onde é vazado a maior parte do descarte degrandes produtores de lixo, como Nova York.

5. AS NOÇÕES DE “TEMPO DE ESTUDO E DE LAZER” DESAPARECERÃO.

A geração Net utiliza tecno-logias tanto para a socializa-ção e para o trabalho, quan-to para a aprendizagem. Porisso, a abordagem das tare-fas escolares pelos estudan-tes se tornou menos compe-titiva e mais colaborativa (tra-balho em equipe). Desta for-

ma, a rede social já promove formas colaborativas de aprendizagemfora das salas de aula e fora dos horários de aula formal. Claro que osestudantes usam o Facebook durante a aula, mas isso não significaque eles não estejam interagindo com o assunto em discussão.

A próxima geração de estudantes universitários habitará onde bemquiser e acompanhará as aulas (senão todas) em cursos on-line.Ganharão diplomas outorgados por organismos de acreditação in-ternacionais. A era da hiperconectividade exigirá mais profissio-nais capazes de tecer num mosaico interligado de atividade carrei-ra e vida pessoal. Trabalho e lazer estarão interligados nas 24 ho-ras dos sete dias da semana. E a vida do estudante vai espelharessa tendência. Desta forma, a aprendizagem autodirigida será ahabilidade mais importante a ser ensinada no futuro.

6. O FUTURO VAI BOTAR PHDS “PELO LADRÃO”.

O número de doutores for-mados nos Estados Unidosaumentou nos últimos seisanos consecutivos, alcan-çando um recorde de48.802 em 2008, segundopesquisa da National Sci-ence Foundation’s Survey

of Earned Doctorates. Um terço destes doutores (33,1%) era cons-tituído por alunos com vistos temporários (estrangeiros) contra23,3% em 1998. Os Ph.Ds em ciência e engenharia aumentarammais de 20% na última década e em 3,2% de 2007 a 2008. A ciênciada computação teve a maior taxa de aumento (7,9% em 2007-2008,e quase o dobro nos últimos dez anos). Por outro lado, os doutora-dos em outros campos diminuíram, especialmente nas ciênciashumanas (abaixo de 7,1%). Uma exceção é a educação, que regis-trou 2,1% mais doutorados em 2008 do que em 2007.

7. AS CIDADES DOS PAÍSES DESENVOLVIDOS APRENDERÃO O QUE É SUS-

TENTABILIDADE NAS FAVELAS DO MUNDO EM DESENVOLVIMENTO.

Moradores de favelas, cor-tiços, guetos e comunida-des aprenderam a usar ereutilizar recursos e matéri-as-primas de forma maiseficiente do que as popu-

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lações dos países ricos. Os bairros das comunidades são de altadensidade, transitáveis a pé e agregam áreas comerciais e residen-ciais ao invés de segregar tais funções. Em muitas dessas cidadesinformais, os participantes desempenham funções laborais dentroda comunidade, tais como o cultivo agrícola e criação de animais.

No futuro, os bairros do mundo desenvolvido viverão em ambien-te tecnológico implementado segundo preceitos empresariais, for-mando cooperativas de energia solar passiva via instalação nostelhados residenciais de seus próprios sistemas fotovoltaicos, eaté instalando nos porões dos complexos habitacionais e de tra-balho jardins hidropônicos para o cultivo de biocombustíveis.Quando a geração de energia se torna um negócio comunitário, elase integra com perfeição ao desenvolvimento futuro da área eco-nômica, afirmam os arquitetos Pavlina Ilieva e Kuo Pao Lian (1).

8. FROTA VEICULAR INTELIGENTE E ESTRADAS COOPERATIVADAS SUBSTITUIRÃO

O IRRACIONAL TRANSPORTE INDIVIDUAL DEVORADOR DE COMBUSTÍVEL.

Os 800 milhões de carros doplaneta que servem a 7,8 bi-lhões de pessoas tornam otransporte uma força domi-nante em nossas vidas. Noentanto, o advento do siste-ma de compartilhamento deautomóveis e de bicicletas emáreas urbanas, tanto nos Es-

tados Unidos e quanto na Europa, já criam modelos e mercados alterna-tivos para a mobilidade fracionada ou por demanda, diz Ryan CC Chin,do MIT. Ryan e sua equipe de engenheiros do Media Lab do MITcriaram um sistema de carro que poderá servir de modelo para as cida-des do futuro. Trata-se de pequenos carros, motos e bicicletas movidosa eletricidade – todos de propriedade da cooperativa e operando emconjunto. O sistema permite que ciclistas e motociclistas possam fazercompras no supermercado e levá-las facilmente para casa. Resolvem,assim, um dos problemas-chave que há tempos prejudicam os trans-portes públicos, em função do fato de muitas vezes as linhas de ônibuse as estações de metrô nas áreas densamente habitadas localizarem-semuito longe da residência de milhares de indivíduos.

Os novos sistemas de transporte emergentes diminuirão os congestio-namentos de trânsito e os riscos de acidentes. Na próxima década, asrodovias interestaduais contarão com pistas para carros e para cami-nhões controladas por computadores. Robo-cars (veículos de peque-no porte totalmente controlados por inteligência artificial) pegarão ido-sos e pessoas com necessidades especiais em suas áreas residenciaispara levá-los a supermercados da vizinhança, para consultas médicas epara onde eles desejarem ir, prevê o futurologista McKinley Conway.

9. O COMBATE À AMEAÇA GLOBAL DA MUDANÇA CLIMÁTICA PODERÁ

UNIR OS PAÍSES OU INFLAMAR RIVALIDADES.

catástrofe. Também poderiam confundir os dados de emissões decarbono – os próprios ou os dos rivais – para manipular a legislaçãointernacional, informa o meteorologista Roger Howard.

Um sistema de monitoramento com tais potencialidades – sensorde poeira, computação virtual, realidade magnificada e uma sériede outras tecnologias emergentes – tem o potencial de “desper-tar” as cidades como ambientes digitais fornecedores de dadosmais precisos sobre consumo de energia, temperatura, etc. As na-ções que podem arcar com tal tecnologia poderiam usar essesdados em seu benefício de forma nem sempre justa.

O antecipador de cenários Jamais Cascio acredita que a futura diploma-cia internacional poderá concentrar cada vez mais foco no controleclimático. Alguns acreditam que a geoengenharia pode tornar-se impe-rativa em 2015. No entanto, a manipulação deliberada dos sistemasnaturais da Terra com o objetivo de atenuar os efeitos das mudançasclimáticas é muito difícil e pode acarretar efeitos colaterais indesejadose perigosos. Uma das consequências poderá ser uma onda de protes-tos que leve à violência, especialmente se diferentes regiões apresenta-rem resultados divergentes ou exigirem resultados incompatíveis.

10. PODEREMOS NÃO SER CAPAZES DE MOVER MONTANHAS COM NOS-

SAS MENTES, MAS OS ROBÔS ESTARÃO PRONTOS PARA RECEBER NOSSOS

COMANDOS MENTAIS.

As nações dotadas dos maissofisticados sistemas de mo-nitoramento ambiental pode-riam utilizar os dados em seuproveito, às vezes enfraque-cendo um inimigo ao nãoavisá-lo de uma tempestadeque se aproxima ou de outra

Outlook 2011 – Reproduzido de www.wfs.org/Forecasts_From_-The_Futurist_Magazine. O objetivo da World Future Society – editora deThe Futuris – é que o relatório cobrindo os desenvolvimentos dos cam-pos negócios, economia, demografia, energia, ambiente, saúde e medici-na, recursos e valores da sociedade e tecnologia ajude os leitores aprepararem-se para os desafios e oportunidades da próxima década.Para participar das atividades e do conteúdo desenvolvido pela WorldFuture Society visite o site www.wfs.org.

NOTA DO EDITOR:(1) Ler nesta edição a matéria “O que as favelas ensinam às cidades”, à pág......

O controle de teclados con-vencionais com base emcomando cerebral – acio-namento de teclas sem ocontato físico – já foi de-monstrado nas universida-des de Wisconsin e de Mi-chigan. Num futuro próxi-mo, o e-mail e o tweeting

cerebrais se tornarão muito mais comuns, afirmam os especialis-tas, embora tais interfaces ainda sejam extremamente lentas.

Um grupo de universitários da Northeastern University demons-trou, em junho último, que poderia controlar um robô através dopensamento. O sujeito do experimento olhava para a tela de umcomputador e selecionava os comandos com a retina, excitando aatividade elétrica (entre 4 e 100 hertz) em seu córtex visual cerebral.Os sinais eram então traduzidos para um pequeno robô. Interfacescérebro-computador mais desenvolvidas permitirão que usuárioscontrolem um braço robótico, por exemplo. A meta de longo prazoé a construção de interfaces para próteses robóticas, de modo aque os usuários possam usar a mente para controlar seus própriosmembros artificiais. ■

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