Economizando a Vida
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Economizando a vida: breves notas sobre a genealogia da economia no
pensamento de Giorgio Agamben
Andrea Cristina Coelho Scisleski
Para falar do livro O Reino e a Glria:
uma genealogia teolgica da economia e
do governo necessrio, primeiramente,
situar alguns postulados de seu autor.
Giorgio Agamben jurista e filsofo
italiano e tem como uma de suas principais
bases tericas de destaque o pensamento
de Michel Foucault, especialmente no que
diz respeito ao que o filsofo francs
discorre no que tange ao governo da vida,
ao biopoder e biopoltica. No entanto,
Agamben, ao se debruar tambm nos
aspectos filosficos e polticos que
implicam a ideia de vida, prope uma
releitura e mesmo uma ruptura com alguns
conceitos foucaultianos. Como o prprio
Agamben (2010) explica, um dos seus
princpios metodolgicos o de demarcar
o elemento filosfico crucial na obra de um
autor. Contudo,
quando interpretamos e desenvolvemos
neste sentido o texto de um autor, chega o
momento em que comeamos a nos dar
conta de no mais poder seguir alm sem
transgredir as regras mais elementares da
hermenutica. Isso significa que o
desenvolvimento do texto em questo
alcanou um ponto de indecidibilidade no
qual se torna impossvel distinguir entre o
autor e o intrprete (...) o momento de
abandonar o texto que est analisando e de
proceder por conta prpria (Agamben,
2010, p. 40-41).
Isto , criar uma interpretao
tambm inventar uma outra teoria. E isso
que faz Agamben a partir, especialmente,
de Foucault.
Em sua obra prima, Homo sacer: o
poder soberano e a vida nua I, Giorgio
Agamben (2004) coloca para si a tarefa
que Foucault no pde responder: (...)
onde est, ento, no corpo do poder, a
zona de indiferenciao (ou, ao menos, o
ponto de interseco) em que tcnicas de
individualizao e procedimentos
totalizantes se tocam? (Agamben, 2004,
p. 13). A crtica de Agamben ao filosfo
francs cabe lembrar que Foucault
morreu na dcada de 80 do sculo passado
consiste na atual necessidade de repensar
as questes que vinculam (e excluem) vida
e poltica.
Se entendermos que em Agamben
sua obra Homo Sacer no trata
meramente de um livro, mas de um projeto
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de pesquisa, visualizamos O Reino e a
Glria como uma continuidade do
pensamento do autor que busca explicar,
atravs da indicao de mais respostas e da
colocao de novas questes sobre a
produo de vida e de morte no contexto
poltico, a ideia de soberania e governo,
partindo de uma concepo de oikonomia.
Para tanto, essa retomada arqueolgica da
terminologia grega busca a definio da
expresso, que designa administrao da
casa (Agamben, 2011, p. 31). Entretanto,
quando Aristteles que um dos
filsofos no qual Agamben se inspira com
frequncia faz seu tratado de economia
apresentando o termo oikonomia, ele j
aponta, segundo Agamben, para uma
operao importante: uma distino que
separa a casa (oikos) da cidade (polis).
Antes de avanarmos sobre este
tema, cabe uma advertncia. Uma
advertncia conceitual e epistemolgica.
Conceitual, primeiramente, porque
Agamben ao continuar suas reflexes sobre
o projeto de sua pesquisa inclui, aqui de
modo mais enftico, uma discusso sobre o
conceito de governo no to
profundamente abordado em Homo Sacer
I, posto que naquele momento um dos
focos residia em precisar o conceito de
soberania.
Advertncia epistemolgica, porque
agora ele prope um recuo arqueolgico
que busca fazer emergir a articulao entre
teologia e poltica, articulao essa que
ser viabilizada justamente pelo conceito
de economia. O livro trata, portanto, de
trazer luz esse vnculo e o modo como
ele foi se produzindo e provocando efeitos
que culminariam no capitalismo atual.
Esclarecido isso, Agamben inicia
suas reflexes sobre a genealogia da
economia e do governo partindo de dois
paradigmas polticos derivados da teologia
crist contempornea. O paradigma
teolgico-poltico, apresentado por Carl
Schmitt em 1922, em que uma de suas
principais teses sustenta que todos os
conceitos decisivos da moderna doutrina
do Estado so conceitos teolgicos
secularizados (Schmitt citado por
Agamben, 2011, p. 14). Essa ideia, para
Agamben, indica uma operao que traz
elementos que concernem ao mbito da
vida divina para a organizao gerencial e
governamental da vida humana. Alm
disso, a ideia de soberania a ser produzida
nessa lgica aponta que, na perspectiva
judaico-crist, o ser humano o nico ser
vivo criado imagem e semelhana de
Deus possibilitando, portanto, uma certa
transposio de uma forma de gesto que
transcendente; isto , o soberano governa a
vida na terra tal qual Deus governa a vida
divina.
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O outro paradigma em questo, a
ser analisado por Agamben, a teologia
econmica de Peterson, oposta ideia de
Schmitt. Para Peterson, a monarquia divina
funciona da seguinte forma: o rei reina,
mas no governa (Peterson citado por
Agamben, 2011, p. 22). Peterson aborda a
organizao da Trindade (Pai-Filho-
Esprito Santo) como os regentes
administradores da vida eterna e terrena.
Aqui, fica clara a perspectiva de uma
gerncia que se d em nvel no mais
monotesta, mas trina. E nessa trindade
reside uma diviso: quem o soberano
reina, e quem so os seus agentes
governam. A partir dessa viso, segundo a
leitura de Agamben sobre Peterson, est
colocado um modelo econmico de gesto,
em que se faz presente tambm uma ciso
entre soberania e governo. Ou seja, dessa
maneira, o soberano pensa a ordem, porm
necessita de agentes subalternos para
execut-las.
Agamben, ao longo dos diversos
captulos do livro, vai apresentando as
sucessivas conceituaes do termo
economia em distintos contextos
histricos. Ele inicia retomando a
oikonomia grega de Aristteles para
designar a administrao da casa que
envolve um organismo complexo no qual
se entrelaam relaes heterogneas (...)
que so distintas em trs grupos: relaes
despticas senhores-escravos (...),
relaes paternas pais-filhos e relaes
gmicas marido-mulher (Agamben,
2011, p. 31). De acordo com o filsofo
italiano, o que une essas relaes um
paradigma que pode ser definido como
gerencial, e no epistmico, que
implica decises e disposies que
enfrentam problemas sempre especficos,
que dizem respeito ordem funcional
(taxis) das diferentes partes do oikos
(Agamben, 2011, p. 32). Progressivamente,
como Agamben discorre detalhadamente
no livro, a extenso analgica e semntica
do termo oikonomia/economia toma
rumos que se propagam bem mais alm das
designaes originais.
Dessa forma, um dos exemplos do
alargamento da concepo de economia
est no cristianismo pregado por Paulo.
Para o apstolo, Deus incumbiu o messias,
Seu Filho, a oikonomia da execuo de um
plano divino de salvao (Agamben,
2011). Oikonomia aqui entendida nos
termos aristotlicos da administrao, mas
j transposta a um campo teolgico. Os
cristos, no sentido que Agamben
interpreta Paulo, passam a ser tambm
membros nessa ordem econmica e, por
conseguinte, tornam-se os primeiros
homens a integrarem-se economia. Nessa
perspectiva, desenha-se uma possibilidade
de unificao do ente divino, justamente
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porque atravs da empreitada realizada
pelo Filho para a salvao da humanidade,
a trindade passa a ser entendida como algo
nico. A diviso Pai-Filho-Esprito Santo
nada mais que uma diviso que organiza
uma gesto; em outras palavras, trata-se de
um dispositivo econmico, um arranjo
gerencial. Nesse momento, evidencia-se
uma expanso no que passa a ser tomado
como economia, mas ainda no est
presente o atrelamento dessa ideia com a
poltica.
Mais tarde, com o desenvolvimento
do cristianismo e em especial durante a sua
longa consolidao na Idade Mdia,
tornou-se importante que a ideia de
trindade fosse mais consistentemente
elaborada, justamente para a igreja no
correr o risco de apresentar uma
pluralidade de divindades que levassem
quebra do monotesmo. Nessa perspectiva,
Agamben explica porque o pensamento de
um dos primeiros telogos romanos,
Hiplito, retomado pela igreja, uma vez
que os argumentos do telogo da Roma
Antiga apresentam um cuidado com a
unicidade divina: Deus uno segundo
sua dynamis1 (...) e triplo apenas segundo
a economia (Hiplito citado por
Agamben, 2011, p. 67). Desse modo,
percebemos que a ciso no diz respeito
ontologia do ser divino e sim apenas sua
forma de administrar. Apesar do xito
cristo sobre a unidade divina enquanto
ente, Agamben pontua que com isso, uma
nova fratura reaparece: a separao entre
Deus e sua ao; isto , entre Deus e seu
governo de mundo. Agamben assinala que
nesse momento podemos j visualizar o
anncio de uma tica em sentido moderno;
em outras palavras, uma tica que surge
da fratura entre ser e prxis (Agamben,
2011, p. 68), produzida no final do mundo
antigo, mas que a modernidade herda2.
importante salientar os efeitos
que aparecem a partir dessa ciso entre
Deus e sua administrao, ser e prxis,
reino e governo, potncia e ao. Nas
palavras de Agamben: Reino e Governo
constituem uma mquina dupla, lugar de
separao e de uma articulao
ininterrupta (Agamben, 2011, p. 114).
Nessa afirmao, cabem algumas
explicaes.
A primeira delas a conceituao
de mquina no projeto agambeniano.
Inicialmente podemos dizer que mquina
um dos significados do conceito
dispositivo. Para Agamben,
sinteticamente, o dispositivo ainda mais
amplo que a concepo foucaultiana,
porm em Agamben, o dispositivo assume
uma funo completamente governamental
que se dirige diretamente aos sujeitos. Nas
palavras do autor:
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Chamarei literalmente de dispositivo
qualquer coisa que tenha de algum modo a
capacidade de capturar, orientar,
determinar, interceptar, modelar, controlar
e assegurar os gestos, as condutas, as
opinies e os discursos dos seres viventes.
No somente, portanto, as prises, os
manicmios, as fbricas, as disciplinas, as
medidas jurdicas, etc (...). Temos assim
duas grandes classes, os seres viventes (...)
e os dispositivos. E entre os dois, como
terceiro, os sujeitos. Chamo sujeito o que
resulta da relao e, por assim dizer, do
corpo a corpo entre os viventes e os
dispositivos (...). Ao ilimitado crescimento
dos dispositivos no nosso tempo
corresponde uma igualmente disseminada
proliferao de processos de subjetivao
(Agamben, 2009, p. 40-41).
importante levar em considerao
que, apesar de dispositivo ser um dos
possveis sentidos para o conceito de
mquina, ele no esgota as concepes
dessa ltima. De acordo com Castro
(2012), a mquina agambeniana implica na
presena de quatro componentes: a)
dispositivo que produz gestos, condutas e
discursos; b) bipolaridade; isto , articula
sempre duas coisas aparentemente opostas,
mas no necessariamente (exemplo:
soberania e governo como elementos da
mquina governamental); c) zonas de
indiscernibilidade; ou seja, a produo de
uma agregao de coisas que se mesclam
ao ponto de no percebemos mais uma
fronteira, fazendo com que essas coisas
paream ou se tornem uma s (exemplo: as
estratgias de produo de vida e de morte
pela mquina jurdico-poltica ocidental) e,
finalmente, d) inoperosidade; o que
significa em termos gerais um modo da
existncia da potncia, j que implica em
uma possibilidade que no
necessariamente se concretiza.
Colocado isso sobre a ideia de
mquina, cabe ainda destacar aqui
brevemente a acepo de potncia, pois se
trata de um elemento crucial em O Reino
e a Glria.
Na verdade, potncia um conceito
importante que atravessa toda a obra de
Giorgio Agamben e que toma como
fundamento, em especial, o pensamento
aristotlico e leibniziano. De modo geral,
para o autor italiano, podemos afirmar que
a experincia da potncia no coincide
com o ato de uma ao. De acordo com
Agamben, segundo os pressupostos
aristotlicos, a potncia propriamente
oposta ao ato: algo como uma faculdade
de sentir distinta do sentir em ato
(Agamben, 2006, p. 15). Ainda em
Aristteles, cabe diferenciar que na ideia
de potncia no est em questo uma
dimenso genrica, mas sim uma certa
experincia, uma certa vivncia que se
atrela possibilidade.
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Para ilustrar podemos nos referir ao
prprio exemplo que Agamben cita: a
criana tem a potncia de vir a ser um
arquiteto, um chefe de Estado o que
remete a uma potncia genrica. Isso difere
em muito de um arquiteto que j tem a
cincia e a habilidade de construir. essa
ltima perspectiva que interessa ao vis
aristotlico, pois o arquiteto tem a potncia
de construir mesmo quando no est
construindo. Isso quer dizer que a
potncia definida essencialmente pela
possibilidade do seu no-exerccio
(Agamben, 2006, p. 16).
justamente a partir dessa noo
de um no exerccio, que a ideia de
privao torna-se fundamental para o
entendimento daquilo que tomado como
potencial: a potncia pressupe a
disponibilidade de uma privao
(Agamben, 2006, p. 16). A privao
implica que o potente tal porque tem
algo e porque s vezes lhe falta algo
(Agamben, 2006, p. 15). Para Agamben,
por exemplo, o arquiteto potente
justamente quando ele no constri; o
pianista sabe tocar piano mesmo quando
no est utilizando o instrumento. Ou seja,
a potncia no se extingue porque o sujeito
est privado de algo. Pelo contrrio, a
partir dessa privao que ele se torna
potente. Ressaltamos que essa privao diz
respeito possibilidade da potncia, uma
vez que quando o arquiteto planeja a
construo ou quando o pianista toca, o
que temos so sujeitos em ato.
Retomando a discusso sobre O
Reino e a Glria referente ao que foi
explanado acima, podemos pensar, ento,
que reino e governo so elementos que
operam como uma mquina dupla. Isso
significa que h uma separao que coloca
esses elementos em campos ontolgicos
distintos, porm, eles esto em relao.
Assim, reino e governo, se tomados
enquanto uma mquina dupla, so um
dispositivo que produzem uma relao de
articulao (que por ser um dispositivo, por
sua vez, tambm produz modos de
subjetivao), mas que ao se articularem
parecem ser uma coisa s, porm no se
esgotam em termos de relao.
por isso que o mtodo de
Agamben aponta para uma arqueologia,
justamente porque ele visa um recuo mais
para trs no tempo a fim de escavar uma
ontologia dos objetos que estuda
(Agamben, 2009). Nesse vis, visibilizar
que na concepo da gesto econmica
capitalista, por exemplo, h uma separao
entre reino e governo, potncia e ato, entre
outros, enquanto elementos ontolgicos
diferentes permite-nos realizar uma anlise
que percebe as foras que produziram uma
articulao tal que faz com que hoje esses
objetos se articulem de tal forma que
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apaream agora, em uma viso ligeira,
como indissociveis e basicamente uma
coisa s.
Nesse contexto, Agamben procura
nos mostrar que a economia capitalista
atual emerge das condies propiciadas
pela teologia judaico-crist. Assim, nessa
via de uma produo de algo que est
disposto como separado, a partir da
genealogia da economia que Agamben
apresenta na via de uma forte influncia
teolgica, que herdamos uma concepo
poltica dessa desarticulao. Ou seja, a
partir do momento em que h a separao
de reino e governo, a concepo de
economia inicia a adentrar no mbito da
poltica, especialmente porque passa a
configurar um modelo para aquilo que
formar um incio de uma ordem jurdica
nas sociedades ocidentais.
Cabe ressaltar ainda, porm, que o
prprio Agamben reconhece que Foucault
ao colocar a problemtica da vida no
mbito do governo da populao de uma
biopoltica, portanto faz um recuo
tambm no cristianismo ao trabalhar a
ideia de poder pastoral. Contudo, Agamben
diverge do filsofo francs no ponto em
que o germe da diviso entre Reino e
Governo aparece na oikonomia trinitria,
que introduz na prpria divindade uma
fratura entre ser e prxis (Agamben,
2011, p. 127). Ademais, essa ciso torna-se
indispensvel para um governo do mundo
na perspectiva teolgica, j que alguns
telogos defenderam a ideia que se Deus
estivesse constantemente ocupado em
intervir a todo instante na vida de cada
vivente em particular, ele seria inferior s
coisas que prov. Ora, justamente pela
ideia sustentada em um rei que reina, mas
no governa que o governo se faz possvel
e, por isso mesmo, passa a implicar
tambm a poltica.
Outro argumento que Agamben
desenvolve no livro concerne ao papel dos
anjos. Estes, alm de serem agentes de
aes do governo divino (portam
mensagens aos homens e mulheres
escolhidos, etc), exaltam a glria divina. Se
por um lado, os anjos mostram uma
hierarquizao da organizao do governo,
por outro, sempre quando exercem suas
atividades, glorificam a Deus. A
sacralizao da hierarquia e a imitao do
divino comeam, no mbito do governo do
mundo, a adentrar no modelo jurdico-
poltico. A glria, nesse contexto, a
celebrao do poder.
Quanto a esse aspecto, Agamben
apresenta alguns exemplos: a chegada do
soberano cidade, os ritos judicirios,
entre outros, em que se inspiram?
Imaginemos, por exemplo, um tribunal
qualquer. O juiz togado, a sua cadeira
acima do nvel do cho, o ru sua
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frente.... Por que o poder precisa da glria?
O que as vestes suntuosas expressam?
Agamben entende que esses ritos no so
modernos, mas que foram inventados na
antiguidade judaico-crist e que de certo
modo ainda se fazem presentes nas
sociedades capitalistas ocidentais.
interessante notar que a
estipulao de um dia de descanso semanal
nas sociedades capitalistas remetem muito
mais herana judaico-crist do que a uma
conquista dos direitos trabalhistas, por
exemplo. Esse dia inoperoso exemplifica
o que se entende por glria, j que a glria
implica em uma celebrao ao poder, mas
uma celebrao que no produz outra coisa
que no a contemplao do prprio poder.
Finalmente, nos apndices do livro
Agamben apresenta um breve resumo do
que foi a discusso abordada:
O que nossa investigao mostrou que o
verdadeiro problema, o arcano central da
poltica, no a soberania, mas o governo;
no Deus, mas o anjo; no o rei, mas o
ministro; no a lei, mas a polcia ou
seja, a mquina governamental que eles
formam e mantm em movimento
(Agamben, 2011, p. 299).
As reflexes finais de Agamben no
livro apontam para um movimento que
buscou, complexa e paulatinamente,
desenhar uma genealogia da economia e do
governo capitalista atual. A herana
teolgica, como coloca Agamben, no
pretende sinalizar de modo algum o bom
ou o ruim nas aes governamentais, mas
ao colocarmos em anlise essa herana
teolgica da concepo de governo e de
economia atual, percebemos a a existncia
de uma ciso que permite um governo pela
exceo, uma distncia necessria entre
soberania e governo, entre ao e prtica
que foram forjadas enquanto estratgias de
gesto. Ao realocarmos essa questo para o
campo da Psicologia, podemos
problematizar a organizao que elas
produzem no mbito das Polticas
Pblicas, por exemplo; os efeitos que se
desdobram em termos de modos de
subjetivao, os valores que so
defendidos pelos indivduos, as sociedades
que constroem. Ao politizar a economia, o
homem se tornou cidado, mas um cidado
forjado por operaes que o dividiram e o
adestraram em um mundo capitalista e
individualizador de seus interesses. O
Estado, ao trazer a dimenso da economia
para a esfera da gesto, poupa (em termos
econmicos!) a vida de sua populao,
padronizando formas de existncia. A ideia
de profanao que Agamben coloca, nesse
sentido, torna-se necessria, j que a
sacralizao de certos valores que se
tornaram cristalizados fomentaram cises e
excluses no campo social.
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Notas
1 Dynamis significa potncia em grego,
como o prprio Agamben explica em
outros textos (Agamben, 2006).
2 Cabe ressaltar que no livro em questo,
Agamben desenvolve uma srie de
argumentos que vo delineando noes
que complexificam e produzem um
adensamento ideia de economia. Dentre
elas, a concepo de livre-arbtrio e
liberdade, de criao, de providncia
divina, etc, mas que nesta escrita no cabe
um maior aprofundamento, j que
demandaria a elaborao de um outro texto
que escapa ao propsito de uma simples
resenha.
Referncias
Agamben, G. (2004). Homo Sacer: o poder
soberano e a vida nua I. Editora
UFMG: Belo Horizonte.
Agamben, G. (2006). A potncia do
pensamento. Revista do
Departamento de Psicologia UFF,
v. 18, n. 1, pp. 11-28.
Agamben, G. (2009). Signatura rerum:
sobre el mtodo. Adriana Hidalgo
editora: Buenos Aires.
Agamben, G. (2010). O que um
dispositivo? Em Agamben, G. O que
o contemporneo ? e outro ensaios.
Argos: Chapec.
Agamben, G. (2011). O Reino e a Glria:
uma genealogia teolgica da
economia e do governo. Boitempo
Editorial: So Paulo.
Castro, E. (2012). Introduo a Giorgio
Agamben: uma arqueologia da
potncia. Editora Autntica: Belo
Horizonte.
Andrea Cristina Coelho Scisleski: Possui
graduao em Psicologia pelo Instituto de
Psicologia (2004) e mestrado em
Psicologia Social e Institucional, ambos
pela Universidade Federal do Rio Grande
do Sul (2006). Doutor em Psicologia pela
Pontifcia Universidade Catlica do Rio
Grande do Sul (2010). docente do
Programa de Ps-graduao em Psicologia
da Universidade Catlica Dom Bosco
(Campo Grande - MS). Realizou
doutorado-sanduiche na Goldsmiths
College, University of London (2009-
2010).
Endereo: Universidade Catlica Dom
Bosco, PPG Psicologia.
av. Tamandar 6000
Jardim Seminrio
79117-900 - Campo Grande, MS - Brasil
Telefone: (67) 33123605
E-mail: [email protected]