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UNIVERSIDADE DA BEIRA INTERIOR Ciências da Saúde
Ecografia das glândulas salivares major na avaliação e seguimento dos doentes com
Síndrome de Sjögren Primária
Catarina Caldeira Roteia
Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em
Medicina (ciclo de estudos integrado)
Orientadora: Dr.ª Margarida Alexandre Oliveira
Covilhã, maio de 2015
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Ecografia das glândulas salivares major na avaliação e seguimento dos doentes com Síndrome de Sjögren Primária
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Dedicatória
À minha família e aos meus amigos.
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Ecografia das glândulas salivares major na avaliação e seguimento dos doentes com Síndrome de Sjögren Primária
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Agradecimentos
Quero começar por agradecer à minha orientadora Dr.ª Margarida Oliveira pela sua
disponibilidade, conselhos e indicações de ordem técnica, e estímulos que me deu durante a
realização desta dissertação.
Agradeço ao meu pai Joaquim e à minha irmã Susana pelo enorme apoio que me
deram neste ultimo ano, sendo decisivos nesta etapa da minha vida.
Agradeço à Joana por estar sempre ao meu lado.
Por fim, agradeço a todos que direta ou indiretamente contribuíram para a realização
deste trabalho.
Um obrigado a todos.
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Ecografia das glândulas salivares major na avaliação e seguimento dos doentes com Síndrome de Sjögren Primária
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Resumo
Título: Ecografia das Glândulas Salivares Major na Avaliação e Seguimentos dos doentes com
Síndrome de Sjӧgren Primária.
Introdução: A Síndrome de Sjögren Primária é uma doença reumática inflamatória crónica,
autoimune, que se manifesta clinicamente por xerostomia e xeroftalmia, devido à infiltração
linfocitária das glândulas exócrinas, principalmente glândulas salivares e lacrimais. A
ecografia tem sido cada vez mais utilizada na avaliação e seguimento destes doentes visto
que é uma técnica imagiológica não invasiva, barata, isenta de radiações e bem aceite pelos
doentes.
Objetivos: Revisão de literatura no sentido de avaliar a utilidade da ecografia das glândulas
salivares major na avaliação e seguimento dos doentes com Síndrome de Sjӧgren Primária.
Metodologia: As palavras-chave “Sjӧgren’s Syndrome” “Primary Sjӧgren’s Syndrome”,
“ultrasonography of the major salivary glands”, “color doppler sonography”, “classification
criteria”; “major salivary glands” e “ultrasonography” foram utilizadas para a pesquisa de
artigos científicos nas bases de dados PubMed e ResearchGate. Foi também realizada a leitura
livros de texto onde este tema era abordado.
Resultados e Discussão: Vários estudos em relação à utilidade da ecografia das glândulas
salivares major na avaliação dos doentes com Síndrome de Sjӧgren Primária foram realizados
e vários parâmetros ecográficos foram descritos como importantes, a saber: a ecogenicidade,
a homogeneidade do parênquima glandular, o tamanho/volume, a definição dos bordos das
glândulas e a vascularização. A homogeneidade do parênquima glandular é o achado
ecográfico que reúne mais consenso entre a comunidade científica como sendo o mais
característico de Síndrome de Sjӧgren Primária. A vascularização das glândulas salivares pode
ser inferida pelo uso de Doppler Cor, que reflete de forma indireta o grau de inflamação.
Estudos adicionais são necessários para incorporar esta técnica na prática clínica diária, sendo
muito promissora no diagnóstico, na avaliação da progressão da atividade da doença e na
monitorização clínica e terapêutica.
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Palavras-chave
Síndrome de Sjӧgren, Síndrome de Sjӧgren Primária, Ecografia das Glândulas Salivares Major,
Ecografia Doppler Cor, Critérios de Classificação, Glândulas Salivares Major, Ecografia
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Ecografia das glândulas salivares major na avaliação e seguimento dos doentes com Síndrome de Sjögren Primária
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Abstract
Title: Ultrasound of the Major Salivary Glands in the evaluation and follow-up of patients with
Sjӧgren Syndrome Primary.
Introduction: Primary Sjögren's Syndrome is an autoimmune inflammatory chronic rheumatic
disease, which is clinically manifested by xerostomia and xerophthalmia due to lymphocytic
infiltration of the exocrine glands, mainly salivary and lacrimal glands. Ultrasound has been
increasingly used in the evaluation and follow-up of these patients because it is a noninvasive
imaging technique, inexpensive, free of radioation and well accepted by patients.
Objetives: Literature review to assess the usefulness of ultrasound of the major salivary
glands in the evaluation and follow up of patients with Sjӧgren Syndrome Primary.
Methodology: The keywords "Sjӧgren's Syndrome" "Primary Sjӧgren's Syndrome",
"ultrasonography of the major salivary glands", "color Doppler sonography," "classification
criteria"; "major salivary glands" and "ultrasonography" were used for the research of
scientific articles in PubMed and ResearchGate databases. Reading of text books where this
topic was discussed.
Results and Discussion: Several studies about the use of ultrasound in the assessment of the
salivary glands of patients with Primary Sjӧgren syndrome were performed and several
ultrasound parameters were described as important, namely: echogenicity, homogeneity
parenchyma, size / volume, definition of the edges of the salivary glands and vascularization.
The homogeneity of the glandular parenchyma is the ultrasound finding which brings more
consensus among the scientific community as being the most characteristic of Primary Sjӧgren
syndrome. The vasculature of the glands can be inferred by the use of color Doppler, which
also indirectly reflects the degree of inflammation. Additional studies are needed to
incorporate this technique in clinical practice, being very promising in the diagnosis,
assessment of the progression of disease activity and clinical and therapeutic monitoring.
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Ecografia das glândulas salivares major na avaliação e seguimento dos doentes com Síndrome de Sjögren Primária
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Keywords
Sjӧgren’s Syndrome; Primary Sjӧgren’s Syndrome; Ultrasonography of the Major Salivary
Glands; Color Doppler Sonography; Classification Criteria; Major Salivary Glands;
Ultrasonography
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Índice
1.Introdução ................................................................................................... 1
2.Síndrome de Sjӧgren ...................................................................................... 2
2.1.Definição ................................................................................................ 2
2.2.Epidemiologia........................................................................................... 2
2.3.Fisiopatologia ........................................................................................... 2
2.4.Manifestações Clínicas ................................................................................ 3
2.5.Diagnóstico .............................................................................................. 7
2.6.Tratamento ........................................................................................... 11
3.Anatomia das Glândulas Salivares Major ............................................................ 13
3.1.Glândulas Parótidas ................................................................................. 13
3.2.Glândulas Submandibulares ........................................................................ 13
4.A Ecografia ................................................................................................. 14
4.1.Noções Básicas ....................................................................................... 14
4.2.Técnica de exploração ecográfica das glândulas salivares major ........................... 15
4.3.Anatomia ecográfica das glândulas salivares major ........................................... 15
4.3.1.Glândulas Parótidas ............................................................................ 15
4.3.2.Glândulas Submandibulares .................................................................. 16
4.4.Ecografia das glândulas salivares major em contexto de Síndrome de Sjӧgren Primária 16
5.A Ecografia Doppler ...................................................................................... 22
5.1.Noções Básicas ....................................................................................... 22
5.1.1.Ecografia Doppler Cor ......................................................................... 22
5.2.Vascularização das glândulas salivares major .................................................. 22
5.2.1.Glândulas Parótidas ............................................................................ 22
5.2.2.Glândulas Submandibulares .................................................................. 23
5.3.Ecografia Doppler em contexto de Síndrome de Sjӧgren Primária .......................... 23
6.Utilidade da ecografia no seguimento dos doentes com Síndrome de Sjӧgren Primária . 25
7.Conclusão .................................................................................................. 26
8.Bibliografia ................................................................................................. 28
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Lista de Tabelas
Tabela I – Manifestações Clínicas da Síndrome de Sjӧgren Primária .......................................... 3
Tabela II – Questões específicas para a pesquisa de sintomas oculares e/ou orais .................... 7
Tabela III – Testes oftalmológicos utilizados na avaliação dos doentes com Síndrome de
Sjӧgren ..................................................................................................................................... 8
Tabela IV – Critérios de Classificação ACR-SICCA da Síndrome de Sjӧgren ............................... 10
Tabela V – Critérios de Classificação AECG da Síndrome de Sjӧgren ........................................ 11
Tabela VI – Opções terapêuticas para as manifestações clínicas sistémicas da Síndrome de
Sjӧgren ................................................................................................................................... 12
Tabela VII – Valor diagnóstico das técnicas imagiológicas para as glândulas salivares major ... 17
Tabela VIII – Sistema de pontuação elaborado por Hočevar et al. ........................................... 18
Tabela IX – Sistema de pontuação elaborado por Elke Theander et al ..................................... 19
Tabela X – Sistema de pontuação elaborado por Wernicke et al ............................................. 20
Tabela XI – Sistema de pontuação elaborado por Cornec et al ................................................ 20
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Lista de Acrónimos
ACR-SICCA - American College of Rheumatology-Sjögren’s International Collaborative Clinical
Alliance
AECG – American – European Consensus Group
Anti-Ro/SSA – Anticorpos contra os antigénios Ro ou SSA
Anti-La/SSB – Anticorpos contra os antigénios La ou SSB
ANA – Anticorpos Antinucleares
AR - Artrite Reumatoide
ED – Ecografia Doppler
EGSM – Ecografia das Glândulas Salivares Major
FR - Fator Reumatoide
FS - Focus Score
IgM – Imunoglobulinas M
LES – Lúpus Eritematoso Sistémico
LNH – Linfoma Não Hodgking
MHz – Milhões de Hertz
OSS – Ocular Stainning Score
PI – Índice de Pulsatilidade
RI – Índice de Resistência
RMN – Ressonância Magnética Nuclear
SS – Síndrome de Sjӧgren
SSP – Síndrome de Sjӧgren Primária
SSS - Síndrome de Sjӧgren Secundária
TC – Tomografia Computorizada
US – Ultrassons
VHC – Vírus da hepatite C
VIH – Vírus da imunodeficiência humana
VS - Velocidade de Sedimentação
Z – Impedância Acústica
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Introdução
A Síndrome de Sjögren (SS) é uma doença reumática inflamatória crónica, de causa
autoimune, que afeta tipicamente mulheres da meia-idade(1). A sua prevalência varia de 0,1%
a 4,8% na população em geral, sendo claramente superior nas mulheres em relação aos
homens (ratio 9:1)(2, 3).
Nesta síndrome ocorre infiltração linfocítica das glândulas exócrinas e hiperatividade
marcada das células B, com consequente hipergamaglobulinémia e presença de anticorpos no
soro, incluindo anticorpos antinucleares (ANA), fator reumatoide (FR), crioglobulinémia e
anticorpos contra os antigénios Ro ou SSA (anti-Ro/SSA) e contra os antigénios La ou SSB (anti-
La/SSB)(3).
A SS manifesta-se clinicamente por xerostomia e xeroftalmia, podendo ainda
apresentar diversas manifestações clínicas sistémicas. Estas manifestações podem estar
relacionadas com o infiltrado periepitelial dos órgãos parenquimatosos ou com a deposição de
imunocomplexos. Embora a SS seja considerado uma doença benigna, cerca 5-10 % dos
pacientes podem desenvolver Linfoma Não Hodgkin (LNH), sendo esta a complicação mais
séria(3, 4).
A SS pode ser primária (SSP), ou seja, não associada a outras doenças ou pode
aparecer associada a outras doenças autoimunes, como a artrite reumatoide (AR), lúpus
eritematoso sistémico (LES), polimiosite, esclerodermia, tiroidite ou outras, sendo então
designada Síndrome de Sjögren Secundária (SSS)(5).
Existem vários critérios de classificação da doença, sendo os critérios ACR-SICCA
(American College of Rheumatology- Sjögren’s International Collaborative Clinical Alliance),
de 2012, os de publicação mais recente(6). Dada a utilidade evidente da ecografia, como
método de imagem na avaliação dos doentes com doenças reumáticas, nomeadamente na
avaliação e seguimento dos doentes com SSP, várias alterações têm sido propostas aos
critérios de classificação ACR-SICCA, visando incluir os achados ecográficos, habitualmente
encontrados nas diferentes fases de evolução desta doença, como parte integrante dos
critérios de classificação da SS.
A ecografia das glândulas salivares major (EGSM) revela-se uma ferramenta de
imagem não invasiva, barata e isenta de radiações, que demonstrou utilidade na
discriminação de pacientes com e sem SS(7). Vários estudos demonstraram que é possível
propor a EGSM como um item adicional aos critérios de classificação da doença já existentes.
Assim, a noção da utilidade da EGSM na avaliação e seguimento dos doentes com SSP
e o saber interpretar os achados ecográficos presentes nas diferentes fases da evolução da
doença, mostram-se cada vez mais importantes na prática clínica do reumatologista.
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Síndrome de Sjögren
Definição
A SS é uma doença inflamatória crónica autoimune, com manifestações clínicas
diversas. Caracteriza-se por uma infiltração linfocitária das glândulas exócrinas
(principalmente glândulas salivares e lacrimais) e por hiperatividade marcada das células B(3).
A SS pode ocorrer na forma primária, não associada a outras doenças, sendo dominada
SSP ou pode aparecer associada a outras doenças reumáticas autoimunes, como a AR, LES,
polimiosite, esclerodermia, tiroidite ou outras, sendo designada SSS(5).
Epidemiologia
As estimativas da incidência e prevalência da SS são variáveis, visto que dependem
dos critérios de inclusão usados, do desenho do estudo, do tamanho da amostra e da
população examinada (etnia, sexo). No entanto, estudos recentes sugerem que a prevalência
varia entre 0,1% e 4,8%, na população em geral, com as taxas a aumentar à medida que a
idade avança. A SS é nove vezes mais comum nas mulheres do que nos homens, com um pico
de incidência por volta da idade da menopausa(3, 5). A prevalência da SSP é aproximadamente
0,5%-1% e a da SSS é de cerca de 30%(8).
Fisiopatologia
A SS é uma exocrinopatia crónica e progressiva onde existe proliferação de linfócitos
e infiltração nas glândulas afetadas. Existe uma resposta autoimune dirigida contra as
glândulas exócrinas. Estas apresentam progressivos e persistentes infiltrados focais
mononucleares. Com o tempo ocorre a atrofia das células do epitélio acinar e posterior
progressão para fibrose(9).
A etiopatogenia não é conhecida, mas atualmente considera-se que na génese desta
doença possa existir uma interação entre diversos fatores, nomeadamente ambientais,
epigenéticos, hormonais, genéticos e neuropsicológicos(10).
Pensa-se que após um estímulo por um fator exógeno, ocorra dano das células
epiteliais das glândulas salivares. Consequentemente ocorre migração dos linfócitos T e
infiltração linfocítica das glândulas exócrinas, com marcada hiperatividade dos linfócitos B e
produção do FR, dos anti-Ro/SSA, dos anti-La/SSB e do crioprecipitado de imunoglobulinas(2,
3).
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Manifestações Clínicas
As manifestações clínicas da SS podem ser divididas naquelas que estão relacionadas
com a disfunção exócrina (glandular) e naquelas que afetam outros órgãos (extraglandulares
ou sistémicas). As principais manifestações clínicas glandulares e extraglandulares são as
seguintes:
Tabela I (parte I de II): Manifestações Clínicas da Síndrome de Sjӧgren Primária
Manifestação Clínica Prevalência (%) Caraterísticas clínicas e laboratoriais
Glandulares Destruição do epitélio glandular, anticorpos contra recetores muscarínicos, diminuição da neurotransmissão.
Xerostomia 90
Dificuldade na mastigação e deglutição; úlceras orais; Infeções orais e cáries dentárias, infeções por fungos (lesões mucosas eritematosas ou pseudomembranosas, língua fissurada, atrofia das papilas filiformes e queilite angular).
Aumento das glândulas parótidas
50 Usualmente bilateral, firme à palpação, assintomática e preditor de risco para linfoma.
Xeroftalmia 95
Sensação de “areia” ou prurido ocular; Diminuição das secreções lacrimais, irritação da córnea e destruição do epitélio da conjuntiva bulbar e da córnea (queratoconjuntivite seca).
Pele seca ~10 Pele seca, acompanhada por prurido.
Secura do trato respiratório superior
20 Mucosa nasal seca, xerotraqueia, bronquite seca. Tosse seca crónica.
Dispareunia 40 Frequentemente observada nas mulheres em pré-menopausa (por disfunção das glândulas vaginais lubrificantes).
Adaptada de: Mavragani CP, Moutsopoulos HM. Sjӧgren syndrome. CMAJ. 186. Canada2014. p. E579-86 (3)
Tabela I (parte II de II): Manifestações Clínicas da Síndrome de Sjӧgren Primária
Manifestação Clínica Prevalência (%) Caraterísticas clínicas e laboratoriais
Extraglandulares (sistémicas)
Não específicas
Musculosquelética 70
Artropatia de Jaccoud (deformidades reversíveis nas mãos, ausência de lesões erosivas); Na radiografia das mãos podem objetivar-se calcificações dos tecidos moles (associadas sobretudo a Fenómeno de Raynaud).
Fenómeno de Raynaud 30 Moderado em comparação com outras doenças autoimunes; não associado a complicações vasculares.
Fadiga 70 Aumento da necessidade de repouso, associada com incapacidade funcional.
Periepitelial
Brônquicas 20
Inflamação mononuclear peribrônquica e/ou peribronquiolar; Tosse seca e encurtamento da respiração durante o esforço; Testes de função pulmonar: predomina o padrão obstrutivo das pequenas vias respiratórias; Radiografia do tórax: habitualmente normal ou infiltrados pulmonares; TC (Tomografia computorizada): espessamento das paredes brônquicas; o envolvimento intersticial puro é menos frequente (tipos comuns: pneumonia linfocítica
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intersticial caraterizada por quistos de parede fina, bronquiolite linfocítica).
Fígado Hepatomegalia Presença de anticorpos antimitocondriais
Infiltração linfocítica à volta das células colangiais.
25 Anticorpos anti mitocondriais e SS: 2/3 dos pacientes demonstram anormalidades enzimáticas; Histopatologia do fígado: inflamação ligeira do ducto biliar intra-hepático; cirrose biliar primária (estadio I); Progressão do SS-associado a cirrose biliar primária: muito lenta em termos clínicos, serológicos e histopatológicos.
5
Rim 2.5
Nefrite intersticial: Infiltração linfocítica em torno das células tubulares renais; Curso subclínico; Acidose tubular renal distal (hipocalémia, pH alcalino da urina, nefrocalcinose. Compromisso crónico renal moderado.
Glândulas endócrinas Infiltrados linfocíticos periepiteliais na tiroide, glândulas suprarrenais e ovários.
Doença da Tiroide Autoimune Anticorpos contra os antigénios da tiroide Hipotiroidismo clínico
Sugere um subtipo de SS com curso ligeiro e normocomplementémia C4
10-20
1.5-16.5
Doença autoimune da glândula suprarrenal Anticorpos contra os antigénios da glândula suprarrenal (21-hidroxilase)
17 Associada à ativação das células B pelas citoquinas e à diminuição da resposta da glândula suprarrenal.
Doença autoimune dos ovários Anticorpos contra os antigénios dos ovários
27
Doença associada a imunocomplexos
Deposição dos imunocomplexos nos pequenos vasos da pele, nos nervos, nos rins e no cérebro como resultado da hiperatividade das células B
Vasculite cutânea Púrpura palpável
10
A manifestação mais comum de vasculite; Confere um risco aumentado de desenvolvimento de linfoma, quando associada a hipocomplementémia e crioglobulinémia; Púrpura não palpável pode também ocorrer em contexto de hipergamaglobulinémia.
Neuropatia periférica Neuropatia axonal sensitiva Neuropatia de pequenas fibras Neuropatia sensitivo-motora
2-10
Distribuição em luva e meia.
Parestesia dolorosa ou em queimadura.
Preditor adverso de linfoma, quando associada com hipocomplementemia, crioglobulinemia e lesões vasculíticas.
Glomerulonefrite ~2
Fator de risco adverso para linfoma e sobrevida, quando associada a vasculite sistémica, hipocomplementémia e crioglobulinémia;
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Glomerulonefrite membranosa e membranoproliferativa são os subtipos histológicos mais frequentes; Deposição de IgM (Imunoglobulinas M) e complemento, documentada por imunofluorescência nos tecidos renais; Hipertensão, proteinúria ligeira e hematúria, são as manifestações clínicas mais comuns.
Vasculopatia do sistema nervoso central
3-20
Associada a anti-Ro/SSA; Manifestações clínicas semelhantes às da esclerose múltipla; Anticorpos detetados contra as aquaporinas-4 foram detetados em pacientes com LES e SS com evidência de mielite transversa extensa longitudinal ou neurite ótica.
Linfoma Tecido linfoide associado a mucosas (o mais comum) Linfoma nodal da zona marginal Linfoma difuso das células B
Estimulação antigénica crónica, aberrações genéticas; Os locais de envolvimento: glândulas salivares minor e/ou major, estômago, pulmões, gânglios linfáticos; o envolvimento da medula óssea é raro; Os fatores de risco para o desenvolvimento de linfoma incluem: neuropatia periférica, glomerulonefrite, linfopenia, lesões purpúricas ou vasculíticas, baixos níveis de C4, crioglobulinémia e centros germinativos na biópsia das glândulas salivares minor.
Adaptada de: Mavragani CP, Moutsopoulos HM. Sjӧgren syndrome. CMAJ. 186. Canada2014. p. E579-86 (3)
Carateristicamente os pacientes com SS apresentam diminuição da função das
glândulas exócrinas, com consequente xeroftalmia e xerostomia.
Os pacientes descrevem sensação de “areia” nos olhos, ardor, diminuição do
lacrimejar, “incapacidade de chorar”, rubor ocular, prurido e fotofobia, devidos à
queratoconjuntivite seca. Podem aparecer filamentos de muco no canto interno do olho,
sendo visíveis principalmente ao acordar. A ulceração da córnea e a blefarite podem também
ser complicações desta afeção.
A secura oral conduz muitas vezes à dificuldade em engolir comida seca, à
incapacidade de ter um discurso fluído, a cáries dentárias (65%), a sensação de ardor, a
diminuição do paladar, a atrofia gengival, a candidíase oral (33%), a esofagite crónica e a
perda ponderal(1, 8, 11).
A fadiga é também um dos sintomas mais comuns, ocorrendo em cerca de 70% dos
pacientes com SSP, que frequentemente descrevem uma crescente necessidade de repouso(3).
O aumento das glândulas parótidas, submandibulares e de outras glândulas salivares
ocorre em cerca de 2/3 dos pacientes com SSP, sendo incomum nos doentes com SSS. Este
alargamento glandular pode ser episódico ou crónico, com tumefação frequentemente
seguida de diminuição do tamanho glandular, em poucas semanas.
A secura vaginal associada a dispareunia é um sintoma comum nas mulheres com SS,
podendo complicar-se com infeções bacterianas ou por candidíase. Outras manifestações
geniturinárias podem ser: amenorreia, menorragias ou metrorragias, endometriose e cistite
intersticial(8, 11).
O envolvimento extraglandular pode comprometer a pele, as articulações, os
músculos, o trato respiratório, a tiroide, o coração, o trato gastrointestinal, o fígado, os rins,
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Ecografia das glândulas salivares major na avaliação e seguimento dos doentes com Síndrome de Sjögren Primária
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a bexiga, o pâncreas, o sistema nervoso periférico, o cérebro, os gânglios linfáticos e a
própria medula óssea(12).
Artrite e/ou artralgias são diagnosticadas em cerca de 50 % dos pacientes e tendem a
ser poliarticulares, bilaterais e simétricas. As articulações mais afetadas são os tornozelos, as
articulações metacarpofalângicas, as articulações metatarsofalângicas e os punhos. O
envolvimento muscular ocorre em cerca de 27% dos pacientes com SSP.
A xerose (mais comum), a vasculite cutânea, o fenómeno de Raynaud e o eritema
anular encontram-se entre as síndromes cutâneas associadas a SS(12). A vasculite afeta vasos
de pequeno e médio calibre, tendo como manifestações clínicas: púrpura, urticária,
ulcerações da pele, glomerulonefrite e mononeurite múltipla.
O envolvimento glandular do trato respiratório superior compromete a mucosa do
nariz, dos seios nasais e da faringe posterior, pelo que estes doentes sofrem frequentemente
de rinite não alérgica e sinusite. A tosse seca persistente decorre do envolvimento da laringe,
traqueia e brônquios. A secura brônquica contribui para a ocorrência de infeções do trato
respiratório superior, devido à tendência para a formação de rolhões mucosos espessos(11).
O envolvimento pulmonar é frequentemente comprovado histologicamente, mas
raramente os doentes têm sintomatologia clínica. A doença pulmonar intersticial é a doença
pulmonar mais comum e responsável pelo aumento da taxa de mortalidade(1, 8). Por outro
lado, a pericardite aguda é uma complicação rara da SS(12). Sintomas endocrinológicos são
também documentados em 15% dos pacientes com SSP e estão sobretudo relacionados com a
disfunção tiroidea.
A disfagia é o sintoma gastrointestinal mais comum, mas náuseas, dor epigástrica e
dispepsia podem ocorrer(1). Foram descritos casos de pancreatite autoimune esclerosante.
Existe uma possível associação entre SS e a presença de anomalias hepáticas: anomalias
bioquímicas ou alterações histológicas na biópsia hepática compatíveis com cirrose biliar
primária, fibrose do trato portal ou hepatite crónica ativa são encontradas nestes
pacientes(12).
A ocorrência de glomerulonefrite é rara e surge associada a crioglobulinémia. A
nefrite intersticial e disfunção tubular renal, com ou sem acidose podem estar associadas a
SSP(8).
O envolvimento do sistema nervoso pode ser multifocal, recorrente e progressivo,
causando hemiparesias, mielite transversa, defeitos hemisensoriais, convulsões e
anormalidades do movimento, como neuropatia não-atáxica sensorial (67%), neuropatia
sensoriomotora (23%) e neuropatia sensorial atáxica (10%). A perda auditiva neurosensitiva
ocorre em 50% dos casos. Casos de meningite asséptica e esclerose múltipla também foram
reportados(1, 8).
Um aumento nas taxas de neuroticismo, psicose, obsessividade, hipocondria, ideação
paranoide, somatização, sintomas obsessivo-compulsivos, distúrbios do sono e defeitos nas
estratégias de copping tem sido reportado(3).
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Ecografia das glândulas salivares major na avaliação e seguimento dos doentes com Síndrome de Sjögren Primária
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O LNH é a complicação mais séria do SSP. Pode surgir em aproximadamente 5-10% dos
casos, sendo a glândula parótida a origem mais comum(8, 11, 13). Os achados que nos devem
fazer pensar em linfoma são aumento glandular unilateral e persistente (especialmente
quando o aumento anterior foi transitório ou intermitente), textura dura e nodular da
glândula, a presença de vasculite cutânea ou púrpura palpável, leucopenia, crioglobulinémia,
baixos níveis de C4, linfopenia, neuropatia periférica, glomerulonefrite e sintomas como
perda de peso, febre e mal-estar(3, 8).Em média, o LNH aparece 7 anos após o diagnóstico de
SSP(12). Apesar do risco de 5-10% do aparecimento de linfoma, a maioria dos pacientes com SS
(≈ 90 %) tem um curso indolente e benigno(3, 11).
Diagnóstico
Em face da multiplicidade de sintomas clínicos e potenciais complicações desta
doença, o diagnóstico precoce da SS é fundamental(14). No entanto, a diversidade das
manifestações clínicas iniciais e a ausência de qualquer sinal, sintoma ou teste
patognomónico da SS que permitam o reconhecimento precoce da doença, tornam por vezes o
diagnóstico difícil(1, 7).
A chave para o diagnóstico desta entidade nosológica é a avaliação clínica cuidada de
doentes que apresentem sintomas persistentes de olhos secos e boca seca, aumento
recorrente das glândulas parótidas, um aumento inexplicado das cáries dentárias ou
resultados anormais de testes serológicos específicos [por exemplo: anti-Ro/SSA e/ou anti-
La/SSB, FR, hipergamaglobulinémia e aumento da velocidade de sedimentação (VS)]. Esta
avaliação deve incluir uma história clínica completa e uma revisão de todos os órgãos e
sistemas, incluindo questões específicas para avaliar a secura oral e/ou ocular, exames
clínicos para avaliar o grau de disfunção glandular e a pesquisa de anormalidades
imunológicas(3, 5).
Perante um doente com sintomas de secura ocular e/ou oral, que persistem há 3
meses ou mais, devemos colocar a hipótese de SS, pelo que certas questões específicas
devem ser colocadas ao paciente, nomeadamente:
Tabela II. Questões específicas para a pesquisa de sintomas oculares e/ou orais
Sintomas Oculares
Tem apresentado diariamente olhos secos (por mais de 3 meses)? Tem sensação recorrente de “areia” nos olhos? Usa substitutos de lágrima mais de 3 vezes por dia?
Sintomas Orais
Tem apresentado diariamente sensação de boca seca (desde há mais de 3 meses)? Tem apresentado aumento das glândulas salivares recorrente ou persistente, quando adulto? Bebe líquidos frequentemente para o ajudar a engolir alimentos secos? Acorda à noite para beber água porque tem a boca demasiado seca?
Adaptada de: Torres SLdC. Síndrome de Sjögren Artigo de Revisão Bibliográfica. Porto: Instituto de
Ciências Biomédicas Abel Salazar - Universidade do Porto; 2013(9)
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Ao exame físico, deve-se ter particular atenção à presença do aumento das glândulas
lacrimais ou salivares e aos sinais de hipofunção salivar, incluindo a existência de cáries nas
porções cervicais e incisionais dos dentes, língua hiperlobulada, com perda das papilas
filiformes e ausência de saliva no pavilhão bucal. Lesões de queratite filamentares ou
ulcerações puntiformes na córnea podem ser detetadas com a coloração de Rosa Bengala,
lissamina verde ou fluoresceína. Por sua vez, a objetivação de alterações na produção de
lágrimas pode ser feita pelo Teste de Schirmer I e pelo Tempo de Rutura da Lágrima. Todos os
pacientes devem ser examinados por um oftalmologista(2, 3, 5, 8, 9, 11).
Tabela III. Testes Oftalmológicos utilizados na avaliação de pacientes com Síndrome de Sjӧgren
Teste de Schirmer I
Um pequeno pedaço de papel de filtro estéril é colocado na junção entre o terço lateral e o terço médio da pálpebra inferior, sem anestesia. Se após 5 minutos o humedecimento do papel de filtro for inferior a 5 mm é considerado anormal, ou seja, indicativo de deficiência na produção de lágrimas. Os resultados frequentemente são semelhantes em ambos os olhos.
Tempo de Rutura da Lágrima (Tear Break-up time – TBUT)
Permite a avaliação global da função lacrimal. Mede-se o tempo de rutura e a osmolalidade da lágrima após a instilação de fluoresceína. A visualização com uma lâmpada de fenda e uma luz de cobalto azul são necessárias. Um tempo de rutura da lágrima inferior ou igual a 10 s é anormal e indicativo de deficiência ou anormalidade na qualidade da camada mucosa mais externa do filme lacrimal. A sua correlação com a gravidade dos sintomas oculares e doenças do epitélio da córnea é melhor do que a do teste de Schirmer I, no entanto pacientes com produção normal de lágrimas podem ter resultados anormais, devido por exemplo a disfunção das glândulas meibomianas.
Coloração da Superfície Ocular (Rosa Bengala e Lissamina Verde)
Os danos das células epiteliais da córnea e conjuntiva podem ser avaliados por corantes vitais que mancham as áreas de tecidos desvitalizados. A coloração Rosa Bengala cora tecidos desvitalizados da córnea e da conjuntiva, no entanto, visto que o seu uso é doloroso em pacientes com olhos secos, esta tem vindo a ser substituída pela fluoresceína (para coloração da córnea) e Lissamina verde (para coloração da conjuntiva). Com a coloração fluoresceína e Lissamina verde podemos então calcular o Ocular Stainning Score (OSS), criado pelo SICCA, cujo score varia de 0 a 12. Se OSS≥3 é sugestivo de SS.
Adaptada de: Torres SLdC. Síndrome de Sjögren Artigo de Revisão Bibliográfica. Porto: Instituto de
Ciências Biomédicas Abel Salazar - Universidade do Porto; 2013(9)
Testes laboratoriais básicos devem ser realizados, de modo a procurar anormalidades
que possam ser observadas na SS, nomeadamente leucopenia, trombocitopenia, anemia,
hipergamaglobulinémia, elevação da VS. Podem também estar presentes proteinúria e/ou
hematúria, que refletem a rara ocorrência de glomerulonefrite e achados indicativos de
acidose tubular renal, incluindo proteinúria moderada, hipoestenúria e pH urinário> 7, na
presença de acidose metabólica. A pesquisa dos ANA, anti-Ro/SSA, anti La/SSB e FR, deve ser
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sempre realizada em caso de suspeita clínica de SS(2, 5). Os doentes com SSP possuem anti-
Ro/SSA (70%-100%) e/ou anti-La/SSB (35-70%), sendo os últimos altamente específicos(3). Estas
percentagens variam com o tipo de exame laboratorial, mas geralmente 60-80% dos pacientes
com SSP exibem um ou ambos os anticorpos. Favorece assim o diagnóstico de SS um teste
positivo para os anti-Ro/SSA e/ou anti-La/SSBA, combinado com os títulos de ANA ≥1:320 e a
presença de FR.
A cintigrafia das glândulas salivares, a sialometria completa, a sialografia com
contraste, a TC, a ressonância magnética nuclear (RMN) e a EGSM são exames diagnósticos
importantes na avaliação dos doentes com SS.
A cintigrafia permite realizar uma avaliação funcional das glândulas salivares major. A
descoberta de uma captação muito baixa do radionuclídeo tecnécio Tc99m através da
cintigrafia é pouco sensível, mas altamente específica de SS.
A sialografia com contraste permite avaliar alterações anatómicas, permitindo uma
excelente visualização dos ductos. No entanto, o seu uso é limitado pelo risco de rutura e por
estar contraindicado na presença de parotidite aguda.
A sialometria completa permite quantificar a taxa de produção da saliva. A taxa total
de fluxo salivar não estimulado é um teste relativamente simples que avalia a produção de
saliva, principalmente das glândulas submandibulares e sublinguais. Pede-se ao doente para
cuspir uma vez; após 15 minutos, o volume de saliva é coletado num recipiente e medido. Um
valor coletado≤1,5 ml durante este tempo indica hipoprodução salivar. A sialometria
completa também pode ser realizada com a estimulação da secreção da saliva, através da
mastigação ou com o uso de sialagogos (como o ácido cítrico ou a pilocarpina), medindo a
produção estimulada da glândula parótida. No teste Saxon, um método de sialometria
completa, o doente mastiga uma esponja durante dois minutos. A diferença no peso da
esponja antes e depois de a mastigar representa a quantidade de saliva produzida, pelo que a
acumulação
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para SS que a cintigrafia e a biópsia das glândulas salivares minor, além de que é mais barata
e acessível que a RMN.
A TC das glândulas parótidas pode revelar heterogeneidade do parênquima, padrão
nodular, acumulação anormal de gordura, alterações do tamanho da glândula e quistos. A
presença de calcificações puntiformes difusas é altamente específica de SS. No entanto, como
a TC envolve radiação ionizante, esta não é tao usada como a RMN ou a EGSM.
A biópsia das glândulas salivares minor tem um papel fundamental no diagnóstico dos
doentes com suspeita clínica de SS. As indicações para a biópsia são as seguintes: confirmação
de uma suspeita de SS e exclusão de outras condições que possam causar xerostomia e
aumento bilateral das glândulas salivares. A classificação histológica mais aceite regista o
número de focos de tecido linfoide (definido como agregado de 50 ou mais linfócitos) por 4
mm2, pelo que um focus score (FS)≥1 é considerado indicativo de SS. As células T CD4+
predominam em lesões ligeiras e as células B predominam em lesões de estadios mais
avançado. Os centros germinativos podem ainda estar presentes em 20% dos pacientes, sendo
a sua presença um fator preditivo adverso para linfoma(3, 5, 9).
Foram elaborados recentemente critérios de classificação de SS para uniformizar as
populações nos estudos epidemiológicos e clínicos: os critérios de classificação ACR-SICCA.
Estes critérios não diferenciam a forma primária da forma secundária e não incluem os
sintomas relacionados com as glândulas exócrinas(5, 6). A seguinte tabela resume os critérios
ACR-SICCA:
Tabela IV. Critérios de Classificação ACR-SICCA da Síndrome de Sjӧgren
A classificação de SS, que se aplica a indivíduos com sinais/sintomas que possam sugerir SS, pode ser realizada em pacientes que têm pelo menos 2 das 3 seguintes manifestações objetivas:
Anti-Ro/SSA e/ou anti-La/SSB presentes no soro ou a presença de FR e títulos de ANA≥ 1:320;
Biópsia das glândulas salivares minor que revele sialadenite focal linfocítica com um FS≥1;
Queratoconjuntivite seca com OSS ≥3 (assumindo que os indivíduos não usam correntemente gotas diárias para glaucoma, e não tiveram cirurgia à córnea ou cirurgia cosmética à pálpebra nos últimos 5 anos).
Um diagnóstico prévio a qualquer uma das seguintes condições deve excluir a participação nos estudos
de Síndrome de Sjӧgren ou ensaios terapêuticos, porque pode ocorrer sobreposição de manifestações clinicas ou interferências com os testes critério:
História de radiação à cabeça ou pescoço;
Vírus da hepatite C (VHC);
Vírus da imunodeficiência humana (VIH);
Sarcoidose;
Amiloidose;
Doença enxerto-vs-hospedeiro;
Doença relacionada com IgG4.
Tabela adaptada de: Shiboski SC, Shiboski CH, Criswell L, Baer A, Challacombe S, Lanfranchi H, et al.
American College of Rheumatology classification criteria for Sjӧgren's syndrome: a data-driven, expert
consensus approach in the Sjogren's International Collaborative Clinical Alliance cohort. Arthritis Care
Res (Hoboken). 2012;64(4):475-87(6)
Os critérios de classificação do AECG (American-European Consensus Group)
elaborados em 2002 são os mais utilizados e os mais amplamente aceites. Estes critérios não
foram desenvolvidos para a prática clínica e nem todos os pacientes com diagnóstico de SS
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preenchem os critérios propostos. Diferencia SSP de SSS. Os diagnósticos de exclusão também
são descritos(5, 16).
Tabela V. Critérios de Classificação AECG da Síndrome de Sjӧgren
Sintomas oculares (resposta positiva a pelo menos uma das seguintes questões):
Tem apresentado diariamente olhos secos, por mais de 3 meses?
Tem uma sensação recorrente de areia nos olhos?
Usa substitutos de lágrima mais de 3 vezes por dia?
Sintomas orais (resposta positiva a pelo menos uma das seguintes questões):
Tem apresentado diariamente sensação de boca seca, por mais de 3 meses?
Tem apresentado aumento das glândulas salivares recorrente ou persistente quando adulto?
Bebe frequentemente líquidos para ajudar a engolir alimentos secos?
Sinais de comprometimento ocular (resultado positivo para um dos seguintes testes):
Teste de Schirmer I ≤5 mm após 5 minutos;
Van Bijsterveld score≥ 4 (depois da coloração lissamina verde).
Histopatologia
Biópsia das glândulas salivares minor positiva quando FS≥1, ou seja, presença de 1 ou mais focos (aglomerados de 50 ou mais linfócitos) por 4mm2 de tecido glandular
Envolvimento da glândula salivar (resultado positivo para um dos seguintes testes diagnósticos):
Sialometria com fluxo salivar total não-estimulado≤1,5ml aos 15 min;
Sialografia da parótida mostrando sialectasias difusas, sem evidência de obstrução dos ductos maiores;
Cintigrafia salivar com atraso na captação, redução na concentração e/ou atraso na secreção do radionuclídeo.
Autoanticorpos (a presença de um ou ambos):
Anti-Ro/SSA e/ou anti-La/SSB.
Classificação
O diagnóstico de SSP requere a presença de 4 dos 6 critérios, incluindo uma amostra de biópsia das glândulas salivares minor positiva ou anti-Ro/SSA ou anti-La/SSB, ou 3 dos 4 critérios objetivos;
O diagnóstico de SSS requere a presença de uma doença do tecido conetivo estabelecida e um sintoma seco mais qualquer um dos 3 dos 4 critérios objetivos;
Exclusão: radioterapia prévia à cabeça e pescoço, linfoma, sarcoidose, doença enxerto-vs-hospedeiro, infeção com o VHC ou VIH ou o uso de medicação anticolinérgica.
Adaptada de: Vitali C, Bombardieri S, Jonsson R, Moutsopoulos HM, Alexander EL, Carsons SE, et al.
Classification criteria for Sjӧgren's syndrome: a revised version of the European criteria proposed by the
American-European Consensus Group. Ann Rheum Dis. 2002;61(6):554-8(16)
Tratamento
Todos os pacientes com SS e xerostomia devem cumprir algumas medidas básicas tais
como a evicção de álcool, tabaco e a ingestão de sumos e água com aditivos. Devem ainda
evitar ambientes com ar condicionado e alguns fármacos como diuréticos, antidepressivos,
anti-histamínicos que podem piorar a secura oral. A vigilância em consultas de estomatologia
é aconselhada, visto que a higiene oral é uma boa medida de prevenção de complicações
dentárias. A estimulação do fluxo salivar consegue-se através do uso de chicletes sem açúcar
e do uso de citrinos. O uso de saliva artificial (preparações de substitutos de saliva) é
aconselhada para alívio sintomático temporário em doentes que não beneficiam de
estimulantes do fluxo salivar e/ou que bebam água abundantemente. Por sua vez, para
aqueles que não têm benefício com estimulantes tópicos e substitutos da saliva e ainda
possuem função residual glandular, é sugerido o uso de agonistas muscarínicos. Atualmente
existem dois agonistas muscarínicos de uso clínico: pilocarpina (10-30 mg/dia via oral) e
cevimelina (30 mg 3x/dia meia hora antes das refeições).
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O tratamento da xerolftalmia deve basear-se na gravidade da doença e na resposta à
terapia. Inicialmente, devem ser usadas lágrimas artificiais ou lubrificantes oculares, sem
conservantes que contenham ou hialuronato de sódio ou hidroxipropilmetilcelulose. Em
pacientes com doença moderada a grave, estão indicadas medidas adicionais tais como a
utilização de ciclosporina tópica (0.05%) durante 6 meses. Geralmente não se usam
glucocorticoides ou outras terapias sistémicas anti-inflamatórias ou imunossupressoras para o
tratamento dos sintomas relacionados com secura oral e/ou ocular(3, 9, 17).
A terapia sistémica deve ser considerada para os pacientes que apresentem
manifestações clínicas sistémicas. As opções terapêuticas encontram-se resumidas na
seguinte tabela:
Tabela VI. Opções terapêuticas para as manifestações clínicas sistémicas da Síndrome de Sjӧgren
Manifestação clínica Terapia
Sintomas não específicos Fadiga
Antidepressivos; Exercício; Repouso. Fenómeno Raynaud
Evitar o frio e o stress; Bloqueadores de canal de cálcio. Artralgia, artrite
Anti-inflamatórios não esteroides; Hidroxicloroquina; Metotrexato; Analgésicos.
Envolvimento periepitelial Disfunção nefrite-tubular intersticial
Potássio oral e carbonato de sódio.
Envolvimento Bronquiolar ou brônquico
Terapia inalatória. Doença intersticial do pulmão
Prednisolona; Azatriopina.
Cirrose Biliar Primária Ácido Ursodesoxicólico.
Hepatite Autoimune Prednisolona; Azatriopina.
Patologia associada a imunocomplexos Neuropatia periférica
Gama globulina intravenosa; Rituximab; Plasmaférese.
Vasculite
Prednisolona; Ciclofosfamida; Rituximab. Plasmaférese Glomerulonefrite Prednisolona; Ciclofosfamida intravenosa.
Doença do sistema nervoso central Pulso de esteroides por via parentérica; Prednisolona; Ciclofosfamida; Azatriopina.
Adaptada de: Mavragani CP, Moutsopoulos HM. Sjӧgren syndrome. CMAJ. 186. Canada2014. p. E579-86 (3)
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Anatomia das Glândulas Salivares Major
Glândulas Parótidas
As glândulas parótidas encontram-se localizadas bilateralmente na fossa
retromandibular, anteriormente à orelha e ao músculo esternocleidomastóideo. Parte do lobo
superficial cobre o ramo da mandíbula e a parte posterior do músculo masséter. O seu
tamanho normal é de cerca de 35 mm na horizontal e 45 mm na vertical, com uma espessura
de cerca de 7 mm na parte anterior e de 22 mm na parte posterior. O tamanho da glândula é
proporcional ao peso corporal, mas em média o peso ronda os 14 g. São as maiores glândulas
salivares do corpo humano.
Normalmente, a glândula parótida é gordurosa, irregular, cuneiforme e unilobular. É
vascularizada pela artéria facial transversa, ramo da artéria temporal superficial. A artéria
facial transversa pode ser visualizada perto do côndilo temporomandibular.
Carateriza-se por uma parte superficial ao plano principal do nervo facial e uma parte
localizada profundamente a este plano(15, 18, 19).
Glândulas Submandibulares
As glândulas submandibulares encontram-se caudal e anteriormente à glândula
parótida. Tem a forma de U e dimensões médias de 30x35x15mm. São rodeadas pelas
seguintes estruturas: músculo milohióideo, mandíbula, ventre anterior do músculo digástrico
e vasos faciais, que normalmente se encontram posteriormente ou dentro da glândula. As
glândulas submandibulares possuem menos tecido adiposo que as glândulas parótidas.
A vascularização é providenciada pelo ramo submentoniano da artéria facial. A artéria
facial está localizada posteriormente à glândula submandibular ou mesmo dentro desta(15, 18,
19).
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Ecografia das glândulas salivares major na avaliação e seguimento dos doentes com Síndrome de Sjögren Primária
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A Ecografia
Noções básicas
A ecografia tem sido cada vez mais usada na prática diária dos reumatologistas. Esta
técnica permite obter imagens de alta resolução, em tempo real e de forma dinâmica, de
estruturas articulares e periarticulares. Tem a vantagem de ser isenta de radiação, barata,
portável, bem aceite pelos pacientes e repetível (20). Ao mesmo tempo, a ecografia é um
procedimento imagiológico com grande capacidade de contribuir para o diagnóstico das
doenças relacionadas com as glândulas salivares. A localização anatómica relativamente
superficial, a clara distinção dos tecidos circundantes e a ecogenicidade típica das glândulas
salivares, permitem que o reumatologista tenha uma rápida visão da anatomia normal e
patológica das glândulas salivares(18).
A ecografia é um método de diagnóstico imagiológico que se baseia no fenómeno de
interação dos ultrassons (US) com os tecidos. Os US são gerados por dispositivos denominados
transdutores (ou sondas) constituídos por cristais piezoelétricos, que são sólidos com retículo
cristalino, que transformam um pulso elétrico em mecânico e vice-versa. A corrente elétrica
passa através do cristal e isto ativa-o; a vibração do cristal cria ondas sonoras que penetram
nos tecidos. Estas ondas sonoras movem-se a uma frequência extremamente elevada. É a
espessura dos cristais piezoelétricos que determina a frequência emitida(21-23). Os materiais
mais utilizados nos transdutores dos equipamentos de ecografia são as cerâmicas de titanato-
zirconato de chumbo. O formato da sonda varia de acordo com a utilização prevista (linear,
convexa, intracavitária). Sondas de alta frequência são utilizadas para o estudo das partes
moles e regiões superficiais e as de baixa frequência para estudos de órgãos mais profundos.
A frequência da onda sonora determina a resolução espacial do método: quanto maior a
frequência, maior será a resolução espacial, ou seja, pequenos detalhes podem ser
visualizados. Por sua vez, altas frequências implicam menor poder de penetração, o que quer
dizer que só se podem visualizar estruturas superficiais. Estas noções são importantes para a
seleção da frequência sonda. As frequências médicas são medidas em milhões de Hertz
(MHz)(21, 23, 24).
Como os tecidos têm uma constituição molecular variada, a velocidade de propagação
dos US também vai ser variável com o meio. Cada meio tem a sua própria impedância
acústica (Z) que é o produto da velocidade do som pela densidade do meio. Meios que
possuam diferentes densidades têm impedâncias acústicas diferentes(24). Assim, após a
emissão dos US pelo transdutor, diferentes respostas são geradas em tecidos diferentes. Cada
tecido origina um eco específico. Estes ecos retornam ao transdutor e o cristal piezoelétrico
converte esta energia mecânica em energia elétrica, que depois é traduzida no monitor do
ecógrafo em “pontos”, numa escala de cinzentos. A cor e o brilho desse “ponto” é
proporcional à intensidade dos ecos recebidos e a sua localização depende do tempo
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Ecografia das glândulas salivares major na avaliação e seguimento dos doentes com Síndrome de Sjögren Primária
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decorrido da sua emissão até à receção. O transdutor revela-se emissor e recetor ao mesmo
tempo. A imagem ecográfica obtida depende então da capacidade de reflexão dos US pelos
tecidos com impedâncias acústicas diferentes. Interfaces com impedâncias acústicas elevadas
produzem ecos de amplitude elevada, sendo denominadas ecogénicas ou hiperecogénicas, em
relação a um referencial de comparação. Por outro lado, as que possuem valores
intermediários de amplitude de eco são hipoecogénicas e aquelas com refletividade pouco
significativa são anecogénicas. Não foram confirmados quaisquer efeitos biológicos dos US nos
doentes ou operadores.
A análise da imagem ecográfica obtida baseia-se nas informações relacionadas com a
deteção, caracterização e interpretação dos sinais ecográficos obtidos no momento do
exame. Primeiro, detetamos uma imagem ecográfica que difere da normalidade.
Posteriormente, descrevemo-la utilizando a seguinte nomenclatura: topografia, morfologia,
dimensões, ecogenicidade (isoecogénica, hiperecogénica, hipoecogénica, anecogénica) e
ecoestrutura (homogénea, perda ligeira da homogeneidade ou heterogénea)(21-24).
Técnica ecográfica de exploração das glândulas salivares major
Os ecógrafos usados para o estudo das glândulas salivares utilizam transdutores
lineares de alta frequência (10 a 18 MHz). Os pacientes devem estar em posição supina ou
deitados com o pescoço em hiperextensão e a cabeça virada para o lado contrário ao que está
a ser examinado. As glândulas parótidas são analisadas nos planos axial e coronal, com o
ecógrafo em modo B. Por sua vez, as glândulas submandibulares são examinadas
essencialmente nos planos coronários. As glândulas salivares devem ser avaliadas
bilateralmente (4, 15, 25-30).
Anatomia ecográfica das glândulas salivares major
Glândulas parótidas
As glândulas parótidas são habitualmente homogéneas e com ecogenicidade
comparável à da tiroide, mas superior à do músculo adjacente. Normalmente, os lobos
profundos das glândulas parótidas dificilmente são visualizados(7, 15, 18, 19).
O ducto principal (ducto Stenton) e os ductos intraglandulares habitualmente não são
visualizados na ecografia, mesmo com os transdutores de alta frequência. No entanto, podem
ser por vezes visualizados como estruturas lineares altamente refletivas.
Na maioria dos casos, a veia retromandibular pode ser visualizada ecograficamente,
encontrando-se profundamente ao nervo facial, junto com a artéria carótida externa. Em
relação ao nervo facial, este não é rotineiramente visualizado com a ecografia, embora a sua
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Ecografia das glândulas salivares major na avaliação e seguimento dos doentes com Síndrome de Sjögren Primária
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posição possa ser inferida visto que este se encontra lateralmente aos principais vasos
intraglandulares, que podem ser visualizados(13, 19).
Por vezes, podem ser encontrados alguns gânglios linfáticos no parênquima das
glândulas parótidas, com localização pré-auricular ou na parte caudal da glândula. Quando
são benignos aparecem elípticos e hipoecogénicos com uma zona central hiperecogénica. É
possível visualizar com a ecografia Doppler (ED) Cor os vasos centrais dos gânglios linfáticos
nas glândulas parótidas normais(13, 15).
Glândulas Submandibulares
As glândulas submandibulares têm um padrão homogéneo, com ecogenicidade
superior à das glândulas parótidas. A sua forma normal é triangular, encapsulada, com uma
base posterior. Encontram-se inferiormente à mandíbula.
O ducto principal (ducto de Wharton) é melhor visualizado quando se encontra
patologicamente dilatado, embora possa ser visto em sujeitos normais como uma estrutura
tubular de parede fina. A sua diferenciação dos vasos da língua pode ser feita usando Doppler
Cor. Os ductos intraglandulares raramente são visualizados, mas quando observados
assemelham-se a estruturas lineares hiperecogénicas.
A tortuosa artéria facial pode ser visualizada a atravessar o parênquima e o nervo
facial pode ser observado posteriormente e fora da glândula(15, 19, 29).
Ecografia das glândulas salivares major em contexto de
Síndrome de Sjögren Primária
A ecografia é uma técnica imagiológica não invasiva e barata, que deteta várias
anormalidades nas glândulas salivares major e não causa transtorno aos doentes. Em modo B,
os seguintes parâmetros podem ser avaliados: ecogenicidade (avaliada em comparação com a
da glândula tiroide ou, no caso de patologia tiroidea concomitante, com as estruturas
anatómicas à volta, músculo e gordura subcutânea), homogeneidade (homogénea, perda
ligeira da homogeneidade e heterogénea), tamanho/volume (menos estudado; as
metodologias variam nos diferentes estudos) e definição dos bordos glandulares (de bem
definidos a bordos não visíveis).
Numerosos estudos usando a EGSM na avaliação dos doentes com SSP foram
publicados e vários conjuntos de critérios de classificação foram sugeridos e usados para
diagnóstico de SSP(7, 15, 25). A maioria dos investigadores reportou a perda da homogeneidade
do parênquima das glândulas salivares como o sinal ecográfico mais indicativo de estarmos
perante um doente com SSP. Wakefield et al.(15) afirmam ainda que apenas uma perda
elevada de homogeneidade pode ser considerada como tendo verdadeiro valor diagnóstico da
doença, pois reduções ligeira da homogeneidade também pode estar presente noutras
patologias com xerostomia subjetiva(13, 15, 19, 25, 31). O conhecimento da evolução das alterações
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Ecografia das glândulas salivares major na avaliação e seguimento dos doentes com Síndrome de Sjögren Primária
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patológicas que ocorrem nas glândulas salivares em doentes com SS revela-se fundamental
para a correta interpretação das imagens ecográficas obtidas, apesar de que uma correlação
direta entre estas alterações e o que se observa ainda não ter sido demonstrada
claramente(7). No estadio inicial da SSP as glândulas salivares podem apresentar aspeto
normal. À medida que a doença progride, estas aumentam de tamanho e ficam mais
heterogéneas, devido à inflamação, alargamento dos gânglios linfáticos e hiperplasia
mioepitelial(13, 15, 32, 33). Na doença de longa duração, as glândulas salivares tornam-se mais
pequenas, hipoecogénicas e pobremente definidas (devido à atrofia e fibrose das glândulas
nos estadios finais traduzida por mais heterogeneidade)(13, 15, 19, 25).
A capacidade da ecografia detetar anormalidades nas glândulas salivares foi avaliada
em vários estudos. A acurácia diagnóstica da EGSM varia nos diferentes estudos, devido ao uso
diferentes critérios de classificação, ao número limitado de pacientes e ao uso diferentes
equipamentos ecográficos. Além disso, há ainda outra variável a não esquecer para estas
acurácias díspares: a subjetividade na avaliação das alterações ecográficas. Verificou-se que
a sensibilidade é baixa quando comparada com outras técnicas imagiológicas, apesar de a
especificidade ser muito boa(15, 31).
Tabela VII. Valor diagnóstico das técnicas imagiológicas para as glândulas salivares major
Método Imagiológico Sensibilidade Especificidade Estudos
Cintigrafia 73-80 Bastante Pobre Markusse et al., 1993(34)
Håkansson et al., 1994(35) Saito et al., 1997(36)
Sialografia 72 72
92 85
Vitali et al., 1996(37) Salaffi et al., 2008(38)
Biópsia das glândulas salivares minor
87 63
90 83
Vitali et al., 1996(37) Salaffi et al., 2000(33)
Ressonância Magnética Nuclear
71-100 93
Späth et al., 1991(39)
Valesini et al., 1994(40)
Vogl et al., 1996(41)
Makula et al., 2000(42)
Niemelä et al, 2004(43)
Ecografia
58,8 75.3 84.4 63.1 87.1 62.8 52
98,7 83.5 73
98.7 90.8 95 98
Hočevar et al., 2005(31) Salaffi et al., 2008(38) Poul et al., 2008(44)
Wernicke et al., 2008(25)
Milic et al., 2009(45)
Cornec et al., 2013(26)
Elke Theander et al., 2014(4)
Hočevar et al. (31) realizaram um estudo cujo objetivo era pesquisar achados
ecográficos típicos de SSP nas glândulas parótidas e submandibulares. Elaboraram um sistema
de pontuação semiquantitativo e determinaram o seu valor diagnóstico para SSP. Foram
realizadas EGSM em 218 pacientes consecutivos com suspeita de SS e o diagnóstico de SS foi
estabelecido segundo os critérios AECG. Cinco parâmetros foram avaliados: ecogenicidade,
homogeneidade (homogénea, perda ligeira e heterogénea), número de áreas hipoecogénicas,
bandas hiperecogénicas e definição dos bordos das glândulas salivares. Os graus dos cinco
parâmetros foram somados para as quatro glândulas salivares, sendo que uma pontuação igual
ou superior a 17 possuía uma sensibilidade diagnóstica de aproximadamente 58.8% e
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Ecografia das glândulas salivares major na avaliação e seguimento dos doentes com Síndrome de Sjögren Primária
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especificidade 98.7%. Concluíram então que a EGSM não era apropriada como teste de
rastreio, visto que os resultados negativos não excluíam SS. Apesar disso, as alterações
ecográficas visualizadas, nas quais se baseou o sistema de pontuação, eram tipicamente
encontradas dos doentes com SS e a sua presença representava invariavelmente o
envolvimento das glândulas salivares major pela doença.
Num estudo mais recente, Hočevar et al.(30) estudaram a reprodutibilidade do
sistema de pontuação semiquantitativo baseado nos parâmetros acima citados. A
concordância interobservador foi elevada em relação à homogeneidade (0,90), à
ecogenicidade (0,88), à presença de áreas hipoecogénicas (0,88) e à pontuação final
calculada (0,90). No entanto, a confiabilidade interobservador na quantificação da definição
dos bordos das glândulas salivares e na presença de zonas hiperecogénicas intraglandulares
não foi satisfatória. Apesar disso, a utilização da EGSM e o cálculo com base no sistema de
pontuação criado demonstraram uma boa reprodutibilidade.
Tabela VIII. Sistema de pontuação elaborado por Hočevar et al.
Ecogenicidade do parênquima (avaliada em comparação com a da glândula tiroide ou, no caso de patologia tiroidea concomitante, com as estruturas anatómicas à volta, músculo e gordura subcutânea)
Grau 0: igual à da tiroide Grau 1: diminuída em relação à tiroide
Homogeneidade
Grau 0: Homogénea Grau 1: Perda ligeira da homogeneidade Grau 2: Evidência de heterogeneidade Grau 3: Heterogeneidade marcada
Presença de áreas hipoecogénicas
Grau 0: Ausência Grau 1: Poucas e dispersas Grau 2: Várias Grau 3: Numerosas
Bandas hiperecogénicas
Grau 0: Ausência Grau 1: Poucas e dispersas Grau 2: Várias Grau 3: Numerosas
Delineação das glândulas salivares dos tecidos circundantes (visibilidade dos bordos das glândulas salivares)
Grau 0: Evidência de bordos regulares e bem definidos Grau 1: Bordos parcialmente bem definidos Grau 2: Bordos mal definidos Grau 3: Bordos não visíveis
Adaptada de: Hočevar A, Rainer S, Rozman B, Zor P, Tomsic M. Ultrasonographic changes of major
salivary glands in primary Sjӧgren's syndrome. Evaluation of a novel scoring system. Eur J Radiol.
2007;63(3):379-83(30) e Hočevar A, Ambrozic A, Rozman B, Kveder T, Tomsic M. Ultrasonographic
changes of major salivary glands in primary Sjӧgren's syndrome. Diagnostic value of a novel scoring
system. Rheumatology (Oxford). 2005;44(6):768-72(31)
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Elke Theander et al.(4) estudaram a utilidade e o valor prognóstico de um sistema de
pontuação simplificado. Este sistema baseava-se apenas no estudo ecográfico da
homogeneidade das glândulas parótidas e submandibulares nos doentes com SSP. Este sistema
baseou-se no proposto por Hočevar et al.(30, 31)
Tabela IX. Sistema de pontuação elaborado por Elke Theander et al.
Grau
0 Parênquima homogéneo Normal
1 Perda ligeira da homogeneidade Mudanças ligeiras inespecíficas
2 Várias lesões hipoecogénicas arredondadas
Anormal e típico SS
3 Várias lesões hipoecogénicas arredondadas e confluentes
Anormal e típico SS
Adaptada de: Theander E. et al; Primary Sjӧgren's syndrome: diagnostic and prognostic value of salivary gland ultrasonography using a simplified scoring system; Arthritis Care Res (Hoboken); 2014; 66(7):1102-7 (4)
A idade e a duração da doença não influenciaram os resultados. A especificidade e o
valor preditivo positivo para as alterações observadas na ecografia nos doentes com SSP foram
ambas de 98%, ao passo que a sensibilidade e o valor preditivo negativo foram 52% e 53%
respetivamente. Concluíram, então, que apesar deste sistema de pontuação ser altamente
específico para SSP, este não parece ser útil na identificação da doença nos seus estadios
iniciais. Segundo os autores, a sua baixa sensibilidade devia-se ao fato de os achados
ecográficos anormais serem ligeiramente menos prevalentes entre pacientes com doença de
início recente ou naqueles examinados à altura do diagnóstico. Afirmam que para que seja
possível utilizar a EGSM para a deteção precoce de SSP ainda são necessários mais ensaios
clínicos.
Estes autores também concluíram que pacientes com alterações patológicas na EGSM
possuíam significativamente mais sinais e sintomas de doença sistémica, maior atividade da
doença e desenvolvimento mais frequente de preditores adversos de linfoma, como aumento
das glândulas salivares, vasculite cutânea, centros germinativos nos achados da biópsia das
glândulas salivares minor e linfopenia de células TCD4+. Assim chegaram à conclusão que este
sistema de pontuação pode ser utilizado na identificação de pacientes com doença grave e
em risco de desenvolver linfoma.
É ainda colocada a hipótese da integração de um sistema semiquantitativo com base
na homogeneidade glandular como item adicional num possível novo conjunto de critérios de
classificação, devido à sua alta especificidade e valor preditivo positivo para SSP. Este
sistema de pontuação semiquantitativo é fácil de aprender e rápido de executar. Pode ser
usado em consultas de ambulatório, podendo ser apropriado para análises longitudinais.
No passado, não existiam dados sobre a utilidade do tamanho/volume das glândulas
salivares major como parâmetro ecográfico a ser inferido para o diagnóstico de SSP(15). Num
estudo de Wernicke et al.(25), os autores analisaram o tamanho e a ecogenicidade do
parênquima das glândulas salivares major por ecografia na avaliação de doentes com SSP e
SSS. A ecogenicidade foi avaliada comparativamente à da tiroide e dos tecidos moles
circundantes.
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Tabela X. Sistema de pontuação elaborado por Wernicke et al.
Grau Achados ecográficos
0 Parênquima homogéneo normal
I Perda ligeira da homogeneidade do parênquima observada com lesões hipoecogénicas difusas 2mm
Adaptada de: Wernicke D, Hess H, Gromnica-Ihle E, Krause A, Schmidt WA. Ultrasonography of salivary
glands - a highly specific imaging procedure for diagnosis of Sjӧgren's syndrome. J Rheumatol.
2008;35(2):285-93(25)
O diagnóstico da SSP e da SSS era estabelecido quando pelo menos duas glândulas
salivares major mostravam evidência de grau II, com uma sensibilidade de 63,1% e 63,6%,
respetivamente. A especificidade da ecografia foi de 98,7%. Assim propõem a EGSM como
exame de primeira linha na avaliação destes doentes e a sua possível inclusão nos critérios de
classificação AECG. Neste trabalho, a média de duração da doença nos pacientes com SSP que
demonstravam grau II era de 7.8 anos, enquanto que a duração da doença nos pacientes com
grau 0 era de 4.2 anos. Tais dados sugerem que as alterações na homogeneidade do
parênquima das glândulas aparecem vários anos após o início da doença.
Os volumes das glândulas salivares foram calculados com a seguinte fórmula:
Volume (ml) = diâmetro longitudinal (mm) x diâmetro transverso (mm) x diâmetro sagital (mm)
x 0,5
A deteção de volumes diminuídos e iguais a 3.0 ml em ambas as glândulas
submandibulares nos pacientes com SS estava associada a uma especificidade de 93% e a uma
sensibilidade de 48%, com um valor preditivo positivo de 77% e valor preditivo negativo de
80%. O volume das glândulas parótidas não era muito diferente entre os grupos de pacientes
versus controlos(15, 25).
Cornec et al.(26) determinaram a acurácia da EGSM no diagnóstico da SSP. A
ecoestrutura de cada uma das 4 glândulas salivares major foi graduada de 0 a 4 de acordo
com as alterações observadas nas imagens ecográficas. Se o grau mais elevado, encontrado
entre as 4 glândulas, fosse superior ou igual a 2, possuía uma sensibilidade de 62.8% e uma
especificidade de 95.0% para o diagnóstico de SSP.
Tabela XI. Sistema de pontuação elaborado por Cornec et al.
Grau Achados ecográficos
0 Parênquima homogéneo normal
1 Pequenas áreas hipoecogénicas sem bandas ecogénicas
2 Múltiplas áreas hipoecogénicas 6mm ou múltiplas calcificações com bandas ecogénicas
Adaptada de: Cornec D. et al.; “Contribution of salivary gland ultrasonography to the diagnosis of
Sjӧgren’s syndrome: toward new diagnostic criteria?”; Arthritis Rheum; 2013; 65(1):216-25(26)
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Num estudo mais recente, Cornec et al. (28) avaliaram se a introdução do sistema de
pontuação semiquantitativo anterior nos critérios de classificação ACR-SICCA aumentava a sua
performance diagnóstica. De fato, a sua adição aumentava a sensibilidade dos critérios de
classificação ACR-SICCA para diagnóstico de SS de 64.4% para 84.4% e apenas diminuía
ligeiramente a especificidade, de 91.1% para 89.3%.
Já Takagi et al.(27) chegaram à conclusão que a EGSM podia substituir qualquer um dos
três itens dos critérios de classificação ACR-SICCA sem a sensibilidade, a especificidade e a
acurácia destes critérios variar significativamente.
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A Ecografia Doppler
Noções Básicas
Quando um feixe de US, emitidos por uma fonte, atravessa os tecidos biológicos
encontra um certo número de interfaces fixas. Se encontrar alvos móveis, como os glóbulos
vermelhos, produz-se uma frequência refletida que é diferente da frequência emitida. A
diferença de frequência é positiva sempre que o alvo se aproxima da fonte e negativa quando
se afasta, denominando-se frequência Doppler.
As aplicações clinicas da ED são múltiplas, podendo esta técnica ser usada para o
estudo de todas as estruturas vasculares(24).
Ecografia Doppler Cor
A ED cor permite analisar o sinal doppler em todo um plano e simultaneamente em
todos os pontos desse plano. A resolução desta imagem depende, entre outros fatores, do
volume a ser estudado. Pode ser analisada não só através da análise do espectro, mas através
do nível de saturação da cor. As frequências mais altas tendem a saturar em direção ao
branco(24).
A ED cor permite estudar a complexa anatomia vascular das quatro glândulas salivares
major, ao analisar os vasos em toda a sua extensão e, ao mesmo tempo, demonstrar a sua
origem, o seu tipo (venoso vs arterial) e suas ramificações colaterais(46). A vascularização
pode ser avaliada através do índice de resistência (RI) e do índice de pulsatilidade (PI), os
quais avaliam a resistência ao fluxo sanguíneo(15).
Vascularização das glândulas Salivares Major
Na maioria dos indivíduos, a distribuição vascular dentro das glândulas salivares major
tem um padrão constante, embora variantes do normal em relação ao tamanho, curso e
ramificação dos vasos possam ocorrer. Uma pesquisa precisa tendo como ponto de partida a
origem dos vasos, e uma exploração completa do seu curso até o seu ramo terminal, pode
ajudar a eliminar as dúvidas na identificação dos vasos (2-6).
Glândulas Parótidas
A artéria que irriga as glândulas parótidas é a artéria facial transversa que tem origem
na artéria temporal superficial, ramo da artéria carótida externa. Possui numerosas
ramificações que irrigam a respetiva glândula salivar, o músculo masséter e a pele da face.
A drenagem venosa das glândulas parótidas e dos músculos masséteres é feita pela
veia retromandibular. A veia retromandibular é formada pela união da veia temporal
superficial com a veia maxilar. Esta corre posteriormente ao ramo da mandíbula,
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superficialmente à artéria carótida externa e profundamente ao nervo facial dentro do
parênquima glandular. A veia retromandibular à medida que emerge do lobo profundo das
glândula parótidas, divide-se num ramo anterior, que se une à veia facial, e num ramo
posterior que se junta à veia auricular posterior para formar a veia jugular externa(47).
Glândulas Submandibulares
O suprimento arterial das glândulas submandibulares é providenciado pelas artérias
submentonianas, que são ramificações da artéria facial.
As veias submentonianas acompanham as artérias e convergem para a veia facial. Por
sua vez, esta termina direta ou indiretamente na veia jugular interna(47).
Ecografia Doppler em contexto de Síndrome de Sjögren Primária
A ED Cor usa-se para estudar as mudanças fisiológicas da vascularização das glândulas
salivares major(46, 48).
Martinoli et al.(46) avaliaram a anatomia vascular das glândulas salivares e analisaram
as mudanças fisiológicas, que ocorriam durante a estimulação salivar em indivíduos saudáveis
e as alterações de fluxo, que ocorriam nas glândulas salivares de pacientes afetados por
doenças inflamatórias crónicas e/ou por uma variedade de nódulos benignos e malignos. Estes
autores descreveram modificações da vascularização na artéria carótida externa e na artéria
facial, antes e durante a estimulação com o limão, nas glândulas salivares saudáveis e
doentes. Nos indivíduos saudáveis, identificaram um aumento marcado do sinal Doppler
dentro do parênquima e o desenvolvimento de um artefacto “em forma de serra” durante a
secreção salivar provocada pela estimulação com o limão. Isto acontecia devido ao aumento
das velocidades do fluxo durante a administração do limão. Ao mesmo tempo, as velocidades
arteriais e as velocidades do pico sistólico (PSV) aumentaram, a impedância arterial diminuiu
e os valores de RI também diminuíram. Normalmente, estas alterações nos valores de RI e PSV
são transitórias em indivíduos saudáveis e tendem a normalizar 20 segundos depois do sumo
de limão ser engolido. Ocorrem devido à hiperemia associada à secreção salivar. Antes da
estimulação com o limão dos pacientes com SSP, verificou-se um aumento do PSV, uma
diminuição da impedância arterial e uma diminuição do RI à análise da forma da onda Doppler
para a artéria facial. Após a estimulação com o limão, a forma da onda Doppler era igual, mas
os valores de RI diminuíam ainda mais.
Neste trabalho, os pacientes com SSP foram ainda divididos em 2 grupos de acordo
com a ausência ou presença de anormalidades parenquimatosas. O padrão hipervascular
difuso pareceu estar diretamente relacionado com as alterações parenquimatosas e era
máximo nas glândulas salivares que apresentavam uma maior heterogeneidade e estruturas
semelhantes a quistos. Como este padrão hipervascular difuso foi descrito noutras doenças
autoimunes, devemos considerar esta característica inespecífica desta afeção. Por outro lado,
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Ecografia das glândulas salivares major na avaliação e seguimento dos doentes com Síndrome de Sjögren Primária
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no grupo dos doentes com SSP em que não se verificavam anormalidades parenquimatosas,
não havia diferença na impedância arterial em relação aos indivíduos saudáveis(15, 46).
Carotti et al.(48) usaram o mesmo procedimento ecográfico e a estimulação da
secreção glandular com o limão tal como Martinoli et al.(46). Estes autores não encontraram
diferença em termos de RI entre os indivíduos com SSP e os indivíduos saudáveis. Apenas o
valor de PI era influenciado pelo grau de inflamação crónica, sugerindo que apenas este
parâmetro poderia refletir as alterações vasculares das glândulas salivares(15, 48).
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Ecografia das glândulas salivares major na avaliação e seguimento dos doentes com Síndrome de Sjögren Primária
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Utilidade da ecografia no seguimento dos
doentes com Síndrome de Sjӧgren
Primária
O diagnóstico da SSP baseia-se nos dados da história clínica, do exame físico, dos
testes laboratoriais, da biópsia das glândulas salivares minor, da sialografia e da cintigrafia
das glândulas salivares. A monitorização clínica (devido ao risco de desenvolvimento de
linfoma) e a monitorização da resposta aos tratamentos são essenciais nos doentes com SSP.
No entanto, é difícil estudar e seguir estes doentes com métodos diagnósticos tão invasivos
como a biópsia das glândulas salivares minor ou sialografia. A EGSM e ED Cor são ferramentas
diagnósticas alternativas não invasivas, isentas de radiação e baratas que podem ser repetidas
várias vezes sem causar transtorno aos doentes. (15)
Jousse-Joulin et al. (49) avaliaram o uso da ecografia nos pacientes com SSP tratados
com Rituximab. Constataram que não ocorriam alterações na homogeneidade ou na
ecogenicidade das glândulas salivares nos indivíduos com SSP tratados em comparação com as
imagens ecográficas obtidas antes do tratamento. Por sua vez, o tamanho das glândulas
parótidas e submandibulares diminuía significativamente após o uso do Rituximab. A análise
da forma da onda Doppler da artéria facial transversa era significativamente anormal nos
indivíduos com SSP não tratados, acabando por regressar à normalidade após a instituição da
terapia. Os valores de RI após a estimulação com o limão da secreção salivar dos pacientes
com SSP tratados com Rituximab não era muito diferente dos valores de RI dos indivíduos
saudáveis.
Estes autores concluíram então que a EGSM e a ED Cor são promissoras na
monitorização clínica e terapêutica dos doentes com SSP. Possíveis parâmetros a utilizar na
avaliação destes doentes seriam a análise do tamanho das glândulas salivares major e o
estudo da vascularização (15, 49).
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Ecografia das glândulas salivares major na avaliação e seguimento dos doentes com Síndrome de Sjögren Primária
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Conclusão
Na prática clínica diária, o diagnóstico de SSP é difícil, dado que os sinais clínicos são
frustes e dado que não existe nenhum teste específico disponível. A ecografia tem-se
destacado na avaliação objetiva dos indivíduos com queixas secas orais e/ou oculares. Esta é
uma técnica simples, não invasiva, disponível, isenta de radiações e mais barata que outros
meios imagiológicos também disponíveis.
Vários estudos em relação à utilidade da EGSM na avaliação dos doentes com SSP
foram realizados e vários parâmetros ecográficos descritos. Sistemas de pontuação
semiquantitativos baseados nos achados ecográficos foram criados, sendo que as alterações
na homogeneidade do parênquima glandular parecem ser o achado ecográfico mais relevante
nos doentes com SSP, devido à sua elevada especificidade e valor preditivo positivo. Apesar
de os sistemas de pontuação semiquantitativos analisados serem altamente específicos para
SSP, estes possuíam baixa sensibilidade. Assim a EGSM não parece ser tão útil na identificação
da doença nos seus estadios iniciais, visto que os resultados negativos não excluem SSP.
Outros itens ainda avaliados nos sistemas de pontuação são o tamanho das glândulas salivares,
a presença de bandas hiperecogénicas, a definição dos bordos das glândulas, a presença de
calcificações intraglandulares e a inflamação do parênquima ou as anormalidades vasculares
avaliadas por ED Cor. A real utilidade diagnóstica destes parâmetros necessita de estudos
mais aprofundados(50). O uso da ED Cor permite avaliar o grau de inflamação das glândulas
através do estudo da vascularização.
Quer a EGSM, quer a ED Cor podem ser ainda possíveis ferramentas para a
monitorização clínica e terapêutica dos doentes com SSP. Os parâmetros a considerar no
estudo e seguimento destes doentes são: a análise do tamanho das glândulas salivares major
na EGSM e o estudo da vascularização através da ED Cor.
Alguns autores sugerem que a adição da EGSM como item independente dos critérios
de classificação AECG e/ou ACR-SICCA aumenta a performance do diagnóstica para SSP.
Afirmam que a EGSM deve ser incluída no futuro num novo conjuntos de critérios de
classificação.
Várias questões ainda permanecem em aberto, nomeadamente as que são referidas
por Tzioufas et al.(7). A primeira questão que este autor coloca é qual a capacidade de estas
técnicas discriminarem entre SS e outras doenças inflamatórias que afetam as glândulas
salivares, nomeadamente a sarcoidose, VHC, infeção por VIH ou apenas síndrome seco
idiopático. Qu