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1 Jorge Solano http://jorgesolano.sites.uol.com.br/ ECLESIOLOGIA APRESENTAÇÃO Esta apostila foi preparada como material de apoio ao curso de Eclesiologia para agentes de pastoral das comunidades católicas de Itapoã, Vila Velha, ES. Consiste, pois, num roteiro sobre os temas tratados, com algumas citações e referências mais detalhadas. Sua compreensão completa depende dos debates e esclarecimentos que acontecem nas aulas. A base central dessa apostila é a Constituição Dogmática sobre a Igreja, do Vaticano II, Lumen Gentium, da qual transcrevemos muitos parágrafos, para facilitar seu uso durante os encontros e possibilitar o acesso de alunos que não tenham condições de adquirir o documento. Chamo a atenção, contudo, para o fato de que copiamos os trechos do site: http://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vat- ii_const_19641121_lumen-gentium_po.html . Como a tradução é feita em português de Portugal, serão observadas algumas diferenças de escrita em relação ao uso ortográfico brasileiro. Grande parte da estrutura desta apostila baseia-se no livro A Igreja, de Hans Küng, que continua sendo um dos mais completos, profundos e instigantes sobre o assunto. Além desse, apoiei-me sobre as obras de Bruno Forte – A Igreja - ícone da Trindade – e Salvador Pié-Ninot – Introdução à eclesiologia. Ora resumimos, ora transcrevemos trechos dessas obras. A referência bibliográfica será feita, quando houver citação literal dos livros.

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ECLESIOLOGIA

APRESENTAÇÃO Esta apostila foi preparada como material de apoio ao curso de Eclesiologia para agentes

de pastoral das comunidades católicas de Itapoã, Vila Velha, ES. Consiste, pois, num roteiro sobre os temas tratados, com algumas citações e referências

mais detalhadas. Sua compreensão completa depende dos debates e esclarecimentos que acontecem nas aulas.

A base central dessa apostila é a Constituição Dogmática sobre a Igreja, do Vaticano II, Lumen Gentium, da qual transcrevemos muitos parágrafos, para facilitar seu uso durante os encontros e possibilitar o acesso de alunos que não tenham condições de adquirir o documento. Chamo a atenção, contudo, para o fato de que copiamos os trechos do site:

http://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vat-ii_const_19641121_lumen-gentium_po.html.

Como a tradução é feita em português de Portugal, serão observadas algumas diferenças de escrita em relação ao uso ortográfico brasileiro.

Grande parte da estrutura desta apostila baseia-se no livro A Igreja, de Hans Küng, que continua sendo um dos mais completos, profundos e instigantes sobre o assunto. Além desse, apoiei-me sobre as obras de Bruno Forte – A Igreja - ícone da Trindade – e Salvador Pié-Ninot – Introdução à eclesiologia. Ora resumimos, ora transcrevemos trechos dessas obras. A referência bibliográfica será feita, quando houver citação literal dos livros.

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BIBLIOGRAFIA BOFF, Leonardo. Eclesiogênese: a reinvenção da Igreja. Rio de Janeiro: Record. 2008. CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA, coedição da editoras Loyola, Ave-Maria, Vozes,

Paulinas e Paulus. 9 ed. Reimpressão de dezembro de 2004. FORTE, Bruno. A Igreja - ícone da Trindade.(Col. Vaticano II – Comentários-3) São Paulo:

Edições Loyola. 1987 KÜNG, Hans. A igreja. Lisboa: Moraes Editores. 1970. KÜNG, Hans. O que deve permanecer na Igreja. Petrópolis: E. Vozes. 1976. MOSCONI, Luís. Atos dos apóstolos: como ser Igreja no início do terceiro milênio? 3 ed. São

Paulo: Paulinas. 2001 PIÉ-NINOT, Salvador. Introdução à eclesiologia. São Paulo: Edições Loyola. 1998. RATZINGER, Joseph. O novo povo de Deus. São Paulo: Ed. Paulinas. 1974. VÁRIOS. A missão da Igreja no Brasil. São Paulo: Edições Loyola. 1973. REVISTA CONCILIUM: Editora Vozes.

Nº 117 – 1976/7 : Crer por imposição? Problemática de fé e magistério. Nº 129 – 1977/8 : Os carismas. Nº 134 – 1978/4 : Evangelização no mundo de hoje. Nº 138 – 1978/8 : Um credo ecumênico. Nº 157 – 1980/7 : Participação da Igreja local na escolha dos bispos. Nº 159 – 1980/9 : Obediência e liberdade na Igreja. Nº 167 – 1981/7 : A revisão do Direito Canônico. Nº 168 – 1981/8 : Quem tem a palavra na Igreja? Nº 177 – 1982/7 : O papel político da Igreja.

REB/42 – REVISTA ECLESIÁSTICA BRASILEIRA, Igreja: carisma e poder. Petrópolis: Ed. Vozes. junho de 1986.

DOCUMENTOS DA IGREJA LUMEN GENTIUM – Vaticano II GAUDIUM ET SPES – Vaticano II EVANGELII NUNTIANDI - 1975 REDEMPTORIS MISSIO - 1990

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1 – ECLESIOLOGIA: A TEOLOGIA SOBRE A IGREJA

O QUE É: a ciência sobre a Igreja

ECLESIOLOGIA não é História da Igreja nem sociologia da Igreja; ECLESIOLOGIA é TEOLOGIA, portanto, é uma reflexão que busca entender

racionalmente a Igreja à luz da fé. TEOLOGIA é “a Fé questionando a Inteligência” e a “Inteligência questionando

a Fé”.

A eclesiologia como reflexão teológica sobre a Igreja, levanta para nós a questão: o que significa crer na Igreja?

A fé é um ato de compromisso, de entrega e de confiança plena naquilo em que acreditamos. Ora, tal atitude só é possível perante Deus. Por isso dizemos que cremos no Pai, no Filho e no Espírito Santo.

A Igreja não é objeto de fé da mesma forma que Deus. Nas línguas latina e grega era possível deixar essa diferença mais clara usando o verbo crer com a preposição em, quando se confessava: creio em Deus. Quando se referia à Igreja se dizia apenas creio a Igreja.

No início do século III, o celebrante perguntava ao catecúmeno na hora do Batismo: “Crês no Espírito Santo dentro da santa Igreja para a ressurreição da carne?” Essa fórmula, talvez, indique melhor o que significa crer na Igreja.

Entretanto, a eclesiologia, como esforço para o entendimento da Igreja só pode ser feito com os olhos da fé.

Em síntese, pode-se dizer que NÃO CREMOS NA IGREJA porque ela não é Deus, e porque nós é que

somos a Igreja. CREMOS A IGREJA porque, pela Graça de Deus, a Igreja se constrói através

da fé e porque a fé vem da Graça através da Igreja. “Quem veio primeiro a fé ou a Igreja?” (Hans Küng, p. 53-55).

Enfim, cremos a IGREJA VISÍVEL E INVISÍVEL, pois ela é simultaneamente visível e invisível.

A Igreja real é a Igreja acreditada dentro do visível e, como tal, uma Igreja invisível no visível. Este seu caráter visível é, portanto, muito particular: tem o seu interior e essencial invisível. O importante permanece encoberto dentro do que foi descoberto. O visível da Igreja vive do invisível; é marcado, formado, dominado pelo invisível. A Igreja é, portanto, na sua essência, mais do que aquilo que visivelmente aparece: não apenas um povo ou população, mas um povo eleito; não só um corpo, mas um corpo misterioso; não um edifício qualquer, mas um edifício espiritual (Hans Küng, p. 59).

AO LONGO DA HISTÓRIA

O estudo da Igreja de maneira específica é recente na História da Igreja. Não havia essa

disciplina entre as matérias teológicas. Não se encontra em nenhum dos grandes teólogos da Antigüidade e da Idade Média um estudo especial sobre a Igreja.

Considera-se como inaugurador da Eclesiologia o tratado “De regimine christiano”, de

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Tiago Viterbo (1301-1302). A partir do século XVI, devido às questões levantadas pela Reforma Luterana, surgem

vários trabalhos escritos para defender que a Igreja Católica é a verdadeira Igreja. Em geral, esses estudos se baseiam em três tipos de argumentos:

1) via histórica: a Igreja Católica é a única que surge na história continuamente como sociedade una, visível, hierárquica e seu chefe é o único sucessor de Pedro.

2) via das notas: só a Igreja Católica possui as quatro notas dadas por Cristo: unidade, catolicidade, santidade e apostolicidade.

3) Via empírica: a existência mesma da Igreja é como um milagre, pois, apesar de todos os seus erros sobreviveu na história, o que prova sua sustentação divina (Vaticano I: Cardeal Dechamps).

Entretanto, é depois do Concílio Vaticano I, em 1870, que se fortalece definitivamente a Eclesiologia como uma disciplina específica dentro da Teologia. Esse Concílio foi o que definiu como dogma primado e a infalibilidade do Papa, o que levantou uma série de questões (inclusive rupturas) dentro da Igreja e que, talvez exatamente por isso, forçou os teólogos a repensar a Igreja.

O que se pode constatar é que predominou uma concepção de Igreja centralizada na hierarquia, que se percebe até hoje quando se ouve falar, por exemplo: “A Igreja defende tal posição...”. “Igreja”, nesse sentido, quer dizer a hierarquia – o Papa, os bispos, a CNBB. Essa idéia é muito antiga e a encontramos, em 1601, em Roberto Belarmino:

... é a comunidade dos homens reunidos mediante a profissão da verdadeira fé, a comunhão dos mesmos sacramentos, sob o governo dos legítimos pastores e, principalmente, do único vigário de Cristo sobre a terra, o romano pontífice (...) Para que alguém possa ser declarado membro dessa Igreja verdadeira, da qual falam as Escrituras, não pensamos que dele se peça nenhuma virtude interior. Basta a profissão de fé exterior e da comunhão dos sacramentos, coisa que o próprio senso pode constatar (...) A igreja é uma comunidade (coetus) de homens tão visíveis e palpáveis quanto a comunidade do povo romano, ou o reino de França, ou a república de Veneza.

Outro exemplo é essa famosa frase de Pio X, de 1906:

só na hierarquia residem o direito e a autoridade necessários para promover e dirigir todos os membros para o fim da sociedade. Quanto à multidão, não possui outro direito senão o de deixar-se conduzir e, docilmente, seguir os seus pastores”

Passado quase um século do Vaticano I, aconteceu o Concílio Vaticano II que é chamado

com razão de “o concílio da Igreja”. De fato, esse concílio não apresentou nenhum dogma, mas centrou sua preocupação em redefinir a ação da Igreja no mundo contemporâneo. Dois documentos desse concílio se tornaram referência indispensável para a reflexão sobre a Igreja: Lumen Gentium e Gaudium et Spes.

Lumen Gentium: é chamado de Constituição Dogmática, pois tem a força de doutrina oficial da Igreja sobre si mesma. “A luz dos povos é Cristo” - começa o documento. E a partir dessa constatação, desenvolve a reflexão sobre a Igreja como Povo de Deus, Corpo de Cristo, e sobre a missão dos diversos ministérios na Igreja.

Gaudium et Spes: trata da ação da Igreja no mundo atual, pois a Igreja deve compartilhar de todos os problemas da humanidade. É esse exatamente o sentido da primeira frase:

GUADIUM ET SPES nº 1

As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos aqueles que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as

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angústias dos discípulos de Cristo; e não há realidade alguma verdadeiramente humana que não encontre eco no seu coração.

Concluindo, devemos ter claro que, embora a Eclesiologia seja uma disciplina recente, os

cristãos, os teólogos, os ministros da Igreja sempre pensaram a Igreja e construíram uma imagem dela de acordo com o tempo em que viviam. Assim, durante sua história, a Igreja sempre definiu sua identidade em relação com realidade que a circundava. Por isso, as imagens que a Igreja tem de si mesma podem ser diferentes. No próprio Novo Testamento, encontramos essas diferenças. O evangelho segundo Mateus tem uma visão eclesiológica diferente do evangelho segundo Lucas. O evangelho segundo João difere das epístolas aos Efésios e aos Colossenses. As epístolas aos Romanos, aos Coríntios e aos Gálatas diferem das epístolas pastorais.

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2 – ORIGEM DA IGREJA

A IGREJA É O REINO DE DEUS SOBRE A TERRA? A IGREJA EDIFICA O REINO DE DEUS? A IGREJA EXPANDE O REINO DE DEUS NA TERRA? A IGREJA REALIZA O REINO NA TERRA? Loisy disse: “Jesus anunciava o Reino, mas o que veio foi a Igreja”. Não seria a Igreja uma seita do Judaísmo? Ler At 24, 5-16; At 28,22. A constituição da autonomia dos cristãos está marcada por:

Batismo Oração comunitária Refeição escatológica Existência de uma coordenação da comunidade Comunidade de fraternidade e partilha

Jesus anunciou o Reino de Deus. Escreva as características do Reino anunciado por Jesus:

Ler Mc 9, 1 e 13,30; Mt 10,23: Reino breve > decisão urgente. A comunidade pós-pascal não esquecera o Reino de Deus. Mas tinha dele uma nova compreensão: o Reino de Deus tornou-se decididamente eficaz no poder do Jesus glorificado. No seu poder anuncia-se já a plenitude do Reino de Deus que está para vir (Küng, p 129). Os cristãos anunciam o Reino de Deus e o nome de Jesus: At 8,12 1 – Em sua vida, Jesus não fundou uma Igreja:

seu ministério é público; não aceita afastamento do mundo; é contrário a separatismo; quer salvar todos e não só os “justos”; os Doze são a representação de todo o povo (as doze tribos).

2 – Jesus coloca fundamentos que possibilitam uma Igreja;

Desde o início congrega em torno de si discípulos; Pregou um Reino futuro, mas já atual; Sua pregação dividia as pessoas: discípulos e não-discípulos; Agrupou discípulos à sua volta além dos Doze; Falou de um povo messiânico; Sabia de um tempo entre sua morte e a parusia;

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Ratzinger escreveu (p. 77): “O fato de Cristo procurar os doze teve sempre em vista o objetivo de implantar a Igreja. Os doze, por sua vez, seriam os pais espirituais deste novo povo de Deus. Observou-se que o título Filho do Homem, que Jesus atribuiu a si mesmo, incluía também o momento da fundação da Igreja, pois encontrada em Dan 7, esta expressão era ligada ao povo de Deus”.

3 – Igreja nasce a partir da fé na ressurreição: 1 Cor 15,14-20

a partir da Páscoa o cristãos falam em “igreja”; não existiu um período inicial sem Igreja, de puro entusiasmo; desde o princípio, a Igreja foi entendida como estabelecida por Deus.

4 – Origem da Igreja: o conjunto do acontecimento cristológico. Toda ação de Deus em Jesus desde o nascimento – a vida pública, a pregação, a morte, a ressurreição, a vinda do Espírito Santo – deve ser considerada como a origem da Igreja. QUANTO À RELAÇÃO ENTRE IGREJA E REINO DE DEUS, CONCLUI-SE QUE: A Igreja não é o Reino:

Reza: “venha o vosso Reino”. Oração da Didaquê: Lembra-te, Senhor, da tua Igreja, salvando-a de todo mal e levando-a à perfeição no teu amor. E reúne-a dos quatro ventos, a ela, a santificada, no teu Reino, que Tu lhe preparaste (X, 5).

Igreja não se tornará Reino. Igreja anuncia algo que ainda não se realizou. Igreja é provisória. O Reino é definitivo.

Igreja sinaliza para o Reino:

Dirige-se para o Reino. Pertence ao Reino. Igreja é um sinal do Reino.

LUMEN GENTIUM nº 3 [...]Por isso, Cristo, a fim de cumprir a vontade do Pai, deu começo na terra ao Reino

dos Céus e revelou-nos o seu mistério, realizando, com a própria obediência, a redenção. A Igreja, ou seja, o Reino de Cristo já presente em mistério, cresce visivelmente no mundo pelo poder de Deus [...].

Igreja deve anunciar o Reino, como Jesus.

LUMEN GENTIUM nº 5 O mistério da santa Igreja manifesta-se na sua fundação. O Senhor Jesus deu início à Sua

Igreja pregando a boa nova do advento do Reino de Deus prometido desde há séculos nas Escrituras: «cumpriu-se o tempo, o Reino de Deus está próximo» (Mc. 1,15; cfr. Mt. 4,17). Este Reino manifesta-se na palavra, nas obras e na presença de Cristo. A palavra do Senhor compara-

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se à semente lançada ao campo (Mc. 4,14): aqueles que a ouvem com fé e entram a fazer parte do pequeno rebanho de Cristo (Luc. 12,32), já receberam o Reino; depois, por força própria, a semente germina e cresce até ao tempo da messe (cfr. Mc. 4, 26-29). Também os milagres de Jesus comprovam que já chegou à terra o Reino: «Se lanço fora os demônios com o poder de Deus, é que chegou a vós o Reino de Deus» (Luc. 11,20; cfr. Mt. 12,28). Mas este Reino manifesta-se sobretudo na própria pessoa de Cristo, Filho de Deus e Filho do homem, que veio «para servir e dar a sua vida em redenção por muitos» (Mt. 10,45).

E quando Jesus, tendo sofrido pelos homens a morte da cruz, ressuscitou, apareceu como Senhor e Cristo e sacerdote eterno (cfr. At. 2,36; Hebr. 5,6; 7, 17-21) e derramou sobre os discípulos o Espírito prometido pelo Pai (cfr. Act. 2,33). Pelo que a Igreja, enriquecida com os dons do seu fundador e guardando fielmente os seus preceitos de caridade, de humildade e de abnegação, recebe a missão de anunciar e instaurar o Reino de Cristo e de Deus em todos os povos e constitui o germe e o princípio deste mesmo Reino na terra. Enquanto vai crescendo, suspira pela consumação do Reino e espera e deseja juntar-se ao seu Rei na glória.

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3 – A IGREJA NO NOVO TESTAMENTO O USO DA PALAVRA IGREJA (= ECCLESÍA) NA BÍBLIA IGREJA É REUNIÃO.

O povo da Nova Aliança passa a se chamar IGREJA exatamente porque é um povo que sempre se reúne a convite de Jesus e em torno de Jesus. Ou seja, seu traço distintivo não é habitar uma determinada região geográfica, um país, nem pela sua raça, nem pela sua cor, nem por alguma cultura particular. É apenas isso: pessoas que se reúnem em nome de Jesus. Não é, portanto, uma reunião política no sentido estrito do termo; não é uma reunião de ajuda mútua; não é uma reunião filantrópica ou assistencial; não é uma reunião de estudos; não é uma reunião de festa de aniversário. É uma reunião de fé-compromisso em que estão presentes essas características: partilha fraterna, compromisso transformador, refeição festiva. Por isso, houve um momento na história da Igreja em que essa reunião era chamada de Ágape1, a ceia do amor. (extraído de “Todo cristão têm direito à Ceia dominical”)

Os seguidores de Jesus Ressuscitado chamam-se ECCLESIA DE DEUS. No uso profano, ecclesía significava assembléia dos cidadãos, convocado pelo arauto para se reunirem na praça. Ecclesía é, pois, uma reunião política. No uso comum, a ecclesía é um acontecimento específico, quer dizer, a reunião enquanto está acontecendo. No uso dos escritores do Novo Testamento, ecclesía vai ter outras dimensões. No Antigo Testamento: A palavra hebraica “qahal” é traduzida mais de 100 vezes, pela LXX, pela palavra grega “ecclesía”. Por exemplo em: Dt 4,10; Dt 9,10; Dt 18,9-22 (instruções diversas para o povo), indicando a reunião do povo. Entretanto, uma reunião convocada por Deus: qahal de Yahweh. Na tradução dos LXX, ecclesía vai adquirindo um sentido escatológico.

Sentido ativo: aviso de convocação Sentido passivo: assembléia reunida.

Para indicar a “comunidade de culto ou legal”, o hebraico usa “eda” que a LXX traduz por “synagogê”. 1 A palavra grega “ágape”, empregada pelos cristãos no sentido de amor, é usada em 1 Cor 13. Em Mt 22,37-41

(“Amai a Deus de todo coração ... Amai o próximo”) o verbo é “agapai”. Em 1 Jo 4,8 está dito: “Deus é amor (ágape)”. Essa palavra passou a indicar a refeição que os cristãos realizavam e que tinha o sentido de confraternização e partilha, em que não havia ricos e pobres, todos traziam o que podiam e compartilhavam. Esse ágape visava ajudar os necessitados. Era antes ou depois da celebração da Ceia. Assim é que se passou também a chamar a Ceia de Ágape. Há ainda muitas questões em que os estudiosos divergem, mas que não nos cabem discutir agora. É certo que a Ceia foi durante um tempo chamada de Ágape.

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No Novo Testamento:

Nos Evangelhos: ecclesía só aparece em Mt 16,18 e em Mt 18,17. Nos demais escritos: aparece 144 vezes.

At 5,11 – Igreja em Jerusalém. At 7,38 – Assembléia de Israel no deserto. At 9,31 – As igrejas em paz na Judéia, Samaria, Galiléia. At 20, 28 – A Igreja de Deus. Em Paulo: Igreja no singular ou no plural usados indiferentemente. Lugar da Igreja:

uma cidade: Tessalônica (1 Tes 1,1), Corinto (1 Cor 1,2), etc. uma região: Ásia (1 Cor 16,19), Galácia (Gl 1,2); Macedônia (2 Cor 8,1). Igreja doméstica: Rom 16,5; Flm 2; Col 4,15, 1 Cor 16,19. A razão da reunião: 1 Cor 1, 17ss. ECCLESÍA: REUNIÕES CONVOCADAS POR DEUS, EM CRISTO: 1 Tes 1,14. A Igreja é

Congregação: a reunião concreta de pessoas. Comunidade: grupo local constante. Igreja: o conjunto dos crentes.. Comunidade escatológica.

Portanto, as comunidades locais – Igrejas particulares – não são seções ou departamentos

da Igreja. A Igreja está completa em qualquer lugar. Por outro lado, a Igreja particular não é a Igreja total.

LUMEN GENTIUM nº 26 [...]Esta Igreja de Cristo está verdadeiramente presente em todas as legítimas

comunidades locais de fiéis, as quais aderindo aos seus pastores, são elas mesmas chamadas igrejas no Novo Testamento (86). Pois elas são, no local em que se encontram, o novo Povo chamado por Deus, no Espírito Santo e com plena segurança (cfr. 1 Tess. 1, 5). Nelas se congregam os fiéis pela pregação do Evangelho de Cristo e se celebra o mistério da Ceia do Senhor «para que o corpo da inteira fraternidade seja unido por meio da carne e sangue do Senhor» (87) Em qualquer comunidade que participa do altar sob o ministério sagrado do Bispo (88), é manifestado o símbolo do amor e da unidade do Corpo místico, sem o que não pode haver salvação (89). Nestas comunidades, embora muitas vezes pequenas e pobres, ou dispersas, está presente Cristo, por cujo poder se unifica a Igreja una, santa, católica e apostólica (90). Pois «outra coisa não faz a participação no corpo e sangue de Cristo, do que transformar-nos naquilo que recebemos» [...].

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4 – FASES INICIAIS DA ORGANIZAÇÃO DA IGREJA

A seguir, vamos repassar algumas fases do desenvolvimento organizativo da Igreja no primeiro século. Observa-se como a Igreja constrói uma estrutura mais hierarquizada à medida que o tempo passa. FASE APOSTÓLICA (30-65 d.C)

O Batismo é uma marca distintiva dos seguidores de Jesus: que vivem em “koinonía” = comunidade/comunhão (13 vezes em São Paulo) estão no Caminho (6 vezes em At) são identificados como cristãos (At 11,26) são a “ecclesía” = igreja (28 vezes em At)

comunidade local: At 15,41; 16,5 comunidade mais ampla: At 5,11; 9,31

Como vivia essa comunidade: At 2,42 ss. Quais as características dessa comunidade:

CONCÍLIO DE JERUSALÉM: A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DA IGREJA 4 PARTIDOS

1º PARTIDO: completa observância da Lei: At 11,2; 15,2; Gl 2,4; Fl 1,15-17. 2º PARTIDO: observância de alguns aspectos da Lei: At 15; Gl 2. 3º PARTIDO: dispensava a observância das práticas judaicas: At 15,20-39; Gl 2,11-14; 1 Cor

8. 4º PARTIDO: total oposição às práticas judaicas e, inclusive, às festas e cultos judaicos e ao

Templo: At 7,47-51; Hb 8,13; Jo 8,44; 15,25; Ap 3,9. Os primeiros cristãos, embora ligados a Israel, realizavam atos próprios que apontavam para uma existência autônoma: Batismo Oração comunitária Refeição comum Líderes Vivência comunitária

NESSA FASE, A REFERÊNCIA ÚNICA DA COMUNIDADE SÃO OS APÓSTOLOS

FASE SUBAPOSTÓLICA (66-100) E PÓS-APOSTÓLICA (100-150) Os continuadores da evangelização apresentam-se sob a figura dos apóstolos. Assim:

os evangelhos são atribuídos a apóstolos ou seus colaboradores. Tg, Pd e Jd são atribuídas a apóstolos.

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Cl, Ef e cartas pastorais são atribuídas a Paulo. Há necessidade de consolidação das Igrejas existentes Epíscopos e presbíteros adquirem maior importância. Maioria dos cristãos é de origem pagã. Fim de Jerusalém, predomínio de Roma

RESUMINDO AS TRÊS FASES:

1º - Autoridade carismática do apóstolo: carismas e serviços

( Curso Básico de História da Igreja, Roland Fröhlich, p. 10)

2º - Sem apóstolo: organização com certa autoridade e unidade na diversidade fundada

em: Ef 4,4-6 3º - Institucionalização:

“presbyteroi” = presbíteros, anciãos (termos não constantes das cartas paulinas, só em At e pastorais)

Funções: At 20,28-35; 1Tim 5,17; 1Pd 5,2; Tg 5,14 “epískopoi” = guardiães, supervisores, bispos:

5 vezes no NT: 1 Pd 2,25 (Cristo); Flp 1,1 (em Paulo?); At 20,8; 1 Tm 3,1-

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7; Tt 1,7; Clemente I, papa (92-101) refere-se a isso também, na 1Clem.;

Do apostolado missionário ao episcopado local; Toda comunidade tinha colégio de ministros locais; A presidência única da celebração eucarística gera o episcopado monárquico; Em 110, S. Inácio de Antioquia já fala de bispos, presbíteros e diáconos

(Inácio, Eph 3,2). (VER LG 28). OBSERVAÇÕES:

1) A palavra “HIERARQUIA” não existe no NT (nem no grego clássico), foi usada no século II, indicando toda a Igreja: DE ORIGEM SAGRADA.

2) DIACONIA foi o termo usado pelo NT para exprimir as funções da comunidade, evitando

qualquer outro termo que indicasse dominação ou poder.

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5 – IGREJA - SACRAMENTO

“Mysterion” = “mysterium, sacramentum” SACRAMENTO:

SINAL DO SAGRADO SINAL QUE REALIZA O QUE SIGNIFICA

LUMEN GENTIUM 1 A luz dos povos é Cristo: por isso, este sagrado Concílio, reunido no Espírito Santo,

deseja ardentemente iluminar com a Sua luz, que resplandece no rosto da Igreja, todos os homens, anunciando o Evangelho a toda a criatura (cfr. Mc. 16,15). Mas porque a Igreja, em Cristo, é como que o sacramento, ou sinal, e o instrumento da íntima união com Deus e da unidade de todo o género humano, pretende ela, na sequência dos anteriores Concílios, pôr de manifesto com maior insistência, aos fiéis e a todo o mundo, a sua natureza e missão universal.

LUMEN GENTIUM 48 Na verdade, Cristo, elevado sobre a terra, atraiu todos a Si (cfr. Jo. 12,32 gr.);

ressuscitado de entre os mortos (cfr. Rom. 6,9), infundiu nos discípulos o Seu Espírito vivificador e por Ele constituiu a Igreja, Seu corpo, como universal sacramento da salvação.

LER Jo 19,34 Santo Agostinho: “Quando o Senhor dormia na cruz, a lança atravessou seu lado e dele brotaram os sacramentos com os quais a Igreja foi criada. E é assim que a Igreja foi criada da costela de Adão” (BF, p. 59) (De Civ. 1,22 c. 17) O Batismo incorpora o homem ao Corpo de Cristo. LER: A Eucaristia mantém a comunhão do Corpo. LER: Jo 11, 52; Ef 2,15s Tomás de Aquino: no Batismo já está em ação a Eucaristia.

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6 – POVO DE DEUS O Povo de Deus no Antigo Testamento

A Aliança vincula Deus e Israel. Javé é o Deus de Israel. Israel é o povo de Javé. Javé escolheu para si um povo e o adquiriu entre todos os povos da terra

POVO = “LAÓS”, no grego bíblico do AT significa povo no sentido de raça, tribo. A LXX usa “laós” (em hebraico: “am”) para se referir quase sempre a Israel. Os outros povos eram “étnos” (em hebraico: “goi”).

O próprio nome “ISRAEL” significa “Deus domina”, Deus reina” (Gn 32,23-31). Por sua infidelidade, Israel é punido. A partir da decadência de Israel, os profetas

anunciam um povo escatológico. Ler Jer 31,31-34. Esse povo escatológico terá uma missão universal: Zac 2,12-17. Esse povo será inaugurado com a vinda do Messias. Mas a maioria do povo de Israel não reconheceu Jesus como Messias. Portanto, os que o reconheceram assumem que constituem o novo Povo de Deus, enquanto

comunidade escatológica de salvação.

No Novo Testamento

LAÓS – No NT, além dos sentidos do AT, passa a ser aplicado para a comunidade dos discípulos.

“A noção de Povo de Deus é o mais antigo e decisivo conceito que descreve o que a Igreja entende de si mesma.” (Hans Küng, p. 170).

Ler At 15, 13-18 (“ex étnon’’, “laón”) Ler 2 Cor 6,16: Paulo emprega as palavras do Sinai referindo-se à Igreja. Ler Rom 9: Israel versus Igreja – antigo povo versus novo povo. 1 Pd 2,9s – “sois a raça eleita”.

De dois povos um novo povo: Ef 2,11-22

LUMEN GENTIUM nº 9 Em todos os tempos e em todas as nações foi agradável a Deus aquele que O teme e obra

justamente (cfr. Act. 10,35). Contudo, aprouve a Deus salvar e santificar os homens, não individualmente, excluída qualquer ligação entre eles, mas constituindo-os em povo que O conhecesse na verdade e O servisse santamente. Escolheu, por isso, a nação israelita para Seu povo. Com ele estabeleceu uma aliança; a ele instruiu gradualmente, manifestando-Se a Si mesmo e ao desígnio da própria vontade na sua história, e santificando-o para Si. Mas todas estas coisas aconteceram como preparação e figura da nova e perfeita Aliança que em Cristo havia de ser estabelecida e da revelação mais completa que seria transmitida pelo próprio Verbo de Deus feito carne. Eis que virão dias, diz o Senhor, em que estabelecerei com a casa de Israel e a casa de Judá uma nova aliança... Porei a minha lei nas suas entranhas e a escreverei nos seus corações e serei o seu Deus e eles serão o meu povo... Todos me conhecerão desde o mais pequeno ao maior, diz o Senhor (Jer. 31, 31-34). Esta nova aliança instituiu-a Cristo, o novo testamento no Seu sangue (cfr. 1 Cor. 11,25), chamando o Seu povo de entre os judeus e os gentios, para formar um todo, não segundo a carne mas no Espírito e tornar-se o Povo de Deus. Com efeito, os que crêem em Cristo, regenerados não pela força de germe corruptível mas incorruptível por meio da Palavra de Deus vivo (cfr. 1 Ped. 1,23), não pela virtude da carne, mas pela água e pelo Espírito Santo (cfr. Jo. 3, 5-

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6), são finalmente constituídos em «raça escolhida, sacerdócio real, nação santa, povo conquistado... que outrora não era povo, mas agora é povo de Deus» (1 Ped. 2, 9-10).

Cristo ama sua Igreja: Ef 5,25-27. POVO DA LIBERDADE:

Jo 8,36 1 – O que é liberdade? Rm 7,18-25; Gl 5,13-18 2 – A Lei é santa, mas não salva: Rm 7,7-12 com Rm 10,1-4 3 – A liberdade e serviço: 1 Cor 10,23-33 É a Igreja uma comunidade de homens livres?

POVO SACERDOTAL

SACERDOTE (“sacerdos”, latim; “hieréus”., grego) no NT só se refere aos sacerdotes do AT.

Cristo é o único sacerdote – Ver Hb 4,14-5,10 e Hb 7,15-8,7 – não por herança sangüínea (Abraão, Levi), mas da “ordem de Melquisedec”. É sacerdote para sempre. E só ele é mediador – nós somos embaixadores do único Mediador.

Como corpo de Cristo, é que a Igreja se torna povo sacerdotal, pois: 1. tem acesso direto a Deus; 2. oferece sacrifícios espirituais; 3. prega a palavra; 4. batiza, celebra, perdoa.

Todos os cristãos compõem o Povo de Deus: clero ou leigo, uma distinção que não cabe. Na Lumen Gentium, define-se com toda clareza que a Igreja é o povo sacerdotal.

Distingue, contudo, entre o sacerdócio comum dos fiéis e o sacerdócio ministerial.

LUMEN GENTIUM nº 10 Cristo Nosso Senhor, Pontífice escolhido de entre os homens (cfr. Hebr. 5, 1-5), fez do

novo povo um «reino sacerdotal para seu Deus e Pai» (Apor. 1,6; cfr. 5, 9-10). Na verdade, os baptizados, pela regeneração e pela unção do Espírito Santo, são consagrados para serem casa espiritual, sacerdócio santo, para que, por meio de todas as obras próprias do cristão, ofereçam oblações espirituais e anunciem os louvores daquele que das trevas os chamou à sua admirável luz (cfr. 1 Ped. 2, 4-10). Por isso, todos os discípulos de Cristo, perseverando na oração e louvando a Deus (cfr. Act., 2, 42-47), ofereçam-se a si mesmos como hóstias vivas, santas, agradáveis a Deus (cfr. Roma 12,1), dêem. testemunho de Cristo em toda a parte e àqueles que lha pedirem dêem razão da esperança da vida eterna que neles habita (cfr. 1 Ped. 3,15). .O sacerdócio comum dos fiéis e o sacerdócio ministerial ou hierárquico, embora se diferenciem essencialmente e não apenas em grau, ordenam-se mutuamente um ao outro; pois um e outro participam, a seu modo, do único sacerdócio de Cristo (16). Com efeito, o sacerdote ministerial, pelo seu poder sagrado, forma e conduz o povo sacerdotal, realiza o sacrifício eucarístico fazendo as vezes de Cristo e oferece-o a Deus em nome de todo o povo; os fiéis, por sua parte, concorrem para a oblação da Eucaristia em virtude do seu sacerdócio real (17), que eles exercem na recepção dos sacramentos, na oração e acção de graças, no testemunho da santidade de vida, na abnegação e na caridade operosa.

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MINISTÉRIOS E HIERARQUIA Antes de abordar a organização da Igreja como está hoje, vale lembrar alguns aspectos.

1º) Jesus foi sacerdote naquele sentido abordado na Carta ao Hebreus, não pertencia à classe sacerdotal. 2º) Primeiramente, não havia hierarquia, mas os serviços. 3º) Com o tempo, foi construída uma hierarquia, que, em grande parte, aconteceu pela presidência na celebração da Eucaristia.

Epíscopoi e presbíteroi – São Jerônimo: “O apóstolo ensina claramente que são a mesma coisa os presbíteros e os bispos... O que mais tarde se escolheu a um para colocá-lo à frente dos demais foi como remédio para as brigas e para evitar que, cada qual puxando para o seu lado, desagregassem a Igreja”. [...] Portanto, o presbítero é o mesmo que o bispo, e as igrejas foram governadas por um conselho presbiteral até que, por inspiração do demônio, apareceram as paixões na religião e começaram a dizer: eu sou de Paulo, eu de Apolo, eu de Cefas (1 Cor 1,12). Pois quando cada um pensava que eram seus os que batizava, e não de Cristo, decidiu-se em todo o mundo que um dos bispos fosse posto à frente dos restantes e que lhe tocasse o cuidado de toda a Igreja, para erradicar os germes do cisma”.

Viúvas e diaconisas – 1 Tim 5,9 Concílio de Laodicéia (343), cânon 11 da Collectio Hispana: “Não convém que as

chamadas presbíteras pelos gregos e, entre nós, viúvas anciãs ou presidentas, sejam constituídas como ordenadas na Igreja”.

São Cipriano: “A eucaristia não pode ser celebrada à margem da comunidade eclesial” (Epístola 45)

Tertuliano (160-230): “Mas onde não existe um colégio de servidores incorporados ao ministério, tu, leigo, deves celebrar a eucaristia e batizar; nesse caso, tu és o próprio sacerdote, pois onde se encontram dois ou três ali se encontra a Igreja, no caso de serem três leigos” (De exhort. Cast. 7,3).

Clemente: Quem preside a eucaristia é o bispo ou presbítero “ou também outras pessoas determinadas com a aprovação de toda comunidade” (I Clem 44,4-5).

Concílio de Arnes (314): proíbe que diáconos celebrem a eucaristia. 4º) Origem do palavra ordenação:

Ordo = Ordem, acesso a determinada classe – ordo senatorum; ordo aequitatum. Concílios II (1139) e IV de Latrão (1215) começam a “teoria do caráter”. Concílio de Trento: “no sacramento da ordem, como no do batismo e da confirmação, se

imprime o caráter que não se pode apagar nem tirar”.

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BISPOS: LG 24 a Funções (múnus): Docente: LG 25 Santificadora: LG 26 Governativa: LG 27

O ministro ordenado – bispo, presbítero ou diácono - pelo fato de agir ‘in persona Christi capitis’ (PO 2) e enquanto ministro da unidade, remete aos demais membros do corpo, à variedade dos dons e serviços suscitados pelo Espírito. Ministério da síntese, ele não se deve tornar síntese dos ministérios (concepção “clericalizante”), mas serviço de discernimento e coordenação dos carismas e dos ministérios, com vistas à comunhão e ao crescimento. Deve ser exercitado mediante a tríplice função profética, sacerdotal e pastoral, pelo bispo, para toda a Igreja local; pelo presbítero e pelos diáconos nos campos de ação a eles confiados pelos bispos. (Bruno Forte, p. 34)

PRESBÍTEROS: LG 28 b, d

DIÁCONOS: LG 29

Os diáconos (servidores) surgiram no início da Igreja para o serviço de distribuição dos bens que eram doados para a Igreja, como vemos em At 6,1-6. A partir do crescimento da Igreja, cada cidade tinha 7 diáconos que eram administradores dos bens da Igreja. Sua função foi se transformando ao longo do tempo, tendo-se tornado um “degrau” para o sacerdócio. Hoje, vemos a recuperação desse serviço específico dentro da Igreja.

LUMEN GENTIUM nº 29

Em grau inferior da hierarquia estão os diáconos, aos quais foram impostas as mãos «não em ordem ao sacerdócio mas ao ministério» (109). Pois que, fortalecidos com a graça sacramental, servem o Povo de Deus em união com o Bispo e o seu presbitério, no ministério da Liturgia, da palavra e da caridade. É próprio do diácono, segundo for cometido pela competente autoridade, administrar solenemente o Baptismo, guardar e distribuir a Eucaristia, assistir e abençoar o Matrimónio em nome da Igreja, levar o viático aos moribundos, ler aos fiéis a Sagrada Escritura, instruir e exortar o povo, presidir ao culto e à oração dos fiéis, administrar os sacramentais, dirigir os ritos do funeral e da sepultura. Consagrados aos ofícios da caridade e da administração, lembrem-se os diáconos da recomendação de S. Policarpo: «misericordiosos, diligentes, caminhando na verdade do Senhor, que se fez servo de todos» (110).

Como porém, estes ofícios, muito necessários para a vida da Igreja na disciplina actual da Igreja latina, dificilmente podem ser exercidos em muitas regiões, o diaconado poderá ser, para o futuro, restaurado como grau próprio e permanente da Hierarquia. As diversas Conferências episcopais territoriais competentes cabe decidir, com a aprovação do Sumo Pontífice, se e onde é oportuno instituir tais diáconos para a cura das almas. Com o consentimento do Romano Pontífice, poderá este diaconado ser conferido a homens de idade madura, mesmo casados, e a jovens idóneos; em relação a estes últimos, porém, permanece em vigor a lei do celibato.

LEIGOS: LG 31

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Superação do Concílio: de “objetos” da atenção dos pastores a participantes e, hoje, agentes eclesiais.

Ao invés de hierarquia/laicato, comunidade/ministérios. LAICIDADE E IGREJA 1. Laicidade na Igreja:

respeito ao valor próprio do humano na Igreja; respeito aos direitos humanos na Igreja; tolerância, diálogo, liberdade na Igreja.

2. Laicidade da Igreja: responsabilidade de todo cristão (inclusive clero) nas questões

“temporais”; não tornar estanque as dimensões sagrado/profano; dimensão missionária e “política”.

3. Laicidade do mundo: autonomia do mundo – fim do eclesiocentrismo; Igreja em diálogo e serviço, não depositária de toda verdade.

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7 – COMUNIDADE DO ESPÍRITO SANTO

Espírito é a ação e presença terrena do Cristo Ressuscitado. É o outro Paráclito Localize uma passagem em que Jesus afirma isso. O Espírito é O DOM ESCATOLÓGICO Ler Joel 3,1-2 e At 2,1-20. O Espírito age em todos: “A graça de nosso Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus e a

comunhão do Espírito Santo estejam com todos vós” (2 Cor 13,13). Igreja é Templo do Espírito: 1 Cor 3,16 – comunidade local; Construída pelo Espírito: Ef 2,17-22; Os cristãos constroem o edifício espiritual: 1 Pd 2,4-7; Igreja subordinada ao Espírito Espírito é de Deus e não da Igreja O Espírito precede a Igreja. Espírito não se restringe à Igreja. O Espírito age onde e quando quer.

A Igreja é essencialmente e permanentemente carismática.

O que é carisma em sentido genérico: dom – Rm 1,11, Rm 5,15; 2 Cor 5,15 em sentido estrito: dons para edificação da comunidade : Rm 12, 1-8; 1 Cor 12,1-11 e 27-31;

1 Cor 14,1-40; ! Pd 4,7-11. Características do autêntico carisma:

1 – liga-se com o reconhecimento de Jesus como Senhor; 2 – é conforme as necessidades da comunidade (não do sentimento ou “prazer” individual); 3 – é sempre um serviço; 4 – todos os membros do Povo de Deus são carismáticos; 5 – ninguém tem o monopólio dos carismas.

Tipos de carisma:

Carismas circunstanciais: exortação, consolação, ciência, etc. Carismas regulares comunitários (de função pública): apóstolos, profetas, doutores, evangelistas, diáconos. Mais tarde: anciãos, epíscopos Compare esses textos com 1 Tm 4,12-14; 2 Tm 1,6s; Que critérios identificam o carisma cristão?

A divisão de Hans Küng: Proclamação: apóstolos, profetas, ensino, evangelizadores, os que exortam; Prestação de serviços: diáconos e diaconisas, os que dão esmolas, os que cuidam dos doentes,

as viúvas que se encontram a serviço da comunidade; Governo: primeiros, presidentes, bispos, pastores (p. 263/264)

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LUMEN GENTIUM nº 12 O Povo santo de Deus participa também da função profética de Cristo, difundindo o seu

testemunho vivo, sobretudo pela vida de fé e de caridade oferecendo a Deus o sacrifício de louvor, fruto dos lábios que confessam o Seu nome (cfr. Hebr. 13,15). A totalidade dos fiéis que receberam a unção do Santo (cfr. Jo. 2, 20 e 27), não pode enganar-se na fé; e esta sua propriedade peculiar manifesta-se por meio do sentir sobrenatural da fé do povo todo, quando este, «desde os Bispos até ao último dos leigos fiéis» (22), manifesta consenso universal em matéria de fé e costumes. Com este sentido da fé, que se desperta e sustenta pela acção do Espírito de verdade, o Povo de Deus, sob a direcção do sagrado magistério que fielmente acata, já não recebe simples palavra de homens mas a verdadeira palavra de Deus (cfr. 1 Tess. 2,13), adere indefectivelmente à fé uma vez confiada aos santos (cfr. Jud. 3), penetra-a mais profundamente com juízo acertado e aplica-a mais totalmente na vida.

Além disso, este mesmo Espírito Santo não só santifica e conduz o Povo de Deus por meio dos sacramentos e ministérios e o adorna com virtudes, mas «distribuindo a cada um os seus dons como lhe apraz» (1 Cor. 12,11), distribui também graças especiais entre os fiéis de todas as classes, as quais os tornam aptos e dispostos a tomar diversas obras e encargos, proveitosos para a renovação e cada vez mais ampla edificação da Igreja, segundo aquelas palavras: ; «a cada qual se concede a manifestação do Espírito em ordem ao bem comum» (1 Cor. 12,7). Estes carismas, quer sejam os mais elevados, quer também os mais simples e comuns, devem ser recebidos com acção de graças e consolação, por serem muito acomodados e úteis às necessidades da Igreja. Não se devem porém, pedir temerariamente, os dons extraordinários nem deles se devem esperar com presunção os frutos das obras apostólicas; e o juízo acerca da sua autenticidade e recto uso, pertence àqueles que presidem na Igreja e aos quais compete de modo especial não extinguir o Espírito mas julgar tudo e conservar o que é bom (cfr. 1 Tess. 5, 12. 19-21).

Observação: a questão dos carismas extraordinários (visões, revelações, glossolalia, profecias, operar maravilhas, etc.) “Nenhum profeta tem significado absoluto: os profetas seguem-se uns aos outros, um depois do outro. A Jesus, porém, não se segue nenhuma nova revelação: n’Ele foi dada ao mundo, de uma vez por todas, a revelação de Deus”. (Hans Küng, p. 290, a respeito dos visionários). ”Portanto, o Espírito não oferecerá nova revelação, mas limitar-se-á a deixar brilhar, numa luz sempre nova, tudo o que Jesus disse e fez, manifestando-o através da proclamação das suas testemunhas.” (Ib., p. 290)

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8 – O CORPO DE CRISTO

Quanto à expressão CORPO MÍSTICO DE CRISTO

Durante a época da patrística: como em S. Paulo, usa-se apenas a expressão Corpo de Cristo, entendendo a Igreja como o verdadeiro corpo de Cristo (= corpus verum). O corpus mysticum é o sacramento. Na Idade Média: falava-se em corpo místico da Igreja (corpus ecclesiae mysticum), entendendo não a dimensão do mistério, mas como uma corporação dos cristãos (influência do Direito romano). Na época moderna: fala-se que a Igreja é corpo místico de Cristo a fim de distinguir do corpo eucarístico. Místico, aqui, significa tão-só “misterioso”, não tem aquele sentido em que usamos a palavra mística atualmente (Conferir Ratzinger, p. 82, 83, 97 e 221,222).

LUMEN GENTIUM nº 7 O filho de Deus, vencendo, na natureza humana a Si unida, a morte, com a Sua morte e

ressurreição, remiu o homem e transformou-o em nova criatura (cfr. Gál. 6,15; 2 Cor. 5,17). Pois, comunicando o Seu Espírito, fez misteriosamente de todos os Seus irmãos, chamados de entre todos os povos, como que o Seu Corpo.

É nesse corpo que a vida de Cristo se difunde nos que crêem, unidos de modo misterioso e real, por meio dos sacramentos, a Cristo padecente e glorioso(6). Com efeito, pelo Baptismo somos assimilados a Cristo; «todos nós fomos baptizados no mesmo Espírito, para formarmos um só corpo» (1 Cor. 12,13). Por este rito sagrado é representada e realizada a união com a morte e ressurreição de Cristo: ; «fomos sepultados, pois, com Ele, por meio do Baptismo, na morte»; se, porém, ; «nos tornámos com Ele um mesmo ser orgânico por morte semelhante à Sua, por semelhante ressurreição o seremos também (Rom. 6, 4-5). Ao participar realmente do corpo do Senhor, na fracção do pão eucarístico, somos elevados à comunhão com Ele e entre nós. ; «Porque há um só pão, nós, que somos muitos, formamos um só corpo, visto participarmos todos do único pão» (1 Cor. 10,17). E deste modo nos tornamos todos membros desse corpo (cfr. 1 Cor. 12,27), sendo individualmente membros uns dos outros» (Rom. 12,5). [...]

A constituição do mistério da Igreja como corpo de Cristo reside na vivência da comunhão

que se efetua sacramentalmente pelo Batismo e pela Eucaristia, que pressupõem a comunhão na mesma fé e na prática do amor fraterno.

Batismo Jesus ordenou o Batismo? Mc 16,16; Mt 28,19. Nunca houve Igreja sem Batismo: o próprio Paulo testemunha isso: 1 Cor 12,12-13.27. O Batismo de João Batista já continha os elementos do Batismo da Igreja, diferindo de

outros batismos, como os dos essênios, pois apresentava: caráter escatológico; necessidade de conversão; realizado por um batista (não a própria pessoa se batiza); é para todo o povo (não para iniciados)

A diferença é que na Igreja o Batismo é feito “em nome de Jesus” que com sua morte e

ressurreição inaugurou a era escatológica.

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Fomos batizados no Espírito para formar um só corpo

Igreja e Batismo: não há um sem o outro. Batismo: conversão e fé. Batismo: acontecimento comunitário

A Ceia do Senhor Os relatos da ceia: Ler 1 Cor 10,16-17: comunhão com Cristo e com os irmãos = um só corpo. Ler 1 Cor 6,15ss: atenção ao “... um só espírito” (soma X pneuma). Igreja e Ceia: não há um sem outro.

Perspectiva do passado: Refeição de lembrança e gratidão; Perspectiva do presente: Refeição de fraternidade e aliança; Perspectiva do futuro: Refeição que antecipa o Banquete escatológico. Nomenclatura:

Ceia, Ágape (pão/refeição/vinho – 55 DC a 100 DC; Refeição/pão/vinho – até meio séc. II; Eucaristia (oração da gratidão que terminava com o memorial da instituição – séc. II); Missa (séc. V, vem de “missio, dismissio”).

No Batismo constitui-se a Igreja, na Eucaristia a Igreja permanece Igreja. No Batismo

forma-se, constrói-se o Corpo de Cristo, na Eucaristia sustenta-se o Corpo de Cristo. Corpo de Cristo

Em Rom e Cor, é a comunidade local: 1 Cor 12,27 (VÓS ...); Rom 12,5 (NÓS...). Em Col e Ef, é a comunidade universal, e é nessas cartas que Cristo é chamado Cabeça da

Igreja: Col 1,20; Col 1,24; Ef 1,22-23; SER O CORPO DE CRISTO IMPLICA NÃO NUMA IDENTIDADE COM CRISTO

– QUER DIZER, A IGREJA NÃO É CRISTO –, MAS NUMA RELAÇÃO DE COMUNHÃO QUE IMPLICA NAS DIMENSÕES DE UNIDADE E DE AMOR.

1 Cor 6,12-20; Ef 5,22-32. Em síntese:

Cristo não se confunde com a Igreja; Cristo está presente na Igreja como ressuscitado; Cristo é maior que a Igreja, é a cabeça da Igreja; Igreja caminha e cresce na obediência a Cristo.

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9 – DIMENSÕES DA IGREJA

Chamamos de dimensões (preferindo a terminologia de Hans Küng) da Igreja àqueles quatro atributos ou qualidades que afirmamos como características próprias da verdadeira Igreja: a unicidade, a catolicidade, a apostolicidade e a santidade.

Segundo consta, o primeiro a usar essa fórmula foi Cirilo de Jerusalém (315-386). Em nosso Símbolo da Fé confessamos: Creio na Igreja una, santa, católica e apostólica. Assim, considera-se verdadeira Igreja de Cristo aquela à qual se possam aplicar essas características.

O que diz o Catecismo da Igreja Católica nº 811: “Esses atributos, inseparavelmente ligados entre si, indicam traços essenciais da Igreja e de sua missão. A Igreja não os tem de si mesma; é Cristo que, pelo Espírito Santo, dá a sua Igreja o ser uma, santa, católica e apostólica, e é também ele que a convida a realizar cada uma dessas qualidades.”

UNA

IGREJA É ÍCONE DA TRINDADE (Jo: que eles sejam um) Unidade não é de membros entre si, mas de Deus: Deus é que reúne, a Igreja deve

convergir para a unidade. Catecismo da Igreja Católica, nº 813:

A Igreja é una por sua fonte: ‘Deste mistério, o modelo supremo e o princípio é a unidade de um só Deus na Trindade das Pessoas, Pai, Filho e Espírito Santo’(UR 2). A Igreja é una por seu Fundador: ‘Pois o próprio Filho encarnado, príncipe da paz, por sua cruz reconciliou todos os homens com Deus, restabelecendo a união de todos em um só Povo, em um só Corpo’ (GS 78,3). A Igreja é una por sua ‘alma’: ‘O Espírito Santo que habita nos crentes, que plenifica e rege toda a Igreja, realiza esta admirável comunhão dos fiéis e os une tão intimamente em Cristo, que ele é o princípio de Unidade da Igreja’ (UR 2).2

A Igreja una se manifesta na multiplicidade das Igrejas locais.

A Igreja é primeiramente uma porque ela participa da mesma palavra e se alimenta do mesmo pão, isto é, ela está unida no corpo e no logos do Senhor. Graças à união eucarística, cada uma das comunidades realiza-se inteiramente como Igreja, com a condição de que ela esteja em comunhão com as outras comunidades, comunhão essa que de forma alguma pode prescindir da palavra que é a mesma para todos. Essa comunhão formada por diversas comunidades, tem seus pontos de apoio nos bispos. A esses, por serem o prolongamento do collegium apostolorum, cabe a responsabilidade de conservar a autenticidade da palavra e a integridade da comunhão (Ratzinger, p. 114).

Não é sinal de unidade: a uniformidade de culto, de hierarquia ou de concepção teológica. A diversidade que há na Igreja de povos, de culturas, de dons, de tarefas, de ritos não

quebra a unidade essencial. Mas a unidade é sempre ameaçada. Por isso, “é preciso conservar a unidade do Espírito

Santo pelo vínculo da paz (Ef 4,3))” e “sobre tudo isso está a caridade, que é o vínculo da perfeição (Col 3,14)”. 2 As siglas indicadas são citações de documentos oficiais da Igreja. UR indica Unitatis Redintegratio. GS indica

Gaudium et Spes.

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CREIO NA COMUNHÃO DOS SANTOS3

IGREJA É COMUNHÃO (communio, latim; koinonia, grego)

Comunhão com O Santo – O Espírito Santo.

Comunhão das realidades santas: Palavra de Deus e Sacramentos. Comunhão entre os cristãos. Comunhão das Igrejas locais.

SANTA Igreja santa e pecadora – visões erradas:

querer uma Igreja só de santos (gnósticos, donatistas, etc.) Igreja santa x membros pecadores. Não há Igreja sem membros. Dividir aspectos pecadores e aspectos santos dos cristãos.

Igreja é pecadora porque seus membros são pecadores. E não vejamos esse pecado só pelo

lado individual, o pecado pessoal dos membros da Igreja. Mais que isso, a Igreja, enquanto instituição, enquanto comunidade visível na história, tem cometido graves pecados. Lembre alguns casos.

Igreja é santa não pela santidade de seus membros, nem por suas atitudes morais. SANTO (“kadad “, em hebraico; “hagios”, em grego; “sanctus”, em latim) aquilo que é

separado por Deus. Assim, a Igreja é santa significa: a Igreja é o povo separado por Deus, em Cristo, para ser a

comunidade dos fiéis, o povo que é sinal da santidade divina no mundo. Deus é que santifica a Igreja. 1 Pd 2,9-10: raça eleita, sacerdócio real, nação santa. Daí, o ministério do perdão: a comunidade é mediadora do perdão de Deus. Mas também a

Igreja precisa de perdão. A Igreja precisa tomar a forma de Cristo, não a do mundo: Rm 12,2ss: “Não vos con-formeis com este mundo, mas trans-formai-vos...” Ef 4,20-24: trans-formação espiritual da mente: HOMEM NOVO. Col 3,9-10: “Cristo é tudo em todos”.

A Igreja deve sempre se renovar para tornar-se santa, não para ficar “moderna”, não por

medo, não para se tornar mais simpática, não para conseguir mais adeptos. A renovação da Igreja é uma exigência do Evangelho.

LUMEN GENTIUM nº 8

3 O primeiro sentido dessa fórmula – “creio na comunhão dos santos” – dizia respeito à comunhão eucarística,

comunhão com as coisas santas (cf. Catecismo da Igeja Católica, nº 1331).

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Mas, assim como Cristo realizou a obra da redenção na pobreza e na perseguição, assim a Igreja é chamada a seguir pelo mesmo caminho para comunicar aos homens os frutos da salvação. Cristo Jesus «que era de condição divina... despojou-se de si próprio tomando a condição de escravo (Fil. 2, 6-7) e por nós, «sendo rico, fez-se pobre» (2 Cor. 8,9): assim também a Igreja, embora necessite dos meios humanos para o prosseguimento da sua missão, não foi constituída para alcançar a glória terrestre, mas para divulgar a humildade e abnegação, também com o seu exemplo. Cristo foi enviado pelo Pai « a evangelizar os pobres... a sarar os contritos de coração» (Luc. 4,18), «a procurar e salvar o que perecera» (Luc. 19,10). De igual modo, a Igreja abraça com amor todos os afligidos pela enfermidade humana; mais ainda, reconhece nos pobres e nos que sofrem a imagem do seu fundador pobre e sofredor, procura aliviar as suas necessidades, e intenta servir neles a Cristo. Enquanto Cristo «santo, inocente, imaculado» (Hebr. 7,26), não conheceu o pecado (cfr. 2 Cor. 5,21), mas veio apenas expiar os pecados do povo (Hebr. 2,17), a Igreja, contendo pecadores no seu próprio seio, simultaneamente santa e sempre necessitada de purificação, exercita continuamente a penitência e a renovação.

CATÓLICA

O termo “católico” vem do grego “kat'holé” (= “em toda parte”) significando “universal”. É empregada uma vez em At 4,18 significando “completamente”.

Referindo-se à Igreja, essa palavra, ao que parece, foi usada pela primeira vez por Inácio de Antioquia em 110 dC.

Existem teólogos que distinguem o termo “católico” de “universal”. Para eles, falar em “Igreja universal” indicaria a extensão geográfica e quantitativa, enquanto dizer “Igreja católica” indicaria a qualidade da Igreja enquanto em comunhão com Cristo anuncia e testemunha a salvação para todos os povos. O Concílio Vaticano II usa os dois termos com o mesmo sentido.

Ressalte-se, então, que o conceito de catolicidade ou universalidade da Igreja não tem sentido:

estatístico: número de membros no mundo inteiro; geográfico: presença em todos os países; histórico: abrange todos os tempos.

A catolicidade da Igreja é um atributo indispensável de sua natureza, de modo que

qualquer comunidade autenticamente cristã, em qualquer lugar que esteja, deve ser considerada católica.

Vemos no Catecismo da Igreja Católica, nº 830 e 831: A Igreja é católica em duplo sentido. Ela é católica porque nela Cristo está presente. “Onde está Cristo Jesus, está a Igreja Católica” (S. Inácio de Antioquia). Nela subsiste a plenitude do Corpo de Cristo unido à sua cabeça (Ef 1,22-23), o que implica que ela recebe dele “a plenitude dos meios de salvação” (AG 6)4 que ele quis: confissão de fé correta e completa, vida sacramental integral e ministério ordenado na sucessão apostólica. Neste sentido fundamental, a Igreja era católica no dia de Pentecostes (AG 4) e o será sempre, até o dia da Parusia. Ela é católica porque é enviada em missão por Cristo à universalidade do gênero humano. (Mt 28,19).

4 AG = Ad gentes

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O fundamento da catolicidade é a permanência da Igreja fiel à sua própria identidade, em qualquer tempo e lugar.

Cada Igreja local só Igreja enquanto é manifestação da Igreja plena. CATOLICIDADE É UMA QUESTÃO DE TOTALIDADE.

LUMEN GENTIUM nº 13 E assim, o Povo de Deus encontra-se entre todos os povos da terra, já que de todos recebe

os cidadãos, que o são dum reino não terrestre mas celeste. Pois todos os fiéis espalhados pelo orbe comunicam com os restantes por meio do Espírito Santo, de maneira que «aquele que vive em Roma, sabe que os indianos são membros seus»(23),. Mas porque o reino de Cristo não é deste mundo (cfr. Jo. 18,36), a Igreja, ou seja o Povo de Deus, ao implantar este reino, não subtrai coisa alguma ao bem temporal de nenhum povo, mas, pelo contrário, fomenta e assume as qualidades, as riquezas, os costumes e o modo de ser dos povos, na medida em que são bons; e assumindo-os, purifica-os, fortalece-os e eleva-os. Pois lembra-se que lhe cumpre ajuntar-se com aquele rei a quem os povos foram dados em herança (cfr. Salm. 2,8), e para a cidade à qual levam dons e ofertas (cfr. Salm. 71 [72], 10; Is. 60, 47; Apoc. 21,24). Este carácter de universalidade que distingue o Povo de Deus é dom do Senhor; por Ele a Igreja católica tende eficaz e constantemente à recapitulação total da humanidade com todos os seus bens sob a cabeça, Cristo, na unidade do Seu Espírito (24).

APOSTÓLICA

Só pode ser una, católica, santa, se for apostólica. APÓSTOLO = MISSIONÁRIO, EMBAIXADOR Testemunho dos apóstolos: único, insubstituível, sem sucessão, definitivo: Cristo

ressuscitou = TRADIÇÃO APOSTÓLICA Aspectos da apostolicidade:

Doutrinal: perseverança na fé transmitida pelos apóstolos; Missionário: ação da Igreja; Existencial: busca de identificação com a forma de ser da igreja apostólica; Ministerial: ministérios como garantia visível da apostolicidade.

Em sentido rigoroso, mais do que sucessores dos apóstolos como tais, os bispos são os primeiros ministros designados pelos apóstolos, ou por “um” deles, para dirigir as igrejas por eles fundadas. Tanto o apostolado como o episcopado têm uma missão comum: a de realizar a presença ativa do Senhor ausente. Trata-se de um vicariato, do exercício de uma mesma autoridade, de uma mesma ação, de uma mesma missão, mas por meio de outras pessoas. (Salvador Pié-Ninot, p. 89)

A Igreja inteira é sucessora dos apóstolos, não apenas os bispos, porque se funda sobre o

alicerce dos apóstolos e porque prossegue o ministério dos apóstolos.

A sucessão especial: Apóstolos > Doutores > Bispos (?)

O papel de Pedro e sua sucessão: Mt 16,16-19 Natureza da Igreja: iniciativa de Cristo

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Jorge Solano http://jorgesolano.sites.uol.com.br/

Fundamento: Pedro, enquanto confessa a fé em Cristo Condição: sujeita às circunstâncias da história.

Debate: A missão de Pedro – Jo, 21,15-17 e a sucessão do Bispo de Roma

LUMEN GENTIUM nº 20 A missão divina confiada por Cristo aos Apóstolos durará até ao fim dos tempos (cfr. Mt.

28,20), uma vez que o Evangelho que eles devem anunciar é em todo o tempo o princípio de toda a vida na Igreja. Pelo que os Apóstolos trataram de estabelecer sucessores, nesta sociedade hierarquicamente constituída.

Assim, não só tiveram vários auxiliares no ministério (40) mas, para que a missão que lhes fora entregue se continuasse após a sua morte, confiaram a seus imediatos colaboradores, como em testamento, o encargo de completarem e confirmarem a obra começada por eles (41), recomendando-lhes que velassem por todo o rebanho, sobre o qual o Espírito Santo os restabelecera para apascentarem a Igreja de Deus (cfr. Act. 20, 28). Estabeleceram assim homens com esta finalidade e ordenaram também que após a sua morte fosse o seu ministério assumido por outros homens experimentados (42). Entre os vários ministérios que na Igreja se exercem desde os primeiros tempos, consta da tradição que o principal é o daqueles que, constituídos no episcopado em sucessão ininterrupta (43) são transmissores do múnus apostólico (44). E assim, como testemunha santo Ireneu, a tradição apostólica é manifestada em todo o mundo (45) e guardada (46) por aqueles que pelos Apóstolos foram constituídos Bispos e seus sucessores.