Durkheim

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E NATURAIS DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS TEORIA SOCIOLÓGICA Professora: Antônia L. Colbari Aluno: Roberto Izoton Comentários de Leitura dos Textos de Émile Durkheim Em seu livro Da Divisão do Trabalho Social, Durkheim (1999, p. XLIII) aborda a divisão do trabalho como um fato moral e objetiva aplicar para o seu estudo o “método das ciências positivas”. No prefácio à 1ª edição da referida obra, o autor anuncia este método, que mais tarde sistematizará no livro As Regras do Método Sociológico. Para ele, os fatos morais são passíveis de observação, descrição e classificação, e podem ser explicados por leis. De acordo com Durkheim, a moral é histórica e varia de acordo com “as condições em que vivem então os homens” (DURKHEIM, 1999, p. XLIV). Cabe à ciência da moral determinar as razões de tal mudança. Além disso, essa ciência está preocupada em melhorar a realidade por meio do estudo especulativo (teórico)

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Comentários de Leitura dos Textos de Émile Durkheim.

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPRITO SANTO

CENTRO DE CINCIAS HUMANAS E NATURAIS

DEPARTAMENTO DE CINCIAS SOCIAIS

PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM CINCIAS SOCIAIS

TEORIA SOCIOLGICA

Professora: Antnia L. Colbari

Aluno: Roberto Izoton

Comentrios de Leitura dos Textos de mile DurkheimEm seu livro Da Diviso do Trabalho Social, Durkheim (1999, p. XLIII) aborda a diviso do trabalho como um fato moral e objetiva aplicar para o seu estudo o mtodo das cincias positivas. No prefcio 1 edio da referida obra, o autor anuncia este mtodo, que mais tarde sistematizar no livro As Regras do Mtodo Sociolgico. Para ele, os fatos morais so passveis de observao, descrio e classificao, e podem ser explicados por leis.De acordo com Durkheim, a moral histrica e varia de acordo com as condies em que vivem ento os homens (DURKHEIM, 1999, p. XLIV). Cabe cincia da moral determinar as razes de tal mudana. Alm disso, essa cincia est preocupada em melhorar a realidade por meio do estudo especulativo (terico) da moral. Porm, ao considerar a moral como um fato dado, que no se modifica com a nossa vontade, a cincia que se prope a estuda-la nos comunica um esprito sabiamente conservador (DURKHEIM, 1999, p. XLVII). Ento, o socilogo deve deixar de lado tudo o que se presta em demasia aos juzos pessoais e s apreciaes subjetivas e se ater apenas ao que pode ser comprovado por meio da observao metdica (DURKHEIM, 1999, p. XLIX).No prefcio 2 edio do mesmo livro, Durkheim prope o desenvolvimento de corporaes profissionais que venham a criar regras que regulem no s as relaes entre seus associados, mas toda a sociedade. Desse modo, seria combatido o estado de anomia jurdica e moral em que se encontra atualmente a vida econmica (DURKHEIM, 1999, p. VI). Esse papel regulador foi desempenhado na Roma antiga e na Europa medieval pelas corporaes de ofcios, porm, com as mudanas socioeconmicas que ocorreram ao longo dos sculos, tais instituies se tornaram obsoletas e desapareceram, mas nada foi desenvolvido para ocupar seu lugar. o vcuo deixado pelas corporaes de ofcio, enquanto fonte de uma moral profissional, e at mesmo de uma moralidade pblica (DURKHEIM, 1999, p. IX), que explica, para o autor, o estado de anomia do qual ele se ressente.Como teria sido o grande desenvolvimento das funes econmicas (DURKHEIM, 1999, p. VIII) o responsvel pela crescente diviso do trabalho e, consequentemente pelo crescente individualismo que gera aquele estado de anomia, nem o Estado, nem qualquer outra organizao poltica poderia resolver o problema, apenas as corporaes profissionais, que so econmicas. Alm disso, quando o Estado regula de maneira exagerada as atividades econmicas, tal regulamentao se degenera em estreita subordinao (DURKHEIM, 1999, p. XXXIII), o que prejudicial.

Os novos grupos profissionais deveriam ter a mesma perenidade das corporaes romanas e medievais. Os sindicatos seriam, de acordo com Durkheim, as nicas instituies de sua poca que possuam essa caracterstica, porm, eles no tm condies de ocupar o lugar das corporaes de ofcio, pois so instituies privadas, sem autoridade legal, desprovida[s] por conseguinte de qualquer poder regulamentador. Alm do mais, o autor observa que h vrios sindicatos de uma mesma categoria industrial, que guardam independncia um do outro sem que se unifiquem. Por fim, existem sindicatos de patres e de trabalhadores, que no se reuniriam com o objetivo de elaborar em comum uma regulamentao que, estabelecendo suas relaes mtuas, imponha-se a ambas as partes com a mesma autoridade (DURKHEIM, 1999, p. XI-XII).Como todos os fatos morais, a moral que emergiria desses novos grupos profissionais apresentariam certa dualidade. Por um lado ela se mostraria necessria sociedade para combater a anarquia que teria se instaurado sobre ela e atraente ao indivduo. Por outro lado ela exerceria sobre este um poder coercitivo. Durkheim escreve que a coero necessria para levar o homem a se superar, a acrescentar sua natureza fsica outra natureza; mas, medida que aprende a apreciar os encantos dessa nova existncia [que a vida em sociedade], ele contrai essa necessidade e no h ordem de atividade em que no os busque com paixo (DURKHEIM, 1999, p. XXII).J na introduo e na concluso de sua obra intitulada As Formas Elementares da Vida Religiosa, Durkheim aborda a religio como fonte tanto das categorias do entendimento quanto da prpria conscincia coletiva. O autor afirma que os primeiros sistemas de representaes que o homem se fez do mundo e de si mesmo so de origem religiosa (DURKHEIM, 1983, p. 211). Desse modo, as categorias do entendimento, que envolvem as ideias de tempo, de espao, de identidade, dentre outras, so provenientes das religies, que tambm so coisas sociais, produtos do pensamento coletivo (DURKHEIM, 1983, p. 212).Como coisas sociais, as categorias do entendimento no so realidades a priori, anteriores experincia sensvel do indivduo, nem podem derivar desta experincia, mas traduzem antes de tudo estados da coletividade: dependem da maneira pela qual esta constituda e organizada, de sua morfologia, de suas instituies religiosas, morais, econmicas, etc. (DURKHEIM, 1983, p. 216). interessante destacar tambm que, para Durkheim, as representaes coletivas e, dentre elas, as categorias do entendimentoso o produto de uma imensa cooperao que se estende no apenas no espao, mas no tempo; para faz-las, uma multido de espritos diversos associaram, misturaram combinaram suas ideias e sentimentos; longas sries de geraes acumularam aqui sua experincia e seu saber (DURKHEIM, 1983, p. 216).Por isso elas vo alm da experincia individual. Ademais, os seres humanos possuem uma dupla dimenso. Alm de termos uma dimenso individual (biolgica), temos tambm uma dimenso social (moral). Por isso somos capazes de ultrapassarmos a ns mesmos enquanto participamos da vida em sociedade.Durkheim afirma tambm que toda religio , por um lado, um sistema de ideias respondendo a um objeto determinado, podendo ser esse objeto natureza, infinito, incognoscvel, ideal, etc. (DURKHEIM, 1983, p. 222). Por outro lado, a religio tambm um culto, ou seja, um sistema de prticas que eleva o fiel para cima de sua prpria natureza. Alm disso, por meio do culto que a f se cria e se recria periodicamente (DURKHEIM, 1983, p. 223). Por fim, o autor escreve que todas as religies tm como substrato a prpria sociedade.Destacamos estes dentre os vrios pontos abordados por Durkheim nas obras que citamos primeiramente porque julgarmos que eles so centrais no trabalho do autor e, em segundo lugar, porque acreditamos que alguns deles so passveis de problematizao.

De acordo com Max Weber, o cientista social faz parte da sociedade que se prope a estudar, portanto esta desperta seus interesses e mobiliza seus valores. Alis, as prprias ideias de valor atuam na determinao do objeto de estudo do pesquisador. Isso no significa que a cincia social seja subjetiva, pois a observncia do mtodo cientfico garante a produo de um conhecimento objetivo, ou seja, um conhecimento que pretende ser vlido para todos os que querem a verdade (WEBER, 1999, p. 100; grifo do autor). Disso tiramos duas concluses: 1) se o socilogo faz parte da sociedade e no consegue se desvencilhar dela, a adoo do mtodo das cincias positivas no estudo da sociedade problemtica, pois tal mtodo prev a separao radical entre sujeito e objeto. 2) os valores do socilogo no podem ser deixados de lado, como propunha Durkheim, apesar de poderem ser controlados pelo mtodo cientfico.Como vimos, Durkheim argumenta que os sindicatos no conseguiriam substituir as corporaes de ofcio como fontes de uma moral profissional e pblica porque, dentre outros motivos, os sindicatos dos patres e os de empregados no dialogariam com o objetivo de constituir normas que seriam estendidas ao conjunto da sociedade. Ora, nos parece que um dos pressupostos do autor que os membros que compem o corpo social seriam capazes de se aglutinar pelo bem da prpria sociedade. Por isso ele parece ignorar aqui as divergncias de interesses que, de acordo com Karl Marx e Friedrich Engels (2001), existem entre patres e empregados. A nosso ver, essa divergncia de interesses que impediria o dilogo entre as duas modalidades de sindicato. Se considerarmos, ento, a perspectiva marxiana, o pressuposto da autorregulamentao parece irreal.Por fim, percebemos que, apesar de Durkheim admitir que as representaes coletivas so variveis de acordo com os contextos sociais, a perspectiva do autor um tanto esttica por focalizar a estabilidade daquelas representaes. por isso que, de acordo com Celso Pereira de S, Serge Moscovici, ao desenvolver a Teoria das Representaes Sociais, parte do conceito de representaes coletivas, para fugir ao individualismo vigente na psicologia social, mas se afasta da perspectiva durkheimiana ao observar que, nas sociedades contemporneas, os elementos religiosos estudados por Durkheim teriam perdido sua fixidez, alm de existirem nessas sociedades novos fenmenos representacionais de origem e mbito bastante diversos (S, 1995, p. 22).Vemos que o pensamento de Durkheim, como qualquer outra perspectiva sociolgica, passvel de crticas. Porm, inegvel a sua contribuio para a fundao da Sociologia enquanto Cincia e, por que no dizer, para a explicao ou para a interpretao dos fenmenos sociais de hoje.Referncias Bibliogrficas

DURKHEIM, mile. As formas elementares da vida religiosa. In: Durkheim. Os Pensadores. Vol.: XXXIII. So Paulo: Abril Cultural, 1983. Introduo e Concluso.

______. Da diviso do trabalho social. So Paulo, Martins fontes, 1999. Prefcio 2. Edio; Prefcio 1. Edio e Introduo.MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Manifesto do Partido Comunista. Porto Alegre: L&PM, 2001.

S, Celso Pereira de. Representaes sociais: o conceito e o estado atual da teoria. In: SPINK, Mary Jane Paris (Org.). O conhecimento no cotidiano: as representaes sociais na perspectiva da psicologia social. So Paulo: Brasiliense, 1995. Cap. 1, p. 19-45.

WEBER, Max. A objetividade do conhecimento nas Cincias Sociais. In. COHN, Gabriel. Max Weber: Sociologia [Coleo Grandes Cientistas Sociais]. So Paulo: tica, 1999, pp. 79-128.