Download (6)

1
Universidade Estadual de Campinas – 21 a 27 de agosto de 2006 9 LUIZ SUGIMOTO [email protected] igmund Freud viveu numa sociedade que exercia forte controle sobre o comportamento sexual dos indivíduos, em especial das mulheres, que se sentiam cul- padas, pecaminosas e sujas ao ve- rem brotar os desejos dentro de si. A repressão sexual era a base para a neurose do tipo histeria que, par- ticularmente na Europa ocidental, tornou-se quase epidemia em to- das as classes sociais: jovens mu- lheres apresentavam quadros gra- ves com desmaios, alterações de dupla personalidade, paralisias, convulsões. Na sociedade de hoje, sexualmente liberalizada, aquelas neuroses clássicas dificilmente são en- contradas – por ve- zes em subgrupos específicos, como de religiosos onde o controle da libido permanece intenso. “Mas vale acrescentar que Freud, sua teoria e a psicanálise contribu- íram muito para aumentar a tole- rância e permitir as realizações se- xuais. É uma prova de que Freud está presente em nosso tempo”, observa o psiquiatra e psicanalis- ta Mário Eduardo Costa Pereira, professor da Faculdade de Ciênci- as Médicas. “A atualidade do pensamento freudiano” é o tema do 1º Simpósio Internacional sobre os 150 Anos de Freud, que vai reunir na Unicamp especialistas brasileiros e france- ses, entre 24 e 26 de agosto (veja texto nesta página). O encontro co- memora uma data redonda do nas- cimento de um dos autores mais importantes do século 20, que pro- vocou uma revolução no âmbito humano ao desenvolver uma teo- ria da mente a partir dos processos psíquicos inconscientes e uma téc- nica terapêutica para pessoas afe- tadas psiquicamente. Mas permi- te principalmente para fazer um balanço sobre a atualidade de seu pensamento e incentivar uma dis- cussão visando reposicionar os ei- xos da própria psicanálise. “A his- tória da psicanálise mostra que se esperava de Freud mais do que ele criou ou poderia dar, na expectati- va de encontrar em suas teorias e práticas uma explicação geral pa- ra tudo que decorra do humano. Trata-se de um grande mal-enten- dido dentro da disciplina, que pre- cisa estabelecer claramente qual é o seu âmbito de competência”, a- firma Costa Pereira, coordenador do evento. O professor, que coordena tam- bém o Laboratório de Psicopato- logia Fundamental, do Departa- mento de Psicologia Médica e Psi- quiatria, lembra que até Freud a- creditava-se que o humano era transparente por si mesmo, capaz de conhecer-se através da consci- ência. Freud mostrou toda uma di- mensão da mente que determina os caminhos do indivíduo, um mo- tor inconsciente que não reflete a- penas uma pureza ou espontanei- dade interior, mas as marcas da tradição, cultura e língua da famí- lia que prepara o acolhimento da criança no mundo. Seus conceitos de inconsciente, desejos e recalque propõem uma mente não mais u- nitária mas dividida, em conflito consigo mesma e dominada em cer- ta medida por tendências eróticas e agressivas escondidas, mas que se manifestam nos lapsos e nos so- nhos. “Hoje, se você comete um lap- so quando conversa, a outra pessoa logo verá algo que o lapso denuncia. É um sinal de que todos nós já lemos o humano com olhos freudianos”, exemplifica o organizador do sim- pósio. Se as histerias dos tempos de Freud já não estão tão presentes, Mário Costa Pereira ressalta as es- tatísticas no campo da psiquiatria mostrando que as taxas de depres- são crescem sem parar. “É evidente que o pensamento freudiano en- contra desafios com as marcas dos nossos tempos, como o debate com as neurociências, com o atual sis- tema econômico neoliberal e a construção de subjetividades nu- ma sociedade globalizada”, pon- dera. Nesse sentido, o professor con- sidera que a teoria e a metodologia de Freud talvez sejam as únicas que se propõem a estudar a subjetividade, tomando cada ser humano como singular, mesmo pertencendo ao grupo genérico dos humanos. Entre os parâmetros ideias de hoje para que o indivíduo avalie sua vida, segundo o professor, es- tão o trabalho, o dinheiro, a beleza, os bens de consumo, o sucesso. No entanto, pouquíssimas pessoas al- cançam estas metas, sendo que mui- tas já são antecipadamente excluí- das da corrida, impedidas sequer de sonhar com esses ideais por causa das condições socioeconômicas. “O preço para se atingir as promessas de felicidade capitalista é a frustra- ção, a angústia, o estresse, a hiper- tensão, a crise de pânico. Há quem atinja e se dá conta de que não che- gou ao paraíso. Quem se vê excluí- do do processo, acha-se um ser hu- mano de segunda categoria e fica igualmente a um passo da depres- são”, atesta. Mário Costa Pereira estará entre os palestrantes do primeiro dia de simpósio, relacionando a atuali- dade do pensamento de Freud face aos avanços das neurociências e da genética psiquiátrica na concep- ção do funcionamento mental hu- mano. Ele vai advertir sobre o ris- co de se incorrer no mesmo pecado cometido pela psicanálise contem- porânea, esperando-se das neu- rociências, por exemplo, respostas para todas as questões do humano. “Nenhum pesquisador sério su- põe que exista um processo psíqui- co desancorado de uma base ma- terial. O problema está em aceitar, simplesmente, que o único registro válido de pensar o humano esteja no nível neurobiológico ou genéti- co, buscando soluções com base nas pesquisas com neurônios, sinapses e neurotransmissores. É preciso le- var em conta os conflitos amorosos, os sentimentos de culpa e de espe- rança, os desejos, em seu registro próprio, sem chegar ao ponto de descrever tudo isso na linguagem das moléculas”, compara. Do divã à pílula – Em outra re- ferência aos recursos modernos – quando Freud recorria às confidên- cias do divã, através do método da associação livre (e antes da hipno- se) –, o professor de Unicamp faz ressalvas quanto ao uso, sobretu- do ideológico, dos medicamentos disponíveis para aliviar sintomas como mal-estar, depressão, ansie- dade, insônia, impotência e para o controle de sintomas psicóticos. “As drogas são úteis do ponto de vista clínico, mas as grandes ques- tões humanas não se resumem à falta de Prozac. Uma boa pílula não ataca os problemas concretos em nível existencial. Também é verda- de que, tecnicamente, estamos cada vez mais próximos da ‘pílula da fe- licidade’, o que vai exigir uma ava- liação dos aspectos éticos na intro- dução desse tipo de droga, pois os conflitos e desejos humanos, en- quanto ais, estão fora do âmbito da farmacologia”. A propósito, Costa Pereira a- crescenta que nunca houve uma O que Freud explica nos dias de hoje? “Freud é um desses autores incontornáveis, que quando expulso pela porta, volta pela janela, tocando no âmago das grandes questões humanas. O pensamento freudiano tem defensores e críticos, mas sempre servirá como um dos pólos do debate sobre o psiquismo e como matriz comum para as diversas escolas da psicanálise e para praticamente todas as áreas psíquicas”, ilustra o professor Mário Eduardo Costa Pereira, coordenador do 1º Simpósio Internacional sobre os 150 Anos de Freud. As mesas do simpósio estão organizadas para debater a atualidade do pensamento de Freud e sua contribuição na clínica psicanalítica e na formação de analistas, bem como os novos horizontes e desafios na área. Os convidados, brasileiros e franceses, são todos conhecidos no meio e envolvidos em debates sobre os novos horizontes e desafios para a psicanálise. Para não omitir nenhum brasileiro, Costa Pereira oferece informações apenas sobre os franceses. Jean-Jacques Rassial, professor titular da Universidade de Marselha, é bastante conhecido no Brasil por seus trabalhos sobre adolescência, mas também vem atuando na relação da psicanálise com as ciências cognitivas. Jacquy Chemouni, da Universidade de Caen, vai falar de psicanálise e política, confrontando as visões freudiana e marxista. Jacques André, da Universidade Paris 7, realiza pesquisas com a adolescência e também com um tipo de alteração importante da personalidade chamada de “estados-limites”. Simpósio na Unicamp discute atualidade do pensamento freudiano e novos desafios da psicanálise medicina tão baseada na ciência e tecnologia, cuja eficácia está com- provada, mas que provoca sérios reflexos na clínica médica. “Temos cada vez mais médicos especialis- tas, com conhecimentos que bro- tam das ciências naturais, e menos a figura do médico que se preocu- pe com a dimensão humana da doença e o sofrimento do pacien- te. Não é casual, portanto, o núme- ro sem precedentes de pessoas de todas as classes sociais que estão recorrendo a curas alternativas e espirituais – cristais, duendes, bru- xarias. Novamente, vemos um si- nal de que a tecnologia dá resposta a problemas pontuais, mas deixa completamente intocadas as gran- des questões humanas, as quais emergem com toda sua intensida- de justamente no âmbito da práti- ca médica”. Uma crítica ácida a Freud é de ter se ocupado somente de pacientes da classe abastada da sociedade e que seus estudos talvez tenham sido limitados por peculiaridades desta elite. Ainda hoje, a psicaná- lise é inacessível para a maioria da população, o que representa outro desafio, na opinião de Costa Perei- ra. “É realmente importante con- ceber técnicas que não sejam tão dispendiosas, ao alcance dos paci- entes mais pobres. Um caminho é disponibilizar a psicanálise nos serviços públicos de saúde. O Hos- pital das Clínicas da Unicamp já oferece uma clínica psicanalítica, que obviamente não segue os pa- râmetros de uma clínica privada de Viena do século 19, mas nos o- briga a reteorizar o uso de dispo- sitivos clínicos propriamente psi- canalíticos que possam ser úteis à população”, informa. Outro bom caminho aberto no Brasil, na opinião do professor, é o Programa de Saúde da Família, que pretende dar vez a um tipo de pro- fissional preocupado em atender e ouvir o paciente inserido em seu contexto econômico, social e fami- liar. Mário Costa Pereira observa aí uma contradição do sistema de saúde, pois nele o médico é remu- nerado por procedimentos técni- cos e se paga pouco por consultas. “No nosso sistema tempo é dinhei- ro, sendo que o serviço público ain- da precisa dar conta da grande de- manda. Por outro lado, para a po- pulação, a figura do profissional altamente especializado que reco- menda exames sofisticados virou um fetiche, quando a maior parte dos casos poderia ser resolvida no nível da clínica geral. Introduzir no sistema o médico de família, que olhe o paciente como um humano doente e não como um corpo bioló- gico doente, é mais um desafio para a política de saúde”. 150 ANOS DE FREUD S Encontro marca os 150 anos do nascimento de Freud Foto: Reprodução Oscar Nemon esculpindo Freud “zangado com a humanidade”, em 1931, foto reproduzida de Diário de Sigmund Freud – 1929-1939: crônicas breves (Artmed, 2000) O professor Mário Eduardo Costa Pereira, coordenador do simpósio: “O pensamento freudiano servirá como um dos pólos do debate sobre psiquismo” Foto: Antoninho Perri INFORMAÇÕES www.fcm.unicamp.br/ departamentos/psiquiatria/ psicopatologia/simposio-freud

description

kmnoih

Transcript of Download (6)

Page 1: Download (6)

Universidade Estadual de Campinas – 21 a 27 de agosto de 2006 9

LUIZ [email protected]

igmund Freud viveu numasociedade que exercia forte

controle sobre o comportamentosexual dos indivíduos, em especialdas mulheres, que se sentiam cul-padas, pecaminosas e sujas ao ve-rem brotar os desejos dentro de si.A repressão sexual era a base paraa neurose do tipo histeria que, par-ticularmente na Europa ocidental,tornou-se quase epidemia em to-das as classes sociais: jovens mu-lheres apresentavam quadros gra-ves com desmaios, alterações dedupla personalidade, paralisias,convulsões. Na sociedade de hoje,sexualmente liberalizada, aquelas

neuroses clássicasdificilmente são en-contradas – por ve-zes em subgruposespecíficos, comode religiosos onde ocontrole da libidopermanece intenso.

“Mas vale acrescentar que Freud,sua teoria e a psicanálise contribu-íram muito para aumentar a tole-rância e permitir as realizações se-xuais. É uma prova de que Freudestá presente em nosso tempo”,observa o psiquiatra e psicanalis-ta Mário Eduardo Costa Pereira,professor da Faculdade de Ciênci-as Médicas.

“A atualidade do pensamentofreudiano” é o tema do 1º SimpósioInternacional sobre os 150 Anos deFreud, que vai reunir na Unicampespecialistas brasileiros e france-ses, entre 24 e 26 de agosto (vejatexto nesta página). O encontro co-memora uma data redonda do nas-cimento de um dos autores maisimportantes do século 20, que pro-vocou uma revolução no âmbitohumano ao desenvolver uma teo-ria da mente a partir dos processospsíquicos inconscientes e uma téc-nica terapêutica para pessoas afe-tadas psiquicamente. Mas permi-te principalmente para fazer umbalanço sobre a atualidade de seupensamento e incentivar uma dis-cussão visando reposicionar os ei-xos da própria psicanálise. “A his-tória da psicanálise mostra que seesperava de Freud mais do que elecriou ou poderia dar, na expectati-va de encontrar em suas teorias epráticas uma explicação geral pa-ra tudo que decorra do humano.Trata-se de um grande mal-enten-dido dentro da disciplina, que pre-cisa estabelecer claramente qual éo seu âmbito de competência”, a-firma Costa Pereira, coordenadordo evento.

O professor, que coordena tam-bém o Laboratório de Psicopato-logia Fundamental, do Departa-mento de Psicologia Médica e Psi-quiatria, lembra que até Freud a-creditava-se que o humano eratransparente por si mesmo, capazde conhecer-se através da consci-ência. Freud mostrou toda uma di-mensão da mente que determinaos caminhos do indivíduo, um mo-tor inconsciente que não reflete a-penas uma pureza ou espontanei-dade interior, mas as marcas datradição, cultura e língua da famí-lia que prepara o acolhimento dacriança no mundo. Seus conceitosde inconsciente, desejos e recalquepropõem uma mente não mais u-nitária mas dividida, em conflitoconsigo mesma e dominada em cer-ta medida por tendências eróticase agressivas escondidas, mas quese manifestam nos lapsos e nos so-

nhos. “Hoje, se você comete um lap-so quando conversa, a outra pessoalogo verá algo que o lapso denuncia.É um sinal de que todos nós já lemoso humano com olhos freudianos”,exemplifica o organizador do sim-pósio.

Se as histerias dos tempos deFreud já não estão tão presentes,Mário Costa Pereira ressalta as es-tatísticas no campo da psiquiatriamostrando que as taxas de depres-são crescem sem parar. “É evidenteque o pensamento freudiano en-contra desafios com as marcas dosnossos tempos, como o debate comas neurociências, com o atual sis-tema econômico neoliberal e aconstrução de subjetividades nu-ma sociedade globalizada”, pon-dera. Nesse sentido, o professor con-sidera que a teoria e a metodologia deFreud talvez sejam as únicas que sepropõem a estudar a subjetividade,tomando cada ser humano comosingular, mesmo pertencendo aogrupo genérico dos humanos.

Entre os parâmetros ideias dehoje para que o indivíduo avaliesua vida, segundo o professor, es-tão o trabalho, o dinheiro, a beleza,os bens de consumo, o sucesso. Noentanto, pouquíssimas pessoas al-cançam estas metas, sendo que mui-tas já são antecipadamente excluí-das da corrida, impedidas sequer desonhar com esses ideais por causadas condições socioeconômicas. “Opreço para se atingir as promessasde felicidade capitalista é a frustra-ção, a angústia, o estresse, a hiper-tensão, a crise de pânico. Há quematinja e se dá conta de que não che-gou ao paraíso. Quem se vê excluí-do do processo, acha-se um ser hu-mano de segunda categoria e ficaigualmente a um passo da depres-são”, atesta.

Mário Costa Pereira estará entreos palestrantes do primeiro dia desimpósio, relacionando a atuali-dade do pensamento de Freud faceaos avanços das neurociências e da

genética psiquiátrica na concep-ção do funcionamento mental hu-mano. Ele vai advertir sobre o ris-co de se incorrer no mesmo pecadocometido pela psicanálise contem-porânea, esperando-se das neu-rociências, por exemplo, respostaspara todas as questões do humano.“Nenhum pesquisador sério su-põe que exista um processo psíqui-co desancorado de uma base ma-terial. O problema está em aceitar,simplesmente, que o único registroválido de pensar o humano estejano nível neurobiológico ou genéti-co, buscando soluções com base naspesquisas com neurônios, sinapsese neurotransmissores. É preciso le-var em conta os conflitos amorosos,os sentimentos de culpa e de espe-rança, os desejos, em seu registropróprio, sem chegar ao ponto dedescrever tudo isso na linguagemdas moléculas”, compara.

Do divã à pílula – Em outra re-ferência aos recursos modernos –quando Freud recorria às confidên-cias do divã, através do método daassociação livre (e antes da hipno-se) –, o professor de Unicamp fazressalvas quanto ao uso, sobretu-do ideológico, dos medicamentosdisponíveis para aliviar sintomascomo mal-estar, depressão, ansie-dade, insônia, impotência e para ocontrole de sintomas psicóticos.“As drogas são úteis do ponto devista clínico, mas as grandes ques-tões humanas não se resumem àfalta de Prozac. Uma boa pílula nãoataca os problemas concretos emnível existencial. Também é verda-de que, tecnicamente, estamos cadavez mais próximos da ‘pílula da fe-licidade’, o que vai exigir uma ava-liação dos aspectos éticos na intro-dução desse tipo de droga, pois osconflitos e desejos humanos, en-quanto ais, estão fora do âmbito dafarmacologia”.

A propósito, Costa Pereira a-crescenta que nunca houve uma

O que Freud explica nos dias de hoje?

“Freud é um desses autoresincontornáveis, que quando expulsopela porta, volta pela janela, tocandono âmago das grandes questõeshumanas. O pensamento freudianotem defensores e críticos, massempre servirá como um dos pólosdo debate sobre o psiquismo e comomatriz comum para as diversasescolas da psicanálise e parapraticamente todas as áreaspsíquicas”, ilustra o professor MárioEduardo Costa Pereira, coordenadordo 1º Simpósio Internacional sobreos 150 Anos de Freud. As mesas dosimpósio estão organizadas paradebater a atualidade do pensamentode Freud e sua contribuição na clínicapsicanalítica e na formação deanalistas, bem como os novoshorizontes e desafios na área.

Os convidados, brasileiros efranceses, são todos conhecidos nomeio e envolvidos em debates sobreos novos horizontes e desafios paraa psicanálise. Para não omitirnenhum brasileiro, Costa Pereiraoferece informações apenas sobre osfranceses. Jean-Jacques Rassial,professor titular da Universidade deMarselha, é bastante conhecido noBrasil por seus trabalhos sobreadolescência, mas também vematuando na relação da psicanálisecom as ciências cognitivas. JacquyChemouni, da Universidade deCaen, vai falar de psicanálise epolítica, confrontando as visõesfreudiana e marxista. Jacques André,da Universidade Paris 7, realizapesquisas com a adolescência etambém com um tipo de alteraçãoimportante da personalidadechamada de “estados-limites”.

Simpósio na Unicamp discute atualidade do pensamento freudiano e novos desafios da psicanálise

medicina tão baseada na ciência etecnologia, cuja eficácia está com-provada, mas que provoca sériosreflexos na clínica médica. “Temoscada vez mais médicos especialis-tas, com conhecimentos que bro-tam das ciências naturais, e menosa figura do médico que se preocu-pe com a dimensão humana dadoença e o sofrimento do pacien-te. Não é casual, portanto, o núme-ro sem precedentes de pessoas detodas as classes sociais que estãorecorrendo a curas alternativas eespirituais – cristais, duendes, bru-xarias. Novamente, vemos um si-nal de que a tecnologia dá respostaa problemas pontuais, mas deixacompletamente intocadas as gran-des questões humanas, as quaisemergem com toda sua intensida-de justamente no âmbito da práti-ca médica”.

Uma crítica ácida a Freud é de terse ocupado somente de pacientesda classe abastada da sociedade eque seus estudos talvez tenhamsido limitados por peculiaridadesdesta elite. Ainda hoje, a psicaná-lise é inacessível para a maioria dapopulação, o que representa outrodesafio, na opinião de Costa Perei-ra. “É realmente importante con-ceber técnicas que não sejam tãodispendiosas, ao alcance dos paci-entes mais pobres. Um caminho édisponibilizar a psicanálise nosserviços públicos de saúde. O Hos-pital das Clínicas da Unicamp jáoferece uma clínica psicanalítica,que obviamente não segue os pa-râmetros de uma clínica privadade Viena do século 19, mas nos o-briga a reteorizar o uso de dispo-sitivos clínicos propriamente psi-canalíticos que possam ser úteis àpopulação”, informa.

Outro bom caminho aberto noBrasil, na opinião do professor, é oPrograma de Saúde da Família, quepretende dar vez a um tipo de pro-fissional preocupado em atendere ouvir o paciente inserido em seu

contexto econômico, social e fami-liar. Mário Costa Pereira observaaí uma contradição do sistema desaúde, pois nele o médico é remu-nerado por procedimentos técni-cos e se paga pouco por consultas.“No nosso sistema tempo é dinhei-ro, sendo que o serviço público ain-da precisa dar conta da grande de-manda. Por outro lado, para a po-pulação, a figura do profissionalaltamente especializado que reco-menda exames sofisticados virouum fetiche, quando a maior partedos casos poderia ser resolvida nonível da clínica geral. Introduzirno sistema o médico de família, queolhe o paciente como um humanodoente e não como um corpo bioló-gico doente, é mais um desafio paraa política de saúde”.

150 ANOSDE FREUD

S

Encontromarca os150 anos donascimentode Freud

Foto: Reprodução

Oscar Nemon esculpindo Freud “zangado com a humanidade”, em 1931, fotoreproduzida de Diário de Sigmund Freud – 1929-1939: crônicas breves (Artmed, 2000)

O professor Mário Eduardo CostaPereira, coordenador do simpósio:“O pensamento freudiano servirácomo um dos pólos do debatesobre psiquismo”

Foto: Antoninho Perri

INFORMAÇÕESwww.fcm.unicamp.br/departamentos/psiquiatria/psicopatologia/simposio-freud