Doença Trofoblástica Gestacional: aspectos clínicos

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DOENÇA TROFOBLÁSTICA DOENÇA TROFOBLÁSTICA GESTACIONAL GESTACIONAL 1.SINTOMATOLOGIA Consoante Rezende (2008), o início da afecção é muito semelhante à instalação da gravidez normal, ameaçada pelas perdas hemorrágicas e distúrbios gravídicos mais intensos (náuseas, vômitos, sialorréia). A sintomatologia mais característica, também denominada período de estado, abrange, entre outros sinais e sintomas: Hemorragia, de caráter precoce, aparecendo por volta do segundo mês. O sangramento é indolor, sem causas aparentes, recorrente, com intensidade progressiva, aumentando em cada crise, sempre mais grave que o anterior; Corrimento vaginal, entremeando as hemorragias. É equivocada a hipótese de que o líquido provenha da rotura das membranas, já que não existe cavidade amniótica em casos de DTG. A coagulação do sangue no interior do útero explica a origem desse corrimento: os coágulos ficam retidos enquanto o plasma escoa; Emissão de vesículas: apesar de não possuir nenhum valor clínico – por só apresentar-se no começo do trabalho de abortamento, quando o diagnóstico já está confirmado – esse é o sinal patognomônico da DTG;

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DOENÇA TROFOBLÁSTICA GESTACIONALDOENÇA TROFOBLÁSTICA GESTACIONAL

1. SINTOMATOLOGIA

Consoante Rezende (2008), o início da afecção é muito semelhante à instalação da

gravidez normal, ameaçada pelas perdas hemorrágicas e distúrbios gravídicos mais intensos

(náuseas, vômitos, sialorréia). A sintomatologia mais característica, também denominada

período de estado, abrange, entre outros sinais e sintomas:

Hemorragia, de caráter precoce, aparecendo por volta do segundo mês. O

sangramento é indolor, sem causas aparentes, recorrente, com intensidade

progressiva, aumentando em cada crise, sempre mais grave que o anterior;

Corrimento vaginal, entremeando as hemorragias. É equivocada a hipótese de que

o líquido provenha da rotura das membranas, já que não existe cavidade amniótica

em casos de DTG. A coagulação do sangue no interior do útero explica a origem

desse corrimento: os coágulos ficam retidos enquanto o plasma escoa;

Emissão de vesículas: apesar de não possuir nenhum valor clínico – por só

apresentar-se no começo do trabalho de abortamento, quando o diagnóstico já está

confirmado – esse é o sinal patognomônico da DTG;

Anemia, em conseqüência das perdas sanguíneas constantes, determinando o

caráter pálido da pele e descoramento das mucosas. Em decorrência da anemia,

observa-se astenia, taquicardia e baixa acentuada do hematócrito;

Toxemia gravídica, revelada por vômitos repetidos, incessantes, que podem levar à

hiperêmese gravídica, além da sialorréia. O aparecimento de toxemia gravídica

antes das 24 semanas de gravidez sugere, acentuadamente, mola hidatiforme.

Medgrupo (2008) ratifica todos os sinais e sintomas supracitados, acrescentando os

seguintes:

Útero amolecido, indolor e maior que o esperado para a idade gestacional,

denominado “útero em sanfona”. Após a eliminação de material intra-uterino, há

um novo crescimento do útero, com grande acúmulo de coágulos. Normalmente

não há ausculta dos batimentos cardiofetais;

Altos níveis de beta-hCG, justificando as náuseas e vômitos intensos;

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Cistos ovarianos teca-luteínicos, geralmente de forma bilateral, levando à presença

de massa anexial palpável ao exame ginecológico. Isso ocorre devido a

hiperestimulação dos ovários pelo hCG.

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2. DIAGNÓSTICOS MÉDICOS

O diagnóstico da Doença Trofoblástica Gestacional (DTG) é clínico, ultra-sonográfico

e laboratorial. Percebe-se a completa inter-relação entre essas três modalidades diagnósticas,

já que uma confirma a hipótese diagnóstica levantada pelas outras (MEDGRUPO, 2008).

A Organização Mundial de Saúde (1983) reconhece o diagnóstico de doença

trofoblástica gestacional mediante níveis elevados de β-hCG por período maior de 4 semanas

(teores séricos superiores a 200.000 mU/mL) e presença de vesículas ou “hidátides” à ultra-

sonografia.

DIAGNÓSTICO CLÍNICO

Essa modalidade diagnóstica deve ser realizada antes de todas as outras. É através dela

que pode ser estabelecida a hipótese diagnóstica da DTG. Três técnicas compreendem o

diagnóstico médico: a palpação, a auscultação e o toque (REZENDE, 2008).

À palpação, em cerca de 50% dos casos, o crescimento uterino se torna

desproporcional à idade presumível da gestação, avaliada pela data da última menstruação

(DUM). Entre a 8ª e a 12ª semanas, o fundo do útero ultrapassa a cicatriz umbilical; com 18 a

20 semanas, enche o escavado epigástrico. A mensuração da altura uterina verifica-lhe o

aumento diário de 1 cm e mais, espelhando, clinicamente, a retenção de coágulos sanguíneos.

Se a hemorragia aumenta e o sangue flui abundantemente, o útero diminui e, paulatinamente,

cresce novamente. A consistência do útero é peculiar à palpação, devido à habitual flacidez da

víscera, que se torna excessivamente mole, pastosa, depressível (REZENDE, 2008).

Segundo Rezende (2008), a ausculta, é, por regra geral, negativa em casos de doença

trofoblástica gestacional, exceto em raros casos, já que as degenerações na gravidez insipiente

são freqüentes.

Durante o toque, chama a atenção a moleza extrema da cérvice e a ausência do

rechaço fetal, mesmo em gravidez que já ultrapassou a primeira metade. Os ovários podem

ser palpados, por estarem aumentados, embora, regra geral, só seja possível a palpação

ooforopática após o esvaziamento uterino (MEDGRUPO, 2008).

DIAGNÓSTICO ULTRA-SONOGRÁFICO

À ultra-sonografia transvaginal, nos casos de DTG, os vilos se apresentam com um

padrão característico de “flocos de neve” ou “tempestade de neve”, o que pode ser

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diagnosticado em idades gestacionais precoces. Consiste em massa central heterogênea com

numerosos espaços anecóicos (espaços que, à ultra-sonografia, não apresentam ecos)

discretos, os quais correspondem ao edema difuso das vilosidades coriônicas hidrópicas.

Como já descrito, é comum o achado de cistos ovarianos teca-luteínicos (MEDGRUPO,

2008).

Rezende (2008) afirma que a maioria dos casos de doença trofoblástica gestacional

(70%) vista no 1º trimestre é confundida à USG com ovo anembrionado ou ovo morto retido.

As dificuldades diagnósticas se acentuam em muitos casos de DTG devido à degeneração da

placenta ou à separação do útero normal em relação ao tecido molar.

DIAGNÓSTICO LABORATORIAL

O diagnóstico laboratorial tem hoje um valor complementar ao ultra-som no

diagnóstico da DTG (REZENDE, 2008). Segundo Medgrupo (2008), o diagnóstico

laboratorial é baseado na dosagem de β-hCG, onde níveis superiores a 200.000 mUI/mL

sugerem doença trofoblástica gestacional, porém Rezende (2008) afirma ser 100.000 mUI/mL

o limite a ser procurado pra se diagnosticar essa patologia.

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3. TRATAMENTO

Rezende (2008) preconiza que a dilatação e esvaziamento do útero é o primeiro passo

para se tratar a DTG. Esse procedimento é feito preferencialmente com a aspiração a vácuo. A

partir daí, os cistos tecaluteínicos tendem a resolução espontânea, com tratamento expectante.

A histerectomia é eventual, sendo aconselhada em pacientes que não desejam voltar a

engravidar, ou quando o tumor uterino é de grandes proporções, em casos de sepse ou

hemorragia severa.

Medgrupo (2008) adota critérios complementares no tratamento dessa patologia. A

aspiração só está indicada em úteros com fundo maior do que 10 cm. A aspiração manual

intra-uterina (AMIU) está mais indicada em casos de úteros menores que 10 cm. A

necessidade de curetagem por mais de duas oportunidades é uma provável indicação de

quimioterapia. Para o mesmo autor, a histerectomia diminui a probabilidade de recidivas.

Em continuidade ao tratamento, se faz necessário realizar o controle pós-molar, ou

seja, o acompanhamento da resolução da patologia após o esvaziamento uterino. O

seguimento pós-molar é composto das seguintes fases, de acordo com Rezende (2008) e

Medgrupo (2008):

Exames clínico: é realizado semanalmente. Normalmente o útero se encontra

involuído em 5 semanas. Um sinal favorável é o retorno da menstruação. A

persistência dos sinais e sintomas podem indicar malignização da DTG;

Ultra-sonografia: também realizada em critério semanal, deve acompanhar a

involução uterina e ovariana, e investigar a invasão miometrial;

RX de tórax: realizado a fim de surpreender metástases assintomáticas. Enquanto

os níveis de hCG estiverem elevados, deve-se realizar esse procedimento;

Dosagem seriada do β-hCG: é considerado o exame mais i mportante do

sseguimento pós-molar. Permite avaliar a idéia exata da quantidade e da vitalidade

do trofoblasto remanescente. Deve ser realizado semanalmente e, quando normal

por três semanas consecutivas (1 – 10 mUI/mL), a dosagem deve ser avaliada

mensalmente por até seis meses. Se após esse período os níveis de β-hCG

estacionarem, a paciente estará autorizada a engravidar.

Em casos de coriocarcinoma, a quimioterapia simples é realizada (NTG não-

metastática ou metastática de baixo-risco) com o metotrexato com resgate de ácido folínico

(MTX-FC), no esquema de 5 dias. As séries são repetidas até a negativação do β-hCG, que é

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dosado no primeiro dia do tratamento. Em casos de não-resposta, é necessário realizar a

quimioterapia combinada (poliquimioterapia), com o regime EMA-CO (ectoposide, MTX,

actinomicina D, ciclofosfamida e oncovin) (REZENDE, 2008).

Há ainda a possibilidade de realizar radioterapia, mesmo que pouco utilizada, quando

há metástase cerebral; ou cirurgia adjuvante, a fim de erradicar as metástases que possam ter

surgido (pulmonar, cerebral, gastrintestinal, hepática e vaginal) (MEDGRUPO, 2008).

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4. COMPLICAÇÕES

As pricipais complicações possíveis em casos de DTG são, segundo Medgrupo (2008):

Complicações abdominais;

Hemorragia;

Infecções;

Perfuração uterina;

Traumastismos operatórios;

Esterilidade;

Coriocarcinoma;

Torção ou ruptura dos ovários;

Hiperêmese gravídica;

Hiperestímulo tireoideano;

Embolização trofoblástica;

Insuficiência pulmonar;

Coagulação vascular disseminada;

Morte.

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5. PROGNÓSTICOS

Rezende (2008) afirma que, de todos os casos de DTG, 80% deles são de evolução

benigna com bom prognóstico, ou seja, apresentam remissão espontânea após o esvaziamento

uterino. Os restantes 20% se malignizam, sendo que 18% se transformam em coriocarcinoma

invasor e 2% sofrem degeneração coriocarcinomatosa.

Os principais fatores de bom prognóstico são, de acordo com Medgrupo (2008):

Nível urinário de hCG < 100.000 UI/24h ou nível sérico < 40.000/24h;

Sintomas surgidos há menos de quatro meses;

Nenhuma quimioterapia prévia;

Não ser a gravidez anterior de termo.

REFERÊNCIAS

MEDGRUPO. Obstetrícia. Edição: ENGEL, C. L. Vol. II. Rio de Janeiro: MedWriters, 2008.

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. “Doença Trofoblástica Gestacional” [relatório

técnico]. Genebra, 1983.

REZENDE, J. Obstetrícia fundamental. 11 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008.