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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
JORNALISMO X VIDEOGAMES: QUEM CRIA
ASSASSINOS MIRINS?
O CASO PESSEGHINI
Por: Aline Carvalhal
Orientador
Prof. Rodrigo Monteiro
Rio de Janeiro
2014
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
JORNALISMO X VIDEOGAMES: QUEM CRIA
ASSASSINOS MIRINS?
O CASO PESSEGHINI
Apresentação de monografia à AVM
Faculdade Integrada como requisito parcial para
obtenção do grau de especialista em Comunicação
Empresarial
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3
AGRADECIMENTOS
....a todos os meus professores
da Pós-Graduação da AVM pela
atenção e paciência, e ao colegas pelo
companheirismo e pela fast food barata
todas as terças-feiras.
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DEDICATÓRIA
.....ao meu pai e minha mãe pelo
apoio moral e financeiro e ao meu irmão
pela amizade verdadeira.
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RESUMO
Este trabalho tem por objetivo demonstrar marcas de julgamento feitas
pela mídia jornalística sob o caso de Marcelo Pesseghini, jovem acusado de
matar quatro membros da família e cometer suicídio. A pesquisa reúne um
breve histórico de videogames violentos no Brasil e resgata a Chacina de
Columbine, nos Estados Unidos, cujos responsáveis também foram acusados
de estarem sob influência de um jogo de videogame supostamente violento. O
objetivo do trabalho é gerar uma reflexão a respeito do papel da mídia e a
superficialidade com a qual tais assuntos são tratados pela mesma.
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METODOLOGIA
Em um primeiro momento, a execução do trabalho se dará mediante
análise bibliográfica para resgatar o histórico de jogos de videogame tidos
como violentos; a classificação indicativa e que órgãos fazem o controle; a
imersão proposta pelos jogos na atualidade; um olhar mais aprofundado sobre
as séries de jogos “GTA” e “Assassin’s Creed”; e a proposta de games
brasileiros como “Favela Wars”. Em um segundo momento, iremos discutir a
cobertura jornalística e os artifícios utilizados para manter certo assunto em
voga; o trabalho também propõe repensar a máxima de que “videogame é
coisa de criança”.
Em um terceiro momento partiremos para uma análise prática
destacando as notícias sobre o Caso Pesseghini e fazendo a análise do
material jornalístico e das marcas de julgamento presentes nele como tom,
imagens e adjetivação. Por fim, iremos resgatar o que foi previamente discutido
e concluir o trabalho com base na análise bibliográfica e qualitativa.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 09
CAPÍTULO I - Sobre jogos violentos e as pesquisas na área 11
1.1 Breve histórico de jogos violentos no Brasil e no mundo
1.2 Classificação indicativa
1.3 Affective Gaming e Imersão Narrativa
1.4 Grand Theft Auto e o valor cultural presente nos jogos
“violentos” da nova geração
1.5 Favela Wars e o fracasso dos games violentos frente a
ascenção de jogos cinematográficos
CAPÍTULO II - Cobertura Jornalística x videogames 29
2.1 Frame de mídia: a arte de manter a polêmica viva
2.2 Videogames: mais que uma brincadeira
CAPÍTULO III – Repercussão do Caso Pesseghini na mídia:
marcas de julgamento 34
CONCLUSÃO 41
BIBLIOGRAFIA 52
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INTRODUÇÃO
No final dos anos 50, um cientista americano chamado Willy
Higinbotham, resolveu criar o que seria mais tarde chamado de “primeiro jogo
de videogame do mundo”. O físico desenvolveu “Tennis fo Two” (Tênis para
Dois), um joguinho simulador de tênis que funcionava em um daqueles
computadores enormes. O objetivo era apenas um: entreter visitantes e
jornalistas que fossem ao Brookhaven National Laboratory, onde ele
trabalhava.
Higinbotham era, na época, um físico altamente respeitado e um dos
principais nomes por trás do Projeto Manhatan, que tinha como objetivo o
desenvolvimento de armas nucleares durante e após a Segunda Guerra
Mundial. O trabalho dele e de todos os responsáveis não era bem visto pela
sociedade e como tudo isso condizia com o surgimento dos primeiros
computadores, aquele tipo de entretenimento era uma boa maneira de trazer
algum carisma para o sisudo ambiente científico.
Mas isso também quer dizer que a pessoa por trás do primeiro
videojogo é a mesma por trás da invenção da bomba atômica. E ainda que
“Tênis para Dois” seja um inofensivo simulador de tênis/pingue-pongue, foi de
certa forma responsável por toda essa teoria da conspiração que estigmatiza
até hoje os jogos eletrônicos.
Com a migração do jornalismo para o ambiente web, assistimos essa
modalidade ir de uma análise aprofundada ou uma reportagem densa mais
característica de jornais impressos e revistas, para uma manchete impactante
seguida de um texto mais ou menos imparcial e extremamente carente de
fontes e de pesquisas a cerca do tema.
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Talvez por isso ainda vejamos situações onde a busca por uma
explicação de certo fato aliada à necessidade do imediatismo culminem em
uma notícia carregada de opiniões desconexas e respostas fáceis que já
mostram para o leitor o que, quando, onde, como e principalmente, o porquê.
O Caso da família Bovo Pesseghini, onde policiais ligaram a chacina ao jogo
de videogame “Assassin’s Creed” exemplifica a situação. Após os PMs
apontarem o fato de que o menino, principal suspeito do assassinato de quatro
pessoas, teria sido influenciado pelo jogo, centenas de sites e portais de
notícias começaram a destacar tal fato em suas matérias como sendo um
motivador real do crime.
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CAPÍTULO I
SOBRE JOGOS VIOLENTOS E AS PESQUISAS NA
ÁREA
1.1 - Breve histórico de jogos eletrônicos violentos no Brasil e
no mundo
Embora videogames já estivessem se popularizando desde a década
de 70, com a criação do Atari por Nollan Busnell e Ted Dabney, foi nos anos
90 que vimos a consolidação de grandes empresas e a construção de uma
indústria lucrativa inclusive no Brasil. Não coincidentemente, essa foi a época
do surgimento de jogos tidos como violentos a exemplo de “Mortal Kombat”
(1992) e “Doom” (1993). Devido ao sucesso, essas e várias franquias se
expandiram para outras mídias como filmes, séries de TV e quadrinhos.
Em “Jogos eletrônicos e violência: um caleidoscópio de imagens”, Lynn
Alves descreve uma pesquisa feita com jovens com o intuito de medir até que
ponto eles são influenciados negativamente por jogos eletrônicos. Como
resultado, Alves demonstrou que a violência na maior parte dos casos gera um
efeito terapêutico e uma canalização de medos, desejos e frustrações,
principalmente em jovens com problemas familiares.
“Os gamers se identificam, ora com o vencedor, ora com
o perdedor das batalhas. Vista dessa forma, a violência
pode ser considerada de forma construtiva como motor
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propulsor do desenvolvimento desses indivíduos. Nesse
sentido, os jogos se constituem em espaços de
elaboração de conflitos, medos e angústias.” (ALVES,
2004)
No entanto, essa identificação com perdedores e vencedores atinge
um nível delicado em jogos como “Mortal Kombat”. Como o nome já diz, no
game, o combate é mortal. Ou seja, um dos lados não sobrevive ao confronto
e no caso específico deste título a morte do perdedor é exageradamente cruel.
Criada em 1992 por Ed Boon e John Tobias da Midway a franquia
“Mortal Kombat”¹ é formada por jogos de luta. Inicialmente, os jogos só
estavam disponíveis para fliperamas, mas com a ascensão dos chamados
consoles caseiros, a série mudou o foco para conquistar o novo nicho.
“Mortal Kombat” ficou famoso por ser um dos poucos jogos a usar
sprites digitalizados (técnica que se aproveitava de imagens de atores reais
fantasiados) enquanto outros usavam sprites desenhados a mão; e por sua
grande quantidade de sangue e violência.
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Como destaque no quesito violência estavam as “finalizações” também
chamadas de “fatalities”, que eram movimentos especiais que podiam ser
usados no final de uma luta. Com uma determinada sequencia de botões o
vencedor podia executar o oponente de maneira extremamente violenta, com
ocorrência de desmembramento, empalação, decapitação, etc. A existência
desse recurso no jogo contribuiu para a criação da ESRB (Entertainment
Software Rating Board), órgão americano que classifica os jogos de acordo
com a faixa etária.
1.2 - Classificação indicativa
Assim como a ESRB, existem outras classificações como a BBFC
(British Board of Film Classification), PEGI (Pan European Game Information),
PA (Entertainment and Leisure Software Publishers Association) e o
DEJUS/MJ (Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e Qualidade da
Secretaria Nacional de Justiça/Ministério da Justiça). Esses órgãos explicitam
o conteúdo do jogo digital, com a idade recomendada para o jogo.
¹Após a falência da Midway, a franquia “Mortal Kombat” foi adquirida pela Warner Bros.
em julho de 2009, fazendo parte da divisão de entretenimento Warner Bros. Interactive.
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“A classificação etária é muito importante neste sentido.
Deve ser obedecida para que as crianças e adolescentes
possam crescer e brincar com o que for mais adequado,
sendo responsabilidade única e exclusivamente dos pais
verificar, permitir ou proibir que seus filhos consumam
determinados jogos digitais, pois mesmo que seja leve,
grande parte dos jogos digitais têm algo que pode ser
considerado violento ou agressivo, apesar disso, (...) é
importante para o desenvolvimento de crianças e
adolescentes, que eles tenham meios para extravasar
seus sentimentos reprimidos.” (CICANCI e SEMERANO,
2010)
Esses órgãos explicitam o conteúdo do jogo digital, com a idade
recomendada. O objetivo é manter os pais da criança a par do que o jogo
contém em termos de imagens e referências.
“A violência emerge muito mais como uma linguagem,
uma forma de dizer, que marca questões afetivas
(desestruturação familiar, ausência de limites, etc.) e
socioeconômicas (queda do poder aquisitivo,
desemprego, etc...). No caso de Narciso, este dado foi
confirmado, ao narrar a sua trajetória de vida, pontua sua
difícil relação com o pai, à fuga para as drogas, o
processo de depressão em que vive imerso e o leva,
muitas vezes, à perda do sentido da vida. Tais
comportamentos registram a necessidade da mediação
dos adultos na vida dos jovens, que precisam ser aceitos.
Esse processo de aceitação, quando não intermediado,
pode levar a comportamentos transgressores, como
utilização de drogas, vandalismos, inserção em uma
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cultura diferenciada do seu grupo, como o caso de
Caótico9, enfim, atos que os distanciam dos adultos ou
marcam um outro lugar e os aproximam dos seus pares.”
(ALVES, 2004)
Arthur Protasio em “Games e Liberdade de Expressão” destaca a
proibição como um fator prejudicial não só para o desenvolvimento do
adolescente como para o amadurecimento da própria indústria de jogos
eletrônicos.
“As proibições são ruins para incentivar a mídia dos jogos,
pois há a impressão de se estar protegendo a sociedade,
quando na realidade se perde mais do que se ganha. A
lista de narrativas e exemplos de jogos artístico culturais
descritos neste trabalho é meramente exemplificativa e a
liberdade de expressão atua com função dupla a favor
dos mesmos. Ela permite maior segurança aos
desenvolvedores em explorarem temas maduros e
consequentemente leva ao amadurecimento da mídia e à
qualidade de arte aos jogos eletrônicos. Caso já sejam
compreendidos como arte, a liberdade de expressão
apenas reitera o papel crucial da disseminação de
cultura.” (PROTASIO, p.19, 2009)
Arthur Protasio defende a Classificação Indicativa como melhor forma
de regulação, realçando sua importância aliada à uma relação positiva dos
pais com crianças e jovens que jogam videogames.
“[A Classificação Indicativa] É uma intervenção do poder
público que ainda necessita da cooperação de núcleos
familiares, mas garante liberdade aos jogadores e
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desenvolvedores de forma que qualquer abordagem e
tema sejam permitidos, desde respeitada a faixa etária
indicada, sem vetar conteúdo para toda a sociedade.
Garantindo que a cultura e arte permaneçam disponíveis
para todos os indivíduos.” (PROTASIO, p.19, 2009)
O mesmo vale para o caso do jogo “Doom” com alguns pontos
adicionais. O jogo de tiro em primeira pessoa lançado em 1993 para
computadores combinava gráficos 3D com violência gráfica. Muito popular,
“Doom” é considerado por muitos o definidor do gênero de tiro em primeira
pessoa tendo inspirado jogos que são muito populares hoje como a série “Call
of Duty” e “Battlefield”.
No entanto esses dois últimos jogos diferem de “Doom” por um detalhe
fundamental: o sangue e a alta carga de imagens satanistas. Esse fato gerou
muita polêmica na ocasião e o jogo foi muito criticado por organizações cristãs
que chamaram “Doom” de “simulador de assassinatos em massa”.
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O jogo fomentou também a discussão em torno da realidade virtual
(RV) - tecnologia emergente na época – que envolveu o senador estadual
Washington Phil Talmadge. O político tentou sem sucesso forçar as pessoas a
obterem um cadastro para uso da RV.
1.2.1 – “Doom” e o Massacre de Columbine
“Doom” chegou a ser associado ao caso do Massacre de Columbine
no dia 20 de abril de 1999. Na ocasião, dois estudantes veteranos chamados
Eric Harris e Dylan Klebold entraram atirando na Columbine High School em
Columbine localizada em Jefferson County no Colorado, Estados Unidos. Os
dois adolescentes assassinaram um total de 12 alunos e um professor e
feriram mais 24 alunos cometendo suicídio em seguida. O complexo esquema
da dupla envolveu tanques de propano na cafeteria, 99 explosivos além de
bombas em carros.
Até hoje os motivos para a tragédia não foram esclarecidos e muito se
especulou a respeito. Sendo o maior massacre já ocorrido em uma escola
americana, o caso Columbine iniciou um debate sobre o porte de armas de
fogo nos EUA.
Em 2005, “Doom” ganhou uma adaptação para os cinemas chamada
no Brasil de “Doom: A Porta do Inferno”. O filme foi considerado ruim pela
crítica especializada, rendendo o prêmio Framboesa de Ouro de Pior Ator para
o protagonista Dwayne Johnson, ex-lutador de wrestling que tentava na época
engatar a carreira de ator.
1.3 - Affective Gaming e imersão narrativa
No entanto, enquanto “Doom” teve uma estreia ruim nas telonas, outra
franquia vinda dos videogames foi muito mais longe do que todos esperavam:
“Resident Evil” (Capcom, 1996). Os filmes com a atriz Milla Jovovich que
rendem milhões de dólares existem graças ao sucesso dos jogos da Capcom,
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empresa que também é dona da famigerada série de luta “Street Fighter”
(Lutador de Rua).
O enredo do jogo eletrônico “Resident Evil” leva uma unidade tática a
investigar uma série de assassinatos estranhos nas montanhas. Ao sobrevoar
o local, eles perdem o contato com a base e são obrigados a pousar perto de
uma mansão desconhecida. Investigando o local o jogador vai montando o
quebra-cabeças do enredo que revela experiências genéticas frustradas
responsáveis pela criação de zumbis e outras criaturas que devem ser
eliminadas ao longo da aventura.
(Resident Evil)
Nos jogos subsequentes, o enredo foi modificado, mas sempre girando
em torno das experiências genéticas feitas pelo conglomerado farmacêutico
Umbrella Corporation. O jogo “Resident Evil 5” foi o mais vendido da história da
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Capcom enquanto “Resident Evil 6”, lançado em 2013, é um dos fracassos
mais recentes da empresa.
(Jogo “Resident Evil 6”)
Em “Affective Videogames and Modes of Affective Gaming”, Kiel Mark
Gilleade, Alan Dix e Jen Allanson citam “Resident Evil” ao descreverem os
fundamentos do que eles chamam de “affective gaming”, termo que não tem
tradução oficial para o português, mas que pode ser chamado para fins de
entendimento de “jogabilidade afetiva”.
A “jogabilidade afetiva” pode ser entendida como o estudo e
desenvolvimento de videogames que podem reconhecer, interpretar e simular
sentimentos do jogador. O estudo por si só se dá em um campo interdisciplinar
que junta computação, ciência, psicologia e ciência cognitiva.
No caso do trabalho de Gilleade, Dix e Allanson os fundamentos do
estudo são descritos do ponto de vista fisiológico, cobrindo parte das origens
do gênero, quão afetivos os jogos podem ser e as capacidades tecnológicas e
conceituais da atualidade.
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Os autores se baseiam em suas próprias experiências com
jogabilidade afetiva (diferente de Lynn Alves que defendeu sua tese baseada
em entrevistas com jogadores) para propor uma nova abordagem ao
desenvolvimento de jogos, baseada em várias heurísticas de design de alto
nível.
[Jill] Eu não sei o que aconteceu.
[Chris] Barry. Onde está Barry?
“Assim começa a cena da mansão no jogo de horror
Resident Evil (Capcom, 1996)- e com isso uma das
primeiras tentativas do mundo dos games rumo a
realização de uma experiência cinemática narrativa
emocionalmente imersiva. Hoje em dia, experiências
como essa, oferecida por Resident Evil no Playstation já
são lugar comum.” (GILLEADE, DIX e ALLANSON, 2005)
Nesse trecho do estudo de Gilleade, Dix e Allanson vemos que
“Resident Evil” foi um dos primeiros jogos a se utilizar do conceito de imersão
por meio de cinemática (cenas onde o jogador não está no controle do
personagem e apenas assiste como um filme). Os autores explicam essa
tendência do mercado do ponto de vista psicológico e atentam para o fato de
que se houver uma tentativa frustrada de causar emoção no jogador, isso pode
arruinar a experiência do jogo como um todo.
“Nós somos criaturas emocionais; se o sentimento não
funciona propriamente durante o jogo (ex: se Resident
Evil não dar medo no jogador), então a suspensão de
descrença do jogador pode ser negativamente afetada e
então estragar a experiência de jogo. Atuais avanços na
computação gráfica e capacidades de memória significam
que videogames são mais do que capazes de despertar
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sentimentos assim como a mídia tradicional (ex: filmes,
livros). Como resultado, jogos emocionalmente engajados
estão se tornando mais dependentes da imaginação de
game designers do que das limitações da tecnologia
disponível atualmente para promover experiências
emotivas”. (GILLEADE, DIX e ALLANSON, 2005)
Dessa forma, vemos que os jogos têm uma intenção um pouco mais
complexa do que simplesmente expor violência ao jogador. O objetivo é causar
emoção para que ele se sinta inserido na aventura (o que os autores chamam
de imersão narrativa) e não necessariamente levar a violência exposta no jogo
para o mundo real.
Em “Jogos Eletrônicos como um conceito chave para o
desenvolvimento de aplicações imersivas e interativas para o aprendizado”,
Gláucio Aranha considera que o aprendizado não é ou não deve ser visto
simplesmente como memorização, e sim como a habilidade de conectar e
manipular informações tornando-as conhecimento.
Em seu artigo, o autor descreve jogos eletrônicos como ferramenta
essencial para o treinamento educacional e mental. Aranha defende que
princípios como imersão e interatividade podem contribuir para o aprendizado
como um instrumento motivacional.
“Apesar das frequentes digressões no sentido da
necessidade de se incorporar as novas tecnologias à
prática do ensino, pouco se tem visto de efetivo e eficaz
neste sentido. Por um lado, encontramos um corpo de
agentes vindos do campo da informática, os quais atuam
no desenvolvimento de softwares, ditos educativos, sem,
contudo, uma base pedagógica que lhes dê a exata
compreensão do que deve ser compreendido como
“educação”, “ensino” e “aprendizagem. Via de regra, os
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programas produzidos com primazia destes agentes e
com fim comercial se assemelham mais a um
adestramento do que a um ambiente de aprendizagem
propriamente dito.” (ARANHA, 2006)
1.4 Grand Theft Auto e o valor cultural presente nos jogos
“violentos” da nova geração
Em 2004, foi criada uma premiação para jogos eletrônicos chamada
hoje de VGX (Spike Video Game Awards, conhecida por VGA na época da sua
criação). A premiação, semelhante ao Oscar® ganhou fama por ser um dos
primeiros eventos do tipo.
Na edição de 2013, o evento premiou o jogo “Grand Theft Auto 5”
(GTA 5) na categoria “Melhor Jogo do Ano”. A franquia “GTA” foi criada em
1997 por David Jones, Dan Houser e pelo designer Zachary Clarke. Os jogos
são desenvolvidos pelos estúdios da Rockstar Games.
O nome da série deriva de um termo policial americano usado para
designar roubo de automóveis. No Brasil, a tradução para esse tipo de crime é
“roubo qualificado de automóvel”.
A franquia, um dos produtos de entretenimento mais rentáveis da
história, sempre causou controvérsias mundialmente por geralmente colocar o
jogador no papel de um criminoso e oferecer um enredo cheio de atividades
ilegais, violência, tráfico de drogas, assassinato, prostituição, etc.
Um dos games da série, chamado “Grand Theft Auto: Vice City” retrata
membros de gangues cubanas assassinando integrantes de gangues
haitianas. A situação causou polêmica na época por parte dos dois países que
alegaram desrespeito a sua cultura. Jean-Robert Lafortune, da coligação
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haitiana-americana, foi a público falar sobre o caso e disse que o jogo era uma
apologia à destruição humana e entre grupos e etnias.
Polêmicas a parte, existe literatura de pesquisa que defende o jogo
destacando seu valor cultural. É o caso do trabalho de Arthur Protásio em
“Games e Liberdade de Expressão”:
“A série Grand Theft Auto, apesar de polêmica, merece
reconhecimento. Como evidência de que, assim como em
filmes e romances, narrativas são criadas a partir do
convívio sociais de seus desenvolvedores e a exposição
dos mesmos a outras obras de arte, as últimas iterações
buscaram retratar períodos específicos da história da
cultura norte-americana. Em Grand Theft Auto IV
(Rockstar Games, 2008), a série promove uma paródia de
várias situações da cultura norte americana atual,
criticando a política antiterrorista do governo, seus efeitos
para com os imigrantes e o crime organizado.”
(PROTASIO, 2009)
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Arthur Protasio também resgata dois artigos sobre a série que expõe a
presença de estereótipos no jogo e de que forma isso é positivo para o
jogador.
“Para Schiesel, trata-se de uma violenta, inteligente,
profana, encantadora, ofensiva, e ricamente texturizada
obra cultural satírica mascarada como diversão. Ao longo
de todo o jogo são feitas sátiras de estereótipos sociais
que auxiliam o entretenimento do jogador, combinado a
produção intelectual. Selman clarifica essa constatação
ao explicar que nenhuma outra mídia melhor solidificou
uma visão cultural do seu passado recente, pois foram os
jogos eletrônicos que utilizaram filmes, música e escrita
para um efeito maior e definiram as retratações de uma
era de gangues de rua em Los Angeles e uma Miami dos
anos 80 consumida pelo submundo do tráfico de drogas.”
(PROTASIO, p.11 2009)
1.5 Favela Wars e o fracasso dos games violentos frente a
ascensão dos jogos cinematográficos
Com o preço de consoles caseiros e seus respectivos jogos em alta
atualmente no Brasil, está sendo observado o fortalecimento de uma nova
tendência: os jogos de navegador. Mais conhecidos como browser games,
esses títulos podem ser jogados de qualquer computador e em sua maioria
são gratuitos e contam com uma loja online onde o jogador pode fazer
transações em dinheiro caso deseje um melhor equipamento que melhore as
características de seu personagem.
É nessa categoria que se encaixa “Favela Wars”, jogo da
desenvolvedora brasileira Nano Studio que surgiu em 2007 produzindo jogos
para celular, migrando para advergames (joguinhos para promover marcas
famosas), e mais tarde focando no desenvolvimento do polêmico Favela Wars.
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O jogo coloca policiais e bandidos se enfrentando em comunidades pobres do
Rio de Janeiro, com dublagem que se utiliza de gírias para ficar o mais próximo
possível da realidade.
Baseado na franquia de jogos de ficção científica “X-COM”, o jogo
brasileiro tem cerca de 200 mil jogadores cadastrados, número que não foi o
bastante para dar o retorno financeiro que a empresa esperava e culminou no
hiato do desenvolvimento do jogo. “Favela Wars” é um dos muitos jogos que
hoje funcionam no modo “free to play”, modalidade na qual o jogador não
precisa pagar para jogar, as transações financeiras são a parte e ficam por
conta do jogador. Se ele quiser ter acesso a novas ferramentas ou melhorar
seu personagem ele pode adquirir itens em uma loja virtual do game, pagando
com dinheiro real.
Peter Hansen, um dos desenvolvedores do jogo disse que a equipe
chegou a conclusão de que o modelo free-to-play não é ideal para este tipo de
jogo e atualmente eles estão conversando com parceiros e investidores para
vendê-lo do modo tradicional, ou seja, pagando pelo jogo completo, com todos
os recursos. Tal medida é no mínimo ousada levando em conta que a
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comunidade de jogadores de “Favela Wars” está acostumada com o modelo
atual e aparentemente não investe muito dinheiro para adquirir itens extras no
jogo.
É possível comparar esse fato isolado com a falência da Midway (da
franquia Mortal Kombat) que acabou cedendo os direitos da série para a
Warner Bros. Desde então “Mortal Kombat” ficou no limbo dos jogos
considerados ruins ainda que mantendo o mesmo padrão de sempre – com o
sangue, a violência e os fatalities. Segundo Lynn Alves, esses podem ser
indícios da banalização da violência nos games.
Outro dado importante refere-se a espetacularização e à
estetização das imagens violentas apresentadas nos
jogos eletrônicos, que podem levar a uma banalização da
violência, tornando necessária a mediação de outros
sujeitos para fomentar a discussão acerca do que está
sendo visto. No discurso dos sujeitos, foi possível
perceber que esse universo imagético não é visto de
forma maniqueísta, isto é, as imagens violentas são
naturalizadas. (ALVES, p 372, 2004)
Completando o pensamento de Alves, é possível supor que além da
banalização que “cega” os jovens para a violência do mundo existe também
uma tendência a banalização dos próprios jogos com temáticas
exageradamente violentas. Isso quer dizer que, de certa forma, jogos que
mostram uma violência pura e simples, sem razão de ser, deixam de ser
interessantes aos jogadores.
Isso pode explicar o fracasso de “Favela Wars”, um jogo que expõe
muito superficialmente o conflito entre policiais e traficantes. Assim como pode
explicar porque a série “Mortal Kombat” não emplacou um jogo com boas
vendas nos últimos anos e até mesmo a franquia “Doom” que ficou no
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27
passado, com todo o seu exagerado acervo de referências satanistas sem um
enredo que as sustente.
Por outro lado, jogos com enredos ricos, semelhantes a filmes, com
cenas que envolvem o jogador e contribuem para a imersão dele na narrativa
tem se erguido como vencedores em meio a todo o banho de sangue habitual
dos anos 90.
Nesse cenário destaca-se a série de jogos eletrônicos “Assassin’s
Creed” (Ubisoft,). O enredo do jogo é centrado na eterna batalha travada entre
assassinos e templários ao longo da história da humanidade. A história se
passa em 2012 e é contada na visão de Desmond Miles que resgata memórias
de seus ancestrais e revive épocas como a Terceira Cruzada da Terra Santa, o
Renascimento e a Revolução Americana, buscando encontrar uma maneira de
impedir os templários de instaurar uma Nova Ordem Mundial.
Desmond Miles é um barman e descendente de uma linhagem da
Ordem dos Assassinos. Miles é sequestrado por membros das Indústrias
Abstergo – uma fachada para os cavaleiros templários - para descobrir a
localização dos Pedaços de Éden, artefatos antigos e muito poderosos. Para
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isso, ele é forçado a usar o Animus, um dispositivo capaz de criar projeções a
partir de memórias contidas no DNA.
Assim, nos diferentes games da série, Desmond revive a história de
assassinos como Altaïr Ibn-La'Ahad da época da Terceira Cruzada da Terra
Santa. Seu principal objetivo é eliminar os membros da Ordem dos Templários,
que são responsáveis pela Terceira Cruzada.
Marcelo Pesseghini, principal suspeito de assassinar quatro membros
da família e logo após cometer suicídio era fã da franquia. Tal fato foi utilizado
pela polícia como motivador do crime. Segundo a investigação, o menino teria
tido uma crise psicótica, em outras palavras, teria confundido o real com o
imaginário.
O termo “crise”, em geral, pode ser definido como “uma
experiência durante a qual um indivíduo enfrenta um
agente de estresse considerado intransponível, apesar do
uso de abordagens características para a resolução de
problemas” (Freeman & DiTomasso, em DiTomasso &
Kovnat, 1995). Assim, as crises são “aqueles
acontecimentos da vida que atacam ou ameaçam o senso
de segurança e controle da pessoa” (Epperson-Sebour,
1990; Parad & Parad, 1990, em DiTomasso & Kovnat,
1995). Numa perspectiva estritamente psicológica,
podemos entender crise como sendo uma manifestação
súbita de uma ruptura de equilíbrio pré-existente.
(COSTA, p.5, 2006)
Conhecendo o enredo de “Assassin’s Creed”, porém a possível
influência do jogo não se sustenta. No game, o herói era incapaz de matar
pessoas comuns e tinha como objetivo unicamente assassinar templários. Vale
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ressaltar também que o assassino não utilizava nenhuma arma de fogo, objeto
do crime no caso da família Pesseghini. No entanto, a mídia não se preocupou
em entrar nesse tipo de detalhe, tendo preferência pela espetacularização do
caso.
CAPÍTULO II
COBERTURA JORNALÍSTICA E O MERCADO DE
GAMES
2.1 Frame de mídia: a arte de manter a polêmica viva
O tão discutido poder exercido pela mídia jornalística sobre a
sociedade entra em maior evidência quando identificamos e analisamos
recursos utilizados por ela não para nos prestar um serviço (que deveria ser
seu objetivo) e sim para ‘construírem’ a importância do evento noticioso que
possuem. O chamado “frame de mídia” ou “mudança de frame” refere-se a
tendência dos jornais de enfatizarem diferentes aspectos de um evento
durante seu tempo de vida para manterem a pauta viva. (CHYI e MCCOMBS,
p.1, 2004)
Nesse cenário podemos discutir a presença do jogo “Doom” nos
noticiários durante o tempo de vida na mídia da tragédia de Columbine. Vale
lembrar que o massacre onde Eric Harris e Dylan Klebold, dois veteranos da
Columbine High School em Columbine, assassinaram doze estudantes e um
professor, foi a porta de entrada para discussões sobre leis de controle de
armas, a disponibilidade de armas nos Estados unidos e a violência
envolvendo jovens.
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30
A mídia expôs intensamente o caso e quando todos esses assuntos se
esgotaram, foi a vez das discussões a respeito de subculturas e bullying,
campo onde estava inserida a suposta influência de filmes violentos e
videogames na sociedade americana. O tiroteiro resultou em ênfase na
segurança escolar e numa espécie de pânico em relação à cultura gótica,
antidepressivos, videogames e até uso da internet pelos jovens. Caracciolo
retoma o pensamento de Lynn Alves ao atentar para o fato de que tragédias
desse calibre dependem de outros fatores e quase sempre estão ligadas a
problemas familiares e sociais.
“A polêmica sobre os games violentos foi fortalecida por
crimes cometidos por usuários, como o que ocorreu na
Columbine High School, em 1999, em que dois jogadores
do game Doom mataram 13 pessoas. Mas é preciso frisar
que eventos como esse, embora gerem muita
repercussão, são casos isolados e que dependem de
uma série de fatores além dos games, como a família,
rejeição, questões sócioeconômicas, distúrbios
psicológicos e até anomalias genéticas e no cérebro.
Além disso, não se pode menosprezar o livre-arbítrio das
pessoas. Os seres humanos não são apenas produtos do
ambiente, eles são capazes de pensar por si mesmos,
fazer escolhas e agir por vontade própria sendo, portanto,
responsáveis por seus atos.” (CARACCIOLO, p.5, 2009)
Há quem acredite que a mídia frequentemente camufla-se em uma
cobrança social da razão da tragédia e pressiona autoridades o que acaba
gerando meias explicações acerca do crime que consequentemente resultam
em manchetes sensacionalistas. De acordo com a jornalista Lauren Gonzales,
as pessoas queriam respostas, e como todo episódio
violento antes ou depois de Columbine, videogames,
televisão, música e filmes teriam que sofrer as
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31
consequências até que as pessoas entendessem (se é
que um dia entenderam) o que realmente aconteceu de
errado. Harris usava Ludox, um antidepressivo. Harris não
foi aceito no exército – o que aparentemente importava
muito para ele, segundo o Rocky Mountain News. Mas
Doom deu a imprensa um alvo direto: Harris jogava
Doom. Harris atirou e matou pessoas. Portanto...
“Os Jogos eletrônicos, em geral são motivos de
preocupação de pais e professores, inúmeras
reportagens se ocupam dos jogos digitais, especialmente
dos de RPG, seja para afirmar suas qualidades e avanços
tecnológicos, ou para afirmar sua influência negativa para
as crianças, ou ainda festejá-los como artefatos culturais
que tornam as crianças e adolescentes mais inteligentes,
como afirma Johnson (2005). Diante disto, os jogos são
objetos envolvidos por polêmicas, ideias preconcebidas e
falsas análises baseadas em reportagens que são
veiculadas pela mídia, como por exemplo, o massacre de
Columbine que teve suas causas associados ao uso do
jogo eletrônico Doom II. É explícito o fascínio que eles
exercem nas crianças e adolescentes. Tornando-se então
um problema para pais e professores que se preocupam
com o tempo cada vez maior que seus filhos e alunos
passam em frente à tela. “ (MOURA, p.5)
No caso ‘Columbine/Doom’ vemos uma tentativa de explicar a tragédia
de uma maneira simplória e altamente superficial. Na época, foi noticiado que
Eric Harris havia criado um mapa amador para o jogo onde substituía os
monstros pelos rostos de seus colegas de classe, fato que nunca foi
comprovado.
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“Dessa feita, Columbine foi responsável por macular o
jogo Doom e reiniciar o choque entre defensores e
críticos dos jogos. Nesse cenário, tamanha foi a
responsabilidade atribuída aos jogos eletrônicos que, em
2001, diversos familiares das vítimas ajuizaram uma ação
coletiva contra 25 empresas do setor de entretenimento,
buscando indenização por danos punitivos no valor de
cinco bilhões de dólares. A despeito da iniciativa, tal pleito
acabou não logrando êxito, já que os juízes americanos
não vislumbraram nexo de causalidade entre os eventos.
(LEAHY, p.18, 2010)
2.2 Videogames: mais que uma brincadeira
Ao mesmo tempo em que a mídia leva os videogames tão a sério - a
ponto de crê-los como fator que influencia qualquer tipo de crime - ela também
vende jogos como um entretenimento majoritariamente infantil. Tal paradoxo
pode ser notado não só nas reportagens dos principais veículos do Brasil e do
Mundo como também em emissões televisivas (filmes, novelas e séries).
Dessa forma, um ciclo vicioso se forma: Torna-se comum relacionar
games com crianças e adolescentes porque em alguma novela do horário
nobre o filho da protagonista joga videogames. Da mesma forma, o autor da
novela observa que as pessoas fora do nicho tem essa visão e por isso, retrata
o caso dessa forma.
Em um noticiário televisivo por sua vez o jornalista cobre um evento
sobre videogames como a Brasil Game Show, onde empresas exibem seus
produtos e as novidades na área dos videogames. Embora quase nunca
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tenhamos total consciência disso, tudo o que vemos em um noticiário é
resultado de um recorte feito pelo jornalista/jornal. No caso do evento, é
comum vermos crianças e adolescentes experimentando uma novidade
qualquer da área, mascotes, pais perdidos acompanhando seus filhos.
Esses recortes, no entanto, podem não corresponder a realidade do
mercado na maioria das vezes. Uma pesquisa da Entertainment Software
Association revelou que a média de idade dos jogadores é de 37 anos nos
Estados Unidos. Sendo que a média dos jogadores que compram jogos
eletrônicos efetivamente é de 41 anos. A mesma pesquisa mostrou que em
2011, 29% dos americanos que têm 50 anos ou mais também jogam
videogames - um aumento de 9% se comparado à mesma pesquisa, feita em
1999.
De acordo com o estudo, essa realidade tem um impacto positivo na
relação entre pais e filhos: 45% dos pais entrevistados jogam com os filhos
pelo menos uma vez por semana. 91% deles são os responsáveis pela compra
ou aluguel dos games, e 98% acreditam que a classificação indicativa é justa.
Para termos de ilustração, o estudo também mostrou um aumento na
participação das mulheres no mundo dos games. Hoje, 42% dos jogadores são
do sexo feminino.
De acordo com estudos da própria Associação, a indústria movimentou
US$ 25,1 bilhões em 2010. Só o mercado de games digitais, incluindo
aplicativos móveis e games sociais, registrou um faturamento de US$ 5,9
bilhões no ano passado.
Em outras palavras, temos adultos que cresceram jogando
videogames e que mantém esse hábito depois dos 30 anos, inclusive
incentivando seus filhos no hobby de maneira saudável.
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Ainda sim, o jornalismo hoje tão urgente e ao mesmo tempo tão
preguiçoso não nos permite uma visão mais ampla da situação e quer fazer
com que as pessoas acreditem que jogos são nocivos sem ter embasamento.
CAPÍTULO III
REPERCUSSÃO DO CASO PESSEGHINI NA
MÍDIA: MARCAS DE JULGAMENTO
Se a cultura gamer só agora começa a ser visto com maior seriedade,
o caso Pesseghini não foi um bom exemplo da valorização do mercado e dos
profissionais por parte da mídia. Entenda-se por mídia tanto o jornalismo
tradicional impresso, online ou televisivo como também o blogs que há um
tempo mostram ter poderes iguais senão maiores como formadores de opinião
se comparados aos meios noticiosos tradicionais.
Conforme vimos anteriormente, O Caso Pesseghini refere-se a chacina
ocorrida no dia 5 de agosto de 2013 na Brasilândia, Zona Norte de São Paulo.
Ao todo, cinco membros da família Pesseghini foram mortos. Entre eles
estavam dois policiais militares – o sargento Luis Marcelo Pesseghini e a
mulher dele, a cabo Andreia Regina Bovo Pesseghini. O filho do casal, Marcelo
Eduardo Bovo Pesseghini de 13 anos também foi encontrado morto assim
como Benedita Oliveira Bovo, de 65 anos, e a irmã dela, Bernardete Oliveira da
Silva, 55 anos. Apesar de inicialmente ter sido especulado que o ataque era da
responsabilidade de criminosos, a versão foi descartada pelos investigadores
que apontaram o filho do casal, Marcelo, como culpado pelas mortes. O jovem
teria se matado em seguida.
Durante a investigação além de ter se descoberto que Marcelo era fã
do jogo “Assassin’s Creed” foi elaborado um laudo psiquiátrico feito com base
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em depoimentos e entrevistas pelo psiquiatra Guido Palomba. Segundo
Palomba, Marcelo sofria de uma “encefalopatia hipóxica” – falta de oxigenação
no cérebro – que fez com que ele desenvolvesse uma espécie de delírio
“similar a perda de noção do personagem Dom Quixote”. O laudo causou
polêmica por não explicar como um menino teria desenvolvido a habilidade,
força física e inteligência necessária para uma chacina com características de
assassinos profissionais.
No blog “andradetalis.wordpress”, o autor se utiliza de uma matéria
publicada no portal G1 para basear sua própria postagem. Logo no título e no
primeiro parágrafo da postagem, podemos observar o uso da adjetivação
quanto ao jogo “Assassin’s Creed”. O autor chama o jogo de ‘violento’ já
depositando sua impressão sobre o game.
Embora esse padrão venha se modificando com a consolidação de
blogueiros como reconhecidos formadores de opinião, uma vez que se trata de
um blog, não se pode cobrar imparcialidade de tal como se fosse um veículo
inteiramente e reconhecidamente jornalístico. Ao decorrer do texto, no entanto,
vemos que o autor tenta se manter imparcial, creditando toda a informação
fornecida ao laudo psiquiátrico de Marcelo Pesseghini feito posteriormente ao
crime. Tal estratégia chega a ser no mínimo paradoxal principalmente se
considerarmos que o autor termina seu texto primariamente imparcial, tomando
partido para uma vertente bastante radical: Ele pede que “para evitar a
incentivação (sic) de novos crimes, por crianças e adolescentes” que
“Assassin’s Creed seja proibido”.
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http://andradetalis.wordpress.com/2013/09/24/proibicao-assassins-creed-e-outros-games-violentos-que-
teriam-tranformado-marcelo-pesseghini-em-um-matador/ (acesso em 3 de janeiro de 2014)
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Em uma outra postagem dessa vez publicada em O Globo, é noticiada
a presença do criador da série no Brasil para a Bienal do livro. Notamos que o
portal tomou cuidado ao falar sobre o tema, referindo-se ao caso como
“suposta influência”.
http://oglobo.globo.com/megazine/as-pessoas-tem-que-entender-que-jogo-uma-simulacao-diz-criador-da-
serie-assassins-creed-9777271
![Page 38: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL · obtenção do grau de especialista em Comunicação Empresarial . 3 AGRADECIMENTOS ... Mundial. O trabalho dele e de todos os responsáveis](https://reader031.fdocumentos.tips/reader031/viewer/2022011806/5c03041b09d3f219408b61b6/html5/thumbnails/38.jpg)
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Já a publicação da Folha, traz um texto que se inicia de maneira
tendenciosa e em seguida aponta-as como vindas do laudo psicológico.
![Page 39: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL · obtenção do grau de especialista em Comunicação Empresarial . 3 AGRADECIMENTOS ... Mundial. O trabalho dele e de todos os responsáveis](https://reader031.fdocumentos.tips/reader031/viewer/2022011806/5c03041b09d3f219408b61b6/html5/thumbnails/39.jpg)
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Nota-se que o jornalista não se preocupou em colocar aspas no início
da matéria e falou diretamente com o leitor. Não fica claro se foi ou não
proposital, e do jeito como a matéria foi construída, o leitor é levado a pensar
que o veículo tem opinião formada sobre o caso ao invés de prezar pela
imparcialidade.
Outro caso, foi a cobertura feita pelo noticioso televisivo Cidade Alerta
apresentado por Marcelo Rezende. O programa policial diário, conhecido por
discutir assuntos polêmicos, falou sobre o caso Pesseghini de maneira
altamente superficial. Marcelo Rezende começa erroneamente traduzindo o
jogo para “Assassino com certeza” e se limita a dizer que o “no joguinho vai
morrendo todo mundo” e que ele influenciou o garoto que também teria dopado
sua família antes de atirar com arma de fogo na cabeça das vítimas.
A questão é que elementos como armas de fogo e entorpecentes não
fazem parte do enredo de “Assassin’s Creed”, logo não faz sentido dizer que
ele foi influenciado pelo jogo. No game, o herói Ezio usa lâminas para executar
seus inimigos e vale frisar, nenhum é membro de sua própria família, pelo
contrário. Chama atenção o modo como o apresentador expõe o game sem
discutir nada a respeito do enredo e se referindo pejorativamente a ele como
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40
“joguinho”. Marcelo Rezende afirma que Assassin’s Creed "é um dos jogos que
está (sic) sendo rejeitado no mundo inteiro, por que é de uma violência à prova
de qualquer coisa". Embora o jogo traga um certo grau de violência, não há
informações sobre ele ter sido banido.
O apresentador também diz que o objetivo do jogo é invadir cidades e
matar pessoa. Como já foi falado anteriormente o jogo envolve assassinatos
de pessoas específicas, mas eliminar civis não é um dos objetivos e, inclusive,
resulta em punição ao jogador.
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CONCLUSÃO
Nesta pesquisa pudemos perceber que o conceito de violência é
inerente a condição humana e não existe possibilidade de um jogo por si só
influenciar o indivíduo. Na realidade, foi possível identificar os jogos como
espaço de catarse. Muitas vezes a interação com games tem uma ação
terapêutica e o jogador pode extravasar as suas energias e emoções
reprimidas sem necessariamente ser parte de qualquer evento trágico.
A mídia jornalística atualmente consolidada no ambiente web deixou
de lado análise aprofundada de um assunto e frequentemente protagoniza a
exibição e publicação de reportagens rasamente imparciais e extremamente
carentes de fontes e de pesquisas a cerca do tema.
Uma análise detalhada da história de Marcelo Pesseghini é suficiente
para se perceber que o comportamento agressivo do menino não pode ser
unicamente relacionado ao game “Assassin’s Creed” e existem questões de
ordem afetiva relacionadas com a sua estrutura familiar. Retomando o discurso
de Lynn Alves, confirmamos que a violência emerge muito mais como uma
linguagem que marca questões como desestruturação familiar, ausência de
limites, etc.
Por conseguinte, se faz necessário o diálogo e a participação efetiva
dos pais na vida dos jovens e não é indicada a proibição de jogos eletrônicos
na vida de crianças e adolescentes, embora seja benéfico que haja
acompanhamento da classificação indicativa dos mesmos.
Como vimos, a tendência da indústria é a cinematografização dos
games. Dessa forma, as narrativas dos jogos estão se tornando mais
complexas o que amplia a imersão do jogador. Isso é diretamente benéfico
para o jovem, não só por funcionarem como válvula de escape como também
para enriquecer o jogador culturalmente com destaque para a história de
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Assassin’s Creed que resgata momentos da História da Humanidade que
podem ter sido apenas rasamente discutidos na escola.
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