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1 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES AVM – FACULDADE INTEGRADA PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU AFETIVIDADE TRANSFORMADORA: ALIANÇA FUNDAMENTAL DA GESTÃO, COM DESENVOLVIMENTO DAS CRIANÇAS EM CRECHE Andréia Nascimento Kvacek ORIENTADOR: Prof. Marcelo Saldanha Rio de Janeiro 2016 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

AVM – FACULDADE INTEGRADA

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

AFETIVIDADE TRANSFORMADORA: ALIANÇA FUNDAMENTAL DA GESTÃO,

COM DESENVOLVIMENTO DAS CRIANÇAS EM CRECHE

Andréia Nascimento Kvacek

ORIENTADOR: Prof. Marcelo Saldanha

Rio de Janeiro 2016

DOCUMENTO PROTEGID

O PELA

LEI D

E DIR

EITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

AVM – FACULDADE INTEGRADA

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

Apresentação de monografia à AVM Faculdade Integrada como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Administração e Supervisão Escolar.

AFETIVIDADE TRANSFORMADORA: ALIANÇA FUNDAMENTAL DA GESTÃO,

COM DESENVOLVIMENTO DAS CRIANÇAS EM CRECHE

Rio de Janeiro 2016

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AGRADECIMENTOS

A Deus por me guiar em todos os

momentos. Em Ti tenho tido força e alegria!

Ao meu marido Luiz Gustavo por ser um

grande incentivador e parceiro em todas as horas.

Aos meus filhos Renan, Gabriela e Juliana,

primeiros alunos na Pedagogia da vida.

Às crianças da creche, com quem aprendo

muito, e que me dão a oportunidade magnifica, de

vivenciar a afetividade transformadora no meu

trabalho.

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DEDICATÓRIA

Ao meu pai Jurandyr (In memoriam), grande incentivador no curso da vida. Presente em minhas conquistas, até teus últimos dias na terra. Jamais me esquecerei dos teus conselhos e do teu sorriso, querido!

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 07

CAPÍTULO I

A importância do afeto no desenvolvimento Infantil 12

CAPÍTULO II

O lugar da afetividade nos documentos oficiais de Educação Infantil 21

CAPÍTULO III

O papel do gestor aliado à afetividade 34

CONCLUSÃO 35

BIBLIOGRAFIA 36

WEBGRAFIA 38

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RESUMO

A partir da compreensão de que ensino e pesquisa são inseparáveis e a

Educação algo constante, o desenvolvimento deste trabalho é uma

possibilidade de investigar de forma intensa e com fundamentação teórica, um

tema que perpassa meu cotidiano profissional e instiga-me na permanente

busca do aprimoramento como educadora. Investigo a importância e as

significações da afetividade no desenvolvimento das crianças em creche.

As abordagens compõem um conjunto de temas que irão auxiliar na

valorização da afetividade que necessita estar vinculada à infância, através das

emoções, das relações humanas e do afeto.

Sendo assim, a presente investigação tem por finalidade atrelar

referências teóricas; documentos oficiais, e a relevância da afetividade no

processo de desenvolvimento e aprendizagem infantil.

No segundo capítulo, faço uma análise das DCNEIs (1999/2009), do

RCNEI (1998) e da (PNEI 2006), sendo possível proporcionar uma visão oficial

da Educação Infantil. No terceiro ilustro o papel do educador aliado à

afetividade.

Palavras-chave: Afetividade, creche e infância.

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INTRODUÇÃO

AFETIVIDADE TRANSFORMADORA: ALIANÇA FUNDAMENTAL DA

GESTÃO, COM DESENVOLVIMENTO DAS CRIANÇAS EM CRECHE

O corpo, a fala, os gestos, o olhar, o modo como nos expressamos e

nos apresentamos ao mundo. Tudo é linguagem, tudo comunica tudo

em nós compõe a história que, dia a dia, escrevemos sem nos dar

conta. (Chalita, 2003, p.29)

O presente trabalho faz parte da minha vivência profissional como

Agente de Educação Infantil, antigo Agente Auxiliar de Creche, criado em 2005,

com exigência de nível fundamental aos candidatos. Em 2014, essa realidade

mudou com a lei e os Agentes Auxiliares de Creches passaram a se chamar

Agentes de Educação Infantil ainda no caminho de torná-lo um profissional de

formação mínima em Médio Normal. Além da mudança de nomenclatura, um

novo piso foi estabelecido para esta formação.

Este trabalho apoia-se na hipótese de que, por muitas vezes, a falta de

afetividade na relação entre crianças, educadores, gestores e responsáveis

torna o trabalho mecânico, trazendo entraves ao desenvolvimento global da

criança.

Desenvolver esta tarefa tornou-se para mim um prazer e um desafio. Um

prazer, porque à medida que construía, me reportava às situações vividas na

Creche. Um desafio, ao fluir as inquietações que o cotidiano nos traz, de como

trabalhar essa afetividade no dia-a-dia com as crianças.

Neste trabalho busco compreender a importância do afeto no

desenvolvimento infantil e abordar aspectos que podem contribuir de maneira

positiva e/ou negativa nas aprendizagens e que levam ao desenvolvimento.

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A afetividade é indispensável à aprendizagem, porque muito além da

troca de carinho expressa no ato de abraçar, beijar, cuidar, ela se transforma

na capacidade que o sujeito tem de gerar transformação no outro, através da

convivência e da interação de conhecimentos.

Temos como ideia central a reflexão sobre o valor da afetividade na

formação da criança, na relação educador/criança. Na transformação que

podemos gerar na construção dos sujeitos através da afeição, procurando

melhorias que possibilitem ao educador uma melhor compreensão da

importância dessa relação, despertando o sentido do educar-cuidar como

suporte da criatividade e da liberdade, identificando valores, princípios e

atitudes que transformam vidas.

No sentido de compreender a importância dessa relação de afetividade

dos gestores de creches, buscam-se caminhos quando falamos em afetividade

transformadora. Ao pensar em desenvolver a criança na creche, instituição que

promove o desenvolvimento através de socialização e aprendizado, devemos

nos remeter ao fato de como isso ocorre. A Educação Infantil também busca a

transformação desta criança cidadã, crítica e responsável.

O trabalho vem demonstrar aos gestores de creche, como podemos ajudar

a desenvolver o potencial que cada aluno tem, dentro de suas possibilidades e

limitações. Para isso é necessário que se pratique a Pedagogia da afetividade

e entendimento, contra a prática de intolerância e do pensamento único. Pois a

partir do aprendizado escolar, podemos ajudar na construção de cidadãos mais

felizes.

Esta investigação foi realizado em uma creche no bairro de Manguinhos, no

município do Rio de Janeiro, com 150 crianças, entre 11 meses a 4 anos de

idade e 30 funcionários. São 25 crianças por turma, em turno integral, das 7h

às 17h.

Neste sentido, procuramos embasamento teórico para explicar os aspectos

que fazem parte da afetividade infantil e como podem contribuir para o

desenvolvimento das crianças.

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Os principais teóricos que nortearam essa pesquisa são Henri Wallon e

Jean Piaget, e outros autores que trazem contribuições para o tema,

possibilitando assim, uma maior compreensão do assunto pesquisado.

A escolha de Wallon para a finalidade deste projeto se deve à dedicação de

grande parte de seu trabalho ao estudo da afetividade, como uma abordagem

do desenvolvimento humano. Wallon acreditava na importância do outro para o

desenvolvimento humano, e defendeu que a emoção é o primeiro e mais forte

elo entre os indivíduos:

As primeiras relações utilitárias da criança não são as suas relações

com o meio físico, que, quando aparecem, começam por ser lúdicas;

são relações humanas, relações de compreensão, que tem como

instrumento necessário meios de expressão, e é por isso que a

criança, se não é naturalmente um membro consciente da sociedade,

também não é um ser primitivo e totalmente orientado para a

sociedade. (WALLON, 1975 p.198)

A análise baseada na teoria walloniana nos traz a compreensão de que

a afetividade revela-se anterior à inteligência na criança e que no início da sua

vida, afetividade e inteligência apresentam-se misturadas, porém com o

predomínio da afetividade sobre a inteligência.

Segundo Piaget (1976, p. 16) o afeto é essencial para o funcionamento da

inteligência.

(...) vida afetiva e vida cognitiva são inseparáveis, embora

distintas. E são inseparáveis porque todo intercâmbio com o

meio pressupõe ao mesmo tempo estruturação e valorização.

Assim é que não se poderia raciocinar, inclusive em

matemática, sem vivenciar certos sentimentos, e que, por outro

lado, não existem afeições sem um mínimo de compreensão.

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Para Piaget, o afeto pode acelerar ou retardar o desenvolvimento das

estruturas cognitivas. O afeto acelera o desenvolvimento das estruturas, no

caso de interesse e necessidade, e retarda quando a situação afetiva é

obstáculo para o desenvolvimento intelectual. A afetividade não explica a

construção da inteligência, mas as construções mentais são permeadas pelo

aspecto afetivo. Toda conduta tem um aspecto cognitivo e um afetivo, e um

não funciona sem o outro.

Rubem Alves nos destaca que a criança em sua integralidade tem a

possibilidade de construir as melhores relações humanas.

O corpo de uma criança é um espaço infinito no qual cabem

todos os universos. Quanto mais ricos forem os universos,

maiores serão os voos das borboletas, maior será o fascínio,

maior será a possibilidade de amar, maior será a felicidade.

(ALVES, 1994, p.70)

A infância exige um tratamento diferenciado e o educador deve contribuir

para o desenvolvimento integral das crianças, cumprindo sua função enquanto

educador e atendendo as necessidades para a vivência em sociedade. Isso

sugere pensar sobre a infância e seu significado, o que faremos mais à frente.

Essa discussão está baseada em estudos que abordam a qualidade do

atendimento às necessidades e cuidados sócio afetivo na Creche, através da

aliança fundamental no desenvolvimento das crianças: a afetividade.

Ser um gestor que foca a afetividade é um constante devir criativo e

transformador, singular e plural, em que as crianças e a comunidade escolar

vivem a mesma aventura rumo a uma infinidade de experiências. Educar com

afeto é investir no desenvolvimento de uma nova geração.

O trabalho encontra-se dividido em três capítulos, e procura definir o

conceito de afetividade a partir dos relatos vividos por mim, entrelaçados com a

teoria walloniana. O primeiro capítulo busca compreender a importância do

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afeto e identificar aspectos que podem contribuir no desenvolvimento da

criança. O segundo aborda a dimensão afetiva revelada nos documentos

oficiais da Educação Infantil. O terceiro explora a afetividade na sua

importância no processo aprendizagem e também como produtora de

conhecimentos, na realidade dinâmica e humanizada na relação gestão-

criança-educador-creche-prática educativa.

...narrar a vida, escrever sua autobiografia é, do ponto de vista da

formação, um exercício de autotransformação: a escrita como uma

experiência e como dispositivo de autoconstituição. (PERÉZ, 2006,

p. 181)

Nessa pesquisa busquei reescrever as experiências afetivas

transformadoras que fizeram e fazem de mim uma Agente da Educação

Infantil, em reflexões no campo pedagógico de Wallon, nas palavras de

pessoas marcantes em minha formação e nas práticas de gestores que por

mim passaram, como profissionais da Educação Infantil.

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I. A IMPORTÂNCIA DO AFETO NO DESENVOLVIMENTO INFANTIL

O primeiro autor a considerar aspectos da afetividade e da cognição

inseparáveis foi o biólogo e epistemólogo suíço Jean Piaget (1896-1980). O

autor adverte sobre o fato de que, apesar de diferentes em sua natureza, a

afetividade e a cognição são inseparáveis, indissociáveis em todas as ações

simbólicas e sensório-motoras. Ele postulou que toda ação e pensamento

comportam um aspecto do conhecimento, representado pelas estruturas

mentais, e um aspecto afetivo, representado por uma energética, que é a

afetividade. Complementando, todos os objetos de conhecimento são

simultaneamente cognitivos e afetivos, e as pessoas, ao mesmo tempo em que

são objeto de conhecimento, são também de afeto.

O primeiro instrumento que propicia a interação da criança com outros

seres humanos e que vem impulsionar seu desenvolvimento cognitivo é a

afetividade. Através dela a criança estabelece os primeiros vínculos de forma

imediata com o meio social, e desse universo absorve inúmeras

aprendizagens. É o que defende Henri Wallon (1979), que aprofundou suas

análises na afetividade humana. Para ele, a consciência afetiva promovida pelo

vínculo é o meio pelo qual o desenvolvimento intelectual da criança pequena

vai sendo construído.

Na verdade, o referido autor defende que pensamento e emoção são

atividades humanas indissociáveis. Esta relação se evidencia desde os

primeiros anos de vida da criança, pois, mesmo antes da aquisição do domínio

da linguagem, ela interage com o adulto próximo, motivada pelo vínculo.

Observando um recém-nascido, em qualquer situação do seu cotidiano,

perceberemos que, mesmo sendo ainda desprovido de capacidades que lhe

possibilitem agir sobre o meio (como pegar uma mamadeira sozinho), ele

expõe suas necessidades através da emoção pelo veículo da gestualidade.

Quem nunca presenciou uma criança chorar intensamente, e por causa deste

choro, toda uma família se mobilizar?! Esta simples situação cotidiana

exemplifica que as crianças pequenas já nos dão indícios de que o

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desenvolvimento afetivo ocorre concomitantemente ao desenvolvimento

intelectual, decorrendo pelas relações sociais.

Assim entendemos que, segundo o referido teórico, o conhecimento é

construído na interação que se dá na mais variadas relações que a criança

pequena vivencia, e por isso o conhecimento não deve ser pensado como uma

ação do sujeito sobre a sua realidade, mas, sim como fruto das mediações

constituídas em suas experiências cotidianas e, também, pedagógicas. Com

base nestas considerações, busquei abordar dois elementos essenciais no

processo de desenvolvimento infantil, que não podem ser pensados

separadamente: a afetividade e a inteligência.

Assim Wallon divide o desenvolvimento em etapas, que para ele são

cinco: impulsivo-emocional; sensório-motor e projetivo; personalismo;

categorial; e puberdade e adolescência.

Para este trabalho, inclino meu olhar especial, para os estágios

impulsivo-emocional e sensório-motor e projetivo, em função da idade das

crianças da minha investigação.

Ao longo do estágio impulsivo-emocional a afetividade e a inteligência se

alternam. No primeiro ano de vida, a função que predomina é a afetividade. O

bebê a usa para se expressar e interagir com as pessoas, que reagem a essas

manifestações e intermediam a relação dele com o ambiente. Trabalhando com

crianças de seis meses a um ano de idade no berçário I, percebi que, através

do choro, da atitude e de movimentos da criança, o educador cria

dependências afetivas com a criança suprindo suas necessidades fisiológicas e

emocionais, indicando entre eles vínculos importantes e fundamentais para um

bom desenvolvimento psicomotor.

Com a troca de afetividade por meio das necessidades saciadas do

bebê é que nasce a vida psíquica dando origem à consciência particular e à

individualidade dessa criança. Quando o bebê experimenta junto com o

educador a troca de carícias, abraços, e outros gestos de afeto, eles vão

criando sinais afetivos como alegria e contentamento.

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Depois, na etapa sensório-motora e projetiva, a inteligência prepondera.

É o momento em que a criança começa a andar, falar e manipular objetos e

está voltada para o exterior, ou seja, para o conhecimento.

Essas mudanças não significam, no entanto, que uma das funções

desaparece. Como explica Izabel Galvão (2002, pg. 45), "apesar de alternarem

a dominância, afetividade e cognição não são funções exteriores uma à outra.

Ao reaparecer como atividade predominante, uma incorpora as conquistas da

anterior".

Wallon mostra que a afetividade é expressa de três maneiras: por meio

da emoção, do sentimento e da paixão. Essas manifestações surgem durante

toda a vida do indivíduo, mas, assim como o pensamento infantil, apresentam

uma evolução, que caminha do sincrético para o diferencial. Refere-se à

principal característica do pensamento da criança: a ausência de diferenciação

entre os elementos - as informações que ela recebe do meio, as experiências

pessoais e as fantasias se misturam. O sincretismo corresponde a um

momento da evolução do pensamento humano e possui uma lógica própria.

Misturam realidade e fantasia sem distinção. Embaralham todas as ideias em

um mesmo plano e veem o mundo de forma global e generalizada.

A emoção, segundo o educador, é a primeira expressão da afetividade.

Ela tem uma ativação orgânica, ou seja, não é controlada pela razão. Quando

alguém é assaltado e fica com medo, por exemplo, pode sair correndo mesmo

sabendo que não é a melhor forma de reagir.

O sentimento, por sua vez, já tem um caráter mais cognitivo. Ele é a

representação da sensação e surge nos momentos em que a pessoa já

consegue falar sobre o que lhe afeta - ao comentar um momento de tristeza,

por exemplo.

Já a paixão tem como característica o autocontrole em função de um

objetivo. Ela se manifesta quando o indivíduo domina o medo, por exemplo,

para sair de uma situação de perigo.

Pelo fato de ser mais visível que as outras duas manifestações, a

emoção é tida por Wallon como a forma mais expressiva de afetividade e

ganha destaque dentro de suas obras. Não é possível falar em afetividade sem

falar em emoção, porém os dois termos não são sinônimos.

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A emoção estaria relacionada ao componente biológico do

comportamento humano, referindo-se a uma reação de ordem física. Já a

afetividade teria uma significação mais ampla, na qual se inserem várias

manifestações - das basicamente orgânicas (primeiras expressões de

sofrimento e de prazer que a criança experimenta, como a fome ou a

saciedade) às manifestações relacionadas ao social (sentimento, paixão,

emoção, humor, etc).

O espaço não é primitivamente uma ordem entre as coisas, é antes

uma qualidade das coisas em relação a nós próprios, e nessa relação

é grande o papel da afetividade, da pertença, do aproximar ou do

evitar, da proximidade ou do afastamento. (WALLON, livro Do Ato ao

Pensamento)

Neste trecho, Wallon mostra que a afetividade está sempre presente em

todos os momentos, movimentos e circunstâncias de nossas ações, assim

como o ato motor e a cognição. O espaço permite a aproximação ou o

retraimento em relação a sensações de bem-estar ou mal-estar. É importante

saber o que a escola, a sala de aula, a distribuição das carteiras e a

organização do ambiente provocam nos alunos: abraço ou repulsa.

A expressão afeto deriva do latim affectur (afetar, tocar), e compõe o

ambiente básico da afetividade. A afetividade é peça no papel psíquico do

sujeito e para entender e educar o ser humano temos que considerar a

importância dos afetos. Trata-se de um aspecto importante na constituição da

pessoa, bem como na determinação da orientação do seu comportamento.

Muitas vezes, deparamos com o uso dos termos afeto, emoção e

sentimento como sinônimos. Contudo o termo emoção encontra-se relacionado

ao componente biológico do comportamento humano, são processos psíquicos

que acompanham manifestações orgânicas.

Já a afetividade é utilizada com uma significação mais ampla, referindo-

se às vivências dos indivíduos e às formas de expressão mais complexas e

essencialmente humanas. Segundo Krueger (2003), os estados afetivos

fundamentais são as emoções, os sentimentos e as paixões. Ela afirma ainda

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que a afetividade influencie a percepção, a memória, o pensamento e as ações

do indivíduo sendo, portanto, um componente essencial para a harmonia do ser

humano.

A infância é um momento em que a criança vive uma ação de adaptação

progressiva ao meio físico e social. Nesse momento, dá-se uma quebra da vida

familiar da criança para começar uma nova experiência. Dessa forma, para que

a criança tenha um desenvolvimento benéfico em todos os aspetos – cognitivo,

biológico, cognitivo e sócio-afetivo – é necessário que ela se sinta segura e

acolhida. O ambiente ao qual a criança será submetida, seja ele qual for,

deverá harmonizar relações interpessoais positivas, e os educadores devem

buscar um enfoque próximo, enxergando a criança em sua totalidade.

Henri Wallon reconheceu na vida orgânica as raízes da emoção,

trazendo contribuições significativas acerca da temática. Wallon se debruçou

sobre a dimensão afetiva que concebe as emoções seja como reações

incoerentes e tumultuadas, seja como reações positivas. Wallon rompe com

uma visão valorativa das emoções, buscando compreendê-las a partir da

apreensão de suas funções, e atribuindo-lhes um papel central na evolução da

consciência de si. Em suas postulações concebe as emoções como um

fenômeno psíquico e social, além de orgânico.

Nessa perspectiva, pode-se falar na indissociabilidade entre o biológico,

o cognitivo e o social ou afetivo. Para Wallon (apud Galvão 1995) o

desenvolvimento humano é descontínuo, alternado em etapas ora com foco na

cognição, ora com foco na afetividade. Segundo ele o desenvolvimento

humano progride continuamente por meio das emoções e da relação com o

meio, independente da maturação orgânica, já que as funções psíquicas

podem prosseguir em um permanente processo de especialização e

sofisticação.

Na creche, esse novo ambiente fora do vínculo familiar, no qual a

criança será inserida possibilita interações diversas entre parceiros, ao mesmo

tempo em que proporciona situações e experiências propícias para a

construção do indivíduo como pessoa. O ambiente pedagógico tem de ser,

entre outros, um lugar de fascinação e inventividade. Motivar a criança para

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que o processo de aprendizagem e de socialização aconteça da forma mais

prazerosa possível.

É fundamental que cada criança seja vista e tratada como pessoa

única, respeitada na sua singularidade, nas suas aptidões, e também em suas

limitações. Isto significa garantir o direito ao colo e ao carinho, bem como o

respeito ao ritmo de cada criança. É igualmente importante propiciar às

crianças momentos de privacidade, autonomia e criatividade.

Desenvolver uma relação afetiva com a criança é preciso estabelecer um

vínculo verdadeiro e profundo. Além disso, à medida que a criança se

desenvolve cognitivamente, suas necessidades afetivas tornam-se mais

inegáveis. Manifestar afeto inclui não apenas beijar, abraçar, mas também

conhecer, ouvir, conversar, se interessar e se envolver, de fato, com a criança

e ser sensível a seus sentimentos e às suas necessidades.

Ao educador compete amparar emocionalmente as crianças

conhecendo-as. Enfim, observando e respeitando as particularidades de cada

criança. O educador afetivo precisa garantir, em sua sala de aula, um ambiente

acolhedor e seguro para a criança. Cabe ao educador ter consciência das

emoções e dos sentimentos, facilitando o desenvolvimento infantil tanto nos

aspectos afetivos como nos cognitivos.

Ao educador pertence, ainda, o papel de estabelecer um ambiente

pedagógico voltado para um momento de convivência e de aprendizagem,

proporcionando uma agilidade libertadora e afetiva, com preparação, respeito,

entrega, troca e afeto.

A trajetória de Educação Infantil sempre esteve ligada ao “conceito de

infância” que o homem construiu ao longo da história, e logo as políticas

voltadas para esta faixa etária.

A obra clássica de Philippe Ariès (1981) - História Social da Criança e da

Família retrata com clareza a lenta evolução de algumas posturas ocorridas ao

longo dos séculos, envolvendo a trajetória da concepção de criança. Na

sociedade medieval, o sentimento de infância não existia, por isso não se

considerava a criança com suas características particulares, próprias da sua

idade, que a diferem do adulto. Ela era considerada um “adulto em miniatura”,

e, por essa razão, supunha-se tinha condições de viver sem os cuidados

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constantes de sua mãe ou ama, ingressava na sociedade dos adultos e não se

distinguia destes, participando de jogos e situações de procedência tipicamente

adulta.

Até o século XVII, as condições gerais de higiene e saúde eram

precárias e logo a mortalidade infantil era muito grande, por causa da

fragilidade das crianças pequenas. Os pais se sentiam penalizados com a

morte de seus filhos, mas viam o acontecimento como fenômeno natural e, que

a criança morta poderia ser substituída por outra recém-nascida. As mulheres,

ao longo de suas vidas davam à luz muitos filhos, tendo consciência que

muitos deles não sobreviveriam à primeira infância. As crianças que

conseguiam atingir certa idade só passavam a ter identidade própria, a ser

consideradas como indivíduos na comunidade social, quando conseguiam

fazer coisas semelhantes àquelas realizadas pelos adultos, com os quais

viviam. Um sentimento superficial de crianças somente era reservado à

criancinha, quando ela ainda era uma coisinha engraçadinha e que servia para

o divertimento dos adultos, que a consideravam como um animalzinho, um

macaquinho. Se morresse, podiam até ficar desolados, mas a regra geral era

não dar muita importância. A criança não chegava a sair de uma espécie de

anonimato.

A partir do século XVII, houve uma mudança considerável no modo de

“ver” a criança. Isso quer dizer que, a criança deixou de ser misturada aos

adultos e de aprender a vida, diretamente, mediante o contato com eles. Ela

passou a ser mantida à distância numa espécie de quarentena, antes de ser

solta no mundo. Essa quarentena foi à escola, o colégio. Nesse período,

definiram-se rumos da educação que visava, antes de tudo, corrigir as

crianças, que, acreditava-se, nasciam sob o estigma do pecado, e guiá-las para

o caminho do bem. Entre os moralistas e os educadores do século XVII,

formou-se o sentimento de infância que viria a inspirar toda educação até o

século XX.

No século XVIII, via-se a criança como um ser primitivo, irracional, não

pensante. Atribuía-se a ela modos de pensar e sentimentos anteriores à lógica

e aos bons costumes. Era preciso educá-la para desenvolver nela o caráter e a

razão – traços de adultos.

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Na realidade, não podendo compreendê-las naquilo que as

caracterizavam, instituiu-se um padrão adulto para estabelecer julgamentos,

em vez de entender e aceitar as diferenças e semelhanças das crianças, a

originalidade do seu pensamento. Pensava-se nelas como páginas em branco

a serem preenchidas, preparadas para a vida adulta. Tratava-se de despertar

na criança a responsabilidade do adulto, o sentido de sua dignidade. A criança

era menos oposta ao adulto, do que preparada para a vida adulta. Essa

preparação se fazia em etapas e exigia-se cuidados. Esta foi a concepção da

educação, que triunfaria no século XIX.

Se na época medieval a vida era basicamente rural, e apenas a

aristocracia e clero tinham acesso à educação e à cultura, com a expansão do

comércio e o surgimento de uma nova classe social, os comerciantes, as

coisas começaram a tomar novos rumos.

Com a expansão do comércio, essa nova classe começou a conquistar

cada vez mais poder político, opondo-se a aristocracia. Esse movimento

culminou com a Revolução Francesa quando o povo e os comerciantes, os

burgueses, tomaram de assalto às instituições aristocráticas. O marco desse

movimento é a Queda da Bastilha, em 14 de julho de 1789. Para os

“burgueses”, a educação dos filhos tornou-se muito importante, porque, sem

conhecimento e sem formação necessária, não poderiam levar à frente os

estabelecimentos comerciais que viriam a herdar, nem conseguir posições

sociais mais favoráveis, caso os pais não as tivessem. As escolas assumiram,

então, o papel de ponte para o futuro, tendo como objetivo a preparação da

criança para a vida e o trabalho. O ensino mais longo e aprofundado era

oferecido aos filhos de burgueses que ocupariam cargos de técnicos,

administradores, legisladores e intelectuais; enquanto que para os filhos dos

trabalhadores braçais, que viriam a ser mão-de-obra da sociedade, destinava-

se apenas uma educação básica.

Com a Revolução Industrial, no século XIX, e o crescimento das

cidades, tornou-se cada vez maior a necessidade de mão-de-obra para

trabalhar nas indústrias. Surgiu desta forma o trabalho feminino, e as mulheres

que antigamente se dedicavam somente aos afazeres domésticos e aos

cuidados com os filhos, passaram a ter de trabalhar fora de casa, nas

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indústrias. A sociedade encarregou-se do cuidado com as crianças – foram

criadas, então, as primeiras creches e instituições de cunho assistencial, onde

as crianças permaneciam, enquanto suas mães trabalhavam. Foram essas

instituições, destinadas à guarda dos filhos das mulheres que trabalhavam fora

de casa, que deram origem à pré-escola atual.

Embora a escolaridade destinada às crianças fosse diferenciada de

acordo com sua classe social, a escola em geral partia de uma concepção de

infância, que pressupunha um padrão médio, único e abstrato de

comportamento e desempenho infantil: as crianças das classes sociais menos

favorecidas (de baixa renda) eram consideradas como carentes, inferiores, à

medida que não correspondiam ao padrão pré-estabelecido. Faltavam a estas

crianças, privadas culturalmente, segundo as concepções vigentes na época,

determinados atributos, atitudes ou conteúdos que deveriam ser nelas

incutidos. Somente na segunda metade do século XX, com os avanços dos

estudos na área da psicologia do desenvolvimento, é que houve uma mudança

de concepção do que é ser criança.

Ariès (1981) mostra como o conceito de criança tem evoluído através

dos séculos, e oscilado entre extremos em que ora consideram a criança como

um bibelot ou um bichinho de estimação, e ora a consideram um adulto em

miniatura, passível de encargos e abusos como os da negligência, do trabalho

precoce e da exploração sexual. A história da criança demonstra que a

presença infantil, como fator merecedor de atenção, cuidados, respeito, no

contexto social, só começa a ser considerada muito recentemente. Foi a partir

da psicanálise e, posteriormente da psicologia infantil que se passou a dar

importância à infância como etapa fundamental e decisiva na formação da

personalidade dos indivíduos. Até então, esta indefinição do que é ser criança,

gerou no mundo e através dos tempos, grandes injustiças e graves prejuízos

em relação às responsabilidades conjuntas do Estado, da sociedade e da

família, no que diz respeito aos cuidados de higiene, saúde, nutrição,

segurança, lazer e educação, elementos fundamentais ao processo de

desenvolvimento e socialização das crianças de 0 (zero) a 6 (seis) anos.

Atendendo às exigências da Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional Nº 9394/96, em seu artigo Nº 29, determina que “a educação infantil,

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primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento

integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico,

psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da

comunidade”. As creches passaram a integrar-se ao Sistema Municipal de

Educação, deixando de ter um caráter “assistencial”, que historicamente se

caracterizou como um atendimento de guarda para crianças de famílias de

baixa renda. A creche deixa de ser um espaço de “guarda” para caracterizar-se

como agência de educação.

Neste sentido, as instituições de Educação Infantil (creches e pré-

escolas) integram as funções de educar e cuidar, comprometidas com o

desenvolvimento integral da criança nos aspectos físico, intelectual, afetivo e

social, compreendendo a criança como um ser total, completo, que aprende a

ser e conviver consigo mesmo, com o seu semelhante, com o ambiente que a

cerca de maneira articulada e gradual. Por isso, estas instituições precisam ter

condições e recursos materiais e humanos voltados para o trabalho de cuidado

e educação dessa clientela.

Cabe aos municípios o compromisso de oferecer às crianças uma

educação de qualidade, direito inerente a todos.

Contudo, com todas as transformações pelas quais passou o mundo,

com os avanços tecnológicos e científicos contemporâneos, os estudos e

pesquisas referentes a Educação Infantil que vem sendo desenvolvidos, a

importância que é dada ao desenvolvimento da criança de 0 (zero) a 6 (seis)

anos, as políticas públicas voltadas a esta faixa etária, acreditamos que

garantir o direito – constitucionalmente adquirido - da criança à educação,

desde do seu nascimento continua sendo um grande desafio, uma vez que, tão

importante quanto garantir o seu acesso às creches e pré-escolas, é garantir o

atendimento com qualidade, respeitando-se os seus direitos fundamentais.

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II. O LUGAR DA AFETIVIDADE NOS DOCUMENTOS OFICIAIS DE

EDUCAÇÃO INFANTIL

A busca tem por finalidade examinar nos documentos oficiais de

educação Infantil, compreensões sugestivas à extensão afetiva e as

orientações e/ou implicações de como os profissionais podem promovê-la no

trabalho educativo realizado com a criança pequena. Com o diagnóstico

documental, descobriu-se que a dimensão afetiva é considerada, nos

documentos analisados (Política Nacional de Educação Infantil: pelo direito das

crianças de zero a seis anos à educação; Referencial Curricular Nacional para

Educação Infantil – introdução, volume 1 e volume 2; Diretrizes Curriculares

Nacionais para a Educação infantil – de 1999 e a revisão, de 2009), como um

dos aspectos essenciais à criança, contemplada como ser integral.

Para cuidar é preciso antes de tudo estar comprometido com o outro

com sua singularidade, ser solidário com suas necessidades, confiando

em suas capacidades. Disso depende a construção de um vínculo

afetivo entre quem cuida e é cuidado. (RCNEI –Vol. 1, p. 75, MEC/SEF,

1988)

As leis atribuem às crianças direitos de cidadania por meio da família, da

sociedade e do poder público, com absoluta prioridade. Esta ideia precisa ser

ampliada. É preciso não apenas cuidar, mas também educar.

Entende-se que a afetividade é um procedimento interacional entre os

aspectos orgânicos e sociais, que permite ao ser humano afetar e ser afetado

pelos acontecimentos; segundo a teoria walloriana trata-se de um domínio

funcional, que, juntamente com a cognição e a motricidade, constitui a pessoa

do modo completo, podendo ser expressa inicialmente pelas sensações de

bem-estar e mal-estar, posteriormente, pelas emoções, sentimentos e paixão.

Assim sendo, abordar tais documentos faz-se indispensável pesquisar e

considerar as concepções de afetividade e suas revelações presentes nos

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documentos, bem como as orientações e/ou implicações no trabalho educativo

a ser desenvolvido com a criança na Creche.

O Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil (RCNEI) de

1998 é composto por três volumes: Introdução, volume 2 – Formação pessoal e

social, e volume 3 – Conhecimento de mundo. O volume introdutório traz a

apresentação de orientações pedagógicas, como o intuito de subsidiar práticas

educativas que permitam à criança o exercício da cidadania, levando em conta

suas especialidades cognitivas, afetivas, emocionais e sociais. Aponta o cuidar

e o educar como função da Educação Infantil:

Educar significa, portanto, propiciar situações de cuidados, brincadeiras e

aprendizagens orientadas de forma integrada e que possam contribuir para o

desenvolvimento de capacidades infantis de relação interpessoal, de ser e

estar com os outros em uma atitude básica de aceitação, respeito e confiança,

e o acesso, pelas crianças, aos conhecimentos mais amplos da realidade

social e cultural. Neste processo, a educação poderá auxiliar o

desenvolvimento das capacidades de apropriação e conhecimento das

potencialidades corporais, afetivas, emocionais, estéticas e éticas, na

perspectiva de contribuir para a formação de crianças felizes e saudáveis.

(RCNEI, 1998, p. 23).

Por sua vez, “[...] cuidar significa valorizar e ajudar a desenvolver

capacidades. O cuidado é um ato em relação ao outro e a si próprio que possui

uma dimensão expressiva e implica em procedimentos específicos” (RCNEI,

1998, p24).

Visto a notificação, o cuidado é composto por duas dimensões – afetiva

e relacional. A dimensão afetiva é tomada como a base para o

desenvolvimento infantil, assim como os aspectos biológicos, enquanto a

dimensão relacional permite a interação entre as crianças e os adultos.

No que diz respeito da educação Infantil, os referenciais o caracterizam

como polivalente, o que “[...] significa que ao professor cabe trabalhar com

conteúdos de naturezas diversas que abrangem desde cuidados básicos

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essenciais até conhecimentos específicos provenientes das diversas áreas do

conhecimento” (RCNEI, 1998, p.41).

Os documentos apontam que as instituições de Educação infantil, no

papel do educador, têm por função proporcionar um ambiente acolhedor,

adequado para oferecer diversas interações sociais que produzam ou não

conflitos, desde que “[...] forneçam elementos afetivos e de linguagem para que

as crianças aprendam a conviver, buscando as soluções mais adequadas para

as situações com as quais se defrontam diariamente” (RCNEI, 1998, p.31).

No volume 2 – Formação pessoal e social, são tecidas considerações

sobre a construção de identidade e da autonomia, que ocorre por meio das

interações sociais, promovendo a ampliação das relações afetivas entre adulto-

criança e criança-criança, procurando o reconhecimento e a diferenciação entre

o eu e o outro, e utilizando a imitação como mecanismo que faz a fusão e a

diferenciação em relação ao outro.

Em relação à construção de identidade, referencia a afetividade e ao

conhecimento como portas internas que a criança tem disponíveis e que

auxiliam na passagem para autonomia.

O documento expõe, no segundo volume, uma subdivisão intitulada

“Processos de fusão e diferenciação”, pontuando a fusão entre a mãe e o bebê

desde o nascimento, e os momentos em que a criança revela seus estados de

bem-estar e mal-estar, caracterizando o processo denominado por Wallon

(1979) de simbiose fisiológica. Sobre a diferenciação, destaca que a criança

adquire consciência do seu corpo e do outro, com o auxilio do movimento.

O RCNEI (1998) concebe a criança como ser social com capacidades

afetivas, emocionais e cognitivas, que aprende com o outro, pelos vínculos que

estabelece com os recursos disponíveis: imitação, faz-de-conta, oposição,

linguagem, imagem corporal.

O volume 3 – Conhecimento de mundo – apresenta o movimento, a

música, as artes visuais, a linguagem oral e escrita, a natureza e sociedade e a

matemática, como conhecimentos que devem ser disponibilizados às crianças.

Para essa análise, constatamos, no movimento, aspectos relativos à

afetividade.

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Segundo o RCNEI (1998), o movimento ajuda a criança a externar suas

emoções, sentimentos e pensamentos com o auxílio dos gestos, de forma que

pode ser tido como uma linguagem, que, além de comunicar, mobiliza as

pessoas pelas trocas afetivas. Desde o nascimento, o bebê já utiliza as

emoções e o movimento para obter a satisfação de suas necessidades.

Conforme as orientações do documento, nessa fase o movimento é subjetivo,

pois recorre às emoções para o estabelecimento de vínculos com os adultos.

“O diálogo afetivo que se estabelece com o adulto, caracterizado pelo toque

corporal, pelas modulações de voz, por expressões cada vez mais cheias de

sentido, constitui-se em espaço privilegiado de aprendizagem” (RCNEI, 1998,

p.21).

Com o auxílio do movimento, o bebê passa as ações de outrem e a

explorar os limites do seu corpo, ações necessárias para a elaboração da

consciência corporal. O professor tem papel fundamental nesse processo,

portanto, precisa ter clareza de que o seu corpo também é um vínculo de

comunicação, que demonstra às crianças seus estados emocionais perante as

situações vivenciadas.

Em síntese, no RCNEI (1998), a afetividade é compreendida como

elemento essencial ao processo de cuidar e educar das crianças da Educação

Infantil. As manifestações afetivas – emoções e sentimentos – são tratadas

como aspectos que devem ser considerados pelos professores. Esse

documento diz que, à medida que a crianças sente-se segura e acolhida no

ambiente, ela passa a explorá-lo, desenvolvendo sua autonomia e ampliando

seus conhecimentos sobre o mundo natural e social. Wallon também destaca

que a afetividade favorece o desenvolvimento da personalidade e a construção

do pensamento.

Por acreditarmos que a afetividade é um elemento dentro do processo de

ensino-aprendizagem que possibilita a formação integral da criança, e que só

uma prática pedagógica pautada nesses elementos propiciará esse

desenvolvimento é que nos propusemos a investigar a presença da afetividade

nas práticas das instituições de educação infantil, nas relações estabelecidas

entre educador/crianças e possíveis contribuições ao desenvolvimento integral

das crianças.

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Já no documento A Política Nacional para a Educação Infantil: pelos

direitos da criança de zero a seis anos à educação – PNEI (2006) - elaborado

com o intuito de assegurar o direito das crianças brasileiras à Educação Infantil

– creche e pré-escola trazem à tona a necessidade do aumento do número de

vagas nas creches e pré-escolas, remetendo à importância do trabalho

educacional a ser desenvolvido nessa faixa etária e à história da educação

Infantil, desde a sua criação.

O documento sustenta que a mudança nas concepções de criança

contribuiu para a delimitação da função dessa etapa educacional, isto é, cuidar

e educar. “Tendo esta função, o trabalho pedagógico visa atender às

necessidades determinadas pela especificidade da faixa etária, superando a

visão adultocêntrica em que a criança é concebida apenas como um vir a ser e,

portanto, necessita ser “preparada para” (PNEI, 2006, p.8).

Destaca-se que um dos problemas dessa etapa educacional para a

realização de sua função, refere-se ao fato de a creche estar por muito tempo,

vinculada ao assistencialismo e, portanto, destinada às crianças de classes

econômicas menos favorecidas, as quais deveriam ser designadas a cuidados

relacionados à alimentação e higiene. Para a pré-escola, a função era educar,

entretanto, o foco vinculava-se à antecipação do Ensino Fundamental.

A PNEI (2006) ressalta que a mudança de perspectiva acontece com a

promulgação da Lei de Diretrizes e Bases de Educação Nacional – LDB

9394/96, que passa a considerar a Educação Infantil como primeira etapa da

educação básica, constituída por dois níveis: creche e pré-escola, tendo com

única finalidade o desenvolvimento integral da criança de zero a seis anos, com

o objetivo de eliminar a dicotomia “a creche cuida” e a “pré-escola educa”.

Assim, a função de educar torna-se intrínseca ao cuidado e estabelece

parâmetros para a formação do profissional que atuará com as crianças

pequenas (0-6 anos).

Confere-se que a Política Nacional para Educação Infantil contextualiza

a história dessa etapa educacional, no Brasil, e as alterações sucedidas no

transcorrer do tempo, acentuando os direitos das crianças e de suas

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respectivas famílias, o dever do Estado e dos órgãos governamentais, inclusive

da União, e das instituições responsáveis pelo cuidado e educação da criança

de zero a seis anos, enfatizando a função dos profissionais da área e propondo

várias medidas para o aprimoramento da qualidade educacional a ser

oferecida. Em relação à dimensão afetiva, deparamos com a concepção da

criança como indivíduo integral e pleno e, portanto, constituído pela afetividade.

As recomendações e notas, no que diz respeito à formação e trabalho

do educador de Educação Infantil, indicam que, para atender às

especificidades infantis, a prática educativa e pedagógica deve basear-se nos

saberes de todos os envolvidos no processo educacional, entretanto, o

documento não apresenta aspectos inerentes à função cuidar e educar, não

tendo sido encontradas concepções, estratégias e implicações quanto à

dimensão afetiva no trabalho docente.

Outro documento, as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação

Infantil - DCNEI – de 1999, foi elaborado com o intuito de nortear os projetos

pedagógicos de cada instituição, visando ao aumento da qualidade do cuidado

e educação oferecidos para as crianças de creche (0-3 anos) e pré-escola (4-6

anos). Possui caráter mandatório e, portanto, as Secretarias municipais e

estaduais, além dos Conselhos municipais e estaduais, precisam ter clareza

das propostas que o documento contempla, pois estas serão norteadoras dos

planos de trabalho a ser desenvolvido em cada instituição, pública ou privada.

O parecer das DCNEI enfoca a história da Educação Infantil, no contexto

brasileiro, e frisa que, durante muitos anos, perdurou a concepção errônea de

que a creche era destinada ás crianças pobres economicamente e carentes

intelectualmente, de forma que não se considerava necessário planejamento,

propostas pedagógicas e profissionais qualificados para cuidar e educar

dessas crianças.

De acordo com o documento, todas as atividades propostas às crianças,

sejam elas espontâneas, sejam dirigidas, precisam ter intencionalidade, ser

avaliadas e supervisionadas pelos órgãos competentes, e o caráter lúdico deve

ser predominante nessa etapa educacional. Defende a não antecipação da

rotina do Ensino Fundamental e uma educação compartilhada entre Estado,

sociedade e família.

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No que concerne à dimensão afetiva, o parecer das DCNEI/1999 traz

que as crianças, desde o início da vida, se comunicam com os adultos pelos

recursos possibilitados pela afetividade – emoções e sentimentos - , e que

expressam curiosidade para aprender. Diante dessa potencialidade da criança,

é função do professor organizar e disponibilizar ambientes e interações em que

os bebês e as outras crianças externem seus estados emocionais, ampliem

suas capacidades cognitivas e construam valores como cooperação e

solidariedade. No ano de 2009, emergiu a necessitada de revisão das

DCNEI/1999, devido à implantação do Ensino Fundamental de nove anos,

respaldado na Lei 11.274 (BRASIL, 2006).

O parecer CNE/CBE 20/2009 estabelece a Revisão das Diretrizes

Curriculares Nacionais para a Educação Infantil – DCNEI/2009 – e objetiva

ampliar o debate sobre a Educação Infantil quanto a outras temáticas que se

torram atuais, na área, levando em conta os princípios propostos em 1999,

significativos e necessários para esse novo contexto.

Com o seu caráter mandatório, as diretrizes:

As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, de caráter

mandatório, orientam a formulação de políticas, incluindo a de formação

de professores e demais profissionais da Educação, e também o

planejamento, desenvolvimento e avaliação pelas unidades de seu

Projeto Político-Pedagógico e servem para informar as famílias das

crianças matriculadas na Educação Infantil sobre as perspectivas de

trabalho pedagógico que podem ocorrer. (BRASIL, 2009, p.3).

Sobre a identidade da Educação Infantil, o documento concebe a creche

e a pré-escola como instituições educacionais, destinadas ao atendimento de

crianças de zero a cinco anos de idade, com profissionais formados conforme

prevê a LDB 9394/94, no mínimo em nível médio para exercício do magistério,

tendo por função o cuidar e educar de modo integrado, cumprindo seu papel

sociopolítico e pedagógico.

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Para tanto, o documento entende a proposta pedagógica ou o projeto

pedagógico como o orientador das ações e metas a serem desenvolvidas nas

instituições, ressaltando que currículo é a consequência das práticas

educacionais, sendo a proposta e definição de currículo um dos avanços das

Diretrizes.

Ainda de acordo com o documento, as práticas devem ser planejadas,

executadas e avaliadas partindo-se do pressuposto de que a criança é um ser

indivisível, composto pelas dimensões “[...] expressivo-motora, afetiva,

cognitiva, linguística, ética, estética e sociocultural [...]” (BRASIL, 2009, p.6). A

criança é considerada sujeito histórico, dotado de direitos, e todos os aspectos

inerentes a essa etapa da vida humana se desenvolvem a partir das

interações, relações e práticas vivenciadas no cotidiano.

Assim como nas diretrizes anteriores, são propostos os princípios éticos,

políticos e estéticos como norteadores das práticas a serem planejadas e

colocadas em prática com as crianças, tendo por intencionalidade o bem-estar

infantil e o cumprimento da função de cuidar/educar.

O cuidado, em seu caráter ético, é concebido pelo direito à vida e à

proteção integral da criança. Em relação à característica necessariamente

humana, é vinculado à afetividade. “Na Educação Infantil, todavia, a

especificidade da criança bem pequena, que necessita do professor até

adquirir autonomia para cuidar de si, expõe de forma mais evidente a relação

indissociável do educar nesse contexto” (BRASIL, 2009, p.10).

O educador, aliado ao cuidar, auxilia as crianças a explorar e vivenciar

situações que possam atribuir significados individuais e coletivos, de sorte a

apropriar-se de modos singulares de agir, expressar e pensar. Assim as

crianças devem ter á sua disposição espaços que permitam movimentação e

interação com os demais, brincadeiras e atividades livres e dirigidas, acesso a

diversos objetos adequados às suas especificidades e faixa etária, vivências

individuais e em grupos, resolução de conflitos e práticas que promovam o

desenvolvimento de sua identidade e autonomia.

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No que respeita à formação dos professores, o documento propõe a

formação continuada, como processo de aprimoramento e reflexão das práticas

disponibilizadas para as crianças.

É válido destacar que as DCNEIs (1999/2009) contextualizam a

concepção de criança estabelecida pelo documento, explicitam os principais

norteadores para a elaboração das propostas pedagógicas de cada instituiçãoe

e a função do professor, de forma que norteia os profissionais da Educação

infantil, mas que precisa ser refletida pelas instituições educacionais.

Com as DCNEI/2009, retoma-se a urgência da construção de um

currículo para a Educação Infantil, destacando a necessidade de explicitar com

clareza o que é currículo para essa etapa educacional, de maneira a não correr

o risco de elaboração de grades curriculares iguais ou semelhantes à do

Ensino Fundamental, aulas cronometradas, reprodução de atividades

desprovidas de sentido e desconsideração do caráter lúdico dessa etapa

educacional. O currículo precisa ser compreendido como soma de experiências

das crianças e de todos os envolvidos no processo educativo, permitindo a

articulação das práticas cotidianas de que as crianças já se apropriaram, com o

conhecimento historicamente e culturalmente acumulado.

Os documentos afirmam com clareza a importância da dimensão afetiva.

Todos os documentos a consideram como um dos aspectos que compõem o

ser humano, a sua integração quanto à cognição, elemento de expressão dos

desejos e vontades das crianças, assim como da motivação e vontade de

conhecer a si e ao mundo e qualificador das interações. Contudo, a partir do

que foi exposto, deparamo-nos com uma aprovação – dar contribuições aos

profissionais da Educação Infantil para a elaboração de um currículo, que

olhem as dimensões afetiva, cognitiva, motora, ética, estética, social e cultural,

de maneira indissociável, tendo por objetivo a constituição da pessoa de modo

completo.

Com base na análise das CCNEIs (1999/2009), do RCNEI (1998) e da

PNEI (2006), foi possível apresentarmos um panorama oficial da Educação

Infantil.

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Foram descritas propostas que ainda estão se consolidando, nessa etapa educacional, as quais indicam a preocupação em qualificar as práticas desenvolvidas com as crianças pequenas.

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III. O PAPEL DO GESTOR AFETIVO

Figura nem sempre presente nas escolas de Educação Infantil, um bom

gestor é o elo entre a rede, os professores e a comunidade.

Ter uma visão global da instituição com foco na aprendizagem dos alunos é um

dos principais atributos de quem assume a direção de uma escola. Ao gestor é

creditada grande parte dos sucessos - e também dos fracassos - de uma

instituição. E não é para menos, pois, como o responsável legal, espera-se que

ele providencie as condições necessárias à aprendizagem, zelando pelo uso

dos espaços, cuidando da administração dos recursos financeiros e

melhorando as relações interpessoais (com funcionários e professores),

institucionais (com a Secretaria de Educação) e com a comunidade.

Tantas exigências chegam a assustar alguns profissionais. Há, inclusive,

os que nem sequer se identificam com o termo gestor - que passou a ser usado

em meados dos anos 1980, visando levar aos sistemas públicos educacionais

a ideia de eficiência por metas a serem alcançadas. Sendo assim, fica a

pergunta: que condições são dadas para que esse profissional exerça seu

trabalho a contento? A pesquisa da Fundação Victor Civita (FVC) constatou

que, nas escolas que oferecem outras etapas de ensino, a Educação Infantil

não recebe a devida atenção do diretor.

O ideal é que cada creche e pré-escola tenha uma pessoa presente que

olhe e responda por tudo o que lá acontece. Para tanto, é preciso que as redes,

além de criar o cargo, definam com clareza às responsabilidades e ofereçam

meios democráticos de seleção e formação específica.

Definir critérios para a escolha desse profissional faz com que ele

entenda melhor as tarefas que realiza e atenda às expectativas. Isso garante,

por exemplo, uma tomada de decisão mais qualificada.

A maneira de chegar ao cargo também é importante. Em nenhum dos

municípios pesquisados, os diretores assumiram a função por meio de

concurso público, pouco mais de 10,5% dos diretores foram indicados por

técnicos ou políticos e quase metade (46%) declarou ter participado de uma

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eleição. Tal prática leva ao reconhecimento do diretor pelos pares e evita a

nomeação de uma pessoa que desconhece a realidade da escola.

RECOMENDAÇÕES DOS ESPECIALISTAS

Às Secretarias Municipais de Educação - Estabelecer mecanismos de seleção de diretores por processos democráticos, evitando que interesses políticos prevaleçam. - Garantir que todas as unidades de Educação Infantil municipais tenham um diretor. - Estabelecer medidas que permitam a continuidade da gestão e a coerência do trabalho em relação ao projeto político-pedagógico. - Definir as atribuições do diretor, considerando sua função articuladora entre a política municipal de Educação, os profissionais da unidade, as famílias e a comunidade. - Organizar cursos de formação continuada específicos para os gestores. - Adotar um processo de avaliação periódica do diretor, inclusive com a participação da comunidade.

O objetivo maior da comunidade educacional revela-se, portanto, o de se

estabelecer uma comunidade de ensino efetivo, onde persevere,

coletivamente, não somente o ideal de ensinar de acordo com o saber

produzido socialmente, mas o de aprender, em acordo com os princípios de

contínua renovação do conhecimento, criando-se um ambiente de contínuo

desenvolvimento para alunos, professores, funcionários e é claro, os gestores.

Este trabalho de pesquisa teve como problema investigar a importância

do afeto na aprendizagem, identificando como a interatividade entre a equipe

gestora e aluno pode contribuir no processo ensino aprendizagem de forma

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acolhedora e prazerosa, destacando de que forma os vínculos afetivos entre a

gestão escolar e os alunos atuam no cenário pedagógico.

Os objetivos principais dessa pesquisa foram perceber a aprendizagem

dos alunos a partir dos laços afetivos constituídos entre os atores da escola;

descrever as dificuldades de aprendizagem dos alunos considerando a relação

de afeto entre a gestão escolar e analisar de que forma a relação de afeto entre

os atores escolares e os alunos pode contribuir para a melhor aprendizagem.

Diante da discussão até aqui apresentada, fica clara a necessidade de

se construir um sistema educativo que supere a clássica contraposição entre

razão e emoção, cognição e afeto, e que rompa com a concepção dissociada,

relegando os aspectos afetivos e emocionais a segundo plano. O presente

trabalho é apenas o início de uma reflexão parcial deste tema que servirá de

base para futuros trabalhos.

É preciso fertilizar o campo do afeto, olhar para o lado e ver as pessoas

que nos cercam elogiar nossas crianças e jovens, admirá-los, pois o afeto

precisa ser adubado e regado diariamente. Educar com afeto é investir no

desenvolvimento de uma nova geração. De nada servirá a rapidez das

informações se não houver uma evolução do pensar criticamente e do refletir

sobre nossa existência.

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CONCLUSÃO

Entendendo que a afetividade permeia todas as inter-relações da criança

desde os primeiros momentos de vida, desempenhando um papel fundamental

na constituição e no funcionamento da inteligência, ressaltamos a importância

das instituições escolares para garantia deste processo, sobretudo o educador,

que precisa ter claro a necessidade de “afetar” positivamente seus alunos. E

assim possibilitar, através de um ambiente aconchegante e afetivo, que as

crianças se envolvam em constantes situações de interação social, veículo

impulsionador de seu desenvolvimento, seja no aspecto cognitivo, afetivo,

motor ou social.

Neste cenário, destacamos a importância do educador ser

comprometido afetivamente para auxiliar no desenvolvimento da criança,

podendo contribuir para seu sucesso ou fracasso na escola, pois é o educador

que media o processo de ensino-aprendizagem, é ele que tem o poder de

estabelecer vínculos afetivos tão profundos e significativos com e entre os

alunos nas atitudes de respeito, em intervenções adequadas, demonstrações

de carinho, escuta e olhar sensível, que pode ensinar-lhes muito.

É de suma importância que as creches, articuladas às políticas públicas,

incorporem de maneira integrada na sua rotina propostas e atividades

pedagógicas que trabalhem conjuntamente a afetividade e a inteligência,

também por meio da ludicidade, no qual o desenvolvimento, a socialização,

constituição das identidades e a construção do conhecimento possam ocorrer.

(BRASIL, 1999).

Afinal é primando pela qualidade da educação e do cuidado oferecido

que a creche passará a ser um real espaço de aprendizagens significativas e

de desenvolvimento, no qual as crianças possam de maneira dinâmica e viva,

construir e ampliar suas capacidades e potencialidades cognitivas, afetivas,

emocionais, corporais, éticas e de inserção social.

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