DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL · 2013-08-12 · sociedade, como os médicos. Mas,...
Transcript of DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL · 2013-08-12 · sociedade, como os médicos. Mas,...
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
CRIATIVIDADE INFANTIL: Perspectivas neurocientíficas
Por: Juliana Marinho Lobo Fernandes
Orientador
Profª Marta Pires Relvas
Rio de Janeiro
2013
DOCU
MENTO
PRO
TEGID
O PEL
A LE
I DE D
IREIT
O AUTO
RAL
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
CRIATIVIDADE INFANTIL: Perspectivas neurocientíficas
Apresentação de monografia à AVM Faculdade
Integrada como requisito parcial para obtenção do
grau de especialista em Neurociência Pedagógica.
Por: Juliana Marinho Lobo Fernandes
3
AGRADECIMENTOS
Amigos são tesouros que merecem ser
cultivados e preservados, pois fazem
parte do meu processo diário. A eles:
Avelino Lobo, Sandra Marinho, irmãs,
sobrinhos, Anderson Ferreira, Cláudia
Nunes e colegas da pós-graduação
minha gratidão.
4
DEDICATÓRIA
Dedico este estudo, bem como todo o meu
respeito e gratidão aos professores Marta
Pires Relvas, a Simone Ferreira e Vasco
Amaral que desencadearam e fortaleceram
novas sinapses, criando assim, memórias
de longuíssimo prazo e para toda a vida.
Também dedico aos meus alunos pelo
aprendizado vivenciado neste período.
5
RESUMO
O trabalho apresentado aborda inicialmente o público alvo da
pesquisa, a Educação Infantil nos contextos histórico, cultural, político e
educacional desde a sua iniciação como prática assistencialista até as novas
legislações que configuram a educação infantil como prática pedagógica que
incorpora ações e propostas que visam o aprendizado e o desenvolvimento
integral humano. Nesta perspectiva de educar os alunos da educação infantil
promovendo condições adequadas para se desenvolver, nos diferentes
aspectos, como físico, motor, emocional, social, intelectual e ampliar suas
experiências vividas no espaço escolar, nos tempos atuais, faz-se necessário
conhecer a Neurociência como uma nova ferramenta de estudo para entender
melhor como se dá o funcionamento do encéfalo, como ele processa as
informações, como ele interage com o meio ambiente e como ele aprende.
Assim, a pesquisa aborda: de que maneiras o conhecimento neurocientífico
pode ajudar professores a estimular, através das artes, a criatividade infantil?
Para responder a questão citada, o trabalho se desenvolveu em meio aos
estudos neurocientíficos, entendendo o acontecimento da criatividade como
algo que inicia no cérebro, nos estímulos cerebrais planejados e aplicados por
professores na educação infantil. Com este pensamento, a proposta de criação
de atividades artísticas geram diferentes conexões neuronais, mudanças de
comportamento cognitivo e emocional, e criatividade nas formas de pensar e
agir. Diante das experiências aqui apresentadas e analisadas, entende-se que a
arte em geral pode estimular a criatividade das crianças desde a mais tenra
idade.
Palavras chave: Educação Infantil, Neurociência, Criatividade,
Neuroplasticidade, Expressão Artística e Aprendizagem.
6
METODOLOGIA
As manifestações artísticas selecionadas, a saber: literatura,
grafismo, pintura e dramatização foram observadas pela pesquisadora que atua
como professora na turma em destaque, sendo o passo inicial da metodologia
realizada. Posteriormente, houve o levantamento e o registro das experiências
didáticas, na modalidade educação infantil, realizadas no ano de 2012 com um
grupo de 20 crianças, com faixa etária de 4 anos, em uma escola particular
localizada na cidade do Rio de Janeiro.
Ao longo do trabalho, a pesquisadora e professora da turma,
embasada em estudos neurocientíficos analisou as experiências vivenciadas
pelos alunos, bem como as reações comportamentais e emocionais diante das
atividades propostas. Depois apresentou observações sobre o processo criativo
das crianças e suas prováveis mudanças de comportamento cognitivo e ou
emocional.
Neste processo, vale salientar a importância da explicitação do
conceito de criatividade, dentro do processo de criação; as contribuições da
neurociência no estímulo à memória e à criatividade; as possibilidades de
transformação cognitiva diante do desenvolvimento artístico criativo dentro do
cotidiano das crianças; e, principalmente, a importância de se conhecer as
áreas cerebrais potencializadas durante as atividades didáticas ao serem
estimuladas criativamente e de como colaboram com o surgimento de novas
7
sinapses, favorecendo a construção de conhecimento, garantindo uma
aprendizagem significativa.
Desta maneira, a metodologia realizada foi permeada de relatórios de
observação e a pesquisa de campo, além de pesquisa bibliográfica que de
grande relevância, fundamentou o trabalho realizado, permitindo a
pesquisadora entender como ocorrem os processos de criatividade e como a
neurociência contribui para uma aprendizagem criativa. Os autores que seguem
fomentaram a curiosidade da pesquisadora e serviram como a base do estudo
em análise. São eles: Marta Pires Relvas, António Damásio, Iván Izquierdo,
Roberto Lent, Saturnino de La Torre e Shelley Carson. Vale registrar, também, a
importância ao frequentar as aulas no Curso de Neurociência, bem como
assistir vídeos relacionados ao tema de estudo e ao acesso de sites que
abordaram a pesquisa retratada.
8
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 09
CAPÍTULO I - Neurociência e educação infantil 13
1.1 – Breve história da Educação Infantil no Brasil
1.2 - Breve história da Neurociência
CAPÍTULO II - Neuroaprendizagem na Educação Infantil 27
CAPÍTULO III – Cérebro e Criatividade 40
3.1 – Processo Criativo
3.2 – Plasticidade cerebral e as experiências artísticas criativas
CONCLUSÃO 75
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 78
ÍNDICE 80
9
INTRODUÇÃO
As artes acompanham e escrevem a história da humanidade, desde
os primeiros grafismos encontrados em cavernas, como forma de expressão de
ideias, pensamentos, sentimentos, desejos e projeções futuras. As expressões
artísticas são o retrato de uma sociedade em um determinado tempo histórico e
social que revela as situações do cotidiano, as angústias, à cultura de um povo
e promove ações futuras de sucesso, desejo e sonhos da humanidade.
...Sabemos que nossos ancestrais humanos mais diretos andavam pela Terra há cerca de 200 mil anos, e que por volta de 30 mil anos atrás humanos estavam criando pinturas e esculturas, entalhando em rocha, fundindo metais, confeccionando joias e possivelmente fazendo música... Temos aí, obviamente, a presença de uma mente capaz de processar símbolos. (DAMÁSIO, 2011, p. 351)
António Damásio em seu livro: E o cérebro criou o homem (2011)
relata com propriedade como a consciência humana surgiu, como ela se
constitui e como ainda é capaz de transformar a realidade por meio da mente.
Nessa perspectiva, é indispensável o conhecimento sobre o encéfalo e suas
possibilidades de aprendizagem, sejam nos âmbitos da ciência e hoje, da
educação.
Algumas indagações feitas por Damásio (2011) são pertinentes à
reflexão ao estudo em destaque.
10
Como é que os bilhões de neurônios em um cérebro humano e os trilhões de sinapses que eles formam conseguem produzir não só ações que constituem os comportamentos, mas também mentes... Capazes de criar culturas? (DAMÁSIO, 2011, p. 365) ... Nos humanos, quando essas mentes conscientes organizaram-se em coletivos de seres semelhantes, tornou-se possível a criação de culturas e dos artefatos externos que as acompanham. As culturas, por sua vez, influenciaram o funcionamento dos cérebros no decorrer das gerações e acabaram influenciando a própria evolução do cérebro humano. (DAMÁSIO, 2011, p. 380)
Como o ser humano produz cultura por meio de suas interações com
o meio e com os seus pares, torna-se possível utilizar as experiências artísticas
como ferramenta para o processo criativo, possibilitando a presença da
plasticidade cerebral na educação.
A presente pesquisa mostrará o desenvolvimento do conceito de
criatividade, através das artes, tendo como base leituras neurocientíficas, no
contexto da educação infantil de uma escola particular do Rio de Janeiro.
Os capítulos que seguem salientaram a história da educação infantil no
Brasil e a história da neurociência como base do estudo em destaque,
identificou a importância de neuroaprendizagem na educação infantil, descreveu
o conceito de criatividade artística na neurociência e analisou algumas práticas
de ensino cujo conteúdo artístico se refletiu em resultados criativos na criança.
O processo criativo quando estimulado na escola desde a educação
infantil possibilita o desenvolvimento de habilidades que permitem a criança
pensar, dar soluções criativas para os desafios apresentados, ter uma visão
diferenciada diante dos padrões pré-estabelecidos pela sociedade.
11
A escola deve proporcionar um clima confiável e facilitador do desenvolvimento de potenciais criativos, que determinará uma autoconsciência do processo vivenciado, do produto e potenciais próprios do aluno. (...) “oferecimento de estímulos certos pode evocar uma torrente de criatividade”. (RELVAS, 2012, p. 191)
Sendo assim, a criança é capaz de revelar o seu ser, sua
individualidade e suas ideias quando está envolvida em um ambiente rico em
estímulos e experiências que permitem e valorizam a liberdade de expressão
diante das situações apresentadas, favorecendo a autonomia, o
autoconhecimento, bem como a imaginação, pontos estes positivos na busca de
transformar a realidade e a si mesmo.
A memória é um fator importante no processo criativo. Pois quando a
criança participa de uma experiência artística, utiliza diferentes recursos para se
expressar, assim evoca múltiplas memórias com informações afins para realizar
sua obra de arte. E como resultado mantém seu cérebro seletivo e reestruturado
durante o funcionamento. Logo, a realização de uma obra de arte é a conclusão
da junção de várias informações comuns em torno de uma ação, projeção de
ação, ou resultado da ação.
Neste sentido, justifica-se este trabalho, quando se pretender analisar
experiências didáticas ligadas à arte, no caso, a literatura, o grafismo, a pintura,
e a música; e comportamentos criativos estimulados justamente por essas
experiências didáticas, em meio ao conteúdo neurocientífico.
Para que ocorra no âmbito educacional o processo de criatividade,
faz-se necessário que os professores compreendam como o cérebro funciona,
como ele aprende, como ele interage com o meio, quais são as áreas cerebrais
12
que precisam ser ativadas no processo criativo e como as artes contribuem
nessa perspectiva.
Marta Relvas (2011) afirma que quando o professor entende as
dimensões cognitivas, motoras, sociais e afetivas do sujeito que aprende e suas
formas de interação nos ambientes contribuem para o sucesso da
aprendizagem. Pois, “o sistema nervoso coordena as atividades internas e
externas do organismo, produzindo uma integração e a busca em manter a
homeostase do indivíduo com o mundo externo.” (RELVAS, 2011, p. 35)
...Os educadores tiverem seus olhares focalizados na promoção do desenvolvimento dos diversos estímulos neurais que se expõem de forma que se compreendam os processos e os princípios das estruturas do cérebro, conhecendo e identificando cada área funcional... Para aquisição da aprendizagem, utilizando-se de recursos sensoriais, como instrumento do pensar e do fazer. (RELVAS, 2011. P. 34) A melhor maneira de potencializar a originalidade está na flexibilidade do educador para aceitar e estimular as novas ideias que os alunos propõem, já que a criança tende instintivamente a criar e a inovar, desde que não seja freada. (TORRE, 2008, p. 30)
Saturnino de La Torre (2008) corrobora com Relvas quando afirma
que o processo de criatividade pode ser desenvolvido no ambiente escolar e
quando acontece traz benefícios para a humanidade que dispõe de seres
capazes de pensar sobre suas curiosidades, inquietações e interesses,
possibilitando a transformação da realidade.
13
CAPÍTULO I
NEUROCIÊNCIA E A EDUCAÇÃO INFANTIL
1.1- Breve História da Educação Infantil no Brasil
A educação infantil no Brasil, inicialmente, não tinha esse nome, pois
se dedicava quase que exclusivamente a assistir as crianças órfãs,
abandonadas ou que as mães precisavam trabalhar, oferecendo cuidados
básicos de higiene e alimentação. Não havia uma intenção pedagógica com
uma proposta elaborada por profissionais que atendessem aos interesses,
curiosidades e necessidades que contribuíssem para o desenvolvimento integral
das crianças.
No século XVI, no Brasil, segundo Ariès (apud Kuhlmann Jr. 1998),
os jesuítas, trouxeram crianças órfãs de Portugal para conviverem com as
crianças indígenas, no desenvolvimento de estratégias de catequese e na
contribuição da “educação dos pequenos indígenas”, assim denominada pelos
jesuítas. Estes implementaram o programa educacional “Ration Studiorum”, que
estabeleceu as classes separadas por idade e a introdução da disciplina.
Alguns aspectos, como a maternidade, o trabalho feminino fora de
casa e a infância estão presentes na história das instituições de educação
infantil como um novo período vivido na sociedade, como afirma Kuhlmann Jr.
(1998, p.81) “(...) a história das instituições pré-escolares somam a interação de
14
tempos, influências e temas, em que o período de elaboração da proposta
educacional assistencialista integra aos outros tempos da história dos homens”.
A primeira infância começou a ser pensada por alguns grupos da
sociedade, como os médicos. Mas, vale ressaltar que a infância pobre e negra
da época era desrespeitada e subjulgada, podendo ser observada em um trecho
do artigo “A creche (asilo para a primeira infância)”, escrito pelo médico Dr. K.
Vinelli no jornal “A Mãi de Família”, em janeiro de 1879.
Que tarefa não é de educar o filho de uma escrava, em ente de uma condição nova que a lei teve de constituir sob a condição de ingênuo! Que grave responsabilidade não assumimos conservando em nosso lar, junto de nossos filhos, essas criaturazinhas que hoje embalamos descuidosas, para amanhã vê-las talvez convertidas em inimigos da nossa tranquilidade, e quiçá mesmo da nossa honra! (KUHLMANN Jr., 1998, p. 83)
Dois momentos, no ano de 1899, marcaram o início das instituições
pré-escolares no Brasil. O primeiro foi à fundação, no dia 24 de março, do
Instituto de Proteção e Assistência à Infância do Rio de Janeiro, pelo médico
Arthur Moncorvo Filho. O Instituto foi o pioneiro no atendimento a infância e
promovia grande influência. Em 1929, já havia 22 filiais espalhadas pelo Brasil.
O Instituto de Proteção à Infância do Rio de Janeiro acompanhava a gestação
da mulher, oferecendo assistência no momento do parto em casa, atendimento
ao recém-nascido e lactante, além da creche e vacinação. E o segundo
momento foi à inauguração da creche da Companhia de Fiação e Tecidos
Corcovado, também no Rio de Janeiro. Esta foi a primeira creche brasileira para
filhos de operários registrada.
15
Enquanto para as famílias mais abastadas pagavam uma babá, as pobres se viam na contingência de deixar os filhos sozinhos ou colocá-los numa instituição que deles cuidasse. Para os filhos das mulheres trabalhadoras, a creche tinha que ser de tempo integral; para os filhos de operárias de baixa renda, tinha que ser gratuita ou cobrar muito pouco; ou para cuidar da criança enquanto a mãe estava trabalhando fora de casa, tinha que zelar pela saúde, ensinar hábitos de higiene e alimentar a criança. A educação permanecia assunto de família. Essa origem determinou a associação creche, criança pobre e o caráter assistencial da creche. (DIDONET, 2001, p. 13).
A iniciativa privada começou a se movimentar oferecendo educação
pré-escolar as crianças providas de recursos financeiros. Para chamar atenção
da clientela e diferenciar o espaço privado do assistencialismo dedicado aos
pobres, a iniciativa privada utilizava o termo “pedagógico” como propaganda
mercadológica. No Rio de Janeiro, o Colégio Menezes Viveira (1875) e em São
Paulo, a Escola Americana (1877) eram as principais instituições voltadas para
pré-escola da elite brasileira.
As referências de implementação de jardins de infância para a
pobreza não se concretizavam de forma efetiva, pois eram apenas arranjos
alternativos preocupando a iniciativa privada brasileira que visava o
desenvolvimento das suas próprias escolas. Desta maneira, em 1883, o setor
privado legitimou seus interesses ao publicar textos na “Exposição Pedagógica”.
Outros grupos da sociedade se movimentaram e criaram espaços
para a infância. Entre eles, o “Patronato de Menores”, fundado por juristas
brasileiros, em 1906 no Distrito Federal. Com o intuito de abrigar as crianças
16
cujas mães trabalhavam fora de casa, o Patronato de Menores, criou a “Creche
Central”.
Dentre os diferentes objetivos do Patronato dos Menores, destaca-se
fundar creches e jardins de infância, proporcionar aos menores pobres recursos
para o aproveitamento do ensino público primário, promover assistência de
detentos menores, promover a extinção da promiscuidade ao evitar a
convivência dos menores de ambos os sexos.
Enquanto em São Paulo, em 1901, um grupo de senhoras
professoras fundou a “Associação Feminina Beneficente e Instrutiva” que
oferecia amparo e educação para a mulher e a infância, como também
preparava professoras para atuarem nos maternais (creche e pré-escola) e uma
escola noturna de alfabetização para as mulheres.
Acreditava-se que a mulher era responsável pela educação da
criança na primeira infância, criando zonas de conflito e interesses. As
instâncias jurídicas, médicas e religiosas controlavam e geriam as ações que
atendiam a infância. Cada um justificava a implementação de creches, asilos ou
jardins de infância de acordo com seus interesses e necessidades.
Os agentes das diferentes instâncias relatadas se articularam e
promoveram a constituição de associações assistenciais privadas.
Essas influências oportunizaram a organização e participação de
congressos sobre os temas relacionados à infância, como saúde, educação
entre outros assuntos.
Em 1922 aconteceu o “1º Congresso Brasileiro de Proteção à
Infância”, juntamente com o “3º Congresso Americano da Criança” que
17
promoveram formulações originais, sintetizando o conjunto das preocupações
que envolviam a infância.
Seu objetivo era tratar de todos os assuntos que direta ou indiretamente se referiam à criança, tanto no ponto de vista social, médico, pedagógico e higiênico, em geral, como particularmente em suas relações com a família, a sociedade e o Estado. (KUHLMANN Jr., 1998, p.90)
Luiz Palmeira fazia parte do grupo Liga Intelectual Clarté, que
publicou na revista Clarté o artigo “A infância abandonada”, que denunciava e
questionava as publicações expostas no Congresso Brasileiro de Proteção à
Infância. Um trecho do artigo diz que “Para nós outros, que não aderimos, esse
Congresso nada resolverá de prático, porque a causa do abandono infantil não
será nunca discutida”. (KUHLMANN Jr., 1998, p. 97).
Ele acreditava que a desigualdade econômica produzida pelo sistema
capitalista era a causa de abandono da infância. Luiz Palmeira ainda relata em
seu artigo
Para esses sociólogos de pacotilha o abandono da infância se acabará com simples, com meras sugestões de filantropismo, como se possível lhes fosse solucionar o problema com a criação de casas de caridade (...) Porquanto até hoje o coeficiente de pequeninos miseráveis não tem diminuído. (KUHLMANN Jr., 1998, p.97 – 98)
Vale resaltar a grande contribuição feita pela professora Maria
Lacerda de Moura, em 1920, às concepções majoritárias do Congresso que
denunciavam as propostas assistencialistas. Ela encaminhou suas ideias à
comissão organizadora que publicou no 7º boletim do Congresso.
18
Seu pensamento revelava aspectos de uma consciência crítica em
relação ao que era proposto para a infância na época pelo Congresso.
Tudo ao alcance de todos! Educação clássica pelo teatro: Corneille, Racine, Ibsen, Shakespeare, Moliere, (...). Bibliotecas públicas por toda a parte. Museus. Exposições permanentes. Edições de todas as obras clássicas, distribuídas pelos lugares mais longínquos. Escolas ao ar livre (...). Postos de higiene. Centros de Música. Excursões e viagens. Escolas de professores. Conselhos de professores. Escolas de belas artes (...). Escolas para cegos e surdos-mudos. Escolas para mutilados. Aproveitamento do cinematográfico como meio de educação sob todos os aspectos (...). Campos de jogos. Escolas maternais e jardins de infâncias. Laboratórios e postos dentários (...). Universidades. Parques e jardins públicos, etc. Enfim, o bem-estar para todos, a satisfação das vocações e das necessidades. A saúde e a alegria de viver. Nada disso é possível no atual regime, porque os detentores do poder e do capital ficariam prejudicados nos seus interesses pessoais. (KUHLMANN Jr., 1998, p.99)
A infância e o reconhecimento dos seus direitos vêm conquistando
debates educacionais e sociais ao longo dos anos. Esses diálogos permitiram
mudanças significativas na concepção da infância e na implementação de
políticas públicas, reconhecendo e respeitando essa fase da vida de um
indivíduo.
Os direitos das crianças vigoraram a partir da Declaração Universal
dos Direitos das Crianças, aprovada em 1959 pela Assembleia Geral da
Organização das Nações Unidas (ONU), garantindo a infância uma gama de
direitos, como a liberdade, proteção, saúde e bem-estar, recreação, lazer e
educação.
O direito a educação escolar incentivou a organização, nas instâncias
públicas e privadas, de instituições que atendessem a primeira infância,
19
possibilitando o desenvolvimento e a aprendizagem das crianças. Desta
maneira, a escola infantil incorporou uma proposta educativa, se distanciando
do caráter exclusivo ao assistencialismo.
Ao longo dos anos, leis definiram e regulamentaram as políticas
educacionais no Brasil.
(...) a expressão educação infantil foi adotada recentemente em nosso país, consagrada nas disposições expressas na Constituição de 1988, assim como na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de 1996, para caracterizar as instituições educacionais pré-escolares, abarcando o atendimento dos 0 aos 6 anos de idade. (KUHLMANN Jr., 1998, p. 7)
Com a preocupação de atendimento a todas as crianças,
independente da sua classe social, iniciou-se um processo de regulamentação
da educação infantil no âmbito da legislação. A Constituição de 1998, o Estatuto
da Criança e do Adolescente, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDB 9.394/96), as Diretrizes Curriculares para a Educação Infantil e o Plano
Nacional de Educação destacam-se na promoção de como a infância precisa
ser respeitada e valorizada como uma etapa de desenvolvimento do ser
humano.
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 208, o inciso IV “(...) O
dever do Estado para com a educação será efetivado mediante a garantia de
oferta de creches e pré-escolas às crianças de zero a seis anos de idade”.
(BRASIL, 1998.)
O Estatuto da Criança e do Adolescente, em 1990, reafirmou os
direitos constitucionais em relação à Educação Infantil enquanto, a Lei de
20
Diretrizes e Bases da Educação Nacional afirma que é de responsabilidade
constitucional dos municípios ofertarem a Educação Infantil, contando com a
assistência técnica e financeira da União e dos estados. O documento reafirma
também, no artigo 29 que...
A Educação Infantil, primeira etapa da educação básica, tem por finalidade o desenvolvimento integral da criança até aos seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, compartilhando a ação da família e da comunidade. (LDB 9.394/96)
O documento “Política Nacional de Educação Infantil” publicado em
1994 promoveu metas de expandir vagas e políticas de melhoria de qualidade
no atendimento às crianças, ressaltando a necessidade de qualificar os
profissionais.
Com o intuito de promover parâmetros para a manutenção e criação
de novas instituições de educação infantil, o Ministério da Educação publicou os
documentos: “Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, como
parte dos Parâmetros Curriculares Nacionais” e as “Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação Infantil”. Os documentos citados são, atualmente, os
principais instrumentos para elaboração e avaliação das propostas pedagógicas
das instituições de Educação Infantil no Brasil.
Além de ser considerada a primeira etapa da Educação Básica, a
educação infantil, torna-se um direito da criança e deve promover a ela
condições adequadas para se desenvolver nos diferentes aspectos, como físico,
motor, emocional, social, intelectual e ampliar as experiências vividas no espaço
escolar.
21
Observam-se avanços na importância de promover à educação
infantil para a formação das crianças, como o seu ingresso da mais tenra idade
no sistema educacional de ensino. Tornando fundamental, que haja um
compromisso social em favor do acesso à educação de qualidade ao respeitar e
fazer valer os direitos da criança descritos nos documentos das políticas
educacionais brasileira.
Sendo assim, faz-se necessário que os profissionais da educação
tenham conhecimento da Legislação Educacional que vigora para que
fundamente sua prática pedagógica na elaboração e promoção de propostas
que atendam as necessidades da educação infantil, possibilitando a melhoria
das intervenções e práticas educativas a serviço da dessa etapa da
escolarização.
1.2- Breve História da Neurociência
A Neurociência, atualmente, é conhecida como um campo de estudo
que por meio de diferentes disciplinas e pelos seus diversos métodos, estudam
o Sistema Nervoso Central e a relação entre as funções cerebrais e mentais.
As disciplinas envolvidas (Anatomia, Biologia, Farmacologia,
Fisiologia, Genética, Patologia, Neurologia, Psicologia, Psiquiatria, Química,
Radiologia e recentemente, a Educação) buscam explicar o funcionamento do
sistema nervoso central na relação com o meio ambiente.
Para compreender melhor, esse campo de estudo, a história da
Neurociência será discorrida como fato elucidador do assunto abordado.
22
No século III a. C., Herophilus (335 -280 a. C.) e Erasistratus (c. 310 -
250 a. C.), no Egito, iniciaram os estudos anatômicos do cérebro. Dissecavam
cadáveres e registravam as descrições detalhadas do cérebro, especialmente
dos ventrículos cerebrais.
Hipócrates e Aristóteles (460 – 379 a. c.) tinham visões diferentes
sobre o cérebro e seu funcionamento. Aristóteles acreditava que o cérebro era
oco por onde as veias passavam por volta e por cima dele, com a função de
“resfriar”, pois o coração era fundamental para a sobrevivência do ser humano.
Enquanto, Hipócrates acreditava que o cérebro era o centro vital do organismo.
Nos anos compreendidos entre 130 – 200 d. C. o médico romano
Galeno, contribuiu com os estudos científicos ao descobrir “buracos” no
cérebro, que posteriormente receberam o nome de ventrículos cerebrais. Ele
acreditava que passavam “líquidos – fluidos vitais” por dentro do cérebro onde
se levava e trazia informações. Desta maneira, Galeano descreveu os
ventrículos cerebrais com detalhes, fazendo a correlação entre as formas e as
funções cerebrais. Para o médico romano, o primeiro ventrículo era responsável
pelo recebimento de informações do ambiente e correspondia às sensações. O
segundo ventrículo processava as informações em imaginação e pensamento e
o terceiro ventrículo era responsável pelo armazenamento da informação em
memória. No entanto, o médico, acreditava que os espíritos de animais ficavam
armazenados no cérebro.
Nos períodos de 1514 a 1564, o anatomista Andreas Vesalius,
natural de Bruxelas, não aceitava que as faculdades mentais estariam nos
23
ventrículos e lamentava não poder formar opinião de como o cérebro regula a
imaginação, o raciocínio e a memória.
René Descartes, no período de 1596 a 1650, tinha uma visão um
pouco diferente da doutrina ventricular, pois acreditava que a maioria das
atividades corporais, como o movimento, digestão, respiração, sono e sensação
tinham uma explicação mecanicista, onde o corpo físico e o cérebro funcionam,
como os bonecos mecânicos e máquinas hidráulicas em Paris, invenções da
época. Para Descartes a glândula pineal era a ligação entre o corpo e a alma.
O anatomista austríaco, Franz Gall, nos anos compreendidos entre
1758 a 1828, desenhou com precisão as circunvoluções corticais. Ele
acreditava que o córtex cerebral tinha diferentes porções e que nestas porções
estavam alojadas as funções mentais. Em 1810, postulou 27 faculdades
“afetivas e intelectuais”, importantes para o estudo daquela época.
Johann Spurzheim, discípulo de Franz Gall, no período compreendido
de 1776 a 1832, ampliou as 27 faculdades descritas por Gall, para 35 e fez
correlações clínicas entre as lesões experimentais e estimulações localizadas.
Para o francês Pierre Flourens (1794 a 1867) os lobos cerebrais
tinham o seu funcionamento integrado, sem localização de funções específicas
e quando lesionado afetava igualmente todas as capacidades intelectuais.
Em 1809 Luigi Rolando fez a primeira estimulação de um nervo no
tecido cerebelar e descobriu uma fissura no cérebro que depois recebeu o seu
nome.
24
A descoberta de uma área no cérebro relacionada à linguagem,
expressão da fala e a correlação anatômica com as afasias, foram declaradas
pelo francês Paul Broca, no período de 1824 a 1880.
Em 1874 Carl Wernicke estudou sobre uma afasia relacionada
compreensão da linguagem, localizada em uma área específica do cérebro,
conhecida como área de Wernicke.
O alemão Friedrich Goltz (1834 - 1902) fez lesões experimentais em
cérebros de cachorros, mantendo-os vivos por um longo período.
O inglês David Ferrier (1870) fez estimulação precisa no córtex dos
macacos, apoiando a localização de funções no córtex. E o alemão Hermann
Munk (1839 – 1912) defendia como Ferrier a localização das funções sensoriais
e motoras, fornecendo de forma mais definitiva a localização da visão no córtex
occipital.
Com a descoberta da eletricidade, no período de 1737 a 1798, Luigi
Galvani descobriu que os animais submetidos a correntes elétricas nos “fios”
por onde passavam os “fluidos vitais” apresentavam contrações musculares.
Esta descoberta permitiu que o conceito de localização cerebral fosse
firmemente estabelecido nas Neurociências. Os alemães Gustav Fritsch (1838 –
1927) e Eduard Hitzig (1838 – 1907) aprofundaram os estudos com
estimulações de correntes elétricas em cães e coelhos, demonstrando desse
modo à localização funcional dos movimentos.
No século XIX com a invenção do microscópio os cientistas
observaram as células no cérebro e perceberam que uma célula poderia se
25
comunicar com as outras células nervosas, formando uma rede única, sem ter
um espaço entre elas.
Cajal utilizou um método de coloração e marcou as células nervosas
como individuais, desenhando-as em lâminas de microscópio. O cientista
descobriu que a rede neuronal não era única, pois as células tinham espaço
entre elas. As pesquisas de Cajal levam os estudos científicos a uma nova
teoria, descrita por Lent, (2008, p.10) “(...) a Teoria Neuronal, que vê o sistema
nervoso como um conjunto de células individuais, especializadas segundo a
região do cérebro, e organizadas ordenadamente em um sistema complexo”.
Considerado o pai da sinapse, o neurofisiologista inglês, Charles
Sherrington (1857 – 1952) identificou o “arco reflexo”, como movimentos
realizados pelos neurônios sensoriais e deu o nome de sinapse aos espaços
celulares que ocorrem nos mecanismos de transmissão de impulsos, embora
não soubesse ainda explicar como as células neurais se comunicavam.
Em 1921, Otto Loewi realizou experimentos com células nervosas
cardíacas, similares às células nervosas neuronais. Em sua pesquisa o cientista
descobriu que os nervos estimulados eletricamente liberavam uma substância
química, que posteriormente na década de 70 foram reconhecidos, identificados
e aceitos pela comunidade científica, como neurotransmissores. Desta maneira,
acredita-se que uma célula (neurônio) libera uma substância química
(neurotransmissor) que estimula a outra célula e assim por diante,
desencadeando uma rede.
O neurocirurgião Harvey Cushing (1869–1939) observou que a
estimulação da zona parietal do cérebro não provoca movimento e sim,
26
sensações táteis. Nos anos de 1950 Wilder Penfield, neurocirurgião canadense,
explorou com detalhes a estimulação elétrica no cérebro humano, produzindo
sensações de cores, luzes, sons e movimentos percebidos pelo paciente,
dependendo da área do córtex ativado.
O americano Herbert Jasper (1906 – 1999) iniciou o uso do
eletroencefalograma, com o objetivo de conhecer mais sobre a atividade de
neurônios individuais no cérebro. Juntamente com David Hubel, Jasper
intensificou seus estudos e por meio dos microeletrodos observaram a atividade
neuronal em animais de laboratório durante os estados de sono, vigília, atenção
e estados anormais como as crises epiléticas.
Em 1992, foi utilizado pela primeira vez o imageamento funcional por
ressonância magnética que possibilitou o avanço nos estudos da Neurociência,
pois tem mostrado que o funcionamento do cérebro envolve não apenas as
áreas esperadas, mas há ativação coordenada de várias regiões do córtex
trabalhando em conjunto.
Os estudos recentes de plasticidade cerebral, células glias, técnicas
de imageamento funcional, entre tantas outras pesquisas possibilitam uma
gama de conquistas científicas que envolvem o conhecimento do sistema
nervoso, permitindo o crescimento da ciência como colaboradora no processo
de sobrevivência e adaptação do ser humano no mundo que vive e se relaciona.
Conhecer a história da Neurociência permite aos educadores uma
nova ferramenta de estudo para conhecer melhor como se dá o funcionamento
do encéfalo, como ele processa as informações, como ele interage com o meio
ambiente e como ele aprende.
27
CAPÍTULO II
NEUROAPRENDIZAGEM NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Inicialmente, neste capítulo, a infância será abordada para
compreender o público alvo da educação infantil, base deste estudo.
A palavra “infância” oriunda do latim infantia, significa “incapacidade
de falar” e, desde a sua origem, traz consigo a característica de incapacidade,
deixando a criança na condição de subalterna na sociedade.
Na Idade Média a criança era tratada como adulto em tamanho
menor, e não havia acomodação ou vestimenta especial para ela. As crianças
recebiam tratamento diferenciado apenas nos primeiros anos de vida, enquanto
dependiam diretamente dos cuidados das mães ou amas. Depois os pequenos
aprendiam os ofícios como aprendizes, em casas de outras famílias.
A partir dos séculos XVI e XVII, por meio da Revolução Educacional,
as crianças passaram a estar, então, separadas dos adultos, e, em vez de
receberem ensinamentos de hábitos e profissões pelo convívio, foram
encaminhadas para as escolas.
Na idade moderna a criança era vista como uma fase da vida em que
o ser humano precisava de cuidados especiais e que deveria ficar resguardada
de informações que poderiam ser nocivas ao seu desenvolvimento.
Com o passar dos séculos, chegando à contemporaneidade, a
infância ganhou um novo olhar.
28
No século XX a criança passou a ser reconhecida como um ser
humano em desenvolvimento, com características próprias, necessitando de
práticas educacionais específicas.
Os novos conhecimentos científicos, educacionais, psicológicos e
sociais sobre a infância trouxeram a valorização e a proteção para a criança,
que passou obter direitos garantidos por lei, visando à melhoria de qualidade de
vida.
O caráter assistencialista praticado por muito tempo na educação
infantil foi perdendo espaço para as propostas educativas que concebem como
importante o desenvolvimento desta faixa etária.
Para Faria & Salles (2007, p.44) é preciso considerar a criança como
um sujeito que possui “desejos, ideias, opiniões, capacidade de decidir, de criar,
de inventar, que se manifestam, desde cedo, nos seus movimentos, nas suas
expressões, no seu olhar, nas suas vocalizações, na sua fala”. Nesse contexto,
a educação infantil precisa atender a infância como produtora de culturas, de
modo a promover a educação intencional das crianças, ampliando as suas
possibilidades de desenvolvimento e aprendizagem.
A criança reconhecida como sujeito, já constitui ideias, valores,
códigos próprios e formas específicas de entender a realidade. Ao compreender
a criança como fruto das relações sociais, entende-se a sua singularidade e
complexidade, pois, inserida no meio cultural, ela se relaciona com novos
conhecimentos e pensa em seu entorno de maneira peculiar, transformando-o.
Para atender com qualidade as especificidades da faixa etária que
compreende a educação infantil, faz-se necessário o aperfeiçoamento dos
29
educadores e profissionais da educação para que garantam o desenvolvimento
pleno dos alunos. Assim, os estudos da neurociência contribuem nas práticas
de ensino, por meio do conhecimento do funcionamento do sistema nervoso.
Segundo Relvas (2012, p.150) “hoje, o diálogo entre educação e
neurociência é possível”, entretanto faz-se necessário conhecer e pesquisar os
processos neurofisiológicos na relação da aprendizagem e do comportamento
humano. As atividades pedagógicas apresentadas em sala de aula e na escola
devem promover especificamente o aprofundamento dos conceitos e o
desenvolvimento de pensamentos mais abrangentes e complexos do cérebro, a
fim de saber aplicar e provocar diferentes estímulos no momento certo no
processo do acompanhamento nos métodos pedagógicos.
Relvas (2012) ainda afirma que
A neurociência objetiva explicar, modelar e descrever os mecanismos neuronais que sustentam os atos perceptivos, cognitivos, motores, afetivos e emocionais, disponibilizando os fundamentos necessários à orientação de aprendizagem. (RELVAS, 2012, p.134)
Conhecer o cérebro é conhecer a si mesmo, perceber suas
habilidades, sentir e interpretar suas emoções para viver melhor em constantes
adaptações ao meio, adquirindo novas aprendizagens ao longo da vida.
A revista Neuroeducação (2012, p.36), no artigo “Um ABC do
cérebro” afirma que o cérebro é o centro das capacidades mentais humanas. O
cérebro coordena funções vitais ao controlar a frequência cardíaca, a
temperatura do corpo, a respiração etc, como também ao desempenhar as
30
chamadas funções “superiores”, como a linguagem, o raciocínio e a
consciência.
Já ao nascer, o cérebro humano é capaz de estabelecer uma gama
de conexões neurais e com o passar do tempo os estímulos recebidos permitem
a ampliação da sua capacidade de agir no mundo, raciocinar, realizar
movimentos, analisar conceitos abstratos entre outros; pois o cérebro de um
indivíduo é dotado de grande potencial para desenvolver suas conexões. Assim,
favorece-se a formação do cérebro criativo, inventivo e autor da sua história.
O cérebro humano, segundo os neurocientistas Roberto Lent e
Suzana Herculano – Houzel (2009) , contém 86 bilhões de neurônios. Cada um
deles pode formar conexões com outros neurônios, criando uma rede, de
aproximadamente, 100 trilhões de conexões neurais. Damásio (2011, p.32)
complementa a informação acima quando diz que “o número de neurônios é da
ordem dos bilhões, e os contatos sinápticos que os neurônios fazem entre si
estão na casa dos trilhões”.
Cada neurônio pode se comunicar com até outros mil. (...) Como o ser humano tem de 10 bilhões a 100 bilhões de células, é possível haver até 100 trilhões de conexões sinápticas. A capacidade de processamento de informações do sistema nervoso provém da integração entre os milhares de sinapses existentes em cada neurônio. (RELVAS, 2009, p.57)
Os neurônios são células especializadas que processam
informações. Cada neurônio possui um corpo celular, dendritos que recebem
informações de outros neurônios, e um axônio que transmite informações para
outros neurônios. O axônio é a principal unidade condutora do neurônio e é
revestido por uma gordura chamada mielina. Esta é capaz de proteger o axônio,
31
pois age como um isolante, permitindo que os sinais elétricos enviados sejam
passados de uma célula a outra.
Damásio (2011, p.32) afirma que os neurônios realizam contatos
sinápticos e se organizam “em pequenos circuitos microscópicos cuja
combinação forma circuitos progressivamente maiores, e estes formam redes ou
sistemas”.
http://saude.hsw.uol.com.br/antidepressivos1.htm, acesso: 10/01/2013
Relvas (2009, p.28) explica como a informação passa de um neurônio
a outro. “A informação é processada por um evento conhecido como impulso
nervoso”, que consiste na transmissão de um sinal codificado de um do estímulo
ao longo da membrana do neurônio, a partir do ponto em que foi estimulado.
Quando os sinais de um neurônio são transmitidos a outro por meio
de interseções entre o axônio do neurônio que está enviando o sinal e o
dendrito que está recebendo, chama-se sinapse. A sinapse química ocorre
nessa interação e neste momento, o axônio libera substâncias químicas
identificadas como neurotransmissores, os quais ser reúnem a receptores
químicos na membrana do neurônio seguinte.
32
http://www.psiqweb.med.br/site/, acesso: 10/01/2013
Enquanto na sinapse elétrica as células possuem um íntimo contato
através junções abertas que permite o livre trânsito de sinais elétricos de uma
membrana a outra, desta maneira o potencial de ação passa de uma célula para
outra muito mais rápido que na sinapse química não podendo ser bloqueado.
As reações químicas que acontecem em nosso cérebro
(materializadas nas sinapses, conforme descrito anteriormente) são as
responsáveis pelo aprendizado, que acontecerá conforme o processamento
dessas reações por nosso cérebro, em função da ação de neurotransmissores.
Quimicamente, os neurotransmissores são moléculas relativamente
pequenas e simples. Diferentes tipos de células secretam diferentes
neurotransmissores. Cada substância química cerebral funciona em áreas
bastante espalhadas, mas muito específicas do cérebro e podem ter efeitos
diferentes dependendo do local de ativação.
Os neurotransmissores envolvidos no processo da educação são a
dopamina, a serotonina, a acetilcolina, o GABA, a noradrenalina e o glutamato.
A dopamina produz sensações de satisfação e prazer. Funciona na
regulação dos movimentos, na regulação do comportamento emocional e
33
proteja-se para o córtex pré-frontal envolvendo algumas áreas como as funções
cognitivas, a memória, o planejamento de comportamento, o pensamento
abstrato e em aspectos emocionais relacionados ao estresse.
A serotonina regula o humor, a atividade motora, funções cognitivas
entre outras. Utilizada com significativo efeito no humor, na ansiedade e na
agressão.
Áreas cerebrais envolvidas a aprendizagem, a memória e a atenção
são controladas pela acetilcolina.
O ácido gama-aminobutirico, mais conhecido como GABA, presente
em quase todas as regiões do cérebro está envolvido com os processos de
ansiedade.
A excitação física e mental e o bom humor são induzidos pela
substância química chamada noradrenalina.
Enquanto o glutamato torna-se vital para estabelecer os vínculos
entre os neurônios que são a base da aprendizagem e da memória a longo
prazo.
Os neurotransmissores quando são ativados de forma correta, não
havendo excesso ou a ausência de alguns deles, a aprendizagem ocorre de
forma prazerosa e significativa.
Carson (2012, p.56) diz que “quando você aprende algo novo ou
forma uma nova lembrança, novas conexões são feitas entre neurônios. Desta
maneira, o ato de aprender pode criar novos dendritos e novas conexões”.
Portanto, a cada momento que o ser humano realiza conexões neurais por meio
das sinapses, a rede de neurônios ganha força e velocidade. Damásio (2011,
34
p.368) ainda complementa quando afirma que “um aspecto fundamental para o
aprendizado é o fortalecimento das sinapses”.
Dependendo de como a rede de neurônios é acionada, a
comunicação pode enviar sinais para o corpo ou evocar lembranças.
Após conhecer um pouco sobre o funcionamento do sistema nervoso
e como ocorre o processamento de informações no cérebro, torna-se vital
promover o desejo pelo saber, tornando a aprendizagem significativa e
prazerosa. Ao estimular todas as áreas cerebrais, desenvolvem-se habilidades
para responder as adversidades da vida.
A aprendizagem é uma modificação biológica na comunicação entre os neurônios, formando uma rede de interligações que podem ser evocadas e retomadas com relativa facilidade e rapidez. Todas as áreas cerebrais envolvidas no processo de aprendizagem, inclusive a emoção. (RELVAS, 2012, p.230) Aprendizagem é o processo pelo qual o cérebro reage aos estímulos do ambiente, ativando sinapses, tornando-as mais “intensas”. Como consequência estas constituem-se em circuitos que processam informações com capacidade de armazenamento molecular. (SHEPHERD, MUSSAK, KOIZUMI apud RELVAS, 2012, p.151)
A emoção é um fator importante neste processo de ensinar e
aprender. Educadores e educandos precisam conhecer e interpretar suas
emoções, como elas se originam e como as emoções contribuem para que
ocorra a aprendizagem.
Relvas (2009, p.95) diz que “as emoções são conjuntos de reações
químicas e neurais que ocorrem no cérebro”. Lent (2008, p.228) contribui
afirmando que “a experiência emocional refere-se a estados subjetivos, frutos
35
da introspecção consciente”. Portanto, a emoção é uma experiência única,
sentida por cada ser humano de maneira diferente.
A coordenação subjetiva e comportamental das emoções é regulada
por um conjunto de estruturas do sistema nervoso central, denominado sistema
límbico. Ele comanda certos comportamentos necessários à sobrevivência de
todos os mamíferos, interferindo positiva ou negativamente no funcionamento
visceral e na regulamentação metabólico de todo o organismo.
As principais áreas cerebrais envolvidas na percepção da emoção e
na organização de respostas diante das emoções em seres humanos, capazes
de provocar a experiência emocional são descritas a seguir.
As amígdalas cerebrais identificam no ambiente o possível perigo em
potencial ao indivíduo, colocando-o em sinal de alerta para fugir ou lutar,
gerando medo e ansiedade. Lent (2008, p.257) afirma que a “amígdala é
considerada primordial no processo de integrar as informações sensoriais as
respostas comportamentais e fisiológicas, especialmente quando o estímulo
indica perigo”.
As amígdalas cerebrais são estruturas complexas que recebem
informações de todos os sistemas sensoriais e se conectam ao hipotálamo por
meio de feixes. Também estão envolvidas no armazenamento e modulação das
memórias formadas em uma situação de alerta emocional.
O hipocampo possibilita o ser humano a comparar as condições de
uma ameaça atual por meio das experiências anteriores, através das memórias
já armazenadas, permitindo ao córtex pré-frontal, decidir a melhor opção a ser
tomada como garantia de preservação.
36
O tálamo realiza conexões entre as estruturas do sistema límbico,
responsáveis pela regulação do comportamento emocional.
O hipotálamo contribui no processo de controle do comportamento,
regula várias condições internas do organismo como a temperatura, mantém
comunicação com os outros níveis do sistema límbico, as suas partes laterais
estão envolvidas com o prazer e a raiva, enquanto a porção mediana parece
ligada a aversão, ao desprazer e a tendência ao riso incontrolável. Quando os
sintomas físicos da emoção aparecem, a ameaça que produzem, retorna, via
hipotálamo, aos centros límbicos e, destes, aos núcleos pré-frontais,
aumentando, por um mecanismo de “feed-back” negativo, a ansiedade, podendo
até chegar a gerar um estado de pânico.
As representações da dor física e o sofrimento causado pela
separação social são detectados pelo córtex cingulado anterior. Por meio de
estudos, Lent registra a importância dos circuitos neurais que envolvem o córtex
cingulado anterior e a ínsula, na representação dos estados corporais internos e
emocionais subjetivos, quando afirma que
(...) constituem a base da nossa capacidade de formar representações subjetivas de sentimentos relativos à própria pessoa, mas também servem de base para a nossa capacidade de compreender a importância emocional de um determinado estímulo para uma pessoa e prever as prováveis consequências a ele associadas. (LENT, 2008, p. 268 e 269)
A ínsula codifica os estados corporais internos, como a dor,
temperatura, sensações musculares, entre outros e “projeta uma ação futura
pela representação mental dos estados corporais”. (LENT, 2008, p.268)
37
O córtex pré–frontal não faz parte do lobo límbico, mas está
intensamente conectado com o tálamo, as amígdalas cerebrais e outras
substâncias sub-corticais, explicando o papel que desempenha na expressão
dos estados afetivos. Contribui na tomada de decisões nos domínios pessoal e
afetivo, como na motivação do comportamento, pois é capaz de planejar ações
e prever as possíveis consequências futuras.
Sobre a importância do córtex pré-frontal na regulação das emoções,
Lent diz que
A regulação da emoção inclui todas as estratégias conscientes e inconscientes para aumentar, manter ou diminuir um ou mais componentes da resposta emocional. Esses componentes são os sentimentos, os comportamentos e as respostas fisiológicas que constroem as emoções. (LENT, 2008, p.267)
SISTEMA LÍMBICO
http://neuroinformacao.blogspot.com.br, acesso em: 10/01/2013
Relvas (2012, p. 32) confirma a importância da emoção no processo
de aprendizagem quando diz que “a aprendizagem emocional acontece em um
contexto dinâmico, relacional e emocional inconsciente. A emoção vai dando
forma à cognição e aprendizagem”.
38
Nessa perspectiva, os educandos precisam ser estimulados a
desenvolver a autonomia; a experimentar, a monitorar, interpretar e manejar
sentimentos, sendo capaz de solicitar ajuda quando necessário. E a proposta
pedagógica necessita estar embasada em eventos que promovam à
responsabilidade, a socialização, a cooperação, a capacidade de transpor
conflitos, a possibilidade de a criança ver o outro e se colocar no lugar dele,
percebendo o mundo de outra maneira e a preservação das relações afetivas.
Para adquirir aprendizagem é preciso que desperte as emoções. Sob
esse aspecto Relvas (2012) diz que
O processo de aprendizagem é acompanhado por sentimentos, envolvendo o domínio de conhecimento na forma de fatos, figuras e pensamentos. A emoção ativa a atenção,(...) que depois desencadeia a memória de curto e longo prazo e, eventualmente, torna o processo de aprendizagem possível. Para se ter aprendizagem, é preciso que ocorra excitação emocional. (RELVAS, 2012, p.38)
Uma sala de aula envolvida em um clima de tensão, estresse, medo e
autoritarismo promove a liberação de cortisol e adrenalina, substâncias que
agem como bloqueadores da aprendizagem, pois alteram a fisiologia do
neurônio, interrompendo as sinapses. Já em um ambiente inverso, as
substâncias serotonina e dopamina relacionadas ao prazer, satisfação e ao
humor são liberadas, envolvendo o clima escolar propício à aprendizagem.
Com base nos estudos da neurociência o professor precisa estimular
os alunos à curiosidade, ao interesse, desafiá-los na busca de resoluções as
dúvidas e inquietações por meio de atividades prazerosas, elaboradas e
39
organizadas a fim de atender as demandas do cérebro, favorecendo conexões
neurais, pois aprender é um ato desejante!
Nessa perspectiva, a educação infantil é o momento imprescindível
para a construção da cultura do aprender, para articular as diferentes
dimensões do ser humano, a expressão de ideias e sentimentos, desenvolver
habilidades e permitir a construção cooperativa do conhecimento. Sendo
necessário, que as crianças reflitam sobre suas ações e conceitos e perceber a
aprendizagem como construção, descoberta e aquisição de conhecimentos.
A aprendizagem está envolvida em diferentes aspectos e vale
desenvolver na infância competências para a aquisição, interpretação, análise,
compreensão e a comunicação da informação, pois “a aprendizagem não é
apenas biológica ou sináptica, mas também subjetiva, afetiva, emocional, social
e cultural”. (RELVAS, 2012, p.144)
40
CAPÍTULO III
CÉREBRO E CRIATIVIDADE
3.1- Processo Criativo A criatividade é a capacidade humana que permitiu o ser humano
sobreviver até agora, em face aos grandes desafios apresentados ao longo da
história. O processo criativo relatado por Ferreira (1982) afirma que
O potencial criador do homem realiza-se dentro de sua própria produtividade. Estimulado pelo desafio de necessidades a satisfazer, tarefas a cumprir a fim de sobreviver melhor, em seu trabalho o homem imagina soluções e cria. (FERREIRA, 1982, p. 36)
Segundo Relvas (2012) no livro “Que cérebro é esse que chegou à
escola?”, a criatividade humana possui diferentes conceitos que variam de
acordo com o campo de conhecimento, objeto de estudo e pesquisa, da época
histórica, social e cultural nos quais o ser humano está inserido. Desta maneira,
as abordagens ampliam as características e significados dados à criatividade.
Relvas (2012, p.176) afirma que a “originalidade, inovação, produtividade,
pensamento criativo, pensamento produtivo, pensamento divergente,
inventividade, descoberta, inteligência, entre outros” são significados comuns
dados à criatividade. A autora ainda relata que a criatividade “estaria nas
combinações que tivessem em sua fórmula a operação mental do tipo produção
divergente” que consiste na “formulação de alternativas variadas a partir da
41
informação dada, procura de diferentes soluções para o problema.” (RELVAS,
2012, p. 182)
Observa-se então, que ao longo da evolução humana, filósofos,
psicólogos, escritores e pensadores em geral apresentam diferentes conceitos
para a criatividade. Existem algumas concepções consideradas clássicas, como
caracteriza Aznar em “A criatividade designa a aptidão para produzir novas
soluções, sem seguir um processo lógico, porém estabelecendo relações
distantes entre os fatos” (apud TORRE, La De Saturnino, 2008, p.271),
enquanto Freud afirma que “A criatividade origina-se em um conflito
inconsciente”. (apud TORRE, La De Saturnino, 2008, p.271) A criatividade
também pode ser vista por Gervilha como “a capacidade para gerar algo novo,
seja um produto, uma técnica, um modo de enfocar a realidade”. (apud TORRE,
La De Saturnino, 2008, p.272) e pode ser considerada ainda como, “um
processo para formar ideias ou hipóteses, verificá-las e comunicar os
resultados, supondo que o produto criado seja algo novo” (apud TORRE, La De
Saturnino, 2008, p.272).
Izquierdo (2011, p. 127) acredita que a criatividade é construída “a
partir do que se sabe, e o que sabemos está em nossas memórias.”
A criatividade era vista como um dom exclusivo a algumas pessoas,
como cientistas, músicos, escritores e artistas em geral. Hoje, entende-se que a
criatividade pode ser uma habilidade a ser estimulada e desenvolvida, conforme
afirma Leonardo Steinberg
42
A atitude criativa parece fazer parte da estrutura constitutiva da espécie. Pode-se ler repetidamente que estamos diante de uma característica fundamental da natureza humana, uma possibilidade dada a todos ou a quase todos os seres humanos ao nascer; porém está frequentemente perdida, enterrada ou inibida pelos efeitos do processo de culturalização. (aput GOOWAN, DEMOS E TORRANCE, 1976, p.133)
A citação acima convida os professores, os coordenadores e os
gestores a pensarem e repensarem sobre a prática educativa realizada na
escola que pode estar podando processos criativos ou ainda não utilizando
meios para que a criatividade se desenvolva e potencialize a criação.
Acredita-se que quando o ser humano pensa com criatividade e
desenvolve suas habilidades, este consegue enfrentar as incertezas e dúvidas
que envolvem o cotidiano, favorecendo maior significado e qualidade de vida.
Segundo Relvas (2012, p.175), “a criatividade é um recurso valioso,
uma habilidade que pode ser estimulada, desenvolvida, trabalhada.” Relvas
(2012, p.190) complementa que a criatividade pode ainda ser “valorizada e
reconhecida como matéria-prima para educar. E que o fazer criativo esteja
sempre presente na educação escolar.”
A curiosidade infantil é relatada por Freire como manifestação à
experiência vital construída e reconstruída histórica e socialmente e
principalmente incentivadora no processo de criação.
A curiosidade como inquietação indagadora, como inclinação ao desvelamento de algo, como pergunta verbalizada ou não, como procura de esclarecimento, como sinal de atenção que sugere alerta faz parte integrante do fenômeno vital. Não haveria criatividade sem a curiosidade que nos move e que nos põe pacientemente impacientes diante do mundo que não fizemos, acrescentando a ele algo que fazemos. (FREIRE, 1996, p.32)
43
Para oferecer processos criativos e práticas educativas criativas faz-
se imprescindível conhecer como se dá o processo criativo no cérebro humano.
Os hemisférios direito e esquerdo do cérebro estão intimamente
envolvidos no pensamento criativo e no processo da criatividade. Esses
hemisférios estão interligados por um feixe de neurônios que permite a
comunicação entre eles, chamado corpo caloso. Os hemisférios apresentam
dobraduras de giros ou circunvoluções, separadas por sulcos ou fissuras.
O hemisfério esquerdo controla o lado direito do corpo, e o hemisfério
direito controla o lado esquerdo do corpo. Os hemisférios funcionam de forma
integrada, mediante a cooperação, fornecendo novas respostas ao meio
ambiente.
http://www.auladeanatomia.com/neurologia/hemisferios.jpg, acesso em: 31/05/2013
Apesar de trabalharem de forma harmoniosa e integrada os
hemisférios direito e esquerdo possuem características diferentes, que se
complementam. Para Carson (2009, p. 57) os hemisférios cerebrais são “dois
44
cérebros completos, cada um com uma própria personalidade, gostos, aversões
e habilidades”.
http://psicologiaparaofuturo.files.wordpress.com/, acesso em 31/05/2013.
O córtex cerebral é revestido por uma fina camada de neurônios que
possibilita o ser humano a pensar, a refletir e a responder a qualquer estímulo
ambiental de forma voluntária. Relvas (2009, p. 42) afirma que “o córtex
cerebral é organizado em áreas funcionais que assumem tarefas receptivas,
integrativas e motoras no comportamento”, pois processam e interpretam
informações sensoriais adquiridas pelos sentidos, como também armazenam
lembranças antigas.
O córtex cerebral é dividido em quatro regiões, denominadas lobos.
Segundo Relvas (2009, p.42), “os lobos são mais ou menos ativados,
dependendo da atividade desempenhada pelo cérebro”. Sabe-se que há a
necessidade dos lobos estarem integrados em suas informações diante dos
desafios experimentados.
45
http://tathianatrocoli.files.wordpress.com/2009/12/lobos.jpg, acesso em: 31/05/2013.
Carson (2012, p.60), diz que o “lobo frontal é dividido em duas partes,
uma direciona os movimentos e a outra é o córtex pré-frontal”. Este é
responsável pela elaboração do pensamento, planejamento, tomada de
decisões. O córtex pré-frontal é considerado pelo autor Carson (2012, p.60)
como “centro dos processos do pensamento de ordem superior”.
Relvas (2009, p. 42) afirma que o lobo parietal é responsável “pela
sensação de dor, tato, gustação, temperatura e pressão”. O lobo temporal está
relacionado ao sentido da audição e também auxilia nos processos da memória
e da emoção. Enquanto o processamento da informação visual é de
responsabilidade do lobo occipital.
Algumas áreas cerebrais são importantes para o processo criativo.
Não há nenhuma área específica como um centro de criatividade no cérebro,
pois a criação está relacionada às funções mentais complexas por meio de uma
“rede” de neurônios conectadas, localizadas por todo o cérebro.
47
“dificuldade” sob diferentes perspectivas. Carson (2012) diz que para fluir o
processo de criação, o cérebro executivo precisa permitir que áreas de ordem
inferior do cérebro expõem suas ideias. Lent (2008, p. 292) corrobora com
Carson quando afirma que o desempenho executivo é organizado em redes
frontais, ou seja, “da integridade não apenas dos lobos frontais, mas das
estruturas corticais e subcorticais a eles conectadas”.
O pioneiro da Neuropsicologia moderna, Aleksandr Romanovich Luria
(apud. Lent, 2008, p.293) diz que a vontade de concluir metas estabelecidas
pelo próprio ser humano na dependência de “estratégias que regulam ideias e
comportamentos” através da fala interior são resultados das formas mais
elaboradas de comportamento, adquiridas pelos lobos frontais.
Lent (2008, p. 291) afirma que as funções executivas são difíceis de
mensurar porque “geralmente se manifestam em ambientes que demandam
criatividade, respostas rápidas a problemas novos, planejamento e flexibilidade
cognitiva”.
As estruturas córtex orbitofrontal, o córtex cingulado anterior e outras
estruturas do córtex pré-frontal constituem um circuito de ligação ao centro
executivo, denominado por Carson (2012) como o centro de julgamento. Este é
capaz de avaliar se a sua ideia ou pensamento criativo é adequado ou não,
permitindo analisar um evento criativo permanentemente enquanto o realiza.
Os centros de associação também são áreas consideradas
importantes para a criatividade. Estes centros estão localizados nos lobos
temporal, parietal e occipital, parte posterior do cérebro.
48
Os centros mencionados recebem informações do meio externo por
meio dos receptores sensoriais, representando a ligação entre o sistema
nervoso e o meio ambiente externo ou o meio orgânico interno, ou seja, o
próprio corpo. Estes receptores sensoriais integram a visão, a audição, o olfato,
o tato e a gustação, reunindo informações sobre os eventos e encaminhando-as
por meio de conexões diretas ao centro executivo, no lobo pré–frontal.
A associação e integração de informações produzem combinações
por meio dos eventos armazenados nos diferentes lobos, possibilitando
pensamentos criativos.
Localizado no córtex pré-frontal e ao longo da linha mediana dos
córtices parietais, a autoconsciência também colabora no processo de criação à
medida que juntamente com as emoções envia informações ao cérebro
executivo que as pode utilizar na tomada de decisões. Para Damásio (2011,
p.197), “a consciência é um estado mental no qual existe o conhecimento da
própria existência e da existência do mundo circundante”. Segundo Relvas a
consciência,
Vai além do processo de cognição ou de “tomada de conhecimento da própria atividade psíquica”, é “ter ciência do seu ambiente e da sua existência, sensação e pensamentos”, é a “condição de ser capaz de pensamento, volição, percepção”, “conhecer ou sentir subjetivamente”, ter “intencionalidade e deliberação” e estar “atento ou sensível interiormente”. (RELVAS, 2012, p. 34)
Desta maneira, a autoconsciência oferece a identidade ao indivíduo,
possibilitando medir sua expressão, permitindo o ser humano a assumir a
49
perspectiva de outra pessoa nos diferentes momentos de criatividade, como a
escrita, as artes e as relações interpessoais.
A autoconsciência nos permite construir a realidade, além de meras sensações físicas, como imaginar uma situação e as consequências de nossas ações, antes que qualquer coisa aconteça. (RELVAS, 2012, p.72)
As emoções emolduram o processo de criatividade, uma vez que o
ser humano se mostra motivado ou não. A emoção exerce influência nos
processos de raciocínio, pois os sistemas cerebrais destinados à emoção estão
intimamente ligados aos sistemas destinados à racionalidade. Mas o que é
emoção? Damásio (2011) afirma que
As emoções constituem ações acompanhadas por ideias e certos modos de pensar, os sentimentos emocionais são principalmente percepções daquilo que nosso corpo faz durante a emoção, com percepções do nosso estado de espírito durante esse mesmo lapso de tempo. (DAMÁSIO, 2011, p.142)
Relvas (2012, p.61) explica a emoção como um “conjunto de reações
químicas e neurais que ocorrem no cérebro emocional”, ocasionando até
alterações nas vísceras, que podem afetar os órgãos internos, de acordo com a
sua intensidade.
Por meio dos estudos de Antonio Damásio, a emoção ainda é citada
por Relvas (2012, p.49) como a “conjugação entre mente e corpo”, a partir da
capacidade que o ser humano tem de interpretar, refletir e pensar sobre as
emoções, que inicialmente são reações neuroquímicas desencadeadas a
princípio por determinados estímulos (podem ser objetos, situações atuais ou
50
eventos presentes na mente), provocando alterações corporais. Desta maneira,
o encéfalo “sente” a emoção de acordo com suas experiências, proporcionando
que cada pessoa “sinta” de forma peculiar e individualizada.
Os estímulos sensoriais são percebidos por meio dos cinco sentidos
presentes no corpo humano e são processados pelo sistema nervoso apenas
partes determinadas da informação de cada estímulo, sendo interpretada no
contexto das estruturas do encéfalo e das experiências já vividas. Segundo
Relvas (2012, p.46) “somente as informações que chegam a ser processadas
pelo encéfalo é que constroem uma realidade própria, dentro da interpretação
do próprio sistema nervoso, sempre baseado em capacidades cognitivas.”
Neste contexto, Relvas (2012, p.46) afirma que “o mundo da
experiência é produzido pelo homem que a vivencia...” e ainda relata que
As experiências são informações que chegam ao sistema nervoso central na forma de estímulos sensoriais. O encéfalo processa essas informações procurando compará-las com outras que já estejam previamente guardadas, reconhecendo-as ou não. Esse mecanismo não envolve apenas os aspectos físicos dessa informação (cor, forma, tamanho), mas também a relaciona com os aspectos diretamente ligados aos sentimentos e às emoções. Após seu processamento, um conjunto de sensações é memorizado com a informação recebida que pode ser agradável ou não. (RELVAS, 2012, p.45)
O núcleo acumbente também conhecido como estriado ventral
promove a integração das emoções com as ações motoras voluntárias. Segundo
Lent (2008) o núcleo acumbente recebe uma gama de informações de áreas
envolvidas no processamento emocional, no aprendizado e na memória. Como
a amígdala cerebral, o hipocampo e o córtex pré-frontal.
51
Entretanto, sabe-se que o núcleo acumbente é importante nos
comportamentos relacionados com reforçadores naturais, como a recompensa.
Quando o centro de recompensa, onde se localiza o núcleo acumbente é
ativado, o ser humano sente-se confiante e motivado. As características citadas
contribuem para a criatividade.
As amígdalas cerebrais recebem informações dos centros sensoriais
e do córtex pré-frontal e avaliam se os acontecimentos relacionados ao medo e
de outros estímulos altamente emocionais são indícios de perigo ou ameaça ao
ser humano.
Quando o ser humano se sente ameaçado, as amígdalas cerebrais
enviam comandos ao hipotálamo e ao tronco cerebral, provocando diversas
ações paralelas no corpo. Altera-se o ritmo dos batimentos cardíacos, na
pressão sanguínea, a respiração acelera e o intestino se contrai como também
os vasos sanguíneos. O cortisol é liberado na corrente sanguínea modificando o
metabolismo do organismo. Desta maneira, os músculos da face se alteram, o
indivíduo pode ficar paralisado ou fugir daquele perigo que o ameaça. Portanto,
para desenvolver a criatividade, o ser humano não pode estar envolvido em
uma atmosfera de medo ou ameaça.
O córtex pré-frontal apresenta sua importância na expressão dos
estados emocionais comportamentais, na manutenção da atenção, bem como
pelo controle do comportamento emocional, pois realiza intensas conexões com
o sistema límbico, permitindo ao ser humano criar comportamentos adaptativos
pertinentes ao tomar consciência das emoções vividas. Além de integrar as
52
informações advindas do meio e do próprio corpo, avaliar as consequências
futuras para planejar suas ações de acordo com suas conclusões.
Relvas (2012, p. 85) sinaliza que “educar a emoção é a habilidade
relacionada com motivar a si mesmo e persistir mediante frustrações, controlar
impulsos, canalizando emoções para situações apropriadas”.
Nesse aspecto, entende-se que as experiências já vivenciadas pelo
ser humano colaboram para que ocorra o processo criativo. Onde favorecerá
sua expressão diante do seu relacionamento com o mundo e na construção das
relações humanas, encontrando, desta maneira, respostas aos desafios
enfrentados no seu dia a dia. Para isso, a escola torna-se fundamental neste
processo, pois através das práticas educativas, a criança, objeto de estudo da
pesquisa observada, desenvolverá suas habilidades, conhecerá seus limites e
potencialidades na criação de transformar a realidade. Pois, “(...) a criação
encontra-se em todo fazer do homem, na arte, na ciência, na tecnologia, ou na
própria maneira de ser de alguém diante do viver.” (Pereira, 1982, p.36)
3.2- Plasticidade cerebral e as experiências artísticas criativas
O conceito de plasticidade cerebral descaracteriza o discurso que
nem todas as pessoas podem aprender independente se possuem uma
deficiência ou problema neurológico ou não. Nesse aspecto, vale salientar a
importância da escola em oferecer diferentes possibilidades de aprendizagem
para os alunos. Pois como afirma Relvas (2012, p. 43 - 44) “todos os alunos
53
podem aprender (...) Porém, a aprendizagem de cada um é diferente, acontece
em tempos e etapas diferentes e se desencadeia a partir de estímulos
diferentes.”
A plasticidade cerebral, citada por Relvas (2009) contribui com a
educação quando é entendida como capacidades adaptativas do Sistema
Nervoso Central,
Sua habilidade para modificar sua organização estrutural própria e de funcionamento. É a propriedade do sistema nervoso que permite o desenvolvimento de alterações estruturais em resposta à experiência e como adaptação a condições mutantes e a estímulos repetidos. (RELVAS, 2009, p.49)
Portanto, “a cada nova experiência do indivíduo, redes de neurônios
são rearranjadas, outras tantas sinapses são reforçadas, e múltiplas
possibilidades de respostas ao ambiente tornam-se possíveis”, (RELVAS, 2012,
p. 203) favorecendo o desenvolvimento de habilidades no processo de
criatividade desde a infância e durante toda a vida. Acredita-se que um cérebro
estimulado corretamente torna-se capaz de responder a problemas mais
complexos, reinventando sua realidade.
Freire também relaciona a plasticidade cerebral ao processo de
construção de conhecimento ao quando diz que
...O nosso conhecimento do mundo tem historicidade. Ao ser produzido, o conhecimento novo supera outro que antes foi novo e se fez velho e se “dispõe” a ser ultrapassado por outro amanhã. Daí que seja tão fundamental conhecer o conhecimento existente quanto saber que estamos abertos e aptos à produção do conhecimento ainda não existente. (FREIRE, 1996, p. 28)
54
Por meio das experiências vividas pela criança, o cérebro é capaz de
se remodelar, reformulando suas conexões de acordo com a necessidade de se
adaptar ao meio ambiente. Para que isso ocorra os sentidos (tato, visão,
audição, gustação e olfato) servem como elos de comunicação entre o mundo
externo e o cérebro que processará esses estímulos. A cada nova experiência e
aprendizado, novas conexões neurais são acrescentadas as já vividas. Desta
maneira, o conceito de plasticidade cerebral pode ser aplicado à educação, na
perspectiva mais concreta da existência e expressão funcional do sistema
nervoso central, como, por exemplo, a motricidade, percepção e linguagem.
Nesse aspecto, Relvas (2012) afirma que
A evolução, a experiência e a sobrevivência humanas são determinadas pelas constantes trocas de mensagens e respostas, remodelando ambos para fins de adaptação, posto que a pluralidade cultural desencadeia mudanças no cérebro. A cada nova vivência, experiência e aprendizado, novas conexões neurais são acrescentadas. (RELVAS, 2012, p. 118)
A plasticidade cerebral se dá em um nível inconsciente e se faz de
forma automática, e em outro nível, o consciente, que depende da memória,
seja esta, emocional ou cultural. Desta forma, não há como ignorar os
processos de aprendizado ligados à linguagem e, consequentemente, a cultura.
Ao entrar em contato com diferentes expressões artísticas, como
dramatizações, desenhos, literatura, pintura e música, as crianças são
estimuladas a terem novas ideias, permitindo a aquisição de novas respostas ao
meio ambiente, desenvolvendo a capacidade de reorganizar suas redes
neurais, reforçando as sinapses, conexões estas, especializadas que permitem
55
transmitir informação entre os neurônios, moldando o fluxo de informação do
circuito nervoso. Relvas (2012, p. 125) contribui sobre o processo da
plasticidade cerebral na aprendizagem quando afirma que “em resposta as
estimulações e experiências, o cérebro aumenta o volume de conexões neurais,
evidenciado sua plasticidade”. Assim, Relvas (2012) relata que o encéfalo se
modifica a cada momento à medida que a plasticidade cerebral não tem sua
importância apenas nas lesões cerebrais, pois a plasticidade é ativamente
contínua, favorecendo, desta forma, o processo de aprendizagem.
Com o desenvolvimento de mais conexões neurais, o cérebro amplia
sua capacidade de estabelecer relações entre essas conexões e substituir
possíveis conexões que foram desgastadas: a capacidade plástica do encéfalo
permite a "substituição" de neurônios, evitando que funções importantes sejam
perdidas.
Essas estruturas cerebrais atuam como mediadores entre as
representações perceptuais dos estímulos sensoriais e a recuperação do
conhecimento que o estímulo pode ativar. O córtex cerebral também está
intimamente relacionado a essas estruturas, razão pela qual as emoções
também devem ser levadas em consideração para compreender o processo de
aprendizagem.
Portanto, os conhecimentos quando são construídos por meio da
ação e interação, através da mobilização de atividades mentais e na interação
com o outro permitem a criança participar do processo criativo que poderá
transformar sua realidade.
56
Os estudos e pesquisas neurocientíficas comprovam que a memória
está intimamente ligada ao processo de aprendizagem, devendo ser valorizada,
trabalhada e estimulada durante as práticas educativas favorecendo a
criatividade infantil no processo escolar.
“O termo memória se refere ao processo mediante o qual adquirimos,
formamos, conservamos e evocamos informação. A fase de aquisição é
coloquialmente chamada de aprendizagem”. (Lent, 2008, p. 242) Izquierdo
(2011, p. 11) corrobora com Lent quando diz que “não podemos fazer aquilo
que não sabemos, nem comunicar nada que desconheçamos, isto é, nada que
não esteja na nossa memória.”
As informações armazenadas no encéfalo são pessoais, pois cada
indivíduo é único e percebe, interpreta e guarda informações de maneira
peculiar, pois as memórias provêm da experiência.
Nossa memória constitui nosso acervo pessoal de dados, o único que possuímos, o tesouro que nos permite traçar as linhas de ação atravessando o presente efêmero em que vivemos rumo ao futuro. (LENT, 2008, p. 242)
Relvas (2009, p.56) afirma que “a memória é a base de todo o saber
e, também, de toda a existência humana, desde o nascimento. Todo o nosso
cérebro funciona por meio da memória; (...) porque lembramos de como fazê-lo”.
Assim, a memória é considerada uma função cerebral importante do encéfalo,
pois permite ao ser humano a capacidade de evitar erros e repetir acertos, além
de acumular experiências para utilizar ao longo da vida. As lembranças das
experiências são evocadas no momento de realizar alguma atividade, ao tomar
57
alguma decisão, na resolução de problemas permeando os diferentes cenários
presentes na vida da criança. “O conceito de memória vai, portanto, muito além
do poder de recordar. Memória é também a capacidade de planejamento,
abstração, julgamento crítico e atenção.” (RELVAS, 2009, p. 56)
Lent (2008, p. 243) explica que “as memórias são codificadas por
neurônios, armazenadas em redes neurais e evocadas por essas mesmas redes
ou por outras. Moduladas pelas emoções, pelo nível de consciência e pelos
estados de humor”.
A memória é considerada um fenômeno biológico e psicológico
envolvendo diferentes áreas cerebrais que funcionam interligadas, não estando
localizada em uma estrutura isolada no encéfalo. Algumas estruturas cerebrais
são importantes no processo de aquisição, formação e evocação das memórias.
O lobo temporal é indicado no armazenamento de eventos passados,
envolvido com a memória a longo prazo. Segundo Relvas o hipocampo “ajuda a
selecionar onde os aspectos importantes para fatos e eventos serão
armazenados e está envolvido também com o reconhecimento de novidades e
com as relações espaciais.” (2012, p. 149).
A amígdala cerebral possui um circuito que está ligado à memória e
este é ativado por meio de sinais elétricos que traduzem os estímulos sensoriais
advindos do meio externo. Neste momento, a amígdala cerebral se comunica
com o tálamo e com os demais sistemas sensoriais do córtex, através de suas
intensas conexões. Relvas (2012, p. 149) afirma que as emoções influenciam a
aprendizagem, “porque elas ativam outras conexões da amígdala para as vias
58
sensoriais”, por meio de conexões entre amígdala e o hipotálamo, onde as
respostas emocionais são criadas.
O córtex pré-frontal está interligado com o lobo temporal e o tálamo
com importante função na resolução de problemas e planejamento do
comportamento, acreditando que o córtex pré-frontal esteja envolvido no
processo da memória.
Alguns neurotransmissores já citados no capítulo anterior como o
glutamato e a acetilcolina apresentam importantes papéis na fixação da
memória a longo prazo. Esta tem valor significativo no processo de
aprendizagem.
Relvas (2012) classifica de forma sintética as características das
memórias de curto e longo prazo.
A memória de curo prazo é reversível e temporária, acredita-se que decorra de um mecanismo fisiológico, por exemplo um impulso eletroquímico, gerando um impulso sináptico, que pode manter vivo um traço da memória por um período de tempo limitado. A memória permanente, ou memória de longo prazo, depende de transformações na estrutura química ou física dos neurônios. (...) As mudanças sinápticas têm uma importância primordial nos estímulos que levam aos mecanismos de lembranças como imagens, odores, sons etc, que, avulsos parecem ter uma localização definida, (...) ao serem ativados, montam a lembrança do evento que é novamente sentida pelo indivíduo. (RELVAS, 2012, p. 232-233)
No âmbito escolar a memória será utilizada em diferentes momentos.
Quando assiste à aula, o educando recebe informações de todo o tipo, tanto visuais como auditivas. Elas se transformam em estímulos para o cérebro e circulam no córtex cerebral antes de serem arquivadas ou descartadas. (RELVAS, 2009, p. 66)
59
Quando um aluno entra em contato com uma nova informação, este
precisa encontrar alguma referência em seus “arquivos” já armazenados. Ao
recordar informações e realizar “links” a aprendizagem transcorrerá de forma
tranquila. Relvas (2009, p. 58 e 64) sugere alguns recursos pedagógicos que
contribuem no momento de evocar, acessar e associar eventos no
fortalecimento de memórias e na aquisição de conhecimentos, como “associar
imagens com sons, palavras, cores, (...) criar letra para música, versinhos
rimados, frases engraçadas, leitura, palavras cruzadas, jogo de xadrez,
atividade física regular e dieta saudável”.
Os estados de ânimo e as emoções são fundamentais para garantir a
regulação da aquisição, da formação e evocação das memórias. Desta forma, a
sala de aula precisa ser um ambiente que inspire respeito e confiança, que
atenda as necessidades, os interesses e as curiosidades do aluno, favorecendo
um clima agradável na construção de conhecimento, pois sabe-se que “ é fácil
aprender ou evocar algo quando estamos alertas e de bom ânimo; e como fica
difícil aprender qualquer coisa, ou até lembrar o nome de uma pessoa (...)
quando estamos cansados, deprimidos ou muito estressados.” (IZQUIERDO,
2011, p. 14)
Ao pensar em memória seu significado vai além de colaborar na
aprendizagem escolar ou não escolar e quando se evoca uma informação ou
evento que traz boas ou más lembranças. Ao resgatar memórias o ser humano
relembra sua história de vida contextualizada em um determinado grupo social,
que está inserido em uma determinada época histórica. E no sentido mais amplo
a história da própria humanidade. A identidade cultural de um povo ou
60
sociedade é constituída das memórias que são comuns aos membros que o
compõem. Izquierdo (2011, p. 12) relata com propriedade sobre as memórias do
ser humano quando afirma que “o acervo das memórias de cada um nos
converte em indivíduos.” E ainda complementa quando diz que
A necessidade da interação entre membros da mesma espécie, ou entre diferentes espécies inclui, como elemento-chave, a comunicação entre indivíduos. Essa comunicação é necessária para o bem-estar e para a sobrevivência. Nas espécies mais avançadas, o altruísmo, a defesa de ideais comuns, as emoções coletivas são parte de nossa memória e servem para nossa intercomunicação. (IZQUIERDO, 2012, p.12- 13)
Assim as identidades culturais de um povo, tribo ou civilização advêm
de suas memórias comuns, onde o ser humano procura estabelecer laços afins,
construindo a sua história.
Após conhecer os conceitos de plasticidade cerebral e memória, a
relação deles e as suas contribuições no processo de aprendizagem, a presente
pesquisa abordará como as expressões artísticas criativas colaboram como
processos estimuladores da plasticidade cerebral infantil.
Portando aproximadamente, 88 bilhões de células especializadas,
chamadas neurônios, capazes de realizar, em torno de, 100 trilhões de
sinapses, o encéfalo humano consegue produzir não somente as ações que
constituem seu comportamento, as interações que realiza com o meio, bem
como a aquisição, formação e evocação de memórias, mas também produz
cultura. E esta, segundo Damásio (2011, p. 380) “influenciaram o funcionamento
dos cérebros no decorrer das gerações e acabaram influenciando a própria
evolução do cérebro humano”.
61
Indivíduos e grupos cujo cérebro deu-lhes a capacidade de inventar ou usar tais narrativas para trazer melhoras a si mesmos e à sociedade em que viviam tornaram-se bem-sucedidos o bastante para que as características dessa arquitetura cerebral fossem selecionadas, individualmente ou no âmbito de todo o grupo, e para que a frequência delas aumentasse no decorrer das gerações. (DAMÁSIO, 2011. p. 357)
Ao longo da história evolutiva o ser humano buscou relações e
comunicou aos demais e as gerações futuras seus sentimentos, seus
pensamentos e suas ideias, até como meio de sobrevivência e registro de sua
cultura. Para isso, utilizou diferentes recursos artísticos para representar. Neste
aspecto, a pesquisa utilizará as artes como canal de expressão do pensamento
e como forma criativa de “ver”, interagir e buscar respostas para o meio.
Se a necessidade de gerir a vida foi uma das razões do surgimento da música, dança pintura e escultura, então a capacidade de melhorar a comunicação e organizar a vida social foram duas outras fortes razões e deram às artes um poder adicional de permanência. (DAMÁSIO, 2011, p. 358)
Nessa perspectiva, as artes pretendem transmitir e comunicar aos
demais, informações sobre possíveis ameaças e oportunidades, tristezas ou
alegrias, sobre a moldagem do comportamento social. Contudo, as artes
também produziram criatividade.
(...) A arte passou a ser um meio privilegiado de trocar informações a respeito de fatos e emoções considerados importantes para os indivíduos e para a sociedade, (...) Também se transformou em um modo de induzir emoções e sentimentos alentadores (...) A arte tornou-se um modo de explorar a própria mente e a mente dos outros, uma maneira de ensaiar aspectos específicos da vida e um modo de exercitar juízos morais e ações morais. (...) (DAMÁSIO, 2011, p. 359 -360)
62
Pereira (1982, p.36) corrobora com Damásio quando afirma que “a
arte afeta a essência humana do homem, acrescentado dimensões novas à
existência (...)” Sendo assim, a arte se dá em um processo cultural e histórico,
inserido em um conjunto de valores que permeiam a sociedade.
A plasticidade cerebral aliada às práticas criativas possibilitam novas
aprendizagens, bem como sugere Pereira (1982, p. 36) “toda criação
corresponde essencialmente a processos de transformação”.
O ambiente escolar é um espaço rico ao agregar múltiplas vivências
baseadas em experiências culturais pessoais e sociais. Além de promover
espaços para a criatividade, possibilitando momentos de integração,
desenvolvendo as potencialidades humanas propiciando, desta forma, a
aprendizagem.
Sensibilizar a inteligência da criança deverá ser uma meta para a
educação, ao reforçar e estimular os processos de crescimento e integração do
indivíduo, a sua individualidade, por meio de práticas educativas criativas.
Assim, a arte na educação precisa estar baseada na liberdade de expressão e
no respeito às diferenças culturais dos indivíduos. Pois quando a criança entra
em contato com a arte de outras culturas, poderá perceber a sua realidade,
podendo relacioná-la com a cultura geral, valorizando e interpretando os
pensamentos e os ideais pessoais e os que a rodeiam.
O estudo de caso realizado abordará algumas atividades artísticas
que envolveram a literatura como eixo norteador, produção de texto coletivo
embasado na cultura nordestina, em especial as obras do Mestre Vitalino,
63
resolução de situações problema a partir de narrativas, releituras da obra “A
família”, da artista Tarsila do Amaral retratadas por meio do grafismo, da
dramatização e da colagem com diferentes materiais que favoreceram o
pensamento criativo de crianças que compreendem 4 anos de idade e
frequentam a educação infantil em uma escola particular do Rio de Janeiro.
A literatura era vista pelos alunos como um momento mágico com
intenções pedagógicas, possibilitando espaços que despertaram emoções
quando as crianças ouviram diferentes narrativas, promoveram o diálogo com
exposição de pensamentos e ideias, motivaram o interesse e a curiosidade, a
comunicação entre os pares na transmissão de informações, ao respeito pela
opinião alheia, bem como a aceitação das contribuições dos demais da turma.
O processo de aprendizagem da turma por meio da literatura pode
ser verificado em um trecho do relatório que segue, descrito pela professora:
O processo de aprendizagem se deu por meio de uma ação educativa que buscou valorizar o estudante como um ser histórico e social, partindo dos seus interesses, indagações e curiosidades, articulados às necessidades específicas da faixa etária e aos conteúdos que ampliaram as possibilidades de atuação no universo do conhecimento, favorecendo uma aprendizagem significativa. Neste sentido, as atividades foram propostas integrando as diferentes áreas do conhecimento. Nas rodas de histórias, a turma mostrou-se interessada e atenta às narrativas contadas pela professora. Apreciou ouvir os contos clássicos, como “Festa no Céu”, “Chapeuzinho Vermelho”, “Os três Porquinhos” e “Patinho Feio”. Depois, dialogamos sobre as histórias, possibilitando momentos onde os estudantes pudessem incorporar novas palavras ao seu vocabulário, expressando suas ideias e opiniões e reproduzindo oralmente pequenos trechos das narrativas. A turma manuseou além dos livros infantis, outros portadores de texto, como a revista em quadrinhos, poesias, letras de música, encarte de supermercado e jornais. Estes momentos desenvolveram atitudes positivas em relação à importância e ao valor da escrita e da leitura na vida social e individual de cada estudante. (RELATÓRIO DE OBSERVAÇÃO, 2012)
64
Ao final do primeiro semestre letivo, a professora sinalizou a
importância de valorizar o interesse da turma diante da literatura e de
desenvolver atividades pedagógicas que explorassem a criatividade dos
educandos por meio da expressão artística. No livro: A arte como processo na
educação, a autora Pereira (1982, p. 39) ressalta que “para poder criar, é
preciso falar com a própria voz sobre a própria experiência, falar de dentro para
fora”.
Com o objetivo de atender o currículo escolar, mas ao mesmo tempo
estimular a criatividade, autonomia, conhecimento de si próprio e do meio em
que está inserido, respeitando as características da faixa etária, os interesses
da turma e as diversas maneiras de aprender e de interagir com o
conhecimento, a professora juntamente com a equipe pedagógica criaram as
sequências didáticas denominadas: “Ler se aprende lendo” e “Quem conta um
conto?”
Sabe-se que a faixa etária em estudo não possui ainda habilidades e
competências para realizar a prática de leitura e escrita, mas favorece a leitura
de mundo e o estímulo à leitura convencional da cultura na qual as crianças
estão inseridas.
Como intencionalidades educativas, a professora listou os seguintes
objetivos:
Estimular a criatividade e imaginação;
Usar a língua falada em diferentes situações cotidianas;
Saber ouvir com atenção e esperar sua vez de falar;
65
Compreender o sentido das mensagens que ouve;
Incorporar novas palavras e seus significados em seu vocabulário;
Expressar ideias, opiniões, desejos e necessidades;
Participar de situações nas quais se faz necessário o uso da leitura e
da escrita;
Conhecer e manusear diferentes portadores de texto, percebendo a
função social da escrita;
Apreciar e interpretar os textos escritos como fonte de conhecimento,
descobertas, prazer, divertimento, informações, por meio dos
diversos gêneros;
Narrar textos ouvidos, em diversas formas, utilizando diferentes
recursos;
Realizar pseudoleituras (rotina, imagens, palavras, pequenos textos),
com riqueza de detalhes;
Conhecer diferentes narrativas;
Relatar fatos e acontecimentos, organizando as ideias numa
sequência lógica;
Escutar textos lidos pelo professor;
Observar, ler e interpretar capas e contracapas de livros, situando o
autor e o título.
Dentre as atividades pedagógicas realizadas, destacam-se as
seguintes:
Criação de textos coletivos e individuais;
Construção de histórias a partir de imagens e textos imagéticos;
66
Recontar oralmente e depois registrar histórias respeitando a ordem
das narrativas;
Produção de cartazes;
Dramatização de histórias;
Manuseio do alfabeto móvel;
Leitura diária de histórias ou outros portadores, como jornal, revistas,
gibis, entre outros, feitas pela professora;
Manuseio de fantoches, criando falas para os personagens;
Inauguração da biblioteca da sala de aula;
Manuseio de diferentes portadores de texto, como: livros, jornais,
revistas, revistas científicas, enciclopédias, letras de música, etc.
Interpretação e ilustração de letras de música escolhidas pela turma
e outros portadores de texto.
Para iniciar estas sequências, a professora convidou os alunos para
irem ao “espaço multimidiático” (local onde dispõem de livros, computadores,
lousa interativa, entre outros materiais tecnológicos) receberem a visita dos três
porquinhos que trariam uma surpresa. Durante o decorrer da narrativa da
história “Três porquinhos”, uma das histórias preferidas da turma, o “lobo mau”
presenteou as crianças com uma caixa repleta de livros. O personagem
recomendou a turma que usassem e cuidassem bem daquele tesouro. Durante
a atividade descrita à professora observou que as crianças estavam motivadas
e envolvidas na visita dos personagens (fantoches) no ambiente escolar,
Confecção de crachá;
Produção das fichas de rotina;
67
algumas ficaram inicialmente apreensivas, com “medo” dos fantoches, enquanto
outras participavam do encontro com alegria e desinibição. Neste ambiente rico
em magia e encantador a turma relatou trechos da história e ao final ficaram
“maravilhadas” ao descobrirem que o tesouro eram livros. Após voltarem para a
sala de aula, a professora relatou que a turma cuidava dos livros, manuseando-
os diariamente e pedia para que a mesma contasse as diferentes histórias.
A seguir, segue relato da professora: “um grande mistério moveu os
alunos do 1º ano, da educação infantil. Eles receberam a visita dos três
porquinhos e do lobo mau, que após recontarem a história “os três porquinhos”
ganharam uma caixa com presentes: eram livros! Envolvidos na literatura, as
crianças receberam os livros com curiosidade e interesse, folhearam e
guardaram o novo presente na sala de aula. Foi à inauguração da nossa
biblioteca!”
Respeitando o contexto descrito Ferreira contribui para a reflexão do
tema ao propor que
As crianças após ouvirem uma história, devem ter a oportunidade de falar sobre os personagens: do que mais gostaram, o que foi mais divertido, o que não foi interessante; comentar todos os sentimentos que tiveram em relação à história. O professor deve incentivá-las a imaginar novos personagens e criar outros diálogos entre elas. (FERREIRA, 2007, p. 71)
Com o “tesouro” (livros) que a turma ganhou a professora
desenvolveu diferentes atividades que podem ser observadas.
Na atividade do livro “A Caixa Maluca”, as crianças desenharam o
que gostariam de esconder na sua caixa. Depois recortaram e colaram no palito,
68
criando um fantoche. Esse fantoche ficava “escondido” no papel azul que era
vazado.
As histórias “Dez porquinhos? Dez.” e “O pato atolado” possibilitaram
à turma a resolução de uma situação problema que foi registrada por meio do
grafismo. Percebe-se que diferentes estratégias foram utilizadas para encontrar
possíveis respostas ao desafio proposto, favorecendo o processo criativo.
70
O grafismo representado nas atividades anteriores possibilita para a
criança um campo imaginário em que ela poderá desenvolver seu processo
criativo. Ao observar o seu grafismo, a criança identifica que tudo que está
representado no papel faz parte do seu ser, pois foi ela que criou e imaginou,
desenvolvendo e fortalecendo a sua maneira de interagir com o meio, ou seja,
sua individualidade.
Os textos coletivos possibilitaram momentos de aprendizagem, uma
vez que, os alunos precisavam respeitar a opinião do outro, saber ouvir e
71
esperar a sua vez, bem como ampliaram o vocabulário conhecendo novas
palavras e expressões linguísticas, mas principalmente, a oportunidade de
expressar suas ideias e pensamentos a partir de uma situação.
A história “Três Porquinhos” foi à preferida da turma. Em diversos
momentos, a professora contou a história, a pedido dos alunos, e eles
recontaram por meio do grafismo, produziram texto coletivo e dramatizaram a
narrativa.
Nos momentos de produção textual coletiva a professora registrava
na hora o pensamento da turma para que fosse visível a eles que suas ideias
podem ser escritas e guardadas criando, assim, a cultura e identidade daquele
grupo social.
Os textos que seguem foram escritos após a turma ter conhecido
algumas características da cultura nordestina, dentre diferentes atividades
realizadas, destaca-se: a visita ao Museu Casa do Pontal, a leitura de diversas
histórias relacionadas ao tema proposto, o manuseio de argila na criação de
esculturas como fazia Mestre Vitalino e outros artistas, pinturas sobre a cultura
nordestina, assistir vídeos e ouvir músicas de Luiz Gonzaga e outros artistas.
LIIVRO: MESTRE VITALINO
72
“A menina estava triste passeando com seu cavalo, quando viu...
Que seus amigos estavam andando atrás dela.
As pessoas carregavam saco na cabeça.
De repente, apareceu um moço com chapéu e uma sanfona.
Eles eram músicos. Tocavam sanfona, triângulo e chocalho.
As crianças gostaram da música.
Tinha uma pessoa vestida de boi que começou a dançar.
Os músicos tocavam forró.
Os músicos e o boi foram embora e as crianças deram tchau.
As crianças estão sentadas ouvindo uma história do boi.
Eles estão vendo os bonecos da festa junina. Eram os bonecos do
Mestre Vitalino.”
Ao estudar o conteúdo “família” e suas identidades culturais foi
apresentada a turma a obra de arte “A família”, de Tarsila do Amaral e depois
de observar e dialogar sobre os aspectos da imagem, a turma foi convidada a
representar a sua família.
73
Ao manipular diferentes materiais e imagens a turma foi estimulada a
desenvolver a imaginação e a criação de novas cenas, de acordo com seus
interesses, ideias e pensamentos. Ferreira (2007, p. 19) afirma que “o ser
criativo é aquele que consegue fazer associações de ideias, derivando daí,
diversidade de respostas a uma situação estimuladora”.
...cria-se um espaço de prazer, onde se solta a imaginação, estimulando e trabalhando a percepção, a cognição, a criatividade, a sensibilidade, produzindo envolvimento afetivo-emocional, paixão, êxtase, estados de exaltação, satisfação plena e a livre expressão por meio de diversas técnicas. (RELVAS, 2012, p. 192)
74
As expressões artísticas infantis estimulam a percepção, o
conhecimento de si mesmo, o raciocínio, a observação, a originalidade, a
autenticidade e liberdade, a expressão do seu ser, a flexibilidade, a curiosidade,
a sensibilidade, a autonomia, aspectos que se remetem a criatividade.
O mundo globalizado e competitivo exige do ser humano uma visão
diferenciada dos padrões preestabelecidos na sociedade, sendo assim, o
desenvolvimento do potencial criativo faz-se necessário ser trabalhado no
âmbito escolar, desde a tenra idade, pois possibilitará a liberdade de expressão,
a reflexão, o favorecimento da aprendizagem, o fortalecimento da autoestima
positiva, bem como a saúde mental dos educandos, futuros homens e mulheres
criativos.
75
CONCLUSÃO
A criatividade, ao longo da história recebeu diferentes conceitos e era
muitas vezes considerada exclusiva aos pensadores, artistas, músicos,
cientistas, escritores entre outros poucos setores da sociedade. Por meio dos
estudos científicos e da pesquisa apresentada observa-se que a criatividade
pode ser desenvolvida em todo indivíduo, pois se entende que o processo
criativo inicia-se no cérebro, nos estímulos cerebrais planejados e no âmbito
escolar, aplicados por professores desde a educação infantil.
Assim, faz-se necessário que professores conheçam e entendam a
fisiologia e a anatomia do cérebro para que compreendam como ocorre o
processo de aprendizagem, quais são as áreas cerebrais ativadas no processo
de criação, bem como perceber e analisar os processos criativos como
estimuladores da plasticidade cerebral, pois a cada nova experiência, o aluno,
arranja e rearranja sua rede de neurônios, onde novas sinapses são reforçadas,
possibilitando inúmeras respostas ao ambiente.
Nessa perspectiva, a proposta de criação por meio das atividades
artísticas possibilita resgatar e valorizar as expressões culturais, gerando
diferentes conexões neurais, mudanças de comportamento cognitivo e
emocional, e criatividade nas formas de pensar e agir.
As expressões artísticas selecionadas para serem observadas nesta
pesquisa possibilitaram diálogos coletivos, a interação entre os alunos e
momentos em que sozinhos precisaram buscar novas soluções para as
situações apresentadas.
76
Ao buscar soluções, o educando resgatou memórias (tudo aquilo que o
aluno já sabe ou aprendeu), associando-as a nova situação, estabelecendo
assim novas conexões neurais para encontrar a saída para o desafio exposto,
construindo assim, a criatividade. As respostas variaram de acordo com as
experiências individuais, de como ele interage com o meio e como busca a
melhor resolução para se adaptar e sobreviver em sociedade.
O ambiente escolar precisa desafiar seus estudantes, promovendo
situações que instigam a curiosidade e a busca de novas soluções, permitindo
aos alunos pensarem, raciocinarem, refletirem, dialogarem, questionarem em
busca de novas formas de agir diante dos processos.
Quando o espaço educacional possibilita as ações citadas acima,
estabelece um clima de confiança e respeito, permitindo que os educandos
desenvolvam suas habilidades, conhecendo seus próprios limites e
potencialidades na criação de transformar a realidade.
A escola promove espaços de criatividade quando agrega a diversidade
de vivências culturais, pessoais e sociais, favorecendo momentos de
aprendizagem. E quando as artes são utilizadas como forma de liberdade a
expressão e na valorização as diferentes culturas, os processos criativos
tornam-se mais evidentes, podendo a criança perceber sua realidade, podendo
associá-la e relacioná-la com a cultura do outro, interpretando ideias e
pensamentos.
Os desafios relatados no trabalho apresentado desenvolveram processos
criativos quando permitiu que os alunos expusessem sua opinião de forma
original, favorecendo a percepção, o autoconhecimento, o raciocínio, a reflexão,
77
a observação, a flexibilidade, a curiosidade, elevando a autoestima, a
autonomia e a sensibilidade de se colocar no lugar do outro, favorecendo a
expressão do seu ser.
A constante adaptação do ser humano ao ambiente que sofre diariamente
modificações exige dele visões diferenciadas aos padrões já estabelecidos,
tornando-se imprescindível o uso da criatividade para sobreviver. E essa
quando desenvolvida e trabalhada na escola possibilita as crianças o ato de
pensar, refletir, questionar, e criar novas ideias e pensamentos que oportunizam
a mudança de comportamento, neuro cientificamente: plasticidade cerebral.
78
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
CARSON, Shelley. O cérebro criativo. Tradução: Bruno Casotti. Rio de Janeiro:
BestSeller, 2012.
DAMÁSIO, António R. E o cérebro criou o homem. Tradução: Laura Teixeira
Motta. São Paulo: Companhia das Letras, 2011.
IZQUIERDO, Ívan. Memória. 2ª. ed., ver.e ampl. Porto Alegre: Artmed, 2011.
FERREIRA, Aurora. A criança e a arte: o dia-a-dia na sala de aula. 2ª. Ed. Rio
de Janeiro: Wak Ed., 2007.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomía: saberes necessários à prática
educativa. 29ª.ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
KUHLMANN Junior, Moysés. Infância e educação infantil: uma abordagem
histórica. Porto Alegre: Mediação, 1998.
LENT, Roberto (coord.). Neurociência da Mente e do Comportamento. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2008.
NEVES, André. Mestre Vitalino. Rio de Janeiro: Editora Paulinas,
PEREIRA, Maria de Lourdes Mader (coord.). A arte como proceso na educação.
2ª. Ed. Rio de Janeiro: FUNARTE, 1982.
RELVAS, Marta Pires. Neurociências e transtornos de aprendizagem: as
múltiplas eficiências para uma educação inclusiva. 5ª.ed. Rio de Janeiro: Wak
Ed., 2011.
79
__________________ (org). Que cerebro é ese que chegou à escola? As bases
neurocientíficas da aprendizagem. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2012.
__________________ Fundamentos Biológicos da Educação: despertando
inteligências e afetividade no proceso de aprendizagem. 4ª. Ed. Rio de Janeiro:
Wak Ed., 2009.
_________________ Neurociência na prática pedagógica. Rio de Janeiro: Wak
Editora, 2012.
TORRE, Saturnino de La. Criatividade aplicada: recursos para uma formação
criativa. Tradução WIT Languages. São Paulo: Madras, 2008.
80
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 02
AGRADECIMENTO 03
DEDICATÓRIA 04
RESUMO 05
METODOLOGIA 06
SUMÁRIO 08
INTRODUÇÃO 09
CAPÍTULO I - Neurociência e educação infantil 13
1.3 – Breve história da Educação Infantil no Brasil
1.4 - Breve história da Neurociência
CAPÍTULO II - Neuroaprendizagem na Educação Infantil 27
CAPÍTULO III – Cérebro e Criatividade 40
3.1 – Processo Criativo
3.2 – Plasticidade cerebral e as experiências artísticas criativas
CONCLUSÃO 75
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 78
ÍNDICE 80