Doces Recordações (2008)

44
1 Doces recordações Ano 2008

Transcript of Doces Recordações (2008)

Page 1: Doces Recordações (2008)

1

Doces recordações

Ano 2008

Page 2: Doces Recordações (2008)

2

Com imenso prazer chegamos ao terceiro livro de memórias da

UNA BEM.

Esse, como os outros, é um tesouro que esconde pérolas de

vida, preciosidades em palavras e recordações e um encantamento com as

relações humanas que explode em cada frase.

O Resgate das Memórias pessoais é um trabalho que tem dupla

finalidade. Há uma valorização das histórias de vida de cada aluna

recuperando o imenso universo das vivências pessoais e cotidianas, dos

relacionamentos mais importantes, das histórias mais queridas e daquelas

que, por trazerem um sofrimento grande trouxeram uma ressignificação

de todo o viver.Tudo é válido para recordar.Tudo é válido para aprender a

viver.

Por outro lado estamos fazendo, de uma maneira

lúdica e gostosa a recuperação e preservação de

brincadeiras infantis, modos de vida, de saberes, sabores e

lendas dos anos passados o que representa um valioso

trabalho de história regional.

Nessas páginas podemos sentir o carinho pela vida

vivida e muita expectativa pela vida que desponta quando

formamos um grupo, fazemos parte ativa dele, somos

valorizados e queremos permanecer na esperança de

construirmos juntos uma vida mais feliz.

Leila M. Suhadolnik O. Pádua Andrade

Prof. de Resgate da memória pessoal

Coordenadora da UNABEM

Page 3: Doces Recordações (2008)

3

APRESENTAÇÃO

“As mulheres são como saquinhos

de chá: não se sabe sua força até

serem jogadas em água quente.”

Doces recordações trazem as

histórias que foram relembradas por

cada uma de nós, ao longo desse ano de

2008, no curso da UNABEM – Universidade

aberta para a Maturidade.

Durante as aulas da professora Leila – Resgate

da Memória Pessoal – fomos levadas a entrar no túnel do tempo de nossas

vidas. À medida que isso ia acontecendo, as recordações afloravam, como

por encanto, em nossas mentes. Foram muitos os testemunhos que cada uma

ia relatando ou escrevendo, e que nos tocavam profundamente.

Com isso nossas relações de amizade, companheirismo e cumplicidade

foram aumentando, sem falar na transformação que tivemos e de como

nossos olhares sobre cada uma foi mudando.

Fomos aos poucos vendo e sentindo que não éramos tão diferentes

assim nos quesitos; alegrias; tristezas; crises; frustrações; dificuldades;

dúvidas; perdas e ganhos. Então, compreendemos que a tarefa de viver tem

seu significado especial para cada um de nós através do extraordinário

poder que temos de superar dificuldades e enfrentar desafios.

Por tudo isso, Doces Recordações fizeram um bem danado às nossas

alunas e aos nossos corações.

Marisa Batista.

Page 4: Doces Recordações (2008)

4

NASCIMENTO

Sylvia Kallás Andrade

Nasci no mês que se comemora o mês do Sagrado Coração de Jesus,

dia 15 de junho de 1934, numa casa velha, alta e com rampa, situada na

popularmente denominada Praça da Matriz, a Praça Monsenhor Messias

Bragança. Hoje foi substituída por um prédio de pequeno porte, e lá está

instalada a Livraria Tavares.

Meu pai, na época que nasci, tinha uma confeitaria, a Confeitaria

Mineira, que ficava no mesmo prédio de nossa casa.

No ano de meu nascimento, houve uma briga na Praça; os dois

homens, ainda discutindo, entraram na confeitaria de meu pai. Um deles

atirou no outro e a bala atravessou a parede e passou por cima de meu

berço, causando o maior susto e pavor nos meus familiares e nas pessoas

que estavam presentes, mas graças a Deus, nada aconteceu comigo.

Minhas irmãs e eu, quando pequenas, ouvíamos minha

mãe contar histórias de antigamente, de quando havia

um senhor muito rico que morava no centro da cidade

e trazia, da fazenda, seu gado Zebu para desfilar

na Praça. Cada um tinha seu nome escrito na

cabeça e empregados para conduzi-los. Este

senhor se chamava Lucinho Maia. Ouvíamos tudo com

muita atenção e ficávamos imaginando como seria

bonito esse gado Zebu desfilando na Praça e, então,

nossos olhos brilhavam de alegria e emoção.

A saudade aumenta quando me lembro da tia Mery, irmã de mamãe,

que morava conosco e nos dedicava muito amor e carinho. Todas as noites

cantava para nós e contava histórias até dormirmos, alegres e sorridentes.

Page 5: Doces Recordações (2008)

5

Raízes

Isabel Suhadolnik Parenti

Meu avô paterno José Suhadolnik, nascido na Áustria, casado com Franciska

Kapreuk, ficou viúvo com 5 filhos: Mitzy, Crystine, Karol, meu pai Karl,

Rudolf e Valery.

Moravam em Liubliana, cidade que pertencia, na época, ao Império Austro-

Húngaro, hoje capital da Eslovênia.

Antes de estourar a 1ª Guerra Mundial resolveu tentar a sorte no Brasil,

conhecido como o “país do futuro” onde ganhariam muito, trabalhando nas

lavouras de café. Só poderiam imigrar famílias e ele era viúvo. Casou-se

então com uma amiga, também viúva com três filhos, e conseguiram assim, o

visto de embarque, trazendo para o Brasil filhos e enteados.

Desembarcaram no Porto de Santos, em 1910, de onde após algum tempo,

foram trabalhar em fazendas de café em Jabuticabal, S. José do Rio Pardo

e Guaxupé.

Meu avô era alfaiate e depois de se adaptar no Brasil, montou a sua

alfaiataria com meu tio Rodolfo.

Após trabalhar em lavoura de café, papai resolveu tentar uma profissão

trabalhando em um curtume, onde já estavam alguns patrícios. Pouco tempo

depois, foi convidado a dirigir uma charqueada onde se trabalhava com

couros, aqui em Passos.

Nessas idas e vindas do trabalho, passava pela casa de

meu avô Fortunato Tozzi, também um imigrante italiano,

casado com Adolphina Padua Tozzi. Uma das filhas

desse construtor sempre o esperava na janela para um

flerte! Era minha mãe, Carmela.

Casaram-se em 1923.

Em 1925, fundou o Curtume Santa Isabel em comunidade

com meu avô Fortunato.

Seria esta a razão do meu nome? Isabel é de origem judaica e significa:

“Que se dedica a Deus”. Sou a segunda filha do casal, nascida em 23 de

outubro de 1927.

Meus irmãos: Nair (já falecida), Maria, José, Franz, Rodolfo, Carlos e

Vagner Valery.

Page 6: Doces Recordações (2008)

6

Simplesmente Elzinha Kallás

Eu me chamo Elza. Nasci em 26 de agosto, na cidade de Passos. Sou a

11ª filha de Chucralla Elias Kallas e Chafica Nassim Kallas, libaneses da

cidade de Fake.

Quando mamãe ficou grávida, Jamil ficou viúvo e sua

esposa chamava-se Elza. E ele dizia para minha mãe: se for

mulher vai se chamar Elza. Quando eu nasci, mamãe mandou

chamá-lo e disse: vai se chamar Elza. A parteira foi D.

Margarida e nasci na minha casa e na cama de minha mãe que

até hoje está lá na casa de meus pais.

Jamil foi meu padrinho de batismo e me quis muito bem, durante

toda vida.

Minha madrinha é minha irmã Ione, que me quer muito bem até hoje e

me ama muito e a meus filhos também.

Não conheci meus avós, pois eles moravam no Líbano e nunca vieram para o

Brasil.

Tive uma infância muito feliz e fui muito amada por meus pais e pela minha

família.

Page 7: Doces Recordações (2008)

7

Infância em Itaú

Marlene Kirchner Mattar

Nasci no dia 10 de maio de 1937, no então Distrito de Itaú, município de

Passos –MG. Como nessa época, o local não dispunha de médicos, o parto foi

assistido pela parteira conhecida na localidade por D. Maria Guerra.

O ano de meu nascimento coincidiu com a instalação da Cia. Cimento

Portland Itaú no Distrito de Itaú, o que trouxe um grande surto de

desenvolvimento na vila, pois nossa economia estava centrada nos grandes

fazendeiros e em algumas indústrias que exploravam as ricas jazidas de

calcário para fabricação de cal.

Meus pais possuíam enormes propriedades rurais, onde criavam gado

e faziam plantações agrícolas e também exploravam jazidas de calcários,

queimando o produto em fornos denominados “CAIEIRAS”, para a produção

de cal .

Eles também tinham uma serraria, onde beneficiavam as sobras de

madeiras que não eram aproveitadas na calcinação da cal.

Meu pai era de origem alemã, e veio para o Brasil juntamente com

meus avós paternos, por volta de 1920. Eles se estabeleceram em Itaú por

volta de 1925.

Minha mãe era brasileira, nascida na cidade de São João Batista do Glória –

MG.

Dos cincos filhos que o casal teve, eu fui a quarta. Destes cinco

filhos, apenas três sobreviveram. Sendo que dos três, um faleceu

recentemente.

Minha vida em criança era cercada de muito carinho pelos que me

rodeavam. Adorava brincar com as crianças das colônias que meu pai

construiu para seus empregados. À noite,

escutava historias contadas por D. Finger, uma

alemã que morava conosco. Sempre fazíamos

passeios nas outras fazendas do papai, onde nos

divertíamos muito. Adorava andar de bicicleta.

Sempre acompanhava mamãe até a vila de

Itaú para fazer compras. Nestas idas a Itaú, era quase obrigatório dar uma

passada na casa da vó Candinha e da tia Maria José, além de visitar a

comadre Rosa.

Por ocasião do Natal, papai ia até a cidade de Passos e voltava com

inúmeros presentes e gostosas variedades de frutas e castanhas, que muito

me agradavam comer.

Nesta ocasião, mamãe fazia questão de montar o nosso tradicional

presépio.

Page 8: Doces Recordações (2008)

8

Já na idade escolar, fui matriculada numa escola municipal na Vila de Itaú

de Minas mantida pela prefeitura de Pratápolis, já que desde 1943, Itaú não

mais pertencia a Passos.

Nessa escola cursei a primeira série primária e a segunda.

Minhas professoras chamavam-se Maria Anchieta Ramos – Haidé

Parreira Pioto.

Como meu irmão mais velho estudava em Passos, meus pais, acharam por bem

levar-me para estudar lá.

Então fiquei interna no Colégio Imaculada Conceição onde prossegui meus

estudos.

Por volta de 1951, meus pais mudaram para Passos e eu deixei o internato,

mas continuei estudando naquele colégio até a 3ª série ginasial.

Page 9: Doces Recordações (2008)

9

Anjos brincando de gente grande

Zulma Terezinha Lara

Anjos de fé, nossas brincadeiras eram muito saudáveis como casinha

e comidinha, que fazíamos de verdade. Mamãe, muito religiosa, zeladora do

Sagrado Coração de Jesus, nos ensinava a rezar muito cedo, rezávamos o

terço.

Mamãe tinha muito medo de chuva, era só armar que ela já reunia os

quatro filhos e rezávamos. Brincávamos até de rezar missas: a comunhão

era biju de farinha. Quando tinha 6 anos já rezava todo o terço.

Aos sete anos, fiz minha primeira comunhão, minha catequista era a

professora Maria José de Souza. Mamãe, como costureira, fez uma veste

branca longa e um lindo véu branco. Meu irmão José, com oito anos, fez sua

primeira comunhão no mesmo dia. Mamãe comprou-me uma sandália branca

que eu adorei. Eram duas tiras largas na frente e uma passava no calcanhar.

Andava pela rua forçando os pés para frente, para que as correias do

calcanhar se soltassem para eu poder levantar o pé para arrumar, e assim,

todos verem minha linda sandália nova.

Fomos para a cidade, lá era preparada uma festa só uma

vez por ano e reuniam-se crianças de todas as comunidades

rurais de Guapé. Esta celebração ocorreu ainda no Guapé

velho, antes da chegada das águas da represa de Furnas.

Lembro-me que vinham alguns padres de outras cidades,

uns atendiam confissões, outros faziam brincadeiras no

coreto da praça, diante da igreja.

Brincávamos de coroar Nossa Senhora, eu vestia

um vestido de mamãe, colocava um véu sobre a cabeça,

subia em um banquinho e era coroada pelas amiguinhas, com coroa de ramos

e cipó de São João.

Quando faltava chuva íamos longe, no meio do cafezal, onde havia uma

cruz e havia morrido um trabalhador da fazenda, de acidente. Levávamos

água para molhar a cruz, pois assim se acreditava que a chuva viria.

Um dia, D.Jovita, responsável pela reza, toda contente, pediu-me que

eu tirasse o terço, pois queria mostrar que eu era capaz de contemplar

todos os mistérios. Comecei a rezar e todos respondiam, e eu sentia uma

grande emoção por comandar aquelas orações. Eis que de repente começou a

chover, em pleno meio dia, um sol escaldante, a chuva caia em nós, olhávamos

para cima e as gotas pareciam de prata, devido ao sol forte e o céu azul...

Foi uma experiência maravilhosa! O chão, com uma poeira fina, ficou

marcado pela chuva só no lugar onde estávamos. Voltamos para casa,

maravilhados. Minha infância ficou marcada com histórias fortes.

Page 10: Doces Recordações (2008)

10

Uma vida feliz

Maria de Lourdes Carvalho Esper

Chamo-me Maria de Lourdes Carvalho Esper, nasci em 23/02/1932, em

Passos, filha de Antonio Júlio de Carvalho, cirurgião dentista e Adozinda

Ferreira Lopes, do lar.

Sempre fui uma mulher voltada para o trabalho. Aos catorze anos

conheci o José (foi amor à primeira vista, pois eu disse: vou casar com esse

turco; posteriormente ele também falou: eu falei a mesma coisa: esta moça

vai ser a minha mulher!), namoramos e em 20 de junho de

1947 casamos, então eu, com apenas 15 anos. Para casar tive

que enfrentar o desacordo de meus pais e também dos

pais dele. Tanto foi que combinamos fugir com o apoio de

alguns parentes e amigos. Fomos até Santa Rita de Cássia e,

na Igreja Matriz, nos casamos.

De volta para Passos, fomos morar na casa de meus pais. O meu marido

também foi um homem voltado totalmente para o trabalho. No final de

alguns meses de casados fomos morar na roça, onde tínhamos uma pequena

venda. Nosso primeiro filho nasceu em 30 de abril de 1948. Foi um parto

bem difícil, sem uma boa assistência, mas vencemos. A vida era um

crescente desafio: o José saía para comprar e vender e eu cuidava da venda

e dos afazeres domésticos. Lavar, passar, socar arroz no pilão, torrar café

na panela, matar e fritar capado (porco gordo), encher lingüiça, fazer

chouriço, picar carne de vaca, cuidar das pequenas criações (porco, galinhas,

patos, perus, vacas e bezerros) era obrigação diária.

Nossa casa era bem freqüentada, recebíamos todos bem. Tivemos mais 3

filhos, ainda na roça.

Nosso quarto filho já nasceu na cidade, mas, ainda assistido por parteira.

Montamos um açougue onde eu trabalhava das cinco da manhã até altas

horas da noite, sem jamais deixar os afazeres de

casa. Lavar uma roupa era um dos afazeres

domésticos que eu mais gostava. Sou exigente e gosto

de lavar e passar. Faço-o muito bem. Sempre fui muito

feliz com meu marido e meus filhos. Minha vida

resumia em trabalhar e viver bem para todos.

Tivemos uma grande alegria quando Deus nos

presenteou com uma filha. Esta, já nasceu na Santa Casa de Passos.

Como todo casamento, tivemos altos e baixos e situações complicadas,

mas jamais deixamos de amar um ao outro.

Muitas vezes passamos por dificuldades financeiras, mas em momento

nenhum deixamos de receber de Deus as bênçãos milagrosas.

Page 11: Doces Recordações (2008)

11

Vivemos casados por 58 anos, com muita união, felicidades e alegria.

Em 1998 perdemos um filho, então com 48 anos de idade. Foi um tempo

muito difícil para todos nós. Todavia, ele havia deixado duas filhas, às quais

nós ajudamos a encaminhar.

No ano de 2005, exatamente no dia 10 de maio, perdi meu marido. Homem

bom, trabalhador, honrado e honesto. Vivemos um tempo bem difícil até os

dias de hoje.

Deus, na sua bondade infinita, fez-me entender que a vida continuava e

que eu, então, deveria assumir também o papel de pai de meus filhos.

Agradeço e louvo a Deus por tudo isso, especialmente pela minha vida, do

meu marido, de meus filhos, netos, netas, um bisneto, nora e genro.

Deus me contemplou com um grande dom: o dom da humildade. Nunca

blasfemei ou senti que não valia a pena viver, nem nos momentos mais

difíceis que passamos.

Tenho bons e grandes amigos e amigas que diariamente freqüentam a

minha casa. Recebo a todos com uma palavra de gratidão e esperança.

Gosto muito de rezar!... Rezo para todos: os que me pedem e também

para aqueles que não pedem.

Sou feliz.

Page 12: Doces Recordações (2008)

12

Adolescência de Nara

Nara Salgado Maia

Meu pai era fazendeiro em Cássia e viajava pelos sertões

comprando gado e sempre fazia amizade com vários fazendeiros. Foi assim

que, em Monte Carmelo, um lugar onde fazia uma parada para o gado

descansar, ele fez amizade com um fazendeiro que tinha uma filha chamada

Nara. Ao completar 40 anos, meu pai se casou com minha mãe e parou de

viajar pelos sertões comprando gado. Tiveram 3 filhos e como sou a última

ele me deu o nome de Nara, em homenagem ao seu amigo.

Brinquei de bonecas até os 11 anos, só deixei

quando ganhei uma bicicleta importada, azul, pois no

Brasil não fabricavam. Foi a minha maior

felicidade.

Quando eu tinha 15 anos, meu pai comprou

uma caminhonete Ford verde e, como ele não

sabia dirigir, me ensinaram a guiar em um mês. A

partir daí eu levava meus pais, toda manhã, para a fazenda e à tarde ia

buscá-los, sempre acompanhada de minha mãe.

Nessa época filho não discutia ordem dada pelos pais. Não tínhamos

muitas alternativas, passeios e nem bailes. Só ganhei meu primeiro sapato

de salto depois de fazer quinze anos.

A gente era feliz com o pouco que tínhamos. Nas férias fazíamos

brincadeira dançante nas casas de colegas. Cada domingo era na casa de uma

colega, levávamos discos que tocavam uma música de cada lado. Depois que

surgiram os long plays que tocavam várias músicas.

Não era servida cerveja ou qualquer bebida alcoólica. A bebida

servida era ponche de frutas feito com guaraná Antártica e frutas

picadinhas. Os pais eram muito vigilantes e entre 10 e 11 horas da noite a

festa acabava.

Hoje, com 63anos, consegui realizar meu sonho que é ser feliz como

uma criança, mas para isso tive que aprender a viver sem ter vergonha ou

medo de ser feliz....

Faço este álbum para os meus filhos e noras, que não são noras, são

filhas, e para os meus netos, razão da minha vida. Não quero que olhem este

álbum com lágrimas nos olhos, mas, sim, com um sorriso nos lábios e

felicidade no coração.

Eu os amo muito e, se algum dia eles tiverem tempo para contar as

estrelinhas do céu, então descobrirão o tamanho do meu amor por eles.

Dizer sempre “eu os amo”, faz muito bem para a alma e para o coração.

Page 13: Doces Recordações (2008)

13

Um legado de fé.

Marisa Batista

Mamãe era de estatura pequena, pele muito alva, traços bonitos,

cabelos castanhos claros e lisos e de temperamento muito calmo.

Sua vida era o lar e os filhos. Trazia as crianças sempre muito limpas,

as roupas simples e bem cuidadas.

Mamãe lavava, passava, cozinhava e cuidava dos filhos, sempre atenta

a tudo que fazíamos. O dia dela se resumia em coordenar a criançada, pois

éramos oito: cinco mulheres e três homens. Era alimentação, banhos, vigiar

as brincadeiras, nada escapava ás suas vistas.

Escola, catecismo e missa aos domingos ninguém podia faltar, mesmo

se estivéssemos com alguma indisposição, pois falava que era manha nossa.

Muito religiosa não perdia por nada as comemorações religiosas. Durante a

semana Santa lá ia ela com um bando de crianças para as procissões. As

pessoas até achavam bonita a cena: mamãe com um bebê ao colo e eu e

minha irmã, cada uma levando uma criança ora nos braços, ora puxando pelas

mãozinhas.

Para nós o Natal e a Semana Santa eram tudo de bom.

Aguardávamos com ansiedade a chegada dessas

festas, pois só nestas ocasiões que a gente

estreava sapatos e roupas. Era uma festa, uma

alegria enorme tomava conta de nossos corações.

Acreditávamos em papai Noel e os presentes, por

mais simples e humildes que fossem eram sempre bem

vindos.

Lembro-me bem da Primeira Comunhão de cada um de nós. Mamãe

fazia questão de mandar fazer os vestidos numa costureira muito boa para

que ficassem bem bonitos. Para os meninos terninhos feitos pelo alfaiate de

papai. Comprava sapatos meias, luvas e véus brancos para as meninas e

sapatos pretos de verniz para os meninos. Preparava uma mesa de café e ,

após a missa convidava nossos amiguinhos para tomar lanche conosco.

Também fazia questão de levar-nos ao fotógrafo para tirar uma foto de

estúdio.

Não usava comemorar o aniversário das crianças mesmo porque era

praticamente um por mês e isso era um luxo que não tínhamos. Anos mais

tarde, na adolescência, é que começamos a fazer umas festinhas.

O sonho de mamãe era que os filhos estudassem e para nós mulheres

queria que todas nós fossemos professoras.

Íamos crescendo, éramos felizes e unidos e esse legado de fé mamãe

nos deixou e até hoje somos fiéis a ele.

Page 14: Doces Recordações (2008)

14

Namoro, noivado e casamento

Sylvia Kallás Andrade

Conhecer e sentir simpatia foi o que aconteceu com o meu

primeiro namorado.

Certo dia, fui a uma loja próxima à minha casa e um moço

passou na loja onde sua prima Nida trabalhava. Lá, ele me viu e escreveu um

bilhete em francês para mim, que dizia: “Você é uma

menina muito bonita”, e entregou o bilhete à Nida

para me repassar.

No dia seguinte, ela me chamou e me deu

o bilhete, no exato momento, ele entrou na loja, fomos

apresentados e nos simpatizamos um com o outro.

Começamos a nos encontrar na loja e aos poucos no Jardim,

escondidos de minha mãe, que ainda não admitia namoro. Namorávamos sem

que meus pais soubessem, de seis horas da tarde às oito da noite.

Mas nosso namoro não estava dando certo porque eu ia muito

cedo para casa e ele se encontrava com outras moças para preencher o

tempo, ia ao cinema, aos bailes. Quando ficava sabendo, desistia com ele,

pois não queria que fosse assim.

Certo dia contaram para minha mãe que eu estava no Jardim

com um moço. Ela foi até lá e me disse:

- Vá para casa, já!

E eu fui chorando Quando cheguei em casa tomei uma surra e

fiquei um mês sem sair de casa, só ia ao Colégio.

Mamãe não queria este namoro, pois, no tempo certo, ela

arranjaria um parente para se casar comigo e não um brasileiro. Mandou-me

para o Rio de Janeiro. Fiquei lá três meses na casa de tia Mery, mas, mesmo

assim, não deixei o meu namorado, escrevia sempre para ele, dando notícias.

Quando voltei do Rio, os parentes passaram a nos vigiar, foi

uma época difícil para o namoro. Uma tarde estava com o meu namorado no

jardim quando vi passar um parente, fiquei apavorada e corri para casa. Na

pressa, perdi minha anágua, contei depois para minhas amigas o acontecido e

rimos muito, o fato virou piada.

Algum tempo depois, papai me levou novamente para o Rio de Janeiro

para encontrar com um parente que estava chegando do Líbano. Fomos

encontrá-lo em alto-mar. A intenção de nossas famílias era de que nos

simpatizássemos um com o outro, porém só nos tornamos amigos.

Page 15: Doces Recordações (2008)

15

Foi assim que meu namoro com o Célio continuou às escondidas.

Até que mamãe se conscientizou que era dele mesmo que eu gostava, então

me chamou e disse:

- Filha, traga seu namorado e venha namorar aqui dentro de

nossa casa, não quero que você continue se encontrando com ele só no

jardim.

Namoramos por mais ou menos três anos e após constatar que

nos amávamos e queríamos nos casar, ficamos noivos no dia 15.6.1953, dia do

meu aniversário.

Os pais do Célio, Sr. Manuel Andrade e D. Maria Deleposte

Andrade, vieram pedir permissão para esse compromisso e abençoar as

alianças e a nós. Esta data foi uma alegria e ficamos todos felizes com a

união das duas famílias.

Noivamos por um ano e nos casamos às oito horas da manhã, do

dia 5 de maio de 1954.

A cerimônia foi realizada durante a missa

celebrada pelo Padre José Deleposte, tio do Célio, e o

coral do qual eu fazia parte cantou lindos cânticos.

Foi um dia inolvidável, a festa se

alongou pela tarde até a hora de tomarmos o avião

da Empresa Real com destino ao Rio de Janeiro,

aonde chegamos já com as luzes da cidade se

acendendo. Vistas do avião eram uma maravilha, um verdadeiro espetáculo.

Passeamos muito, conhecemos vários lugares turísticos da

cidade: Pão de Açúcar, Corcovado, Paquetá e Niterói. Tiramos várias fotos

que até hoje guardamos como recordação. Passamos quinze dias nessa lua-

de-mel inesquecível, que recordamos com saudades.

Quando voltamos da viagem, moramos dez meses com minha

sogra, pois o Célio trabalhava na Usina Açucareira. Depois disso, mudamos

para a vila residencial, nas dependências da Usina, que oferecia casa aos

seus funcionários.

Foi muito bom o tempo que passamos naquela vila. Lá havia

festas, cinema e muitas comemorações, alto-falante com músicas à tarde

que preenchiam o tempo dos moradores. A vida lá se diferia com muita

evidência da vida a que estávamos acostumados, pois morávamos no centro

da cidade e nos mudamos para uma espécie de vila distante da cidade.

Lecionei três anos na Escola Dr. Joaquim Mário, na Usina.

Ficamos morando por seis anos lá e fizemos muitas amizades.

Como sou muito comunicativa, entrosei-me logo com outros moradores.

Nossos filhos nasceram lá. Hoje tenho saudades deste tempo distante.

Page 16: Doces Recordações (2008)

16

Sou uma pessoa que gosta de estar envolvida com a família,

amigos e a igreja, na qual trabalho em vários movimentos.

Gosto de estar com minha família. Fazemos muitas reuniões,

passeamos juntos e, principalmente, festejamos aniversários e tudo de bom

que a vida nos proporciona.

Sou feliz pela minha vida e também porque Deus me deu a

graça de comemorar com muitas festas as Bodas de Prata, as de 40 anos de

casados e as Bodas de Ouro, junto aos filhos, netos e neta, genro, nora,

familiares e amigos.

Completando meu prazer, faço parte, hoje, da Unabem que é a

Universidade Aberta para a Maturidade. Essa universidade nos proporciona

muita alegria.

Obrigada a todos aqueles que nos ajudam a trazer à tona

nossas recordações. São pessoas maravilhosas, dignas de serem aplaudidas.

São elas: Leila, Nádia, Cal, Gustavo, Ernani, Michele, Ana Paula e Gabriela.

Page 17: Doces Recordações (2008)

17

Namorar e enforcar aula...

Maria Thereza Mello Kallás

Estudava no Colégio das Irmãs. Lourdinha, minha amiga, e eu

não gostávamos muito de estudar e, sim, de aproveitar e namorar... Naquela

época falava-se enforcar a aula. Assim, íamos para o campo de futebol e

ficávamos lá comendo o lanche e conversando sobre namorado. Depois íamos

para casa como se tivéssemos ido à aula. Por isso ficávamos muito de

castigo.

Eu aproveitei muito e namorei bastante. Naquela época, se falássemos

”vamos fazer uma brincadeira na casa de fulana”, isso significava dançar ao

som de uma vitrola. Começávamos às 7 horas e terminávamos às 10 horas

da noite.

Quando eu tinha 13 anos, minha mãe me deixou usar salto alto e um

vestido justo para ir ao Passos Clube. Eu me senti maravilhosa!

Naquela época o divertimento era o clube ou o jardim da Matriz. Esse

jardim era bom demais: onde começava o namoro, primeiro o flerte. Depois,

o rapaz vinha conversar, pedia o namoro e em seguida saíamos para sentar

nos bancos do jardim e namorar...

Uma história interessante de que me lembro foi quando

minha mãe teve a primeira neta e todas as sobrinhas queriam

ser madrinhas de representar. No dia do batizado fomos todas

para a igreja e o padre era o Monsenhor Messias. Assim que

chegamos ele disse que para ser madrinha teria que estar

com roupa de mangas e vestindo meias e véu. Então

eu fui a madrinha, pois era a única que estava

com mangas e meias. Ah!

O véu eu pedi

emprestado para

minha irmã...

Assim, eu fui uma

madrinha muito feliz!

Page 18: Doces Recordações (2008)

18

A infância de menina levada

Nilda Esper Kallas

Sou de uma família de 8 irmãos. Quando eu estava para nascer, D.

Elvira foi atender minha mãe, pois nesse tempo os partos eram feitos em

casa. Minha mãe disse para Tia Reina que se fosse mulher pegasse as

roupinhas rosa e se fosse homem pegasse as azuis, que estavam

arrumadinhas na gaveta...

Minha tia se desorientou tanto que pegou as roupinhas azuis. Minha

mãe ficou satisfeita, pois, meu pai estava louco de vontade que viesse mais

um homenzinho. Quando perguntou à D. Elvira qual era o sexo, ela muito

brava respondeu:

- E você ainda pergunta? Minha mãe ficou por entender. Quando falou

com minha tia ela confessou ter se enganado com as roupas e só não apanhou

porque minha mãe não dava conta de levantar-se!

Fui à escola com sete anos e sempre levava muita merenda.

Na igreja do Rosário, onde hoje é a prefeitura, eu assistia ao

catecismo e ganhava pontos. Quem não faltasse ajuntava muitos pontos.

Quem tivesse mais pontos escolhia o melhor prêmio, no dia da exposição de

prendas.

Na minha casa tinha um colchão de palha. Eu

gostava de dormir nele e não deixava ninguém

dormir lá. De manhã eu arrumava a cama e enfiava

a mão dentro do colchão, em uma abertura da

capa, e esparramava as palhas de modo que ficasse

muito alto. Quando alguém assentava sobre ele, eu

não gostava e ficava muito brava.

Minha família e eu morávamos ao lado dos meus avós

maternos. Meu avô era fazendeiro e tinha uma charretinha toda pomposa e

linda. Não deixava ninguém sair nela. Ia todos os dias à fazenda e só levava

meus irmãos. Não gostava de levar as meninas. Uma vez fui com ele e

chegando lá quis andar de carro de boi. Morria de medo, grudei na armação

do carro, quase chorando e gritando.

Meu avô trazia latões de leite da fazenda, que minha avó vendia. Ela

colocava uma mesa coberta embaixo de uma enorme parreira. Abria de um

em um os latões e com um litro com um cabo de ferro comprido ia medindo a

quantidade acostumada para cada freguês. Nessa época não havia leite

pasteurizado.

No mês de maio havia as coroações de Nossa Senhora. As duas

meninas que iam coroar davam saquinhos de doces para as acompanhantes

que ficavam do seu lado. Após a coroação, as duas meninas ofereciam o

Page 19: Doces Recordações (2008)

19

saquinho para a menina que carregava a coroa, para o padre e para a senhora

que ensaiou. Era uma alegria imensa, todo mês de maio eu aproveitava com

vestido branco comprido, de véu e grinalda.

Uma vez convidei minha prima Nadéa para jogar maré e tive uma idéia

de cercar um carro que vinha na rua.

Pulamos no meio da rua e abrimos os braços e as pernas, e o chofer

que vinha na maior velocidade, buzinava sem parar. A Nadéa pulou fora e eu

fiquei no meio da rua de braços e pernas abertos. O chofer fez uma brusca

parada, derrapando o carro na rua de terra. Nessa época a Rua Dois de

Novembro não era calçada. Foi um poeirão em volta de mim.

O chofer desceu do carro xingando e deixando a porta aberta, subiu

as escadas para falar com meu pai. Meu pai mandou-nos chamar, levou-nos

para um quarto. Desceu a vidraça para não fazer barulho para o vizinho e

disse: “Venha experimentar o sapatinho novo, o vestidinho novo, minha

filha”.

Ficou muito zangado com minha prima dizendo que não ia bater nela

porque não era filha dele. Foi tirando a correia devagarzinho e me deu umas

boas correiadas dizendo: _ Você quer fazer o carro parar?

Foi a primeira e última vez que eu apanhei de meu pai. Era só ele olhar

para a gente, que ficávamos quietinhos sem dizer uma palavra e sem

discussões.

Aproveitei muito minha infância, brinquei demais, jogava peteca, iôiô,

bilboquê, pulava corda, brincava de pique de esconder, queimada ou

cemitério, rebatia bola com minha vizinha Dalva e nas férias, ia à

piscina todas as manhãs.

Todos os anos, dia 1º de janeiro, toda família

de meus avós paternos reuniam-se na casa deles,

durante a tarde inteira.

Era costume os avós e os tios, darem

dinheiro às crianças. A gente chegava perto de cada

chefe de família, tomava a benção e dizia: “feliz ano bom”, e

cada um dava uma nota para a gente, com valores variados.

As meninas iam todas de bolsinha nas mãos ou a tiracolo.

Eu tinha muita vontade de saber se nota rasgava, fui ao quintal, olhei

para os quatros cantos, não vi ninguém, peguei uma nota de 10 mil reis, parti

com as mãos, bem no meio da nota.

Fiquei com tanto medo de apanhar que joguei as duas metades na

sarjeta e corri para casa que era do lado. Esperei um tempinho e voltei para

casa de minha avó.

Page 20: Doces Recordações (2008)

20

Pouco tempo depois, um de meus primos chegou gritando; “olhem o que

eu achei!!” E mostrou as duas metades do meu dinheiro rasgado. O pai dele

disse: “me dá aqui, que eu troco pra você”.

Eu quase morri de paixão, mas não abri a boca de medo. Fiquei com

menos dinheiro que as outras crianças, que quase a toda hora abriam a bolsa

para contar quanto tinham. Mas valeu a experiência, matei a vontade.

Page 21: Doces Recordações (2008)

21

Infância religiosa

Juvenila Carvalho Hipólito de Souza

Eu nasci em 24 de junho de 1933. O mês de junho é consagrado ao

Sagrado Coração de Jesus e aos santos: Antonio, casamenteiro, São Pedro e

São Paulo, que tem a chave do céu e São João Batista, o batizador. Sabemos

pelas palavras do anjo Gabriel que João, cujo nome significa “Deus é

propício” foi concedido aos dois cônjuges, Isabel e Zacarias, em idade

avançada e enviado por Deus para endireitar os caminhos do Senhor, foi

santificado pela graça divina antes mesmo que seus olhos se abrissem à luz.

Tive uma infância muito alegre. Mamãe nos deixava ir, depois do

jantar, para a rua do Colégio das Irmãs, onde brincávamos de vários tipos de

jogos: boca de forno, pique esconde, passa anel, pular corda, apertar a

campainha na casa dos vizinhos, barra-manteiga e muitos outros. Quando

batiam sete horas, mamãe chamava para tomar banho e logo a seguir nós

íamos dormir. No outro dia, começava tudo de novo.

O senhor Luiz Patti era o farmacêutico que aplicava injeção. Ele tinha

um auxiliar que se chamava Nino

que era um anjo de pessoa, não deixava a injeção doer. Mas na hora

de aplicar era um deus- nos- acuda!

Meus padrinhos, Dr. Arthur e Madrinha Carolina, moravam em frente

a minha casa. O quintal deles era imenso, com muitas frutas.

Eu, como afilhada, era sempre convidada para ir apanhar e

comer aquelas deliciosas frutas! Minhas amigas ficavam

com ciúmes, mas eu sempre dividia com elas.

Minha primeira comunhão foi linda! Meu vestido

branco, enfeitado com rendinhas franzidas, fazendo um

desenho que formava flores. Vesti um véu branco e

minha alma estava pura, sem maldade, sem egoísmo e

alegre porque ia receber Jesus, que deu seu precioso

sangue, também por mim!

Eu sempre amei a vida. A vida é muito bela de se viver, sempre

agradeço por estar vivendo bem todos estes anos!

Page 22: Doces Recordações (2008)

22

Os amores da minha vida

Benedita Aparecida Barros de Oliveira

Nasci em Três Corações, dia 24 de março de

1933, portanto, estou hoje com 74 anos bem

vividos, cheio de emoções e saudades.

Recebi este nome porque minha

mãe era devota de São Benedito e como

estava demorando a engravidar, fez uma

promessa de colocar esse nome que significa ser

uma pessoa bendita e abençoada por Deus!

Meus pais eram muito bons e eu tive

uma infância tranqüila e feliz. Brincava como

toda criança com pureza e ingenuidade. Nunca fiz

arte ou me machuquei feio por ser calma e muito bem

cuidada pela minha mãe.

Minha mãe chamava-se Maria Porto de Barros era carinhosa, fina,

educada e que nunca me bateu. Meu pai era maravilhoso, lindo, inteligente,

extrovertido. Papai Valdomiro Barros Lemos era um artista, um poeta que

declamava lindos poemas e era muito aplaudido.

Quando eu estava com cinco anos, mais ou menos, fomos morar em

Poços de Caldas onde havia cassinos famosos e onde o meu pai trabalhava

como chefe dos “croupiês” no “Palace Hotel”. Em Poços, eu estudei até a

quarta série e minha professora me ensinou a declamar poesias (tem uma

poesia chamada “Arara” que lembro até hoje). Meu pai era poeta e

declamava sempre no palco do cassino quando havia convidados importantes.

Ele me levou na Rádio de Poços para declamar e foi emocionante!

Meu pai conheceu gente famosa e importante como Getúlio Vargas,

Carmem Miranda, Libertad Lamarc,etc.Mas , um dia, veio um decreto e

fechou todos os cassinos do Brasil.Então, viemos para Passos.Moramos,

também, e São Paulo e aos meus 17 anos voltamos definitivamente pra

Passos.

Aos dezoito anos diziam que eu era muito bonita, mas, recatada e

ingênua. De repente, um moço lindo, loiro, alegre, começou a me rodear até

me conquistar. O seu nome era Grimaldes Oliveira Campos era apaixonado

por mim, me adorava, me namorou e conquistou pra sempre!

Casamos e fomos muito felizes!Tivemos seis filhos:Fernando, Júlio,

Grimaldes,Cristina,Sandra e Raquel. Sou avó de 14 netos e 1 bisneto. Hoje,

sou viúva, moro sozinha e tenho duas damas de companhia: uma para o dia e

outra para a noite.

Page 23: Doces Recordações (2008)

23

Primeira Comunhão Isabel Suhadolnik Parenti (Belinha)

Houve um momento especial na minha vida!

A primeira Comunhão, o vestido branco, a coroa de

flores e o véu!

Naquele tempo, a Santa Casa de Misericórdia de

Passos era dirigida pelas irmãzinhas da

Imaculada Conceição, congregação fundada pela

Irmã Paulina, e todo ano elas preparavam as

crianças das imediações para receber Jesus.

A Capela de Nossa Senhora das Dores era

enfeitada com carinho para o grande dia!

Eu fui uma dessas privilegiadas crianças e não me esqueço

do quanto senti meu coração batendo forte, de tanta

felicidade!

Após a missa uma grande e enfeitada mesa foi servida, com

coisas que toda criança gosta.

Recebemos um Santinho e um terço como lembrança. Até tirei o meu

retrato com ele!

O Sr. José Barbosa, o fotógrafo mais famoso da cidade, esteve lá marcando

com fotos o grande acontecimento!

Page 24: Doces Recordações (2008)

24

Rezar para as almas

Zulma Terezinha Lara

Um de nossos folclores, que infelizmente está desaparecendo, pois

não vejo há muitos anos, mas é muito vivo em minha memória é o costume de

rezar para as almas. Quando eu era menina, na fazenda, na época da

Quaresma se rezava para as almas. Só homens é que saiam para rezar, em

números ímpares, nunca pares, e só rezavam em números ímpares de casa.

Era proibido abrir portas e janelas e, a reza, era sempre à noite. Os

rezadores andavam em silêncio, não podiam olhar para trás. Dizia a lenda

que as almas acompanhavam a reza, todas vestidas de branco. Eles usavam

catracas, que iam batendo para acordar os donos das casas para que

também rezassem, e tudo com muito respeito, era cantado e também

rezado, durante os dias comuns da quaresma. A oração era mais ou menos

assim:

Alerta, alerta pecador, este sono que vos dorme, Ave

Maria, Ave Maria.

Bendito, louvado seja, na paixão do redentor, Deus

desceu do céu na terra, padeceu dos pecados, com

Maria Imaculada que dela nasceu Jesus, Ele foi o que

Deus criou, padeceu por nós na cruz.

Reza um Pai-Nosso e também uma Ave Maria, Ave

Maria, ai, ai, ai...

Reza mais um Pai-Nosso e uma Ave Maria, Ave Maria,

ai, ai, ai...

Peço mais um Pai-Nosso e uma Ave Maria, Ave Maria, ai, ai, ai...

Me despeço na graça do Senhor e com muita fé seguimos

Bendito seja Deus e Ave Maria, Ave Maria.

Na roça dormíamos cedo e à meia noite, saíamos para rezar, sempre

as quartas ou sextas-feiras. Na última casa era servido um café e isso

acontecia sempre em minha casa. Antes de deitarmos, preparávamos o café

com quitandas, ou pamonha. Colocávamos a mesa do café do lado de fora,

onde tinha um banco e deixávamos tudo arrumado. Às vezes, tínhamos medo.

Meu irmão era o mais medroso, quando ia rezar em casa, ele corria e

deitava com a mamãe e o papai. Quando ficou mais mocinho, um dia inventou

de acompanhar a reza, e lá foi ele jurando se comportar. Foram rezar em

uma colônia, um pouco longe de casa. Vários dos que rezavam moravam nessa

colônia e só restou três deles para voltar para casa com meu irmão. Quando

chegaram ao alto do morro começaram a ouvir vozes. Dos três, um era mais

Page 25: Doces Recordações (2008)

25

corajoso e disse para os outros que não olhassem para trás, andassem

firme, não corressem e que rezassem! Meu irmão, muito curioso, deu uma

leve olhada para trás e disse que tinham umas cinqüenta pessoas de branco

atrás deles, e que conversavam muito. Seu cabelo arrepiou todo, saíram

gritando e correndo. Meu irmão chegou em casa, branco, quase sem fala e

nunca mais quis acompanhá-los.

Nesse domingo que passou, encontrei-me com um dos rapazes que

rezava naquele tempo. Fazia muitos anos que não o via, foi muito bom

revivermos nossos tempos na roça. Ele me contou muitas coisas que

aconteciam com eles durante as rezas e que eles não tinham medo. Quando

saiam com poucos homens para rezar, eles cantavam e ouviam muitas outras

vozes que cantavam com eles, no ritmo certo da música e que, muitas vezes,

pareciam implorar suas orações.

Adorei as estórias que ele me contou. Ele disse que havia a reza

comum da Quaresma e que, na semana das dores, rezava-se as sete dores

de Maria, uma outra canção. Mas eles não rezam mais há muitos anos. Ele

acredita que era muito sofrido e que não davam sossego para as almas que

ficavam muito agitadas, e que não temos o direito de tirá-las deste sossego

eterno.

Valeu a pena relembrar esta estória que me acompanhou enquanto eu

vivi na roça, que há trinta e quatro anos não vejo mais. Tenho saudades!

Page 26: Doces Recordações (2008)

26

Leilão inusitado, muitos anos depois...

Sylvia Kallás Andrade

Ave Maria Puríssima

Ginásio da Escola Normal Imaculada Conceição

Passos, 27 de outubro de 1949

Prof.ª Ana Rita Stockler Mezencio

Aluna: Silvia Kallás

Leilão de “Nossa Classe”

Como precisamos de uns moneys para a construção do Ginásio,

resolvi fazer um leilão das preciosidades de nossa classe.

Em primeiro lugar, quanto me dão pela tagarelice da Mesqui?

Pela bondade da Selma combinada com a boa vontade da

Augusta?

Quanto me dão pelo espalhafato da Vitória?

Quem dá mais pela sapequice da Inês Moraes? Quem deseja

arrematar a malandragem da Conceição Câmara combinada com o

jeitinho da Cici?

Quanto me dão pela sabedoria da Ineizinha e os

desenhos da Leila?

Quanto me dão pelas leituras da Nirce

e a santidade da Geralda?

Quem dá mais pelas sardas da Emília e

pela gordura da Placidina?

Quanto vale o batuque da Conceição Alux

e o acanhamento da Neif?

Quem dá mais pelo sorriso e pelas covinhas da Sirlene?

Rifa-se a voz de barítono da Elvia e a calma da Marly.

Quem dá mais pela elegância da Silvia combinada com as pernas

de seriema da Anunciação?

Quem quer arrematar as brigas da Nora e da Gleida?

Quanto me dão pelo nervosismo da Clarinda e assiduidade da

Ivis?

Quem dá mais pelas madeixas douradas da Expedita misturadas

com as da Vilma?

Rifam-se os beliscões da Beraldo.

De minha importante pessoa, rifo os tênis rasgados e a língua

de cinco metros, misturados com a gagueira da Dodora.

Saudades do tempo de estudante!

Page 27: Doces Recordações (2008)

27

Porque me chamo: Adelaide

Adelaide da Penha Alves

O nome próprio é um sinal de cidadania, nos identifica e distingue um

dos outros. O nome é um som ou conjunto de sons que ao ser ouvido,

imediatamente nos faz pensar assim: sou eu...

O nosso nome é um dos primeiros sons a penetrar em nossa mente e

ser fixado na memória.

O primeiro nome que minha mãe sonhou

pra mim foi: AÍDA. Não que ela conhecesse a

ópera de Giuseppe Verdi e, sim, por ter conhecido

em sua adolescência uma senhora, muito bondosa,

elegante e que a tratava bem. Meu pai, em sua

simplicidade rústica de um bom mineiro do

interior, respondeu:

- Aída? Mas, então, a próxima filha vai ter

que se chamar: A VOLTA...

E foi assim que esse lindo nome foi descartado.

Imaculada, lembrando o dogma da concepção da virgem Maria ou Inês,

exalando a pureza de Santa Inês, eram os nomes mais cotados para mim.

Mamãe os achava lindos!

Meu pai queria porque queria que eu me chamasse: PENHA. Era

devoto de Nossa Senhora da Penha e tinha até um lindo quadro da santa com

um rio, um jacaré, a mata fechada com uma cobra venenosa e em cima de um

penhasco (ou pedras ou penha), a imagem de Nossa Senhora que salvava um

homem desses perigos. O meu pai, que foi criado e sempre viveu na roça,

tinha muita fé e dizia que Nossa Senhora da Penha o tinha livrado desses

perigos.

Bem... Havia aí um pequeno impasse... E talvez, a escolha do nome

tenha também um toque especial de algo não muito bem definido a que

chamamos: DESTINO.

Só sei que nasci no dia 16 de dezembro e que muitos santos são desse

dia. Ou seja, têm esse dia dedicado a eles. E foi aí que minha mãe teve a

idéia de olhar no ALMANAQUE FONTOURA.

Naqueles idos de 1.947 quase não havia publicações escritas aqui,

nesse interior das Gerais, a não ser esse famoso e útil almanaque que era

distribuído pelas farmácias. O almanaque foi uma das primeiras mídias da

Indústria Farmacêutica a fazer a cabeça do brasileiro para que ele

comprasse remédio pronto, já que, naquele tempo todos sabiam gostavam e

preferiam usar apenas os remédios caseiros. Mesmo sendo mídia

manipulativa, o tal ALMANAQUE era muito bom mesmo.

Page 28: Doces Recordações (2008)

28

Na mesma hora em que a minha mãe leu no Almanaque: 16 de

dezembro; Santa Adelaide, ela se emocionou e pensou assim:

“Gente, esse tem que ser o nome da minha filha. É muita coincidência

ela nascer justo no dia de Santa Adelaide, sendo que a minha mãe e a avó

paterna (ambas já falecidas) tinham também esse nome: Adelaide”.

Foi assim que eu recebi esse nome e pro meu pai não ficar magoado

fui registrada e batizada como: Adelaide da Penha.

PERAÍ! Ainda não acabou.

Como chamar um bebê tão pequenino e delicado com um nome tão

grande e senhoril? E foi aí que começaram a me chamar de FIA ou FIÍNHA

e este foi o som que eu ouvi até os 7 anos.

Naquele tempo, fazer 7 anos era muito importante. Diziam que aos

sete anos a gente entrava na idade da razão e, a partir daí, muita

responsabilidade já era cobrada de nós. Aos 7 anos entrávamos na escola e

também éramos preparadas para fazer, no fim do ano a PRIMEIRA

COMUNHÃO.

Esses fatos eram marcantes porque até então, nossa vida era

estritamente familiar. Sempre junto com os pais, irmãos, avós, tios e

primos. No máximo, brincávamos na rua com os filhos dos vizinhos à tarde

ou à noitinha, enquanto nossos pais punham a cadeira na calçada e

conversavam e nos olhavam enquanto tomavam a “fresca”. Às 8 horas da

noite todos se recolhiam para dormir.

Entrar na escola era nosso primeiro contato social maior, íamos

conhecer a professora, a diretora, os colegas e as crianças maiores das

outras séries.

Dava um pouco de medo e vergonha também.

Não havia “Jardim-de-Infância” nem “Pré-

Escola”, entrávamos direto no 1º ano para aprender

a “pegar no lápis”. Eu tinha vergonha de pedir pra

ir ao banheiro e um dia fiz xixi na sala de aula. Por

usar anágua grossa e saia pregueada, o xixi foi

absorvido e “acho” que ninguém notou. Bem, fui

feliz no 1º ano, aprendi a ler muito bem e passei com

10 em tudo. Minha professora era dona Nair e ao fazer a

chamada me chamava de Adelaide e todos os colegas também. A primeira

vez que uma coleguinha de classe foi em minha casa e perguntou pra minha

mãe: “A Adelaide tá aí?” foi que minha mãe teve outro insight e resolveu

deixar de me chamar de FIÍNHA e só me chamar pelo verdadeiro nome. A

partir daí foi que comecei a ouvir a voz da minha mãe falando o meu nome e

também todas as demais pessoas, menos meu irmão que até hoje me chama

de FIA.

Page 29: Doces Recordações (2008)

29

Aos sete anos comecei a ser e a me sentir e a me identificar como

Adelaide. Aceitei, mas achava que era um nome antigo. Hoje gosto, acho que

não é um nome comum, é forte, tem personalidade, tem história em meus

ancestrais, é de origem portuguesa das famílias MARQUES e QUEIRÓS.

Page 30: Doces Recordações (2008)

30

Minha Jornada Escolar

Maria Rita Alves Grilo.

Aos sete anos iniciei minha jornada escolar. Fui alfabetizada pela

minha prima Zélia Vilhena, professora, que também alfabetizou meus irmãos

e primos e lecionou na Escola da Fazenda da Taquarussu.

Quando viemos para a cidade, eu fui estudar no Colégio Imaculada

Conceição, CIC, cursando o primeiro ano primário. Eu já havia completado

oito anos. Participei de um teste para concorrer a uma Bolsa de Estudo e

consegui o direito ao estudo gratuito até o final do terceiro ano do curso

normal, hoje Magistério.

Cursei as três primeiras séries no CIC. Eu levava o

estudo muito a sério. Era estudiosa e aplicada. Fui a única

aluna do curso primário no CIC a ser premiada para

participar do Retiro Espiritual que acontecia todos os

anos para os alunos do curso Ginasial e Normal. Foi

uma grande vitória para mim e meus pais que sempre

zelaram pela religiosidade familiar.

Na 4ª série fui estudar no grupo Escolar

Abraão Lincoln para levar um dos meus irmãos comigo.

No grupo eu procurava fazer o melhor possível nos

estudos. Éramos uma turma mista, muito alegre e amigos divertidos. Os

meninos sempre aprontavam alguma arte. Meu quarto ano foi muito divertido

e bom. Foi um ano apenas, mas deixou saudades. Nossa formatura foi no

Auditório da Rádio Sociedade de Passos, com direito a Paraninfo, Orador e

Discursos.

No ano seguinte fiz um curso chamado de Admissão ao Ginásio, nas

classes anexas à Escola Normal Professora Júlia Kubitscheck. Nossa turma

era muito animada, mas éramos também muito estudiosos, o diretor era uma

fera e não admitia gracinhas.

Terminado o curso, voltei a estudar no CIC. Uma adversidade, porém,

atrasou minha vida escolar. Eu iniciei a primeira série do Curso Ginasial. O

CIC era um colégio muito rígido com a disciplina e com o uniforme escolar

dos alunos. Era o mês de junho, quando aconteciam as provas bimestrais e eu

estava com nota negativa em Latim, que era matéria obrigatória no currículo

escolar.

Exatamente no dia da prova de Latim, tive que ir à aula com uniforme

incompleto, faltava a boina, que eu esqueci na sala no dia anterior. Perdi a

prova de

Latim e ganhei uma bomba no final do ano.

Page 31: Doces Recordações (2008)

31

Muita revoltada e já sabendo da possibilidade de repetir a série,

parei de estudar. No ano seguinte meus pais e a madre superiora do CIC me

convenceram a voltar, com direito a bolsa de estudos. Consegui o meu

diploma de Professora no fim do ano de 1964, um ano muito agitado, pois o

Brasil estava em revolução.

Lembro-me de que o Quartel da Polícia era em frente ao Colégio e

na hora da partida dos soldados, para a luta, houve um momento cívico de

despedida e oração na Capela e na calçada do CIC, bem em frente ao

Quartel formamo-nos para desejar boa sorte aos rapazes, pedindo a

proteção de Deus!

Terminada a minha jornada estudantil, trabalhei

como professora em Bom Jesus da Penha e

depois, em Furnas.

Cursei a Faculdade de Filosofia de

Passos, me especializando em Supervisão,

Orientação e Administração Escolar.

Após a aposentadoria do meu

marido, nos mudamos para Passos, onde

lecionei nas Escolas: E. Abraão Lincoln e N.

Sra. Da Penha e trabalhei como Pedagoga na

então Delegacia Regional de Ensino e voltando para a E. N. Sra. Da

Penha, onde me aposentei em l994.

Hoje estou na Universidade Aberta para a Maturidade – UNABEM

e estou me preparando para cursar a Faculdade de História no próximo ano,

com o incentivo do meu irmão, Prof. Grillo.

Minha jornada escolar foi bastante difícil, com muitos sobe e

desce, porém, foi muito divertida e alegre e ainda guardo lembranças

maravilhosas das colegas, dos colegas e dos Professores.

Dos meus alunos, carrego comigo muita saudade e aprendizado de

vida!

Page 32: Doces Recordações (2008)

32

Minha adolescência

Luzia Soares de Oliveira Maia

As recordações que lembro de minha infância são várias.

Sempre brincava com duas amigas que moravam perto da fazenda.

Minha mãe, muito exigente, quando as duas amigas apareciam ia logo

dizendo: - primeiro termina a obrigação depois brinca com suas amigas. Ah!

Como eu ficava esperta e fazia tudo correndo...

Brincávamos de fazer comida num fogãozinho à lenha feito por nós: as

panelinhas e a chapas foram presentes de meu pai quando fez uma viagem

para Uberaba.

Meu sonho era ter uma boneca. Até os 7 anos

não havia ganhado e sempre brincava com boneca

de pano e outros cacos que minha mãe jogava

fora.

Era uma festa quando ganhávamos uma

rolinha ou um franguinho para fazer nossa

comidinha e, ao mesmo tempo, era um

problema, pois em nossas panelinhas não

cabiam o franguinho. Aí teríamos de pedir

minha mãe uma panela maiorzinha. Então vinha

primeiro a bronca: - Só empresto se me

devolver limpa e brilhando. Volte limpa e

brilhando!

Certa vez mamãe foi a Belo Horizonte fazer uma consulta médica,

então eu disse: - Mãe, o meu sonho de ter uma boneca ainda não acabou.

Queria que a senhora me comprasse uma. Quando ela voltou trouxe seda

para fazer vestido para cada uma de minhas irmãs e eu não ganhei o vestido

porque havia ganhado a boneca. Chorei muito porque queria os dois, mas tive

que me contentar só com a boneca.

Morávamos à beira de um riacho. Quando chovia bastante formava uma

lagoa ao lado, então, deixávamos a casinha para brincar de jogar pedaços de

pau uma nas outras. Entramos na água sem roupa, quando já estávamos

cansadas de brincar,fomos nos vestir, qual não foi a surpresa quando não

encontramos nossas roupas.

Ao voltar para casa já íamos chorando antes de contar o que havia

acontecido. Foi terrível o castigo que recebemos: chicote e ficar sem sair

de casa por muito tempo. Um pequeno descuido de mamãe, porque achava

que estávamos brincando na cozinha.

Outra passagem de minha infância que nunca me esqueci foi quando

meu irmão e eu estávamos embaixo de uma bananeira, olhamos para cima

Page 33: Doces Recordações (2008)

33

vimos duas pencas maduras. A bananeira era alta e meu irmão disse: -“Sobe

você que é mais leve que eu!” Pois eu era muito magra. Quando comecei a

tirar as bananas do cacho desequilibrei, caí e sofri um desmaio. Meu irmão

me carregou e me escondeu atrás de uma horta de verduras. Quando

acordei sentia dores nas costas e saía sangue pelo nariz e pela boca. Porém,

tive que aquentar tudo calada, pois se meus pais soubessem seria outro

castigo na base do chicote.

Aos 14 anos tive o primeiro namorado, pegávamos na mão só quando

íamos nos cumprimentar ou nos despedir.

Como sonhava em ter um vestido bonito, bordado ou de renda! Pedi à

minha mãe a tão sonhada roupa. Para minha tristeza a resposta foi que se eu

quisesse vestido bordado teria que fazer ou pedir alguém para me ensinar.

Assim, fui atrás de tudo e aprendi a bordar o meu vestido branco. Ficou

lindo, com bordados coloridos e rendas para usar no casamento de minha

irmã .

Aos 16 anos comecei a ir a bailes, mas sempre acompanhada de minha

irmã. As músicas tocadas eram sempre românticas,

boleros, valsas e, às vezes, até arriscava uns passos

do tango La Cumparsita.

Aos 23 anos encontrei o homem que amei de

verdade, namoramos, noivamos e nos casamos dentro

de um ano.

Como são doces as lembranças daquela época,

quando estava no salão de dança vestindo rodado

salto alto, corpo bonito. Modéstia à parte, eu

dançava bem, por isso nunca tomava chá de cadeira.

Ah! Se o tempo pudesse me levar de volta, outra vez, à minha

mocidade!

Tudo passou, tão rapidamente, como um sonho.

Page 34: Doces Recordações (2008)

34

Escola normal

Maria Tércia da Silveira

A Escola Normal era a mais famosa escola da cidade. Ficava no

número 264 da Praça do Rosário ou Praça Geraldo da Silva Maia e onde,

hoje, é o edifício Portinari.

Era um prédio grande de dois pavimentos e estava sempre pintado da

cor de tijolo-rosado. Todas as salas eram grandes e espaçosas. No térreo,

ficavam as classes anexas, isto é, o curso primário, que se fazia em 4 anos.

O restante era o curso ginasial e escola normal. Feito esse curso Normal, a

pessoa era normalista, hoje professora.

As carteiras eram de madeira e duplas:

para dois alunos. Os quadros- negros, todos

pretos e pequenos.O mobiliário era simples, até

mesmo o da secretaria. Era muito bonito um

armário-estante que lá ficava.

As professoras primárias, isto é, do primeiro

ano ao quarto eram as seguintes:

Aristotelina Teresa de Souza (D. Tutinha)

Guaraciaba Machado Lemos (D.Guará )

Mais tarde vieram novas professoras:

Isabel Serafim de Andrade (Belinha Serafim)

Maria José Vieira Leal (Zezé )

Do Ginásio e curso Normal

Dr. Washington Álvaro de Noronha: diretor e professor de Português

e Francês

Reverendo Jairo Borges: Psicologia

Benedita Andrade: Metodologia

Maria Simão: Educação Física

Rita Reis: Biologia, Canto e Música

Maria Augusta Reis: Português

Bartira Noronha Freire: História

Beatriz Noronha: Geografia

Redelina Andrade (Dona Ré): Matemática

Luiz Marinho: Inglês

Violeta Camargo: Francês

Dulce Santos: Português

Francisco Soares de Melo: Português e Latim

Nair Le Senechal: Artes

Maria Aparecida Le Senechal: Artes

Page 35: Doces Recordações (2008)

35

Meus avós

Maria Rita Alves Grilo.

Vovô Nhozinho (Saturnino Gomes de Lemos Grillo) e Vovó Dona (Donolina

Mendes Grillo)

Ele, descendente dos Gomes de Lemos e Grillos, de famílias

portuguesas que imigraram para o Brasil e se assentaram no sul de Minas e

na região de Pirai, no Rio de Janeiro, espalhando-se depois por todo o Brasil.

Meus avós vieram para Passos com minha bisavó Maria Rita, trisavó

Adelaide e seus filhos, eram fazendeiros ou comerciantes.

Meu avô Nhozinho morou na cidade por um tempo,

depois comprou a fazenda Taquaruçu , onde ficou boa parte

de sua vida.

Minha avó Dona, era filha da alta

burguesia do Sul de Minas. Seu pai era

Juiz de Direito e foi Maestro de uma

orquestra, era descendente de espanhóis que

habitaram a região de Elói Mendes, seu primo, nome dado

à cidade mineira de Elói Mendes.

Ela era uma pessoa fina, de uma delicadeza ímpar,

tocava harpa e conheceu meu avô, às vésperas do casamento, como era de

costume. Teve seus filhos em São Gonçalo do Sapucaí. Quando vieram para

Passos, meu pai tinha cinco anos. Após a morte de minha bisavó, vovó ficou

sob a responsabilidade de seu pai, com os cuidados de aias que olhavam vovó

e sua irmã.

Com o falecimento de seu pai, vovó ficou tão traumatizada, tomou

raiva de música e passava mal só de ouvir qualquer som.

Quando moravam na fazenda Taquaruçu ela foi ficando doente e eu só

me lembro de seu semblante triste e abatido. Depois de um tombo que

levou, ela ficou até a morte, sentada numa cadeira. Meu avô fabricou uma

cadeira de madeira que era para seu uso sanitário e nos banhos. Vovó era

sempre carregada por nós, netas, ou pelas noras. Durou com vida dois anos

após a morte do vovô.

Meus avós maternos: Theodoro Leão Alves Negrão e Rita Martins de

Mendonça. Ambos de Bom Jesus da Penha, onde nasceram, se conheceram,

casaram e tiveram seus filhos (já citados).

Vovô era trabalhador e honesto, uma pessoa simples, mas sempre

batalhador. Em Bom Jesus, trabalhava numa farmácia de seu parente. O que

continuou a fazer na farmácia do Tio Antenor Negrão, aqui em

Passos.Trabalhou na Fábrica de Manteiga Aviação e, finalmente,na

Page 36: Doces Recordações (2008)

36

Prefeitura de Passos, no gabinete do Prefeito Geraldo da Silva Maia, onde

se aposentou.

Era uma pessoa brincalhona, mas muito brava. Não tolerava bagunça

dos netos, mas nunca bateu nem nos filhos e nem nos netos, pois os arteiros

sumiam com o seu vozeirão dando uma bronca.

Gostava de pentelhar a vovó, por causa de religião: sempre que ela

pegava o terço, ele pegava um livrinho de São Cipriano que era tido como

feiticeiro.

Vovó, com sua santa paciência, nada dizia. Fechava-se num quarto e só

rezava...

Vovó costurava para os filhos e netos.

Certa vez, ela fazia um vestido e deixou a

tesoura na mesa de costura e foi à cozinha ver as

panelas. Vovô pegou a tesoura e a levou para o

quarto. Ao voltar, vovó deu falta da mesma e foi

atrás dos netos. Ninguém a vira, saímos todos à

procura da tesoura, por todos os lados.

Ao perguntar ao vovô se ele a vira, a resposta foi rápida: - “Vi, claro

que vi, o capeta acabou de pegá-la e correu para o quarto”.

Vovó ficou brava, fez o sinal da Cruz e o mandou procurá-la. Ele

rapidamente agiu. “Eu vou buscá-la e nem que eu tenha de matar aquele

danado, eu trago a tesoura”.

Foi até o quarto, derrubou alguma coisa, gritou com o “capeta”, deu

murro no guarda-roupa e voltou descabelado. Entregou a tesoura e disse:

“Tá vendo? Num falei que era ele?

Dei umas sapatadas nele, o joguei no chão, tomei a tesoura e trouxe

procê”. Vovó ficou muito brava com ele. Rezou o Creio em Deus Pai, mandou-

nos ir brincar e voltou ao trabalho.

Além desta, muitas outras o vovô aprontava com a vovó, com as tias e

conosco. Era um homem bom, alegre e religioso (do jeito dele). Vovó sempre

foi muito religiosa e calma, tinha muita paciência com todos e com tudo. Era

a mãe da paciência.

Page 37: Doces Recordações (2008)

37

Minha Infância

Cleusa Aparecida Costa Gomes

Foi inesquecível! Uma infância perfeita, cheia de criancices,

descobertas, brincadeiras, cada dia uma novidade, tudo perfeito... para se

recordar.

Tinha muita vontade de aprender a nadar nos córregos, então íamos

pescar de peneira para engolir os peixinhos vivos. Eu engoli muito peixe vivo,

mas nunca aprendi a nadar.

Nos finais de semana, ajuntávamos a

criançada, primos, vizinhos e brincávamos o

tempo inteiro. Meu pai fez uma casinha com

fogãozinho e a gente fazia comidinhas, às

vezes de mentirinha, às vezes até de

pedrinhas, comia como se fosse de verdade.

Nossas mães davam os restos do almoço pra gente

colocar nas panelinhas e nos pratos. Os pratos eram

pedaços de louça.

Todos os domingos aconteciam o batizado das bonecas que tinha até

padre. O bom era que a gente considerava a comadre de verdade, fazíamos

festinhas de aniversário das bonecas, as nossas mães também brincavam

porque elas faziam bolinhos, docinhos, etc.

Pulava corda até roxear as pernas e chupava limão com sal escondido,

dentro do carro de boi que ficava sempre parado no barracão. Mamava no

próprio peito da vaca o leite quentinho e andava a cavalo em pêlo, só com

uma corda ou cipó no pescoço, até esfolar as nádegas.

Certa vez Zezinho, Mariza e eu pegamos sarampo. Minha mãe foi nos

dar um laxante (óleo de rícino) que eu não queria tomar. Levei uns bons

tapas e, em seguida, tive que tentar tomar o tal óleo, mas aí eu comecei a

vomitar. Minha mãe, então, vestiu uma meia do meu pai na minha mão, deu-

me a chave da porta para segurar e mandou que eu virasse de uma vez o

vidro do óleo na boca. Resultado: virei e não vomitei.

Um dia uma Companhia de Reis foi almoçar na minha casa, com muita

alegria e vários palhaços. Papai foi pra cozinha ajudar matar os frangos, etc.

Criança naquela época só aparecia quando as visitas iam embora.

Na minha casa trabalhava um rapaz, apelidado

de Fio, que ajudava meu pai na roça e no retiro,

rachava lenha, torrava e moia café, tratava das

criações, etc. O Fio tinha uma bicicleta, que sonho! Eu

morria de vontade de andar de bicicleta. Aí, pensei: - É

Page 38: Doces Recordações (2008)

38

hoje! Enquanto a Folia de Reis almoça eu vou andar de bicicleta, está todo

mundo distraído mesmo...

Peguei a bicicleta, apoiei-a no passeio que descia pro curral, subi na

bicicleta e soltei... Fui bater numa porteira e caí, torci o pé, levantei

arrastando e puxando a bicicleta e fui chorar escondida dentro do carro de

boi até a folia de Reis ir embora. E demorou tanto! Porque eles cantaram...

cantaram de novo...

Quando foram avisar pra minha mãe que eu estava machucada, o pé

já estava inchado e preto, mas se não fosse a intervenção do Fio eu tinha

levado uma surra daquelas. Só sei que mais tarde o Fio trocou de bicicleta e

eu, até hoje, não aprendi a andar de bicicleta.

Ah! No fundo da minha casa morava meu tio Neca, irmão de

minha mãe, e tia Páscoa. Tia Páscoa era uma mulher muito humilde,

simples mesmo, fumava cigarros de palha. Às vezes, ela fazia cigarros

de palha sem fumo pra ensinar a meninada a fumar. A gente

tentava soltar a fumaça pelo nariz, mas quase morria de tanto

tossir. E pras nossas mães não sentir o cheiro ela mandava a gente

soprar três cantos da parede e o cheiro sumia.

Uma das lembranças tristes foi quando meu tio Neca foi ofendido por

uma cobra. Nós, as crianças, estávamos brincando no barracão. Ouvimos uns

gritos, saímos correndo e ainda vimos a cobra pendurada no braço dele!

Depois meu pai começou a raspar no local com uma faca, minha mãe cozinhou

ovo, e colocou os pedaços no local.

O Fio saiu correndo pra chamar o vizinho que tinha carro para levá-lo

à cidade mais próxima, mas nada adiantou, ele faleceu logo depois.

E assim minha infância foi vivida com muita tranqüilidade,

com limites, mas com muita responsabilidade. A criança

obedecia aos pais, tios, avós e tinha o maior respeito pelos

mais velhos.

Adorava ir à cidade pra comer pão com

salame, tomar guaraná, chupar picolé de

groselha até a boca ficar vermelha. E,

como a gente só andava de botina de

goma, quando íamos para a cidade,

calçávamos sandálias e podíamos dormir

com a lâmpada acesa , pois na roça era só

lamparina. Que delícia de vida!

Page 39: Doces Recordações (2008)

39

A Boneca de Louça

Maria Aparecida da Cunha Andrade.

Tinha mais ou menos 5 anos quando, finalmente, ganhei de minha mãe

a boneca de louça que tanto sonhava. Coloquei nela o nome de Belinha.

Tinha vestido cor-de-rosa com bordados e um chapeuzinho na cabeça.

A boneca vinha acompanhada de um carrinho para carregá-la.

Um dia, fui brincar na casa de uma

colega, a Izildinha, e levei a boneca e o

carrinho.

Quando cheguei à casa de minha colega,

ela veio correndo ao meu encontro, tomou de

minhas mãos a boneca com o carrinho e saiu

correndo.

Na correria, a Izildinha

tropeçou e deixou a Belinha cair,

quebrando o chapeuzinho e um

bracinho.

Peguei, então, a Belinha e o carrinho e voltei

correndo e chorando para casa.

Mesmo quebrada, guardei a Belinha por muito

tempo e deste dia em diante não quis outra boneca.

Page 40: Doces Recordações (2008)

40

As Pastorinhas

Maria Rita Alves Grilo.

Quem são? Onde estão?

Nos idos de 1960 e uns, eu fui pastorinha num grupo coordenado por

Dona Elza Barros.

Como era lindo ser pastorinha! Nós cantávamos em

igrejas, casas, fomos até em fazendas sob o

patrocínio do Zote Moraes, na maior paciência, nos

levando e trazendo pelos locais.

Mas afinal, o que é ser Pastorinha?Noel Rosa

descrevia as pastorinhas: “Linda Pastora, morena, da

cor de Madalena” ...

Eu não sei quem era Madalena, porém, imagino

que seria seu amor e uma morena linda, como era

lindo ser pastorinha. Tínhamos um uniforme em

xadrez com avental branco, chapéu de palha

enfeitado. Nossa missão era o que nos tornavam

lindas!

Cantávamos nos dias Natalinos, para homenagear o

recém-nascido Menino Deus. Entrávamos enfileiradas duas a duas. Na

frente, a Estrela Guia entoava um canto-convite para a visita e homenagem

ao Menino Deus.

A seguir, a pastora Briosa prestava sua homenagem, os Reis Magos

faziam suas oferendas, os pastores em número de dois ou quatro também

marcavam sua presença. O grupo finalizava com um cântico de despedida.

Não era lindo?

E o que me impressiona é a falta de interesse dos grupos políticos,

comunitários e até mesmo religiosos, deixando cair no descaso uma

apresentação tão significativa para a cristandade e para a sociedade. As

Pastorinhas não são apenas apresentações folclóricas, com todo o respeito

ao folclore, mas são homenagens que fazem renascer nos corações de

crianças e jovens o amor e carinho devido à vida, à criança recém-nascida e

ao Menino Deus.

Para nós, que temos mais tempo vivido, é uma doce lembrança de uma

era em que se dava valor ao folclore social e ao religioso, em que as

apresentações eram tão bem preparadas pela coordenadora. Temos

esperança de ver o resgate do nosso folclore, seja ele social ou religioso,

dando às novas gerações a oportunidade de entenderem que as nossas

lembranças e saudades existem porque tivemos nossa juventude no bem e na

paz de Deus e das famílias, em sintonia com o Sagrado Universal.

Page 41: Doces Recordações (2008)

41

Sonho de vida

Adelaide da Penha Alves

Existe uma grande diferença entre “sonho de sua vida” e “sonho do

ideal da sua alma”. Minha vida sempre foi abençoada e tive quase tudo de

bandeja, sem precisar me esforçar muito. Casa, comida, segurança e saúde,

remédios, vitaminas, lombrigueiros, dentistas.

Na escola, cadernos encapados, lápis e borracha, uma boa pasta e

lanche todo dia. Minha mãe sempre me ajudou com a lição e por isso sempre

fui bem na escola. Ao terminar a 4ª série, mamãe me colocou no ginásio, em

Passos.

Formei-me para professora e já arrumei trabalho pra lecionar. Fiz o

concurso e passei em primeiro lugar. Fui efetivada e tive estabilidade

profissional. Fui uma boa professora, querida por quase todos e me

aposentei bem.

No amor encontrei um moço lindo, honesto, trabalhador, sonhador e

romântico, como eu. Amamo-nos, namoramos, noivamos e casamos. Tivemos

problemas, mas graças a Deus, estamos juntos. Tivemos três lindos filhos:

Túlio, Lívia e Bianca e até agora, dois netinhos: Gabriel e Maria Clara.

Até hoje, nunca tive que lutar muito para ter o que tenho. Nunca

sonhei muito e sempre aceitei o que a vida me deu.

Nos meus sonhos de criança eu adorava balé e sempre ficava

dançando em casa, na pontinha do pé.

Sonhei várias vezes o mesmo sonho: Numa campina cheia de flores, eu

queria cheirar e beijar a todas, para isso eu começava a

saltar de flor em flor, como se fosse uma bailarina. E a

cada salto eu ia mais alto, mais alto, quase voando. Era

tão lindo que, em certo momento do sonho, eu

realmente conseguia voar. Acordava

emocionada e feliz. Parecia que eu tinha

voado de verdade e aumentava minha

vontade de ser bailarina. Só que não era

uma vontade tão forte assim. Dentro de

mim eu já achava que era impossível e cultivava esse sonho

como apenas um sonho, um sonho bom de sonhar, nada mais.

Page 42: Doces Recordações (2008)

42

Eu também adorava piano. Quando passava perto de uma casa onde alguém

tocava, eu parava e ficava ouvindo. Uma vez ganhei um

xilofone e aprendi sozinha a tocar algumas

musiquinhas como: “Parabéns a você”. Em minha

infância havia em Itaú uma pessoa que ensinava

piano (D. Iracema) e depois na juventude, no

colégio das irmãs (CIC), elas também ensinavam.

Mas eu nunca pedi isso pra mamãe. No fundo eu

sentia que pedir isso seria abusar, porque mamãe já se

sacrificava muito por mim. Só o sonho já me bastava.

Sonhei também em ser Psiquiatra. Outro sonho pelo qual nunca lutei

por julgar impossível. No meu tempo nenhuma moça saia pra estudar fora,

numa faculdade. Eu teria que fazer Medicina e depois, me formar em

psiquiatria, num estudo que só tinha nas grandes capitais. Formar-me como

professora -única opção da região- já era bom demais pra mim. Sempre fui

conformada e tranqüila.

No fundo da minha alma o que eu sempre quis foi ser importante pra

alguém, ser essencial na vida de uma pessoa. O que eu sempre quis foi ser

querida, ser amada. O que eu quero é que as pessoas gostem de mim. Só que

eu nunca soube muito bem conquistar o amor ou a amizade de ninguém.

Sempre tímida, sempre na retaguarda, sempre calada, fechada, insegura.

Mas, aos poucos, estou aprendendo a ser melhor e que, para ser amada é

preciso ser amável e saber amar primeiro.

O que me motiva é a certeza de que se eu fizer apenas o que me dá

vontade, vou isolar-me, dormir demais, comer demais, me exercitar de

menos, ficar deprimida e só esperando a morte chegar, sem nenhuma

qualidade de vida. Esforço-me pra fazer não o que quero, e sim o que é

correto e me fará bem.

Levantar cedo, caminhar, tomar sol, sair de casa, ver pessoas,

conversar, conviver, ter atividade social e religiosa, ter compromissos e

cumpri-los. Fazendo isso me sinto bem, levo uma vida mais saudável e minhas

filhas e meu marido ficam satisfeitos comigo. Peço pra Jesus me dar força a

cada dia.

Onde quero chegar? Em muitas coisas eu já cheguei.

Quero conservar o amor do meu marido pra ficarmos bem velhinhos e

juntinhos, um sempre apoiando e dando apoio pro outro e que só a morte nos

separe.

Quero ser exemplo, apoio e porto seguro pras filhas, genros e netos.

Quero envelhecer devagar, com qualidade de vida, dignidade e vida

própria, sem dar trabalho pros outros.

Page 43: Doces Recordações (2008)

43

Quero morrer com dignidade, lúcida, sem muito sofrimento e

rapidamente.

Quero deixar boas lembranças. Antes de ir quero ter tempo pra

melhorar muito, rezar muito e ser merecedora de um lugarzinho no céu.

Quero cantar o que ainda não cantei, antes que minha voz enfraqueça.

Ir a bailes e dançar antes que minhas pernas enfraqueçam e eu perca

o equilíbrio.

Quero ler ótimos livros e ver bons filmes enquanto meus olhos

conseguirem ver.

Quero fazer ainda algumas boas viagens e passeios, mas não quero

ficar gastando demais.

Quero uma boa poupança para minha velhice segura.

Ainda e sempre, quero ser útil, bondosa, alegre, ajudar a quem

precisar, ter sempre uma palavra boa para todos, ser agradecidas por tudo

e por nada. Não me tornar uma velha chata, rabugenta, implicante e que só

sabe falar de suas doenças.

Quero esquecer do meu egoísmo, amar Jesus que está na figura do

meu próximo, e morrer em paz, com a sensação do dever cumprido. Saber

que combati o bom combate... Amém!

Page 44: Doces Recordações (2008)

44

Mensagem para o Dia das Mães

Você não tem noção do bem que nos faz.

Você é para nós:

Colo que acolhe,

Braço que envolve,

Palavra que conforta,

Silêncio que respeita,

Alegria que contagia,

Olhar que acaricia,

Desejo que sacia,

Amor que promove.

Que o Espírito Santo esteja iluminando-a, para que a sua luz resplandeça em

nós, alunas, a alegria de estar com você às terças e quintas, encontros

produtivos, agradáveis que nos proporcionam bem-estar, alegria, felicidade.

Dão-nos oportunidade de reviver nossas raízes e nossas estórias.

Obrigada Leila, por nos fazer reativar nossa memória, buscando lembranças

que já ficaram esquecidas, apagadas. Você nos deu um sopro de vida.

OBRIGADA, FELIZ DIA DAS MÃES! DE SUAS ALUNAS.

Da aluna: Zulma Terezinha Lara 08-05-08