Do salto alto ao bandeirão. A relação entre as torcedoras mulheres e os clubes de futebol
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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
ESCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTES
DEPARTAMENTO DE RELAÇÕES PÚBLICAS, PUBLICIDADE E TURISMO
Renata Scarellis
DO SALTO ALTO AO BANDEIRÃO A relação entre as torcedoras mulheres e os clubes de futebol
São Paulo
2012
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
ESCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTES
DEPARTAMENTO DE RELAÇÕES PÚBLICAS, PUBLICIDADE E TURISMO
DO SALTO ALTO AO BANDEIRÃO A relação entre as torcedoras mulheres e os clubes de futebol
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Escola de Comunicações e Artes como requisito parcial para a obtenção do titulo de bacharel em Comunicação Social com habilitação em Relações Públicas sob a orientação do Prof. Dr. Leandro Leonardo Batista
São Paulo
2012
BANCA EXAMINADORA
Espaço reservado às observações da Banca Examinadora responsável pela avaliação
deste trabalho, apresentado em _______ de _____________ de 2012, na Escola de
Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo.
Examinador 1
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
Examinador 2
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______________________________________________________________________
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Examinador 3
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______________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar, agradeço àqueles que estiveram comigo ao longo de toda a minha
vida: minha família. Meu pai, por ter me ensinado, entre tantas coisas, o quão bom é se
apaixonar pelo futebol e por ser minha companhia em dias de jogo. Minha mãe, pelo
apoio incondicional em tudo o que eu faço (menos as idas ao estádio), e por sempre
acreditar que „‟tudo vai dar certo‟‟. Meu irmão, por me ajudar a levar o mundo menos a
sério, e por ser meu outro companheiro. Aos três, por me ajudarem com as inúmeras
revisões, impressões, e o que mais precisou para que eu concluísse o trabalho.
Depois, agradeço aos meus amigos ecanos, que entre ECA Jr, times, conversas de
vivência - especialmente as de quinta-feira - intercâmbio, festas, viagens, trabalhos de
faculdade e aulas me ensinaram, inspiraram, e fizeram com que eu conseguisse
entender facilmente o porquê dizem que esses são alguns dos melhores anos das
nossas vidas.
Àqueles que me ajudaram para a realização deste trabalho, me orientando,
emprestando livros, dando dicas, saindo para conversar comigo ou me dando apoio
moral na reta final.
RESUMO
O presente trabalho visa apresentar a relação da mulher com o universo masculino do
futebol do ponto de vista histórico, sociológico e mercadológico, com foco na
espectadora da modalidade. O papel da figura feminina vem se moldando através das
diversas transformações sociais ocorridas ao longo dos séculos, conferindo cada vez
mais liberdade de escolha para a mulher em universos como trabalho, política e lazer,
antes dominados por um rígido núcleo masculino. Percebendo os benefícios sociais e
econômicos que essa democratização pode trazer, somados ao crescente poder de
influência que a figura feminina tem em núcleos familiares, algumas organizações
esportivas já se preocupam em entender como fazer com que a mulher também seja
uma consumidora fiel do esporte. O marketing esportivo, utilizando-se de uma série de
ferramentas, pode entender quais são as suas necessidades e traçar a melhor
estratégia para conquistar e fidelizar essas torcedoras, contribuindo também para que o
mercado do futebol se profissionalize no Brasil como um todo.
Palavras-chave: mulher, torcedora, futebol, marketing esportivo
ABSTRACT
The present study aims to present the connection between women and the male
universe of soccer, from historical, sociological and commercial point of view, focusing
on female fans. Women‟s role in society has been constantly changing, giving them
more and more freedom to make choices in work, politics and leisure, environments
dominated exclusively by men for a long time. Understanding social and economic
benefits of having both genders actively participating on this field, coupled with the
growing influence that the female figure takes into family units, some sports
organizations are already acting to find out how to get women‟s attention. Sports
marketing can help identifying female fan‟s needs, and building up specific strategies to
make them become faithful consumers of soccer.
Keywords: women, fan, soccer, sports marketing
SUMÁRIO
Introdução...............................................................................................................
1. A construção do território masculino do futebol.................................................
1.1 De onde ele vem............................................................................................
1.2. Como ele é recebido no Brasil......................................................................
1.3. O futebol e as suas significações .................................................................
1.4. Quando ele vira sinônimo de violência..........................................................
2. As mulheres entram em campo..........................................................................
2.1. Elas como praticantes...................................................................................
2.2. As praticantes brasileiras..............................................................................
2.3. Elas como profissionais.................................................................................
2.4. Elas como torcedoras....................................................................................
2.5. Legitimação x estereótipos............................................................................
3. O mercado da bola.............................................................................................
3.1. O que é marketing esportivo.........................................................................
3.2. O marketing para promover o esporte...........................................................
3.3. O marketing do esporte a serviço de uma organização................................
3.4. O que elas querem (ou precisam).................................................................
4. Quando o público feminino ganha os holofotes.................................................
4.1. No marketing pelo esporte............................................................................
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81
81
4.2. Nos produtos.................................................................................................
4.3. Nas datas comemorativas.............................................................................
4.4. Na web .........................................................................................................
Considerações Finais.............................................................................................
Referências Bibliográficas......................................................................................
86
90
93
96
98
LISTA DE QUADROS E FIGURAS
Imagem 1 - Homens praticando kemari em festividade no Japão........................... 14
Imagem 2 - Homens jogando calcio fiorentino da piazza di Santa Croce, em Florença,
Itália............................................................................................................................15
Imagem 3 - Torcedores do Liverpool se espremem nas grades para conseguir ver a
partida do seu time contra o Nottingham Forest, em 15 de abril de 1989............. 29
Imagem 4 - Briga entre torcedores do Palmeiras e do São Paulo no estádio, que
terminou com um torcedor são-paulino morto em campo, ocorrida em
1995.......................................................................................................................... 30
Imagem 5 - Mais de 40.000 mulheres e crianças lotam o estádio turco de Sukru
Saracoglu, em setembro de 2011............................................................................ 32
Imagem 6 - Jogadoras iranianas choram após terem jogo cancelado na Jordânia, por
se recusarem a jogar sem o hijab, em fevereiro de 2012...................................... 36
Imagem 7 - Goleira do Araguari Atlético Clube entra em campo para jogar contra o
Fluminense, em 1958.............................................................................................. 41
Imagem 8 - Gandulas mulheres são escaladas para participarem da final dos Estaduais
de 2012.................................................................................................................... 44
Imagem 9 - Senhoritas da alta sociedade acompanham partida no ABC Paulista, na
década de 20........................................................................................................... 46
Imagem 10 - Torcida organizada do Corinthians, com a clara predominância de
homens, sobe para as arquibancadas..................................................................... 50
Imagem 11 e 12 - Torcida Flu Mulher se prepara para ver partida do Fluminense, e
Núcleo de Mulheres Gremistas visita a obra da nova arena do Grêmio............... 54
Imagem 13 - Produtos para o público feminino fã de MMA usar no dia a dia, lançados
em 2012................................................................................................................... 56
Imagem 14 - Jovem torcedor do Manchester City assiste o time no Family Stand,
espaço reservado para as famílias.......................................................................... 65
Imagem 15 - Goleira da seleção americana de futebol, Hope Solo, posa para
campanha realizada pela Nike com foco em mulheres......................................... 72
Imagem 16 e 17 - Desodorizador Febreze, patrocinador da NFL, faz campanha focada
no público ferminino................................................................................................. 73
Imagem 18 - Espaço da Mulher Colorada leva mães para visitarem o Beira-Rio e
comemorar o dia das mães..................................................................................... 84
Imagem 19 – Banheiros reformados no Beira-Rio, estádio do Internacional
(RS)........................................................................................................................ 84
Imagem 20 e 21 - Camisa baby look do Avaí e bijuteria feminina de pele para as
torcedoras................................................................................................................ 87
Imagem 22 e 23 - Agasalhos como o do São Paulo e pijamas como o do Santos são
alguns dos produtos que hoje são oferecidos às mulheres pelos clubes......... 88
Imagem 24 - Vencedoras da promoção „‟Que sentimento é esse?‟‟, lançada pelo Avaí
para o dia internacional das mulheres de 2012, recebem os prêmios............... 91
Imagem 25 e 26 - Ações do Corinthians (SP) nas redes sociais para o dia das mães e
para o dia internacional das mulheres................................................................... 92
Imagem 27 e 28 - Reportagem feita para torcedoras atleticanas (PR) na seção
„‟mulher‟‟ do site oficial............................................................................................. 94
Quadro 1 – 4 P‟s do marketing esportivo................................................................ 60
Quadro 2 - mix de marketing promocional.............................................................. 66
11
INTRODUÇÃO
"[...] É preciso ter o Futebol no sangue, e a gente, neste momento, não dúvida de que qualquer laboratório detectaria a presença do Futebol no sangue de cada brasileiro, numa mistura balanceada com glóbulos brancos e vermelhos [...]". (Mino Carta editorial da Revista Isto É, n° 212 - jan/81)
A dentista Caroline da Rosa Corrêa tem em seu armário sete camisas do
Internacional (RS) e é sócia do clube desde 2003. Já a advogada Viviane Espíndula, de
Uberlândia, viaja a São Paulo sempre que pode para assistir aos jogos do Corinthians
(SP). A cruzeirense Mariana Bremgartner acompanha não só as partidas do seu time,
mas também de todos os outros no Campeonato Brasileiro e ainda algumas partidas de
clubes no exterior.
Os exemplos descritos acima estão cada vez mais presentes nos times de norte
a sul do país. Atleticanas, gremistas, são paulinas, palmeirenses, santistas ou
vascaínas, elas estão por toda a parte. E não só na torcida, mas também trabalhando
para desenvolver o futebol como negócio, apitando as partidas, ou até mesmo
driblando e fazendo gol.
Foi-se o tempo em que o futebol era „‟coisa de homem‟‟. Aliás, se o futebol é
uma representação tão fiel da sociedade, cabe dizer que se foi o tempo no qual a
esfera pública era um espaço dos homens. As mulheres têm ocupado cada vez mais
os espaço que antes eram exclusivamente masculinos, e o futebol é mais um deles.
Não se pode deixar de dizer que tantos anos de restrições deixaram marcas,
que se apoiam em preconceitos ou ideias que insistem em colocar a mulher e o futebol
em campos distantes, mas é também inegável o crescente interesse por parte delas
nesse território.
Ainda que existam muitos pontos em comum quando se fala em torcer e
pertencer, as diferenças também se fazem presentes. Elas aparecem, por exemplo,
nas necessidades de homens e mulheres que escolhem acompanhar um clube, seja
ela referente a produto, a conteúdo informativo, à arena. O que faz uma mulher ir ao
12
estádio ou comprar um produto? Com certeza não são as mesmas coisas que
estimulam os homens a fazê-lo, e nesse ponto entra o profissional de marketing
esportivo, que irá estudar como falar e o que oferecer para que conquistar essa mulher,
que dessa maneira irá não só consumir mais do produto esportivo, mas também
influenciar os seus círculos sociais, a começar pela família.
No Brasil, que se autodenomina „‟o país do futebol‟‟, esse assunto é cada vez
mais recorrente. Reportagens veiculadas na mídia mostram as torcedoras apoiando o
seu time no estádios, comprando produtos licenciados, e se manifestando na web, mas
será que as marcas e os clubes levam isso em consideração na hora de comunicar? É
esse processo que o presente estudo procura entender.
Para isso, a discussão será dividida em quatro etapas. A primeira tarefa será
construir o território masculino do futebol, da sua origem à sua chegada no Brasil,
mostrando como o futebol nasce para suprir necessidades masculinas e quais
representações sociais ele pode assumir, o que ajudaria a explicar a sua popularidade.
Em seguida, fala-se do contexto social feminino, demonstrando como
movimentos sociais e tecnológicos fizeram com que a mulher se aproximasse do
esporte, ainda que essa tenha sido sempre uma relação conturbada, cheia de
proibições e desconfianças. Dá-se uma especial atenção à mulher torcedora dos dias
de hoje, uma principais figuras deste estudo, mostrando quem é ela, a sua trajetória no
futebol, e as barreiras enfrentadas dia após dia no processo de legitimação nesse
território.
No capítulo três, apresenta-se a teoria do marketing esportivo, mostrando como
o profissional pode atuar para potencializar ganhos de organizações esportivas ou
marcas que se associem a ele, quem são as consumidoras esportivas e o que já foi
feito nesse campo no exterior quando se fala de modalidades consideradas
masculinas.
Por fim, no capítulo quatro, encontra-se uma breve análise de iniciativas de
clubes ou marcas brasileiras que invistam para trazer ou fidelizar a torcedora mulher
dentro do universo do futebol, além de opiniões de alguns profissionais do mercado.
13
1. A construção do território masculino do futebol
1.1 De onde ele vem
Para analisar a construção do território do futebol na sociedade e a relação da
mulher com ele, é importante entender primeiramente a sua origem e contexto, pois
esses fatores contribuem para a compreensão de como ele se reflete hoje na
sociedade. São diversas as teorias acerca do tema, pois há muitos séculos o homem
pratica esportes coletivos com a bola que poderiam ter influenciado em maior ou menor
grau o desenvolvimento do futebol moderno.
Pesquisas apontam que atividades muito semelhantes ao futebol tenham sido
praticadas na Ásia, especificamente na China e no Japão. Na China, ela aconteceu na
dinastia Han, no século III a. C. O jogo era chamado tsu-chu (cuju), e consistia
basicamente em lançar uma bola com os pés para uma pequena rede. A atividade
deriva de uma macabra diversão praticada pelos militares, que chutavam as cabeças
de seus inimigos após as batalhas para relaxar, mas posteriormente se transforma em
treinamento militar e é introduzida a bola de couro revestida com cabelo para a sua
prática. O esporte se populariza e se propaga para as cortes reais e camadas sociais
mais altas como divertimento.
O cuju teria influenciado no surgimento do kemari, que começa a ser praticado
no Japão durante o período Heian, no século II a. C. A diferença é que o esporte chega
nesse país com caráter cerimonial, sendo o objetivo do jogo manter a bola no ar,
passando-a entre os jogadores. Era visto como uma espécie de oferenda às divindades
e por isso a elegância e a graciosidade nos movimentos eram consideradas
importantes. Até hoje o kemari é praticado no Japão, com o intuito de preservar o seu
caráter histórico.
14
Na Europa, os primeiros registros vêm da Grécia, de um jogo chamado
episkyros. As partidas eram jogadas por times de 12 a 14 jogadores cada, e era
permitido o uso das mãos e pés. Conta-se que o esporte não se tornou tão popular
entre os gregos quanto as outras modalidades praticadas na mesma época, porém
conquistou os romanos que a invadiram e criaram, a partir dela, o harpastum, um jogo
com caráter violento.
Graças à série de invasões romanas na época, o esporte acabou sendo levado
para outros continentes e regiões da própria Europa. Existem controvérsias com
relação à influência do harpastum nos esportes que surgiriam nesses países, porém
são várias as semelhanças entre as diversas práticas, ainda que cada região tenha
adotado regras distintas.
No norte francês, durante o século XII surge o soule. O termo deriva do latim
solea, que significa „‟calçado‟‟, o que indica um jogo realizado com os pés. A bola era
de couro e em algumas regiões era praticado com as mãos ou mesmo com um bastão.
A disputa acontecia uma vez por ano e tinha caráter ritual, sem delimitação de espaço,
tempo, ou número de jogadores.
Na Itália surge o calcio fiorentino, um dos ancestrais mais conhecidos do futebol,
e que deu o nome à modalidade como é conhecida hoje pelos italianos, o calcio.
Conta-se que a história teve início na cidade de Florença, durante a Idade Média, em
uma batalha entre facções políticas que resolveram medir forças em um jogo de bola,
prosperando depois como esporte.
Imagem 1: homens praticando kemari em festividade do Japão.
15
No calcio fiorentino, duas equipes de 27 jogadores cada se enfrentavam em um
campo de areia e tinham como objetivo arremessar a bola, seja com as mãos ou com
os pés, na rede do adversário, que ficava do lado oposto do campo. Tornou-se uma
modalidade praticada somente pela aristocracia italiana e permitia golpes como socos
e chutes dentro de campo, inclusive com registros de morte de jogadores em
consequência de golpes sofridos durante a partida. Segundo Franco (2007), um
estudioso estimou em quarenta mil o número de espectadores de cada partida.
Atualmente a modalidade é jogada em Florença três vezes ao ano, quando
acontece uma série de comemorações na cidade, com as quatro esquipes da cidade se
enfrentando na Piazza di Santa Croce.
Na Inglaterra, a prática de jogos com bola começa desde 1174, por ocasião da
festa popular de Schrovetide, que comemorava a expulsão dos invasores
dinamarqueses. Assim como na prática chinesa (cuju), a bola era considerada a
representação da cabeça do chefe invasor, mas não se sabe se ela era conduzida com
os mãos ou com os pés. Mais adiante, em 1314, um documento faz referência explícita
a um jogo de bola com os pés que se tornou tão popular a ponto de, em 1365, ser
proibido pelo rei Eduardo III, alegando que ele afastava as pessoas de práticas nobres
e úteis. Mesmo assim, multiplicaram-se as menções ao jogo com os pés, muitas vezes
designado pela palavra football.
Imagem 2: homens jogando calcio fiorentino na Piazza de Santa Croce, em Florença, Itália
16
Embora haja nítidos pontos comuns entre as práticas com bola relatadas acima,
não é possível traçar uma linha de continuidade entre elas. Isso porque ao mesmo
tempo que todas apresentavam semelhanças, também existiam diferenças
significativas, principalmente no que diz respeito ao espírito do jogo (objetivos coletivos
ou individuais, prática com mãos e/ou pés). Para Franco (2007), nenhuma delas
desembocou em algo semelhante ao futebol pois:
„‟[...] jogos com bola são manifestações antropológicas, não específicas de determinado povo e determinada época, enquanto o futebol tal qual como o conhecemos hoje resultou de um conjunto de fatores presentes apenas na Inglaterra do século XIX. (FRANCO, 2007, p.18)‟‟
De maneira geral, reconhece-se que as primeiras formas nitidamente modernas
de futebol são encontradas na Inglaterra entre 1830 e 1850, quando surgem nas
escolas públicas manifestações que mais tarde viriam a se diferenciar entre o rugby e o
football (DUNNING e MAGUIRE, 1997, p.330).
Para entender melhor tal processo, é importante destacar o cenário social e
econômico da época. Nesses anos, as escolas inglesas serviam como agentes de
unificação entre as classes proprietárias de terra já instaladas e a classe burguesa
industrial em ascensão. Os pais consideravam a escola, e principalmente o esporte,
uma maneira de os filhos aprenderem conceitos de virilidade e independência, e o
Império britânico o considerava um poderoso instrumento para, além da atividade
física, transmitir valores como disciplina, trabalho em equipe, elementos que eram
importantes para sua política de manutenção e expansão.
O momento era de mudança de poderes, e os processos de industrialização,
urbanização e aumento do poder do Estado favoreciam a classe burguesa em
detrimento da aristocrática. Isso se refletia no aumento da rivalidade por status entre
antigas escolas aristocráticas como Eton e Harrow, e as novas escolas aristocráticas
como a Rugby, sendo o esporte um reflexo claro disso.
17
Quando os alunos da escola Rugby começaram a ganhar reputação praticando
o que era um protótipo do rugby moderno, os meninos da Eton começaram a adotar
variações que seriam mais semelhantes ao soccer moderno. Nesse processo, além da
rivalidade, via-se a diferença entre ideais de comportamento e violência aceitos na
sociedade da época.
Apesar das tentativas de unificar as duas práticas e fazê-las se disseminarem
como um único esporte nacional, o rugby e o futebol seguiram separados, ambos com
popularidade crescente na sociedade inglesa, e refletindo distintos sentimentos dos
britânicos daquela época.
Enquanto o rugby realçava a virilidade, a força física e a coragem, o football era
uma demonstração de uma virilidade mais contida e civilizada. Como relata o escritor
Gideon Guthrie, entre os anos de 1889/1890:
“Além do valor real de altruísmo, do domínio de si mesmo e do bom humor, o futebol mostra, por exemplo, a necessidade da amabilidade e da lealdade, a superioridade do espírito sobre o corpo, a moderação e a humildade (..) Durante cada partida, esses preceitos morais são apresentados como exemplo para os espectadores que têm também a ocasião de condenar as maneiras e as condutas faltosas, e ousamos crer que esses breves sermões do domingo à tarde não deixam de ter efeitos sobre a reforma da população” (GUTHRIE, apud DUNNING e MAGUIRE, 1997, p.331).
A situação internacional de conflitos do século XIX, porém, ajudou o futebol a se
moldar, pois a necessidade constante de meninos que estivessem prontos para lutar
em guerras influenciava no uso do esporte nos colégios como espaço para ensinar
essas diversas formas de agressividade e masculinidade, enfraquecendo o conceito de
“lazer racional” que ele possuía.
Esse movimento, que englobava também uma política de expansão do Império
Britânico, fez com que o futebol, o rugby, entre outras modalidades praticadas na
Inglaterra se difundissem e chegassem a diversos países como Argentina, Austrália,
África do Sul, Índia, Estados Unidos, e o próprio Brasil, que se apropriaria do futebol e
o tornaria o esporte mais popular do País.
18
Não só o futebol moderno, mas o jogo com bola, no geral, nasce como uma
manifestação masculina. Seja como diversão pós-batalha, treinamento militar,
cerimônia religiosa, decisão de forças ou instrumento de educação, o futebol é
introduzido a esferas que não tem a participação da mulher. Nem mesmo o kemari,
com seu caráter cerimonial, permitia a participação da figura feminina. Nos outros –
cuju, episkyros, harpastum, calcio fiorentino ou mesmo no futebol moderno - ela ficava
ainda mais distante, já que todos os jogos se caracterizavam pela virilidade e
agressividade, ainda que fosse de forma contida, valores distantes da figura feminina.
1.2. Como ele é recebido no Brasil
No Brasil, a chegada do esporte que se tornaria paixão nacional é atribuída à
figura do jovem Charles Miller, graças ao seu empenho para trazer o esporte bretão e
difundi-lo no País. Charles era filho de pai escocês e mãe de origem inglesa. O casal
morava no Brás, onde ele nasceu, e aos nove anos o mandaram para a Inglaterra para
estudar. Lá, Charles aprendeu a jogar futebol pela Bannister Court School, escola
pública de New Hampshire, onde também aprendeu críquete e rugby. No futebol,
atuou como jogador, árbitro e até mesmo dirigente.
No regresso ao Brasil, em 1894, com pouco mais de vinte anos, e apaixonado
pelo esporte, trouxe consigo o material que o ajudaria a desenvolvê-lo no País: dois
uniformes, um par de chuteiras, duas bolas, uma bomba de ar, e um livro de regras.
Os primeiros treinos foram realizados nas várzeas do Carmo. Charles Miller era
sócio do São Paulo Athletic Club, fundado em 1888, e funcionário da São Paulo
Railway Company, o que possibilitou que ele organizasse uma partida no dia 14 de
abril de 1895 entre as duas instituições, a primeira partida oficial de futebol do Brasil.
A partir daí, surgem iniciativas como a fundação, em 1898, da Associação
Atlética Mackenzie College, primeiro time formado exclusivamente por brasileiros, o
Sport Club Internacional, em 1899, que reunia ingleses e brasileiros, e o Sport Club
19
Germânia, com alemães e descendentes. Em 1900, foi fundado o Club Athlético
Paulistano, formado por representantes de famílias tradicionais de São Paulo e, em
1902, a Associação Athlética das Palmeiras, criada por jogadores do segundo time do
Paulistano.
Nota-se, portanto, que todos esses clubes possuíam algumas características em
comum: eram formados por brancos pertencentes às classes nobres de São Paulo. Um
esporte que era associado a ideais de progresso e industrialização, inserido em uma
sociedade com marcas do escravismo e ainda essencialmente agrária.
A visão de que só as elites protagonizaram o processo de desenvolvimento do
futebol, porém, mudou. Conta-se que „‟entre 1880 e 1890, anos antes de Charles Miller
retornar da Inglaterra, jesuítas já haviam introduzido jogos com o ballon anglais’’
(FRANCO, 2007, p.61). Em Itu, no Colégio São Luís, jovens da elite praticavam um
jogo chamado „‟bate bolão‟‟, que a partir de 1894 já possuía alguns elementos do
futebol moderno, como as equipes formadas por onze jogadores, as traves de madeira
e os times uniformizados. Existem também relatos de marinheiros ingleses que
jogaram futebol na praia em seus dias de folga, e até mesmo o registro de uma partida
realizada em 1878.
Segundo Franco (2007), apesar do reconhecimento dos esforços e da paixão de
Charles Miller pelo esporte, e do evidente acesso que a elite teve ao futebol, „‟enxergar
só esse lado da história não permite esclarecer as relações entre a atividade e a
sociedade brasileira, até porque muitas de suas significações estão no processo de
apropriação pelos diversos setores sociais que o difundiram e o transformaram em um
fenômeno‟‟. A criação de times e clubes de futebol pelo país – sobretudo São Paulo e
Rio de Janeiro – obedeceu duas tendências.
A primeira é a formação de equipes pela elite, como já foi falado anteriormente.
O futebol, ali, representava um item da modernidade europeia importante para a elite
brasileira. Os colégios e clubes eram espaços exclusivos dessa camada social, que
detinha os instrumentos necessários para a prática do futebol, como chuteiras e
uniformes, além das técnicas e dos saberes ingleses.
20
Nada disso impediu que surgisse uma segunda tendência: o interesse das
camadas médias e subalternas pelo futebol. Estes jogavam em times improvisados, e
nesse meio o futebol se tornava um modo de representação que era negado em outros
campos sociais. Deste movimento surgem importantes equipes como, por exemplo, o
S. C. Corinthians Paulista, formado em 1910 por um grupo de operários.
Por outro lado, a criação de clubes vinculados a empresas que convocavam
seus operários para jogarem também ajudava a quebrar essas barreiras sociais. Nesse
caso, jogadores começaram a receber gratificações, e os melhores atletas tinham a
oportunidade de se dedicar mais ao futebol e menos à função para a qual tinham sido
contratados no primeiro momento.
Os clubes elitistas e populares organizavam seus campeonatos separadamente,
sendo que o primeiro cobrava um elevado valor pelos ingressos e mensalidades de
seus sócios na tentativa de manter essa segregação. Nesses campeonatos de elite, a
partir de 1920, era possível encontrar inúmeras senhoritas acompanhando as partidas
de futebol, que representavam uma oportunidade para elas também participarem da
vida pública da alta sociedade.
A formação da concepção do futebol no Brasil, então, era dupla. De um lado,
estava a perspectiva europeia, que celebrava os valores de cooperação, solidariedade,
disciplina e coordenação dos movimentos; de outro, a realidade das classes médias e
subalternas, que apreciava a arte de improvisação e malandragem, valores
relacionados à própria condição de vida dessas pessoas.
De lá pra cá, seriam formados órgãos reguladores como a FIFA, realizados
campeonatos regionais, nacionais e internacionais, o futebol malandro e improvisado
se uniria ao futebol estratégico e ao fair play, acabando com a segregação entre
populares e elitistas, e a Seleção Brasileira cresceria no cenário internacional.
Se internamente o futebol já mostrava a sua força como elemento de construção
da identidade brasileira, externamente esse cenário não poderia mudar. A seleção
brasileira tornou-se um meio de os brasileiros mostrarem a sua força para o exterior,
21
um campo no qual o País lutava de igual para igual, se não de maneira superior, com
os países mais modernos do mundo:
„‟[...] é principalmente na segunda metade do século XX, que o futebol irá se consolidar como esporte de preferência nacional na sociedade brasileira. O inédito vice-campeonato mundial de 1950, conquistado em território nacional, as vitórias nas Copas de 1958, 1962 e 1970, conferem ao futebol brasileiro o status de melhor do mundo. Essas conquistas desencadearam uma série de transformações nunca experimentadas no meio futebolístico nacional. Surge uma crescente busca pelo esporte e a necessidade em acompanhar os seus principais acontecimentos. Neste contexto, a mídia irá desempenhar um importante papel na divulgação, popularização e massificação do futebol (BOSCHILIA e MEURER, 2003, p.2).‟‟
O futebol também se tornaria mais do que uma ferramenta de expressão, uma
atividade de lazer, um meio de educar ou uma arma política, ele se tornaria um
verdadeiro mercado, movimentando bilhões de dólares por ano, transformando-se em
uma valiosa ferramenta de comunicação, seja para os clubes, seja para as marcas que
se relacionam com ele.
Outros esportes como Fórmula 1, vôlei, MMA1, estão ganhando cada vez mais
espaço na mídia e conquistando novos fãs, mas o futebol se consagrou como o esporte
de preferência nacional, já que 90% dos brasileiros declaram atualmente torcer por
algum time de futebol, e 44% deles são considerados „‟apaixonados‟‟2. O fato de o
futebol ser popular e ter alto índice de aceitação no País não significa, porém, que ele
sempre foi democrático. Desse grupo de torcedores, 68% são homens, e 32%
mulheres3, o que mostra que ele se consagrou como um esporte masculino também no
Brasil, ainda que essa situação esteja em processo de mudança (capítulo 2).
Justamente por refletir pontos tão importantes da sociedade e de identidades, e
pelo seu alto poder de atração e consumo, é que o futebol se torna um campo tão
explorado por sociólogos, antropólogos, psicólogos, linguistas e diversos profissionais
1 Sigla usada para se referir a artes marciais mistas
2 Classificação Nielsen. NIELSEN SPORTS, 2011. Disponível em: http://br.nielsen.com/news/nielsen_sports.shtml .
Acesso em: abril 2012 3 Idem
22
de mercado, o que permite a compreensão de sua rede de significados de maneira
mais aprofundada.
1.3. O futebol e suas significações
A industrialização e o surgimento de novas classes já permitiu a compreensão
de como nasce o conceito moderno do futebol (item 1.1). Para entender como ele se
transforma na representação de um rígido núcleo masculino, mais uma vez recorre-se
a fatores históricos e sociais, agora com foco nas sociedades democráticas.
Para Franco (2007), o sucesso da democracia, ao mesmo tempo que trouxe
inegáveis benefícios a setores antes excluídos da tomada de decisões, provocou
também „‟a perda de identidades grupais que tinham sido essenciais nos séculos
anteriores‟‟. A consciência de pertencer a uma determinada comunidade se dilui, pois o
conceito de cidadania, por si só, prevê um certo tipo de homogeneização.
Os novos recortes que surgiram eram muito maleáveis, facilmente mutáveis -
partidos políticos, grupos religiosos – e não satisfaziam essa necessidade de
pertencimento. É nessa brecha que o futebol encontra espaço para crescer,
transformando-se em metáforas desses núcleos do mundo contemporâneo, sejam eles
sociológicos, linguísticos, religiosos, psicológicos e antropológicos.
A característica sociológica foi a mais citada até o presente momento, visto que
é antigo o uso do futebol como ferramenta política de legitimação. Na segunda metade
do século XIX, tornou-se comum usá-lo para manifestar o nacionalismo,
independentemente do tipo de regime que o fazia. Quem não se lembra da famosa
campanha feita pelo governo militar brasileiro em 1970? A vitoriosa seleção brasileira
contava com craques como Jairzinho, Pelé, Tostão e Rivellino, criando o momento
perfeito para mostrar o poder do País e exaltar o sentimento nacionalista, que ficou
marcado através da „‟hipnótica‟‟ canção „‟Pra Frente Brasil‟‟ („‟de repente é aquela
23
corrente pra frente/ parece que todo o Brasil deu a mão / todos ligados na mesma
emoção‟‟).
O segundo ponto é o aspecto religioso do futebol. O fato de o clube ser algo
difícil de definir, maior que seus dirigentes, jogadores e torcedores, faz com que esse
caráter religioso se intensifique. Também não é rara a divinização dos elementos que o
compõe, que seriam imagens palpáveis dessa abstração. É o caso dos atletas, que são
tratados como verdadeiros deuses pela imprensa e pelos torcedores, status que é
muito utilizado pelas marcas que atrelam o seu produto aos jogadores. Sobre o tema,
Da Matta (1982) destaca:
„‟No Brasil, o esporte é vivido como um jogo. É uma atividade que requer táticas, força, determinação psicológica e física, habilidade técnica, mas também depende das forças incontroláveis da sorte e do destino. Não deve, portanto, ser por acaso, que em certos países, o futebol está associado a um sistema nacional de loteria. No caso brasileiro, chamada a “loteria esportiva”, inteiramente relacionada ao futebol, permite atualizar todo um conjunto de valores associados ao sistema brasileiro da sorte e do azar, inclusive com o apelo mágico às entidades sobrenaturais das chamadas religiões Afro-Brasileiras (como a Umbanda) e do Catolicismo popular. (DAMATTA, 1982, p.30)‟‟
Tal caráter fica ainda mais evidente quando se analisa junto a metáfora
linguística no futebol. Os jogadores viram „‟ídolos‟‟, a camisa do time „‟manto sagrado‟‟,
os gols ilógicos são „‟espíritas‟‟, as defesas difíceis „‟milagrosas‟‟, e assim por diante. E
não é só a religiosidade que se manifesta através da linguagem. A terminologia bélica
também está presente, quando as partidas são chamadas de „‟batalhas‟‟ ou os
jogadores de „‟guerreiros‟‟.
Para expandir a análise linguística, não se pode deixar de citar que esse é mais
um campo onde fica clara a apropriação do futebol como território exclusivo do gênero
masculino. Termos como „‟entrar de salto‟‟, „‟jogar como mulherzinha‟‟, „‟jogar igual a
uma moça‟‟, entre outros que ficaram no imaginário coletivo e contribuem para que a
mulher e o futebol sejam vistos como elementos opostos.
24
As construções das metáforas psicológicas e antropológicas ajudam a reforçar
esse imaginário masculino. Vale observar que muitos desses aspectos podem ser
incorporados também do cotidiano feminino – como no caso de termos religiosos -
mas aqui se pretende analisar como estes foram incorporados pela classe dominante
masculina da época, e as metáforas sexistas tornam a análise ainda mais clara.
O futebol recupera tanto o sentimento referente ao grupo, quanto a identidade
do homem, ajudando-o a reconstruir valores identitários presentes na época de clãs e
tribos. Sobre isso, Arthur Brittan (1989), em Masculinity and Power, faz a seguinte
observação:
„‟A imagem mais popular da masculinidade na consciência de todos os dias é aquela do homem-herói, do caçador, do competidor, do conquistador. (..) Em certo sentido, a crença no homem-caçador ou no herói não parece ter nenhum fundamento no mundo quotidiano onde vivem a maioria dos homens. Os homens têm pouquíssimas ocasiões de serem heróis, a não ser como passatempo ou nos esportes. O homem-caçador foi transformado em o „homem-sustentáculo‟ da família. As chances de heroísmo surgem apenas no campo do esporte, e não na floresta durante uma perseguição sem tréguas para alimentar a tribo. (BRITTAIN apud DUNNING e MAGUIRE, 1997, p.332)‟‟
Para o antropólogo Desmond Morris (apud FRANCO 2007, p.212), de fato, o
futebol se assemelharia ao mundo tribal, pois ambos suscitam sentimentos fortes e
duradouros, e possuem códigos que se mostram através de pinturas corporais, cantos
e gritos.
Já Franco (2007), prefere usar a definição de clã, pelo fato de seus torcedores
não estarem necessariamente convivendo no mesmo território como aconteceria em
uma tribo, mas espalhados. A base é territorial, mas mesmo quando ele muda de
espaço, se reconhece através de brasão, nome e totem. O sentimento de torcer
transcende esse indivíduo. Para ele:
„‟O clã é um grupo que acredita descender de um ancestral comum, mais mítico que histórico, contudo vivo na memória coletiva. Ainda que todo clube de futebol tenha origem concreta e mais ou menos bem documentada, com o tempo ela tende a ganhar ares de lenda, que prevalece no conhecimento do
25
torcedor comum sobre dados históricos. É nessa lenda, enriquecida por feitos esportivos igualmente transformados em lenda, que os membros do clã orgulhosamente se reconhecem‟‟
Qualquer que seja o aspecto observado, o fato é que se os valores masculinos
grupais ou individuais encontraram um refúgio tão valioso no futebol, era natural que
fosse igualmente grande o temor de que esse núcleo também fosse atingido pelas
transformações sociais. A partir desse ponto, começa-se a entender melhor um dos
principais motivos da resistência masculina à entrada das mulheres no futebol.
Durante as primeiras duas décadas do século XX, com a ocorrência de
processos como o fechamento das fronteiras, a transformação dos locais de trabalho, e
a mudança das relações familiares, os homens começaram a recear que estivesse
ocorrendo uma „‟feminização‟‟ da sociedade, buscando núcleos que preservassem essa
masculinidade. Outra iniciativa nítida, além do futebol, foi o escotismo4, movimento
criado por Robert Baden Powell, que ensinava jovens rapazes a desenvolverem
cidadania e a serem úteis e responsáveis.
Certo que os valores sociais e a divisão sexual do trabalho não deixariam de se
basear em uma sociedade que Dunning e Maguire (1997) classificam como andriarcal5
mas, pouco a pouco, os papéis sociais sofriam mudanças que, de certa maneira,
perturbavam a rígida ordem social masculina.
Essa „‟feminização‟‟ se dá, na realidade, por diversos aspectos que dizem
respeito às outras ressignificações provenientes das mudanças sociais ocorridas na
época. Um fator muito importante é o „‟cerceamento das normas de regulação da
violência e da agressão, do declínio, na maioria dos indivíduos, de sua tendência a
sentir prazer em participar de atos violentos ou de testemunhar esses atos‟‟ (DUNNING
e MAGUIRE, 1997, p.320). Trata-se literalmente, do enfraquecimento da „‟pulsão por
4 Na época, as meninas também se interessaram pela atividade, e Baden Powell confiou a Agnes, sua irmã, a
criação do Bandeirantismo, escrevendo um livro que ensinava como as moças poderiam contribuir para a construção do Império. O movimento não era bem visto por todos, razão pela qual ele ganha um nome diferente do escotismo. 5 Palavra de raízes gregas que significa ‘’dominação do macho’’, em vez de sociedade patriarcal, que significa,
literalmente, a dominação do pai (ELIAS apud DUNNING E MAGUIRE, 1997, p.323)
26
atacar‟‟, e do surgimento de sentimentos como vergonha e a marginalização daqueles
que fogem às novas regras. Com a presença de leis e normas mais severas que
condenavam manifestações de violência, mudam os comportamentos em sociedade, e
o futebol se torna, então, um dos espaços onde demonstrações de violência continuam
sendo aceitas, mas sob regras pré-definidas.
1.4. Quando ele vira sinônimo de violência
Ainda que a violência seja vista como uma característica fundamentalmente
masculina, já que ela é muitas vezes associada à virilidade, segundo Morgan e
Summers (2008), essa exacerbação emocional promovida pelo esporte satisfaz uma
necessidade de ambos os gêneros:
„‟O consumo esportivo pode oferecer uma válvula de escape para o exercício dos instintos combativos e agressivos, permitindo a canalização e liberação de comportamentos que, de outra forma, seriam socialmente inaceitáveis (urrar, gritar com autoridades – no caso, o árbitro). O interessante é que essa válvula de escape para a agressão é apreciada tanto por homens quanto por mulheres, e o esporte apresenta um mecanismo socialmente aceitável para esse comportamento‟‟. (MORGAN e SUMMERS, 2008, p.19)
Se o futebol é justamente um meio de canalizar a „‟pulsão por atacar‟‟
anteriormente citada por Dunning e Maguire (1997), e se ele atende às necessidades
de ambos os sexos, onde está o problema? Está no fato que essa „‟guerra simbólica‟‟
muitas vezes é construída como um campo masculino, e que ela extrapola os limites do
jogo, levando a uma violência real entre torcedores ou mesmo ente jogadores dentro
de campo. Esse tipo de violência, em vez de válvula de escape, é um dos maiores
vilões das torcedoras mulheres no futebol, como será visto mais adiante.
Os motivos que levam a esse resultado são vários, estão na linguagem, na
estrutura das arenas, no campo psicológico, no tratamento dado pela mídia e no
próprio comportamento de jogadores, técnicos ou dirigentes.
27
A linguagem bélica já foi citada (item 1.3.), e ao termos anteriores somam-se
expressões como „‟matar a bola‟‟, „‟matar o jogo‟‟, a referência ao jogador como
„‟guerreiro‟‟, „‟matador‟‟, a designação de „‟capitão‟‟ àquele que é escolhido para
representar o time junto ao árbitro; todos termos usados tanto pelos torcedores quanto
pela imprensa formadora de opinião. Fica claro que, „‟de tempos em tempos, o jogo
apresenta ambientação de claro sentido militar‟‟ (FRANCO. 2007, p.236).
As torcidas organizadas também fazem uso dessas expressões militares para se
autodenominar, como é o caso das Brigatte Rossonere (Milan), Dragões da Real (São
Paulo), Máfia Azul (Cruzeiro), e Red Army (Manchester United), entre outras. Nos
„‟gritos de guerra‟‟ encontram-se ainda mais formas de violência, quando se fala de
maneira explícita sobre ataques, mortes, brigas e batalhas, muitas vezes direcionados
diretamente às torcidas rivais.
Já figura do técnico ganha o aspecto da figura de um comandante quando, a
partir de 1922, difundiu-se o uso do banco na lateral do campo, de onde o profissional
podia orientar os jogadores e fazer mudanças na estratégia de jogo. Alguns técnicos
fizeram, inclusive, uso dessa característica, como o técnico Rubens Minelli, que disse
„‟sou fascinado pelas batalhas da Segunda Guerra Mundial. (..) Faz parte da estratégia
explorar os pontos vulneráveis do adversário e fortalecer as fragilidades que você
tem‟‟6.
Mesmo a estratégia empregada no futebol, com os conceitos de atacar e
defender, a ocupação de espaços, lembra aquela que é também usada para uma
batalha. Além desse caráter bélico que o futebol carrega, seja pela linguagem, seja
pela sua própria essência, por vezes clânica, por vezes nacionalista, existem outros
motivos que fazem com que o futebol seja um meio através do qual muitos grupos
manifestam a sua violência.
É inegável, por exemplo, que os problemas sociais, tanto de Primeiro Mundo,
quanto de Terceiro Mundo estimulem essa violência, que é extravasada também por
outros canais. Franco (2007) observa que, nos países de Terceiro Mundo, por exemplo,
6 Entrevista publicada pela Revista Placar em 15/04/1988. Citado por FRANCO, 2007, p.192
28
ela se mostra através dos elevados índices de delinquência. Das sociedades mais
autoritárias às sociedades mais democráticas, todas experimentam o mesmo fenômeno
da violência. Um bom exemplo é o drama de Heysel7, que chocou toda a Europa, e
teve apontado como principal vilão o desemprego decorrente na Inglaterra no governo
de Margaret Tatcher. Tais acontecimentos se resumiriam, então, a expectativas e
frustrações vindas à tona por meio do futebol. Dunning e Maguire (1997) concluem que:
„‟É evidente que o problema deve ser tratado fora dos estádios. É um problema social simples e terrivelmente complexo: é preciso dar aos hooligans perspectivas tão excitantes quanto uma boa briga, porém socialmente aceitas. Caso se limite a expulsá-los do futebol, sua violência procurará sem dúvida se exprimir em outro lugar. Talvez de forma pior..‟‟
Para alguns estudiosos, a violência do torcedor é uma resposta às condições
concretas com que o tratam. Não por acaso, de acordo com essa linha de pensamento,
o hooliganismo surgiu na Inglaterra, que tinha os estádios mais antiquados da Europa.
Segundo Franco (2007), uma evidência foi a diminuição dos episódios de violência
quando as grades que separavam as arquibancadas do campo de jogo foram retiradas
dos estádios ingleses. Isso fez com que diminuísse a sensação de isolamento, de que
a grade era necessária pelo perigo que os hooligans representavam, o que servia como
um estímulo para a violência que era esperada deles.
7 Ocorrida em 1985, no estádio de Heysel, na Bélgica, quando hooligans do Liverpool atacaram torcedores italianos
da Juventus, deixando 38 mortos e inúmeros feridos (FRANCO, 2007, p.192)
29
Alguns clubes ingleses como o Liverpool Football Club foram ainda mais longe e
se engajaram com as comunidades com a intenção de diminuir direta ou indiretamente
a criminalidade como um todo, afastando a imagem do futebol do vandalismo e da
violência. O Liverpool estabeleceu um desenvolvimento comunitário e um programa de
relações públicas, como parte de um projeto adotado por seis clubes da modalidade no
final dos anos 80 (MORGAN e SUMMERS, 2008, p.81). Ídolos dos gramados
participavam de encontros para promover campanhas antidrogas e antifumo;
estudantes que tivessem melhorado sua frequência nas aulas ganhavam adesivo e
certificado do clube, a alguns eram convidados a ir ao clube para uma apresentação.
No Brasil, os episódios de violência parecem estar, no geral, intimamente
ligados às torcidas organizadas. E não só por indivíduos que tenham antecedentes
criminais, mas também com a participação de uma parcela significativa de cidadãos
comuns. Dentro desses grupos existe uma ordem, com hierarquia, e sentimento de
solidariedade aos companheiros. De acordo com um estudo recente, publicado pela
Universidade de São Paulo8, foram registradas 133 mortes de torcedores no Brasil nos
8Reportagem Site Portal de Notícias R7, maio 2012 Disponível em: http://videos.r7.com/violencia-entre-torcidas-causa-seis-mortes-por-ano-no-brasil/idmedia/4fba988ee4b076d29bdfc28f.html Acesso em: maio 2012
Imagem 3: torcedores do Liverpool se espremem nas grades para conseguir ver a partida do seu time contra o Nottingham Forest, em 15 de abril de 1989
30
últimos 20 anos, sendo que só em 2011 foram 20 registros de assassinatos
comprovados dentro do universo das torcidas. As vítimas geralmente são homens
jovens, com uma média de 23 anos, e muitas dessas brigas são anunciadas nas redes
sociais, para que os participantes cheguem ao local preparados para a luta.
Uma das maneiras de combater essa violência de dentro dos estádios foi o veto
às bandeiras com mastros e à venda de bebidas alcoólicas, vidros e latas9, elementos
que podem contribuir para manifestações violentas e que podem ser usados como
armas no caso de brigas, como aconteceu na década de 90 em jogos entre paulistas.
Outro aspecto analisado para elucidar o fenômeno é a perda do efeito
tranquilizante do grupo, dos ritos sociais e do mito nas sociedades ocidentais
contemporâneas. A falta de pertencimento leva à angústia, e ao mesmo tempo que a
busca por coisas mais restritas e concretas (que muitas vezes resultam em grupos
9 GARCIA, Natalia. Alckmin explica veto à volta das bandeiras com mastros aos estádios de SP. In: Site Estadão, outubro de 2011. Disponível em: http://www.estadao.com.br/noticias/esportes,alckmin-explica-veto-a-volta-das-bandeiras-com-mastro-aos-estadios-de-sp,784888,0.htm Acesso em: maio 2012
Imagem 4: briga entre torcedores do Palmeiras e do São Paulo no estádio, que terminou com um torcedor são-paulino morto em campo, ocorrida em 1995
31
extremistas) ajuda a recuperar esse sentimento, também pode levar o indivíduo a
praticar exageros em nome dela.
O psicólogo francês Gustave Le Bon (apud FRANCO 2007, p.330) ainda fala
sobre a energia psíquica despendida na tarefa de torcer para um time. Esse fenômeno
é chamado de contágio, e pode ocorrer tanto de forma horizontal (entre torcedores),
quanto de forma vertical (entre torcedores e jogadores). Ambas iniciam a reação em
cadeia que desperta uma agressividade inerente ao ser humano, manifestada através
do futebol. Manifestações como cantos, vaias, ofensas e aplausos surgem em vários
locais do estádio, e passam a ser seguidas ou contestadas pelos outros torcedores.
O efeito da multidão se torna perigoso, pois, nessa alma coletiva, o conceito de
individualidade se dilui e ações por impulso prevalecem. Ao se sentirem protegidos
pela imensa multidão, cresce também o conceito de impunidade, o que permite que
essa violência inerente seja externalizada pelos torcedores.
Ainda que, como foi dito no início deste item, o instinto combativo e agressivo do
esporte seja apreciado por homens e mulheres, todas essas formas de manifestações
violentas que extrapolam a atividade esportiva em si são atribuídas quase que
exclusivamente ao gênero masculino.
A figura feminina no esporte – sobretudo como espectadora – é colocada no
campo oposto da violência, sendo vista como um elemento que contribui para a paz
nas arenas. Uma prova disso foi a ação inédita adotada pelo clube de futebol turco,
Fenerbahçe, em setembro de 2011. Depois de uma invasão de campo ocorrida durante
um amistoso com o rival Shaktar Donetsk, o clube recebeu como punição da
Federação do país excluir homens da torcida na partida contra a equipe do
Manisaspor, pelo campeonato turco, com o objetivo de acabar com a violência. A
solução encontrada pelo clube foi distribuir mais de 40 mil ingressos para mulheres e
crianças menores de 12 anos, que lotaram o estádio Sukru Saracoglu. O resultado
32
repercutiu em todo o mundo e a Federação de Futebol Turca explicou que o objetivo da
decisão era „‟recordar aos torcedores a beleza e os valores do futebol‟‟10.
A ação fez tanto sucesso que o clube holandês Ajax, solicitou à Federação
Holandesa de Futebol (KNVB), que considerasse a possibilidade de tal medida ser
adotada na Amsterdam Arena, após receber punição por um torcedor ter invadido o
gramado e agredido o goleiro do time visitante.
Por último, é curioso perceber que essa externalização da violência independe
da vitória ou da derrota. Franco (2007) afirma que „‟a embriaguez da vitória provoca a
sensação de poderio e erosão das normas morais e sociais‟‟; como pode ser
observado, por exemplo, pelas depredações promovidas pelos torcedores são-paulinos
na avenida Paulista depois da conquista do tricampeonato da Copa Libertadores da
América, em julho de 2005.
Justamente pelo fato de a violência se manifestar por motivos distintos no
futebol que ela exige uma atenção especial das organizações esportivas. Uma das
saídas discutidas frequentemente por profissionais que trabalham com a modalidade é
10
REUTERS. Entrada para homens é proibida em partida do Fenerbahçe. In: Site Esporte Terra, setembro de 2011. Disponível em: http://esportes.terra.com.br/futebol/europeu/2012/noticias/0,,OI5361771-EI18001,00-Entrada+de+homens+e+proibida+em+partida+do+Fenerbahce.html Acesso em: maio 2012
Imagem 5: mais de 40.000 mulheres e crianças lotam o estádio turco de Sukru Saracoglu, em setembro de 2011.
33
trazer a figura feminina para o espetáculo, que ajuda a transformar o futebol em um
programa democrático e familiar, uma vez que com a mulher aumenta também a
participação de crianças e jovens, coibindo manifestações violentas.
34
2. As mulheres entram em campo
2.1. Elas como praticantes
Nas últimas décadas, tem-se observado o aumento da participação da mulher
em diversos territórios que eram antes considerados masculinos, como a política, o
trabalho, e o espaço esportivo.
Para iniciar a discussão especificamente sobre a inserção da mulher neste
último espaço e a sua relação especificamente com o futebol, parte-se do pressuposto
de que todas as frentes de atuação no esporte estão interligadas, no sentido de que
elas fortalecem a imagem feminina dentro desse universo como um todo. Isso porque a
mulher entra no território do esporte de diversas maneiras: como praticante diletante ou
atleta profissional, torcedora e profissional de gestão, de comunicação, ou como
árbitra, gandula, bandeirinha e técnica.
Imagina-se, por exemplo, que ao ver a presença de mulheres repórteres dentro
de campo ou mesmo liderando mesas redondas, as torcedoras potenciais se sintam
mais à vontade para ingressar nesse espaço, ou que o fato de ver tantas torcedoras
abrindo espaço no esporte, estimule-as não só a torcer, mas também a trabalhar com
futebol, e assim por diante. Quando se fala da história da mulher dentro do esporte e
do futebol, portanto, é necessário cruzar esses diversos momentos e espaços nos
quais ela aparece e tenta legitimar a sua presença. A isso, somam-se as constantes
mudanças no papel da mulher e do homem na sociedade, que reconfiguraram a
participação dos dois sexos em diversos territórios.
Dunning e Maguire (1997) ressaltam que a maioria das mulheres sempre tendeu
a aceitar a „‟definição hegemônica do esporte‟‟, vendo-o como uma área reservada
masculina, mas que um conjunto de mudanças sociais na época contribuiu para que
essa situação mudasse:
35
„‟ [...] em contrapartida, o deslocamento da balança de poder entre os sexos, se bem que longe de ser significativo, prosseguiu depois do impulso inicial dados pelas sufragettes
11, ao mesmo tempo que todo um conjunto de processos,
voluntários ou não, e foi nitidamente suficiente para que os homens não conseguissem impedir as mulheres de entrar em grande número na sua fortaleza masculina. (DUNNING e MAGUIRE, 1997, p.341)‟‟
Além de acontecimentos políticos, uma série de fatores ligados à modernização
também contribuiu para que as mulheres pudessem iniciar a prática esportiva. Um
advento importante foi o movimento pelo vestuário racional, iniciado na Europa em
1880 com defensores como Oscar Wilde e com registros em 1918 no Brasil; o
movimento propunha uma discussão sobre a apropriação das peças de roupa para
homens e mulheres, que na época usavam ternos ou espartilhos pouco confortáveis. O
uso de roupas mais cômodas para a prática esportiva foi uma das inovações trazidas
pelo movimento, sobretudo com o surgimento do vestido bifurcado para as moças
ciclistas, chamados bloomers12. Com o uso de roupas menos restritivas, a mulher pôde
ter uma liberdade maior e se envolver mais com atividades esportivas.
Vale lembrar que em algumas sociedades as restrições no vestuário para a
mulher ainda existem, até mesmo na prática esportiva, pois as leis prevalecem sobre a
tecnologia e o conforto. É o caso do Irã, país no qual as mulheres são obrigadas a
praticar esportes cobrindo o corpo com uniformes de mangas longas, meias altas, e
usando o hijab, véu que cobre o cabelo, o pescoço e as orelhas.
No ano de 2011, o véu islâmico chegou a ser proibido pela FIFA, alegando falta
de segurança (caso ele fosse puxado, poderia machucar alguma jogadora), e as
iranianas não puderam participar da partida contra a Jôrdania para a qualificação das
Olimpíadas de 201213.
11
Militantes que reclamavam o direito de votar para as mulheres (DUNNING e MAGUIRE 1997, p.341) 12
ALVES, Letícia de Almeida. Os termos da moda. In: Site UOL. Revista Leituras da História. Disponível em: http://leiturasdahistoria.uol.com.br/ESLH/Edicoes/5/artigo72303-5.asp Acesso em: abril 2012 13
Globo Esporte, junho de 2011. Disponível em: http://globoesporte.globo.com/futebol/futebol-internacional/noticia/2011/06/selecao-feminina-do-ira-e-impedida-de-jogar-por-usar-veus-islamicos.html Acesso em: abril 2012
36
Além do vestuário, segundo Dunning e Maguire (1997), outros fatores
importantes para ampliar a participação da mulher no esporte foram o surgimento de
tampões, métodos para controlar a gravidez, mamadeira (para encurtar o período de
amamentação), progressos domésticos que derrubaram barreiras como menstruação,
gravidez e amamentação, que antes definiam „‟o papel da mulher como procriadora‟‟.
Acredita-se que o primeiro envolvimento das mulheres com o futebol tenha sido
no século XII, quando as mulheres francesas começaram a participar do „‟Futebol do
povo‟‟14. A primeira equipe feminina oficial de futebol no mundo surge, porém, na
Inglaterra, em 1894, quando nasce o Net Rolibol. Pouco mais de uma década depois,
em 1910, já existiam equipes femininas francesas como o Rouge Esportive e Feminine
Esporte, ambas criadas em Paris.
De acordo com Franco (2007), o que fez com que o futebol feminino
deslanchasse foi a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), quando milhares de homens
foram lutar nas trincheiras. Porém, ainda segundo o autor, „‟o futebol não conseguiria
lutar contra o progressivo restabelecimento da ordem‟‟ e, pouco tempo depois, em
1921, a Federação Inglesa de Futebol proibiu a prática de futebol por parte das
mulheres em seus campos, publicando uma clara resolução a respeito do assunto, na
qual diziam que „‟O Conselho se vê na obrigação de afirmar que o futebol não é jogo
14
EÇA, João. História do futebol feminino no mundo, julho de 2009. In: Site Baianíssimo. Disponível em: http://www.baianissimo.com.br/sites/mulheresemcampo/noticia.aspx?nid=58 Acesso em: abril 2012
Imagem 6: jogadoras iranianas choram após terem jogo cancelado na Jordânia, por se recusarem a jogar sem o hijab, em 2011
37
para mulheres (..) e convida os clubes membros da Football Association a não ceder
seus campos para partidas femininas‟‟.
A Federação Francesa, anos depois, adotou a mesma postura que os ingleses.
As mulheres ainda podiam ser vistas jogando algumas partidas com a intenção de
conquistarem fundos para caridade, pois isso atraía o público, mas com tantas
restrições, o futebol feminino entraria em declínio, e a retomada só aconteceria anos
depois.
As federações ainda contavam com amplo apoio popular e o preconceito dos
homens e até mesmo de outras mulheres impunham uma série de restrições para a
prática feminina de esporte. Naquela época, as atividades físicas consideradas
adequadas para as mulheres eram somente aquelas que não iam contra a sua
natureza frágil e delicada, e que tinham como princípio básico a manutenção da saúde
e a prevenção de doenças do aparelho reprodutivo, como também o embelezamento
do corpo feminino (GOELLNER apud CAMPOS, 2010, p.24).
Modalidades como futebol, boxe e rugby, então, não poderiam fazer desse
grupo de modalidades permitidas às mulheres, já que, nelas, os chamados „‟desportos
de confronto‟‟ (DUNNING apud CAMPOS 2010, p.7), a agressão e a violência eram o
elemento central, ainda que não de forma explícita (item 1.2).
Para aquelas que ainda assim ousavam enfrentar essa barreira e se aventurar
nos esportes destinados exclusivamente aos homens, restavam às duras críticas,
vindas de homens e mulheres, muitas vezes divulgadas e apoiadas pela imprensa.
Foi após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) que o futebol feminino voltou
a se fortalecer, ainda que não tivesse encontrando apoio social. Em 1951, a FIFA se
recusou a cuidar dele, alegando que essa era „‟uma questão de biologia e de educação
que deve ser deixada a médicos e professores‟‟. (FRANCO, 2007, p.203) E foi somente
duas décadas mais tarde, no início de 1970, que as federações da Alemanha
Ocidental, Inglaterra e França suspenderam o veto à prática do futebol feminino. Em
1971 ainda foi realizada uma Copa de Futebol Feminino (não reconhecida pela FIFA)
no México, vencida por 3x0 pela seleção dinamarquesa, que disputou a final contra o
38
time mexicano, com a presença de 100 mil espectadores15. A FIFA ainda demorou
mais de uma década e, em 1988, finalmente aceitou organizar um torneio internacional
feminino na China, o mesmo país que, três anos mais tarde, em 1991, iria sediar a
primeira Copa do Mundo feminina.
Atualmente, a FIFA tem como uma de suas missões o desenvolvimento não só
do futebol feminino, mas também de aumentar a participação da mulher no futebol
como um todo, ocupando cargos técnicos e executivos, como se pode observar do
trecho extraído da sua missão16:
„‟[...] compromete a prestar apoio financeiro ao esporte, dando a jogadoras, treinadoras, árbitras e assistentes a oportunidade de participarem mais ativamente do futebol. A FIFA contribui para a popularização do esporte através de campanhas que informam e conscientizam o público e ajudam a derrubar barreiras sociais e culturais a fim de melhorar a posição das mulheres na sociedade.‟‟
Hoje, estima-se que existam 29 milhões17 de mulheres jogando futebol ao redor
do mundo, número muito menor se comparado aos homens, mas que também cresce
em uma velocidade muito maior do que o futebol masculino, que já se encontra
consolidado.
Vale ressaltar que existem diferenças culturais entre alguns países quando se
fala do desenvolvimento do esporte. Nos Estados Unidos, por exemplo, as
modalidades que ficaram configuradas como territórios masculinos e se tornaram
populares entre homens foram o futebol americano e o beisebol, portanto, a entrada no
território do futebol por parte das mulheres e a sua relação com o futebol é bem
diferente do que na maioria dos outros países, e isso, evidentemente, refletiu-se na
estrutura que o país tem atualmente para a prática do futebol feminino.
15
Idem ao 3 16
FIFA. Live your goals. Disponível em: http://www.fifa.com/womensworldcup/liveyourgoals/aboutthecampaign/index.html Acesso em: abril 2012 17 FIFA. O jogo feminino. Disponível em:
http://pt.fifa.com/aboutfifa/footballdevelopment/technicalsupport/women/mission.html Acesso em: abril 2012
39
2.2. As praticantes brasileiras
O surgimento do futebol feminino no Brasil apresenta controvérsias em sua
história que fazem com que datas oficiais tenham diferenças até mesmo de mais de um
século. De acordo com Lessa (2003), o que ficou registrado como o primeiro jogo entre
mulheres, em 1913, foi, na verdade, uma partida entre homens do Americano
travestidos de mulher e senhoritas da sociedade, em evento beneficente visando à
construção de um hospital da Cruz Vermelha para crianças. A partida atraiu grande
público divulgando nos jornais uma nota dizendo que „‟as mulheres podem até jogar
futebol‟‟, mas tudo não passou de uma brincadeira para promover o evento.
Uma outra partida que ficou conhecida e foi divulgada pelo jornal A Gazeta,
dessa vez só com a participação das moças, foi a partida entre os bairros de Cantareira
e Tremembé, realizada em 1921, e que foi citada como uma „‟atração curiosa‟‟, quando
não „‟cômica‟‟18.
Assim como no exterior, o esporte no Brasil começa a se difundir como um bom
instrumento de formação dos jovens, que mostrava saúde, disciplina e modernidade
(sobretudo no período higienista) e, para as mulheres, ficavam reservados os esportes
que as permitissem manter a sua feminilidade intacta, portanto, esportes que fossem
associados a contato ou violência não poderiam fazer parte dessas opções.
Formava-se, a partir dessa ideia, a resistência contra o futebol feminino, como
se pode ver pela publicação do escritor Coelho Neto em 192619 :
18
SUGIMOTO, Luiz. Site Jornal da Unicamp. Edição 211, maio de 2003. Disponível em: http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/ju/maio2003/ju211pg12.html Acesso em: abril 2012 19
A História do Futebol Feminino no Brasil. Site Literatura na Arquibancada, fevereiro de 2012. Disponível em: http://www.literaturanaarquibancada.com/2012/02/historia-do-futebol-feminino-no-brasil.html Acesso em: abril 2012
40
“Certamente ninguém exigirá da mulher que jogue o football ou o rugby, que esmurre antagonistas com o guante de boxe, que arremesse barras de ferro, que se engalfinhe em luta romana. Há exercícios que lhe não são próprios e que lhe seriam prejudiciais, não só à beleza como à saúde e até a sujeitariam ao ridículo”.
Tudo isso, porém, não fazia com que o futebol feminino inexistisse, e, na década
de 40, eram organizados torneios de futebol feminino e exibições de gala das mulheres
cariocas, tema que continuava sendo discutindo por diversas esferas de profissionais
que, na grande maioria das vezes, se posicionava contra essa prática.
A dimensão dessa questão assumia proporções que incluíram atitudes como
apelo a governantes, quando um cidadão enviou uma carta a Getúlio Vargas pedindo
que ele acabasse com esse „‟movimento entusiasta‟‟20:
„‟[Venho] Solicitar a clarividente atenção de V.Ex. para que seja conjurada uma calamidade que está prestes a desabar em cima da juventude feminina do Brasil. Refiro-me, Snr. Presidente, ao movimento entusiasta que está empolgando centenas de môças, atraíndo-as para se transformarem em jogadoras de futebol, sem se levar em conta que a mulher não poderá praticar êsse esporte violento, sem afetar, seriamente, o equilíbrio fisiológico das suas funções orgânicas, devido à natureza que dispoz a ser mãe... Ao que dizem os jornais, no Rio, já estão formados, nada menos de dez quadros femininos. Em S. Paulo e Belo Horizonte também já estão constituindo-se outros. E, neste crescendo, dentro de um ano, é provável que, em todo o Brasil, estejam organisados uns 200 clubes femininos de futebol, ou seja: 200 núcleos destroçadores da saúde de 2.200 futuras mães que, além do mais, ficarão presas de uma mentalidade depressiva e propensa aos exibicionismos rudes e extravagantes. (José Fuzeira, em carta datada de 25/04/1940 e repercutida pela imprensa)’’
Na década de 50 nasce o primeiro time brasileiro exclusivamente feminino
chamado Araguari Atlético Clube, que possuía também um time masculino criado em
1944. Tudo por causa de uma iniciativa da diretora da escola Visconde de Ouro Preto,
Isolina França Soares, que propôs ao diretor do clube, Ney Montes, de fazer uma
partida de futebol beneficente contra os seus maiores rivais, o Fluminense Futebol
Clube, para arrecadar dinheiro para a instituição de ensino. O diretor alegou que o
clube não estava muito bem e que uma ideia melhor seria chamar as estudantes e
fazer uma partida diferente, com jogadoras mulheres.
20
Idem ao 8
41
A notícia correu e 45 moças se apresentaram para jogar. Os times ganharam
versão feminina, e em 1958, entraram em campo o Araguari e o Fluminense. O jogo foi
um sucesso de público, e logo surgiu um convite para uma partida na cidade de
Uberlândia. Conta-se que a partida foi um sucesso tão grande que atraiu mais público
do que um amistoso disputado entre o Uberlândia e o Botafogo dos craques Garrincha
e Didi, com superlotação do estádio. O feito ganhou as páginas da revista o Cruzeiro,
de 28 de fevereiro de 1959, que falou do „‟pó-de arroz‟‟ e dos „‟cabelos bonitos‟‟ das
jogadoras, mas também das „‟botinadas‟‟, das quais não escapava „‟nem mesmo o
juiz‟‟.21
Apesar do aparente sucesso, novamente aumentaram as pressões e as
demonstrações de resistência, como a publicada pelo ex-futebolista Antonio Carlos
Nogueira, o Leivinha, para quem a primeira partida de futebol feminino em São João da
Boa Vista, em 1952, mereceu excomunhão da Igreja22.
21
Reportagem Bom dia Brasil. Conheça quem foram as mulheres pioneiras no futebol. Site Globo, março de 2011. Disponível em: http://g1.globo.com/bom-dia-brasil/noticia/2012/03/conheca-mulheres-brasileiras-que-foram-pioneiras-no-futebol.html Acesso em: março 2011 22
SUGIMOTO, Luiz. Site Jornal da Unicamp. Edição 211, maio de 2003. Disponível em: http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/ju/maio2003/ju211pg12.html Acesso em: abril 2012
Imagem 7: Goleira do Araguari Atlético Clube entra em campo para jogar contra o
Fluminense, em 1958
42
Os times sobreviveram menos de um ano à pressão, quando o diretor Ney
Montes recebeu uma notificação dizendo que a prática era proibida, pois a lei 31.199
de 14 abril de 1941 „‟proíbe as mulheres brasileiras de praticarem esportes
incompatíveis com as condições de sua natureza. Futebol, futebol de salão,
halterofilismo e beisebol.‟‟
O decreto lei valeu até 1979, e somente em 1981 foi criada a primeira liga de
futebol feminina no Rio de Janeiro, mesma época na qual empresas e mídia começam
a se interessar pelo futebol feminino brasileiro, ajudando-o a reiniciar esse processo de
divulgação e popularização. Dois nomes importantes que surgiram nesse contexto
foram o Radar F.C., equipe carioca, e o Saad.
Atualmente o futebol feminino brasileiro se destaca no cenário internacional e
ocupa a 5ª. posição no ranking da FIFA23, mas nacionalmente sofre com a escassez de
recursos e oportunidades, já que são baixos os números de campeonatos femininos
nacionais, e muitas jogadoras partem para jogar futebol em clubes do exterior.
2.3. Elas como profissionais
Outros campos de atuação dentro do universo do esporte são referentes aos
cargos técnicos e executivos, como é o trabalho desempenhado pelas árbitras,
bandeirinhas, gandulas e técnicas, além de mulheres que trabalham com o produto
futebol, ou seja, jornalistas, ou gestoras em clubes e organizações ligadas ao futebol.
No campo do jornalismo esportivo, uma das referências é Regiane Ritter, que
trabalhou por 15 anos como repórter de rádio, quando as entrevistas pós-jogos eram
feitas diretamente nos vestiários, ambiente que poderia não parecer adequado para
receber mulheres. Naquela época, existiam 8 jornalistas credenciadas, enquanto hoje
esse número subiu para 90.
23
FIFA. Ranking Mundial Feminino da FIFA. Atualizado em junho de 2012. Disponível em: http://pt.fifa.com/worldranking/rankingtable/women/index.html Acesso em: junho 2012
43
De lá pra cá, centenas de outras mulheres se interessaram pela profissão, e
hoje não só realizam entrevistas em campo, como participam e até mesmo comandam
mesas redondas, ou tem programas exclusivos com mulheres, como é o caso do Belas
na Rede, criado pela Rede TV!.
Outra iniciativa inovadora, desta vez da Rádio Globo, será a de realizar um
reality show que selecionará a primeira narradora oficial de futebol no País, uma mulher
que ganhará como primeira missão transmitir os jogos da Copa do Mundo de 2014. O
programa „‟Reality Locutoras‟‟ mostrará, através hotsite e da própria Rádio, o
desenvolvimento das participantes durante aulas e treinamentos dados por
comunicadores.
No campo da arbitragem, foi uma brasileira que conquistou um importante título
no comando no futebol, considerada a primeira árbitra profissional de futebol no
mundo. Léa Campos foi estudante de jornalismo, se apaixonou pelo futebol e chegou a
falar com o presidente Emílio Garrastazu Médici, em 1972, para pedir a intervenção do
mandatário para que pudesse exercer a profissão. O Brasil tem mais de vinte mulheres
que exercem essa profissão hoje, além de bandeirinhas e assistentes.
Recentemente, foram as personagens que ficam na beira do gramado que
ganharam atenção: as gandulas. Isso porque a jogada que gerou o primeiro gol da
vitória do Botafogo na partida contra o Vasco, pela final da Taça Rio, começou a partir
de uma reposição de bola rápida feita pela gandula Fernanda Maia, de 23 anos, sendo
três como gandula. Fernanda ganhou destaque em inúmeros programas de televisão,
revistas e jornais, tanto pela eficiência em campo quanto pela beleza, e com isso fez
com que a atenção fosse voltada para o trabalho das gandulas mulheres no estádios.
Várias outras gandulas participaram da final dos estaduais, sendo que na final do
Gauchão, entre Caxias do Sul e Internacional, foram escaladas oito mulheres para
ajudar na partida, após confusão na partida anterior com gandulas homens.
44
Se as atividades citadas acima ainda são desempenhadas por um baixo número
de mulheres, na alta gestão ela só poderia ser menor. Ainda de acordo com a
reportagem do programa Bom dia Brasil, a pioneira no Brasil foi Marlene Matheus,
primeira mulher a se tornar presidente de um clube de futebol, o S. C. Corinthians
Paulista quando, em 1991, apoiada pelo marido (Vicente Matheus, ex-presidente da
mesma equipe), foi eleita e exerceu um mandato de dois anos. Marlene se envolveu
também com outras áreas do clube, e em 2008 exerceu o cargo de vice-presidente
social durante a gestão de Andres Sanchez.
Atualmente, outro grande clube brasileiro possui uma mulher no lugar mais alto
de sua gestão. A carioca Patrícia Amorim, ex-nadadora e vereadora, foi eleita, em
2009, a primeira mulher presidente do Clube de Regatas do Flamengo.
Apesar do reconhecimento, ambas apontam a existência de discriminação por
parte de colegas de profissão e torcedores. No exterior, a situação não é muito
diferente. Em abril de 2012 foi veiculado um documentário produzido pela BBC
britânica entitulado „’Sexism in Football’24’. Nele, a apresentadora da BBC Sports,
Gabby Logan, mostra diversos casos de sexismo no futebol, e debate a questão com
mulheres que trabalham no futebol britânico.
24
BBC Londres. Sexism in Football, abril de 2012. Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=rUxYiXuX5hc Acesso em: abril 2012
Imagem 8: gandulas mulheres são escaladas para participarem da final dos Estaduais de 2012
45
O documentário parte do polêmico caso envolvendo dois jornalistas esportivos, o
ex-jogador Andy Gray e o narrador Richard Keys, que perderam seus empregos na Sky
Sports (Andy foi demitido e Richard renunciou ao cargo) após os microfones terem
capturado comentários discriminatórios sobre a bandeirinha Sian Massey,
questionando se ela seria capaz de entender a regra do impedimento. Eles ainda
debocharam da dirigente Karren Brady por ter falado sobre sexismo no futebol, e uma
captura das câmeras no intervalo do programa esportivo que apresentavam, na qual
constrangeram uma repórter que dividia a cena com eles, ao fazerem comentários em
tom sexual.
Também é apresentada a associação „‟Women in football‟‟, formada por
mulheres que trabalham com futebol e que se reúnem periodicamente para discutir
questões ligadas à profissão e ao sexismo existente. Dela, participam profissionais
como Jacqui Oatley, primeira locutora inglesa de futebol, e Karren Brady, que assumiu
o posto de diretora do Birmingham City Football Club aos 23 anos (atualmente é vice-
presidente do West Ham United). Todas contam, durante o documentário, casos de
discriminação explícita e até mesmo de assédio sexual.
Atualmente, existem mulheres também presidindo grandes clubes europeus,
como é o caso de Gisele Oeri no suíço Basel, Francesca Menarini na equipe italiana do
Bologna, e Rosela Sensi na também italiana A. S. Roma.
Além dos clubes, a profissionalização do futebol e outras modalidades
possibilitou o surgimento de inúmeras empresas que trabalham especificamente com
marketing e comunicação esportivas, onde também se encontram mulheres
especialistas no assunto.
A existência de diversos campos de atuação, somadas a escassez de pesquisas
na área, faz com que não seja possível estimar o número de mulheres que trabalham
com futebol ou esporte nas áreas citadas anteriormente, mas aqui também se observa
o crescimento da sua participação.
46
2.4. Elas como torcedoras
A aparição mais bem aceita e constante da figura feminina no futebol é como
espectadora. Lançado como um esporte de elite, era comum ver as moças da alta
sociedade acompanhando as partidas nos estádios em meados de 1920. Em um Brasil
que ansiava por modernização e se espelhava no modelo e hábitos europeus (item
1.3), poder ver partidas de futebol trazia prestígio e um pouco desse sentimento de
modernidade.
Além disso, a presença feminina nos estádios trazia elegância, tranquilidade e
beleza, transformando as senhoritas em um elemento ativo na consolidação do esporte
como um evento social moderno e exclusivo das classes mais abastadas, e,
consequentemente, distante das classes mais populares (COSTA, 2006, p.4).
Todos esse „‟benefícios‟‟ eram amplamente destacados pela imprensa, como
mostra este trecho de um dos jornais da época: „‟(..) presença assídua nas
arquibancadas durante os campeonatos, as gentis ‘demoseilles’ aumentavam o
Imagem 9: senhoritas da alta sociedade acompanham partida no ABC Paulista,
na década de 20
47
brilhantismo da festa e davam nota alegre ao certamên, torcendo ativamente e fazendo
dos sporstmen seus ídolos maiores‟‟ (PEREIRA apud CAMPOS 2010, p.27).
Os sportsmen se tornam, nesse contexto, mais do que ídolos esportivos para
elas, transformando-se em objeto de admiração e de desejo das senhoritas que
frequentavam as partidas. Com a introdução do futebol nas cidades, o ideal de beleza
masculino muda, passando de homens magros e intelectuais, para homens fortes e
atléticos. A poetisa e tradutora carioca Ana Amélia de Mendonça demonstra isso
publicamente em seu poema „‟O Salto‟‟, quando fala apaixonadamente do goleiro
Marcos Carneiro de Mendonça, com quem se casou em 1917 (COSTA, 2006, p.8).
Uma outra demonstração dessa admiração de Ana pode ser vista também através da
publicação da revista Foot-ball, com uma crônica intitulada „’Foot-ball e o amor‟‟, que
continha trechos de uma carta dela para o atleta, na qual o compara a um deus grego:
„‟[..] Tens o porte viril de um guerreiro de Atenas/ Tens a nobreza e o ardor dos moços de outra idade/ Dos atletas e heróis entrando nas arenas/ Tens a bela estatura e altiva majestade/ Que belo vencedor de algum torneio atlético/ Que Pindaro cantou nos fortes epinícios/ Eu te encontrei de pé, com porte airoso e estético [..] (FERNANDEZ, 2010, p.70)‟‟
Ainda que a admiração estivesse centrada nos esportistas, no estádio as
senhoritas ainda tinham a oportunidade de flertar e encontrar um par romântico na
própria arquibancada, cheia de moços jovens da alta sociedade.
Assistir as partidas de remo ou de futebol era, portanto, uma ótima oportunidade
de socialização, e também de sair do espaço restrito da casa para estar mais próxima
dos ideais modernos de feminilidade, e frequentar o ambiente público que era antes
destinado exclusivamente aos homens. (COSTA, 2006, p.4).
Apesar dessa condição bem aceita de torcedora ter um caráter mais passivo
dentro do universo do esporte, começavam a surgir diferentes iniciativas que
fortaleciam ou exacerbavam a presença da mulher nesse território. O papel da própria
poetisa Ana Amélia de Mendonça ia muito além de falar da sua admiração pelo marido.
Ao voltar da Europa, aos 13 anos, trouxe consigo livros de poesia e também bolas de
48
futebol, sendo uma grande incentivadora do esporte no país. Chegou jogar futebol, a
treinar os operários da fábrica de seu pai e a escrever sobre o assunto. Isso mostra
que a mulher buscava, nessa época, legitimação e liberdade sob diversos aspectos.
Ana Amélia é uma importante figura nesse contexto pois trabalhou em várias frentes
para promover essa mudança, chegando a ser vice-presidente da Federação Brasileira
pelo Progresso Feminino, fundada por Bertha Lutz em 1922, e a participar de inúmeros
congressos e eventos que abordavam o tema.
A mulher brasileira começa, na década de 20, uma busca pela inserção no
espaço público e pelo reconhecimento de direitos nos âmbitos trabalhistas, jurídicos e
políticos, mas segundo Moura (apud CAMPOS 2010, p.27), no I Congresso Feminino
Brasileiro em 1922, por exemplo, não foi encontrada nenhuma referência a respeito do
lazer das mulheres. Mesmo não sendo tema central das primeiras movimentações
feministas, já existiam nessa época iniciativas para participar do universo do esporte
em diversas outras frentes.
A mulher torcedora, ainda que sofra atualmente dificuldade na legitimação como
torcedora (item 2.4), foi sempre a presença mais bem aceita e valorizada nos estádios,
pois como destaca Brasão (apud CAMPOS, 2010, p.26), „‟contribuir para a
exacerbação emocional do jogo é um campo do qual as mulheres nunca foram
dispensadas‟‟. Elas trazem não só graça e beleza às arenas, mas também ajudam a
fazer com que o ambiente seja mais leve, seguro e bem estruturado, visto que
segurança e infraestrutura são dois pontos determinantes para sua participação.
A partir da década de 60, porém, acontece o movimento contrário. Os estádios
começam a se popularizar e a mulher passa a se enxergar distante dele. De acordo
com Toledo (apud CAMPOS, 2010, p.32) no final dos anos 60 e início dos anos 70,
nasce uma nova forma de torcer, a das torcidas organizadas25. Elas são instituições
autônomas aos clubes e se manifestam reivindicando resultados e qualidade dos
profissionais que representam a sua equipe, seja em jogos ou em treinos. São
25
As primeiras organizadas foram a Torcida Uniformizada do São Paulo e a Charanga Rubro-Negra, do Flamengo, criadas em
1939 e 1941, respectivamente. A diferença estava no modo de torcer. O modelo citado no texto, e que se desenvolveu no final dos anos 60, era mais próximo ao modelo que conhecemos atualmente, que tem o papel não só de incentivar, mas também de cobrar o clube
49
formadas, na sua maioria, por jovens que realizam, por meio dela, a sua sociabilidade
com gestos, ações e atitudes muitas vezes reprováveis pelos domínios públicos. Essa
forma de torcer ganhou adeptos provenientes, sobretudo, das camadas mais
populares.
Ainda que parecesse improvável, uma dessas torcidas teve uma representante
mulher, a primeira no comando de uma organizada. Foi a TOV, torcida do Vasco, que
de 1956 a 1976 teve como presidente a torcedora Dulce Rosalina, e que depois fundou
a Renovascão, a qual participou até o seu falecimento em 2004.
As torcidas organizadas, no geral, demoraram a incorporar mulheres e, em
alguns casos, até prescrevem normas de conduta para as meninas filiadas. Segundo
Costa (2006), alguns membros das organizadas costumam justificar a escassa
presença feminina „‟por conta do temperamento das mulheres pouco afeito à união e
constantemente inclinado a promover desavenças internas nos grupos dos quais fazem
parte‟‟ (COSTA, 2006, p.6).
Ao mesmo tempo que a mulher se afastava ou era afastada do futebol, a
popularização do esporte faria com que ele ganhasse maior destaque na mídia, que a
partir desse fenômeno viu uma grande chance de criar essa necessidade e hábito nos
torcedores de acompanharem o mundo da bola no seu cotidiano. A classe proletária,
segundo Caldas (1990) „‟representava uma potencial consumidora desse produto que
se tornaria o futebol, processo que só aconteceu graças à industrialização e
urbanização na época‟‟.
Nasce também nessa época o ideal do torcedor de guerreiro, apaixonado, fiel,
responsável por garantir a festa nas arquibancadas e por incentivar o seu time sob
quaisquer circunstâncias. Ideais que estavam longe de serem identificados no universo
feminino, que nascem justamente quando a participação delas era baixa e passava
desapercebida. Era o tempo de exageros, da paixão a qualquer custo, de sentimentos
exacerbados que muitas vezes levariam ao descontrole e à violência. As décadas de
80 e 90 foram marcadas por episódios violentos em dias de partidas de futebol que
foram amplamente divulgados pela imprensa (item 1.4.), a torcida organizada foi
50
marginalizada, e apenas uma pequena parcela de mulheres continuou se arriscando
para poder torcer por algum time.
Mesmo que atualmente ainda existam episódios de violência e o território do
futebol se mostre predominantemente masculino, diversas medidas foram tomadas
para coibir a violência nos estádios e melhorar a sua infraestrutura, ou para atrair mais
pessoas para o esporte, o que reaproximou ou conquistou novas torcedoras brasileiras,
que hoje assistem futebol pela TV, ou vão ao estádio com seus parentes, amigos,
companheiros, sozinhas, ou com torcidas organizadas (item 2.5). De acordo com o
sociólogo Ronaldo Helal, em entrevista ao Globo Esporte, uma pesquisa apontou que
elas respondem por 22% da arrecadação das bilheterias de uma partida de futebol26.
Ainda assim, 74% das mulheres ainda dizem preferir ver as partidas pela TV27, e
a maioria justifica que o principal receio é justamente a falta de segurança. Sobre essa
questão vale observar, porém, que a pesquisa publicada pelo O Lance! constatou que
26
Reportagem Globo Esporte. Futebol não é só coisa de macho: torcedoras estão cada vez mais presentes nos estádios, julho de 2009 Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=3fZT7F5eNJ4 Acesso em: abril 2012 27
Pesquisa Lance Imperdível!, 2011 Disponível em: http://issuu.com/rafaelmazzari/docs/outro?mode=window&pageNumber=2 Acesso em: abril 2012
Imagem 10: torcida organizada do Corinthians, com a clara predominância de homens, sobe para as arquibancadas
51
quase a totalidade dos entrevistados (99%), incluindo homens e mulheres, disseram
não ter ido ao estádio no último ano, o que significa que investir nas arenas para atrair
um público mais diversificado é um investimento que pode atingir ambos os gêneros e
aumentar consideravelmente o público consumidor dos espetáculos.
2.5. Estereótipos e legitimações
A história da mulher na sociedade é marcada por estereótipos e preconceitos, e
no futebol não poderia ser diferente. De fato, já pelas discussões nos itens anteriores é
possível perceber que o processo de legitimação da mulher nesse campo é lento e
difícil.
Segundo Dunning e Maguire (1997), é justamente essa série de limitações que a
mulher sempre teve vinculadas à sua figura que a instiga a entrar nesse universo:
“O que motiva as mulheres a entrarem nesse universo são: o desejo de obter
satisfações de mimetismo, sociabilidade, e de mobilidade semelhantes àquelas
que os homens obtêm do esporte, além de vantagens do pontos de vista de
identidade, do auto-conceito, da auto-confiança e dos habitus, (tal como um
maior sentimento de segurança nos locais públicos e uma melhor capacidade
de auto-defesa em caso de ataque físico); o desejo de ser iguais aos homens
como consequência de frustrações ressentidas no passado motivadas por
restrições e limitações vinculadas aos papéis femininos.”
Para fazê-lo, porém, elas precisam vencer uma série de desconfianças, tanto
dos homens quanto das próprias mulheres. Precisam não só mostrar que são capazes
de nutrir sentimentos clubísticos, mas também que conseguem entender esquemas
técnicos e táticos, regras do jogo como o impedimento, nomes e posições dos
jogadores de seus times.
Essa desconfiança e falta de familiaridade com o tema futebol é, inclusive, tema
recorrente na mídia. Para os Mundiais de 2006 e 2010, circulou na internet uma
52
mensagem com „‟Regras para a Copa do Mundo‟‟, na qual os homens se dirigiam „‟a
todas as mulheres do mundo‟‟, ironizando a falta de compreensão delas da importância
dos jogos. Um dos primeiros pontos dizia: „‟durante os jogos eu estarei cego, surdo e
mudo, exceto nos casos que eu solicite que me encha o copo de cerveja‟‟, ou „‟do dia 9
e de junho ao 9 de julho, você deverá ler toda a seção de esporte de modo a se manter
a par do que se passa na Copa do Mundo, o que lhe permitirá participar das
conversas‟‟.
Curiosamente, esse é o campeonato pelo qual mais mulheres têm apego,
diferente dos homens, que preferem seus clubes locais. Em pesquisa realizada por
Franco (2007), a seleção nacional foi citada como sendo a mais importante do que
times locais para 64% das mulheres, contra 37% dos homens, e uma outra pesquisa
realizada pela empresa brasileira de pesquisa e inteligência de Marketing feminino,
Sophia Mind, constatou que o percentual de mulheres que assiste aos jogos da seleção
nacional é de 94%, sendo que 30% ainda assistem jogos de outras seleções. Isso
porque a maioria dos homens se interessa pelo dia a dia do seu clube, e busca uma
maior frequência de jogos, enquanto muitas mulheres preferem o clima de festa e o
sentimento que se cria em torno de um campeonato importante como é o mundial.
Costa (2004) define três tipos de mulheres no futebol: a „’grã-fina das narinas de
cadáver‟‟, personagem criada por Nelson Rodrigues, que perguntava „‟quem é a bola?‟‟
durante o jogo, a maria-chuteira, que „‟herda a sua falta de interesse no jogo‟‟, mas que
vê nos jogadores de futebol uma boa oportunidade de mudar de vida, e a torcedora
autêntica, que deve superar obstáculos como os estereótipos citados acima.
As marias-chuteira sempre foram presença constante na mídia. O seu único
interesse está nos jogadores de futebol, com quem têm romances amplamente
explorados pela mídia, e muitas vezes aproveitam-se dos minutos de fama para se
autopromoverem. O tema já inspirou novelas, crônicas, músicas e revistas. Na
Argentina, a novela Botineras (exibida entre 2009 e 2010), foi sucesso de público; no
Brasil, atualmente, a personagem Suelen, uma das principais da novela „‟Avenida
Brasil‟‟, produzida pela Rede Globo de Televisão, é uma maria-chuteira, interpretada
pela atriz Isis Valverde. Não faltam reportagens explorando essa figura, seja para
53
eleger a maria-chuteira mais bonita, ou entrevistas para que elas contem detalhes
sobre seus romances com os jogadores, ou sobre as festas que frequentam.
Aqui é importante fazer uma diferenciação. Um ponto que estará sempre
atrelado à torcedora do sexo feminino é a questão da atração gerada pelos jogadores
ou pela figura do ídolo. Como foi visto no começo deste capítulo, ela existe desde os
anos 20, quando o ideal de beleza muda e as senhoritas passam a admirar o físico dos
atletas, e são muitas que hoje somam isso à sua torcida. É uma admiração pela figura
do ídolo que vai muito além da chance de ascender economicamente às custas dos
jogadores, como fazem as marias-chuteira. Kakazetes, Neymarzetes, mulheres
histéricas que gritam por Cristiano Ronaldo, Beckham e outros jogadores famosos
também fazem parte de um público consumidor do produto futebol, que paga ingresso,
e compra camisas, faixas, etc.
A questão da atração física é, inclusive, uma das maneiras que as marcas têm
de atrelar seus produtos à figura do ídolo (além de seus valores), e que a mídia tem
usado para promover o futebol para as mulheres. Matérias com caráter mais
descontraído para eleger os jogadores mais bonitos da temporada, ou que mostrem
meninas apaixonadas por seus ídolos são cada vez mais comuns em programas
esportivos, pois essa é também uma maneira de incluir a mulher no território do futebol.
Evidente que o ponto citado acima gera discórdia e preconceito, visto que esse é
mais um argumento para caracterizar a falta de interesse ou conhecimento da mulher
quando o assunto é futebol, mas é fato que, dentro do campo do futebol, a torcida
feminina tem a liberdade de assumir outros tipos de interesse que não somente o
esporte em si.
Todos os tipos de interesse somados, o índice de mulheres entre 18 e 60 anos
que declaram torcer por algum time já chega a 80%28. Claro que nem todas elas
consomem o produto esportivo ou acompanham os seus times, mas isso indica que
essa parcela estabeleceu, de alguma maneira, um primeiro contato com a modalidade.
28
Pesquisa Sophia Mind. ‘’Futebol – Uma paixão nacional’’, junho de 2010. Disponível em: http://www.sophiamind.com/pesquisas/consumo-pesquisas/futebol-uma-paixao-nacional/ Acesso em: abril 2012
54
Quando se fala efetivamente de acompanhar campeonatos o número cai, mas é
considerável, chegando hoje a 30%29.
Aquelas que procuram se consolidar como torcedoras autênticas fazem questão
de salientar o seu interesse unicamente pelo jogo de futebol, e se reúnem em torcidas
organizadas ou comunidades virtuais para demonstrar isso. Elas não só participam das
torcidas, como criam facções femininas, caso da Galoucura Feminina (MG – Atlético
Mineiro), Jovem Fla Pelotão Feminino (RJ – Flamengo), Dragões da Real (SP - São
Paulo F. C.), ou torcidas só delas, como a Flu Mulher (RJ – Fluminense), Força
Feminina Colorada (RS – Internacional), e as Guerreiras Alvinegras (Botafogo – RJ).
O Grêmio conta com o Núcleo de Mulheres Gremistas (RS), criado em 2003,
para ajudar o time que estava em má fase, além de promover esforços para que a
torcida feminina conquiste espaço no futebol. Elas mesmas ressaltam que „‟este
movimento não é uma manifestação de um feminismo exacerbado e radical, mas sim
de uma conquista democrática, justa e igualitária que vem sendo adquirida pela mulher
ao longo dos anos‟‟30. O núcleo que começou com 20 torcedoras conta hoje com mais
de 3 mil cadastradas.
29
Idem 30
Núcleo de Mulheres Gremistas. Site oficial. Disponível em: http://www.mulheresgremistas.com.br/sitedinamico/ Acesso em: abril 2012
Imagem 11 e 12: torcida feminina Flu Mulher se prepara para ver partida do Fluminense, e Núcleo de Mulheres Gremistas visita a obra da nova arena do Grêmio.
55
Esse movimento se nota não só na organização na hora de apoiar o time, mas
também na aquisição de produtos e participação nos programas de sócio-torcedor,
principalmente no sul do País. Em pesquisa feita pelo Datafolha, estima-se que de
cada três homens torcedores no RS, dois são mulheres. Dos cerca de 100 mil sócios
atuais do Internacional, 22 mil são mulheres, sendo que dez anos antes elas eram
apenas 2%, além de serem comprarem quatro de cada dez produtos vendidos na Inter
Sport no Beira-Rio.
No Grêmio a situação também merece destaque. As mulheres, que dez anos
atrás garantiam 1% do faturamento da Grêmio Mania no estádio Olímpico, agora
garantem 40% dele, e são 70 mil no quadro social do time, número que aumentou
consideravelmente na década de 90, visto que antes disso eram apenas 402
torcedoras31.
Em todo o País se observa o aumento do consumo de artigos esportivos para
mulheres, bem como a crescente participação nos dias de jogos. Os mais bem-
sucedidos nesse setor são os clubes que dão melhores condições para as suas
torcedoras, tanto em oferta de produtos, quanto no estádio (capítulo 4). E a
preocupação com as necessidades desse público vem não só do futebol, mas também
de outras modalidades que buscam democratizar o esporte entre os gêneros.
Uma modalidade que vê crescer o número de adeptos homens e mulheres é o
MMA (artes marciais mistas). A faixa de lutas da SporTV, a Combate, tem 31% da sua
audiência composta por mulheres32. As emissoras ampliaram as transmissões e o
conteúdo sobre a modalidade, começou a aparecer o público feminino.
Elas procuram o esporte para desestressar, em função de toda a adrenalina e
imprevisibilidade da luta, e gostam do sex-appeal dos lutadores, elementos que estão
31
MOMBACH, Hiltor. Cresce a presença da torcida feminina nos estádios da dupla Gre-Nal. Correio do Povo, outubro de 2011. Disponível em: http://www.correiodopovo.com.br/Esportes/?Noticia=351121 Acesso em: abril 2012 32 PRADO, Laís. Mulher está assistindo mais programas masculinos, dezembro de 2011. Clube da Criação. Disponível em: http://ccsp.com.br/ultimas/noticia.php?id=56035 Acesso em: abril 2012
56
presentes também no futebol. Mesmo que esse seja mais um esporte configurado no
território masculino, com a violência como um de seus elementos centrais, ele começa
a se popularizar no Brasil em um tempo no qual a procura da mulher por territórios
masculinos já é evidente, e talvez por isso o seu desenvolvimento seja muito diferente
do futebol. Isso porque desde o início o público feminino é considerado uma fatia
estratégica de mercado, como se pode observar a partir do fato de que o UFC dedicou
grande parte da sua linha fashion às garotas, com roupas e acessórios que podem ser
usados não só na prática da luta, mas também para desfilar nas ruas.
O futebol não fica para trás e já está atento ao consumo feminino, lançando os
mais diversificados produtos para a parcela de 53% de mulheres que declaram
comprar produtos esportivos para consumo próprio33, além de oferecerem incentivos
para que as mulheres frequentem as arenas..
Ainda que existam essas iniciativas para estimular a presença das mulheres no
futebol, existem também muitas reclamações sobre a falta de segurança nos estádios,
e a escassez de produtos esportivos desenvolvidos para o sexo feminino no mercado,
33
Pesquisa Sophia Mind. ‘’Futebol – Uma paixão nacional’’, junho de 2010. Disponível em: http://www.sophiamind.com/pesquisas/consumo-pesquisas/futebol-uma-paixao-nacional/ Acesso em: abril 2012
Imagem 13: produtos para o público feminino fã de MMA usar no dia a dia, lançados em 2012
57
citado por 65% delas34. No Brasil, de maneira geral, faltam estratégias sólidas nesse
sentido, como será mostrado nos capítulos a seguir.
Os profissionais que trabalham com a área tem nesse público uma grande
oportunidade, já que muitos clubes ainda não possuem estratégias voltadas para elas,
que podem trazer inúmeros benefícios para o espetáculo esportivo, seja no âmbito
social, trazendo mais segurança e paz para os estádios, ou no âmbito econômico, com
o consumo do esporte e das marcas associadas a ele.
34
Idem
58
3. O mercado da bola
3.1. O que é marketing esportivo
O profissional de comunicação e marketing tem um papel-chave quando se fala
na democratização do futebol e no desenvolvimento do mercado esportivo como um
todo. Para uma melhor compreensão de como isso pode ser feito, é necessário
entender os conceitos que são utilizados na construção de estratégias e planos táticos
no mundo esportivo, bem como as diferenças e semelhanças entre o público do sexo
masculino e feminino.
Neste capítulo, portanto, será feita uma introdução teórica ao tema com a
demonstração de algumas aplicações práticas desses conceitos. Dada a sua
abrangência, serão escolhidos para aprofundamento apenas os itens que mais
interessam ao presente trabalho: o marketing no contexto esportivo, o produto
esportivo, a promoção e a relação dos gêneros na hora de traçar estratégias nesse
universo.
O primeiro ponto a ser esclarecido, portanto, é o que é marketing esportivo, e
em quais pontos ele difere no marketing tradicional. Segundo Kotler e Keller (2011), o
marketing, de maneira geral, tem como papel identificar e suprir as necessidades dos
consumidores de maneira lucrativa:
„‟O marketing envolve a identificação e a satisfação das necessidades humanas
e sociais. Para defini-lo de uma maneira bem simples, podemos dizer que ele
„‟supre necessidades lucrativamente‟‟. (..) Os profissionais de marketing
envolvem-se no marketing de bens, serviços, eventos, experiências, pessoas,
lugares, propriedades, organizações, informações e ideias. (KOTLER e
KELLER, 2011, p.4)‟‟
59
Para Yanaze (2011), o marketing esportivo, por sua vez, nada mais é do que “a
aplicação dos princípios de marketing a qualquer produto da indústria do esporte‟‟. O
profissional que se ocupar dessa área pode trabalhar, portanto, todas as frentes citadas
por Kotler e Keller (2011) tendo em mente o ponto de vista esportivo. Fala-se de
materiais esportivos como tênis, roupas, camisas de time; de eventos como a Copa do
Mundo e as Olimpíadas; de experiências como a ida ao estádio; de pessoas, como é o
gerenciamento da imagem de atletas, entre tantas outras aplicações.
Nesse ponto é importante fazer uma distinção. Morgan e Summers (2008)
ressaltam que essa aplicação pode ser categorizada em duas frentes: „‟aos produtos
esportivos e ao marketing de produtos não-esportivos por meio da associação com o
esporte‟‟. No primeiro caso, os esforços em marketing têm como finalidade promover o
esporte como um serviço; já no segundo, o esporte é usado como um meio de agregar
valor e promover identificação do público com a marca através da apropriação de
valores transmitidos pelo esporte.
No caso das organizações que usam essa estratégia para promover seus
produtos, existem tanto as organizações que nada tem a ver com o esporte, como
instituições bancárias ou empresas de bens de consumo, e também aquelas que tem
como finalidade vender produtos esportivos, e que, portanto, tem o esporte já
incorporado em sua missão, como é o caso da Nike, Adidas, Puma, Penalty entre
outras.
Ainda que essa divisão entre o „‟marketing de um esporte‟‟ ou o „‟esporte no
marketing de uma organização‟‟ ajude a categorizar o tipo de negócio que está sendo
feito e a traçar estratégias específicas, é cada vez mais difícil dissociar uma atividade
da outra. Está se tornando comum que a marca se associe à atividade esportiva e ao
espetáculo e, nesse caso, ela é vista como parte colaborativa no desenvolvimento do
esporte, agregando valor à marca, ao mesmo tempo que a exposição é feita de
maneira mais efetiva e para um número maior de pessoas.
Em resumo, o marketing esportivo nada mais é do que a aplicação dos quatro
P‟s (item 3.2.) – preço, produto, promoção e ponto-de-venda – e do planejamento
60
estratégico de marketing de forma específica em um contexto esportivo, todo
concebido para atender às necessidades dos clientes do esporte, sejam eles
consumidores individuais, participantes de esportes ou jogadores, e investidores
corporativos.
O contexto esportivo é o que confere complexidade a essa prática, devido
principalmente a dois motivos: o fato de o produto esportivo ser altamente incontrolável,
e da interferência que muitos dos clientes têm sobre o processo.
Sobre a primeira, pode-se dizer que o esporte apresenta várias características
de um serviço. São elas: a intangibilidade – maioria das experiências não é de natureza
física; inseparabilidade – as experiências e os encontros esportivos são produzidos e
consumidos simultaneamente; a perecibilidade – não é possível manter um inventário
dos eventos ou produtos esportivos e, se os ingressos para um evento não forem
vendidos, essa receita futura estará perdida para sempre; e a heterogeneidade – cada
experiência ou encontro esportivo é único para cada cliente do serviço de esportes
(MORGAN e SUMMERS 2008, p.8).
Quadro 1 – Os 4 P‟s do marketing esportivo
Fonte: MORGAN, M.J.; e SUMMERS, J. 2008
61
O profissional de marketing esportivo lida com um produto que é altamente
incontrolável e imprevisível, já que não se pode prever, por exemplo, o resultado final
de uma partida, ou o impacto que isso causará na percepção do consumidor sobre a
sua experiência. Curiosamente, o componente „‟imprevisibilidade‟‟ é uma das maiores
forças do futebol, ao mesmo tempo que representa um dos maiores desafios para
aqueles que trabalham com ele.
Franco (2007) destaca que em uma pesquisa dirigida por Eli Ben-Naim, no
Laboratório Nacional de Los Alamos (EUA), os estudiosos apontaram a vitória do mais
fraco em 45% das vezes (o campo de observação foi a Liga Inglesa durante mais de
um século), uma das maiores entre as modalidades coletivas. Outras que
apresentaram índices elevados de imprevisibilidade, ainda que menores que o futebol,
foram o futebol americano e o beisebol, esportes altamente populares nos Estados
Unidos35
Aos fatores intangíveis citados acima, somam-se os elementos tangíveis de uma
mercadoria – como merchandising, vídeos de jogos, lembranças esportivas – e essa
dicotomia acrescenta complexidade ao cenário.
O segundo ponto que torna o contexto esportivo diferente dos demais diz
respeito à interferência dos clientes, como é o caso da mídia, um dos mais fortes. Isso
porque os torcedores são sensíveis à cobertura midiática de suas equipes e também às
análises feitas pelos jornalistas com relação a decisões técnicas ou mesmo
estratégicas da empresa, e essa pressão pode influenciar a tomada de decisão
administrativa.
No futebol brasileiro, a força da mídia é aparente. É a modalidade que mais
ganha cobertura no País, e as análises sobre as equipes e as decisões do clube são
diárias. Essa força foi mostrada, por exemplo, na campanha promovida pela Rede
Globo contra o técnico Dunga, em 2010, quando ele cortou o privilégio da emissora na
35
O beisebol é popular também em diversos países da América Central e no Extremo Oriente
62
cobertura da seleção. O técnico passou a receber duras críticas e questionamentos
com relação à sua postura por parte dos jornalistas e comentaristas da emissora36.
Quando se fala sobre gêneros, a mídia pode ser tanto positiva ao „‟democratizar
o esporte‟‟, quanto negativa ao contribuir para a criação e cristalização de estereótipos
prejudiciais. Um estudo sobre mídia esportiva feito nos Estados Unidos concluiu que as
mulheres geralmente não participam de programas esportivos de audiência masculina
e, quando são convidadas, são vistas de maneira estereotipada (MESSNER, HUNT e
DUMBAR, 1999, p. 7).
Essa informação, porém, não pode ser vista de maneira estática, pois se
observa uma constante mudança no cenário internacional e nacional, que também se
moldou através desses estereótipos (item 2.5.). No Brasil, observa-se que, em certo
ponto, a mídia tem contribuído para chamar a atenção para a presença da mulher no
futebol, o que pode contribuir para que as organizações esportivas enxerguem esse
público de maneira estratégica, investindo em campeonatos femininos, ou em estrutura
para as torcedoras.
Por fim, outro ponto que diferencia o contexto esportivo dos demais é a
satisfação do consumidor final, que é influenciada por uma série de fatores que fogem
do controle do profissional. Ela é determinada pela qualidade das experiências dos
espectadores esportivos, e essas sofrem influência de outros consumidores, do
contexto físico, do humor e das sensações próprias dos consumidores. São todos
fatores incontroláveis, pois o profissional não pode prever qual será a sensação do
espectador, a interação com os outros, e muito menos o resultado da partida.
Nesse cenário, as atividades do marketing são usadas para ajudar os órgãos
esportivos a atingir suas metas e seus objetivos corporativos e a se comunicar com
seus diversos públicos, levando em conta todos esse fatores incontroláveis na hora de
buscar a melhor estratégia.
36
Folha.com junho de2010. Campanha de internautas defende Dunga na briga contra a Globo, junho de 2010. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/tec/755180-campanha-de-internautas-defende-dunga-na-briga-contra-a-globo.shtml Acesso em: maio 2012
63
3.2. O marketing para promover o esporte
No Brasil, apesar da intimidade com a modalidade que o fez se autodenominar
„‟o país do futebol‟‟, ainda faltam investimentos em diversos setores, como é o caso do
marketing. Mesmo com o aparente movimento de profissionalização ocorrido
principalmente na última década, o futebol brasileiro sofre com o amadorismo. Para o
ex-jogador brasileiro e atual técnico da seleção do Iraque, Zico, a falta de compromisso
e visão a longo prazo dos dirigentes faz com que, muitas vezes, a gestão fique sem
planejamento e isso resulte em complicações financeiras como as que vemos hoje,
além da desigualdade e influência política que ainda atrapalham o esporte quando se
avalia a credibilidade para estabelecer parcerias (AREIAS, 2007, p.27).
Aqui é importante ressaltar que a precariedade nos investimentos em marketing
afeta o processo de decisão de todos os consumidores, sejam eles homens ou
mulheres, ainda que a participação do primeiro público esteja mais consolidada.
A fim de explorar o produto esportivo de maneira mais profissional, diversos
esforços no setor têm sido feitos por clubes brasileiros como Internacional (RS),
Grêmio (RS), São Paulo (SP) e Corinthians (SP). Este último vem trabalhando de
maneira forte e contínua, desde a nomeação, em 2007, na gestão de Andrés Sanchez,
do diretor de marketing Luís Paulo Rosenberg. A primeira campanha de sucesso
lançada foi a „‟Eu nunca vou te abandonar‟‟, criada a partir dos gritos da torcida em
apoio ao time que acabava de ser rebaixado à segunda divisão do Campeonato
Brasileiro. O kit contendo camiseta, adesivo e pulseira surpreendeu a todos e esgotou
o seu primeiro lote de mil exemplares nas seis primeiras horas de venda.
Desde então, foram criadas mais camisetas, programa de sócio-torcedor,
cruzeiros marítimos, acampamento de férias oficial, e contratação de estrelas como o
jogador Ronaldo, uma série de ações que fortalecem a identificação do torcedor com o
clube.
64
Os princípios básicos usados por eles e outros clubes para agregar valor à
organização, segundo teóricos, envolve o trabalho com os 4 P‟s (quadro 1), sempre
levando em consideração o contexto diferenciado do esporte.
O primeiro a ser analisado, portanto, é o produto esportivo. São dois os tipos: no
primeiro, o produto é a própria competição esportiva, como seria um jogo de futebol, e
carrega as características de serviço citadas anteriormente – intangibilidade,
inseparabilidade, heterogeneidade e perecibilidade. No segundo, fala-se do
merchandising esportivo, como é o caso das camisas de futebol, ou de um ingresso
comprado. É difícil, porém, separar um item do outro, uma vez que o ingresso e a
camisa comprada geram expectativas com relação à experiência de compra, ou ao dia
da competição.
O consumidor pode ter contato com a competição esportiva, no caso o jogo de
futebol, seja através da mídia ou através do estádio, e este último é um dos maiores
problemas para a evolução da modalidade no País. Faltam arenas com estrutura
adequadas para receber os torcedores do clube, o que compromete a participação de
mulheres e crianças na competição.
Um boa referência nesse âmbito é a Inglaterra. O país bretão tem os ingressos
mais disputados do mundo e, em 2011, clubes como o Manchester United, Arsenal,
Manchester City e Tottenham atingiram a impressionante marca de 95% ou mais de
frequência do público em todos os jogos da temporada.
Foi lá que nasceu também um projeto inovador chamado Family Stand, criado
pelo Manchester City. A área com capacidade para 8.000 pessoas só pode ser
ocupada por menores de 16 anos e seus acompanhantes. Além de coibir o uso de
palavrões e tornar o programa mais familiar, ainda atrai parceiros focado no mercado
de crianças, como por exemplo a marca de chocolate Cadburrys, que possui um ponto
de venda dentro da área de serviços do Family Stand.
65
Outro ponto importante a ser trabalhado é a promoção, que é definida por Ray
(apud MORGAN e SUMMERS, 2008, p.217) como: „‟a combinação de todos os
esforços iniciados pelo vendedor para estabelecer canais de informação e persuasão
de modo que venda mercadorias e serviços ou promova ideias‟‟.
Ela nada mais é do que o direcionamento estratégico dos esforços de
comunicação de uma empresa para uma série de públicos-alvo, sejam eles internos ou
externos. As ferramentas básicas usadas para realizar uma promoção são conhecidas
como o mix de comunicação, que consiste em seis elementos que devem ser
trabalhados de forma estratégica e integrada. Myers (1994) ressalta que as
organizações esportivas podem fazer um bom uso dessa ferramenta para se comunicar
com o público feminino, uma vez que ele está mais propenso a responder a
mensagens de organizações quando estas são comunicadas através de diferentes
níveis e de maneira consistente.
Imagem 14: jovem torcedor do Manchester City assiste o time no Family Stand,
espaço reservado para as famílias
66
A venda pessoal é útil sobretudo para garantir patrocínios esportivos, e se
torna uma poderosa ferramenta se utilizada em conjunto com os outros elementos que
compõe o mix. O marketing direto pode ser feito através de telefone, correspondência,
mídia de massa, internet, ou outras mídias interativas, importantes no cenário atual sob
diversos aspectos.
Já a promoção de vendas pode ser aplicada tanto para o público interno quanto
para o público externo. No primeiro caso, é comum que ela seja usada para incentivar
equipes internas de vendas, oferecendo, por exemplo, lugares para as pessoas
assistirem ao espetáculo (muitas vezes em camarotes especializados); no segundo, é
comum que ela seja usada em conjunto com os patrocinadores (item 3.3), em ações
que incluem amostras, concursos, programas de lealdade, etc.
A publicidade provavelmente é o mais conhecido deles, ainda que ela seja mais
utilizada pelo investidores esportivos. Ela pode ser utilizada para divulgar eventos,
produtos, ou mesmo os seus jogadores em pontos-de-venda de mídias de massa,
como rádio, televisão e jornais.
Quadro 2: mix promocional esportivo
Fonte: MORGAN, M.J.; e SUMMERS, J. 2008
67
A maior tendência das organizações esportivas, porém, não está no uso da
publicidade, e sim do patrocínio (item 3.3) e das relações públicas. Esse recurso é
definido por Shank e Simon (apud MORGAN e SUMMERS, 2008) como:
„‟uma função de gerenciamento para avaliação de atitudes públicas,
identificação de políticas e procedimentos de uma organização quanto ao
interesse público, e execução de programas de ação (e comunicação)
elaborados para conquistar a compreensão e a aceitação públicas. É também
utilizado no estabelecimento e na manutenção de relações mutuamente
benéficas entre organizações e seus vários públicos (SHANK e SIMON apud
MORGAN e SUMERS, 2008, p. 236)‟‟
A publicidade, nesse contexto, seria um dos recursos das relações públicas para
gerar comunicação com os diversos públicos que se relacionam com a organização
esportiva (item 3.4.). Ela pode contribuir tanto para o desenvolvimento da marca quanto
para precaver ou reparar possíveis crises que possam prejudicar a marca ou a imagem
das celebridades esportivas.
O gerenciamento de imagem se torna, inclusive, uma prática cada vez mais
comum no Brasil, com a chegada de inúmeras agências especializadas no assunto. A
agência 9ine atualmente desenvolve esse trabalho focado em captação de patrocínio e
assessoria de imprensa, cuidando de atletas de ponta como Neymar (Santos), Lucas
(São Paulo) e Leandro Damião (Internacional). Estes podem se desenvolver como
porta-vozes não só de outras organizações, mas também de causas sociais e de
valores, contribuindo até mesmo para a democratização do esporte, como será visto
mais adiante.
Em resumo, as funções de RP, segundo Morgan e Summers (2008) podem ser
as seguintes: desenvolver entusiasmo ou interesse por determinado mercado, criar
notícias sobre produtos e serviços; apresentar informações sobre produtos ou serviços;
agregar valor ao serviço do cliente; construir lealdade à marca; e defender determinada
marca ou imagem corporativa.
68
Como a marca está presente em uma série de mídias diversas, é importante que
esse profissional esteja em contato com elas e com as novas tendências. Um dos
movimentos que têm sido observado, por exemplo, é a busca dos consumidores
esportivos por informações em meio eletrônicos cada vez mais frequente.
Em pesquisa realizada pela Globoesporte em 2012, 91% dos entrevistados
confirmou que a internet revolucionou a maneira de acompanhar esportes, e vale
destacar que a audiência feminina de futebol atinge o índice de 39%37. O uso da
internet é, inclusive, um meio que as empresas têm de customizarem as ofertas para
seus diferentes públicos.
Além dos sites oficiais dos clubes, hoje é comum que as pessoas que
compartilham dos mesmos gostos ou que têm as mesmas características se agrupem
em comunidades. No caso das mulheres, ferramentas que possibilitam interação social
são as mais populares. Sloan (2001) relata que, por esse motivo, duas das principais
atividades delas na web são usar e-mail e chats. Além disso, procuram artigos sobre
carreira, finanças pessoais, família, saúde e bem-estar; todos itens que suprem a
necessidade delas de se conectarem com outras mulheres, questionarem e terem
respostas, e fazer tudo isso com muita cautela e muitas informações (item 3.4).
Uma prova mais recente da valorização das interações por parte do público
feminino é a popularidade das redes sociais com elas. As mulheres buscam as redes
para expandirem o seu „‟círculo de influência‟‟ e para trocarem experiências com outras
pessoas, indo além dos seus lares (item 3.4). É mais do que apenas entretenimento, as
mídias sociais têm benefícios funcionais. Em pesquisa realizada em 2011, a Nielsen
estimou que existam, em média, 200 a 300 fóruns de discussão exclusivos de mulheres
ao redor dos mercados mundiais (sem contar blogs individuais), nos quais elas se
conectam com outras para discutir questões que vão desde a vida familiar, gestão de
carreiras, até saúde e bem-estar.
Por observação, percebeu-se que são grandes os números de comunidades
femininas ligadas ao futebol, ou de mulheres que se manifestam nas redes em grupos
37
Pesquisa Futebol Internet 2012. Globoesporte.com Acesso em: abril 2012
69
de clubes. Elas aproveitam o espaço para encontrar outras mulheres que compartilham
o mesmo gosto e também para se legitimarem como espectadoras ou praticantes da
modalidade.
Atentos a essa tendência e ao aumento da participação da mulher na vida
esportiva (como praticante ou espectadora), o mercado norteamericano começou a
traçar estratégias de inclusão e fidelização em esportes populares como o beisebol e o
futebol americano. Vale lembrar que, no país, essas são as modalidades originalmente
masculinas, uma vez que o futebol se configurou como um esporte feminino. Estima-
se, hoje, que as americanas representem quase metade das espectadoras do Super
Bowl38, e que 46% do consumo de produtos oficiais da National Football League vem
delas. Além disso, elas são um terço da audiência adulta da programação da ESPN
Sports.
A campanha da NFL para atrair e fidelizar torcedoras incluiu iniciativas ligadas à
educação com relação ao jogo, envolvimento em causas sociais e criação de conteúdo
direcionado para elas. Foram elaborados seminários exclusivos para elas que
contaram com a participação de aproximadamente 12.000 mulheres no ano 2000.
Neles, falava-se sobre estratégias de futebol americano e regras do jogo, sobre a vida
no NFL, a história do futebol americano, os equipamentos usados, regras, dicas na
hora de assistir o jogo, além da realização de um tour pelo estádio, com direito a visita
aos vestiários e sala de imprensa. Jogadores e ex-jogadores compareciam nas
palestras como porta-vozes do esporte, e uma parte do dinheiro da inscrição era doada
para instituições de caridade. Para atingir camadas mais jovens, além disso, eram
incentivados campeonatos escolares, fazendo com que mulheres tivessem o primeiro
contato com o esporte desde jovens.
Visando agregar ainda mais valor da marca com o público feminino, a NFL
passou a patrocinar uma fundação que lutava contra o câncer de mama, causa social
que sensibiliza as mulheres (item 3.4.). Para manter a comunicação constante com as
38
Jogo de futebol americano no qual se decide o campeão nacional. Disputam ele os campeões da NFC (Conferência Nacional de Futebol) e do AFC (Conferência Americana de Futebol), ambos conferências da NFL (Liga Nacional de Futebol)
70
espectadoras, utilizou-se da tradicional publicidade e criou conteúdo exclusivo na web.
No site, foi criada uma seção entitulada „‟NFL para elas‟‟ que, durante a temporada de
2011, apresentava semanalmente torcedoras do futebol americano competindo de
maneira divertida pelos melhores looks, sempre fazendo alusão ao confronto em
campo. O site também mostrava vídeos cômicos falando sobre rivalidade, muitas vezes
estrelados por mulheres que tinham alguma ligação com a NFL (esposas, filhas e netas
de técnicos ou proprietários).
Já a Major Baseball League começou esse processo buscando entender quem
eram as suas espectadoras. Foram entrevistadas mais de 3 mil mulheres para
descobrir „‟o que elas entendiam do jogo‟‟, como o enxergavam. Dessa maneira,
perceberam a importância que as mulheres tinham nas decisões familiares, e que
portanto uma boa estratégia seria justamente engajá-las a consumirem o esporte e os
produtos ligados ao beisebol.
Para isso, eles viram que deveriam aumentar os canais de informação, bem
como os detalhes sobre a modalidade. Passaram então a divulgar mais histórias sobre
o beisebol, a dar informações mais detalhadas sobre o jogo, os produtos, os descontos.
Começaram a demonstrar de maneira mais direta o seu compromisso em promover
uma boa experiência para a família, de modo a atingir não só as mulheres com a
comunicação, mas também homens e crianças. Usaram personalidades esportivas
para falar com o público feminino, e se aproveitaram de programas televisivos e
publicações impressas consumidas por elas. As ações também incluíam promoções
em datas comemorativas como o dia das mães, hábito mais comum de ser encontrado
no caso do futebol brasileiro.
Uma constatação importante feita através da pesquisa elaborada pela Major
League Baseball foi a de que „‟as mensagens as quais as mulheres respondem não
necessariamente afastam os homens‟‟ (SLOAN 2000, p.31). Isso pode ajudar a
derrubar essa que é uma desconfiança quando se fala sobre marketing esportivo39
39
Levando-se em consideração modalidades consideradas masculinas, como futebol, lutas, beisebol e futebol americano
71
voltado para o público feminino, pois as mulheres tendem a precisar naturalmente de
informações mais constantes (item 3.4.).
3.3. O marketing do esporte a serviço de uma organização
O patrocínio esportivo é o último item do mix a ser discutido, sendo que este é o
terceiro maior meio de publicidade do mundo, atrás apenas da imprensa e da televisão.
Esse número não inclui o gasto adicional com a alavancagem que as empresas usam
para maximizar o dinheiro do patrocínio e que pode atingir um valor quatro vezes maior
que a despesa original com o acordo. (MORGAN e SUMMERS, 2008, p.288).
Com já foi dito anteriormente, essa é uma poderosa ferramenta para as
organizações não-esportivas, uma vez que relacionar seus produtos ao esporte e a
personalidades esportivas lhes confere emoções que elas mesmas, sozinhas, não
conseguiriam criar. Isso porque o consumidor encontra essa marca em um ambiente de
consumo altamente emotivo que caracteriza o futebol.
No Brasil, a primeira vez que as duas coisas se uniram foi em 1930, quando
Assis Chateaubriand, dono da empresa Lacta, deu a um dos chocolates da sua marca
o nome de Diamante Negro, apelido do ídolo Leônidas da Silva (AREIAS, 2007, p.17).
Hoje essa prática é comum, expandindo-se para diversas formas existentes de
patrocínio, que vão muito além de uma simples atividade promocional. Para MORGAN
e SUMMERS (2008), o patrocínio esportivo deve „‟estar embutido na estratégia
empresarial e ser executado por meio de propostas de valor de marca‟‟.
Dessa maneira, ele se torna uma plataforma de marketing que pode ser ativada
e integrada no mix de marketing, aumentando a efetividade de uma série de atividades
de marketing para ambas as partes da aliança. Nessa visão é possível, por meio do
esporte, traçar um empreendimento em conjunto que dê um bom retorno para todos.
72
Para as autoras, os principais objetivos dos patrocinadores, ao fazerem esse
acordo, são: criar conhecimento do produto ou da marca, mudar ou reforçar a imagem
de marca, aumentar a fidelidade à marca, exibir responsabilidade com a comunidade,
estimular vendas, motivar funcionários e entreter clientes ou clientes potenciais.
Uma prática pouco frequente é que as marcas que se associam a esportes
masculinos busquem esses objetivos e concentrem esforços no público feminino. A
Procter&Gamble, patrocinadora da NFL, resolveu apostar nisso, e para criar
conhecimento sobre a marca de desodorizadores de ambiente Febreze, fez uma
campanha voltada para mulheres fãs do NFL, que representam um terço dos
espectadores assíduos.
A Febreze se engajou em uma missão que prometia ajudá-las a eliminarem
odores típicos de dias de jogo: roupas sujas para mães de atletas, asas de frango, alho
ou outros odores fortes que poderiam ficar na cozinha por conta dos pratos preparados
nos dias de jogo ou em festas de comemoração.
A campanha contou com a presença de Olivia Manning, mãe de dois
quarterbacks conhecidos da Liga e esposa de um ex-jogador, que falava como fazia
para manter o frescor na sua casa, sobretudo em dias de jogo. Além dos comerciais,
Olivia participava de uma exposição móvel em um ônibus da Febreze, na qual falava
com mulheres sobre como cuidar da casa nessas ocasiões e apresentava ela mesma
os produtos; para completar, postava conteúdo da fanpage da marca, com receitas e
outras dicas para preparar a casa nessas datas e receber amigos.
Imagem 15 e 16: desodorizador Febreze, patrocinador da NFL, faz campanha focada no
público ferminino
73
No caso de empresas ligadas ao esporte como a Nike e a Adidas, essa conexão
e esses objetivos tomam forma de maneira mais óbvia do que outras empresas que
atuam em áreas diversas; estas devem estudar essa compatibilidade com o esporte e
seus mercados-alvo, para que a associação seja positiva e efetiva.
A Nike, por exemplo, patrocina diversas equipes ou atletas femininas, como a
seleção americana feminina de futebol, e recentemente se aproveitou da fama da
goleira Hope Solo para incluí-la em uma campanha voltada exclusivamente para o
público feminino veiculada nos EUA. Nela, Hope fala sobre a sua relação com o seu
trabalho e a sua dedicação para se tornar a número 1 naquilo que faz. Esse comercial
faz parte de um extenso trabalho que a Nike vem fazendo desde o início da década de
90 para atingir o público feminino.
A marca começa com a campanha entitulada „‟Dialogue Campaign‟‟, na qual
falava sobre os ganhos emocionais e físicos que as mulheres teriam ao praticar
esportes. Para saber o que as mulheres precisavam, a organização conduziu uma série
Imagem 17: goleira da seleção americana de futebol, Hope Solo, posa para campanha
realizada pela Nike com foco em mulheres
74
de entrevistas em profundidade, focus group, e procurou entender como seu público
feminino pensava, a quais mensagens respondia, e o que lia todos os dias na
publicações femininas (MYERS apud SLOAN, 2001, p.29).
Tal iniciativa chegou inclusive a enfrentar alguma resistência masculina, que
dizia não entender o porquê de uma campanha voltada exclusivamente para mulheres,
e receava perder mercado masculino por concentrarem esforços no feminino. Ela se
revelou certeira, porém, quando a Nike aumentou sua força com o aumento da
participação de mercado.
A campanha foi evoluindo, a Nike abriu um canal exclusivo para o público
feminino e hoje participam dos comerciais da marca, atletas femininas de diversas
modalidades - dançarinas, lutadoras, patinadoras, jogadoras de futebol – que falam de
maneira abrangente de estilo de vida, sonhos e realizações. As campanhas se
tornaram populares justamente por conversarem com as mulheres, e trazerem à tona
reflexões profundas, fatores que são apreciados pelo público feminino, como será visto
no item a seguir.
Aproveitar-se do patrocínio de atletas é, inclusive, um hábito comum no futebol.
Jogadores como Neymar e Ronaldo recebem cifras milionárias para estrelar
campanhas de produtos pertencentes a diversos setores. A presença de atletas do
futebol feminino brasileiro não é tão comum nesse caso, principalmente pelo fato de a
mídia explorar pouco a imagem das jogadoras. Uma exceção é a jogadora Marta que,
eleita por diversas vezes a melhor do mundo, vai estrelar campanhas publicitárias da
Coca-Cola até a Copa de 2014. Ela não só estará nos anúncios da marca, mas
também ajudará a promover a Copa Coca-Cola, um torneio de futebol para
adolescentes no País.
De fato, uma vez feito o investimento, é necessário potencializá-lo através de
ações de ativação, como foi feito no exemplo da NFL e da P&G. No geral, recomenda-
se que ao planejar o orçamento das atividades de alavancagem, seja reservado US$ 2
para cada US$ gasto ao adquirir o esporte (MORGAN e SUMMERS, 2008, p.343).
75
A agência Namosca criou para a Adidas, patrocinadora oficial do Palmeiras, em
2008, uma ativação promocional que proporcionou uma experiência para os torcedores
com a marca e ainda gerou considerável mídia espontânea, envolvendo também as
torcedoras do clube. Dez torcedores que estivessem vestindo a camisa oficial dentro do
estádio ou que acertassem mais respostas de um quiz sobre a história do clube no dia
anterior ao da partida tinham a oportunidade de entrar em campo no intervalo do jogo
para bater uma falta com uma barreira montada e um goleiro profissional. Aos que
acertassem, era dado um prêmio de R$ 1.000 em produtos da marca. Para o dia
internacional da mulher daquele ano, prepararam uma edição especial da ação, na qual
seriam selecionadas dez mulheres para participarem da cobrança de falta40.
3.4. O consumidor do futebol
Para que todas as ações anteriores fossem efetivas, foi necessário entender,
além dos princípios já detalhados, quem era o consumidor com quem a organização
estava falando.
São inúmeras as variáveis que compreendem o processo de escolha do
consumo esportivo. Por isso, é importante que sejam feitos estudos para entender
quem são eles e como, quando, onde e por que eles tomam determinadas decisões de
compra.
O consumo esportivo pode acontecer de duas formas: indiretamente, quando se
assiste por um jogo pela televisão, ou se ouve pelo rádio, ou se lê ao seu respeito em
um jornal ou revista; e diretamente, quando se assiste pessoalmente a um jogo ou se
participa de um esporte.
A tomada de decisão pode ser rápida e direta ou mais lenta e complexa, o que
acontece principalmente quando o consumidor tem falta de experiência com o produto
40
Agência Namosca cria ‘’Lances Impossíves’’ para Adidas. Site Vox News, março de 2008 Disponível em: http://www.voxnews.com.br/dados_noticias.asp?codnot=57168 Acesso em: abril 2012
76
ou quando ela apresenta algum risco. No Brasil, o maior risco relacionado ao
comparecimento em estádios de futebol é o classificado como físico, e pode ser
traduzido pela preocupação com a violência (MORGAN e SUMMERS, 2008, p.103).
Caso o estádio não ofereça condições adequadas, o comparecimento do público pode
ficar comprometido, principalmente quando se trata de mulheres e crianças (item 1.4.).
O processo de decisão do consumidor é, como um todo, uma influência de
fatores internos ou psicológicos com fatores externos ou sociais. Os fatores internos
são uma junção de personalidade, com percepção e aprendizagem, e o fornecimento
de informação da marca exerce influência em todos eles. Se um clube construir a
imagem do espetáculo esportivo como um programa seguro e familiar, por exemplo,
isso irá moldar a percepção e a aprendizagem do indivíduo, engajando-o a ir ao estádio
e, por consequência, fortalecendo sua relação com à marca.
Já os fatores externos ou sociais dizem respeito à cultura do indivíduo, aos
grupos de referência, e às influências situacionais. O grupo de referência mais
importante para qualquer consumidor é a família. Em recente pesquisa divulgada,
revelou-se que dos mais de 120 milhões de brasileiros que torcem para algum time de
futebol, 63% ouviu falar a primeira vez de futebol em casa, e mais da metade deles
escolheu o seu time justamente por influência de alguém com quem convive no círculo
familiar (pai, irmão, tio, ou marido no caso das mulheres)41. É natural que a influência
masculina seja predominante nesse sentido, já que se fala de gerações nas quais a
concepção do futebol como um universo masculino não era discutida.
Durante muito tempo, estudar o público consumidor de esportes como beisebol,
futebol americano e futebol era sinônimo de estudar os homens torcedores do esporte.
De acordo com Branch (apud SLOAN, 2001, p.4), por muitos anos, a indústria do
marketing esportivo acreditou que a comunicação do esporte não poderia ser voltada
para mulheres, pois elas não seriam capazes de ser „‟atletas sérias, entendidas do
jogo‟‟, ou por que elas viam os eventos esportivos como um lazer para homens,
assistindo partidas somente para fazer companhia para maridos ou namorados.
41
Pesquisa Lance!NET, maio de 2010. Disponível em: http://issuu.com/rafaelmazzari/docs/outro?mode=window&pageNumber=2 Acesso em: abril 2012
77
A essa ideia da mulher como figura distante do cenário esportivo, soma-se o fato
que a indústria esportiva, assim como tantas outras, sempre foi controlada por homens,
o que fez com que as práticas e opiniões mais difundidas sobre essa questão fossem
sempre essencialmente masculinas (item 2.3).
As constantes mudanças no papel da mulher na sociedade, porém, fazem com
esse setor não possa mais ignorar a presença do público feminino. Hoje, mulheres em
todo o mundo estão extrapolando seu papel tradicional e influenciando as decisões nos
seus lares, nos negócios e na política.
Existem dois aspectos nesse movimento: o da independência feminina, à
medida que a mulher tem mais liberdade para tomar decisões relativas a sua vida e a
sua carreira, e o do papel da mulher no núcleo familiar, uma vez que atualmente cresce
o poder dela em influenciar as decisões tomadas para a casa, envolvendo filhos e/ou
marido.
Quando se fala do segundo, fala-se frequentemente de responsabilidades
compartilhadas. A decisão de atividades sociais, como seria a ida a participação no
espetáculo esportivo, por exemplo, para 61% dos entrevistados independe do
gênero42. Entendendo o universo feminino, portanto, os profissionais de marketing
esportivo podem influenciar como as famílias investem o seu tempo de lazer, e de que
maneira investem o seu dinheiro nesse setor.
Especificamente no caso do futebol, a influência das mães pode, inclusive, ser
negativa. Isso porque as mulheres segundo Sloan (2001), tem como característica a
preocupação de „‟cuidar dos outros‟‟, e o sentimento cristalizado de insegurança e falta
de estrutura faz com que muitas delas tenham um pré-conceito com relação à
modalidade, desincentivando a participação da família em atividades do gênero por
medo de envolvimento com violência, o que demanda um trabalho diferenciado com
esse universo.
42
Pesquisa NIELSEN, junho de 2011. O índice diz respeito aos países emergentes, como é o caso do Brasil. Nos países desenvolvidos, ele sobe para 73%
78
E afinal, como se configura esse universo feminino? Será que ele é mesmo tão
diferente do masculino? O primeiro ponto que é importante abordar quando se faz essa
construção, é que a busca da mulher por igualdade em territórios masculinos não quer
dizer que a estratégia de marketing não deve ser diferenciada, pois o seu
relacionamento com as organizações é distinto. Para Myers (1994), na hora de criar
campanhas, deve-se levar em consideração as características únicas da mulher,
respeitando suas semelhanças e diferenças com relação aos homens, o que demanda
estratégias especiais como as adotadas pela NFL e pela MJB americanas (item 3.2.).
Horwarth (apud SLOAN, 2001, p.21) sugere que seja aberto um diálogo contínuo
com as mulheres, começando pelas funcionárias, pois estas podem trazer uma boa
percepção sobre o universo feminino e dizer como se sentem com relação a
determinados produtos.
Howell (apud SLOAN, 2001, p.18), por sua vez, acredita que as organizações e
marcas que queiram atingir as consumidoras mulheres devem demonstrar habilidade
não só em entender o estilo de vida e interesses desse público, mas em mostrar como
a imagem e o direcionamento da companhia são compatíveis com o estilo de vida e as
mudanças que elas vivem.
O marketing relacionado a causas sociais, por exemplo, é um jeito efetivo de
atingir o público feminino. Essas causas podem ser relacionadas à própria figura
feminina, como o apoio da NFL ao Instituto de Câncer de Mama (item 3.2.), mas
também podem ser causas que elas acreditam e que as sensibilizem, como aquelas
relacionadas a crianças, à família.
As mulheres se preocupam em buscar marcas que sejam íntegras ao mesmo
tempo que apresentem um bom custo/benefício, que sejam compatíveis com elas, e
por isso buscam mais informações na hora de tomar decisões, fazendo-o de maneira
cautelosa (HOWARTH apud SLOAN, 2001, p.24).
Uma vez feita a escolha, elas têm por natureza a característica de
compartilharem as suas experiências, e de serem fãs mais leais às suas marcas. O
quesito relações sociais é um dos que mais diferem entre os gêneros. A mulher gosta
79
de marcas que se atentem a essa característica, e tende a compartilhar mais
pensamentos, sentimentos e impressões com as pessoas do que os homens que, por
sua vez, se atêm mais a itens tangíveis e compartilham a experiência com menos
pessoas (item 3.2.). Elas são também mais sensíveis ao tratamento que recebem, e
caso a percepção seja positiva, tendem a formar um laço com a marca, tornando-se
porta-vozes da organização.
As espectadoras são interessadas em um número maior de assuntos ligados ao
esporte que os homens – elas gostam de saber a história dos jogadores, do clube,
aspectos mais „‟humanos‟‟ que estatísticas de jogos ou número de títulos, e esperam
que a organização esportiva tenha essa informação direcionada a ela de forma
facilitada e espontânea, sem que ela „‟tenha que perguntar‟‟. A „‟humanização‟‟ do
esporte explorada pela mídia já facilita esse movimento naturalmente.
Em pesquisa realizada por Sloan (2001), as mulheres confirmam as teorias
acima e listam, por ordem de importância, os dez pontos que elas acreditariam que
melhoraria a percepção feminina sobre o esporte. São eles: educar as mulheres sobre
o jogo, comunicar-se falando em crianças (que atinge mães), dar descontos e
promoções, estreitar relações com comunidades, focar-se em publicações femininas,
agir na web (através de sites e redes sociais), contratar mais mulheres para cargos
administrativos no esporte, oferecer mais artigos esportivos ou produtos licenciados
femininos e, por último, a publicidade tradicional e os esforços de marketing tradicional
(por tendência, mais masculinos).
Como se pode ver, a NFL e a Major League Baseball (item 3.2.) se atentaram
justamente a essas características particulares do gênero feminino na hora de
desenvolver o seu produto esportivo e aplicar o mix de promoção.
Além das diferenças, é importante destacar que existem também as
semelhanças. O consumo esportivo está baseado na união de ideias, pois ele permite
aos indivíduos compartilhar algo com os outros na comunidade, de igual para igual,
independentemente da posição social, idade ou sexo. De acordo com Voight e Beisser
(apud MORGAN e SUMMERS, 2008):
80
„‟O esporte permite aos consumidores estabelecer ligações com outros que
poderiam ser chamados de „‟conhecidos socialmente distantes‟‟ (como
conhecido de trabalho ou de um evento social). Isso é possível, pois o esporte
constitui um interesse comum, que pode ser livre de estigmas ou restrições
sociais.(VOIGHT e BEISSER, apud MORGANS e SUMMERS, 2008, p. 18)‟‟
No caso do futebol brasileiro, para ambos, homens e mulheres, a modalidade é
ao mesmo tempo um fator de diversão e educação, e a razão de ela ser a preferida
entre tantas é devido ao fato de ser considerado um esporte emocionante.
Independentemente do sexo, o futebol atrai pela imprevisibilidade, e nutre o sentimento
de pertencimento que as pessoas necessitam sentir.
Cabe ao profissional de marketing levantar os pontos de divergência e
convergência entre os gêneros, realizando pesquisas para identificar quais as
necessidades de cada um deles e de que maneira eles se relacionam com a marca, a
fim de tornar o espetáculo esportivo um programa democrático e familiar.
81
4. Quando a torcedora ganha os holofotes no Brasil
4.1. No marketing pelo esporte
Alguns clubes brasileiros já perceberam essa oportunidade e começaram a
estudar o contato do universo feminino com o futebol, de modo a fidelizar cada vez
mais fãs e trazer para a modalidade um caráter mais democrático e seguro. Devido à
escassez de pesquisas completas sobre essas iniciativas, será feito, nesta última
etapa, um levantamento de algumas iniciativas que foram encontradas em diversos
clubes através de notícias veiculadas na mídia sobre o tema.
Vale ressaltar que é difícil encontrar estratégias sólidas ou pesquisas detalhadas
no Brasil sobre uma tema, uma vez que ele começou a ser colocado em evidência há
pouco tempo e muitas vezes de maneira pontual.
Os clubes que têm mais preocupação com a torcedora mulher na hora de traçar
a sua estratégia de marketing estão concentrados na região sul do País, onde, por
consequência, está também a maior concentração de torcedoras com participação
ativa nos espetáculos e na vida dos clubes de futebol.
O Avaí (SC) é um dos clubes que possui mais estratégias nesse sentido,
comunicando-se com a figura feminina através de diversos canais e níveis. As ações
vão desde traçar planos para as torcedoras, até colocar mulheres para participar de
sua gestão. Em entrevista concedida ao LANCE!NET, o presidente do Avaí, João
Nilson Zunino, explicou o porquê o clube percebe o crescimento importante no volume
de associações femininas:
„‟Isso se deve a diversos fatores: ser uma terra de gente bonita que tem no futebol um assunto de todas as casas, ser o Avaí um clube frequentado por famílias (o pai traz a mãe, filhos e filhas para o estádio), termos um estádio
82
amigável ao público feminino, discurso integrador em toda a estratégias de marketing e comunicação, ter mulher entre os seus diretores, termos quase 40% dos funcionários do sexo feminino (exceto o futebol) e, tradicionalmente, valorizamos a mulher.‟‟
43
As torcedoras catarinenses fazem sua parte e usufruem desses benefícios. Elas
já são 40% dos seguidores do Avaí nas redes sociais e, no estádio, a presença
feminina já chegou a uma proporção de quatro mulheres para cada dez pessoas em
uma partida. Para João Nilson, as mulheres trazem „‟beleza e elegância à arena‟‟, e o
Avaí tem como objetivo valorizar a mulher catarinense que acompanha a equipe.
Uma iniciativa curiosa e que não está necessariamente vinculada ao futebol foi a
parceria com o estúdio fotográfico A3, no qual as torcedoras podem fazer books com
descontos. Os torcedores homens também podem usufruir desse benefício, ainda que
a iniciativa seja voltada ao público feminino.
Esses números altos também são vistos quando se fala do Grêmio, o seu
quadro de sócio-torcedoras já conta com 20 mil participantes mulheres (item 2.5.). O
clube ainda contou com uma iniciativa vinda das próprias torcedoras, que formaram o
Núcleo de Mulheres Gremistas (item 2.5.), de maneira que essa comunicação entre
clube e a torcida feminina estivesse mais presente. De acordo com elas, o clube tem se
preocupado em qualificar a segurança e as condições de higiene dos estádios, bem
como oferecer uma maior variedade de produtos femininos com a marca do clubes,
que contribui para o processo de fidelização das torcedoras.
Um problema, porém, que ainda é observado, é a questão da participação da
mulher nas esferas de gestão e administração do Grêmio, pois o preconceito dos
dirigentes e grupos políticos do clube ainda é forte, o que pode ser comprovado quando
se observa a formação do Conselho Deliberativo do Grêmio, que possui 320 cadeiras e
apenas 4 mulheres que integram esse órgão.
O Grêmio chegou inclusive a estruturar um projeto pioneiro de criação do
Departamento da Mulher Gremista, que abriria „‟um espaço físico e administrativo
43
AMARAL, Flávio. Ação do Avaí promete levar mulheres para a Ressacada. Lance!NET, março de 2011. Disponível em: http://www.lancenet.com.br/avai/Avai_0_437356501.html#ixzz1wDGvAapH Acesso em: maio 2012
83
dentro do clube voltado exclusivamente para receber e valorizar a participação da
mulher na vida esportiva, social e política do clube‟‟, mas que não se desenvolveu
devido ao pouco interesse dos dirigentes que comandavam o Grêmio na época. Para
elas, a criação desse departamento seria a forma mais eficiente de aproximar e trazer
novas torcedoras:
„‟Este departamento teria todo seu foco voltado para estudar e analisar o perfil da mulher torcedora, propiciando assim, que fosse desenvolvidas ações específicas, voltada para este nicho que ainda é tão pouco explorado pelos clubes de futebol. Outro aspecto relevante é que este Departamento da mulher poderia ainda, desenvolver atividades voluntárias de cunho social que, com certeza, trariam mais projeção ao clube.
44‟‟
Ainda que sejam necessários avanços entre a relação do clube com as
torcedoras, o Núcleo de Mulheres Gremistas conseguiu obter prestígio e respeito por
parte da diretoria do Grêmio, o que faz com que a questão feminina seja mais presente
no clube.
O vice-presidente de serviços especializados do Internacional, Luciano Busatto
Davi, afirmou que o clube também está montando uma comissão feminina. O
Internacional inaugurou, em 2007, o Espaço Mulher Colorada no Beira-Rio. Ele dá
atenção ao lado social do clube, servindo como um local de convívio das torcedoras
com cursos, palestras, e encontro delas, que ali podem organizar atividades como
visitas regulares a instituições e hospitais, para dar apoio e levar brindes do clube às
mães coloradas e aos bebês. No dia das mães, organizaram um tour especial pelo
Beira-Rio e um almoço de confraternização. O espaço também dá apoio às esposas
dos jogadores recém-contratados.
44
JACQUES, Marisa. Entrevista concedida por e-mail no dia 28/05/2012
84
Além disso, o Internacional promoveu mudanças para oferecer mais conforto e
segurança para as suas torcedoras que frequentam o estádio. Banheiros amplos, bem
iluminados e com espelhos, fraldários e mais câmeras de segurança foram algumas
das mudanças que ajudaram o clube a ampliar o número de sócio-torcedoras, que hoje
representa 22% do quadro geral (item 2.5.).
Imagem 18: Espaço da Mulher Colorada leva mães para visitarem o Beira-Rio e comemorar o dia das mães.
Imagem 19: Banheiros femininos reformardos no Beira-Rio, estádio do Internacional (RS)
85
O Figueirense, para chamar a sua torcedora ao estádio, elaborou uma
modalidade de associação exclusiva para elas, com 33% de desconto nas
mensalidades. Em 2009, o clube já contava com mais de mil sócias, e com 25% a 30%
de seus assentos ocupados por mulheres em dias de jogo45.
De acordo com o ouvidor da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Ronald
de Almeida, medidas devem ser tomadas para que as mulheres frequentem mais os
estádios:
„‟O incentivo à presença das torcedoras nos estádios de futebol é um dos fatores fundamentais para dinamizar a economia do futebol em geral e, sobretudo, para ensejar mais paz nos estádios e, por certo, mais charme e beleza, como vemos nos torneios de hipismo, tênis, vôlei, golf e fórmula 1, dentre tantos outros de alto nível‟‟, diz Ronald.‟‟
46
Estima-se que hoje 6% das mulheres brasileiras com mais de 16 anos vão ao
estádio47 e, para aquelas que não frequentam, os principais obstáculos são o
desconhecimento, o medo da violência e a falta de estrutura.
A participação da mulher no futebol nesse sentido, porém, vai além da
mobilização dos clubes. Prover condições e incentivos para que a mulher vivencie o
lazer através da participação em partidas de futebol é, segundo Campos (2010), uma
questão que demanda também a elaboração de políticas públicas. Ela ressalta que
essas políticas estão em construção sob diversos aspectos – saúde, segurança,
direitos morais, civis, sexuais e políticos mas que falta um olhar aprofundado quando
se fala de lazer. Este último, em teoria, está garantido pela Constituição Federal de
1988, mas será que, em se falando de espetáculo esportivo, são oferecidas as
condições necessárias para a participação da mulher? Será que apenas a influência da
45
RUY, Karine. Mulheres invadem estádios de futebol. Portal Futebol Feminino, março de 2009. Disponível em: http://www.portalfutebolfeminino.com/index.php/campo/mulheres-invadem-estadios-de-futebol Acesso em: maio 2012 46
Idem 47
Idem
86
mídia e dos negócios, como foi falado até agora, são suficientes para que essa questão
seja resolvida? De acordo com a autora (2010):
„‟(In)felizmente, muitas vezes, as mudanças no comportamento humano ocorrem via leis e decretos que fazem cumprir as reinvindicações de grupos sociais, daí a necessidade de políticas públicas adequadas a todos os segmentos da população, já que as estruturas sociais e culturais não são mudadas de uma hora pra outra, mesmo que por meio de decretos (CAMPOS,
2010, p.12)‟‟ .
Para que isso aconteça, porém, é também necessário que sejam feitas
pesquisas mais aprofundadas, afim de entender quem são essas mulheres, e qual a
melhor maneira de incluí-las no espetáculo esportivo.
4.2. Nos produtos
Como já foi exemplificado no decorrer do trabalho, uma das formas mais
comuns de consumo é a compra de produtos que estejam associados à organização
esportiva; nesse caso, ao clube de futebol. O mais comum são as camisas oficiais, mas
hoje essa oferta se expandiu e são oferecidos produtos de inúmeras categorias, que
ajudam o torcedor a construir aumentar o seu sentimento de pertencimento ao clube.
De olho no crescente mercado feminino, esse é o aspecto mais consolidado
quando se fala de marketing esportivo, pois a maioria dos clubes brasileiros já ampliou
o seu portfólio para as torcedoras.
No Avaí (SC), estão incluídos na estratégia os mais diversificados produtos. São
oferecidas duas opções de baby look nas lojas oficiais do clube, além de calça legging
87
e bermuda. De acordo com o gerente das lojas oficiais do Avaí, Bruno Koerich de
Paula, o público feminino é mais exigente que o masculino48.
No final de 2011, o clube lançou uma linha exclusiva de roupas femininas com
marca do Avaí, e promete aumentar a oferta com uma nova coleção em 2012/2013 de
mais de 30 produtos em parceria com a Fanatic, lançada no maior evento de moda de
Santa Catarina, com a participação do presidente e dos principais atletas do clube,
tanto na plateia como na passarela.
Além das roupas, possuem uma coleção de bijuterias , e tem em seus planos o
lançamento de perfumes e kits de maquiagem. Hoje são mais de 1.700 produtos
licenciados, e a categoria de produtos femininos sempre esteve presente com
inovações.
Já segundo João Basílio, gerente da Grêmio Mania do Olímpico, cerca de 40%
do faturamento da loja é oriundo da venda de artigos femininos, sendo que há dez anos
ele não chegava nem a 1% (item 2.5.). O site, assim como de tantos outros clubes,
possui uma seção „‟feminina‟‟, com a oferta de inúmeros produtos, que vão desde a
linha oficial, até acessórios como sacolas, necessaire, porta-batom, bolsas e mini-
bolsas, além de biquínis, roupas íntimas, calçados, jaquetas, e óculos de sol femininos.
Entusiasmado com a participação feminina nas vendas, o diretor executivo de
marketing do Grêmio, Paulo César Verardi, no lançamento do quarto uniforme, trouxe
48
Idem ao 3
Imagem 20 e 21: camisa baby look do Avaí e bijuteria feminina de pele para as torcedoras
88
uma „‟inovação‟‟ para as torcedoras, um shorts com modelagem especial, a exemplo da
camiseta.
Na loja Inter Sport do Beira-Rio, segundo o gerente Gilberto Lopes Ferreira, a
proporção de consumidoras é a mesma que na Grêmio Mania, e com isso cresce a
preocupação em oferecer produtos variados e de qualidade para elas, a começar pelas
camisas femininas do Inter para torcedoras. O Figueirense não ficou para trás e hoje
oferece cinco modelos de baby look e camisetas com corte especial para elas.
Essa oferta, porém, não se restringe ao sul, e é observada por todo o Brasil. Na
loja do Sport Recife, 30% da clientela é feminina, e isso se reflete em produtos49. Em
São Paulo, clubes como Corinthians, São Paulo, Palmeiras e Santos oferecem além
das camisas oficiais tipo baby look, camisetas com modelagem feminina para o dia a
dia, agasalhos, calças, bijuterias e moda íntima.
49 Reportagem Bom dia Brasil. Mulheres fanáticas por futebol lotam estádios e têm torcida própria. Disponível em: http://g1.globo.com/bom-dia-brasil/noticia/2012/03/mulheres-fanaticas-por-futebol-lotam-estadios-e-tem-torcida-propria.html Acesso em: maio 2012
Imagem 22 e 23: agasalhos como o do São Paulo e pijamas como o do Santos são alguns dos produtos que hoje são oferecidos às mulheres pelos clubes
89
O Vasco da Gama (RJ) lançou, para comemorar o dia dos namorados de 2012,
uma linha exclusiva de lingerie para as vascaínas. As nove peças foram feitas em
parceria com a empresa Sapeka, segundo a gerente de licenciamento do Vasco, Flávia
Mayrink, para que „‟as vascaínas se sintam bonitas ao usar os produtos‟‟. A garota
propaganda foi a atriz Desirée Oliveira, que é torcedora do clube, e o making of da
campanha foi publicado na VascoTV.
Pouco tempo depois, o Corinthians também anunciou uma parceria com a marca
Sapeka, e lançou sua própria linha de lingerie para as torcedoras do clube, tendo como
garotas-propaganda as irmãs gêmeas que foram eleitas musa e rainha da Gaviões da
Fiel. As peças foram colocadas à venda na megaloja do Poderoso Timão do Parque
São Jorge, e também no site da marca de lingerie.
Apesar da aparente evolução, observou-se, pela análise dos sites das equipes
citadas acima, que a oferta de produtos femininos ainda é muito menor que a de
masculinos, e que essas confecções nem sempre são feitas tendo como base a real
necessidade das mulheres, já que é considerável – 65%50 - a parcela que diz sentir a
falta de produtos ligados a futebol desenvolvidos para elas. De acordo com Hartmut
Zastrow, diretor-executivo da empresa de consultoria esportiva Sport+Markt,
comprovou-se através de pesquisa realizada em 21 países (incluindo o Brasil), que, na
média, as mulheres fãs de futebol consomem mais produtos ligados ao esporte do que
os homens, ainda que muitos clubes e campanhas ainda não explorem isso: „‟Os
clubes e as campanhas ainda não exploraram esse mercado, que tem muito potencial.
Acreditamos que as grandes marcas do mundo fashion, acessórios e joias, por
exemplos, poderiam trabalhar o futebol como tema de suas campanhas de
comunicação.‟‟, declarou Zastrow em entrevista.
Uma iniciativa curiosa que não está ligada a nenhum clube foi a do estilista
Edson Eddel que, aproveitando-se da temática futebol para vender seus produtos,
desenhou vestidos de noiva temáticos, que poderiam ser usados como segunda opção,
após o vestido tradicional. Ao que tudo indica, porém, algumas torcedoras se animaram
50
Pesquisa Sophia Mind, junho de 2010. Disponível em: http://www.sophiamind.com/pesquisas/consumo-pesquisas/futebol-uma-paixao-nacional/ Acesso em: maio 2012
90
para entrar vestidas com ele já na igreja. Segundo o criador, a noiva brasileira estava
sem opções criativas, e as lojas só ofereciam as mesmas opções de sempre, por isso a
ideia de inovar.
Os vestidos custam R$ 24 mil, mas quem desejar somente alugar pode fazê-lo
por R$ 12 mil na primeira locação, e R$ 8 mil da segunda em diante51.
4.3. Nas datas comemorativas
A maior parte dos clubes brasileiros se aproveita de datas dedicadas às
mulheres (dia internacional da mulher, dia das mães) para cativar o público feminino
com ações pontuais. Desde pequenas homenagens até concursos e premiações, essa
são as datas na quais são encontradas mais ações. Uma das alternativas mais
tradicionais é a não-cobrança pelo ingresso feminino, ou o desconto na compra.
O Grêmio, pensando no dia das mulheres, fez uma série de ações de
comemoração. Incluiu na sua homenagem a leitura da escalação feita pela cantora
Vanessa Marques, da famosa dupla gaúcha Claus e Vanessa , e o telão do estádio
apresentou o vídeo com a música „‟Mulher‟‟, do Erasmo Carlos. Os jogadores foram
acompanhados por 22 mulheres na entrada em campo, tradicionalmente feita com
crianças. A loja Grêmio Mania deu 20% de desconto às torcedoras; as sócias que
foram ao quadro social ganharam flores e, as cem primeiras a chegarem, maquiagem.
Por último, o departamento de marketing deu ao Núcleo de Mulheres Gremistas a
oportunidade de uma visita as obras da Arena do Grêmio, que está em construção.
O Avaí lançou o concurso chamado „‟Que sentimento é esse?‟‟, no qual
torcedoras deveriam enviar a resposta à pergunta com uma foto que demonstrasse o
seu amor pelo Leão da Ilha, caracterizada com camisa, bandeiras ou cores do time. A
torcedora que melhor conseguiu representar esse sentimento foi premiada com um
51
Reportagem Rede Record. Estilista lança vestidos de noiva temáticos de futebol, maio de 2012. Disponível em: http://rederecord.r7.com/video/estilista-lanca-vestidos-de-noiva-tematicos-de-futebol-4fc649e26b713616c5505477/ Acesso em: maio 2012
91
book digital do Stúdio A3 e um superposter, um kit com produtos licenciados do Avaí -
uma regata feminina, um creme ou shampoo, um espelho de maquiagem, uma lixa de
unha, uma canga e um biquíni – e uma blusa exclusiva que ainda não havia chegado
nas lojas. As outras quatro melhores ganharam o kit e, em uma extensão da promoção
no Facebook, duas torcedoras que tiveram suas fotos e mensagens com o maior
número de „‟curtir‟‟ receberam duas camisas oficiais.
As funcionárias do clube também foram homenageadas com café da manhã
especial, rosas e mensagens de agradecimento pela dedicação ao clube. O evento foi
organizado pela diretoria Social do Avaí, e contou com a participação com presidente
do clube, João Nilson Nizuno.
O Atlético-PR também preparou uma série de ações para todas as mulheres que
estavam em contato com o clube. As colaboradoras receberam rosas com a
mensagem "Hoje os olhares se voltam para quem traz mais beleza e força para o
nosso Furacão. Feliz Dia das Mulheres", e 22 sócias foram sorteadas para entrarem
com o time em campo, ganhando brindes pela iniciativa. Os jogadores entraram com
uma faixa em homenagem a elas. O clube ainda enviou mensagens de agradecimento
a todas as esposas dos jogadores. A última ação foi um pacote de preços especiais
Imagem 24: vencedoras da promoção „‟Que sentimento é esse?‟‟, lançada pelo Avaí para o dia internacional das mulheres de 2012, recebem os prêmios
92
para sócias na compra de produtos oficiais do clube. Entre os dias 9 e 12 de março, as
torcedoras pagavam 15% a menos nas lojas da equipe.
O Vasco fez uma ação chamada „‟Mulheres apaixonadas‟‟, na qual as sócio-
torcedoras deveriam enviar uma frase dizendo „‟Eu sou apaixonada pelo Vasco
porque..‟‟. As vinte vencedoras poderiam assistir a partida contra o Duque de Caxias na
Tribuna de Honra do clube, ao lado do presidente do clube, Roberto Dinamite, e ainda
levar um acompanhante.
O Corinthians, assim como outros clubes, elaborou uma série de ações virtuais,
aproveitando-se da forte participação das torcedoras nas redes sociais. Foi feito um
mosaico com fotos de torcedoras corintianas e uma mensagem especial no site, um
papel de parede alusivo à data, uma galeria com fotos enviadas pelas torcedoras, e
posts nas redes sociais com mensagens de parabéns. Foi lançado um concurso
cultural no Facebook, no qual a torcedora que tivesse a foto mais votada ganhava um
par de ingressos para a partida entre a equipe e o Guarani. Para o dia das mães, mais
posts especiais e mosaico com fotos das mães corintianas.
O Flamengo, em homenagem ao dia internacional da mulher, deu uma rosa para
as sócias que estiveram na Gávea, e as funcionárias ganharam uma camiseta feita
especialmente para a data.
Imagem 25 e 26: ações do Corinthians (SP) nas redes sociais para o dia das mães e para o dia internacional das mulheres
93
No Coritiba, quarenta sócias tiveram a oportunidade de tomar um café da manhã
exclusivo e conversar com o presidente Vilson Ribeiro de Andrade, e o superintendente
de futebol, Felipe Ximenes.
Ações de outros clubes ou de anos anteriores envolveram mecanismos
semelhantes, nos quais torcedoras concorriam a ingressos para partidas especiais, ou
a lugares privilegiados no estádio, tratamento VIP, produtos licenciados, e funcionárias
eram homenageadas com pequenos eventos, mensagens e até mesmo produtos
(como camisetas especiais).
Como foi visto no capítulo anterior, ações desse tipo são válidas para se
comunicar com o público feminino, mas ela não pode ser um caso isolado, e sim fazer
parte de uma estratégia de comunicação constante e através de diferentes níveis, para
que as torcedoras a percebam e respondam através do usufruto do produto esportivo
(que seja o espetáculo ou o merchandising).
4.4. Na web
No capítulo 3 também foi mostrado o porquê de a web ser uma poderosa
ferramenta para se comunicar a figura feminina, principalmente quando se fala de
meios que possibilitam a interação, como são chats, e-mails e, mais recentemente, as
redes sociais.
Ainda que a participação das torcedoras na rede seja percebida pelos clubes,
não foram encontradas muitas ações nesse sentido. Tanto clubes do sul como de
outras regiões não possuem conteúdo direcionado ao público feminino, sendo que essa
é uma oportunidade de baixo custo e efetiva para estreitar o relacionamento entre as
duas partes.
Uma iniciativa que só foi encontrada no site do Atlético-PR foi um espaço com
conteúdo exclusivo para mulheres no seu site oficial. Segundo descrição do próprio
94
site, o canal foi criado para que „‟a torcedora atleticana possa argumentar, sugerir,
comentar e contribuir com o futebol do seu clube‟‟52.
No espaço, são publicadas histórias de torcedoras como Dayane Cordeiro, que
perdeu o vestibular para poder ver seu time jogar a primeira partida da final do
campeonato brasileiro de 2001 contra o São Caetano, e de Shayenne Santos, que
conta de onde vem a sua paixão pelo Furacão.
Além disso, são publicados textos com assuntos que podem interessar ao
público feminino, falando sobre moda, saúde, bem-estar e alimentação. Uma das
matérias, por exemplo, une moda ao futebol, e dá dicas de looks para as torcedoras
usarem com a camisa oficial do clube.
Na segunda metade de 2011, o „‟Espaço Mulher CAP‟‟ foi também para o
facebook, e hoje conta mais de 1.700 seguidoras, que recebem dicas de receitas,
52
Site Oficial Clube Atlético Paranaense. Disponível em: http://www.atleticoparanaense.com/mulher/torcida_feminina.html Acesso em: maio de 2012
Imagem 27 e 28: reportagem feita para torcedoras atleticanas (PR) na seção „‟mulher‟‟ do site oficial mostra como usar as camisas do time com peças do dia a dia
95
beleza, bem-estar, e que também podem acompanhar as promoções e as novidades
do seu time do coração.
Todas ações listadas acima suprem algum tipo de necessidade da consumidora
mulher, seja ela diretamente ligada ao futebol ou não – informações claras, incentivo
para participar do contexto esportivo, valorização de interações sociais, cuidado com a
segurança da família e da própria torcedora, oferecimento descontos e promoções,
entre outras. O principal problema está no fato de, para a maioria dos clubes, isso ser
algo pontual e isolado, sem que exista uma estratégia com um conjunto de ações para
desenvolver essa questão, como aconteceu nos Estados Unidos com as ligas de
futebol e beisebol americanas, o que dificulta que a participação da torcedora mulher
no território do futebol cresça rapidamente e se consolide.
96
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Transformações tecnológicas e sociais moldaram, ao longo da história, o papel
de homens e mulheres dentro da sociedade. Durante muito tempo, ambos os gêneros
tiveram os seus espaços muito bem definidos: enquanto ao homem pertencia a esfera
pública, à mulher ficavam destinados o cuidado da casa. É portanto, natural, que
muitas das concepções criadas nessa primeira esfera (pública) tenham sido moldadas
por ideais quase que exclusivamente masculinos, como é o caso dos esportes.
Modalidades como o futebol foram desenvolvidas pensando na educação e no
lazer dos meninos e homens da época, e por muito anos as mulheres foram impedidas
de entrar nele. A aparição mais bem aceita da figura feminina no espetáculo esportivo
sempre foi justamente na assistência, mas conforme o futebol se populariza e vira
negócio, ela também é colocada de lado nessa esfera. Comunicação, produtos e
estádios, foram todos feitos por homens e para homens, ideia que permaneceu por
muito tempo „‟intacta‟‟.
Inegável dizer, porém, que o movimento feminino sempre existiu. Seja por
aquelas que reivindicam direitos no trabalho, na política, seja por aquelas que se
atentavam ao lazer e burlavam leis e preconceitos para poderem jogar bola, fazer parte
de organizadas ou trabalhar com o futebol. Esse movimento social como um todo
ganhou força, e a mulher ganhou mais possibilidades de escolha na sua vida, assim
como mais responsabilidades, como um maior poder de influência nos seus núcleos
familiares.
Atentos a isso, a esfera do futebol e da mídia começaram a explorar a figura
feminina, mostrando mais mulheres nos estádios - sozinhas, com seus maridos e filhos,
- lançando mais conteúdo na TV voltado para elas, produtos licenciados que agradem
as mulheres e camisas de time femininas.
São dois os benefícios buscados nesse movimento: o primeiro é social, pois com
a presença de mais famílias nos estádios, o espetáculo tende a se tornar mais pacífico;
97
o segundo é claramente econômico, pois esse passa a ser um público estratégico à
medida que ele não só consome o produto esportivo como tem o poder de influenciar
os investimentos em lazer feitos pela sua família.
Apesar de todo esse discurso existir, isso não quer dizer a torcedora mulher é
vista como parte estratégica de muitos clubes, pois a desconfiança de que ela seja um
público válido para investimento ainda existe, já que a maioria dos consumidores de
futebol ainda é indiscutivelmente masculina. Soma-se a toda essa questão o fato de a
profissionalização do futebol no Brasil ser tardia e ainda precária em muitas regiões do
País.
Em países como os Estados Unidos, onde o espetáculo esportivo está mais
desenvolvido, é mais fácil achar pesquisas de mercado sobre o tema, e a segmentação
da estratégia de marketing esportivo por gêneros mesmo em modalidades
consideradas inicialmente masculina, como é o caso do futebol americano e do
beisebol, é mais comum.
Nos últimos anos, algumas pesquisas na área têm sido lançadas, e as mulheres
são frequentemente citadas por consultores esportivos como um público importante
para o universo do futebol. Ainda assim, faltam pesquisas na área, para que se possa
traçar um perfil mais detalhado das torcedoras mulheres, que consiga entender o
envolvimento delas com o time, e a real necessidade das torcedoras quando se fala de
consumo esportivo.
É importante que todo esse processo de inclusão seja feito levando em
consideração as diversas frentes de atuação no futebol, sendo o próprio trabalho com
marketing esportivo uma delas. Isso porque uma das maneiras de conhecer o público
feminino é fazendo com que mulheres também participem do processo de pesquisa e
planejamento de estratégias do território do futebol, que foi formado e se desenvolveu
por muito tempo baseado somente em concepções masculinas.
98
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