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DO AMOR PLATNICO AO CRUSH: A FILOSOFIA ENTRE
ADOLESCENTES TPICOS DE ENSINO DE FILOSOFIA
Gabriel R. Rocha1
RESUMO: O artigo demonstra a relao de equivalncia possvel entre o amor platnico
e o significado da gria crush usualmente muito utilizada entre os adolescentes. No
obstante, a equivalncia demonstrou-se falsa, pois que o objeto do amor platnico,
consoante ao entendimento apresentado ao Banquete, de Plato, difere do objeto de desejo
expresso no signo crush. No entanto, apesar de diferir quanto ao fim, o crush passvel
de ser compreendido como etapa inicial, no processo ascendente em relao ao amor
verdadeiro. Pondera-se sobre o crush em sua correlao ao contexto sociocultural
contemporneo, neste fim, utiliza-se de autores como Pierre Lvy, Ernest Cassirer,
Zygmunt Bauman e Alasdair MacIntyre, justapondo-se, sempre que possvel e necessrio,
a aspectos determinantes da filosofia platnica em correspondncia ao tema proposto.
Alm de contar com uma breve introduo e consideraes finais, optou-se por uma seo
nica, em contribuio ao estudo qualitativo do tema. Ademais, o estudo reafirma a
utilidade da filosofia como constituda de saber fortemente contributivo ao pensar
rigoroso, crtico e plural sobre as diferentes expresses que caracterizam o modo de ser
contemporneo, particularmente, em relao ao modo de ser do jovem adolescente imerso
em um mundo cada vez mais multicultural, global e inter-relacionado em rede.
Palavras-chave: Amor platnico; Beleza; Crush; Desejo; Eros.
ABSTRACT: The article demonstrates the possible equivalence relationship between
platonic love and the meaning of the commonly used slang crush among teenagers.
Nonetheless, the equivalence proved to be false, since the object of Platonic Love,
according to the understanding presented of Plato's Symposium, differs from the object of
desire expressed in the mark crush. However, despite differing in the end, the crush is
likely to be understood as the initial step in the ascending process in relation to true love.
It is based on crush in its correlation with the contemporary social and cultural context,
in this end, it uses authors like Pierre Lvy, Ernst Cassirer, Zygmunt Bauman and Alasdair
MacIntyre, juxtaposing, whenever possible and necessary, to determinant aspects of the
Platonic philosophy in correspondence to the proposed theme. In addition to having a
brief introduction and final considerations, a single section was chosen, contributing to
the qualitative study of the theme. In addition, the study reaffirms the usefulness of
philosophy as consisting of highly contributory knowledge in rigorous, critical and plural
thinking about the different expressions that characterize the contemporary way of being,
particularly in relation to the way of being of the young adolescent immersed in a world
increasingly multicultural, global and interrelated within a network.
Key-words: Platonic love; Beauty; Crush; Desire; Eros.
1 Doutor em Filosofia pela Universidade Catlica do Rio Grande do Sul (PUC-RS). Professor de Filosofia
na educao bsica; email: [email protected]
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Introduo
Entre muitos aspectos comuns que caracterizam a adolescncia2, a utilizao
de grias compe o que poder-se-ia chamar de modo de ser adolescente. Este uso
particular da linguagem, entre os jovens adolescentes, no se restringe a determinados
locais de livre convivncia, mas perpassa tambm o meio educacional, ou seja, o espao
de relao e formao que a escola. Da mesma forma em que tambm se encontra
manifestadamente presente no mundo virtual ou ciberespao3.
Evidente que nenhum professor estimula o uso de grias em sala de aula,
espao em que, prioritariamente, deve-se aprender e fazer uso de certas regras quanto
utilizao e compreenso da linguagem, seja esta, mtica ou religiosa, esttica ou
cientfica, histrica ou geogrfica expressadas na oralidade ou na simbologia, no desenho
ou na cartografia, e claro, na escrita. Entrementes, as grias expem particularidades no
somente restritas a simples expresses verbais, embora sejam estas o meio de sua
manifestao, mas expem, sobretudo, caracteres comportamentais e ticos, culturais,
estticos e sociais, especficos determinada gerao4.
Resulta assim, que se torna possvel a identificao de carter geracional,
mediante observao cautelosa quanto ao uso de determinadas grias, quando aquele
que expressa, revela, mesmo sem intencionalidade, a qual gerao se vincula, i. ., h
qual gerao pertencia quando do perodo de sua juventude.
Evidencia-se no interior desta perspectiva que existem grias mais
universalizveis do que outras, em que seu uso, claramente ultrapassam aspectos mais
restritivos a grupos determinados. Por exemplo, h grias que servem para identificar
certo grupo social ou s chamadas tribos urbanas, como as usadas entre os skatistas e
os punks, mas a outras que nitidamente identificam todo um conjunto sociocultural e
mesmo histrico de uma determinada gerao, sobressaindo-se de maneira mais
2 No Brasil, o Estatuto da Criana e do Adolescente (Lei Federal n 8 069, de 13 de julho de 1990), em seu
artigo 2, assere o seguinte: Considera-se criana, para os efeitos da Lei, a pessoa at doze anos de idade
incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade. 3 LVY, P. Cibercultura, p. 157, o ciberespao o espao das comunicaes por redes de computao. 4 Este amplo aspecto que revela a abrangncia de uma gria, expe o desejo de socializao, inerente a
qualquer ser humano. Conforme assere ROCHER, Guy. Introduccin a la sociologa general, p. 23: A
socializao o processo por meio do qual a pessoa aprende e interioriza, no transcurso de sua vida, os
elementos socioculturais de seu meio ambiente, integra-os na estrutura de sua personalidade, sob a
influncia da experincia e de agentes sociais significativos, e se adapta assim ao entorno social em cujo
seio deve viver.
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abrangente. Este parece ser o caso da gria aqui escolhida para anlise e reflexo
filosfica, o crush.
No causa estranheza que em um mundo cada vez mais globalizado e em rede,
o que tido como local rapidamente ultrapassa a sua origem geogrfica ou histrico-
cultural e, assim, estenda-se ao globo. Se esta velocidade de inter-relao e
interdependncia existe entre economias nacionais, organizaes, pases e suas
instituies, ainda mais velozmente se identifica esta ausncia de zonas limtrofes ao que
refere ao mundo jovem adolescente.
Em consequncia, livros tornados Best-sellers, filmes Blockbusters,
sries televisivas, canais por assinatura, vesturio, acessrios, alimentao, blogs, sites
de busca e pesquisa, redes sociais, games, entre outros, identificam o comum modo de
ser caracterstico deste perodo existencial em nossa contemporaneidade mundial.
Por conseguinte, o objetivo primordial proposto deste artigo, d-se no esforo
compreensivo de a partir de uma gria, atualmente utilizada e disseminada entre a
juventude adolescente, o crush, promover o exerccio reflexivo sobre certos aspectos
da filosofia platnica, bem como, ponderar sobre a possibilidade - em verdade
considerada como sempre necessria - da interferncia filosfica no espao comum de
comunicao e convivncia que se caracteriza a sala de aula.
Neste intuito, escolhe-se um termo que ultrapassou o discurso puramente
acadmico, o de amor platnico e sua possvel relao de equivalncia ou no, entre
esta expresso, e a gria crush. Assim, resulta que o tema proposto sugere aproximar o
discurso produzido no texto filosfico, neste caso, o texto dialgico de Plato, sobretudo,
o dilogo Banquete, e a expresso crush, atualmente usual entre os jovens adolescentes,
em clara referncia, no dizer deles mesmos, ao objeto de seus desejos.
Crush e amor platnico
Como anteriormente mencionado crush uma gria. Mas ao que se refere?
E neste sentido, porque se revela plausvel propor pensa-la filosoficamente justapondo-a
ao chamado amor platnico?
Antes de esclarecer-se os questionamentos referidos acima, necessrio
adicionar compreenso proposta a seguinte contribuio de Ernst Cassirer sobre o
conceito de smbolo. Observa-se o seguinte:
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[...] O sinal uma parte do mundo fsico do ser; o smbolo uma parte
do mundo humano do sentido. Os sinais so operadores; os smbolos
so designadores [...] Um smbolo no apenas universal, porm
extremamente varivel. Posso expressar o mesmo significado em vrios
idiomas; e at mesmo dentro dos limites de uma nica lngua o mesmo
pensamento ou ideia pode ser expresso em termos muito diferentes. [...]
Um smbolo genuno no se caracteriza pela uniformidade, mas pela
versatilidade. No rgido nem inflexvel, mvel5.
Consoante a referendada citao, compreende-se o smbolo como elemento
que designa a realidade, embora no seja a realidade, porm, oferta-lhe sentido. A gria,
portanto, um smbolo e no somente um sinal ou uma pantomima, porque nela se
manifesta, via linguagem, todo o imagtico caracterstico de um signo6. A gria, portanto,
o crush, expressa uma mediao simblica entre o real e o ideal, sendo dotada de
significado e propiciadora de entendimento intersubjetivo.
Termo de origem inglesa, no h traduo de crush, enquanto gria7, pois,
crush crush, e assim expressa uma cultura lingustica comum entre os adolescentes,
qual seja, a manifestao do desejo amoroso a pessoas prximas ou no fisicamente, mas
que sempre correspondam, ou ao menos venham a corresponder, ao imagtico erotizante
juvenil.
Resulta do precedente que quando o (a) jovem adolescente afirma: Ele ou
ela meu crush, significa no somente e, necessariamente, uma relao direta e pessoal,
porm uma relao de desejo idealizado, em cuja principal fora motriz parece constituir-
se na beleza fsica.
Em consequncia, tem-se duas possibilidades de equivalncia ao amor
platnico8: a primeira quanto a idealizao do objeto de desejo, a segunda d-se na
5 CASSIRER, E. Antropologia Filosfica ensaio sobre o homem: introduo a uma filosofia da cultura
humana. p.67. 6 A tese principal de Cassirer que toda relao do homem com o mundo mediada por um sistema de
signos. Esses sistemas podem ser lingusticos, artsticos, matemticos, etc., antes do homem ser racional,
ou poltico, ou faber, ele symbolicum. 7 Diz-se enquanto gria, porquanto a palavra crush significa literalmente esmagar, moer, mas,
tambm traz consigo este significado de paixo passageira e ou idealizada, por exemplo, a expresso
She has a crush for you (ela tem uma quedinha por voc). Assim, ao se analisar a gria, esta, enquanto
gria e expresso verbal entre os adolescentes, no recebe traduo, embora, todos saibam o seu significado
quando transliterado lngua portuguesa. 8 Conforme o Dicionrio Oxford de Filosofia, p. 148, verbete Ficino, Marslio (1433-99), diz-se deste, que
seus comentrios ao Banquete de Plato so a fonte da expresso corrente amor platnico, com o sentido
de um amor que no procura expresso sexual, contentando-se antes unicamente com a apreciao das
formas que o ser amado exemplifica. Marslio Ficino foi o principal representante do platonismo e
neoplatonismo renascentista, fundador e diretor da Academia de Florena, sua a numerao mundialmente
conhecida que serve para a organizao, catalogao e citao dos dilogos de Plato. Em 1484 foi
publicada sua traduo integral dos dilogos de Plato. Id. ibid., p. 148.
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relao entre desejo e beleza, i. ., o desejo pelo belo. Todavia, antes da necessria
continuidade investigativa desta equivalncia possvel, torna-se vlido acrescentar o que
se segue.
Quando na dcada de 1990 surgira entre os adolescentes o uso da gria ficar,
esta trazia como significado simblico, o fato de realmente ter beijado algum, por
exemplo, fiquei com ela ou com ele em uma festa. Assim o ficar no equivaleria
a namoro, i ., um compromisso fixo com outra pessoa, ficar era somente ficar,
mesmo que houvesse a possibilidade do ficar se efetivar em namoro ou em algum
compromisso monogmico.
Da mesma forma, o crush no necessariamente ficar, e muito menos
namorar, mas, sobretudo, manifesta-se como ato de desejo ou de se encontrar enamorado
por algum que, pode ou no, ser de relao fisicamente aproximada.
Chega-se assim a primeira possvel concluso: o crush pode corresponder
a amor platnico se e somente se pensado conforme o senso comum, em sua
manifestao de desejo amoroso idealizado, mas no realizvel. Portanto, no
expressando equivalncia com a proposta filosfica de Plato quanto ao amor. Pois, como
ser demonstrado, o amor idealizado em Plato realizvel, constituindo-se no amor pelo
Belo em si, sempre correlato ao amor pelo Bem, logo ele no idealizado, mas
plenamente atingvel na contemplao.
Nestes termos o crush no passvel de satisfazer tamanha exigncia
platnica, entretanto, ainda assim pode-se considerar o crush como equivalente da
primeira manifestao pelo desejo do belo, uma primeira etapa quanto a real beleza e o
verdadeiro amor, que no e no pode ser em Plato somente amor pelos belos corpos9.
Adentra-se, pois, ao tema da educao10 do desejo, de valor inestimvel Plato.
Se somente se deseja com o corpo (sma), no possvel quele que assim
procede, desvincular-se de prazeres menores. Entretanto, estes prazeres menores no
so isentos de intensidade, ao contrrio, por serem intensos e passveis de causarem
desregramento interno aos indivduos que, justamente, a estes prazeres h submisso,
9 Argumento que segue a lgica dos enunciados correspondente ao dilogo Banquete, contudo, tambm
correlato ao dilogo Fedro. O tema ser desenvolvido mais adiante. 10 Educao no tem sentido de instrumentalizao tcnica, mas, sobretudo, condiz com educao moral
da psych, educar para a formao e desenvolvimento das virtudes ou excelncias (aretai) morais. Consultar
dilogo Leis, 643e-644a-b. Sobre esta questo assere JAEGER, Paidia, p. 336: A educao profissional,
herdada do pai pelo filho que lhe seguia o ofcio ou a indstria, no se podia comparar educao total de
esprito e de corpo do nobre baseada numa concepo total do Homem.
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podendo efetivamente manifestar o domnio do desejo de prazer sobre outras faculdades
ou tendncias internas da psych11 (alma) humana, o que, por sua vez, ocasionar
indivduos compromissados somente com satisfao dos sentidos12.
Para Plato preciso educar a faculdade desejante (epithyma), opondo-lhe a
faculdade da razo (logistikn), e a esta, acrescentando-lhe uma virtude ou excelncia
(aret) fundamental, a temperana (sophrosn)13. Observa-se o exposto seguinte no
dilogo Fedro:
[...] em cada um de ns existem dois princpios, de forma e de conduta,
que seguimos para onde eles nos conduzem: um, inato, o desejo de
prazer ( ), outro, adquirido, que aspira sempre ao
melhor. Por vezes, estas duas tendncias concordam em ns, mas, em
certas ocasies, verificamos que entram em guerra em que uma vez sai
vencedora a primeira, outra vez a segunda. Posto isto, assentemos em
que, quando sai vencedora a forma orientada pela razo, essa forma
chama-se temperana; quando o desejo que, destitudo de razo, nos
arrasta para os prazeres, chama-se gula [...]14
Embora o desejo de prazer seja inato aos homens necessrio educ-lo,
oferecer-lhe correta direo, caso contrrio, no se torna possvel trilhar um caminho
ascendente do corpreo ao racional, diga-se, espiritualizar a relao com os objetos de
desejo, bem como na relao mesma com o prprio desejo inato de prazer15.
11 O termo alma, do grego , conceito fundamental em Plato. Considera-se aqui como termo alma a
sede da inteligncia e da moral. Conforme prope TRABATONNI, Plato, p. 131-32: Desde os tempos
de Homero, a alma representava a vida do corpo. Todavia, Plato aceita a provvel posio do Scrates
histrico, que abandona o aspecto fisiolgico (alma como apenas o que mantm o corpo vivo) para uma
imagem espiritual: a alma , antes de tudo, a sede do intelecto e da conscincia e o sujeito das aes e dos
valores morais. 12 Como assere GRUBE, El pensamiento de Platn, p. 130: Do ponto de vista da intensidade os maiores
prazeres so fsicos [...] se o que buscamos a intensidade, nunca a encontraremos na sade ou na
moderao. 13 Conforme o argumento apresentado, corrobora ROWE, Introduccin a la tica griega, p. 253: A sophrosn a sujeio harmoniosa das duas partes inferiores da alma parte racional dominante. Para
Rowe, sem a temperana, no possvel faculdade racional (logistikn) da psych dominar as funes
que lhe so inferiores. 14 PLATO, Fedro, 237e-238a. Observa-se no Fedro, 238a, o trecho seguinte: [...] quando o desejo que,
destitudo de razo, nos arrasta aos prazeres e nos conduz a seu belo talante, essa forma chama-se gula.
Na traduo do dilogo para a lngua inglesa tem-se o termo excess a significar em demasia, em
excesso. In: Plato in Twelve Volumes, 1925. Questo de amplo interesse, cuja problemtica, adentra-se
psicanlise. Conforme MASCARENHAS, Emoes no Div, pp. 216-19, a gula relaciona-se com a
voracidade, fissura mesma. Por isso insacivel, ademais, refere-se a todo tipo de excesso, no somente,
portanto, aos apetites culinrios. Assim, tanto o termo gula da traduo para o portugus quanto o termo
excess em ingls, ambos parecem adequados, e expressam coerncia ao pensamento (notavelmente
originrio) de Plato. 15 REIS, M. Por uma nova interpretao das doutrinas escritas: a filosofia de Plato tridica, p. 385,
nota 11, argumenta o seguinte: Na filosofia platnica, o uso de epithyma (apetite de algo) distingue-se
daquele do ros (desejo, amor). O sentido do primeiro termo mais restrito que o do segundo. A epithyma
refere-se a um tipo de mpeto prprio parte apetitiva da alma, voltado para determinado objeto (apetite de
algo), ligado s experincias de carncia e suprimento, de prazer e dor. J o eros refere-se ao impulso da
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Plato argumenta que no condizente com razo e com virtude satisfazer-
se em um modo de ser conduzido por um hedonismo absoluto, ainda mais, quando os
objetos de prazer no se elevam para alm da sensao16. O dilogo Fedro, na passagem
seguinte, corrobora com s inferncias apresentadas.
O desejo que, desprovido de razo, atrofia a alma (psych) e esmaga o
prazer (hdon) do bem, e se dirige exclusivamente para os desejos
prprios da sua natureza, cujo nico objetivo17 a beleza corporal,
quando se lana impudicamente sobre ela, comporta-se de tal maneira
que se torna irresistvel, e dessa irresistibilidade, dessa fora
destemperada, que ele recebe a denominao de Eros, ou de Amor18.
Embora o final da citao conclua negativamente quanto fora
destemperada de Eros, torna-se plausvel, quando adicionado a outros argumentos do
prprio Fedro, compreender que Eros, quando desprovido de razo e desprovido de
temperana, somente fora impulsiva sem o devido direcionamento, assim justifica-se
o educar daquele que deseja, e somente assim possvel alma (psych) e no ao corpo,
amar o que verdadeiramente digno de amor19.
Entrementes, antes de merecida e continuada anlise qualitativa sobre Eros, e
sobre determinados conceitos compreenso almejada, imprescindvel somar-se mais
algumas consideraes sobre o crush enquanto possibilidade de exprimir a mentalidade
cultural20 do jovem adolescente.
totalidade da alma (e no de parte dela), seu lan vital, movimento que conduz a alma continuidade,
unidade, bem como elemento unificador do mltiplo. Este argumento, embora forte, passvel de
refutao na prpria passagem referendada no texto do dilogo Fedro, 238c. Porm, o argumento est
correto quanto a caracterizao de eros como fora propulsora totalidade da alma (por isso aqui apresenta-
se a interpretao de eros como caminho ascendente em direo Beleza em si, consoante ao dilogo
Banquete, da mesma forma considera-se que crush no pode significar equivalncia a amor platnico
como amor ideal, justamente devido ao objeto de amor do amante. Como elemento metafsico de
unificao, creia-se que est mais para o Bem do que para Eros. Quanto questo de carncia ou falta,
temos o desejo pela beleza, assim como temos pela sabedoria ou pelo gozo fsico, o que difere o objeto e
no a faculdade desejante. Por isso educar a razo de quem deseja e adicionar a virtude da temperana. 16 Isto , como ato de sentir, asthesis. 17 No original grego tem-se a expresso: , assim a melhor traduo seria,
infere-se: cujo nico desejo a beleza corporal. 18 PLATO. Fedro, 238c. 19 Cr-se evidente que, em Plato, no h negao do desejo de prazer. A prpria felicidade (eudaimona)
no a ausncia de desejos como pensaram os epicuristas, ao contrrio, a felicidade, consoante Plato, o
domnio sobre si, i. ., o equilbrio entre as faculdades da psych, embora seja sempre prefervel o
predomnio da razo como garantia da prpria harmonia. Contribui GRUBE. El Pensamiento de Platn, p.
117, no seguinte: Plato afirma que o prazer e dor so estados de atividade, rechaando assim a confuso
de uma felicidade como mera imperturbabilidade e ausncia de todos desejos, estado negativo e passivo
que constituiria o ideal dos epicuristas. Tambm em referncia ao Filebo, GRUBE (Ibid., p. 123): Uma
vida boa, deve conter, para tanto, certa mescla de conhecimento e sentimento, de intelecto e prazer. 20 Conceito relevante histria e antropologia, mentalidade cultural significa, infere-se, ao que caracteriza
um modo de ser especfico dentro de determinado contexto histrico-social, todavia, no restrito
necessariamente a um tempo e espao determinado e especfico, pois que seu objeto , sobretudo, o mental,
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Supe-se que a utilizao de grias entre os jovens adolescentes, caso em que
o crush somente mais uma, dentre inmeras, acabam por atuar como identificadores
ou como agentes sociais em que determinados grupos expressam seus valores e sua
mentalidade cultural comum, logo, identificao essa fortemente relacionada
coletividade. Por paradoxal que inicialmente possa parecer, o uso de grias revela uma
possvel contraposio ao individualismo ou a individuao, marca indelvel de nossa
poca.
O socilogo polons, Zygmunt Bauman, assim define o conceito de
individualizao: O que a idia de individualizao traz a emancipao do indivduo
da determinao atribuda, herdada e inata do carter social dele ou dela: uma separao
corretamente vista como uma caracterstica muito clara e seminal da condio
moderna21.
Procede assim que o individualismo atua como desagregador do sujeito, na
medida em que o dissocia do todo social, promovendo o rompimento com a histria e,
com a herana familiar e comunitria22. Por conseguinte, as grias, em geral, acabam por
constiturem-se como agentes de identificao social estimulando convivncia e s
relaes intersubjetivas.
Entretanto quando aplicado especificidade da gria crush, no se pode
inferir que h um efetivo movimento de socializao. Pois, quando certo aluno relata que
possui diferentes crush em diferentes locais, o referido espao23 no necessariamente
embora em direta relao com o que tipicamente social. O historiador Ronaldo Vainfas, em artigo
intitulado Histria das Mentalidades e Histria Cultural, p. 148-49, corrobora em nossa elaborao,
asserindo o seguinte: [...] Nova Histria Cultural, distinta da antiga histria da cultura, disciplina
acadmica ou gnero historiogrfico dedicado a estudar manifestaes oficiais ou formas da cultura de
determinada sociedade: as artes, a literatura, a filosofia etc. A chamada Nova Histria Cultural no recusa
de modo algum as expresses culturais das elites ou classes letradas, mas revela especial apreo, tal como
a histria das mentalidades, pelas manifestaes das massas annimas: as festas, as resistncias, as crenas
heterodoxas ... Em uma palavra, a Nova Histria Cultural revela uma especial afeio pelo informal e,
sobretudo, pelo popular. Nota-se, portanto, que o trabalho aqui proposto, embora se relacione com que
poder-se-ia chamar de histria das ideias, porquanto vinculado o tema a um grande expoente do
pensamento filosfico, Plato, tem, no entanto, como ponto de partida de sua pretensa problematizao algo
que pertence cultura simples, informal, expresso de um modo de ser em que o uso da gria serve como
caracterizao. Ademais, evidencia-se o tema como objeto passvel de diferentes abordagens tericas, o
que contribuiria, por si s, a produtivo trabalho interdisciplinar em sala de aula, e no somente na alcunha
Cincias Humanas, mas tambm, notadamente em relao s Linguagens e suas tecnologias. 21 BAUMAN, Z. A sociedade individualizada, p. 183. 22 Pensa de maneira correlata, Alasdair MacIntyre, em crtica s ticas individualistas e, em defesa da
perspectiva apresentada pelo comunitarismo tico, do qual comunga. Consultar, entre outras obras, After
Virtue, 1981. 23 No adentraremos, at por falta de competncia sociolgica para faz-lo, na especfica problemtica
quanto aos conceitos de espao. Todavia, apresenta-se sobre o tema o seguinte esclarecimento de
BAUMAN. tica Ps-Moderna, p. 167: Muito se escreveu sobre a distino entre espao fsico
espao objetivo, espao como tal - e espao social. Em geral existe acordo em que ambos se acham em
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fsico, em verdade, na maioria no o , e nisto entra-se na questo do distanciamento
promovido pelo mundo online e, neste sentido, ocorreria no um estmulo
socializao, ao contrrio, haveria estmulo ao individualismo excludente24.
A relao com o virtual inegvel se nisto existe a promoo para o
retrocesso nas relaes humanas ou abertura socializao, todavia, esta questo longe
se encontra de mostrar-se conclusiva. No obstante, o aspecto mais estritamente filosfico
ao tema talvez se revele no seguinte questionamento: O que caracteriza s relaes
humanas?
Se s relaes humanas estiverem restritas socializao e vida coletiva, ao
encontro com o outro em espao determinado no tempo e no espao, sem dvida o mundo
online seguramente expresso de empobrecimento da existncia humana. Por outro
lado, se a virtualidade do espao em rede propicia relaes humanas qualitativas, ento
h outras formas possveis de caracterizar os relacionamentos humanos. Esta segunda
perspectiva, positiva quanto s relaes cibernticas, parece colocar-se de acordo com o
pensamento do filsofo francs Pierre Lvy.
Para Lvy, em obra intitulada Cibercultura, virtual toda entidade
desterritorializada, capaz de gerar diversas manifestaes concretas em diferentes
momentos e locais determinados, sem, contudo, estar ela mesma presa a um lugar ou
tempo determinado25. Se conforme assere, trata-se de manifestaes concretas, a
realidade virtual to composta de realidade quanto ao que se restringe a empiria das
relaes humanas, ideia, ao que parece, condizente com o conceito de
desterritorializao.
Nestes termos a gria crush manifesta algo real, embora o objeto desejado
seja uma simples reproduo imagtica. Quando, por exemplo, jovens tornam-se
seguidores nas redes sociais que so globais, vlido frisar de outros jovens que de
relacionamento metafrico um com o outro. De um lado, falamos de espao social usando os termos
cunhados para a distncia e proximidade fsicas, objetivas e mensurveis. Mas, de outro lado, pode-se
tambm frisar que s se pde chegar idia desse espao fsico pela reduo fenomenolgica da
experincia diria pura quantidade, durante a qual a distncia despovoada e extemporalizada, ou
seja, sistematicamente limpada de todos os traos contingentes e transitrios; somente no fim dessa reduo
que se pode conceber o "espao objetivo", o "espao como tal", como espao puro, espao vazio,
espao destitudo de qualquer contedo relativo a tempo e circunstncia. Sob esse outro ponto de vista, o
espao fsico uma abstrao que no se pode experimentar diretamente: captamos o espao fsico
intelectualmente com a ajuda de noes que se cunharam originalmente para mapear qualitativamente
relaes diversificadas com outros homens. 24 Tal inferncia coloca-se de acordo com o pensamento de Bauman, em cuja crtica s redes sociais e ao
mundo virtual, perpassa quase a integridade de suas obras. Cabe-nos ressaltar que, de maneira oposta
apresenta-se as ideias de Pierre Lvy. 25 LVY, P. Cibercultura, p. 47.
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certa forma lhe representam ideais, entre os quais o de beleza, a consequncia desta
relao se manifestar no comportamento, gerando-se assim, atitudes e modos de
proceder, crenas e ideias, portanto, se a relao em si mesma no necessariamente
social, seus impactos sero sentidos no interior das sociedades.
Torna-se compreensvel valorizao excessiva da beleza fsica, o culto aos
corpos trabalhados em esforos contnuos em horas de academia. No se intenciona
criticar a valorizao da sade e do esporte, mas sim, o elevado status quo sociocultural
que impera em torno do corpo. O chamado padres de beleza que se encontram
reforados na grande mdia, formam modelos idealizados sobre o que melhor
representaria os ideais de belo.
Neste panorama, desenvolvem-se valores outros que no correspondem aos
valores morais. Ao valorar em demasia tudo o que se encontra atrelado ao corpreo, i. .,
aos valores materiais, em consequncia desvaloriza-se princpios necessrios que
deveriam nortear a vida humana e as sociedades, assim, no por acaso que todas as
grandes crises da contemporaneidade mundial, prope-se, possuam como causa primria
a falta de virtudes26.
O filsofo Alasdair MacIntyre ao analisar tica tomista e a diferenciao
proposta entre bens exteriores e bens interiores, denota que as sociedades ocidentais
materialmente desenvolvidas, excluram as virtudes em detrimento da valorizao
somente dos bens exteriores.
Neste sentido, acrescentar-se-ia a identificao do belo ao corpo, com a
supremacia da imagem e da propaganda a promover a supraexcitao dos sentidos, to
bem explorada pelo show business e admirado pela sociedade do espetculo27,
privilegiando-se o desejo de prazer ao que satisfeito apenas pelos sentidos que, como
referido anteriormente, coloca-se em oposio ao que propusera o pensamento platnico.
Assim a simbologia do crush relaciona-se diretamente, portanto, com a
imagem em um contexto que privilegia o espetculo. Como proposto de forma notvel
26 Cf. MAcINTYRE, Depois da virtude, p. 340-341: Se no houver um telos que transcenda os bens limitados das prticas constituindo o bem de toda a vida humana, o bem da vida humana concebido como
uma unidade, far com que certas arbitrariedades subversivas invadam a vida moral e sejamos incapazes
de especificar adequadamente o contexto de certas virtudes. 27 Ttulo da obra de Guy Debord, La Societ du spectacle, publicada pela primeira vez em 1967, em Paris.
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por Guy Debord: O espetculo no um conjunto de imagens, mas uma relao social
entre pessoas, mediatizada por imagens28.
A definio de espetculo conforme se nos apresenta Debord, acaba por
adentrar-se na anlise desenvolvida, porquanto, o crush, demonstra justamente as
relaes que em grande medida so mediatizadas pela imagem, imagens estas que
representam os esteretipos de beleza produzidos pela indstria cultural na
retroalimentao dos prprios valores das sociedades industrializadas contemporneas.
Se de fato vivenciamos uma sociedade do espetculo, isto tambm significa
que vivenciamos uma sociedade da primazia dos sentidos e avessa ao pensamento
abstrato, contemplao e reflexo.
Para Plato29 os sentidos so considerados insuficientes e incapazes para
compreender a realidade primeira do inteligvel e, portanto, a realidade e universalidade
dos princpios originrios (archa) representados nas Ideias do Justo, do Belo e,
sobretudo, a do Bem30, conforme evidencia-se no dilogo Repblica.
E que existe o belo em si, e o bom em si, e, do mesmo modo,
relativamente a todas as coisas que ento postulamos como mltiplas,
e, inversamente, postulamos que a cada uma corresponde uma ideia,
que nica, e chamamos-lhe a sua essncia [...] E diremos ainda que
aquelas so visveis, mas no inteligveis, ao passo que as ideias so
inteligveis, mas no visveis31.
Do que se segue que em Plato, as artes em geral, bem como os indivduos
que a expressam, esto somente utilizando-se de opinies (doxai) sobre a realidade, e no,
portanto, com o conhecimento (epistme) desta. A imagem (edolon) que funciona como
representao do sensvel e revela o senso esttico, uma cpia de algo que em si mesmo
uma imitao (mmesis). Logo no h aproximao ao que verdadeiramente real e ao
que verdadeiramente possui valor ou deveria possuir valor ao ser humano32. No obstante
28 DEBORD, La Societ du spectacle, tese 58. Livre traduo do francs. Vale a ressalva que o autor faleceu em 1994, antes, portanto, do acesso global rede mundial de computadores (Internet), tambm,
portanto, antes do surgimento das redes sociais. 29 O filsofo prope uma relao do homem com o todo csmico universal. O mundo fsico e a vida fsica
que h neste, somente expressa uma particularidade existencial, mas se encontra neste plano os princpios
que o fundamentam. A filosofia de Plato promove a espiritualidade no humano e, portanto, vinculada ao
imperecvel e permanente, ao que, em suma, verdadeiramente . 30 Compreende-se que o Bem (Agathn) no uma Ideia (Idea ou Edos), mas est alm destas, conforme
depreende-se do exposto seguinte, Repblica, 509c, [...] apesar do bem no ser uma essncia (ousa), mas
estar acima e para alm da essncia (hyperousa), pela sua dignidade e poder. 31 PLATO, Repblica, 507b. 32 Tal raciocnio revela-se coerente ao sugestionado na teoria da Linha, no livro VI de A Repblica, em
que se evidencia os diferentes nveis hierrquicos de realidade e a adequao dos saberes apresentados de
forma ascendente, de maneira que cabe a psych ascender da multiplicidade s essncias, e ainda sobre
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caberia ainda questionar: Mas estas imagens, representaes do belo nos corpos belos,
atuam propeduticamente em sentido ascendente Beleza em si mesma?
Chega-se novamente ao anteriormente proposto, ou seja, embora o desejo aos
corpos belos possa atuar como primeira etapa ao verdadeiramente Belo, consoante ao que
asserido no dilogo Banquete, a ausncia de valores que possam corresponder ao no
corpreo e a invisibilidade nas sociedades contemporneas, acabam por atuar como fortes
empecilhos para este caminho ascendente em direo ao inteligvel e, portanto, no
correspondem realidade do amor platnico.
No contexto mercadolgico das sociedades industrializadas, cujo mote
econmico o consumo, os objetos de desejo so produzidos sobretudo no olhar, a
partir deste sentido corpreo que aquele que deseja assim vislumbra os possveis prazeres
proporcionados na aquisio de algum bem exterior.
notvel que nA Repblica33, confere-se educao o atributo de,
justamente, caracterizar-se a correta orientao dada ao olhar. Ora, se se olha somente
tendo em vista as coisas materiais, a faculdade que deseja ir preponderar fortemente
sobre a racionalidade e sobre qualquer virtude que a psych possa apresentar e
desenvolver.
Do que se segue que o olhar da psych, quando corretamente educado, volta-
se interioridade de si mesmo, assim transcendendo s imperfeitas representaes do
visvel. Contudo, se o olho como rgo humano pudesse indicar algo em direo perfeita
beleza, indubitavelmente encontrar-se-ia o cu ou mesmo o alm do cu, s galxias e os
objetos do universo, o grau maior de aproximao quanto ao que realmente Belo.
Justifica-se, pois, o distanciamento quanto simples beleza encontra nos corpos belos, e,
por conseguinte, a ruptura entre o que chamar-se-ia de crush e o amor platnico.
Na atualidade de nossas sociedades a educao subtraiu o olhar
interioridade, ao conhecimento de si mesmo, este, sobretudo, o sentido da correta
orientao do olhar para Plato. Em suma, este caminho interno das virtudes, dos bens
interiores como propunha a tica tomista. Infelizmente, tudo parece indicar que se
caminha em sentido contrrio a estes bens imperecveis e no descartveis ao esprito
humano.
estas, o Bem, (este representado no simbolismo do Sol). Consultar tambm o livro X da referida obra,
sobretudo, a passagem de 597a-598e ss. 33 PLATO, Repblica, 518d.
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A modernidade lquida como a cunhou Bauman, como sendo a civilizao
do excesso, da superfluidade, do refugo e da sua remoo34, a civilizao dos bens
exteriores, da moda, do suprfluo e da mutabilidade constante, assim, em certo sentido, o
crush representa somente esta necessidade de preencher-se de algo que, provavelmente,
no durar at prxima estao.
Da mesma forma se h uma civilizao do excesso, longe nos encontramos,
consoante a tica aristotlica35, da virtude. Tem-se o excesso do descartvel e do
momentneo, assim como h deficincia do que se constitui como permanente e
duradouro, daquilo que sempre . Sem dvida, esta foi uma sria preocupao para Plato.
A beleza dos corpos degenera-se, envelhece, morre e decompe-se, mas a
Beleza em si mesma encontra-se em tudo o que belo e, se belo, tambm bom, porque
tudo verdadeiramente bom h de ser belo36. Do que se segue que as virtudes sempre so
em si mesmas virtudes, talvez, seja este o tlos grego que precisa ser reconstrudo37.
O simbolismo do crush, portanto, expressa esta superficialidade indelvel
ou esta liquidez, nos dizeres de Bauman, sobre s relaes humanas nas sociedades
contemporneas. E, se estes desejos amorosos pelos belos corpos e das belas
representaes das imagens, ainda sim, podem servir como indcios de uma continuidade
ascendente Beleza verdadeira e primeira, neste caso, se correto for, h possiblidade de
se restaurar o humano em sua prpria humanidade.
Em estudo sobre o dilogo Banquete38, o notvel historiador da filosofia e
helenista italiano Giovanni Reale, comenta:
34 BAUMAN, Z. Vidas Desperdiadas, p. 120. 35 [...] a virtude moral um meio-termo, e em que sentido devemos entender essa expresso; e que um
meio-termo entre dois vcios, um dos quais envolve excesso e o outro deficincia, e isso porque a sua
natureza visar mediania nas paixes e nos atos. (tica Nicmaco, II, 1109 a 20). 36 No texto platnico do dilogo Hpias Maior, cujo principal objeto, a anlise do conceito de Belo em
uma busca marcadamente propedutica pela definio do Belo em si, apresenta-se, embora o dilogo seja
aportico, a equivalncia entre o Bem (Agathn) e o Belo (Klon), neste sentido, algo no pode ser bom
sem ser belo e belo sem ser bom. Conforme o texto, Hpias Maior, 297b, assere Scrates: Na mesma
ordem de ideias, se o belo causa do bem, porque o bem s pode ser originado pelo belo. E a est, salvo
erro, a razo de nos empenharmos na sabedoria e em todas as demais coisas belas: que o seu produto, o
seu rebento ou seja, o bem digno do nosso empenho; e so, porventura, elas que nos levam a descobri
o belo como uma espcie de pai do bem. No dilogo Repblica, 506e-507c, tem-se o inverso na relao,
porquanto, o Bem aparece como o pai do Belo. Consultar, entre outras obras fundamentais: G. M. A.
Grube, Platos thought, London, University Press, 1970. 37 Neste sentido corrobora MAcINTYRE, Depois da virtude, p. 368-69: As virtudes devem ser
compreendidas como as disposies que, alm de nos sustentar e capacitar para alcanar os bens internos
s prticas, tambm nos sustentam no devido tipo de busca pelo bem, capacitando-nos a superar os males,
os riscos, as tentaes e as tenses com que nos deparamos, e que nos fornecero um autoconhecimento
cada vez maior, bem como um conhecimento do bem cada vez maior. 38 As obras filosficas e eruditas em cujo ttulo aparece a palavra banquete, to abundantes na literatura
grega ps-platnica, atestam a grande influncia que a penetrao do espirito filosfico e dos seus
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[...] a temtica do eros e do amor, deve ser entendido como fora
mediadora entre o sensvel e o suprassensvel, uma fora que d asas e
eleva, atravs dos diversos graus da beleza, Beleza meta-emprica em
si mesma. E j que o Belo, para o grego, coincide com o Bem ou, em
todo caso, um aspecto do Bem, assim Eros uma fora que eleva ao
Bem39.
Eros ocupa um lugar de suma importncia, porque atua exatamente na
distncia entre o mundo corpreo, sensvel, e o mundo verdadeiramente real, ou
inteligvel. Por isso Eros como o filsofo. Pois, embora este ame o inteligvel e tudo o
que lhe corresponde, a virtude, o Belo, a sabedoria (sopha), seu amor nunca plenamente
satisfeito. Por conseguinte, sempre haver uma ausncia a ser preenchida, sempre haver
necessidade de contnuos esforos para afastar-se da ignorncia (amatha).
Do que pondera Reale, o Amor um damon40, entre outros, que atuam entre
os deuses e os homens. Filho de Penia (pobreza) e Poros (abundncia), o Amor ou Eros
tem dupla natureza, estando no meio entre a ignorncia e a sapincia41.
Por sua vez, Bauman apresenta o seguinte comentrio ao dilogo Banquete:
[...] Como sempre, Scrates se esfora para elevar a mera descrio
categoria de lei da lgica ao substituir "provvel" por "necessrio": "no
necessrio que aquele que deseja deseje o que lhe falta ou no deseje
o que no lhe falta?" Para que no haja lugar para adivinhaes e erros
de julgamento, Scrates resume: todos "que desejam, desejam o que
no est em sua possesso, o que no tm, o que no so e o que lhes
falta". Isto , ele insiste, o que chamamos de "desejo"; ou seja, o que o
desejo deve ser, a no ser que seja outra coisa que no o desejo42.
Assim, considera-se que o desejo existente enquanto no se possui o que se
deseja43. Logo, infere-se que o problema tico-filosfico no se encontra na faculdade de
desejar, mas sim nos objetos aos quais se direciona a faculdade desejante.
profundos problemas exerceu neste tipo de reunio. Plato o criador da nova forma filosfica do banquete.
A narrao literria e a nova interpretao filosfica da antiga prtica social associam-se nele organizao
da vida espiritual na sua escola JAEGER, Paideia, p.722-23. 39 REALE, G. Plato, p. 217. 40 vlido elucidar que o termo grego damon/ no possui entre os gregos, o sentido imaginrio de
anjo decado, entidade maligna que habita o inferno. Ora o damon identificado como espcie de guia
zeloso, como aparece nas palavras de Scrates (consultar Apologia de Scrates), e ainda, como aqui est
sendo utilizado, no sentido de deuses menores (mortais), como o caso do referido Eros. 41 REALE, ibid., p. 218-219. Consultar tambm o dilogo Banquete, 202e-203a. 42 BAUMAN, A sociedade individualizada, p. 207-08. 43 Assim pondera TRABATTONI, Plato, p. 147: O conceito de eros, no somente para Plato, revela um
dado essencial da natureza humana, ou seja, a sua tenso dinmica para a obteno de um determinado
objetivo. Em outras palavras, essa vontade pode ser chamada de tenso ou desejo.
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Em consequncia, a proposta de Plato quanto ao desejo educar o agente
desejante, i. ., a psych humana. Porquanto conforme for o direcionamento do olhar,
ter-se- consigo s consequncias em relao ao que se deseja. Encontra-se assim a
funo paidestica da filosofia, mas tambm a responsabilidade educativa do profissional
de educao, e ainda o dever educativo de pais e familiares como da sociedade em geral,
em relao ao comportamento e aos valores apresentados aos jovens e s geraes futuras.
Por conseguinte, deve-se propor lucidez quanto aos objetos de desejo, pois
naquilo em que, hipoteticamente se encontra carente, seria de fato necessrio, ou
simplesmente correspondente do suprfluo? O desejo apresentado se restringe
satisfao do corpo, da vaidade, do orgulho de si, ou almeja uma satisfao mais profunda
e elevada que, inclusive, pode ser considerada digna de equivalncia aos bens interiores
da psych, e assim tidos como universalizveis? Retorna-se problemtica referida mais
acima quanto ao que se deve valorar, ou ao o que est sendo valorado nas sociedades
contemporneas.
Socialmente ou culturalmente no h grandes problemas quanto ao desejo
pelos belos corpos, pela admirao do vigor da juventude igualmente procura de
experincias diversas, que objetivam formar a prpria identidade e o enriquecimento das
prprias relaes humanas. Todavia, a questo mais profunda, e diz respeito a modos
de ser e valores equivocados que se tem cultuado na contemporaneidade mundial, seja
esta, uma sociedade do espetculo, como prope Debord, ou uma civilizao do
excesso, como interpreta Bauman.
O crush pode expressar culturalmente algo natural ao ser humano, como
asseria Plato, i. ., o desejo de prazer. Se, no entanto, este desejo de prazer restringir-se
somente ao corpreo sem avanar formas e expresses mais elevadas e, portanto,
tambm a prazeres mais qualificados, em nada se avana em sentido educacional, e
mesmo civilizatrio.
Como assere Reale, o amor desejo do belo, do bem, da sapincia, da
felicidade, da imortalidade44, no entanto, cr-se que este sentido ou esta direo dada ao
amor, no natural, mas sim, consequncia adquirida na experincia educativa de si
mesmo, em correlata relao ao mundo em que se vivencia prpria existncia45.
44 Cf. REALE, op. cit., p. 219. 45 Como possvel depreender-se da magistral passagem do dilogo Banquete, 210a-e; 211c-d: [...] deve
com efeito, comeou ela (Diotima), o que corretamente se encaminha a esse fim, comear quando jovem
por dirigir-se aos belos corpos, e em primeiro lugar, se corretamente o dirige seu dirigente, deve ele amar
um s corpo e ento gerar belos discursos; pois deve compreender que a beleza em qualquer corpo irm
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Do que se segue que na relao de ensino e aprendizagem, quando a ateno
do professor se direciona no somente contedos, porm, permitindo a abertura para a
vivncia dos prprios educandos, promove-se assim, o compreender de novos horizontes
educativos que se integram aos contedos necessrios, todavia, acrescentando-lhes
sentidos qualitativos, que dignificam e enobrecem a prpria relao entre professores e
alunos.
Considerado o crush como possvel expresso de primeira etapa do amor,
o amor pela particular beleza manifestada em um corpo belo, pode-se ponderar em
aproximada consonncia prpria descrio de amor apresentada por Diotima, propondo
assim um caminho ascendente de contemplao da beleza. Sem dvida a apresentao de
um novo arcabouo de valores se apresentam indispensveis, e neste novo caminho
propositivo que os belos discursos se tornam imprescindveis formao educativa e
filosfica.
Neste propsito, o direcionamento do olhar amoroso s coisas
verdadeiramente belas, a procura ao mais belo, indubitavelmente conduzir ao encontro
com as virtudes e, sobretudo, ao Bem46. Vislumbra-se assim, a inegvel probabilidade
quanto aos provveis benefcios a serem produzidos nas relaes humanas e na vida em
sociedade.
Resulta-se assim do exposto precedente, a plausibilidade embora soe pueril
de maior apreo filosofia ou ao amor filosofia. No obstante, o despertar para este
amor no se encontra restringido no desejo aos corpos belos, mas o bom uso desta fora
impulsiva de Eros, adicionando-lhe o melhor uso de uma racionalidade que, enfim
compreenda, a ausncia de desejo sabedoria nas sociedades contemporneas, pois, como
da que est em qualquer outro, e que, se deve procurar o belo na forma, muita tolice seria no considerar
uma s e mesma beleza em todos os corpos; e depois de entender isso, deve ele fazer-se amante de todos
os belos corpos e largar esse amor violento de um s [...] depois disso a beleza que est nas almas deve ele
considerar mais preciosa que a do corpo, de modo que, mesmo se algum de uma alma gentil tenha todavia
um escasso encanto, contente-se ele, ame e se interesse, e procura e produza discursos tais que tornem
melhores os jovens; para que ento seja obrigado a contemplar o belo nos ofcios e nas leis, e a ver assim
que todo ele tem um parentesco comum, e julgue de pouca monta o belo no corpo; depois dos ofcios para
o conhecimento que preciso transport-lo, a fim que veja tambm a beleza das cincias, e olhando para o
belo j muito, sem mais amor como um domstico a beleza individual de uma criana, de um homem ou
de um s costume, no seja ele, nessa escravido, miservel e um mesquinho discursador, mas voltado ao
vasto oceano do belo e contemplando-o, muitos discursos belos produza, e reflexes, em inesgotvel amor
sabedoria [...] Eis, com efeito, em que consiste o proceder corretamente nos caminhos do amor ou por
outro se deixar conduzir: em comear do que aqui belo e, em vista daquele belo, subir sempre, como
servindo-se de degraus [...] e conhea enfim o que em si belo.
46 Para Plato, o conceito de eros torna-se assim a suma e o compndio da aspirao humana ao bem.
JAEGER, ibid., p. 738.
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exorta o Banquete47: Uma das coisas mais belas a sabedoria, e o Amor amor pelo
belo, de modo que foroso o Amor ser filsofo, e sendo filsofo, estar entre o sbio e o
ignorante.
Consideraes finais
Ao longo do texto houveram algumas concluses que denotaram certo grau
de pessimismo em referncia a gria crush. Pois o seu mais direto significado se
identifica com um modo de ser puramente relacionado ao efmero e suprfluo, sendo
mais uma expresso de sujeio do poder constante da imagem e aos ininterruptos
estmulos visuais, aos quais, todos ns, encontramo-nos submetidos na
contemporaneidade.
Se por um lado, na juventude que devemos adquirir certos valores essenciais
s necessrias relaes humanas, tambm o perodo existencial que manifesta grandes
sonhos e ideais, de uma incerteza otimista quanto ao futuro como se em outro perodo
existencial se tornasse possvel haver certezas e a crena frequente de que tudo
realmente vivel de ser realizado. Triste seria, segundo esta linha argumentativa, de uma
juventude isenta de idealismo, do querer um amor ideal, de desejar o que causa prazer e
negar o que motivo de dor. Entrementes, no se pode confundir ideais com iluses, da
mesma que no possvel equivaler submisso a padres como livre-arbtrio.
A contemporaneidade possui certos aspectos comuns, devido mesmo a
internacionalizao cultural em que estamos inseridos, i. ., o local, de alguma forma,
sempre est imerso ao global. A rede mundial de computadores, as redes sociais,
desterritorializaram s relaes humanas, consoante ao demonstrado no pensamento de
Pierre Lvy. Para o filsofo francs, ampliou-se positivamente a comunicao, e o homem
ganhou novos horizontes e possibilidades que lhe enriquecem a existncia.
Em forma distinta, o socilogo polons Zygmunt Bauman, deduz que as
relaes humanas se tornaram empobrecidas, fluidas, sem, portanto, a necessria
consistncia qualitativa que deveriam sustentar s relaes humanas. Encontramo-nos
carentes de sabedoria e distanciados do que os gregos chamaram de bem viver ou boa
vida.
47 PLATO, op. cit., 204b.
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De maneira similar, embora de outra perspectiva argumentativa, Alasdair
MacIntyre prope que a grave ausncia de virtudes nas sociedades ocidentais
consequncia do individualismo das ticas modernas e do emotivismo encontrado nas
ticas contemporneas. novamente preciso aproximarmo-nos, enquanto sociedades
desenvolvidas e industrializadas, dos ideais de virtude, bem como, encontrarmos um tlos
que corresponda aos anseios da prpria racionalidade.
Mediante a toda esta complexidade, tem-se em Plato, algumas possibilidades
para repensarmos o nosso comportamento e nossos valores. Entrementes, no se trata de
acordarmos em absoluto com o pensamento platnico, e nem de crermos na possibilidade
de haver na obra do filsofo grego, todas as respostas que procuramos em nossas
inquiries. No obstante, a maneira como Plato prope filosofia, i. ., como amor ao
saber que forma o homem de maneira marcadamente espiritual, ou seja, do homem
integrado ao cosmo e em correspondncia a um ideal de perfeio, beleza e sabedoria,
manifesta uma maneira de ser ou um modo de vida que se ope ao materialismo
existencial vigente.
Os filsofos, os professores, os pesquisadores das cincias humanas, no
podem omitir-se quanto formao moral, cvica, poltica e comportamental da juvenil
adolescncia. Pois muito se instrui o intelecto, mas pouco ainda se faz em relao
verdadeira educao que, como propusera Plato, educao para as virtudes. Contudo,
conforme asserido, no possvel educar para as virtudes se no valoramos os bens
internos ao esprito humano.
preciso dizer com coragem s sociedades e s instituies, muitas das quais
instituies educacionais: nem tudo que parece ter valor digno de ser valorado. Tal
assertiva, inclusive, revela o sentido aproximado expresso no seguinte: Tudo me lcito,
mas nem tudo convm, procuro no me deixar dominar por nada48.
A exortao do apstolo Paulo, nos revela algo importante para ainda
pensarmos nestas palavras finais de encerramento. O ser humano independente da poca
e do contexto histrico, e independentemente de qualquer possvel determinismo
geogrfico ou cultural, possui em si mesmo certas tendncias internas, devendo-se educar
lhe, para no se perder no excesso de suas imperfeies morais ou na carncia do que lhe
oposto, ou seja, a virtude.
48 PAULO, 1 Carta aos Corntios 6, 12.
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Como considerado, tem-se o excesso de bens materiais e superabundncia do
suprfluo e do descartvel, em patolgica valorizao objetos que promovam o prazer
somente ao corpreo e aos sentidos, no obstante, desvelada a factual ausncia de
virtudes, de satisfao de si, de prazeres qualificados que enobream e que ofertem reais
sentidos existncia, para alm da aparncia fsica e da transitoriedade de bens de
consumo.
Plato propunha que todo ser humano detentor de um defeito inato, o amor
excessivo de si mesmo, como tambm a existncia do desejo inato de prazer. Logo, se
no oferecermos aos adolescentes e s crianas, aos jovens, enfim, a solidez, portanto,
em oposio a liquidez, quanto a maneiras corretas de se proceder e de agir consigo
mesmo e com os outros, as novas geraes correm o risco de tornarem-se incapazes de
desejarem o que no se v com os olhos do corpo.
este o sentido que o crush no poderia somente ser, embora o seja, i., ,
o desejo pelo belo sem nenhuma intencionalidade de procurar o mais Belo, no havendo
assim uma verticalidade dialtica ascendente, tudo se d no corpreo e neste permanece.
somente neste sentido que se pode permitir equivalncia entre crush e amor
platnico, ou seja, somente na concepo common sense do termo, porquanto, o amor
platnico, repete-se, no idealizado no sentido comum de entendimento da expresso,
de inalcanabilidade, de desejo, porm, apenas ao que manifesta corporeidade.
O outro provvel sentido de crush e sua equivalncia ao amor platnico,
no o do senso comum, mas o da tradio de Eros como fora impulsiva que direciona
Verdade (Altheia) e Sabedoria (Sopha), torna-se possvel apenas quando partcipe da
educao. Nisto a funo do filsofo, do professor, para ento corrigir e orientar, em
suma, para conduzir (psicagoga) o olhar da psych do jovem ao incessante procurar do
mais Belo, que necessariamente tem de se vincular abstrata imaterialidade, logo,
condizente assim, a universalidade do Justo e do Bem.
Do que se conclui em sentido abrangente que a exigncia platnica de amor
ao Belo, constitudo de um convite e de um aviso. Convite, porque convida-nos
procura de uma Beleza que no se encontra na transitoriedade daquilo que perece,
envelhece, morre. Aviso, ou alerta, porquanto se no aceitarmos o convite, possivelmente
estejamos fadados a incapacidade de nunca contemplarmos o Belo, assim, contentando-
nos s aparncias como se estas fossem a realidade originria, exatamente como
prisioneiros, em uma caverna pouco iluminada.
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