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INTRODUO

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INTRODUOASPERGILLUS E ASPERGILOSEAs micoses oportunistas tm aumentado substancialmente, podendo ser, o agente etiolgico responsvel, qualquer fungo saprfita ou comensal. Aspergilose um exemplo de micose oportunista provocada por fungos filamentosos, biquos e pertencentes ao gnero Aspergillus. A doena no Homem pode ocorrer por mecanismos no infecciosos como a inalao dos respectivos esporos do fungo. Indivduos atpicos e no atpicos desenvolvem reaces alrgicas aos antignios de esporos inalados (Richardson & Warnock, 2003). Infeces graves, como Aspergilose Invasiva (AI), surgem em grande maioria nos doentes imunodeprimidos, particularmente nos doentes com leucemia, com aplasia medular, nos submetidos a transplantao medular, nos receptores de rgos slidos e nos indivduos com tratamentos prolongados de quimioterapia ou base de corticosterides (Saballs-Radresa et al., 2000; Richardson & Warnock, 2003) em que, os esporos inalados podem entrar e germinar, originando hifas nos pulmes que tendem a invadir tambm outros tecidos ou rgos (O'Fel, 1997; Raja & Singh, 2006). Assim, a inalao de esporos de Aspergillus o modo habitual no desenvolvimento de infeces nos humanos, sendo o perodo de incubao desconhecido (Richardson & Warnock, 2003). Numa 1 fase, estes esporos, caracterizam-se por desenvolverem no Homem infeces que so predominantemente de origem pulmonar, isto se encontrarem condies locais e/ou gerais que favoream a sua implantao (O'Fel, 1997). A Aspergilose Pulmonar Invasiva (API) uma infeco oportunista, de prognstico reservado, ocorrendo principalmente em indivduos imunocomprometidos (Nourry et al., 2005) com maior-3-

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incidncia nos doentes que recebem terapia imunossupressora. A inalao dos esporos biqios no ambiente hospitalar (Herbrecht et al., 2004) e sobretudo com concentraes mais elevadas durante obras, a consequente germinao j no hospedeiro, leva a que doentes susceptveis possam contrair facilmente aspergiloses pulmonares (Einsele et al., 1998). Na maioria dos casos de AI difcil determinar se a infeco foi adquirida dentro ou fora do estabelecimento hospitalar, sendo espordicos os casos descritos como associados a ambientes exteriores ao ambiente hospitalar. No entanto, parece provvel que alguns indivduos sejam colonizados antes da sua admisso no hospital e venham a desenvolver doena invasiva quando ficam neutropnicos (Richardson & Warnock, 2003). A capacidade de invaso dos esporos depende da virulncia do fungo, das defesas do hospedeiro e ainda da modalidade da exposio, em especial da quantidade de esporos inalados (O'Fel, 1997; Richardson & Warnock, 2003; Richardson, 2005b).

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1. Fungos do gnero AspergillusDentro do gnero Aspergillus, a espcie com maior poder patognico o Aspergillus fumigatus (A. fumigatus) (Peixinho et al., 2003; Raja & Singh, 2006). Esta espcie, termotolerante, capaz de suportar temperaturas da ordem dos 55C (Latge, 1999), bem como de crescer a temperaturas que se aproximam do limite mximo encontrado em todos os eucariotas. Estas caractersticas sugerem que estes organismos apresentam mecanismos nicos de resistncia ao stress, podendo justificar a sua capacidade de adaptao ao crescimento em stress no hospedeiro (Bhabhra & Askew, 2005). O A. fumigatus o agente etiolgico responsvel por aproximadamente 90% das Aspergiloses Invasivas diagnosticadas (Latge, 1999; Araujo et al., 2005a). Porm, muitas outras espcies, incluindo Aspergillus flavus, Aspergillus niger, Aspergillus terreus e Aspergillus nidulans podem ser responsabilizadas pelo aparecimento de doena (Latge, 1999; Moragues et al., 2003). O A. fumigatus pode encontrar-se com relativa facilidade no solo, na gua, nos vegetais (Moragues et al., 2003), nos alimentos ou na matria orgnica em decomposio aerbia, no p e no ar exterior e interior das casas, incluindo os hospitais, (Richardson & Warnock, 2003; Herbrecht et al., 2004) o que justifica a fcil propagao dos seus condios atravs das correntes de ar (Raja & Singh, 2006).

1.1. MorfologiaOs fungos filamentosos do gnero Aspergillus pertencem famlia das Aspergillaceae e classe dos Ascomicetos (Sharma & Chwogule, 1998; Larone, 2002). Estes organismos apresentam um talo filamentoso constitudo por hifas septadas, com ramificaes dicotmicas fazendo ngulos de 45 (Sharma & Chwogule, 1998), mostrando-5-

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estruturas de reproduo assexuada situadas no cimo de uma vescula terminal com forma varivel e que o prolongamento do conidiforo. A forma da vescula (esfrica, hemisfrica, alongada ou elptica) constitui uma caracterstica de identificao da respectiva espcie. Quanto cor, esta estrutura apresenta-se igual ao conidiforo ou incolor. O conjunto da vescula, das clulas conidiogneas tambm denominadas por filides, e, das cadeias de condios, designado por cabea aspergilar. Esta suportada por um conidiforo que em regra perpendicular clula p (Larone, 2002). As filides, que formam cadeias baspetas de esporos, designados de fialocondios, inserem-se na vescula e podem constituir uma ou mais sries (Larone, 2002). Nas espcies unisseriadas, os fialocondios so produzidos directamente pelas primeiras filides, como se verifica na espcie A. fumigatus. Nas espcies bisseriadas, as estruturas que constituem a 1 srie, denominadas por mtulas ou filides de 1 ordem, so estreis, sendo exemplo A. nidulans (Latge, 1999).

O fialocondio, separado da clula conidiognea por intermdio de um septo, apresenta uma forma varivel, podendo ir de esfrica a alongada, e ter dimenses que oscilam entre 2 e 5 m. Quanto sua cor, esta pode apresentar-se de clara a escura, sendo responsvel pela cor da colnia (Larone, 2002).

Relativamente ao aspecto macroscpico, as colnias apresentam uma superfcie de cor branca, na fase inicial de maturao. Dependendo das espcies, a sua cor pode evoluir para verde, amarelo, laranja, castanho ou preto. No seu verso, a colnia apresenta-se geralmente branca, dourada ou acastanhada. A textura da colnia surge algodoada, tornandose pulverulenta com a produo de esporos, os quais, podem apresentar rugosidade da parede, caracterstica igualmente importante na identificao de espcie (O'Fel, 1997; Larone, 2002).

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A

B

Figura 1 Aspecto macroscpico (A). Colnias de Aspergillus fumigatus em meio de Sabouraud Dextrose Agar, incubadas 5 dias a 25C. Aspecto microscpico (B). Cabeas aspergilares: conidiforos, vesculas, filides e fialocondios.

As espcies so ento identificadas de acordo com as diferenas morfolgicas observadas, quer macroscpicas quer microscpicas. As formas sexuadas destes fungos, pertencentes classe dos Ascomicetos, no so habitualmente encontradas a partir dos isolados clnicos (Latge, 1999).

Existem mais de 200 espcies dentro deste gnero, mas apenas cerca de 20 tm sido encontradas como causa de doena (Richardson & Warnock, 2003). No entanto, so mais frequentemente isoladas: A. niger, A. nidulans, A. terreus e, com maior predomnio nos pases temperados, a espcie A. fumigatus. As espcies A. flavus e A. niger so mais frequentes nos pases tropicais (O'Fel, 1997).

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1.2. PatogneseHipersensibilidade, colonizao ou infeco Como foi referido, o agente etiolgico da aspergilose ubquo no meio ambiente e, a infeco, que pode ocorrer por inalao, massiva ou prolongada, ou por implantao dos esporos, depende grandemente de factores inerentes ao hospedeiro. A AI tem constitudo um problema grave em diversos grupos de doentes imunocomprometidos. Como grupos de risco incluem-se doentes com neoplasia hematolgica, em particular com leucemia aguda, receptores de stem cells, receptores de rgos slidos, doentes tratados com altas doses de corticosterides e indivduos com deficincias de neutrfilos, ao nvel do nmero ou da funo (Richardson & Warnock, 2003). Adicionalmente, outras causas podero predispor ao aparecimento da AI, tais como a diabetes, infeces por citomegalovrus (CMV), alcoolismo e a administrao parenteral de antibiticos (Raja & Singh, 2006). O aparecimento da infeco est assim facilitado por alguns factores predisponentes, os quais, podem ser divididos em factores gerais e em factores locais. Nos factores gerais incluem-se o nmero de esporos que so inalados e a diminuio dos mecanismos de defesa imunitria. A diminuio do nmero ou a alterao da funo dos macrfagos alveolares e/ou dos neutrfilos polimorfonucleares constitui uma influncia determinante nas formas invasivas (O'Fel, 1997). A nvel pulmonar, os macrfagos alveolares so capazes de fagocitar e destruir os condios inalados. Nas situaes em que os macrfagos apresentam uma capacidade reduzida de resposta na neutralizao do inculo, os esporos podem germinar ao nvel do tecido pulmonar (Bellocchio et al., 2005; Brooks et al., 2005). A utilizao de drogas citotxicas, imunodepressivas, de corticides, bem como de antibiticos, representa o factor mais frequentemente associado ao aparecimento da infeco

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(O'Fel, 1997; Stevens, 2002). Relativamente aos factores locais poderemos enumerar os factores anatmicos, nomeadamente a existncia de cavidades pulmonares preexistentes, que contribuem para o aparecimento do aspergiloma, e os factores de origem iatrognica, como cateteres e prteses de vlvula cardaca os quais podem constituir a porta de entrada do fungo no organismo humano (O'Fel, 1997; Latge, 1999). Tendo em conta os factores anatmicos, de referir que, nos pulmes, os condios intumescem e acabam por germinar originando hifas septadas e ramificadas em ngulo agudo. Estas hifas, recm formadas, tendem a desenvolver-se em cavidades preexistentes, resultando na formao de uma bola de fungos ou aspergiloma, que constitui uma massa acastanhada livre dentro das cavidades. As cavidades resultam em geral de tuberculose, bronquiectasia, enfartes antigos ou abcessos (Sharma & Chwogule, 1998; Latge, 1999). Os fungos do gnero Aspergillus apresentam tendncia a invadir os vasos sanguneos, sendo que, reas de hemorragia e enfarte so expostas s reaces tecidulares inflamatrias necrosantes (Cotran et al., 2000; Brooks et al., 2005). Durante o processo infeccioso verifica-se a fixao do fungo a protenas do hospedeiro (fibronectina, laminina, vibronectina e colagnio), o que, frequentemente, revelado por microleses da membrana basal. A adeso seguida da degradao destas molculas por proteases elaboradas pelo prprio fungo. De resto, estas exoproteases degradam as protenas plasmticas (fibrinognio) interferindo com a hemostase, justificando assim o aparecimento de fenmenos hemorrgicos (O'Fel, 1997; Rementeria et al., 2005). ainda de referir que as espcies de Aspergillus so caracterizadas por libertarem toxinas, em particular aflatoxinas, restrictocina e mitogilina, as quais podem ser importantes no desenvolvimento de doenas no Homem (Cotran et al., 2000; Rementeria et al., 2005). Recentemente, foi discutida uma possvel relao entre a produo de micotoxinas e a patogenicidade do fungo. Foi ainda verificada a existncia de micotoxinas com capacidade

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de alterar o sistema de defesa do hospedeiro, podendo a actividade imunossupressora resultante ajudar o fungo a invadir os tecidos e funcionar como um factor de virulncia (Kamei & Watanabe, 2005). As aflatoxinas, particularmente a B1, so micotoxinas responsabilizadas por efeitos carcinogneos a nvel heptico. A mitogilina e a restrictocina so ribotoxinas caracterizadas por inibirem a sntese de protenas pelas clulas do hospedeiro, atravs da degradao de RNA mensageiro (Lamy et al., 1991; Kamei & Watanabe, 2005). Sabe-se ainda que a mitogilina um forte indutor de imunoglobulina da classe E (IgE), podendo assim estar envolvida nas respostas alrgicas do hospedeiro ao Aspergillus (Cotran et al., 2000). Aspergillus fumigatus, causa principal de AI, para alm da colonizao saproftica nas cavidades preexistentes nos pulmes, , assim, considerado como um patognico oportunista importante. Este fungo tem sido referido como um importante causador de doenas alrgicas respiratrias, incluindo, de entre outras asma, aspergilose broncopulmonar alrgica e sinusite fngica alrgica (Kurup, 2005; Paoletti et al., 2005). At ao momento foram detectados e propostos 23 alergenos, classificados de Asp f1 a Asp f23; no entanto, nem todos foram aceites e reconhecidos como tal. A sua produo durante o crescimento fngico em situao de AI no certa. Porm, todos estes alergenos aparecem numa resposta imune activa de hipersensibilidade do tipo I, com produo de anticorpos de alta afinidade dos tipos IgG e IgE. Os indivduos imunocompetentes, regularmente afectados, apresentam elevados nveis destes anticorpos, e, embora estes no sejam sempre protectores contra uma infeco invasiva podem ser teis no diagnstico proposto (Rementeria et al., 2005). Reaces de hipersensibilidade do tipo III e do tipo IV so verificadas na alveolite alrgica por sensibilizao aos esporos de Aspergillus (Cotran et al., 2000). Na aspergilose broncopulmonar alrgica, verifica-se uma resposta imune do tipo I, III e IV (Kurup, 2005).

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1.3. Modo de transmissoFungos do gnero Aspergillus so biquos, saprfitas e presentes esporadicamente nas vias respiratrias de indivduos sos (Peixinho et al., 2003; del Palacio et al., 2003a). Apresentam assim distribuio universal, com a particularidade de se reproduzirem por intermdio de grandes quantidades de pequenos esporos, os quais so encontrados na atmosfera durante todo o ano e considerados como contaminantes comuns do laboratrio (Sharma & Chwogule, 1998; del Palacio et al., 2003a). Facilmente aerossolizados, pela sua pequena dimenso, os condios podem atingir os alvolos pulmonares (Raja & Singh, 2006). Assim, a principal via de penetrao dos esporos fngicos a via area (Richardson & Warnock, 2003), sendo o aparelho broncopulmonar mais susceptvel doena aspergilar (Greene, 2005). No entanto, existem casos de colonizao de determinados tecidos do hospedeiro por espcies de Aspergillus, as quais esto na origem de infeces localizadas, no invasivas. Estas espcies, penetrando por via area, podem afectar os seios nasais originando sinusites, ou, ainda, por inoculao directa, a crnea, o canal auditivo externo, as unhas, mais raramente a pele, e, por inoculao inadvertida, endocardites (O'Fel, 1997; Richardson & Warnock, 2003).

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2. AspergilosesA designao de aspergilose engloba um espectro de doenas consideradas como micoses provocadas por fungos do gnero Aspergillus. A doena foi confundida, durante muito tempo, com a infeco pulmonar apresentada por tratadores de pombos. A aspergilose , de entre as micoses pulmonares conhecidas, a mais frequente, representando um grupo de doenas que, sendo provocadas pelo mesmo agente etiolgico, tm uma patognese varivel (Peixinho et al., 2003). Actualmente, considerada como a segunda micose oportunista mais frequente, sendo que, a primeira, a candidose (Richardson, 2005b). Preferencialmente afecta os pulmes. Menos frequentes so as afeces ao nvel dos seios perinasais, do sistema nervoso central e do tubo digestivo, nomeadamente ao nvel do esfago. Apenas ocasionalmente afectam os olhos e o endocrdio. A invaso tecidular com carcter infeccioso observada em doentes imunodeprimidos, sobretudo nos doentes que apresentam uma neutropenia prolongada ou que receberam elevadas e continuadas doses de corticides, podendo tambm afectar os doentes que recebem transplante de rgos slidos (Klont et al., 2004). Verifica-se que doentes atpicos e no atpicos, quando expostos a uma inalao massiva de esporos de Aspergillus, como o exemplo dos trabalhadores do malte, podem apresentar reaces alrgicas de hipersensibilidade (Richardson & Warnock, 2003), doena resultante de mecanismos no infecciosos.

Existem vrios tipos de manifestaes clnicas que podem ser devidas a infeces por fungos do gnero Aspergillus, podendo tambm ocorrer situaes no infecciosas.

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2.1. Manifestaes clnicas a nvel pulmonar

2.1.1. Aspergiloma

Aspergiloma referido como o desenvolvimento do fungo in situ numa cavidade preexistente e em comunicao com a rvore respiratria superior, permitindo, por um lado, a chegada dos esporos, e, por outro, o arejamento da cavidade necessrio ao crescimento fngico, dando origem a quantidades abundantes de hifas e mesmo cabeas aspergilares (Figura 2) no espao pulmonar anormal (O'Fel, 1997; Richardson & Warnock, 2003; Greene, 2005; Hope et al., 2005a).

Figura 2 Cabeas aspergilares na cavidade pulmonar. Adaptado de Chandler et. al., (1980).

A ausncia de defesas ao nvel do local, nomeadamente macrfagos, permite o desenvolvimento da bola de fungos (O'Fel, 1997).

Manifestaes clnicas Alguns doentes so assintomticos, enquanto outros desenvolvem sintomatologia. As manifestaes clnicas podem ser vrias. Como principais, poderemos considerar as

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seguintes: hemoptises como sintoma mais comum, ocorrendo em cerca de 50% a 80% dos casos, tosse crnica, expectorao, febre, dispneia, astenia e emagrecimento (O'Fel, 1997; Richardson & Warnock, 2003). O exame radiolgico apresenta uma imagem caracterstica, a qual corresponde a uma imagem em guizo, com opacidade arredondada em torno de uma cavidade de bordos finos (O'Fel, 1997; Richardson & Warnock, 2003).

Evoluo e prognstico do aspergiloma Podem ser verificadas vrias situaes ao nvel da evoluo e do prognstico. O fungo pode morrer, verificando-se uma calcificao em 7 a 10% dos casos. Poder ocorrer uma estabilizao clnica e radiolgica, importante em 25% dos aspergilomas diagnosticados, sem vastas alteraes parenquimatosas. A complicao mais importante a hemoptise recidivante e abundante, constituindo sria ameaa vida (O'Fel, 1997; Latge, 1999). A maioria dos doentes apresentam episdios intermitentes de pequenas hemorragias sucessivas, mas, acima de 25% sofrem hemoptises graves e fatais (Richardson & Warnock, 2003; Hope et al., 2005a) Mais raramente, observada uma supurao broncopulmonar aguda ou crnica evolutiva conduzindo a uma insuficincia respiratria progressiva. A evoluo para API nos imunodeprimidos ou nos indivduos debilitados rara (O'Fel, 1997).

2.1.2. Aspergilose difusa invasiva ou septicmica A AI uma infeco sria nos doentes comprometidos imunologicamente (Becker et al., 2000; Sanguinetti et al., 2003).

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O agente mais comum A. fumigatus, mas, tambm, espcies como A. flavus, A. terreus e A. niger podem ser responsveis, sendo a doena causada pelas diferentes espcies de Aspergillus clinicamente indistinguvel (Hiltermann et al., 2003). Encontram-se bem estabelecidos os factores de risco para a AI, estando includos: uma infeco pulmonar subjacente; neutropenia prolongada; uma terapia imunossupressora; transplantao alognica de stem cells, Doena do Enxerto Contra Hospedeiro (DECH) e seu tratamento (Becker et al., 2000). Os doentes receptores de transplantao alognica de stem cells desenvolvem mais frequentemente doena disseminada, ao passo que, pessoas com doenas hematolgicas malignas desenvolvem normalmente doena pulmonar invasiva difusa (Richardson, 2005b). A AI corresponde ao desenvolvimento de formas aspergilares no parnquima pulmonar (Figura 3) de indivduos imunodeprimidos ou sujeitos a teraputicas extremamente agressivas pelo uso de corticides, antibiticos e drogas imunossupressoras, bem como nos casos de agranulocitose prolongada (O'Fel, 1997; Sharma & Chwogule, 1998; Raja & Singh, 2006).

Figura 3 Aspergillus fumigatus causando AI num pulmo humano. Caracterstica morfolgica da ramificao dicotmica em ngulo agudo das hifas no tecido. Adaptado de Chandler et. al., (1980).

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Manifestaes clnicas A AI pode ser dividida em duas entidades clnicas, no que respeita sua evoluo: a Aspergilose Pulmonar Invasiva clssica e a Aspergilose Pulmonar necrosante crnica, sendo esta ltima uma doena menos severa que est normalmente associada a indivduos com uma doena subjacente de menor gravidade (Hiltermann et al., 2003). A forma clssica, que ocorre em doentes severamente imunocomprometidos (com leucemia linfoctica, linfoma, receptores de transplantao de medula ssea, e principalmente em doentes com terapia corticide) (Richardson & Warnock, 2003), resulta da inalao massiva de esporos de fungos do gnero Aspergillus. A germinao dos condios pode afectar os pulmes e os seios perinasais, levando a doena invasiva sob a forma de processo pneumnico agudo com ou sem disseminao. Na imagem de Tomografia Computorizada (TC) apresentada na Figura 4, possvel visualizar as leses de um doente com aspergilose pulmonar. As leses assumem um aspecto idntico ao de situaes de pneumonia necrosante, com focos cinzentos, arredondados e bem delineados, apresentando bordos hemorrgicos, sendo muitas vezes denominadas de leses alvo (seta) (Cotran et al., 2000).

Figura 4 Tomografia Computorizada de um doente com Aspergilose Pulmonar (gentilmente cedida pelo Servio de Transplantao de Medula ssea do IPO Porto).

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A forma necrosante crnica da API ocorre em pessoas ocasionalmente imunodeprimidas, devido a uma doena pulmonar preexistente ou a debilidade no seu sistema imune causada por diabetes ou abuso do lcool, etc. (Hiltermann et al., 2003; Raja & Singh, 2006). Assim, a API apresenta-se como uma infeco progressiva, aguda e severa, de mau prognstico, podendo ser fatal, ocorrendo primariamente em doentes com elevado grau de imunocomprometimento (Hiltermann et al., 2003; Peixinho et al., 2003; Nourry et al., 2005). A maioria dos casos de AI ocorre entre receptores de transplantao medular alognica, normalmente em associao com DECH. Ao contrrio, em doentes submetidos a autotransplante, a AI rara, sendo a neutropenia o principal factor de risco (Bow, 2005; Richardson, 2005b).

Evoluo A evoluo frequente e rapidamente mortal, independentemente da doena primria subjacente, a menos que, seja diagnosticada numa fase inicial e tratada precocemente de modo eficaz. Nos indivduos que apresentam imunossupresso, o microrganismo difunde-se a partir do local primrio para os tecidos contguos, sem considerar os planos tecidulares. As hifas invadem o lmen e a parede dos vasos sanguneos, sendo responsveis por trombose, enfarte, necrose e hemorragias (Richardson & Warnock, 2003; Brooks et al., 2005). possvel uma disseminao do fungo a partir dos pulmes para o tracto gastrointestinal, os rins, o crebro, o fgado, ou outros rgos, originando abcessos e leses necrticas. Este tipo de infeco traduz-se num quadro clnico grave (O'Fel, 1997; Brooks et al., 2005). Como maior manifestao da doena temos o aparecimento de febre, a qual no responde ao protocolo teraputico antibacteriano usado (Sulahian et al., 2001), e, algumas vezes, tambm no responde terapia imposta com anfotericina B (Hiltermann et al., 2003).- 17 -

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Outros sintomas podem ainda ser observados, tais como: tosse, dores e hemoptises, sendo que, a sua presena sugere invaso vascular pelos fungos (Brooks et al., 2005). A radiografia pode aparecer normal (Sulahian et al., 2001), ou, ainda, revelar leses nodulares ou infiltrados (Sharma & Chwogule, 1998; Hiltermann et al., 2003), sendo que a TC altamente sugestiva nos doentes neutropnicos quando detectada a presena do sinal de halo (Sulahian et al., 2001).

2.1.3. Bronquite aspergilar/Traqueobronquite

A traqueobronquite verifica-se muitas vezes em doentes com SIDA e, tambm, em receptores de transplante pulmonar (Richardson & Warnock, 2003). A bronquite aspergilar uma infeco rara, sendo caracterizada pelo

desenvolvimento do fungo sobre a parede dos brnquios espessados (O'Fel, 1997) ou pela formao de membranas ou lceras nas vias respiratrias (Sharma & Chwogule, 1998).

Manifestaes clnicas O doente, na expectorao, elimina fragmentos fngicos. O rolho de muco e a formao das membranas levam obstruo das vias respiratrias originando dificuldades respiratrias (Sharma & Chwogule, 1998), sendo que, alguns doentes apresentam tosse e febre (Richardson & Warnock, 2003). Aproximadamente 10% dos doentes com AI desenvolvem traqueobronquite isolada ou associada a pneumonia (Sharma & Chwogule, 1998).

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Evoluo Normalmente favorvel, sendo acelerada por aerossis mucolticos, e, sobretudo, por manobras de aspirao endoscpica, permitindo assim a extraco do rolho de muco ou a sua expulso ps-endoscpica (Richardson & Warnock, 2003). possvel nestas situaes acontecerem recidivas (O'Fel, 1997).

2.1.4. Superinfeco aspergilar de broncopneumopatias obstructivas crnicas

uma patologia vulgar verificada nos servios de pneumologia dos adultos e das crianas. Doentes com broncopneumopatias crnicas, nomeadamente bronquite crnica, asma severa, muco viscoso e graves perturbaes na eliminao das secrees, apresentam excelentes condies para contrarem infeco aspergilar. Nas secrees brnquicas destes doentes podemos encontrar fungos do gnero Aspergillus, de uma forma intermitente e em quantidades variveis (O'Fel, 1997). indispensvel assegurar, com regularidade, uma desinfeco rigorosa dos aparelhos de ventilao e dos aparelhos de aerossis, de forma a eliminar os fungos que eventualmente possam albergar (O'Fel, 1997).

2.1.5. Aspergilose alrgica

A aspergilose alrgica definida como um conjunto de manifestaes alrgicas provocadas pela inalao de esporos de Aspergillus, em que o desenvolvimento de anticorpos do tipo IgE, contra os antignios de superfcie dos condios, desencadeia acessos de asma imediatos em doentes atpicos por exposio subsequente (Richardson & Warnock, 2003).

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Em alguns indivduos os condios germinam e as hifas colonizam a rvore brnquica, sem invadirem o parnquima pulmonar, originando uma sintomatologia caracterstica de aspergilose broncopulmonar alrgica ou asma com eosinfilia pulmonar, tambm designada por doena de HINSON (O'Fel, 1997; Richardson & Warnock, 2003; Brooks et al., 2005).

Manifestaes clnicas Esta afeco, observada nos doentes afectados por asma brnquica ou por fibrose qustica com colonizao brnquica por Aspergillus, caracterizada por asma com dispneia contnua, febre, infiltrados pulmonares durveis resultando numa dilatao crnica das vias areas, hipereosinfilia tanto no sangue como na expectorao (O'Fel, 1997; Richardson & Warnock, 2003). Uma outra manifestao de aspergilose alrgica, que ocorre por aspirao massiva de esporos de Aspergillus, em indivduos no atpicos, a alveolite alrgica extrnseca (O'Fel, 1997; Sharma & Chwogule, 1998).

Evoluo A evoluo extremamente grave. Apresenta perodos febris recidivantes, acompanhados de exacerbao. As manifestaes de dispneia aparecem periodicamente. Verifica-se uma evoluo crnica, em que a destruio brnquica origina frequentemente obstruo prolongada, por rolhes de muco (doena pulmonar obstrutiva crnica). Esta forma de aspergilose apresenta um prognstico reservado, dada a progressiva perturbao da funo respiratria (O'Fel, 1997). O exame fsico, nos estdios agudos da doena, revela cianose e taquicardia (Sharma & Chwogule, 1998).

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2.2. Manifestaes clnicas extrapulmonares

Para alm das infeces ao nvel pulmonar, so ainda de referir outros tipos de infeco por Aspergillus spp., com localizao extra pulmonar. So elas, como mais frequentes, a aspergilose cutnea, otomicose, aspergilose sinusal, endocardite e aspergilose cerebral.

2.2.1. Aspergilose cutnea

A aspergilose cutnea definida como um conjunto de leses cutneas associadas a AI ou sistmica. Estas leses so caracterizadas por placas drmicas necrosantes, abcessos ou granulomas subcutneos e mculas ou ppulas drmicas apresentando erupo com tendncia supurativa (Richardson & Warnock, 2003; Hope et al., 2005a). Existem duas formas de aspergilose cutnea, primria e secundria, as quais foram descritas em doentes imunocomprometidos, nomeadamente em doentes oncolgicos (Richardson & Warnock, 2003; Mays et al., 2006). A infeco fngica primria, na pele, resulta de uma inoculao directa do fungo, manifestando-se pelo aparecimento de leses nas proximidades do local de insero de cateteres intravenosos ou mesmo no prprio local ou ainda em zonas de fissuras (Hope et al., 2005a). Para alm de espcies de Aspergillus, nesta forma de infeco podem estar implicadas espcies de Fusarium, Mucor e Rhizopus. A aspergilose cutnea secundria verifica-se a partir da infeco cutnea, por invaso de tecidos profundos, originando formas disseminadas em hospedeiros neutropnicos (Richardson & Warnock, 2003; Hope et al., 2005a). No entanto, em alguns doentes com sinusite fngica invasiva, poder haver uma extenso directa pele causando celulite fngica da face (Mays et al., 2006).

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2.2.2. Otomicose

A otomicose corresponde a uma infeco do pavilho auditivo externo (del Palacio et al., 2003a), sendo considerada uma infeco benigna que ocorre habitualmente como complicao de leses cutneas primrias (eczema, dermatite crnica irritativa) ou ainda por malformaes anatmicas. Tambm a utilizao de corticides e a aplicao tpica de antibiticos de largo espectro por perodos prolongados, favorece o aparecimento da infeco (O'Fel, 1997). Segundo OFel (1997), esta doena caracterizada por um rolho micelar localizado no pavilho auditivo externo e por vezes no tmpano. Clinicamente, a obstruo mecnica provoca alguns sintomas tais como prurido, surdez, dor localizada, zumbido e exsudado moderado. Apresenta com frequncia a possibilidade de recidivar.

2.2.3. Aspergilose sinusal

A aspergilose sinusal uma infeco que ocorre com alguma frequncia, sendo observada num contexto de imunodepresso, em doentes que possuem sinusites crnicas unilaterais (O'Fel, 1997). Podem ocorrer em adultos jovens imunocompetentes com recidivas de rinosinusite crnica, que no respondem terapia feita com antibiticos, anti-histamnicos ou corticosterides. Os doentes, muitas vezes, apresentam uma polipose nasal unilateral, com muco espesso amarelo-esverdeado e sinusite (Richardson & Warnock, 2003). Manifesta-se por leses granulomatosas crnicas, aspergilomas ou sinusite com invaso do palato, da rbita e da base do crnio, sendo devida a uma afectao dos seios perinasais por Aspergillus (Hope et al., 2005a).

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2.2.4. Endocardite

A endocardite fngica por vezes verificada nos doentes submetidos a cirurgia cardaca, ainda que tambm seja descrita como uma complicao do abuso de drogas parenterais. Os sinais clnicos, bem como os sintomas, so semelhantes aos da endocardite bacteriana. A doena pode ser abrupta ou insidiosa. Alguns dos sintomas como: febre, fadiga, perda de apetite e de peso, so comuns, embora inespecficos. Podem tambm ser observadas queixas cardacas em 50 a 90% dos doentes, bem como aumento de mau humor em 30%. Embolia com obstruo das artrias principais, particularmente as do crebro, ocorre em cerca de 80% dos casos (Richardson & Warnock, 2003).

2.2.5. Aspergilose cerebral

mais comum ocorrer uma aspergilose cerebral aps uma disseminao hematognea a partir de uma infeco pulmonar (Richardson & Warnock, 2003). O Sistema Nervoso Central (SNC) envolvido em 10 a 20% dos casos de aspergilose disseminada (Saballs-Radresa et al., 2000; Richardson & Warnock, 2003), mas a infeco cerebral raramente diagnosticada ante-morte. Esta forma de aspergilose apresenta elevada mortalidade nos doentes imunocomprometidos (Siddiqui et al., 2004). Nos doentes submetidos a transplante de stem cells, a infeco por Aspergillus uma causa comum de abcessos cerebrais (Richardson & Warnock, 2003), os quais, na maioria dos casos, tambm so devidos a disseminao hematognea (Hope et al., 2005a). A exibio de sinais clnicos e a taxa de progresso de aspergilose cerebral difere de doente para doente (Richardson & Warnock, 2003).

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2.3. Epidemiologia, controlo e tratamento da aspergiloseA pneumonia a manifestao clnica mais frequentemente provocada por este fungo oportunista, sendo descritas mltiplas formas de AI (Kontoyiannis et al., 2005). Os esporos das espcies de Aspergillus, ao serem inalados, podem ser depositados nos alvolos pulmonares. Num hospedeiro susceptvel, o condio pode germinar e originar uma hifa que, tambm ela, se pode desenvolver e invadir os tecidos pulmonares. Dependendo do estado imunitrio do hospedeiro, o crescimento fngico pode restringir-se s vias areas, invadir a membrana basal, ou invadir os vasos sanguneos causando hemorragia e finalmente disseminao (Mennink-Kersten et al., 2004). A AI, doena oportunista em hospedeiros imunossuprimidos, representa nestes doentes uma significativa ameaa de vida, com uma prevalncia varivel entre 0,5 e 25%. A amplitude de mortalidade reporta a valores que variam entre os 50 e os 100% (Lombardi et al., 2002), sendo estabelecida, aproximadamente, entre os 60 e os 80% nos doentes com leucemia aguda e em receptores de transplantao medular (Kontoyiannis et al., 2005). A elevada mortalidade torna necessrio e urgente adoptar mtodos mais aperfeioados de diagnstico (Wheat, 2003). Esta doena (AI) uma das complicaes infecciosas de maior gravidade nos doentes hematolgicos, com uma mortalidade da ordem dos 50% em doentes com leucemia ou linfoma, tratados com quimioterapia convencional, ultrapassando os 80% nos receptores de alotransplante de progenitores hematopoiticos (Maertens et al., 2002; Jarque et al., 2003; Bellocchio et al., 2005). necessria a mxima precauo relativamente aos indivduos que correm risco de desenvolver doena alrgica ou AI, no que se refere exposio aos condios das espcies de Aspergillus (Richardson & Warnock, 2003). As unidades de transplantao de medula ssea empregam, na sua maioria, sistemas de presso positiva com filtrao do ar por filtros HEPA (High Efficiency Particulate Air), e,- 24 -

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inclusivamente, praticam polticas de isolamento dos doentes, minimizando assim o risco de exposio aos condios de Aspergillus bem como a esporos de outros fungos (Richardson & Warnock, 2003). Doentes com risco de virem a adquirir AI podem efectuar profilaxia primria com anfotericina B ou itraconazol, um triazol com actividade contra espcies de Aspergillus (Saballs-Radresa et al., 2000; Kontoyiannis et al., 2005). A anfotericina B um antifngico de amplo espectro, activo contra fungos leveduriformes, dimorfos e diferentes gneros de fungos filamentosos, com uma eficcia demonstrada no tratamento das principais micoses sistmicas. Este antifngico ainda muito usado e considerado como a droga de eleio no tratamento dos doentes com AI (Raja & Singh, 2006). A resposta anfotericina B influenciada por parmetros como dose e velocidade de administrao, local da infeco, estado imunolgico do doente e susceptibilidade do agente infeccioso (Brooks et al., 2005). Estudos efectuados por Herbrecht e colaboradores (2002b), indicam que nos doentes com AI o tratamento inicial com voriconazol conduziu a melhores respostas, melhorou a sobrevivncia e resultou em efeitos secundrios menos severos do que a terapia standard feita com anfotericina B. Tambm Boyd e colaboradores (2004) referiram que o voriconazol a droga que melhor resulta no tratamento dos doentes com AI, e que, se no estiver contraindicado o seu uso, deve ser utilizada em substituio da anfotericina B. O voriconazol tambm uma alternativa apropriada s preparaes de anfotericina B para o tratamento emprico antifngico nos doentes com neutropenia e que apresentem febre persistente (Walsh et al., 2002). Apesar deste medicamento ser bem tolerado, leva ao aparecimento de reaces adversas, tais como, alteraes hepticas, reaces cutneas e distrbios de viso (Sambatakou et al., 2006), no sendo, no entanto, necessria a interrupo do tratamento (Alvarez-Lerma et al., 2005).

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As teraputicas actualmente disponveis para tratamento da AI tm uma eficcia ainda longe do desejvel. Como anteriormente foi referido, uma das principais causas que predispem para o aparecimento da AI o estado de imunodepresso ou de debilidade que os doentes apresentam na sequncia de algumas doenas do foro hematolgico (doenas malignas), bem como, dos seus tratamentos. Essas doenas (leucemias, linfomas, aplasia medular, entre outras) obrigam a que os doentes sejam submetidos, como modo de tratamento/cura, a transplantao de medula ssea.

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3. Transplantao de Progenitores HematopoiticosA transplantao de progenitores hematopoiticos, habitualmente, e por razes de ordem histrica, designada como transplantao de medula, pode ser de trs tipos considerando a fonte de stem-cells: alognica proveniente de indivduos da mesma espcie; singnica proveniente de gmeos univitelinos; autloga proveniente do mesmo indivduo (Hoffbrand & Pettit, 1993; Hoffbrand & Pettit, 2000). As stem-cells eram obtidas classicamente da medula ssea. Veio posteriormente a verificar-se que o sangue do cordo umbilical/placenta tambm rico nestas clulas, o que permitiu realizar, em 1988, a primeira transplantao recorrendo a esta fonte de progenitores hematopoiticos. Constatou-se, igualmente, que aps alguns tratamentos de quimioterapia, bem como nos tratamentos em que eram utilizados factores de crescimento hematopoiticos, o nmero de stem-cells circulantes aumentava, o que veio a possibilitar, nos ltimos anos, a sua utilizao como fonte para transplante (Hoffbrand & Pettit, 1993). Os progenitores hematopoiticos so tambm designados por stem-cells ou clulas estaminais. Estes enxertos so administrados por via endovenosa aps um regime de quimioterapia e/ou radioterapia que se designa por regime de condicionamento. Nos transplantes alognicos devido ao facto de estarmos perante um enxerto, que em geral rico em linfcitos T, este imunocompetente, o que leva necessidade de efectuar imunossupresso no perodo imediato aps o transplante, at que se estabelea a tolerncia imunolgica. A DECH resulta de no ocorrer tolerncia, levando a uma reaco imunolgica de enxerto contra hospedeiro (Hoffbrand & Pettit, 1993; Blume et al., 2004). Aps o transplante, verifica-se frequentemente uma situao de imunodeficincia grave, em parte devida, quer doena base, quer ao regime de condicionamento, quer teraputica profiltica da DECH, e quer aos casos em que ocorre DECH devido ao seu tratamento. Alm- 27 -

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disso, a prpria DECH associa-se a um atraso na recuperao da imunidade. Todos estes factores contribuem para a imunodeficincia que ocorre aps o transplante, o que especialmente grave nos doentes com DECH sob teraputica imunossupressora. Em particular nestes doentes, o risco de infeces por agentes oportunistas pode ser grave e frequente (Marr et al., 2002; Bow, 2005). A transplantao alognica, mais vulgarmente utilizada nos casos de leucemia aguda ou leucemia mielide crnica, anemia aplstica e em certas doenas genticas, como, por exemplo, na talassemia major (Hoffbrand & Pettit, 1993; Blume et al., 2004). A transplantao medular autloga, frequentemente usada para o tratamento de linfomas malignos e em doentes seleccionados que apresentem alguns tumores slidos, leucemias agudas ou mieloma mltiplo (Hoffbrand & Pettit, 1993; Blume et al., 2004). No STMO (Servio de Transplantao de Medula ssea) do IPOFG (Instituto Portugus de Oncologia Francisco Gentil) do Porto, EPE (Empresa Pblica Empresarial), cerca de 2/3 dos alotransplantes so efectuados em doentes com leucemias agudas (linfides e mielides), leucemias mielide crnica e aplasia medular. As principais doenas com indicao para transplantao autloga so os linfomas de Hodgkin e no Hodgkin e o mieloma mltiplo. Em transplantao autloga as infeces fngicas invasivas so, na ausncia de outros factores de risco, muito raras.

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3.1. Possveis complicaes da transplantao de stem-cellsA preceder o transplante, muitos dos doentes so submetidos a quimoterapia agressiva, com longos perodos de neutropenia, o que conduz a um aumento do risco de infeces fngicas (Marr et al., 2002). Aps o tratamento verifica-se um perodo varivel de pancitopenia, nomeadamente de neutropenia grave. O aparecimento de pancitopenia verifica-se at que as stem-cells pluripotentes do dador, infundidas no receptor, colonizem a medula ssea e iniciem a proliferao e posterior diferenciao, para ento levarem produo de novos tipos celulares (eritrcitos, leuccitos e plaquetas maduras) (Hoffbrand & Pettit, 2000; Blume et al., 2004). No perodo ps-transplante, das importantes barreiras a ultrapassar, so, sem margem para qualquer dvida, as infeces. Como tentativas de preveno da infeco, incluem-se: uso de antibiticos e/ou de antifngicos como profilcticos, uso de ar filtrado (filtros do tipo HEPA) em fluxo laminar ou presso positiva e barreiras reversas (Bow, 2005). A utilizao precoce e emprica de antibiticos de uso sistmico nos quadros febrs outra forma usada para tratamento de infeces provveis. No entanto, a terapia prolongada com antibiticos, outro factor que pode facilitar o aparecimento de infeces fngicas. Nos doentes de alto risco recomendada profilaxia primria antifngica medicamentosa, em geral com um triazlico (Avivi et al., 2004).

As complicaes aps alotransplante, podem ser divididas em precoces ou tardias. As complicaes precoces, aparecem habitualmente antes do dia 100, e, nestas, podemos incluir a DECH aguda que tem como alvos principais a pele, o fgado e o intestino (Hoffbrand & Pettit, 1993; Hoffbrand & Pettit, 2000; Blume et al., 2004; Devine et al., 2005).

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O envolvimento de cada rgo classificado, segundo a sua gravidade, em estdios, de 0 (ausente) a 4 (o mais grave), que conduzem a uma classificao global da DECH aguda em graus de 0 (ausente) a IV (ver tabela 1) (Przepiorka et al., 1995). Nas complicaes precoces poderemos ainda incluir a falncia do enxerto, a cistite hemorrgica, a pneumonite intersticial, a doena heptica veno-oclusiva e as infeces provocadas por agentes oportunistas (bactrias, fungos e vrus) (Hoffbrand & Pettit, 1993).

Tabela 1: Estadiamento e graduao recomendada da DECH* agudaExtenso envolvimento de rgo Fgado b) (bilirrubina mol/l 34,1 a 51,3

Pele

a)

Tubo digestivo c)

Estdio 1

Erupo < 25%

Diarreia > 500 ml/dia (280 a 555 ml/m) ou nusea persistented)

2 3

Erupo 25 a 50% Erupo > 50% Eritrodermia generalizada com formao de bolhas Estdio 1-2 Estdio 3 ou Estdio 4 ou

51,3 102,6 102,6 - 256,5

Diarreia > 1000 ml/dia Diarreia > 1500 ml/dia (>833 ml/m) Dor abdominal grave com ou sem leo

4 Grau e) I II III IV f)

> 256,5

Nenhuma Estdio 1 ou Estdio 2-3 ou Estdio 4

Nenhuma Estdio 1 Estdio 2-4 -

*Doena Enxerto Contra Hospedeiro Aguda Keystone. Adaptado de Przepiorka et al., (1995). Legenda: a) regra dos 9 ou mapa de queimados; b) bilirrubina total; desce 1 estdio se for documentada causa adicional de hiperbilirrubinmia; c) s adultos; na criana basear na superfcie corporal, no foi discutido nesta conferncia; desce 1 estdio se documentar causa adicional de diarreia, d) nusea persistente com documentao histolgica de Doena Enxerto Contra Hospedeiro no estmago ou duodeno e) critrio para estabelecer o grau baseado no grau mnimo de envolvimento por rgo necessrio para conferir aquele grau; f) Grau IV tambm pode incluir um menor envolvimento de rgo mas com uma diminuio extrema do Performance Status

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As complicaes tardias so as que habitualmente aparecem aps o dia 100. Neste tipo de complicaes inclui-se a DECH crnica com envolvimento principal da pele (esclerodermia, alteraes de pigmentao, alteraes liquenoides), das mucosas (sndrome seco, leses envolvendo a mucosa oral, m absoro), do fgado e pulmes (Hoffbrand & Pettit, 1993). Nas fases crnicas, as leses podem ter a forma de placas, evidenciar um aspecto firme, e, em alguns doentes, formar um quadro idntico a esclerodermia com contracturas e ulcerao (Hoffbrand & Pettit, 1993; Hoffbrand & Pettit, 2000). As membranas mucosas tambm podem ser afectadas com o aparecimento de leses semelhantes a lquen plano, tanto na boca como na faringe (Hoffbrand & Pettit, 2000). Nas complicaes tardias, poderemos ainda referir: o aparecimento de cataratas, infertilidade, leucoencefalopatia e neoplasia secundria (Hoffbrand & Pettit, 1993; Hoffbrand & Pettit, 2000; Blume et al., 2004).

O regime de condicionamento, a que so submetidos os doentes antes do transplante, conduz, por si s, ao aparecimento de efeitos colaterais que envolvem todos os tecidos com elevado ndice de replicao, nomeadamente as estruturas epiteliais, e alopcia total, embora que temporria. Tambm o surgimento de mucosite, com interrupo do efeito de barreira das mucosas, facilita a penetrao das bactrias na corrente sangunea (Hoffbrand & Pettit, 2000; Blume et al., 2004). Como consequncia da quimio e da radioterapia, pode verificar-se o aparecimento de uma grave complicao, ou seja, a chamada doena veno-oclusiva do fgado que pode aparecer com maior frequncia se existirem alteraes prvias da funo heptica (Hoffbrand & Pettit, 2000).

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O aparecimento de cistite hemorrgica pode ser devida ao tratamento, por aco dos metabolitos da ciclosfosfamida, ou a infeces virais como as provocadas por adenovrus, citomegalovrus ou poliomavrus (Hoffbrand & Pettit, 2000).

3.2. Doena Enxerto Contra HospedeiroOs principais factores de risco na DECH so: histocompatibilidade;

alossensibilizao do dador; dador idoso; receptor idoso; sexos diferentes (dador do sexo feminino principalmente se esteve grvida); a no existncia de profilaxia para DECH; infuso de leuccitos viveis do dador e a intensidade do protocolo de condicionamento (Hoffbrand & Pettit, 2000; Blume et al., 2004).

Na DECH, aguda e crnica, a funo heptica encontra-se alterada, situao que no se verifica nos casos de doena menos grave. Por exames histolgicos verificamos leso nas clulas epiteliais do ducto biliar, existncia de alteraes inflamatrias, ductopenia, bem como de colestase (Hoffbrand & Pettit, 2000; Blume et al., 2004). A DECH, no transplante alognico HLA-compatvel, pode ser prevenida por remoo completa, in vitro, dos linfcitos T da medula ssea do dador. No entanto, este processo pode ter efeitos adversos, nomeadamente, aumento da falncia do enxerto e recada da leucemia, entre outros. Normalmente, a preveno da DECH feita com ciclosporina, com ou sem metotrexato (Devine et al., 2005). Recentemente, tm sido utilizados, tanto na preveno como no tratamento, tacrolimus e micofenolato de mofetilo (Hoffbrand & Pettit, 2000; Blume et al., 2004). O tratamento inicial da DECH aguda de grau II ou superior efectuado com corticide em dose elevada.

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O risco de AI nos receptores de alotransplante, mais frequente nos doentes com DECH. Nos doentes submetidos a autotransplante, a AI no frequente (0,5 a 5%) (Richardson & Warnock, 2003) mas, quando a desenvolvem, aparece geralmente durante o perodo inicial de neutropenia. Assim, o conhecimento da fase de maior risco de desenvolvimento de AI de extrema utilidade para delinear estratgias de modo a preveni-la entre grupos diferentes de receptores de stem-cells, quer se encontrem no hospital quer na comunidade (Richardson, 2005b).

4. Diagnstico da aspergiloseA aspergilose referida como um problema grave, srio e muitas vezes fatal, em doentes com doenas hematolgicas que recebem quimioterapia ou nos submetidos a transplantao de medula ssea (Kawazu et al., 2003; Wheat, 2003; Suankratay et al., 2006). O diagnstico preciso da AI complicado e pode ser difcil de obter, uma vez que os sintomas clnicos so, muitas das vezes, semelhantes aos de outras infeces (Lombardi et al., 2002; Klont et al., 2004). O aparecimento de febre persistente, nico sinal de infeco, e, a existncia de sintomas inespecficos ou atenuados em resultado da medicao base de corticosterides, dificultam esse mesmo diagnstico (Walsh et al., 1999; Mennink-Kersten et al., 2004). Por outro lado, diagnsticos em que sejam utilizados procedimentos invasivos, nomeadamente, obteno de biopsias, podem estar contra-indicados ou serem de elevado risco nos doentes com um mau estado geral, com insuficincia respiratria ou que apresentem pancitopenia em especial trombocitopenia grave, entre outros sintomas (Herbrecht et al., 2002a; Jarque et al., 2003; Pazos & del Palacio, 2003).

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O diagnstico da AI continua a ser largamente apoiado nos achados clnicos e histopatolgicos. Porm, as limitaes apresentadas na definio dos sinais e sintomas clnicos e na obteno de dados histolgicos a partir de cortes de tecidos obtidos por biopsia, comprometem a sua utilizao como meios nicos na obteno do diagnstico, estimulando, por isso, o desenvolvimento de metodologias mais precisas e rpidas. O diagnstico micolgico, baseado na observao directa e no isolamento do agente a partir dos produtos patolgicos, ser de grande importncia para a identificao precisa do agente etiolgico e para a avaliao da susceptibilidade aos agentes antifngicos. Contudo, um dos problemas do exame cultural o da responsabilizao de fungos do gnero Aspergillus, isolados num laboratrio de micologia, como agente etiolgico da doena, dado o carcter contaminante e saprfita destes microrganismos (O'Fel, 1997; del Palacio et al., 2003a; del Palacio et al., 2003b). A dificuldade maior quando se trata de produtos habitualmente no estreis, como secrees respiratrias e em particular a expectorao. Considerando a fcil contaminao das amostras, recomendada uma elevada prudncia nos procedimentos de colheita, evitando as contaminaes e consequentemente os falsos positivos. Os dados obtidos a partir do exame cultural, devero ser acompanhados de resultados do examo histopatolgico (Hiltermann et al., 2003). No entanto, fungos como Fusarium spp. e Pseudallescheria boydii, aparecem idnticos nos cortes histopatolgicos, sendo o diagnstico diferencial, por cultura, de grande importncia para a instituio da teraputica, dado o facto de apresentarem uma sensibilidade anfotericina B inferior apresentada por Aspergillus (Hiltermann et al., 2003). Tambm, Herbrecht e colaboradores (2002a), referem que o diagnstico convencional da AI dependente da cultura e da observao histopatolgica dos tecidos envolvidos e que a avaliao microscpica e cultural da expectorao, bem como das amostras do Lavado BroncoAlveolar (LBA), apresentam insuficiente sensibilidade para fazer um diagnstico de certeza. Hiltermann e colaboradores

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(2003) referem ainda que a cultura de Aspergillus a partir de amostras de expectorao, difcil, verificando-se resultados positivos apenas em 8 a 34% dos casos. Todavia, o valor preditivo aumenta se obtivermos em amostras de expectorao, repetidas em dias consecutivos, culturas positivas (del Palacio et al., 2003a). Com base em estudos experimentais, del Palacio e colaboradores (2003a), referem que at 20% das culturas de amostras de expectorao podem ser falsos positivos em doentes submetidos a transplantao de medula ssea, sendo que, esta percentagem, ainda mais elevada em receptores de rgos slidos. O valor preditivo das culturas dependente dos factores de risco apresentados pelo doente. Porm, tambm referido por Perfect e colaboradores (2001) que, em doentes de alto risco, uma cultura positiva est associada a AI em 50 a 64% dos casos, ao passo que, nos doentes considerados de risco intermdio, a incidncia de AI desce para valores situados entre 8 e 28% conforme se representa na tabela 2. Nos receptores de transplantao de medula ssea, as culturas positivas de Aspergillus tm um valor preditivo muito elevado situando-se entre os 64 e os 80% (Perfect et al., 2001; del Palacio et al., 2003a).Tabela 2: Percentagem (%) de risco de AI em doentes com culturas positivas de Aspergillus spp.Risco alto Transplantao alognica de medula ssea Neutropenia Neoplasia maligna hematolgica Risco Intermdio Transplantao autloga de medula ssea Esterides VIH Transplantao de rgo slido Diabetes Doena pulmonar Neoplasia maligna no hematolgica 28% 20% 19% 17% 11% 9% 8% 64% 64% 50%

Adaptado de Perfect et al., (2001).

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Actualmente, o diagnstico muitas vezes baseado na descoberta clnica e radiolgica, que, no sendo especfico, leva a que sejam iniciadas terapias potencialmente txicas de um modo emprico, sem que, todavia, se consiga fazer o diagnstico com segurana (Wheat, 2003). No entanto, a obteno de imagens por tcnicas eficientes nem sempre permite uma diferenciao adequada dos agentes etiolgicos envolvidos neste tipo de sintomatologia (Lombardi et al., 2002). Segundo Pazos & del Palcio (2003), as tcnicas radiolgicas complementam o diagnstico, ainda que nem sempre se detectem leses nodulares na radiografia simples do trax e somente seja visivel o sinal de halo na Tomografia Axial Computorizada (TAC). Tcnicas de diagnstico rpido, recentemente introduzidas, tm-se mostrado vantajosas na obteno de um diagnstico precoce. Desse grupo de tcnicas, fazem parte a Tomografia Computorizada de Alta Resoluo (TCAR) e a deteco do fungo por mtodos no culturais baseados quer na deteco de antignios fngicos em circulao (Maertens et al., 2002) quer na de cidos Nucleicos (AN) (Pazos et al., 2005). Estas tcnicas, ao permitirem a presuno do diagnstico precoce de AI, possibilitam a implementao de estratgias teraputicas (Pazos et al., 2005). Dada a diversidade de opinies relativamente ao diagnstico correcto, e, para que este seja eficaz evitando a elevada mortalidade de doentes, cuja incidncia depende da doena primria (del Palacio et al., 2003a) necessrio que se descubram urgentemente mtodos mais aperfeioados de diagnstico.

No desenvolvimento da aspergilose, parecem estar implicados no s factores que so inerentes ao hospedeiro, como o seu estado imunolgico, mas tambm, os que so inerentes virulncia do prprio fungo. Estes factores de virulncia parecem ser vrios (Rementeria et al., 2005). Entre as molculas e os genes que se relacionaram com esta

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virulncia, encontram-se componentes da parede celular, como galactomanano (GM), produzido pelo Aspergillus durante a fase de crescimento celular (Klont et al., 2004; Morelle et al., 2005; Suankratay et al., 2006), (1-3)-glucano, galactomanoprotenas e enzimas como a quitina sintetase (Rementeria et al., 2005). O GM, polissacardeo importante da parede celular, tem sido detectado nas paredes da hifa e nos condios de Aspergillus fumigatus (Morelle et al., 2005; Rementeria et al., 2005). Este exoantignio, detectado nos sobrenadantes de culturas destes fungos, produzido durante a invaso dos tecidos. A deteco de antignio GM circulante, mostrou-se uma ferramenta til e sensvel para o diagnstico da infeco por Aspergillus, em doentes hematolgicos com alto risco de AI (Sulahian et al., 2001; Centeno-Lima et al., 2002). Assim, a possibilidade de se detectar com rapidez o antignio GM para Aspergillus gerou grandes expectativas na obteno de um diagnstico precoce e de uma mais rpida e eficaz interveno teraputica (Jarque et al., 2003). Embora a sua concentrao possa variar, considerado o marcador de diagnstico mais til nos doentes com AI, podendo ser detectado no soro, na urina e no Lquido CefaloRaquidiano (LCR), entre outros (del Palacio et al., 2003a; Rementeria et al., 2005). Jarque e colaboradores (2003), realizaram um estudo prospectivo, de Fevereiro a Setembro de 2002, em doentes adultos que foram internados na Unidade de Hematologia do Hospital Universitrio de La Fe, em Valncia, para receberem quimioterapia intensiva e/ou transplantao de progenitores hematopoiticos. Deste estudo, onde foi efectuada a deteco do antignio GM, ressalta que a positividade, frente a este antignio, permitiu antecipar o diagnstico da AI em 2 a 17 dias relativamente ao aparecimento de leses radiolgicas, e de 2 a 15 dias em relao ao exame micolgico. No entanto, poder, segundo estes autores, reverter-se de especial importncia o estudo da cintica da antigenemia na valorizao da resposta teraputica.

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A deteco do antignio fngico circulante GM correntemente considerada como um mtodo indirecto adequado no diagnstico provvel (Centeno-Lima et al., 2002; Maertens et al., 2004), bem como, na escolha da respectiva teraputica da AI (Stevens, 2002).

A determinao da antigenemia para A. fumigatus nos doentes que apresentam imunossupresso, continua a ser um factor fundamental quer na deteco quer no processo de tratamento da doena.

Existem vrios mtodos que nos permitem fazer um diagnstico de AI varivel no tempo, considerando a rapidez de identificao, bem como, varivel no que respeita a valores de sensibilidade e consequentemente de especificidade. Nestes mtodos, poderemos referir: o exame microscpico, directo, ou histopatolgico, o exame cultural de amostras de produtos patolgicos, a hemocultura, bem como outros tipos de diagnstico sendo disto exemplo a TC do Torx, o diagnstico serolgico quer com deteco de anticorpos quer com a deteco de antignio, e, ainda, as tcnicas de Biologia Molecular.

4.1. Tcnicas microbiolgicas/histopatolgicas4.1.1. Produtos patolgicos

Expectoraes, aspirados, lavados broncoalveolares, biopsias de entre as quais a transbronquial pulmonar, fluidos corporais como sangue, urina, LCR, constituem amostras que podem ser utilizadas na deteco precoce da aspergilose (Stevens, 2002; Kawazu et al., 2003).

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Introduo

A Biopsia transbronquial pulmonar muito dificilmente pode ser realizada, devido ao aparecimento de trombocitopenia e/ou coagulopatia, comuns entre os doentes

imunossuprimidos. A lavagem broncoalveolar apresenta menos riscos mostrando utilidade no diagnstico da API (Kawazu et al., 2003). No entanto, tambm os lavados broncoalveolares so pouco utilizados em doentes neutropnicos, devido hipoxia sangunea, trombocitopenia e mau estado geral que habitualmente os acompanha (del Palacio et al., 2003b). A obteno de biopsias atravs de agulhas guiadas por processos radiolgicos traduzse num bom diagnstico, normalmente desprovido de complicaes, se bem que podemos obter falsos negativos se no forem encontrados os tecidos invadidos pelo miclio (del Palacio et al., 2003a). O uso de hemoculturas, no diagnstico da aspergilose, no apresenta muito valor, uma vez que, o isolamento de Aspergillus a partir do sangue raro (Kontoyiannis et al., 2000).

4.1.2. Exame directo

Exame a fresco e histopatolgico

De entre os mtodos de confiana utilizados para o diagnstico de AI, temos o exame histopatolgico de seces de tecidos corados (Richardson & Warnock, 2003). efectuado aps biopsia, aps exrese cirrgica ou por necrose, em que o exame dos tecidos obtidos e corados por Gomori-Grocott ou por PAS, permite, a visualizao de filamentos septados com ramificaes em ngulo agudo (Cotran et al., 2000; del Palacio et al., 2003a) sem que se possa afirmar qual a espcie em causa (O'Fel, 1997).

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Introduo

Como j foi referido anteriormente, no exame histopatolgico, possvel verificar, nos casos de alterao patolgica do pulmo, a formao da bola de fungos. Do ponto de vista histopatolgico, a bola de fungos consiste numa massa esfrica de elementos hifais septados, ramificados e entrelaados (del Palacio et al., 2003b). Tais estruturas, podem tambm ser visualizadas em exames radiolgicos como estruturas esfricas expansivas que se movimentam no interior da cavidade, conforme o doente muda de posio (Sharma & Chwogule, 1998). A observao por exame directo com KOH, calcoflor ou colorao de um esfregao pela tcnica de Gram, permite um diagnstico presuntivo e rpido (del Palacio et al., 2003a). Esta observao confirma a presena de um fungo no produto patolgico, que venha a ser isolado nos meios de cultura.

4.1.3. Exame cultural As espcies de Aspergillus crescem habitualmente em poucos dias, na maioria dos meios de cultura e temperatura ambiente (Brooks et al., 2005). O isolamento de Aspergillus atravs de cultura, em meio de Czapeck, um mtodo de deteco da possvel infeco, permite a identificao da espcie infectante, bem como a realizao de testes de sensibilidade in vitro aos compostos antifngicas. Embora as espcies de Aspergillus sejam nutricionalmente pouco exigentes, deveremos utilizar meios de cultura sem cicloheximida sempre que se suspeite de infeco por fungos deste gnero, j que esta inibe o seu crescimento, (del Palacio et al., 2003a). As espcies de Aspergillus patognicas para o Homem so capazes de crescer rapidamente a 37C e, algumas espcies, toleram temperaturas acima dos 50C. No entanto, a incubao dos meios de cultura deve ser realizada a uma temperatura compreendida entre os 25 e os 37C, por um perodo de, ou at, quatro semanas, e, se possvel, utilizando tubos- 40 -

Introduo

em vez de placas, uma vez que a desidratao nestas maior do que a que se verifica nos tubos (del Palacio et al., 2003a; Bhabhra & Askew, 2005).

Embora culturas do LBA sejam especficas e permitam a determinao das espcies, o exame cultural no o mais indicado pelo facto de apresentar uma sensibilidade insuficiente (Ascioglu et al., 2002; Kawazu et al., 2003). Estudos realizados por del Palcio e colaboradores (2003a) referem que nas amostras obtidas por broncoscopia (aspirados, LBA), a positividade se situa aproximadamente em 50% (del Palacio et al., 2003a). No entanto, se utilizados lavados broncoalveolares e biopsias de tecidos, os resultados podem ser melhorados, mas raramente devem ser utilizados em doentes hematolgicos (leucemias, linfomas, transplantao de medula ssea, autloga e alogenica, entre outros), devido natureza invasiva do processo e gravidade do seu estado (Latge, 1999; Pazos & del Palacio, 2003). Tcnicas microbiolgicas/micolgicas tradicionais, visando a observao directa e a cultura da expectorao, tm uma baixa sensibilidade (15 a 20%) (Pazos & del Palacio, 2003). Assim, e devido ao facto das culturas apresentarem uma baixa sensibilidade no diagnstico de AI, o aparecimento de uma nica cultura positiva resulta num diagnstico pouco provvel. Por outro lado, o aparecimento de culturas de espcies de Aspergillus nem sempre refletem doena invasiva, uma vez que, pode ocorrer colonizao em doentes imunocomprometidos, e resultados falsos positivos provenientes de contaminao ambiental, so, ocasionalmente, um problema (Ascioglu et al., 2002).

Um resultado elucidativo de uma hemocultura positiva para Aspergillus spp. difcil em virtude da aspergilemia ser rara e por motivo de pseudofungemias ocorrerem em doentes que apresentam risco de AI (Kontoyiannis et al., 2000). A aspergilemia interpretada como

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Introduo

uma situao de excepo, com valores que oscilam entre 0,5 e 2% das fungemias, sendo uma consequncia da invaso dos tecidos pelo fungo. As aspergilemias so mais frequentes nas endocardites causadas por espcies de Aspergillus. Pensa-se que apenas 10% das aspergilemias correspondam a situaes de verdadeiras aspergiloses, enquanto que 90% das fungemias no significativas (pseudoaspergilemias) sejam devidas a contaminaes (del Palacio et al., 2003a). Nos doentes com doena hematolgica do foro oncolgico, e, nos que apresentam elevado risco de virem a desenvolver AI, a existncia de hemoculturas positivas para espcies de Aspergillus associadas a provvel ou verdadeira aspergilemia, aparecem tardiamente, por vezes apenas um dia antes da morte, ou ento, so evidenciadas por autpsia (Kontoyiannis et al., 2000; del Palacio et al., 2003a). Hemoculturas positivas para espcies de Aspergillus, sempre foram consideradas como contaminaes em doentes com tumores slidos ou com doenas hematolgicas malignas, quando colhidas nas proximidades da morte. O isolamento de A. terreus, a partir de hemoculturas, a causa comum de verdadeira aspergilemia, talvez por esta espcie ser mais resistente teraputica antifngica (Kontoyiannis et al., 2000).

4.2. Outros tipos de diagnstico4.2.1. Tomografia Computorizada do Trax

As imagens podem ser muito teis para fazer um diagnstico precoce em doentes com aspergilose. Uma radiografia precoce mostra-nos, forosamente, um tpico infiltrado, o qual, pode contudo, ser compatvel com uma variedade de causas infecciosas ou no infecciosas (Stevens, 2002). No entanto, a radiografia, devido ao facto de ser um mtodo auxiliar de diagnstico de baixa sensibilidade e especificidade, e, de expr o doente a- 42 -

Introduo

radiaes sucessivas para a avaliao do seu estado evolutivo, impe a necessidade da utilizao de mtodos mais sensveis e mais especficos (Greene, 2005). Os achados imagiolgicos iniciais, obtidos por TC, so de grande utilidade na identificao de estratgias de diagnstico e teraputicas adicionais. A probabilidade de que um achado particular esteja associado com uma infeco especfica depende principalmente da probabilidade pr-teste. O sinal de halo e o sinal de ar crescente so dos poucos, altamente sugestivos de AI. O sinal de halo definido como um permetro de opacidade em vidro despolido que rodeia o ndulo pulmonar; o sinal de ar crescente definido como um ndulo que contm uma bolsa de gs em meia lua que rodeia um sequestro de pulmo desvitalizado (Maertens et al., 2002; Stevens, 2002; Greene, 2005). Uma TC pode reduzir o tempo necessrio para o diagnstico, de 6 dias para 1 dia e, assim, obter-se uma melhor resposta para a terapia (Stevens, 2002). A TC um exame essencial para a suspeita precoce de diagnstico de AI, em virtude de apresentar uma maior sensibilidade e especificidade relativamente radiografia, permitindo iniciar, mais precocemente, uma teraputica antifngica apropriada (Greene, 2005).

4.2.2. Diagnstico serolgico com deteco de anticorpos

uma tcnica til no diagnstico do aspergiloma e da aspergilose alrgica, sendo positiva em mais de 80% dos casos (Brooks et al., 2005). No entanto, esta deteco tem uma utilidade reduzida no que se refere ao diagnstico da Aspergilose Invasiva, uma vez que apresenta uma baixa sensibilidade (del Palacio et al., 2003a) devido deficiente resposta imune produzida por estes doentes (Centeno-Lima et al., 2002).

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Introduo

4.2.3. Diagnstico serolgico com deteco de antignio

Desde h cerca de 20 anos que se reconhece que doentes com AI apresentam antignios no seu soro. Ainda que a espcie A. fumigatus possua mais de 100 diferentes antignios, protenas ou glicoprotenas com capacidade de ligao a anticorpos (Latge, 1999), os de maior utilidade para o diagnstico da AI so o GM, principal exoantignio, presente no soro e libertado durante o crescimento fngico ao nvel dos tecidos e o (1-3)-D-glucano (Latge, 1999; del Palacio et al., 2003a; Tarrats & de la Bellacasa, 2003; Klont et al., 2004). Este ltimo um polissacardeo existente na parede celular de fungos como Aspergillus, leveduras do gnero Candida e Pneumocystis jiroveci (del Palacio et al., 2003a), donde, a sua presena no sangue e fluidos normalmente estreis, pode ser considerada como um marcador de infeces fngicas invasivas (Pazos et al., 2005) . A deteco do (1-3)--D-glucano apresenta uma sensibilidade de aproximadamente 90%, uma especificidade que ronda os 100%, valor preditivo positivo de 59% e negativo na ordem dos 97%, com uma eficcia global de 85%. Nesta determinao, a presena de falsos positivos est associada a doentes hemodialisados com aparelhos possuidores de membranas de celulose, em tratamento com albumina, imunoglobulinas, sulfamidas e anticancerosos (del Palacio et al., 2003a; Pazos et al., 2005). Actualmente, a experincia clnico-micolgica, em associao com esta prova, apresenta um valor limitado, sendo necessrios estudos prospectivos com populaes divididas por factores de risco (del Palacio et al., 2003a). Tambm, em estudos realizados por Kawazu e colaboradores (2004), se refere que os resultados positivos, obtidos com o teste de (1-3)--D-glucano utilizando um ensaio cintico, tendem a ocorrer mais tardiamente j no decurso dos sinais clnicos. Este ensaio veio demonstrar uma sensibilidade de 55% e uma especificidade de 98%, o que parece ser uma limitao para o diagnstico de AI, embora apresente uma elevada sensibilidade e especificidade para a candidose.- 44 -

Introduo

A deteco do GM e de DNA no soro ou no LBA, ajuda na confirmao do diagnstico da AI (Herbrecht et al., 2004). Segundo Wheat (2003), a tcnica Platelia Aspergillus, na deteco da antigenemia para Aspergillus galactomanano, permite aos clnicos tomarem decises relativamente teraputica a instituir, sua reduo ou substituio com vista a uma melhoria do estado clnico dos doentes. A deteco em circulao de marcadores de AI pode ser til, no s, para efectuar o diagnstico, mas tambm para avaliar da eficcia teraputica por diminuio dos nveis de GM (Ascioglu et al., 2002; Jarque et al., 2003; Pazos et al., 2005). A deteco do GM especialmente til em doentes que recebem tratamentos com base em corticosterides, em doentes neutropnicos ou quando coexistem condies que mascaram o diagnstico de AI sendo, por isso, uma tcnica til no seu diagnstico (Maertens et al., 2002; del Palacio et al., 2003a; Upton et al., 2005). O GM foi detectado em primeiro lugar, atravs de uma tcnica baseada numa reaco de aglutinao com partculas de ltex recobertas de um anticorpo monoclonal (Acm) de rato EBA-2, dirigido contra o galactomanano de Aspergillus (Pastorex Aspergillus). Estas partculas reagem com o antignio polissacardico de Aspergillus por aglutinao visvel a olho n. Com um limite de deteco de 15 ng/ml de galactomanano, esta tcnica veio a revelar-se pouco sensvel, no sendo por isso actualmente utilizada Bio-Rad PastorexAspergillus (del Palacio et al., 2003a). O teste PlateliaAspergillus Bio-Rad utiliza um Acm de rato EBA-2 e reconhece as cadeias laterais de 1-5-D-galactofuranosdeo das molculas de GM (Tarrats & de la Bellacasa, 2003). Embora utilizando o mesmo Acm da tcnica de aglutinao, apresenta uma sensibilidade superior, com um limite de deteco de 0,5 a 1 ng/ml de GM. Por outro lado, e para alm da sua sensibilidade, de notar que este mtodo tem uma grande reprodutibilidade

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quando se comparam resultados obtidos em laboratrios diferentes (del Palacio et al., 2003a). Uma vez aceite a determinao do GM como um critrio de diagnstico de primeira ordem, de primordial importncia conhecer as causas associadas ao aparecimento de falsos positivos (Ascioglu et al., 2002; Jarque et al., 2003). Uma das causas apontadas a reactividade apresentada com antibiticos (Buchheidt & Hummel, 2005). Recentemente, foram descritos falsos positivos em doentes com neutropenia febril persistente, tratados com piperacilina-tazobactam (Jarque et al., 2003; Husain et al., 2004). Ao que parece, alguns lotes deste antibitico esto associados a reaces positivas, quando efectuados testes de pesquisa referentes ao GM (Aubry et al., 2006), surgindo uma forte reaco cruzada entre eles. A confirmar-se, este fenmeno pode ter relevncia clnica, uma vez que, a piperacilinatazobactam um dos antibiticos mais usados no tratamento emprico da febre em pacientes neutropnicos (Jarque et al., 2003). A taxa de falsos positivos com o Kit Platelia Aspergillus oscila entre 8 e 14% e tem sido observada em receptores de transplantao de medula ssea, doentes neutropnicos, crianas com doena oncolgica hematolgica, neonatos, e, na rejeio crnica ou na DECH aps transplantao alognica de medula ssea. Outras causas indicadas como estando na origem de falsos positivos em doentes neutropnicos so, a colonizao massiva do tubo digestivo por Aspergillus, infeces por outros fungos como Paecilomyces variotii, Penicillium spp., Alternaria spp., Candida spp., bacteriemia por bactrias Gram positivas e Gram negativas que libertem na corrente sangunea exoantignios e que originem reaces cruzadas com o Acm utilizado pelo Kit Platelia Aspergillus Bio-Rad (del Palacio et al., 2003a; Husain et al., 2004). Apesar de tudo, preciso clarificar o significado dos falsos positivos, e, para isso, fundamental entender clinicamente os doentes e realizar tcnicas de PCR quantitativa do DNA do Aspergillus (del Palacio et al., 2003a). A deteco em

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circulao do DNA do Aspergillus na primeira amostra de soro positiva para o antignio GM pode ajudar no diagnstico de AI nos doentes hematolgicos. Num diagnstico de emergncia, a determinao por PCR em tempo-real, na mesma amostra, permite encurtar o tempo de resposta e ajudar na deciso clnica (Millon et al., 2005). A mesma posio j partilhada por Kawazu et al., (2003), em estudos realizados com amostras de lavados brnquicos, de doentes com suspeita de AI. Ainda que se desconheam as causas, a existncia de falsos negativos, na pesquisa de GM, poderia ser devida, entre outros factores, a, encapsulao do processo infeccioso que impediria a libertao de GM nos lquidos orgnicos, grau de angioinvaso que poderia ser menor em doentes no neutropnicos, com formao de imunocomplexos que impeam a deteco de GM em doentes com anticorpos frente a Aspergillus (del Palacio et al., 2003a; Herbrecht et al., 2005). Tem-se tambm especulado que, com o tratamento prvio antifngico, haveria supresso na produo de GM pelo fungo o que tambm contribuiria para o aparecimento de falsos negativos (del Palacio et al., 2003a). Nos doentes com AI, o GM pode ser detectado no soro, na urina, no LCR, no lquido do pericrdio e no LBA, estando ainda por definir neste ltimo, o valor de cut-off, de modo a podermos diferenciar entre infeco e colonizao (del Palacio et al., 2003a). Sendo o GM um hidrato de carbono solvel na gua, pode ser detectado nos fludos anteriormente referidos, quando obtidos a partir de doentes que manifestem suspeitas ou AI (Klont et al., 2004; Maertens et al., 2004). O aparecimento de GM no soro est normalmente associado com invaso tecidular, e, consequentemente, com AI (Maertens et al., 2004). Estas concentraes so oscilantes, no se conhecendo exactamente qual a sua cintica. Sabe-se no entanto que, para um estudo mais sensvel, so necessrias duas amostras de soro do doente por semana. Alguns autores propem que sejam feitas colheitas aos doentes em dias alternados ou at mesmo dirias,

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uma vez que no conhecido com exactido o perfil de libertao do GM em todos os doentes. A maioria dos estudos realizados correspondem a doentes neutropnicos de alto risco, com uma neutropenia profunda e prolongada, bem como a receptores de transplantao de medula ssea (del Palacio et al., 2003a). Esta tcnica reveste-se de grande interesse e importncia, uma vez que, no sendo invasiva, til, permitindo um diagnstico precoce, antecipando-se sintomatologia clnica, s imagens radiolgicas e ao tratamento emprico antifngico (Pazos & del Palacio, 2003). Assim, a antecipao do diagnstico pode contribuir para melhorar a utilizao das restantes provas de diagnstico e dos recursos teraputicos (Jarque et al., 2003).

A

tcnica

Platelia

Aspergillus

Bio-Rad

baseia-se

numa

reaco

imunoenzimtica de tipo sandwich, realizada em um tempo, em microplaca, permitindo a determinao semi-quantitativa do antignio circulante GM em soros humanos. So considerados como negativos, quanto presena de GM, valores de ndice 1,0 ng/ml nomeadamente, o controlo do resultado, aconselhando a repetio do teste na mesma amostra e numa outra colhida do mesmo doente. Com este controlo, possvel a eliminao de qualquer dvida quanto a uma falsa positividade devida a contaminao do soro ocorrida aps colheita (Platelia Aspergillus Bio-Rad). A existncia de duas colheitas sucessivas, positivas, indica a presena de GM no soro do doente, sendo um indicador de AI (Platelia Aspergillus Bio-Rad). Relativamente a esta tcnica, poderemos constatar que a deteco prospectiva de GM no soro, por ser um mtodo no invasivo e sensvel, de extrema utilidade para estabelecer o

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diagnstico precoce de AI em doentes hematolgicos de elevado risco (Stevens, 2002; Pazos & del Palacio, 2003). Este tipo de doentes deve ser submetido a colheitas bissemanais, sendo que, estas devem ser mantidas inclusivamente durante o tratamento antifngico, tendo por isso valor de prognstico. Quando a existncia de antigenemia para Aspergillus se confirma, deve ser realizada uma TCAR do trax e, se possvel, uma broncoscopia. A instaurao de uma teraputica emprica, baseada nas informaes fornecidas pelos exames anteriores, permite reduzir o nmero de doentes que necessitam de tratamento antifngico, assim como possveis efeitos secundrios e os respectivos custos (del Palacio et al., 2003a).

4.2.4. Diagnstico da Aspergilose Invasiva por tcnicas de Biologia Molecular

Na ltima dcada desenvolveram-se tcnicas para a deteco de DNA de Aspergillus, atravs da reaco em cadeia da polimerase (PCR). Esta tcnica, outro marcador biolgico possvel para o diagnstico da AI (del Palacio et al., 2003a; Millon et al., 2005). Todavia, ainda que seja possvel a deteco do DNA fngico na maioria das amostras clnicas, as que so provenientes do tracto respiratrio apresentam problemas para o seu estudo com tcnicas de Biologia Molecular (PCR), uma vez que difcil distinguir o portador assintomtico ou transitrio de Aspergillus spp. daquele que apresenta realmente uma AI (Kawazu et al., 2003; del Palacio et al., 2003a). Esta situao, deveras problemtica, pela elevada frequncia de resultados positivos, devida distribuio ubqua de Aspergillus (Kawazu et al., 2003). de notar que 25% da populao saudvel apresenta PCR positivo para Aspergillus em amostras do tracto respiratrio, o que, segundo del Palcio e colaboradores (2003a), poder ser solucionado se se fizer a quantificao da carga fngica mediante a realizao de PCR em tempo-real. A sensibilidade, no que se refere determinao do DNA por tcnicas de PCR, enorme, sendo aproximadamente vinte vezes mais sensvel do que a cultura. Por este- 49 -

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mtodo, pode detectar-se de 1 a 10 fg de DNA fngico ou de 1 a 5 unidades formadoras de colnias/ml. Estas tcnicas de Biologia Molecular que utilizam PCR podem ser muito teis no diagnstico precoce, bem como, na ajuda da monitorizao do tratamento antifngico (del Palacio et al., 2003a; Liu et al., 2005). Como resposta favorvel ao tratamento, verifica-se que doentes com AI apresentam um menor nmero de amostras com PCR positivos, ao contrrio dos doentes cuja resposta ao tratamento desfavorvel (del Palacio et al., 2003a). A quantificao da carga fngica, com a realizao de PCR no sangue perifrico, pode no entanto ser uma mais valia no sentido de solucionar o problema da elevada frequncia de casos positivos (Kawazu et al., 2003; del Palacio et al., 2003a; Millon et al., 2005). A amostra ideal o sangue (total, soro, plasma), preferencialmente o sangue total sem anticoagulante, j que a sensibilidade na tcnica de PCR efectuada no plasma menor. Se utilizarmos sangue total de doentes com AI declarada, a sensibilidade da tcnica, quando so estudadas duas ou mais amostras, sobe para 100% (del Palacio et al., 2003a). O consenso internacional que define Infeco Fngica Invasiva (IFI) nos doentes oncohematolgicos no inclui a tcnica de PCR como um instrumento de diagnstico, em virtude de resultados no concordantes serem devidos necessidade de standardizao (Ascioglu et al., 2002; Kawazu et al., 2004; Millon et al., 2005). Tambm Hope e colaboradores (2005b) referem que embora existam inmeros esforos dirigidos para a deteco do DNA de Apergillus spp., a falta de tcnicas standardizadas bem como o pouco conhecimento da cintica e libertao do DNA, continuam a impedir a aplicabilidade desta tcnica em larga escala. Scotter e colaboradores (2005) demonstraram tambm que a PCR muito sensvel para o diagnstico de AI mas que se encontra associada a um nmero

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moderado de falsos positivos, e que, o mtodo de deteco do GM exibe baixa sensibilidade mas uma elevada especificidade. Num estudo efectuado por Millon e colaboradores (2005) foi detectado em circulao DNA de Aspergillus por tcnica de PCR em tempo-real a partir de doentes hematolgicos que apresentavam uma primeira amostra GM positivo. Neste estudo, verificaram que PCR positivos, na primeira amostra de soro GM positivo proveniente de doentes com risco de AI, estava associado a um mau prognstico. Os sinais clnicos e radiolgicos, tambm associados a um mau prognstico, tm sido referidos, e, aparecem em mdia nos seis dias seguintes ao primeiro resultado de GM, em mais de metade dos doentes. Resultados de PCR positivos podem reforar a tomada de deciso para o incio da teraputica, bem como, a sua suspenso no caso de AI no se confirmar. Resultados negativos podem reforar a deciso de adiar a teraputica ou mesmo a sua suspenso. No entanto, estes devem ser interpretados com alguma precauo. A concluso deste estudo sugere que a realizao do PCR em tempo-real, logo que a primeira anlise de GM seja positiva, pode ter interesse, no melhora o diagnstico de AI, mas pode ajudar na tomada de deciso em doentes hematolgicos com risco de IFI.

4.3. Estudo comparativo dos 3 mtodos (glucanos; GM; PCR)Kawazu e colaboradores, em (2004), realizaram estudos comparativos usando a deteco de GM, glucanos e a PCR. Deste estudo concluram que a PCR em tempo-real, para o DNA de Aspergillus em amostras clnicas, apresentava elevada sensibilidade in vitro, da ordem dos 79%, tendo verificado valores de sensibilidade de 58% para a deteco do GM e de 67% para os -D-Glucanos (BDG). Como problemas, surgiram a falta de reprodutibilidade dos resultados intra e interlaboratoriais e o facto de o diagnstico por PCR ser baseado numa tcnica demorada, complicada e com custos cerca de seis vezes superiores

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aos verificados, relativamente utilizao da deteco antignica por qualquer um dos mtodos usados. Porm, deste estudo, ressalta ainda, que na deteco do GM, quando utilizado um valor de cut-off mais baixo (ndice 0,6), a obteno de dois resultados positivos, consecutivos, permite considerar este teste com perfil excelente para o diagnstico de AI em doentes hematolgicos de alto risco. Em amostras utilizadas para a pesquisa de BDG tem-se verificado a presena de falsos positivos associados a doentes sujeitos a hemodilise, by-passes cardiopulmonares, tratamentos com imunoglobulinas e exposio a gaze que contm glucanos. de referir que a prpria exposio ambiental aos BDG pode tambm comprometer a especificidade do mtodo (Hope et al., 2005b). Costa e colaboradores (2002), verificaram que a deteco do GM era mais sensvel do que a PCR em tempo-real para estabelecer o diagnstico da AI (52% vs. 45% respectivamente), havendo ainda outros autores como Sanguinetti e colaboradores (2003) que descrevem uma sensibilidade maior na deteco do GM relativamente tcnica de PCR em tempo-real (100% vs. 90% respectivamente) no diagnstico da API. No certo que a deteco do DNA seja mais sensvel do que a deteco do GM no diagnstico da AI (del Palacio et al., 2003a). Tambm Palomares e colaboradores (2005) concluram, aps um estudo realizado em 31 doentes, com elevado risco de aspergilose e com grande probabilidade de apresentarem AI, que nenhum dos soros dos doentes apresentaram PCR positivos no obstante terem usado um mtodo com uma sensibilidade abaixo de 5 clulas conidiais e que, dos doentes estudados, 11 apresentavam reaces positivas na deteco do antignio GM (14 episdios). Dois doentes apresentavam probabilidade de infeco clnica com sinais pulmonares radiolgicos, culturas microbiolgicas positivas e deteco de GM positiva (em duas ou mais

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amostras consecutivas com valores superiores a 1 ng/ml). Assim, o GM positivo, antecipa o aparecimento de sinais clnicos de infeco. Pouco se conhece ainda, relativamente origem e cintica da determinao do DNA fngico no sangue. Porm, tem-se sugerido que a resposta do hospedeiro ao fungo impediria a libertao de DNA, desde o local onde ocorre a infeco at corrente sangunea, quando o grau de angioinvaso menor. Tambm se desconhece como circula na corrente sangunea, como se efectua a sua metabolizao e como desaparece no sangue, tudo isto, bastante importante para que se possa estabelecer a altura ideal de obteno das amostras para o estudo do DNA (del Palacio et al., 2003a). Buchheidt & Hummel (2005) corroboram este desconhecimento, acrescentando que a taxa de sensibilidade baixa significativamente quando o doente se encontra exposto a tratamento antifngico e que a reduo da mortalidade e/ou a taxa de morbilidade, usando a tcnica de PCR, no efectiva e no se conhece a relao custo-benefcio na utilizao deste mtodo.

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OBJECTIVOS DO TRABALHO

Objectivos do Trabalho

OBJECTIVOS DO TRABALHOEstudos prvios sugerem que a deteco de antignio GM no sangue permite uma suspeita de aspergilose em doentes alotransplantados, mais precocemente. Foi nosso objectivo investigar se esta nova metodologia pode contribuir para reduzir a morbilidade e mortalidade nos doentes com suspeita de aspergilose. importante referir que, em mdia, no Instituto Portugus de Oncologia Francisco Gentil do Porto EPE, surgem de 3 a 5 doentes por ano com suspeita de aspergilose, constituindo um subgrupo, dentro dos alotransplantados, com elevada mortalidade. Tudo isto porque o diagnstico actual (micolgico) demasiadamente demorado, de aproximadamente 4 semanas e de baixa sensibilidade. precisamente no grupo de doentes alotransplantados, aquele em que se torna importante um diagnstico precoce de aspergilose, uma vez que, esta uma complicao relativamente frequente e a mortalidade elevada. S mediante um diagnstico muito precoce e uma rpida e adequada teraputica se poder reduzir a mortalidade destes doentes alotransplantados.

Neste contexto, os objectivos deste trabalho foram:

1 Determinao semi-quantitativa de antignio circulante GM em amostras de soro humano de doentes alotransplantados.

2 Correlacionar os valores obtidos no follow-up e verificar se a deteco prvia de antignio circulante teve como consequncia uma diminuio da morbilidade e consequentemente da mortalidade.

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Objectivos do Trabalho

3 Validar o mtodo de deteco de antignio GM como avaliao precoce do risco de desenvolvimento de AI em doentes alotransplantados

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MATERIAL E MTODOS

Material e Mtodo

MATERIAL E MTODOS1. Caracterizao da amostra estudadaO estudo foi efectuado em 16 doentes com diferentes tipos de patologias do foro hemato-oncolgico, os quais, foram submetidos a alotransplante no Instituto Portugus de Oncologia Francisco Gentil do Porto Empresa Pblica Empresarial. Todos os doentes envolvidos neste estudo foram atempada e devidamente informados sobre os objectivos do estudo, dando o seu consentimento com vista sua participao no mesmo. A escolha dos doentes foi feita tendo como base o tipo de transplante, nomeadamente alotransplante, em virtude destes apresentarem maior risco de infeces fngicas invasivas. Todos os dados clnicos, referentes aos doentes, foram obtidos recorrendo consulta do seu processo clnico existente no Servio de Transplantao de Medula ssea. Os doentes foram submetidos a regime de condicionamento que dependia da patologia base e da sua condio fsica. Na maior parte dos doentes foram usados regimes baseados na associao do Bussulfano e Ciclofosfamida (12 doentes, 75%) a que foi associado, nos que foram submetidos a alotransplante no aparentado, AntiTimcito Globulina (ATG). Em trs doentes (18,75%) o regime de condicionamento foi Fludarabina mais Bussulfano. Num doente (6,25%) com anemia de Fanconi, que efectuou um alotransplante a partir de dador no aparentado, foi usado um regime exclusivamente imunossupressor que consistiu na associao de Fludarabina, Ciclofosfamida e ATG.

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Material e Mtodo

Na tabela 3 esto representados em detalhe os regimes de condicionamento utilizados.

Tabela 3 Regime de condicionamento

Regime de condicionamento Bu12Cy2ATG Bu16Cy2 BuCy2ATG BuCyMelf FluBu6 BuCyMelfATG FluCyATG Total

Frequncia 1 8 1 1 3 1 1 16

Percentagem 6,25 50,00 6,25 6,25 18,75 6,25 6,25 100,00

Legenda: Bu Bussulfano, Cy Ciclofosfamida, Melf Melfalan, MelfATG Melfalan + AntiTimcito Globulina, Flu Fludarabina.

Dos 16 doentes que incluram o estudo, 9 eram do sexo masculino (56,25%) e 7 do sexo feminino (43,75%), com idade mediana de 35 anos (mnima 11 e mxima 55), distribudos segundo os seguintes escales etrios: dos 11 aos 19 anos 2 doentes (12,5%), dos 20 aos 29 anos 5 doentes (31,25%), dos 30 aos 39 anos 3 doentes (18,75%), dos 40 aos 49 anos 4 doentes (25%) e dos 50 aos 59 foram includos 2 doentes (12,5%).

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Material e Mtodo

Dos doentes que incluram o estudo, 15 (93,75%) tinham patologia hematolgica maligna e 1 doente (6,25%) apresentava anemia de Fanconi. A distribuio dos doentes em relao ao tipo de diagnstico representada na tabela 4.

Tabela 4 Tipo de diagnstico

Tipo de diagnstico Leucemia mielide aguda Leucemia mielide crnica Linfoma no Hodgkin Leucemia linfide aguda Anemia de Fanconi Total

Frequncia 7 3 4 1 1 16

Percentagem 43,75 18,75 25,00 6,25 6,25 100,00

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Material e Mtodo

Na tabela 5 feita a representao do diagnstico relativamente fase da doena no transplante. No transplante, a maioria dos doentes apresentava-se em 1 remisso completa. Os 8 doentes, com linfoma no Hodgkin ou com leucemia aguda, apresentavam-se em 1 remisso comple