DISSERTAÇÃO DE MESTRADO A QUALIFICAÇÃO DA … · A qualificação da despesa pública surge...

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Reitoria da Universidade de Cabo Verde Praça António Lereno C.P.379-C Tel. (00238) 261.99.04/261.98.94 Fax. (00238) 261.26.60 E-mail: [email protected] Site: www.uni.edu.cv DISSERTAÇÃO DE MESTRADO A QUALIFICAÇÃO DA DESPESA PÚBLICA: O instrumento da desconcentração orçamental Caso Cabo Verde CLAUDINO MARIA MONTEIRO SEMEDO ORIENTADOR: PROFESSOR DOUTOR EUGENIO LAGEMANN UNICV UFRGS 2010

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  • Reitoria da Universidade de Cabo Verde

    Praa Antnio Lereno C.P.379-C Tel. (00238) 261.99.04/261.98.94

    Fax. (00238) 261.26.60 E-mail: [email protected]

    Site: www.uni.edu.cv

    DISSERTAO DE MESTRADO

    A QUALIFICAO DA DESPESA PBLICA:

    O instrumento da desconcentrao oramental

    Caso Cabo Verde

    CLAUDINO MARIA MONTEIRO SEMEDO

    ORIENTADOR: PROFESSOR DOUTOR EUGENIO LAGEMANN

    UNICV UFRGS 2010

  • AGRADECIMENTOS

    Dou graas a Deus pelo dom da vida e por me ter ajudado e acompanhado sempre.

    Ao meu professor e orientador Doutor Eugnio Lagemann pela oportunidade, pelo

    apoio e por ter desfrutado dos seus conhecimentos e experincia. Agradeo tambm os

    demais professores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e aos colegas de

    mestrados com quem tambm aprendi muito durante os dez meses de aula.

    Aos meus Pais, irmos e meus familiares pela confiana e apoio de sempre.

    Aos meus amigos mais chegados pela amizade e fora.

    Durante a minha carreira profissional tenho contado com colegas e amigos de trabalho

    do Ministrio das Finanas, particularmente da Direco Geral do Oramento e da

    Direco Geral do Tesouro que muito contriburam para a preparao desta dissertao

    por isso seria justa prestar-lhes tambm um tributo - muito obrigado a todos.

  • Quem est em desvantagem tem de ser mais criativo

    e melhor estrategista do que o mais forte. (CARLOS MATUS: 1996)

  • RESUMO

    A reforma oramental nesta fase de viragem das Finanas Pblicas Cabo Verdiana ,

    onde a transparncia e a boa governao so palavras de ordem, num Pas ainda

    dependente da ajuda externa no seu processo de desenvolvimento, h necessidade

    efectiva de se apostar na melhoria da qualidade da despesa pblica como condio sine

    qua non para se atingir a almejada economicidade, eficincia e eficcia na gesto da

    coisa pblica.

    Neste processo, o oramento enquanto instrumento de poltica ganha importncia

    capital, particularmente na vertente de despesa.

    O trabalho faz uma abordagem histrica da reforma oramental na sua vertente de

    despesa, analisa a suas implicaes e prope um novo instrumento de qualificao da

    despesa pblica em Cabo Verde.

    Palavra-chave: Qualidade da Despesa Pblica

  • ABSTRACT

    The budgetary reform in this phase of transformation of the Cape-verdean Public

    Finances, where transparency and good governance are the axiom, in a country still

    dependant on external aid to implement its process of development and transformation,

    have effective necessity of betting itself in the improvement of the public expenditures

    quality as condition sine qua non to reach the goal for economic, efficiency and

    effectiveness in the management of the public goods.

    In this process the budget gains capital importance as an instrument for implementing

    policies, particularly in the expenditure front.

    The work makes a historical approach of the budgetary reform, especially on the

    expenditure side. It analyzes its implications and proposes a new instrument of

    qualification of public expenditures in Cape Verde.

  • SUMRIO

    INTRODUO .............................................................................................................. 10

    CAPTULO 1- Abordagem terica Programao/planeamento e oramentao ........... 12

    1.1. Conceptualizao do oramento ...................................................................... 12

    1.1.1. A programao e o planeamento .............................................................. 13

    1.2. O Planeamento Estratgico Situacional de CARLOS MATUS. ..................... 18

    1.2.1. Epistemologia do planeamento ................................................................. 21

    1.2.2. Os trs cintos do governo ......................................................................... 23

    1.2.3. O tringulo do Governo ............................................................................ 24

    1.2.4. Seleco de problemas.............................................................................. 27

    1.3. Oramentao .................................................................................................. 28

    1.3.1. Oramento incremental............................................................................. 32

    1.3.2. Da Oramentao por Objectivos ao P.P.B.S ........................................... 35

    1.3.3. A Racionalizao das Decises Oramentais (RDO) ............................... 37

    1.3.4. O Oramento base-zero ............................................................................ 38

    CAPTULO 2 -Oramento do Estado de Cabo Verde ................................................... 40

    Sua trajectria logo ps independncia at os dias de hoje. ........................................... 40

    2.1. A Administracao financeira do Estado de Cabo Verde nos primeiros dias e

    anos da independncia ................................................................................................ 40

    2.1.1. Oramento. ............................................................................................... 41

    2.1.2. Sistema de Planeamento /Oramento ....................................................... 43

    2.2. A reforma oramental dos anos 90 e princpios de 2000 ................................. 48

    2.2.1. A reforma do oramento / despesa ........................................................... 48

    2.2.2. A reforma do sistema de planeamento ..................................................... 59

    2.2.2.1. O Modelo e os Instrumentos Actuais do Planeamento ..................... 60

    2.2.2.2. A estratgia de transformao econmica ao documento de estratgia

    de crescimento e reduo da pobreza ................................................................. 63

    2.3. A Avaliaao das Finanas Pblicas / Despesa Pblica .................................... 67

    2.3.1. Avaliao da Gesto das Finanas Pblicas (CFAA) ............................... 67

    2.3.2. A Reviso de Despesa Pblica ................................................................. 71

    2.3.3. Avaliaao do Sistema Nacional de Planeamento ..................................... 74

    2.3.3.1. Seguimento e Avaliao .................................................................... 77

    2.3.4. Avaliao PEFA (Public Expenditure & Financial Accountability), ....... 79

    CAPTULO 3 -O que deve ser melhorado e introduzido nas reformas em curso .......... 82

    3.1. A introduo do Quadro de Despesa Mdio Prazo no ciclo oramental ......... 82

  • 3.1.1. O QDMP no contexto do sistema de planeamento, programao e

    oramentao .......................................................................................................... 84

    3.2. A Reviso da Despesa Pblica como input ao Quadro de Despesa Mdio Prazo

    87

    3.3. Desconcentrar Por Resultados ......................................................................... 90

    CONCLUSO ................................................................................................................ 96

  • Lista de Figuras

    Figura 1 Modelo de Planeamento/programao/oramentao e controlo 61

    Figura 2 Sistema de Planeamento em Cabo Verde 62

    Figura 3 A do DECRPII 67

    Figura 4 -Sistemas de Informao de Gesto Oramental e Financeira 78

    Figura 5 - Estrutura programtica 85

    Figura 6 - O QDMP no contexto do sistema de planeamento e oramento de Cabo

    Verde 86

    Figura 7 - ciclo oramental 87

    Figura 8 Modelo de programao oramental 88

    Figura 9 Circuito entre os diferentes instrumentos de planeamento 90

    Ivandro/Dissertaaoactualizadofinalissima_V2.doc#_Toc265657322Ivandro/Dissertaaoactualizadofinalissima_V2.doc#_Toc265657323

  • Lista de Tabelas

    Tabela 1Quadro sntese da Pontuao do Desempenho da GFP no final de 2007 ......... 81

  • 10

    INTRODUO

    O desafio que se coloca a Cabo Verde no seu processo de desenvolvimento enorme. A

    graduao de Cabo Verde ao Pas de Rendimento Mdio, a integrao na Organizao

    Mundial do Comrcio, a Parceria Especial com a Unio Europeia interpela o pas para

    mudar de paradigma e, um deles a mudana da abordagem na gesto das finanas

    pblicas.

    Cabo Verde tem conseguido uma estabilidade macroeconmica nos ltimos anos e a

    gesto das finanas pblicas tem sido o grande recurso, recurso esse que deve e tem que

    ser melhorado e multiplicado.

    Nesse processo da gesto da coisa pblica, uma questo central que ainda se coloca

    neste momento em Cabo Verde a natureza do modelo e a abordagem do sistema de

    planeamento, programao, oramentao e controlo que se pretende implementar e

    desenvolver hoje e no futuro.

    Desde os anos noventa que os sucessivos governos vm apostando na reforma a nvel

    oramental de forma a melhorar a eficincia e eficcia na afectao dos recursos

    pblicos, isto , a qualificao da despesa pblica.

    A qualificao da despesa pblica implica a melhoria em todas as fases do oramento,

    desde sua fase de preparao e elaborao, na execuo e na prestao de contas do

    Estado, do prprio sistema de seguimento e avaliao enquanto processo.

    A qualificao da despesa pblica surge como o objectivo primordial de todo este

    processo.

    Com a informatizao e a introduo de um sistema integrado de gesto oramental e

    financeira (SIGOF) foi possvel iniciar o processo da desconcentrao de algumas fases

    do processo da execuo oramental (fase de despesa - desconcentrao da

    cabimentao e liquidao).

    Foram efectuadas vrias reformas legislativas e institucionais, com destaque a

    aprovao da nova lei da Contabilidade Pblica (DL n29/2001, de 19 de Novembro, a

    criao da figura dos ordenadores financeiros e controladores financeiros,

    regulamentados em Janeiro de 2007- em anexo), criando assim as condies efectivas

  • 11

    para o inicio da desconcentrao de algumas fases da realizao de despesas,

    nomeadamente o cabimento e a liquidao.

    O objectivo deste estudo aprofundar o processo da desconcentrao oramental

    enquanto instrumento de qualificao da despesa pblica em Cabo Verde.

    No trabalho utilizou-se, para alm da parte terica recorrendo literatura, vrios

    documentos e relatrios de avaliao de finanas pblicas na vertente da despesa

    pblica e legislaes sobre a reforma oramental em Cabo Verde de 1975 a 2009.

    Tambm, foram entrevistados os dirigentes financeiros de algumas instituies e do

    Ministrio das Finanas.

    No primeiro captulo se desenvolve a parte terica da evoluo dos sistemas de deciso

    oramental e a abordagem do planeamento estratgico situacional de CARLOS

    MATUS como um novo instrumento de planeamento do Governo.

    O segundo captulo se analisa a abordagem histrica do processo oramental e do

    planeamento em Cabo Verde, desde a independncia em 1975 at os dias de hoje,

    analisando as principais reformas a nvel do oramento e do planeamento e as

    avaliaes das finanas pblicas ocorridas, suas implicaes na perspectiva da melhoria

    da qualidade da despesa pblica.

    No terceiro e ltimo captulo so abordados os desafios da reforma oramental e se

    prope, na perspectiva da melhoria da qualidade da despesa pblica, a desconcentrao

    do processo oramental, mais concretamente da preparao e elaborao do oramento,

    (tendo aqui o Quadro de Despesa Mdio Prazo (QDMP) como instrumento), da

    execuo oramental (tendo a Reviso da Despesa Pblica como input ao QDMP) e a

    desconcentrao do processo de elaborao das contas do Estado com a organizao dos

    servios em centros de responsabilidade.

  • 12

    CAPTULO 1- Abordagem terica Programao/planeamento e oramentao

    1.1. Conceptualizao do oramento

    O oramento enquanto sistema de deciso tem evoludo muito, especialmente do sculo

    XIX ao presente.

    A teoria do oramento foi elaborada durante o liberalismo embora com uma funo

    predominantemente financeira o oramento surge apenas como um meio de obteno

    de receitas para a realizao das despesas do Estado. o oramento- registo-limite.

    Com o reforo do papel do Estado na economia o oramento passa a ter as funes

    puramente econmicas e o oramento-registo- limite substitudo pelo oramento-

    programa- interveno, que iremos analisar ao longo deste captulo.

    No domnio econmico o oramento uma previso (plano), onde se distingue duas

    perspectivas:1 - Racionalidade Econmica - permite uma gesto mais racional e

    eficiente dos dinheiros pblicos, na medida em que concretiza a relacionamento entre

    receitas e despesas e facilita a procura de um mximo bem-estar; - Eficcia como

    quadro de elaborao de polticas financeiras- modernamente, do ponto de vista

    econmico e sobretudo encarado como um elemento fundamental para a definio e

    execuo de politicas financeiras, conseguindo-se por meio do oramento conhecer a

    politica econmica global do Estado.

    Nesta perspectiva, a qualificao da despesa pblica preponderante na implementao

    de toda a poltica pblica.

    A qualidade da despesa pblica aparece associado aos novos atributos de que uma

    politica oramental deve reunir hoje: um desses atributos que iremos aqui analisar o

    princpio da harmonizao e vinculao a instrumentos do planeamento orientado por

    resultado, podendo assim, avaliar a to falada economicidade, eficincia e eficcia na

    gesto da coisa pblica, estando assim os objectivos da poltica a montante do processo

    1 Cit,.p 338 ,Antnio L.Sousa Franco, Finanas Pblicas e Direito Financeiro, Vol I e III, 4 ed.,Almedina

    , Coimbra 2008

  • 13

    oramental e reflectem no modo como o oramento preparado, elaborado, organizado,

    isto , como apresentado e executado.

    A oramentao pblica que, de entre outros aspectos, se distingue da privada pelos

    recursos disponveis, pelo mbil e pelo tipo de bens e servios cuja previso assim

    assegura, tem uma natureza sistemtica.Os sistemas oramentais congregam e envolvem

    vrios actores, teorias econmicas e sociais, numerosas estruturas institucionais,

    normas, regras, valores concorrentes, que produzem resultados nem sempre perceptveis

    pela leitura do documento oramental. Neste sistema oramental os resultados dessas

    interaces so precisamente as decises oramentais que envolvem, entre outros,

    avultados recursos financeiros.

    Neste contexto, o oramento surge num processo, como uma fase do modelo de

    planeamento- programao- oramentao e controlo, portanto como parte deste

    processo.

    Que modelo e sistema de planeamento? Como programar / oramentar? Enfim, so

    questes que hoje se levantam.

    Nos documentos produzidos nas grandes organizaes internacionais (FMI, OCDE2 e

    Unio Europeia) em matria de Finanas Pblicas e de gesto da despesa pblica, o

    assunto mostra o seu vigor e ele aparece ainda associado aos novos atributos que uma

    poltica oramental. ..para estar no caminho certo, a poltica oramental deve ser

    disciplinada, deve basear-se em princpios de estabilidade e de sustentabilidade, deve

    ser claramente orientada pela mxima disciplinadora e de reduo da despesa pblica e

    de eliminao dos factores reais e aparentes determinantes do aumento aqui fatdico..

    (Cabral Nazar, 2008:13).

    1.1.1. A programao e o planeamento

    O conceito da programao dinmico, cujo significado, mbito e importncia foram

    sofrendo evoluo, imposta pela evoluo dos regimes econmicos, ocorridos nas

    ltimas dcadas.

    Este conceito traduz o papel / peso que o Estado deve ter numa determinada economia

    relativamente sua interveno.

    2 FMI- Fundo Monetrio Internacional; OCDE- Organizao de Cooperao e Desenvolvimento

    Econmico.

  • 14

    A definio de programao no neutra e traduz sempre o posicionamento poltico e

    ideolgico. Segundo Cabral Nazar, mesmo quando se queira dar uma definio

    pretensamente neutra da programao, isto encerra tambm uma determinada opo ou

    posicionamento poltico e ideolgico.

    A definio tem variado conforme abordagem. SANCHES M.OSVALDO 3define a

    programao como um princpio oramental, segundo o qual o oramento pblico deve

    ser estruturado sob forma de programao, isto , deve expressar o programa de

    trabalho de cada entidade do sector pblico e o planeamento como acto ou efeito de

    planear. Processo este estruturado no sentido de coordenar o exerccio de opes

    (definio de objectivos, aces e meios a mobilizar para a realizao de um objectivo),

    com vista a tomada de decises que maximizem em termos de eficincia, eficcia e

    efectividade o emprego de recursos escassos e que ordenem os processos de execuo.

    Com efeito, podemos afirmar sem exagero, que existem tantos conceitos e formas de

    abordagem do planeamento quantas as possibilidades determinantes histricas,

    geogrficas, scio-polticas, culturais e econmicas que caracterizam cada sociedade.

    KORNAI, que considera o planeamento as a process of congnition and comprise pe

    o acento na recolha de informaes, na coordenao das diferentes actividades e na

    interdependncia das mesmas: O principal objectivo, desejos e aspiraes e o seu

    confronto com a realidade. Constitui um pressuposto da troca de informao e da

    coordenao de actividades interdependentes; uma vez que as actividades dos agentes

    econmicos so interdependentes., o planeamento representa um ptimo veculo para a

    anlise dessa interdependncia e para a compatibilizao dos interesses em anlise, na

    ptica de REIGADO F.MARQUES4.

    Pode-se ainda definir a programao como o acto de estabelecer um programa de futuro

    ou, estabelecer e definir organizativo de alguma coisa.

    A programao interpela uma lgica de interveno e neste quadro, surge o acto de

    programar ou de estabelecer um programa no qual so pr-definidos objectivo, metas e

    percurso exacto para alcanar esses fins. No campo da interveno econmica (ou

    econmico-financeira), as relaes e a delimitao conceptual entre o planeamento e a

    programao tm sido apresentadas, em diferentes momentos e contextos, de forma

    muito diversa. s vezes, a programao e o planeamento aparecem como sinnimos ou

    3 In Dicionrio de Oramento, Planejamento e reas Afins; 2 Edio Actualizada e Ampliada, oms -

    Brasilia 2004. 4 Introduo do Planeamento, Publicao Dom Quixote, Lisboa, 1983

  • 15

    como conceitos afins; noutras, como seu elemento integrante e, muito especialmente,

    no raro, como mtodo ou tcnica de planeamento.

    Apesar desta evidente proximidade conceptual, tambm no deixou de encontrar-se o

    entendimento segundo o qual o conceito de programao se oporia ao de planeamento

    (ou planificao). Esta ciso foi, por sua vez, o resultado do antagonismo que, durante

    quase todo o sculo XX, marcou os dois sistemas econmicos dominantes no mundo: o

    sistema capitalista e o sistema socialista.

    MARIO MURDEIRA ao definir os conceitos programao e planeamento durante

    a poca da existncia dos dois sistemas econmicos, entende que a designao plano

    econmico e planeamento econmico, ou, em formas sincopadas, plano e planeamento,

    sero utilizadas em exclusiva referncia ao plano e ao planeamento socialista; para o

    caso dos pases capitalistas, desenvolvidos ou no, em vez daquelas designaes,

    utilizaremos, respectivamente as de programa ou programao 5

    REIGADO MARQUES distingue assim em planeamento duas grandes linhas de

    orientao, de certo modo opostas, que encontram justificao no binmio sistema

    econmico e poltico, dados objectivos particulares do planeamento. Mais do que as

    caractersticas especficas de cada pas, so as concepes gerais de organizao da

    sociedade que encontramos na base da clivagem entre as duas linhas de orientao,

    apresentando posio dos autores, tais como, HERZOG, FEDORENKO ou EFIRMOV,

    entre outros, que consideram apenas possvel falar de planeamento em pases

    socialistas.

    BETTELHEIM define que a planificao a forma especfica de organizao de um

    determinado tipo de sociedade. Esta definio traduz uma concepo que permite

    identificar o planeamento com a cincia econmica do socialismo, cincia na qual se

    desenvolveriam os outros ramos das cincias sociais, com as suas teorias prprias e

    interdependncia.

    I, M.CVIRKOV,6 No Planeamento Econmico de Estado (Programao e Deciso

    Oramental) apresenta as diferenas entre o planeamento socialista e a programao

    capitalista sendo como diferenas de princpio e de natureza tcnica. Quanto s

    primeiras, elas devem, antes de mais, ao profundo antagonismo dos objectivos globais,

    traados para a organizao da actividade econmica (e, por conseguinte, para a prpria

    5 Neste sentido, Mario Madureira, Planeamento econmico, Ed.Aster, 1979;p 19.

    6 Cit Cabral Nazar -Programao e Deciso Oramental. Da racionalidade das decises oramentais

    Racionalidade Econmica TESES, Almedina, Coimbra 2008

  • 16

    actividade econmica do Estado), inerentes a cada um dos sistemas em presena. A

    divergncia entre a programao capitalista e o planeamento socialista reflecte a

    diversidade do carcter de classe do Estado, da orientao social da sua actividade, das

    diferenas de princpio do objecto (no que se refere ao carcter das relaes de

    produo) e da diversidade dos mtodos para a sua concretizao. Assim, a

    programao econmica do Estado visa no a transformao das bases do regime

    capitalista, mas ao contrrio, a manuteno e consolidao do seu alicerce principal sob

    a forma de propriedade privada dos meios de produo. Ao invs, o planeamento

    socialista no se limita aos mtodos de influncia indirecta sobre o desenvolvimento

    econmico. O planeamento socialista pelas suas caractersticas, de plano imperativo,

    centralizado e escala nacional, assumido como alicerce fundamental do

    desenvolvimento econmico.

    No sistema socialista, o planeamento foi sendo observado pela sua configurao

    dialctica, pelo que a escolha dos mtodos a utilizar na planificao de curto, mdio e

    longo prazo, foram sendo adaptadas essncia das tarefas socioeconmicas e s

    possibilidades da economia nacional. A partir sobretudo, dos anos sessenta, os estudos

    acadmicos desenvolvidos e que veriam a apoiar as polticas de planificao, centraram

    na procura de critrios de optimizao e na elaborao dos mtodos de planeamento

    ptimo.

    A verdade que, ao longo dos tempos, a programao e o planeamento aparecem (desde

    logo, na literatura especializada) sistematicamente interligados, designadamente nos

    pases capitalistas onde o planeamento foi ganhando preponderncia econmica e

    inegvel estatuto jurdico normativo.

    Assim, certos autores utilizaram o termo planeamento como sinnimo de programao

    num sentido muito amplo.

    Porm, as opinies divergem. Uns que vem a programao como elemento ou parte

    integrante do processo mais vasto de planeamento.

    F.LOURENO FERNANDES entende a programao como um dos componentes do

    planeamento que diz respeito ao cumprimento dos objectivos detalhado no plano. Em

    sentido idntico, F.PEREIRA DE MOURA que v um plano que compe um

    delineamento genrico da evoluo econmica durante um certo perodo, digamos, uma

    previso ou programao global relativa ao produto, rendimento e emprego, acumulao

    de capital, consumo e poupana, comrcio externo tudo a partir de certos objectivos

    que se decide alcanar e assentado em relaes estruturais ligando essas vrias

  • 17

    grandezas e elementos da economia. Alm do programa global necessrio elaborar

    programas sectoriais (relativos agricultura, industria, transportes, energia, habitao,

    ensino, etc.) e programas regionais (dividindo o pas em regies plano); uns e outros

    sero conciliveis com o plano global, constitudo desagregaes dele, cada um segundo

    a sua ptica; e ainda tm de ser congruentes entre si.

    Podemos ainda encontrar o conceito programao em outras dimenses, por exemplo

    microeconmica ou enquanto tcnica inerente ao prprio processo de planeamento. o

    caso de GUY CAIRE que define a programao como 7 essai de calcul rationnel et de

    controlo de lemploi des ressources rares. Diversamente, o planeamento, em sentido

    mais amplo, seria macroeconmico por definio, cabendo-lhe assegurar a

    compatibilidade dos diferentes programas que dela fazem parte, sendo a unidade

    macroeconmica dotada de um centro superior de deciso. Esta abordagem o PAZ

    FERREIRA8 entende que a programao reporta-se a aspectos tcnicos de execuo, a

    aces concretas de nvel microeconmico, enquanto o planeamento , por excelncia,

    um instrumento macroeconmico.

    Finalmente, surge o entendimento segundo o qual a programao uma tcnica inerente

    ao prprio processo de planeamento, entendimento este que se desenvolveu a partir,

    sobretudo, da introduo histrica de modelos de programao linear e do ulterior

    aperfeioamento das tcnicas previsionais, levado a cabo pelos pases ou at por

    instituies e organizaes internacionais.

    Poder-se- dizer que, desde sempre a programao tem sido vista pelo prisma do

    planeamento, apesar das mutaes ocorridas nas ltimas dcadas.

    Segundo Cabral Nazar a programao com o processo de planeamento apresenta trs

    formas: a programao como elemento do planeamento; como componente tcnica; e

    como processo da sua optimizao. A programao hoje nada tem a ver com o

    planeamento econmico convencional que durante largas dcadas do sculo XX foi

    utilizado, nas economias capitalistas.

    Hoje a programao est associada ao planeamento, e este ao oramento e ao controlo,

    num sistema de seguimento e avaliao, estando por isso, num processo Programao

    Planeamento Oramentao -Controlo.

    7 Guy, Caire, La Planificaton, 2 dition Cujas Paris, 1972,pp. 63)

    8 Eduardo Paz Ferreira, Lies de Direito da Economia cit p.301

  • 18

    1.2. O Planeamento Estratgico Situacional de CARLOS MATUS.

    Planeamento Estratgico Situacional (PES) um modelo da famlia dos modelos de

    planeamento estratgico aplicado ao sector pblico.

    O modelo foi elaborado por CARLOS MATUS, e apresenta-se como uma alternativa

    crise do planeamento autoritrio e tecnocrata. Algumas teorias econmicas e sobre

    estratgias de guerra permeiam o discurso do autor e do suporte s suas ideias.

    Segundo seu propositor, o Planeamento Estratgico Situacional um mtodo de

    planeamento governamental, voltado para a organizao da mquina administrativa do

    governo, distinto do planeamento tradicional e do planeamento estratgico empresarial.

    Seria prprio para ser utilizado como ferramenta a servio do dirigente poltico, no

    governo ou na oposio, permitindo o resgate do valor prtico do planeamento. De

    acordo com MATUS, no devemos confundir o planeamento com a predio. A

    predio um recurso de clculo utilizado pelos governantes e planeadores, mas no o

    nico.

    CARLOS MATUS coloca vrias questes sobre o planeamento para depois apresentar

    os seis argumentos do porqu planear e a epistemologia do planeamento moderno o

    planeamento situacional.

    . O planeamento uma ferramenta de governo ou uma tcnica para o uso dos

    tcnicos? Pode-se e deve-se planear a poltica? Precisamos planear em quaisquer

    circunstncias e sob qualquer ideologia? O planeamento estratgico pblico pode vir a

    ser a principal ferramenta do poltico do futuro?

    O ser humano no improvisa; geralmente faz o clculo que precede (antecede) e preside

    a aco. Mas o clculo, sem outros requisitos, pode ser chamado planeamento?

    O planeamento necessrio? O planeamento uma ferramenta eficaz do governo? Que

    peso tem o planeamento no desempenho do governo? (MATUS, Adeus Senhor

    Presidente, Governantes Governados;1996).

    Partindo do princpio do planeamento como o clculo que precede e preside a aco,

    apresenta trs variveis para fundamentar a mediao entre o clculo e a deciso: o

    horizonte temporal da anlise, a sistematicidade e as dimenses consideradas na anlise

    do clculo que precede e preside a aco:

  • 19

    a) O horizonte temporal da anlise considerado para tomar a deciso (enfoque

    limitado ao presente, a amanh a cinco anos, a trinta anos?);

    b) A sistematicidade da anlise que proceda a deciso (mtodos sistemticos,

    embasamento terico, intuio, mera experincia?);

    c) As dimenses consideradas na anlise do clculo que precede e preside a aco

    (realidade compartimentada ou viso global e situacional?)

    Define portanto o planeamento como um clculo situacional, articulado e sistemtico e

    exemplifica, mostrando a actuao de um poltico que, geralmente se move no

    imediatismo situacional, do planeador tecnocrata, ao contrrio, coloca-se na zona do

    clculo compartimentado em diferentes horizontes temporais e do planeamento

    estratgico situacional, com um p no cume e outro no cho, tem um campo de viso

    capaz de articular o clculo situacional em diferentes horizontes temporais, em

    diferentes domnios da realidade e a partir de diversas perspectivas de anlise. Esses

    posicionamentos de diferentes espaos de clculo, segundo MATUS que torna difcil

    o dilogo entre o poltico, o planeador tecnocrata e o planeador situacional, e assim que

    o governante afasta-se do planeamento, e os planeadores da realidade.

    MATUS prope o clculo situacional sistemtico e apresentado nos seis argumentos do

    porqu o planeamento:

    O primeiro argumento apresenta a necessidade de estabelecer alguma mediao entre o

    presente e o futuro. Focando no hoje, no presente, e argumenta que a racionalidade

    de uma deciso tomada hoje depende do que ocorrer amanh, sendo por isso necessrio

    a definio do critrio na tomada de deciso hoje considerando a sua implicao no

    amanh. Este argumento destaca por isso a necessidade de se prever as possibilidades

    do amanh e traar, antecipadamente, o rumo das aces a serem empreendidas hoje;

    MATUS foca por isso no presente, no hoje Esse amanh me afecta hoje, porque

    hoje o momento de eu fazer alguma coisa com vista a estar em condies de tirar

    proveito das oportunidades que o amanh oferecer e de evitar problemas futuros

    (MATUS: Adeus Senhor Presidente, Governantes Governados; 1996);

    No segundo argumento defende a necessidade de planear (prever), quando a predio

    impossvel. Tendo como elemento de que o que acontece amanh no predizvel, uma

    vez que o futuro no apenas depende de grande nmero de variveis mutveis, embora

    conhecidas; depende tambm dos homens que criam essas variveis como critrios

    possveis que ultrapassam sua prpria imaginao e intenes. O amanh, construdo

  • 20

    hoje, incidir sobre quem planeia e abrindo novas oportunidades ou criando novos

    problemas, destacando por isso a necessidade de se prever as possibilidades do amanh

    para traar, antecipadamente, o rumo as aces a ser empreendidas hoje.

    O terceiro argumento mostra que preciso ter a capacidade para lidar com as surpresas.

    Os acontecimentos de amanh podem estar fora do espao de possibilidade que hoje se

    possa imaginar como provvel, o que dificulta com sensatez prever e imaginar. Assim,

    pode ocorrer surpresas amanh, mostrando assim a vantagem de se prever como

    enfrentar o amanh, com planos de contingncia reactivos, as surpresas que hoje

    escapam minha previso, ou tentar evit-las hoje por meio de planos de contingncia

    preventivos;

    No quarto argumento MATUS defende a necessidade de uma mediao entre o passado

    e o futuro. O fracasso ao enfrentar o imprevisto com rapidez e eficcia, deve servir de

    exemplo e aprendizagem e evitar futuros erros e pagar somente o custo necessrio por

    eles. Consequentemente, a aprendizagem de modo oportuno com o passado recente e

    pr esse conhecimento a servio dos outros argumentos desse discurso, fundamentando

    a necessidade de se aprender com a prtica, como mediao entre o passado e o futuro;

    O quinto argumento mostra a necessidade de uma mediao entre o conhecimento e a

    aco. Nessa linha, surge o plano como clculo que precede e preside a aco. Esse

    clculo explicativo apresenta diferentes vises ou ponto de vista dos diversos actores

    sociais que coexistem em dada situao e que afectam directa ou indirectamente a

    situao ou o conceito- problema.

    O clculo puramente poltico nem puramente tcnico e tampouco o nico.

    Consequentemente, sua primeira dificuldade para conhecer superar o conceito de

    diagnstico, que no considera a existncia de vises diferentes sobre a mesma matria

    (problema), sugerindo portanto que entre a aco e o conhecimento da realidade a seu

    servio indispensvel o planeamento, ainda que apenas como mera anlise do presente

    e para o presente, para que se explicitem as diferentes vises e os diferentes modos de

    calcular dos vrios actores relevantes. Portanto, segundo MATUS todo esse complexo

    clculo tcnico, poltico e social deve preceder e presidir aco, pois, se no for assim,

    aco resultar dissociada do clculo. Se a aco no estiver fundamentada em clculo

    slido, estaremos diante da impreviso mais primria; e, se esse clculo no estabelecer

    uma ponte com a aco, ento ter sido completamente suprfluo;

    O sexto argumento mostra a necessidade da existncia da coerncia global em face das

    aces parciais dos actores sociais.

  • 21

    1.2.1. Epistemologia do planeamento

    O pressuposto bsico do planeamento estratgico situacional, segundo CARLOS

    MATUS, explicado pela posio do sujeito e do objecto planeado.

    No modelo tradicional o sujeito nico que planeia est fora, ou acima da realidade

    (objecto planeado) e controla a aco do objecto planeado e reduz outros actores a

    simples agentes econmicos que apenas reagem a seu acto de planear e sendo sujeito

    nico que controla o sistema o diagnstico um instrumento para a busca da verdade

    objectiva.

    Tendo o controlo do sistema a previso confunde com a predio sendo por isso

    conhecer as leis de funcionamento do sistema, onde a realidade complexa reduzido

    a um objecto social, sendo por isso seu comportamento apenas social.

    MATUS apresenta em contrapartida seis postulados do Planeamento Estratgico

    Situacional;

    Postulado 1 o sujeito que planeia est includo no objecto planeado. Por sua vez,

    o objecto planeado inclui outros sujeitos que tambm planeiam.

    Neste contexto, o sujeito se confunde com o objecto planeado e da o actor no ter o

    controlo da realidade planeada. Pois, so vrios actores no sistema e no so

    independentes;

    Postulado 2 como so vrios actores que coexistem na realidade com diferentes

    capacidade de planeamento, h vrias explicaes da realidade e todas esto

    condicionadas pela insero particular de cada actor na mesma realidade;

    Postulado 3 para compreender a realidade e tornar-se capaz de prever sua evoluo, j

    no suficiente nem possvel reduzir as aces humanas a comportamentos

    predizveis;

    Havendo vrios actores podem coexistir no sistemas adversrios e/ou aliados e, nesta

    situao as aces no so apenas comportamentais e necessrio o clculo

    interactivo ou juzo estratgico, tpico da interaco entre actores sociais;

    Postulado 4 se o actor que planeia compartilha a realidade com outros actores que

    tambm planeiam, ento, necessariamente, o plano deve abranger o problema de vencer

    ou minar a resistncia dos outros aos planos que no sejam seus. O planeamento,

  • 22

    portanto, no deve ser confundido com a definio normativa do deve ser, mas

    englobar o pode ser;

    Postulado 5 se o planeamento de um actor realizar-se em um meio activamente

    resistente e em conflito com os outros actores, o normativo ser apenas um momento do

    estratgico e do operacional e, em consequncia, tudo estar impregnado de forte

    incerteza mal definida;

    Postulado 6 o plano no monoplio do Estado. Qualquer fora social luta por

    objectivos prprios e est capacitada a fazer um clculo que precede e preside a aco.

    Da que existem vrios planos em competio ou em conflito, e sendo o final aberto.

    O planeamento estratgico, contrariamente do planeamento normativo est mais

    prximo da realidade onde se lida com situaes no dia-a-dia que devem ser planeadas.

    o planeamento como clculo que precede e preside a aco!

    Reala portanto, o planeamento na situao, onde coexistem vrios actores que tambm

    planeiam, contrariamente abordagem do planeamento normativo onde o Governo tem

    o monoplio do Plano.

    O planeamento o principal componente da capacidade de governo e critica a

    abordagem do planeamento normativo onde impera o conceito do Estado monopolista

    do Sistema de Planeamento, Estado este como sujeito que controla o objecto

    planeado, quando na prtica h vrios actores que planeiam num contexto onde o

    sujeito se confunde com o objecto planeado.

    H um dilogo entre a prtica e a teoria cujo tema o verbo planear . A

    professora, DonaPprtica, pede Senhorita Teoria Normativa: - conjugue o verbo

    planear. A Senhorita Teoria Normativa obedece: - Eu planeio. _ Continue, est

    indo bem, dia a Dona Prtica J terminei, Professora, responde a Senhorita

    Normativa. A Senhorita Situacional est ansiosa para falar e conjuga o verbo antes que

    lhe peam Eu planeio, tu planeias, ele planeia etc. (Matus Carlos: Adeus Senhor

    Presidente )

    O planeamento deve apoiar-se em alguma teoria da produo da aco humana. Os

    mtodos de planeamento referem-se aco humana e os seus efeitos em um dado

    sistema de governabilidade

    No modelo em que existe um nico actor que planeia aparentemente mais governvel.

    Este modelo tem as seguintes caractersticas na ptica de MATUS: i) um actor planeia e

    dirige, os demais so simples agentes econmicos com reaces predizveis; ii) as

    aces dos agentes econmicos so previsveis e enumerveis respondem a uma teoria

  • 23

    do comportamento social que segue as leis; iii) o sistema gera incertezas, mas a

    incerteza refere-se exclusivamente possibilidade de que ocorram aces previsveis e a

    seus resultados; no existe o no-enumervel e o inimaginvel; iv) o actor que planeia e

    dirige no controla algumas variveis, mas as variveis no-controladas no tm

    conduo criativa inteligente porque no respondem a outros actores que tambm fazem

    planos. Ningum portanto detm o monoplio do planeamento este o primeiro

    princpio do planeamento moderno.

    Pelo facto de existirem vrios sujeitos que planeiam em igualdade de circunstncias,

    onde o Estado no o nico sujeito e no objecto planeado coexistirem vrios actores

    num ambiente de conflito, neste sistema gera incertezas e nem tudo predizvel.

    Ao reconhecermos a existncia de vrios actores tambm questionvel o diagnstico

    nico da realidade e de um clculo.

    1.2.2. Os trs cintos do governo

    Sendo um mtodo de Planeamento Governamental, CARLOS MATUS, recorre a

    actuao ou a gesto do Governo e apresenta os trs cintos.

    O mtodo PES qualifica a gesto do governo segundo os resultados e as condies

    fora do controle do actor (variantes), nas quais os resultados so alcanados.

    Lembremos que o actor escolhe seu plano, mas no pode escolher as circunstancias

    favorveis ou desfavorveis que motivam o plano e nas quais deve ser realizado. O

    plano corresponde no somente vontade e ideologia do governante, mas tambm s

    circunstancias nas quais ele o formula () (Adeus, Senhor Presidente, Governantes

    Governados: p.30)

    MATUS, Considera o Governar um problema muito complexo que exige por isso,

    um mtodo adequado de planeamento, no o mtodo tradicional (normativo) que ele

    considera como um mtodo ingnuo.

    O autor questiona se h mtodo para potenciar a arte de governar para depois

    argumentar o mtodo do Planeamento Estratgico Situacional. Recorre aos trs cintos

    do governo, trs balanos para explicar, adequar os problemas e recursos (poltico,

    econmico), recursos para solucionar os problemas e os resultados: O Balano de

    Gesto poltica, Balano Macroeconmico e Balano de Intercmbio de Problemas

    Especficos.

  • 24

    I -O Balano de Gesto Poltica, sintetiza os resultados positivos e negativos alcanados

    no mbito especfico que responde ou no s demandas polticas dos actores sociais e da

    populao em geral. O critrio central de gesto desse balano visa a maximizao dos

    benefcios polticos ponderados pelos diversos actores e grupos sociais durante o

    perodo de governao. Enquadra aqui as aces do governante, com recurso ao poder

    poltico como qualidade da democracia, o respeito das liberdades e garantias dos

    cidados, a descentralizao, tendo como recurso crtico o poder poltico.II- O Balano

    Macroeconmico regista, em seus benefcios e custos, as consequncias polticas do

    gestao macroeconmico e os resultados econmicos alcanados nas condies polticas

    vigentes, dentre os quais se destacam o crescimento econmico, o emprego, o equilbrio

    do comrcio externo e a taxa de inflao. O critrio central para a gesto desse balano

    a eficcia macroeconmica no perodo do governo e o recurso crtico escasso neste

    caso, so os meios econmicos. III- O Balano de Intercmbio de Problemas

    Especficos, por sua vez, refere-se ao saldo de efeitos polticos positivo ou negativo,

    gerado pelo enfrentamento dos problemas especficos valorizados pela populao. Os

    recursos crticos escassos desse balano incluem o poder poltico, os recursos

    econmicos e, principalmente, as capacidades gerenciais. Esses balanos devem ser

    analisados e avaliados constantemente, tendo por base, dois critrios fortemente inter-

    relacionados: a eficcia formal ou tcnica para responder e enfrentar os problemas e a

    eficcia material ou poltica.

    A gesto desses balanos exige a resoluo do problema no tempo oportuno, tendo

    presente a eficcia tcnica e a eficcia poltica durante o perodo de governo, que pode

    gerar contradies intensas e comuns. A ineficcia poltica conduz, a longo prazo,

    ineficcia tcnica, e vice-versa.

    1.2.3. O tringulo do Governo

    Segundo MATUS, o governar exige que, constantemente se articulem trs variveis

    interdependentes: projecto de governo, capacidade de governo e governabilidade do

    sistema.

    O projecto de governo se refere ao contedo da proposta de objectivos e meios, isto ,

    aces que o governo prope alcanar e no depende apenas do seu contedo, mas

    tambm das circunstncias e da capacidade do governo.

  • 25

    A governabilidade do sistema o controlo do governo sobre as variveis que actuam no

    projecto de governo, sendo certo que quanto maior o nmero de variveis decisivas que

    um actor controla, maior sua liberdade de aco e maior , para ele, a governabilidade

    do sistema e quanto menor for o nmero de variveis que o actor controla, menos sua

    liberdade de aco e menor a governabilidade do sistema;

    A capacidade de governo surge como percia para dirigir e fazer cumprir os

    objectivos propostos, onde se destaca o conhecimento das tcnicas de planeamento, e na

    capacidade de direco, gesto e de controlo.

    No tringulo de governo, separa-se, de um lado, variveis diferentes e, de outro,

    variveis que se inter-relacionam para se compreender a complexidade do processo de

    governo como uma unidade comum s trs variveis: a diferenciao que leva ao

    reconhecimento de sistemas de natureza diferente, designadamente, o sistema

    propositivo de aces (projecto de governo), o sistema social (governabilidade do

    sistema) e o sistema de direco e planeamento (capacidade de governo); a interaco e

    o mtuo conhecimento, mostrando o que h de comum aos trs sistemas - aco humana

    e o projecto de governo como propostas de aco; a governabilidade do sistema

    referindo-se s possibilidades de aco; e a capacidade de governo, definida como a

    capacidade para gerar e comandar aces.

    CARLOS MATUS, numa crtica alusiva ao livro-Plano prope uma estrutura modular

    problemas operaes, como forma de tornar o plano mais prtico e operacional. Num

    cenrio de conflitos e incerteza prprio no planeamento estratgico situacional, o

    homem lida com problemas mal-estruturados, por isso, deve em vez deLlivro Plano,

    procurar uma estrutura modular, problemas operaes.

    Se adoptamos o modo de pensar de um homem em aco, constatamos que ele no

    trabalha por sector, nem com polticas e programas sectoriais. Tampouco se alimenta

    directamente de investigaes, mas de propostas executivas que processam as

    investigaes (MATUS: Adeus Senhor Presidente, Governantes Governados).

    O poltico trabalha com problemas e operaes. Um modo de conseguir que um plano

    seja prtico, operacional e facilmente adaptvel s circunstncias consiste em estrutur-

    los por problemas (oportunidades) e operaes.

    O conceito de operao, segundo o autor, oferece muitas vantagens; um mdulo

    agregvel e desagregvel que sintetiza em forma prtica os diversos tipos de aco que

    um actor prope-se a realizar. Esses mdulos podem exigir em separados os seguintes

  • 26

    recursos: de poder, econmicos e organizacionais ou combinaes desses recursos

    mencionados;

    Considerando que, as operaes exigem recursos econmicos, esses podem

    compreender gastos correntes, investimentos ou ambos. Assim, com o conceito de

    operao recupera-se a unidade indivisvel da aco planeada e, ao mesmo tempo,

    transforma-se o plano em estrutura organizacional para a aco, na qual cada operao

    tem um propsito e um responsvel.

    A estrutura modular do plano estratgico tambm resposta adequada s necessidades

    de articular o Plano e o Oramento por Programas. Pelos mtodos tradicionais

    impossvel articular o Plano e o Oramento porque no pode haver correspondncia

    precisa entre pargrafos de um livro e mdulos de distribuio de recursos. Em troca, o

    Plano uma estrutura modular equivalente estrutura modular do Oramento, o

    problema encontra uma soluo bvia.

    O sistema Planeamento -Programao Oramentao Controlo, segundo CARLOS

    MATUS s possvel na Abordagem do Planeamento Estratgico, com a introduo da

    estrutura modular.

    A crtica ao planeamento tradicional seria o pano de fundo para a elaborao do

    Planeamento Estratgico Situacional, sendo por isso apresentado como um modelo

    pautado na democracia e na descentralizao, no qual o plano fruto de criao

    colectiva, e a partir dessa caracterizao e surge perante a crise do chamado

    planeamento tradicional.

    O Planeamento Estratgico Situacional foca os problemas que as populaes e as

    organizaes enfrentam e, estes devem ser o afazer da prtica poltica onde o

    Planeamento Estratgico Situacional adquire o sentido prtico em relao a eles. Para

    MATUS, o PES pode, portanto, ser entendido como o modo de processar

    tecnopoliticamente os problemas.

    O processo de Planeamento Estratgico Situacional apresenta quatro momentos focados

    no problema: i) momento explicativo, no qual se identificam e seleccionam problemas,

    descrevendo-os e analisando suas causas, e so identificados os ns crticos causais, que

    devem ser enfrentados para que se atinjam as metas; ii) momento normativo -

    prescritivo, no qual so formulados planos de aco, prevendo diversas circunstncias

    fora do controlo do governante, elaborando cenrios para levar em conta essa incerteza

    e identificando possveis surpresas que devero ser respondidas por meios de plano de

    emergncia, onde se esclarece a factibilidade tcnica e econmica das metas do plano

  • 27

    nos diferentes cenrios considerados; iii) momento estratgico que identifica os actores

    interessados, positiva ou negativamente, no problema, que explora a viabilidade poltica

    do plano e prope estratgias para superar as restries polticas por meio de um

    processo de construo da viabilidade; iv) o momento tctico-operacional que, no dia-a-

    dia, filtra, processa e pressiona para a execuo do plano, em uma batalha constante

    contra todos os casos de urgncia, de rotina e a improviso. Segundo MATUS, neste

    momento que se estabelece, ou se trava, a mediao entre o conhecimento produzido

    pelo plano e a aco que transforma a realidade, a cada dia. Nesse momento, que se

    estabelece os pr-requisitos da organizao exigida, pelo predomnio do plano sobre a

    impreviso.

    MATUS, entende que tudo comea com a seleco de problemas, tarefa que se torna

    mais fcil e mais rigorosa quando se dispe de uma grande estratgia.

    Para MATUS, a definio do problema deve ser formulada de forma descentralizada

    consoante nvel e focada nos problemas operaes, no nvel respectivo, cabendo a

    nvel central fazer a seleco de megaproblemas que por sua complexidade e

    envergadura exigem a participao de vrias organizaes. Reconhece-se a dificuldade

    em identificar correctamente os problemas, sem o qual no possvel estudar as causas

    e definir operaes para enfrent-los.

    1.2.4. Seleco de problemas

    O mtodo Planeamento Estratgico Situacional, utiliza um protocolo de seleco de

    problemas baseado em nove critrios suficientemente filtrados, pela prtica, que devem

    ser encarados apenas como um guio sujeito a reviso, conforme a natureza do caso

    considerado. Esses critrios so os seguintes: i)valor poltico do problema, isto , a

    qualificao da importncia atribuda ao problema: - pelo actor central e outros actores;

    pelo partido poltico do actor; pela populao em geral; pela populao directamente

    afectada; ii) tempo de maturao dos resultados - tempo que provavelmente levar para

    que aparea uma mudana significativa nas metas propostas; iii) vector de recursos

    exigidos pelo enfrentamento do problema em relao ao vector recurso do autor: -

    trata-se do grau da coerncia entre a disponibilidade de poder poltico, recursos

    econmicos, recursos cognitivos e capacidades organizacionais sob controlo ao actor

    que governa, e o grau em que tais recursos so exigidos pelo plano para enfrentar o

    problema. iv) governabilidade sobre o problema, que estabelece o grau de dificuldade

  • 28

    poltica do problema ( se esto fora ou no do controlo do actor governante); v) resposta

    dos actores com governabilidade critrio que complementa o anterior, aprofundando a

    situao em relao aos problemas, cujas causas esto fora do controlo do actor; vi)

    custo de adiamento, isto , a implicao do custo poltico caso o problema for excludo

    do plano; vii) exigncia de inovao ou continuidade- diz respeito a capacidade do

    poltico na tomada de deciso com recursos conservadores ou inovadores; viii) impacto

    regional conhecimento do impacto do plano sobre o problema, considerado o

    interesse em moderar ou em intensificar os desequilbrios regionais; e ix) impacto sobre

    o Balano Poltico de Gesto ao Final do Governo - critrio sntese, sobre a

    contribuio do plano na resoluo do problema, tendo presente os trs cintos do

    governo gesto poltica, balano macroeconmico e balano de intercmbio de

    problemas especficos.

    1.3. Oramentao

    Teoria da oramentao: diferentes abordagens

    O processo e tcnica oramental tm evoludo ao longo do tempo, particularmente,

    durante todo o sculo XX, no de forma planeada, antes espontnea e natural,

    influenciada pelos vrios sistemas polticos, pelas teorias econmicas, pelas vrias

    abordagens.

    As abordagens e conceptualizao do oramento tambm tm evoludo. Em

    PREMCHAND 9 , na proposta de identificao dos conceitos de oramentao ,

    possvel retirar das diferentes abordagens econmicas e organizacionais trs conceitos

    i)a oramentao como processo de optimizao que lida sobretudo com as teorias

    normativas da afectao de recursos que, por sua vez, lidam com a maximizao do

    bem-estar social e colectivo.Nesta abordagem, CABRAL NAZAR ,10

    enquadra quer a

    teoria da utilidade marginal pigouviana de determinao da composio da despesa, que

    COSTA SANTOS ,aborda na obra A Study in Public Finance11

    ; ii) oramentao como

    9 In Govermmene Budgeting p.34 e p.42 Cit Cabral Nazar -Programao e Deciso Oramental. Da

    racionalidade das decises oramentais Racionalidade Econmica TESES, Almedina, Coimbra 2008

    10

    In Cabral Nazar -Programao e Deciso Oramental. Da racionalidade das decises oramentais

    Racionalidade Econmica TESES, Almedina, Coimbra 2008

    11

    Cit Costa Santos O critrio geral da optimizaao do bem-estar avanado por Pigo leva a sustentar que

    os indivduos optimizam o seu bem-estar quando nivelam em relao a cada bem a respectiva utilidade

  • 29

    processo determinado pela procura de servios, em que, o oramento surge como o

    final de um procedimento burocrtico, com referncia a variveis endgenas (o custo

    dos servios) e a factores exgenos (a disponibilidade de rendimento). Esta abordagem

    dita funcional e descritiva inclui um espectro variado de temas que vo desde o

    objectivo do oramento, as suas conexes e tarefas (com destaque para o elenco das

    funes financeiras. Esta abordagem tratada em vrias literaturas, segundo

    Musgrave 12

    ) onde apresenta trs funes: de afectao de recursos; de estabilizao

    macroeconmica e de redistribuio iii) Finalmente, a oramentao entendida como

    um processo burocrtico interno, compreendendo as teorias que comparam (ainda que

    implicitamente), as decises oramentais s decises das empresas no sector privado,

    fundamentalmente pela mediatizao do conceito da racionalidade perspectiva, que

    segundo Cabral Nazar, importante, em primeiro lugar verificar se a deciso

    oramental antes de mais nada e acima de tudo uma arte, o que, a ser assim,

    prejudica a sua cientificidade. Em segundo lugar, a deciso oramental deve ser

    considerada no apenas do ponto de vista individual, em termos da natureza humana,

    mas tambm no quadro de um processo organizacional que inclui um conjunto de

    actividades previamente definidas, independentes e coordenadas, com vista

    concretizao de certos objectivos.

    No caso da deciso oramental, as interaces so mltiplas e muito complexas e

    afectam a natureza do resultado obtido, pondo em causa a prpria racionalidade

    decisional.

    No processo Planeamento Programao Oramentao e Controlo, o Oramento

    surge como um instrumento criado para garantir maior eficcia na obteno da

    eficincia organizacional, mas pode trazer disfunes no produto oramental.

    Ao longo dos tempos, houve vrias tentativas nesse sentido, o de dar afinal, a resposta

    do que uma boa oramentao.

    Foi, sobretudo, a partir da elaborao por V.O.Key, Hr, do seu artigo The Lack of

    Budgetary Theory (1940), que se levantou a questo da eficincia, eficcia e de

    optimizao, tendo o oramento como instrumento, onde o aspecto mais significativo da

    marginal com a correspondente desutilidade marginal aferida, no caso dos bens pblicos, pelos

    impostos suportados. (p. 347 Programao e Deciso oramental) 12

    Richard A.Musgrave; The Theory of Public Finance- A Study in Public Economy, McGraw Hill

    Company, NY., 1959, Richard A.Musgrave, Principles of Budget Determination, I Public Finance

    Selected Readings, cit, p.15 ss.,Richard A.Musgrave , Fiscal Systems, Yale University Press, New Haven,

    1969 Richard A.Musgrave, Public Finance in theory and practice , 2 ed. ,McGraw Hill Book

    Company, U.S., 1976, Richard A.Musgrave , The Future of fiscal policy A reassessment, Leuven

    University Press, 1978

  • 30

    oramentao pblica o de escolher a repartio das despesas pelos seus diferentes

    fins e assim atingir o maior retorno ou satisfao possvel. Neste caso, est-se perante

    o princpio de equilbrio receitas e aplicao de despesas num cenrio de escassez de

    recursos na satisfao de necessidades ilimitadas custo de oportunidade, custos esses,

    que devem ser avaliados em relao aos resultados e estes a valer o seu custo em termos

    de resultados alternativos, que sejam esperados ou prosseguidos.

    MERTON, defende que o oramento no se limita a ser um documento formal com

    valores inscritos, um plano quantificado de actividades futuras, mas utilizado tambm

    como instrumento de controlo, de planeamento e de motivao; nesta medida, ele torna-

    se um instrumento que provoca consequncias funcionais e disfuncionais, manifestas e

    latentes, que determinam, afinal, o grau do seu sucesso. Os aspectos funcionais dos

    sistemas de oramentao redundam justamente no facto de estes contriburem para

    uma gesto assente numa melhor planificao, coordenao, controlo e avaliao, o que

    supe, entre outras consequncias, a ideia de comunicao, de coordenao e de

    informao.

    Para alm da anlise custo de oportunidade, necessria a anlise incremental (ou seja,

    a anlise dos valores adicionais que podem advir de uma despesa adicional), tendo em

    conta o fenmeno da utilidade decrescente. A anlise oramental, apesar de ter o foco

    para que os resultados valem os seus custos, tambm, deve incluir uma comparao

    entre os valores relativos. O conceito de utilidade marginal sugere uma via de

    abordagem do problema, tendo como mtodo a diviso dos recursos disponveis em

    incrementos e considerar quais utilizaes alternativas de cada incremento que podem

    assegurar um maior retorno.

    A terceira e ltima proposio diz respeito eficcia relativa de diferentes meios na

    concretizao de um objectivo comum.

    Partilhando o mesmo objectivo, o valor relativo das actividades entre si, que pode

    tambm ser comparado em termos da sua eficcia.

    A teorizao econmica do oramento tambm traz limitaes.LEWIS 1reconhece as

    limitaes importantes na concepo terica da oramentao. A primeira resulta da

    dimenso e do impacto temporal da deciso oramental e a segunda a aplicabilidade de

    um mtodo de clculo econmico similar utilizado nas empresas ao Estado.

    No obstante estas limitaes, o autor considera ser possvel, a partir da definio das

    trs proposies (custo de oportunidade, anlise incremental e eficcia relativa de

    diferentes meios na concretizao de um objectivo comum), conceber um sistema de

  • 31

    oramentao alternativo que permite comparar os benefcios relativos advenientes das

    despesas pblicas e a aplicao das ideias resultantes da anlise econmica precedente.

    Numa nova perspectiva planeadora e integradora dos sistemas oramentais, MELVIN

    ASHEN (1967) 2 retoma o tema da utilidade do oramento.

    Para o autor, o oramento constitui provavelmente o maior instrumento de gesto; se for

    racionalmente desenhado, ele pode contribuir de forma poderosa para a concretizao

    das tarefas de gesto, de uma forma eficiente e eficaz. ASHEN retoma, em todo o caso,

    as preocupaes reveladas pelos autores que o antecederam, ao afirmar que o maior

    problema que deve ser resolvido atravs do processo oramental o da distribuio de

    recursos escassos (avaliados em termos monetrios) por diversas solicitaes. Isto,

    pressupe trs operaes de carcter intelectual que consiste em diterminar: a) a forma

    mais eficiente de alcanar certos e determinados objectivos; b) o conjunto ptimo de

    objectivos concorrentes; c) a dimenso ptima do oramento global.

    Podemos afirmar que ASHEN, nesta perspectiva defende a substituio da estrutura

    tradicional de oramento pelo oramento de programas, no quadro designadamente do

    sistema P.P.B.

    CABRAL NAZAR, entende que o P.P.B sugere as seguintes as caractersticas: o

    desenho do oramento deve facilitar a mensurao adequada dos custos monetrios

    totais necessrios concretizao dos objectivos propostos; a estrutura oramental deve

    facilitar a comparao de vias alternativas para a obteno de um certo objectivo; a

    apresentao oramental deve identificar, de forma clara, as implicaes dos custos

    futuros inerentes aos compromissos assumidos; o desenho do oramento deve facilitar a

    comparao entre os inputs referentes aos custos e a obteno dos outputs, mormente

    quando segmentos relacionados de um mesmo programa sejam administrados por

    diferentes entidades gestoras; o desenho do oramento deve delinear os objectivos dos

    compromissos de gastos assumidos, em termos tais que seja possvel levar a cabo a

    anlise custo-benefcio;o oramento deve tornar possvel a agregao de despesas

    relacionadas, onde quer que elas ocorrem a nvel da estrutura hierrquica

    administrativa;o oramento deve servir para produzir dados econmicos sobre os

    contributos que a actividade financeira pode acarretar para a economia nacional.

    O oramento surge aqui no apenas como um instrumento informativo do sector pblico

    e privado, mas tambm como um plano financeiro (e econmico) que deve orientar de

    forma racional a aco dos agentes econmicos na economia nacional.

  • 32

    Considerando o impacto tremendo do oramento sobre todos os planos da economia

    privada, Moor (1962)13

    na verdade, afecta a utilizao dos recursos econmicos, a

    estabilidade das condies econmicas, a distribuio do rendimento privado e a taxa de

    crescimento econmico subjacente, enfim, s ideias que antecedem as de Ashen e

    Moor est, por sua vez, contida uma dada viso do oramento (um oramento - plano

    e informativo), como portador, em si mesmo, de uma racionalidade pura e

    compreensiva, sobreposta (sucednea!) do mercado.

    1.3.1. Oramento incremental

    Este processo a partir do conceito da racionalidade compreensiva veio a ser criticado

    por alguns autores. CARLES E.LINDBLOM (1959), The Science of Muddling

    Through 14

    procurou confrontar o iter procedimental subjacente abordagem terica,

    descritiva, do processo oramental (tal como habitualmente figurava na literatura

    especializada), com aquele que, em seu entender, constituiria a realidade do processo

    decisional, tendo por base o funcionamento da mquina administrativa competente e da

    sua articulao com o poder poltico. Em confronto pois, com a abordagem da

    racionalidade compreensiva ou mtodo da raiz Carles E.Lindblom, props a

    formulao de uma outra abordagem, o mtodo das comparaes sucessivas limitadas,

    a que chamou tambm de mtodo dos ramos. Incorporando, em boa medida a tese da

    proposta de Lindblom, viria a ser publicada, a 1 edio, daquela que considerada a

    maior obra de referncia do incrementalismo oramental, The Politics of The Budgeting

    Process, da autoria de AARON WILDAVSKY . 15

    . Ele inaugura uma nova abordagem

    (as abordagens anteriores centravam muito na dimenso econmica sobre a melhor

    forma de afectar e de utilizar recursos escassos), Wildavsky definiu um quadro terico

    completamente distinto dos antecedentes, ideia segundo a qual a oramentao respeita

    sempre poltica; a maior parte das polticas respeitam a oramentao, devendo por

    isso, ser entendido como uma parte importante do jogo poltico. O decisor perante os

    13

    Cit, Cabral Nazar -Programao e Deciso Oramental. Da racionalidade das decises oramentais

    Racionalidade Econmica TESES, Almedina, Coimbra 2008 p.361, Roy E. Moor, The budget doent

    tell us enough, in Public Finance Selected Readings, ed.Helen A. Cameron e Willian Hender so,

    Randon House, New York, 1966 14

    Cit Cabral Nazar -Programao e Deciso Oramental. Da racionalidade das decises oramentais

    Racionalidade Econmica TESES, Almedina, Coimbra 2008 p 362. 15

    Cit Cabral Nazar -Programao e Deciso Oramental. Da racionalidade das decises oramentais Racionalidade Econmica TESES, Almedina, Coimbra 2008 , 5 edio, Pearson, Longman, New York,

    2004

  • 33

    recursos disponveis concede a cada programa, a cada despesa, um incremento de justa

    partilha.

    As decises oramentais, assim, basicamente, dizem respeito a decises sobre o poder,

    sobre quem o detm, sobre quem dele beneficia, ou no.

    O oramento incremental tem como pressuposto de que, partindo de um ponto base!

    do qual, fazendo pequenas alteraes possvel gerir com eficcia a complexidade de

    todo o sistema de poder poltico e ao mesmo tempo, obter o necessrio apoio poltico s

    decises oramentais, enaltecendo a dimenso poltica da oramentao. Por outro lado,

    o oramento um contrato que envolve vrios participantes.

    O oramento embora possa sugerir que neste se procura concretizar certos objectivos,

    mediante a planificao das respectivas despesas, a verdade que, na maior parte dos

    casos, a apreciao posterior revela que as verbas no foram utilizadas nos propsitos

    iniciais. O oramento, reflectindo a luta de poder num contrato um instrumento

    mais pacfico numa abordagem incremental. Pois mais fcil para os polticos este

    modelo, que segundo Wildavsky a principal preocupao dos polticos parecem ser os

    eleitores. Mas, dentro desta categoria demasiado vaga e abstracta, preciso operar

    algumas distines: os eleitores que mais preocupam os polticos so, como demonstrou

    Downs, aqueles que se situam geralmente no centro estatstico do espectro poltico

    so os eleitores medianos, sem preferncia ideolgicas muito vincadas, capazes de

    alterar a sua preferncia de voto em virtude de pequenas mudanas conjunturais; so os

    votos flutuantes que geralmente decidem as eleies . Assim, mais fcil satisfazer

    todos os pequenos aumentos de dotaes no oramento do que mudanas radicais na

    estrutura e no montante do oramento/ despesas.

    A abordagem incremental, segundo CABRAL NAZAR, apresenta as seguintes

    caractersticas: i) a oramentao est ligada base (do servio ou agncia) ideia de

    justa partilha ( fair shares) , sendo a base um conceito central do incrementalismo e

    consiste na expectativa geral de que a despesa ir manter-se, que a mesma aceite como

    uma parte do que tem de ser feito, ficando portanto fora de um escrutnio intensivo. Em

    perodos mais difceis (do ponto de vista econmico ou financeiro), a base pode ser

    objecto de debate e ajustamento; ii) a oramentao consensual, uma vez que exige

    um acordo mnimo entre os participantes sobre a direco geral da poltica pblica; iii) a

    oramentao histrica, como uma herana do seu passado. As formas tradicionais

    de especificao das despesas (designadamente, o line-item-budgetary form)

    facilitam a perspectiva histrica da oramentao. Com efeito, os responsveis pela

  • 34

    elaborao do oramento no tm de efectuar alteraes nos programas na sua

    globalidade, mas alteraes em rubricas especficas pessoal, funcionamento,

    equipamento, etc., que no fundo sustentam um dado programa. Pois, mais fcil

    calcular pequenas revises ou actualizaes, do que calcular mudanas radicais; iv) a

    oramentao fragmentada os oramentos so feitos de fragmentos: os servios

    fazem os seus pedidos de dotao de acordo com as suas necessidades especficas.

    Mesmo quando as propostas de oramento chegam entidade que centraliza a sua

    elaborao, mesmo aqui, a apreciao no tende a incidir sobre a globalidade das

    rubricas; v) a oramentao simplificada. Pois, para minorar a complexidade relativa

    estimao de gastos com grandes programas, na sua globalidade, a opo tende a recair,

    por razes de simplicidade, pela apreciao de itens especficos (gastos com o pessoal,

    com investimentos, etc.); vii) a oramentao social. Porque a personalidade dos que

    propem novos programas ou despesa decisiva: disso depende a sua aceitao ou

    aprovao final. Olha-se mais o responsvel pela implementao dos mesmos do que

    para o objecto em causa: viii) a oramentao satisfatria .Os responsveis pela

    elaborao oramental procuram no tanto a maximizao, apenas a satisfao (e o

    suficiente). Ou seja, esto preocupados, no com a obteno do melhor dos mundos,

    mas sim com evitar o pior ou evitar os problemas ; ix) a oramentao tratada

    como se no fosse programtica Mesmo que existam programas oramentais, a

    verdade que os decisores e responsveis desenvolvem a maior parte do seu trabalho

    sob forma de ajustamentos monetrios marginais aos programas j existentes. x) a

    oramentao repetitiva a atitude mais comum, no processo de deciso oramental,

    a de que s raras vezes ela chamada a resolver os problemas de uma vez por

    todas. A sucesso de problemas (mais do que a resoluo de problemas) o que

    melhor retrata o que de facto acontece; xi) a oramentao sequencial mas mesmo

    em relao a cada problema, os responsveis oramentais no procuram atac-los, de

    uma s penada, em apenas um s ano. Vo adiando pelos sucessivos anos a sua

    resoluo definitiva. Tambm contribui para facilitar os clculos.

    As caractersticas apresentadas d ao oramento incremental um instrumento de

    perpetuao do satus quo, conservador, tradicionalista; no revolucionria - um

    instrumento poltico para se perpetuar no poder, depositando os interesses

    conflituosos ou antagnicos, que preciso saber gerir, em ordem obteno do

    consenso possvel e prpria salvaguarda do( s) poder (es), dando a ideia de que o

    oramento um instrumento de preservao desse poder: e que a forma mais sensata de

  • 35

    o assegurar consiste em ir satisfazendo em pequenas doses, um pouco, os interesses de

    todos.

    1.3.2. Da Oramentao por Objectivos ao P.P.B.S

    O Planning, Programming and Budgeting System (PPBS) surgiu nos Estados Unidos

    da Amrica a partir da dcada de cinquenta do sculo XX.

    Nesta abordagem, retoma-se claramente a perspectiva racionalizadora e de acordo com

    a ideia de que no domnio das decises pblicas oramentais tambm h lugar a

    racionalidade pura e compreensiva.

    Segundo SOUSA FRANCO, a reintroduo da ideia de racionalidade deve-se por um

    lado, do desenvolvimento das tcnicas do planeamento e programao; por outro, do

    aperfeioamento das tcnicas de gesto empresarial, e alguns casos inspiradores de

    inovaes introduzidas no sector pblico; e, ainda da criao de processos novos de

    racionalizao da deciso, de anlise do custo de investimentos dos servios pblicos e

    dos benefcios sociais deles resultantes (Finanas Pblicas, Vol I. cit p. 419).

    Este novo mtodo, para alguns, uma verdadeira revoluo. Para ALLEN SCHICK 16

    ,

    por exemplo, o PPBS foi o primeiro sistema oramental especialmente desenhado para

    acomodar as mltiplas funes do oramento, surgidas e afirmadas, em momentos

    sucessivos da histria do direito oramental norte-americano, sobretudo ao longo do

    sculo XX.

    Relativamente funo, para ROBERT ANTHONY17

    (1965) o oramento, em teoria,

    desempenha trs funes essenciais: i)a funo de controlo operacional, que permite

    verificar se as diferentes tarefas foram levadas a cabo de forma eficaz e eficiente; ii) a

    funo de gesto (management), processo atravs do qual gestores asseguram que os

    recursos disponveis so utilizados com eficincia e eficcia, tendo em vista o

    cumprimento dos objectivos da organizao; iii ) a funo de planeamento estratgico,

    pela qual se decide os objectivos da organizao, as alteraes destes, as alteraes dos

    recursos disponveis e das polticas que orientam a obteno e afectao desses

    recursos.

    16

    Assim, Allen Schicv ( 1966), The Road to PPB : The Stages of Budget Reform, in Public Budgeting,

    Program Planning and Evaluation, Fremont J. Lyden and Ernest G, Miller, Chicago ( in Programao e

    Deciso Oramental ) 17

    Cit Cabral Nazar

  • 36

    Na funo de controlo, o oramento passa no s a respeitar a regra de especificao das

    despesas para se transformar num instrumento exclusivo de controlo da execuo.

    Relativamente gesto surge, pela primeira vez a referencia ao Oramento por

    Objectivos ou Oramento Funcional (Performance Budgeting). nesta etapa e na

    sequncia das concluses apresentadas pela 2 Comisso Hoover, (1954) que surge a

    nova e arrojada forma de apresentao oramental, o oramento programa, que viria a

    ser assumido mais tarde, como elemento central do processo oramental, no quadro do

    sistema P.P.B.

    Nazar CABRAL, analisa este conceito Performance Budgeting e Program Budgeting,

    mostrando que por causa da proximidade, foram vulgarmente confundidas aspectos que

    viriam a merecer crtica de uns autores, como Arthur Smithies, 18

    e, tentativas de

    delimitao conceptual, por outra parte. que a diferena no se prende s com o hiato

    temporal que mediou entre o aparecimento do Performance Budgeting e do Program

    Budgeting, mas tambm de natureza substantiva. Ao contrrio do Performance

    Budgeting, que instrumento de gesto, o Program Budgeting obedece a uma

    perspectiva de planeamento, sendo certo que o seu maior objectivo o da racionalizao

    da deciso, ao assegurar: i) o fornecimento de dados sobre custos e benefcios referentes

    s diversas alternativas capazes de atingir as metas definidas; ii) a existncia de

    indicadores de resultado que facilitam a concretizao desses mesmo objectivos. Assim,

    enquanto o primeiro retira o seu ethos e grande parte da sua tcnica da contabilidade de

    custos e da gesto cientfica, o segundo, retira as suas ideias-chaves da economia e da

    anlise de sistema.

    O PPBS mostrou-se como um projecto ambicioso que permitiu a ligao entre o

    oramento e os objectivos mais vastos da poltica econmica, tornando assim, um

    instrumento de poltica num processo planeamento, programao, oramentao e

    controlo, isto , assegura um processo sistemtico e compreensivo de deciso

    oramental.Neste processo o planeamento o momento de definio dos objectivos,

    como expresso quantificada das misses a atingir; a programao a organizao dos

    meios necessrios para alcanar os objectivos determinados, sendo o produto desta

    organizao a elaborao de um programa; a oramentao, como o clculo, a

    aquisio organizada dos recursos existentes em relao aos elementos dos programas j

    decididos na programao.

    18

    In Conceptual Framework for the Program Budget , in Program Budgetin, Program Analysis and the

    Federal Budget, cit, p.34

  • 37

    O PPBS, deixa nos sistemas modernos de oramentao um legado evidente a

    orientao planeadora e uma nova especificao e classificao programtica da

    despesa (o oramento de programas).

    1.3.3. A Racionalizao das Decises Oramentais (RDO)

    O mtodo Racionalizaao das Decises Oramentais (RDO), teve forte influncia do

    PPBS e surge de forma a superar as falhas do mesmo, protagonizado no esforo de

    racionalizao compreensiva, do Plano para o Oramento.

    Esta nova forma e metodologia, surgida a partir de finais da dcada de sessenta, da

    oramentao das receitas e despesa do Estado, denominada de Racionalizao das

    Decises Oramentais RDO (Rationalisation des Choix Budgtaires) e, dentro desta, a

    afirmao e desenvolvimento dos oramentos de programas.

    Para Jacques Bravo19

    , as origens do novo mtodo resultaram da adequao de

    conjugao de uma necessidade com uma oportunidade, que ficou a dever-se ao

    movimento racionalizador , movimento este que, ao longo da dcada de sessenta,

    marcou os sistemas oramentais de outros pases desenvolvidos.

    A necessidade prendia-se com as limitaes do sistema tradicional francs e com a

    urgncia posta na sua reforma, tendo um triplo fundamento: i) o desafio colocado s

    finanas pblicas europeias no incio da dcada de setenta, perante a limitao dos

    recursos disponveis em face do crescimento exponencial das despesas pblicas. Surge

    assim a importncia atribuda s ideias de eficincia e da eficcia, com destaque para

    esta ltima no quadro de todos os sistemas PPB, no qual RDO se inclui; (ii) a existncia

    de novos problemas postos Administrao, a exigir a procura de uma eficcia

    administrativa acrescida e, por conseguinte, a reforma da gesto pblica e a prpria

    renovao da cincia administrativa; (iii) a expanso dos sistemas PPB, a partir do

    exemplo pioneiro do sector da Defesa norte-americano.

    O sistema tradicional francs, segundo J. Bravo, apresentava as seguintes

    caractersticas: o peso do precedente, expresso pela importncia em cada oramento,

    do montante dos crditos renovados ( services votes) no conjunto dos crditos

    oramentais; o carcter marginal da deciso oramental; a negligncia em relao ao

    futuro; um oramento de meios; a heterogeneidade da nomenclatura oramental,

    19

    Neste sentido, Jaques Bravo, Lxprience franaide des budgets de programmes, RE, n 1, 1973 , p.3 e

    4.

  • 38

    misturando-se classificaes tanto por natureza, como pelo tipo jurdico de interveno,

    como ainda pelo seu destino; a ausncia de ventilao das despesas atendendo ao

    objecto; a indiferena aos resultados; a falta de ligao entre as autoridades de deciso

    e de execuo; a ausncia de projectos alternativos; a contraco do calendrio de

    discusso oramental; um controlo oramental restrito apreciao da legalidade,

    negligenciando a eficincia e a eficcia das decises.

    A RDO, trouxe para alm da introduo de um novo processo decisional objectivos

    racionais, isto , de racionalizar as escolhas oramentais que consistia essencialmente,

    no quadro do processo oramental, a explicitao dos objectivos prosseguidos pelas

    entidades pblicas, a comear pelo Estado, o recenseamento, a comparao e seleco

    dos meios para os alcanar e de medir os resultados atravs de indicadores relevantes,

    aplicando os princpios e tcnicas de gesto privada/empresarial, pondo a tnica na

    eficcia e eficincia.

    A RDO foi assim concebida como um novo processo de abordagem de formulao e de

    execuo das decises pblicas, apresentando quatro etapas principais: estudo, deciso,

    aco e controlo. No plano intelectual, a natureza circular e iterativa do processo fica

    clara: o estudo consiste na anlise dos diferentes objectivos e dos meios alternativos

    para os concretizar, conduzindo s decises sobre os programas de aco; a

    programao como elemento central do processo deve, por sua vez, ser concebida de

    molde a facultar permanentemente o quadro e os elementos informativos necessrios ao

    bom desempenho analtico (deciso e aco) e, no final; a avaliao e controlo. O

    elemento central, volta do qual se organiza todo o procedimento racional, o

    programa, a combinao de meios em sequncia das aces com vista concretizao

    dos objectivos traados, uma estrutura programadora da qual o oramento dar, depois

    uma imagem anual aplicada.

    1.3.4. O Oramento base-zero

    Os sistemas PPB, em especial a RDO, surgiram num momento inquietante da evoluo

    das finanas pblicas dos pases ocidentais, em que a despesas do Estado crescia de

    forma descontroladas. Seria por isso necessrio uma poltica de austeridade

    financeira. A RDO seria, nesta perspectiva, um modelo no s para conter as despesas

  • 39

    pblicas, mas tambm facilitadora do crescimento econmico. A prtica mostrou que

    longe de se reduzir as despesas assumiu como reveladores de necessidades 20

    O Oramento de base-zero (OBZ) surge assim como a primeira experincia de

    planeamento e oramentao assumidamente orientada para a conteno do crescimento

    da despesa, quer a nvel do sector privado quer ao nvel do sector pblico.

    O OBZ foi pensado a partir da contribuio terica de PETER PYHRR, na empresa

    americana Texas Instruments, em 1969. Foi aplicado pelo ento Governador Jimmy

    Carter ao Estado da Gergia, na preparao do Oramento de 1973.

    Consiste em reavaliao permanente das despesas programadas de um dado sector ou

    departamento no momento da apresentao do oramento. O processo exige a

    justificao detalhada das dotaes relativas aos fins pretendidos. Chama a ateno para

    os excessos e para a duplicidade de esforos entre os departamentos, e foca nas quantias

    necessrias para os programas e no no aumento percentual em relao ao ano anterior.

    As prioridades so especificadas dentro dos departamentos e nestes, nas respectivas

    unidades operacionais ou funcionais, permitindo comparaes entre elas, e uma

    avaliao mais cabal do respectivo desempenho.

    O OBZ baseia numa ideia managerial de planeamento numa primeira etapa do

    processo, permitindo o estabelecimento de programas, metas e objectivos e assumpo

    das decises bsicas em matria de poltica da organizao como um todo.

    Apresenta dois momentos distintos:i) a identificao dos pacotes de deciso, onde se

    identifica e se descreve uma actividade especfica, que pode ser aceite ou rejeitada no

    processo de deciso; ii) a priorizaao dos pacotes de deciso, que consiste em

    classificao e ordenao dos programas e as despesas de acordo com o grau de

    importncia.

    A OBZ ao priorizar os pacotes de decises estaria a racionalizar as decises: a saber,

    que novos programas de alta prioridade possam receber maiores dotaes do que os

    programas obsoletos, desnecessrios ou redundantes que podem, pois ser abandonados

    ou secundarizados.

    O OBZ pretendeu assumir-se, acima de tudo, no sem inmeras dificuldades de

    implementao, como um expediente pragmtico de renovar a oramentao das

    despesas de uma organizao. Trata-se de permitir a avaliao constante dos programas

    20

    Cit Cabral Nazar -Programao e Deciso Oramental. Da racionalidade das decises oramentais

    Racionalidade Econmica TESES, Almedina, Coimbra 2008, Jean-Claude Ducros , La rationalisation

    des choit budgetaires.

  • 40

    (e das respectivas despesas). A avaliao das alternativas e da performance do programa

    pode, em circunstncias pontuais suscitar a necessidade de repensar e redireccionar o

    programa, o que, em ltima anlise, supe deitar tudo fora e comear de novo .

    Todavia, na maior parte dos casos, os programas subsistem, incorporando as

    modificaes e melhorias.

    Como afirma PETER A.PYHRR ,na maior parte deles, a ateno principal incidir na

    avaliao da eficincia e eficcia do programa e na avaliao e priorizaao dos

    diferentes nveis de esforo de despesa. (The Zero- Base Approach , p.264)

    Em sntise Base Zro signifie que la rfrence au passe nest ps taboue, que la

    situation doit tre analyse avec un oeil neuf , sans prjugs, hors de la pesanteur des

    strutures actuelles, bref quil convient de rapartir de zero! ) 21

    CAPTULO 2 -Oramento do Estado de Cabo Verde

    Sua trajectria logo ps independncia at os dias de hoje.

    2.1. A Administracao financeira do Estado de Cabo Verde nos primeiros dias e anos da independncia

    Cabo Verde, em 5 de Julho de 1975 tornou-se num Estado independente.

    J o Conselho de Estado de Cabo Verde colonial, atravs da Lei n 13/74, de 13 de

    Janeiro, ao preparar as condies para a transio da descolonizao independncia,

    aprovou o Estatuto Orgnico do Estado de Cabo Verde e desenhou a sua respectiva

    Administrao Financeira. Este desenho est plasmado no captulo III da Lei supra

    mencionada: definindo o activo e o passivo, dando competncia ao Governo de

    Transio a dispor dos seus bens e receitas, a definir seu o patrimnio o Estado de Cabo

    Verde e a especificar o o alcance da administrao financeira do Estado de Cabo Verde,

    e ficando no entanto subordindo ao oramento privativo, elaborado anualmente, e

    mandado executar pelo Governo de Transio, nos termos da lei outrora vigente.

    Por Decreto n 5-C /75, de 23 de Julho,22

    no uso da faculdade conferida pelo ento n 3

    do artigo 15 da Lei sobre a Organizao Poltica do Estado, de 5 de Julho de 1975, o

    21

    \Marurice Tchenio, Jean Pierre Vaihen e Gerges Garibian, La pratique du BBZ p. 23 Cit Cabral

    Nazar - Programao e Deciso Oramental. Da racionalidade das decises oramentais Racionalidade

    Econmica TESES, Almedina, Coimbra 2008 22

    Documento em anexo (1)

  • 41

    Governo decretou a primeira orgnica do Ministrio das Finanas23

    , dando assim o

    passo decisivo para a organizao financeira do Estado independente de Cabo Verde.

    2.1.1. Oramento.

    O primeiro oramento do Estado Independente de Cabo Verde, foi publicado pela Lei

    n1/76, de 19 de Abril no Boletim Oficial n 16. Um Diploma com onze artigos, onde o

    Governo era () autorizado a arrecadar as contribuies, impostos e mais

    rendimentos do Estado e a obter outros recursos indispensveis administrao

    financeira, de harmonia com as normas legais aplicveis, como a utilizar o seu produto

    no pagamento das despesas inscritas no Oramento Geral do Estado respeitante ao

    mesmo ano (. .). (p.3 do Sup.ao Boletim Oficial n16, de 19 de Abril de 1976 artigo

    2 da Lei n 1/76), remetendo implicitamente as normas do Captulo III da Lei n 13/74,

    de 13 de Janeiro. Se propunha uma receita de 683.935.040$00, sendo 274.190.000$00

    de receitas ordinrias e 409.745.040$00 de receitas extraordinrias, fixadas despesas

    ordinrias e extraordinrias na quantia 903.196.241$00, sendo 493.451.201$00 as

    ordinrias e de 409.745.040$00 as extraordinrias. No oramento constava medidas de

    gesto de tesouraria, relativamente a utilizao e distribuio de verbas, na fiscalizao,

    no se